nível superior
Revista online | As implicações da educação domiciliar
Maria Auxiliadora Lopes*, especial para a revista Política Democrática online (44ª edição: junho/2022)
No dia 19 de maio deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei (PL) 1.388/2022, que autoriza a educação domiciliar, conhecida como homeschooling no Brasil, e, se aprovada pelo Senado e se tornar lei, irá alterar às Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).
Segundo o texto aprovado e enviado ao Senado, os critérios para quem optar pela educação domiciliar exigem, por exemplo, que o estudante esteja regularmente matriculado em uma instituição de ensino, que deverá acompanhar a evolução do aprendizado.
Além disso, pela proposta, pelo menos um dos pais ou responsáveis deve ter escolaridade de nível superior ou em educação profissional tecnológica em curso reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC).
A outra exigência é a comprovação dessa formação, que deverá ser apresentada à escola no momento da matrícula, quando também ambos os pais ou responsáveis pelo aluno terão de apresentar certidões criminais da Justiça Federal e estadual ou distrital.
No entanto, diante dessa proposta, é imprescindível repensarmos alguns conceitos de educação que socialmente construímos:
“Ato ou processo de educar(-se), aplicação dos métodos próprios para assegurar a formação e o desenvolvimento físico, intelectual e moral de um ser humano; pedagogia, didática, o ensino conjunto desses métodos; pedagogia, instrução, ensino” (Educação | Michaelis On-line).
“A educação pode ser definida como sendo o processo de socialização dos indivíduos. Ao receber educação, a pessoa assimila e adquire conhecimentos. A educação também envolve uma sensibilização cultural e de comportamento, onde as novas gerações adquirem as formas de se estar na vida das gerações anteriores.” (Conceito de educação - O que é, Definição e Significado)
“Denomina-se educação o processo em que se adquirem competências e habilidades.” (Brasil Escola)
Veja, abaixo, galeria de imagens:
Visionárias, as comunidades tradicionais entendem que existem educação e educação escolar.
Educação é aquela compreendida dentro de um processo mais amplo e cotidiano, que faz parte de todos os grupos sociais, incluindo relação com a família, entre pessoas, as gerações, as relações de trabalho e com o meio ambiente. É a educação própria de determinados povos/comunidades.
Educação escolar é um recorte do processo educativo mais amplo. Ela implica na necessidade de organização de uma ação educacional de construção de processo de escolarização específico e diferenciado, voltado fundamentalmente para o fortalecimento e valorização das comunidades
Existe uma relação intrínseca entre educação e escola, que é um espaço privilegiado da construção coletiva do conhecimento, da socialização dos indivíduos, do preparo para o exercício da cidadania, da correção das desigualdades e da valorização da diversidade.
Recentemente, a necessidade do distanciamento social, devido à pandemia da covid-19, trouxe à tona algumas questões no que se refere à saúde mental de crianças e adolescentes que foram obrigados a permanecer em casa.
Uma pesquisa, realizada pelo Departamento de Psicanálise com Crianças do Instituto Sedes Sapientiae, atestou que, em tempos de isolamento compulsório, como o que passamos por ocasião do acirramento da pandemia da covid-19, nossa população infantil e adolescente teve sua saúde mental gravemente afetada, grande parte em decorrência da privação do convívio escolar.
Os estudos e práticas afirmaram, com convicção, que a escola é fundamental para a educação de nossas crianças e adolescentes, mas, principalmente, para uma saudável constituição psíquica.
Além disso, há as situações de crime de abandono intelectual, violência doméstica e abuso sexual contra crianças que as escolas identificam e encaminham às instâncias responsáveis.
O ser humano é um ser social, e o convívio com outras crianças e as interações são base para um desenvolvimento saudável. A criança não pode ser privada do convívio social independente da vontade de seus pais.
Será que o simples fato dos pais ou responsáveis terem nível superior ou técnico os habilita para o ensino de nossas crianças e adolescentes, considerando que a educação escolar é um processo complexo e requer formação específica que leve os alunos a desenvolverem competência e habilidades para seu pleno desenvolvimento intelectual e social, observando os princípios constitucionais, a base nacional comum e os princípios que orientam a educação básica brasileira?
É importante destacar, ainda, a importância da convivência de crianças e adolescentes no ambiente escolar, já que a escola é um ambiente catalisador das diferentes culturas, formas distintas de viver e agir, criando mecanismos para que, a partir dessa convivência, tenha uma postura respeitosa diante das diferenças.
A aprovação de um projeto de lei que propõe mudança tão impactante para o sistema educacional brasileiro, sem que toda a população esteja ciente de todas as implicações, deve ser amplamente discutida com todos os segmentos populacionais, movimentos sociais, especialistas em educação, pais e representações estudantis, para que todos tenham conhecimento e analisem as consequências da aprovação da proposta.
A educação escolar representa um lugar de aprendizagem pela convivência com a diversidade e o respeito às diferenças sociais e culturais. A opção pela educação domiciliar é preocupante, uma vez que coloca a responsabilidade da aprendizagem curricular apenas nos pais ou responsáveis pelo educando, mesmo que estes não tenham habilitação para o ensino.
Considerando que a educação visa o pleno desenvolvimento da pessoa e seu preparo para cidadania, privar crianças e adolescentes do convívio e do ambiente escolar viola a liberdade, a democracia e o desenvolvimento pleno que possuem, já que é necessária uma relação intrínseca com a educação.
Sobre a autora
*Maria Auxiliadora Lopes é pedagoga, ex-consultora da Unesco e ex-diretora do Departamento de Desenvolvimento dos Sistemas de Ensino, da Secretaria de Educação Fundamental do Ministério da Educação (MEC). Também foi coordenadora da Coordenação Geral de Diversidade e Inclusão Educacional do Departamento de Educação para Diversidade e Cidadania da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC.
** O artigo foi traduzido para publicação na revista Política Democrática online de junho de 2022 (44ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.
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José Antonio Segatto: Uma crise anunciada
Urge uma reforma para desburocratizar e desprivatizar as universidades públicas
Já há alguns anos constatamos, em artigo neste mesmo espaço (Publicização da universidade, 10/8/2014), o desencadeamento de uma grave crise nas universidades estaduais paulistas – USP, Unesp e Unicamp. Apontávamos também seus fatores originários, que, acumulados ao longo do tempo, não haviam sido enfrentados – e envolviam e envolvem não só problemas econômico-financeiros e do sistema administrativo, mas, sobretudo, a conformação dos poderes e dos métodos de gestão, impregnados de patrimonialismo e clientelismo, cartorialismo e corporativismo. Observávamos, ademais, ser necessária a adoção de medidas urgentes capazes de estancar o agravamento da crise em curso e, mais, que esta poderia resultar em eventual inadimplência, o que implicaria a paralisação de atividades e a impossibilidade de pagamento da folha de salários e de encargos.
Decorridos mais de três anos, poucas providências foram adotadas. A USP, cuja situação, naquele momento, era de maior gravidade – com a folha de pagamentos tendo chegado a 105% do orçamento –, viu-se compelida a despender quase todas as suas reservas e realizar um ajuste, ainda que parcial e fraco, sem ir ao cerne das questões. Dessa forma, mesmo com as reparações promovidas pela Reitoria, a sua situação econômico-financeira continua precária.
Concomitantemente, a situação da Unicamp e da Unesp era e é igualmente débil e inquietante. A primeira aprovou recentemente medidas tímidas e/ou paliativas, adiando a resolução dos problemas. Já a segunda não tomou providência alguma – mesmo diante do fato de sua folha de pagamentos ter-se aproximado dos 100% da receita – e não tem orçamento para pagar o 13.º salário dos servidores estatutários (professores e técnico-administrativos), bem como, provavelmente, para o total da massa salarial de 2018 – situação que pode vir a se agravar, dado que a administração central tem tido sua capacidade diretiva e sua credibilidade exauridas de maneira célere.
Ante a magnitude da crise, o establishment universitário (reitor e seu staff, gestores acadêmicos e administrativos, corporações e confrarias de interesses, etc.) tem-se postado de forma incerta, procurando simplesmente contornar suas origens e implicações. Tem-se limitado a reivindicar o aumento do porcentual da quota-parte do ICMS, que já é de 9,57%, equivalente a quase R$ 10 bilhões. Convenhamos, é um montante bastante expressivo, se considerarmos a realidade socioeconômica do País.
A situação, que hoje é grave, poderá tornar-se imponderável ou mesmo dramática nos próximos anos se medidas de reforma estrutural e de ajuste não forem realizadas. Guardadas as devidas diferenças e proporções, não é de todo inverossímil que aconteça em São Paulo algo parecido com o que sucede na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). Para evitar semelhante constrangimento as universidades paulistas terão de atacar problemas crônicos, cujas resoluções não podem mais ser postergadas – muito menos ser resolvidos com medidas efêmeras.
Dado que os problemas são numerosos, alguns devem ser eleitos como prioritários. Entre eles:
1) o da burocratização – as universidades se tornaram imensos aparatos burocráticos com centenas de órgãos (departamentos, conselhos, comissões, câmaras, diretorias, seções, divisões, etc.) e milhares de servidores técnico-administrativos, que chegam a perfazer o dobro ou o triplo de docentes/pesquisadores. Tais aparatos ganharam, muitas vezes, vida própria, sobrepondo-se às atividades de ensino, pesquisa e extensão, e mesmo as atividades dos docentes experimentaram cabal burocratização. Esse fato provocou distorções inconcebíveis, transformando atividades-meio em atividades-fim.
2) O da privatização – a cultura e as práticas patrimonialistas, também nas universidades públicas, foram convertidas em procedimentos ordinários; manifestam-se dos mais variados formas e meios e a ele se acoplaram o clientelismo e o corporativismo. Mediante a indiferenciação entre o público e o privado, a burocracia universitária apropria-se constantemente de bens e fundos públicos, autoatribuindo-se benefícios e privilégios dos mais variados tipos, ao legislar em causa própria – isso proporcionado por pacto (velado) entre o establishment universitário e o sindicalismo de resultados e/ou negócios, movido por um corporativismo insaciável e de conveniência pecuniária; ocorreu mesmo uma sindicalização de órgãos centrais da universidade. Tudo isso foi possibilitado, evidentemente, pela autonomia (didático-científica, administrativa, financeira e patrimonial), compreendida pelos servidores (docentes e técnicos-administrativos) como ilimitada, e pela refutação desses mesmos funcionários de qualquer regulação externa.
Inegavelmente, existem outros problemas que poderiam ser expostos.
1) A falta de transparência e de responsabilização de agentes nas decisões e na execução orçamentária e financeira e no controle de aplicações e investimentos;
2) a ineficiência e mesmo o amadorismo na gestão universitária. Logo, a crise não se deve, simplesmente, ao mero desequilíbrio financeiro provocado por gestões perdulárias – o que, de fato, aconteceu –, mas deriva de questões estruturais.
Isto posto, e se nosso entendimento for adequado, urge a realização de uma ousada reforma acadêmico-administrativa, capaz de eliminar órgãos e procedimentos burocráticos e cartoriais, patrimoniais e corporativos – mudanças passíveis de desburocratizar e desprivatizar as universidades públicas, ou seja, de democratizá-las e publicizá-las. Entretanto, se esse estado de coisas não for revertido, elas estarão fadadas ao perecer gradual, perdendo o sentido de ser e existir. Ou, no mínimo, podem ficar à mercê de projetos e interesses impróprios, como o sugerido no relatório do Banco Mundial, há pouco divulgado com acentuado júbilo por certos órgãos da mídia.
* José Antonio Segatto é professor titular de sociologia da Unesp
Projeto de Lei quer tornar obrigatória exigência de nível superior para ministros de Estado
Caso seja aprovada e vire lei, proposta de autoria do deputado tucano Bruno Covas já se aplicaria ao ministros atualmente empossados
A Câmara dos Deputados analisa a obrigatoriedade de todos os ministros de Estado possuírem diploma de nível superior. A exigência está prevista no Projeto de Lei 4727/16, de autoria do deputado Bruno Covas (PSDB-SP).
O parlamentar argumenta que a informação tem o poder de desencadear ações de sucesso, essenciais à criação e permanência das organizações no mercado. Quanto mais conhecimento, afirma o parlamentar, maiores as chances de criar, planejar, controlar, solucionar ou oportunizar o momento.
Projeto de Lei quer aumentar período de contrato de professores temporários
Inclusão de deficientes em cotas para universidades avança no Congresso
“É disso que o País precisa: pessoas capazes de produzir com efetividade, detentoras de know how para o desenvolvimento”, afirma.
Caso seja aprovada e vire lei, a medida vai aplicar-se também aos ministros já empossados.
Atualmente, de acordo a Constituição, os ministros de Estado devem ser brasileiros maiores de 21 anos de idade e no exercício dos direitos políticos.
A proposta tramita em caráter conclusivo e será analisada pelas comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Agência Câmara | Brasília - 26/07/2016 - 19h10
Fonte: Painel Acadêmico