motociata
Chomsky: PT tem que lembrar que apoio de artista e reunião em universidade não ganham eleição
Mariana Sanchez*, BBC News Brasil
Pela janela, Noam Chomsky, de 93 anos, assiste à motociata pró-Bolsonaro rasgar a rua, preenchendo o ambiente com bandeiras verde e amarelas e o ronco alto dos motores das motocicletas.
Ativista político que se autodenomina um socialista libertário, Chomsky diz seguir "com grande interesse" aquela que tem sido descrita como a eleição mais tensa no país desde a redemocratização. Suas reflexões, ele ressalta, não são as de um especialista. "Não me leve muito a sério", diz, antes de emendar observações afiadas sobre a política brasileira.
Chomsky nota que, se as motociatas de Bolsonaro têm ocupado espaços públicos ao redor do Brasil, o mesmo não tem acontecido com a campanha do petista Luiz Inácio Lula da Silva, que tenta voltar à presidência e impedir que o atual presidente conquiste mais quatro anos no Palácio do Planalto. Para o pensador, a esquerda deixou de ocupar as ruas de modo organizado.
"No Brasil, minha impressão é que o PT simplesmente falhou nos últimos 20 anos em se organizar como movimento de base. Então, só para ilustrar, a gente conversa com as pessoas e as pessoas não sabem que se beneficiaram dos programas que o Lula criou, não sabem que ele foi o responsável por seus filhos poderem entrar na faculdade, por terem conseguido abrir um pequeno negócio. É Deus, é sorte, ou algo assim. Não o PT", aponta Chomsky.
Segundo ele, assim como o partido Democrata nos Estados Unidos, o PT se afastou do trabalhador, do mais pobre. Ao abraçar agendas neoliberais, perdeu a conexão histórica com seu eleitorado. E isso abriu espaço para que movimentos de direita radical capturassem essa audiência.
"(O PT vai fazer) uma grande reunião do partido para tentar responder ao que aconteceu (no primeiro turno), uma reunião na universidade, onde estarão artistas e escritores. Enquanto isso, as pessoas comuns (seguem) dizendo (sobre o PT): 'nos livramos dos bandidos'", avalia Chomsky, que conversou com a BBC News Brasil, por vídeo chamada, na tarde de segunda-feira (03/10), menos de 24 horas após a definição de segundo turno entre Lula, que conquistou 48,43% dos votos válidos, e Bolsonaro, com 43,20% dos votos.
Segundo Chomsky, um defensor incondicional da liberdade de expressão, a falta de capilaridade de base do PT e da esquerda brasileira explica a eficácia que têm algumas fake news na campanha, como a de que Lula planeja fechar templos religiosos.
"Se você tivesse um partido político ou qualquer organização geral defendendo os trabalhadores e os pobres, eles poderiam reagir a isso (fake news) na base, via organização local. Os Democratas não têm. E acho que não existe nada parecido no Brasil. O PT simplesmente não está se organizando na base, no chão de fábrica", afirma Chomsky.
O filósofo, aposentado pelo Massachussets Institute of Technology (MIT) e atualmente professor da Universidade do Arizona, afirma que pautas como o aborto e o armamento civil são estratégias diversionistas para que a população mais pobre não perceba que as políticas econômicas dos governos são desfavoráveis a seus interesses. E afirma que o "pior crime de Bolsonaro é destruir a Amazônia", algo que pode colocar em risco a sobrevivência da humanidade como um todo.
Chomsky vê muitos paralelos entre a política nos EUA e no Brasil: desde o erro das pesquisas eleitorais ao medir as performances dos candidatos populistas de direita ao risco de uma repetição da invasão do Capitólio à brasileira.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista de Noam Chomsky à BBC News Brasil, editada por concisão e clareza.
BBC News Brasil- Como o senhor avalia o quadro político do Brasil hoje, à luz dos resultados do primeiro turno, que mostraram Lula a 1,5 ponto percentual de ganhar no primeiro turno mas com Bolsonaro apenas 5 pontos percentuais atrás dele, mostrando um vigor que as pesquisas não detectaram e que surpreendeu muita gente?
Noam Chomsky - Em primeiro lugar, isso é apenas uma parte do quadro político. Tem outra parte que eu acho ainda mais reveladora, que é que os candidatos de direita, os candidatos de Bolsonaro, realmente varreram a maior parte do Brasil muito além do que se esperava para o Congresso e entre os governadores.
E foi bastante surpreendente ver o que aconteceu com as pesquisas, dá pra supor que é bastante semelhante ao que está acontecendo nos Estados Unidos (onde as pesquisas demonstraram erro fora do esperado em antever a votação trumpista). Eles foram exatos em Lula, quase precisos. Mas subestimaram muito Bolsonaro e também seus candidatos.
Isso é exatamente o que acontece com Trump. As pesquisas subestimam o apoio popular a ele e aos que ele apoia. E suspeito que o motivo seja o mesmo. A parte da população que está inclinada a votar em Trump ou Bolsonaro provavelmente é tão anti-elite que não confia nos pesquisadores, acha que eles fazem parte dessa conspiração de esquerda que está tentando destruir a família, a igreja. Eles simplesmente não respondem. Eu não ficaria surpreso se o mesmo estivesse acontecendo aqui.
Houve uma tonelada de publicidade negativa nos anúncios da campanha de Bolsonaro em relação ao Lula. "Livre-se do ladrão". "Livre-se da corrupção". "Eles estão apenas roubando você". E a impressão que dá ao falar com as pessoas nas ruas é que isso teve um grande efeito. Que o grupo de Bolsonaro seja corrupto até o pescoço não é o que as pessoas têm ouvido ou captado no WhatsApp. Então, o papo das pessoas conversando na rua é 'vamos nos livrar dos corruptos, dos ladrões'. Novamente um fenômeno bastante semelhante tem acontecido nos Estados Unidos.
BBC News Brasil - Mas por que a esquerda não consegue reagir a isso?
Chomsky - O Partido Democrata, que você poderia supor ser a oposição (a Trump e aos republicanos nos EUA), na verdade praticamente se juntou à onda neoliberal no início dos anos 1980. Eles abandonaram a classe trabalhadora e os pobres apenas para seguir a guerra de classes de (Ronald) Reagan. Muito parecido com o Partido Trabalhista na Inglaterra, onde a piada era que Tony Blair havia se tornado uma versão light de (Margareth) Thatcher.
O resultado final é que esse público não é de ninguém. Não há nenhum partido político que esteja de fato defendendo os direitos e interesses dos trabalhadores, dos pobres. Eles (os trabalhadores e os pobres) são facilmente desviados para outras preocupações quando alguém como Trump, nos EUA, aparece no palco segurando em uma mão dizendo uma faixa que diz "eu te amo" enquanto que com a outra mão, ele te apunhala pelas costas. Eles apenas olham para o "eu te amo", não para o programa de governo.
No Brasil, minha impressão do que aconteceu é que o PT simplesmente falhou por 20 anos em se organizar na base. Então, só para ilustrar, a gente conversa com as pessoas e as pessoas não sabem que se beneficiaram dos programas que o Lula criou, não sabem que ele foi o responsável por seus filhos poderem entrar na faculdade, por você ter conseguido abrir um pequeno negócio. É Deus, é sorte, ou algo assim. Não o PT. Vimos isso em discussões pré-eleitorais de ativistas do partido, falávamos sobre como eles tiveram um grande apoio de artistas e de alguns movimentos sociais, mas não são essas pessoas que vão votar e vencer a eleição. Na verdade, (minha esposa) acabou de me dizer que haverá uma grande reunião do partido para tentar responder ao que aconteceu (no primeiro turno), uma reunião na universidade, onde estarão artistas e escritores. Enquanto isso, as pessoas comuns (seguem) dizendo que nos livramos dos bandidos. Essa é uma observação superficial, mas essa é a impressão que tenho há muitos anos.
BBC News Brasil - A direita radical tem ganhado terreno entre grupos que antes eram considerados esquerdistas, como trabalhadores sindicalizados, os mais pobres. Esse é inclusive um objetivo declarado deles, como disse recentemente Steve Bannon à BBC News Brasil. Por que isso está acontecendo?
Chomsky - Devo dizer que, embora acompanhe de perto os assuntos brasileiros, não estou intimamente envolvido neles, então posso dar apenas julgamentos superficiais. Mas me parece muito com o que aconteceu nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha. Então, vamos dar uma olhada nos Estados Unidos: o chamado neoliberalismo não tem praticamente nada a ver com mercados ou qualquer coisa assim, é apenas uma guerra de classes massiva e selvagem, muito concentrada e bem planejada, o capitalismo selvagem em seu extremo.
Na década de 1970, o mundo dos negócios viu uma oportunidade de reverter as odiadas medidas do New Deal, as medidas social-democratas, que eram significativas. Eles foram fortemente apoiados por alguém como (o presidente americano republicano Dwight) Eisenhower, mas a comunidade empresarial nunca gostou e, no início dos anos 1970, houve uma crise econômica e uma oportunidade para os empresários de basicamente ir na jugular dessas medidas e lançar uma grande guerra de classes. Reagan embarcou. Margareth Thatcher, na Inglaterra, fez o mesmo. Tanto eles quanto seus conselheiros pelo menos entenderam que era apenas uma guerra de classes. A primeira coisa que fizeram foi ir atrás de destruir os sindicatos. Esse é o único mecanismo de defesa que os trabalhadores têm, isto está bem compreendido ao longo de mais de um século. Você tem que destruir os sindicatos se quiser levar a cabo uma guerra de classes. Divida a população e faça com que ela se desvie, se afaste das questões econômicas. Não queremos que olhem para isso porque estamos apunhalando-na pelas costas. Em vez de olhar para a economia, olhe para o aborto ou para armas ou qualquer coisa.
Isso começou com (o republicano) Richard Nixon com o que foi chamado de Estratégia do Sul (um discurso político que explorava eventuais episódios de violência em protesto antirracismo e advogava pela insegurança da população branca nas cidades), quando ele percebeu que podia conquistar os democratas do Sul que se opunham aos direitos civis (dos negros), apresentando-se como o partido racista.
Claro, Nixon não dizia: 'sou racista'. O que fazia era dar indicações, os chamados apitos de cachorro, que são códigos para fazer as pessoas entenderem que você está do lado da supremacia branca. E no momento em que chega a Reagan, não eram nem apitos de cachorro, era um racista aberto.
Ao mesmo tempo, os republicanos foram percebendo que se fingissem ser contrários ao aborto - apenas fingissem - poderiam ganhar o enorme voto evangélico. Se a gente voltar para a década de 1960, os líderes do Partido Republicano eram pró-escolha da mulher. Reagan, George H. W. Bush faziam parte basicamente dos apoiadores de Roe versus Wade (a decisão da Suprema Corte que liberou o aborto em todos os EUA até ser derrubada pela Corte este ano). Reagan, como governador da Califórnia, passou uma das leis mais abrangentes para garantir o acesso ao aborto (em 1967). Os estrategistas do Partido Republicano de meados dos anos 1970 que perceberam que, se fingissem ser anti-aborto, poderiam obter o enorme voto evangélico e o voto católico do norte. E num estalar de dedos, todos eles se tornaram apaixonadamente anti-aborto.
Isso está acontecendo agora no Brasil, o grande voto evangélico vai para Bolsonaro também. Novamente, (a estratégia de investir nas) questões culturais. Você olha para as eleições de 2018 no Brasil, nas quais suspeito que Steve Bannon esteve muito envolvido, e as mensagens que vinham no WhatsApp, que é o que a maioria das pessoas olham, é que o PT ia destruir as igrejas, ia transformar seus filhos em homossexuais e assim por diante. Esse é o problema. Desta vez, eles são todos ladrões corruptos que atacam a igreja, e por aí vai. Se você tivesse um partido político ou qualquer organização geral defendendo os trabalhadores e os pobres, eles poderiam reagir a isso (fake news) na base, via organização local. Os Democratas não têm. E acho que não existe nada parecido no Brasil. O PT simplesmente não está se organizando na base, no chão de fábrica. O que eles estão fazendo é como quando os democratas nos Estados Unidos se reúnem para ir a uma das festas chiques de (Barack) Obama, onde podem ouvir Beyoncé cantando e discutir. Se os republicanos querem apelar à classe trabalhadora, o que eles fazem é mandar que George W. Bush vá a um bar e peça uma cerveja e finja ser um "Zé" da classe trabalhadora comum. O que os democratas fazem: John Kerry vai praticar windsurf. Isso realmente não vai agradar aos trabalhadores. O PT e os Democratas se tornaram partidos de pessoas abastadas, que vão às universidades discutir o que fazer. E aí já está perdido.
De outro lado, os republicanos estão já bastante esgotados com os seus principais apoiadores, os setores corporativos, que não gostam deles. Assim como a classe empresarial no Brasil não gosta da vulgaridade e crueldade de Bolsonaro. Mas ainda assim, os dois grupos acham melhor isso do que ter outro petista ou democrata no poder.
BBC News Brasil - O senhor está traçando muitos paralelos entre os EUA e o Brasil. Há quem acredite que o país pode viver uma situação como o 6 de janeiro de 2021, quando trumpistas invadiram o Capitólio pra contestar os resultados eleitorais. O senhor vê esse risco no Brasil?
Chomsky - O tumulto das motociatas do Bolsonaro dão uma ideia do que poderia ser. E olha que era apenas um desfile pelas ruas da cidade. Acho que os próximos serão meses muito difíceis. Bolsonaro fez declarações alegando possíveis fraudes tão extremas que a comunidade diplomática internacional se opôs fortemente. Então eu acho que eles vão se abster desse tipo de movimento. Mas é perfeitamente possível que eles possam replicar o 6 de janeiro. Lembre-se, o 6 de janeiro chegou muito perto de um golpe e só não o foi porque meia dúzia de pessoas decidiram diferente. Teria sido um golpe se (o vice de Trump) Mike Pence e (o então líder da maioria no Senado) Mitch McConnell estivessem dispostos a ver o sistema democrático formal derrubado. Foi muito perto.
Se aconteceu nos EUA, há um risco muito grande de que aconteça no Brasil. O país está obviamente muito dividido e Bolsonaro está despejando armas na mão de pessoas que se organizariam facilmente para dar um golpe. Não é preciso muita imaginação para pensar que os mesmos que participam da motociara também poderiam pegar em armas se for o caso. Como Trump, Bolsonaro disse muito explicitamente que ele não vai ser derrotado, quem sabe o que ele quer dizer?
BBC News Brasil - Se Lula vencer, o que ele deveria fazer em seu terceiro mandato?
Chomsky - Bom, a essa altura está meio tarde, mas eles precisam começar a se organizar entre a população em geral. Não basta ter artistas do seu lado, ou ter acadêmicos, é preciso sair às ruas e se organizar para realmente ter forças populares reais ali.
Não é que faltem pessoas (nesse campo da esquerda). Houve grandes manifestações populares (contra Bolsonaro), mas meio espontâneas. Eu não acho que eles tinham uma organização unificada ou um conteúdo político direto, exceto o "fora Bolsonaro" ou algo assim. Isto não é suficiente.
BBC News Brasil - Como o governo Bolsonaro se compara ao de Trump?
Chomsky - Uma das semelhanças é voltar a atenção do público para outro lugar. Essa técnica de apontar pro outro lado e gritar 'olha lá o ladrão', pra se livrar de questionamento sobre o aumento da fome e da pobreza, sobre as mortes da pandemia.
Mas o pior crime de Bolsonaro, não só para os brasileiros, mas para o mundo inteiro, é destruir a Amazônia. Mais alguns anos com o atual avanço da extração ilegal da madeira, do agronegócio e da mineração e chegaremos em pontos de inflexão irreversíveis, no qual a floresta se converte em savana. Sabe-se que isso acontecerá mais cedo ou mais tarde, mas essa possibilidade se aproximou muito por causa desses ataques destrutivos. É um desastre para o Brasil, uma catástrofe para o mundo inteiro. Em vez de tratar disso, vamos fazer campanha em outra coisa: 'olha aí, os ladrões do PT, tentando enganá-lo', 'eles vão destruir a família', 'vão atacar a igreja cristã'. Enquanto isso, nos aproximamos mais e mais do ponto em que não vamos mais sobreviver.
*Texto publicado originalmente na BBC News Brasil
Bolsonaro volta a defender voto impresso em nova motociata
Após participar de 'motociata' em Florianópolis um dia após decisão de Lira de levar discussão ao plenário, presidente acena a parlamentares e critica STF
Fábio Bispo, Especial para o Estadão
FLORIANÓPOLIS - O presidente Jair Bolsonaro voltou a defender o voto impresso, conclamou a população a “lutar com todas as armas” pelo voto "auditável" e fez aceno a parlamentares. “Eleição fora disso não é eleição”, disse Bolsonaro em Florianópolis (SC), no início da tarde deste sábado, 7, após participar de "motociata" pelas avenidas da cidade.
O presidente repetiu os ataques aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) ao discursar para apoiadores na Beira-Mar Continental de Florianópolis: ”Não são meia dúzia dentro de uma sala secreta que vai contar e decidir quem ganhou as eleições; não vai ser um ou dois ministros do Supremo. Quem tem legitimidade além do presidente (da República) é o Congresso Nacional”, declarou.
Na sexta-feira, 6, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), decidiu levar para o plenário a discussão sobre o voto impresso, após o projeto ter sido derrotado em comissão especial nesta quinta-feira, 5, por um placar de 23 a 11, em comissão especial da Casa. Lira optou pela estratégia arriscada para agradar ao Palácio do Planalto, mas avisou Bolsonaro que, se o texto for rejeitado, não aceitará ruptura institucional.
No ato com tom de campanha em Santa Catarina, Bolsonaro aproveitou para atacar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que lidera pesquisas de intenção de voto para as eleições do próximo ano, e fez ilações em tom alarmista citando o regime político da Venezuela.
“A gente vê na pequena Pacaraima, cidade de Roraima, onde o Exército brasileiro acolhe centenas de pessoas por dia que fogem do paraíso socialista da Venezuela. Muitas são grávidas com crianças pequenas que chegam lá arrastando seus filhos com uma mala na mão e uma trouxa de roupas na cabeça. Muitas sendo obrigadas a se prostituírem para dar de comer aos seus filhos. Nós sabemos como aquele regime começou, quem apoiou. Não preciso dizer que o é o bandido de nove dedos”, declarou. “Não queremos isso para o Brasil. E mais do que não queremos, lutaremos com todas as armas disponíveis para que isso não aconteça em nossa pátria.”
E a ofensiva contra Lula se estendeu aos ministros: “O ladrão de nove dedos, que seus amigos é que vão contar os votos dentro de uma sala secreta”.
Por diversas vezes, Bolsonaro pregou a união de seus apoiadores para combater as supostas ameaças que tem levantado, sempre sem provas, contra a democracia brasileira. ao insistir em eleições com voto impresso. “Há 50 anos eu jurei dar minha vida pela pátria, mas juntamente com vocês, agora, nós juramos dar a nossa vida pela nossa liberdade.”
E mandou recado aos que defendem a legalidade e segurança do atual sistema eleitoral Brasileiro - sem voto impresso -, a quem nominou de não democratas: “Quem não é democrata não tem espaço no resto do Brasil. Eu tenho limites, alguns poucos acham que são o dono do mundo, vão quebrar a cara. Nós queremos e exigimos nada mais além disso. Não continuem nos provocando, não queiram nos ameaçar”, disse ao final do discurso.
Prisão
A Polícia Militar informou que 24 mil motocicletas participaram do evento em Florianópolis, que teve a participação de diversos grupos de motociclistas da Região Sul do País. No palanque, montado no último trecho da "motociata", Bolsonaro discursou ao lado da vice-governadora de Santa Catarina, Daniela Reinerh, do senador Jorginho Melo (PL-SC), da deputada federal Caroline De Toni (PSL-SC), do deputado federal Daniel Freitas (PSL-SC) e do empresário Luciano Hang, que esteve ao seu lado desde a recepção no aeroporto.
O comboio de motos percorreu mais de 60 quilômetros pelas avenidas de Florianópolis. Apesar de não ser evento oficial da Presidência, a "motociata" mobilizou forte aparato público, com reforço no policiamento, guarda municipal, utilização de helicópteros, ambulâncias, entre outros. Diversas vias da cidade foram bloqueadas para o evento.
Pela manhã, um homem foi detido, segundo a PM, por ter atirado objeto nos apoiadores do presidente. Segundo comandante do 4º Batalhão da PM, Tenente-Coronel Dhiogo Cidral, não houve representação registrada pelas supostas vítimas. O homem foi levado para delegacia, onde foi lavrado um Termo Circunstanciado, e acabou liberado.
Fonte: O Estado de S. Paulo
*Título do texto original foi alterado para publicação no portal da Fundação Astrojildo Pereira (FAP)
Bolsonaro insufla manifestantes com discurso golpista em atos pró-voto impresso pelo país
Presidente fala em vídeos para apoiadores e ataca novamente Barroso e TSE diante de possível derrota de PEC na Câmara
BRASÍLIA, RIO DE JANEIRO , SÃO PAULO e RIO DE JANEIRO
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) insuflou manifestantes com discurso golpista em atos pró-voto impresso pelo país neste domingo (1º).
Bolsonaro fez uso de videochamadas para se dirigir a apoiadores nas manifestações em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte, nas quais voltou a atacar o sistema eleitoral brasileiro e a criticar o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso.
“Vocês estão aí, além de clamar pela garantia da nossa liberdade, buscando uma maneira que tenhamos uma eleições limpas e democráticas no ano que vem. Sem eleições limpas e democráticas, não haverá eleição”, disse Bolsonaro pela manhã aos manifestantes em Brasília.
“Uma eleição limpa, democrática, com o voto impresso em papel com contagem pública é a garantia da continuidade da nossa democracia”, afirmou aos apoiadores na avenida Paulista à tarde.
BOLSONARO PARTICIPA DE MOTOCIATA EM PRESIDENTE PRUDENTE
No Rio, Bolsonaro falou com os manifestantes por meio do celular do deputado federal Helio Lopes (PSL-RJ) e citou Barroso. “Não podemos admitir uma pessoa apenas, no caso o ministro Luís Barroso, [que] seja válida apenas a vontade dele. [...] Tem que estar subordinado à vontade popular.”
Procurado via TSE para comentar as declarações do chefe do Executivo, Barroso não se manifestou até a publicação deste texto.
Bolsonaro ignorou apelos de líderes e dirigentes de partidos do centrão, que pediram moderação após a live da última quinta-feira (29) na qual o presidente fez o maior ataque até então ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas.
No sábado (31), Bolsonaro afirmou após motociata em Presidente Prudente (SP) que não aceitará uma “farsa”. “Queremos eleições, votar, mas não aceitaremos uma farsa como querem nos impor.”
Aliados de Bolsonaro avaliam a renovação do discurso golpista como uma tentativa de manter sua base radical mobilizada diante de uma série de desgastes do governo e da aliança com o centrão, consolidada com a indicação de Ciro Nogueira para chefiar a Casa Civil na semana passada.
Os atos deste domingo aconteceram em meio à discussão na Câmara da PEC do voto impresso, proposta de emenda à Constituição defendida pelo governo.
Na manifestação em Brasília, a deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF), presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), atribuiu a possível derrota a uma suposta pressão exercida por TSE e STF.
“Esta é a última tentativa de a gente virar esse jogo. Nós vamos votar no dia 5 [de agosto], mas muitos que apoiavam, que sempre votaram a favor, estão cedendo a uma pressão muito forte do TSE e do STF."
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já disse que não vê chances de a proposta chegar ao plenário.
Em São Paulo, apoiadores do presidente se reuniram no quarteirão em frente ao prédio da Fiesp, na avenida Paulista. Procurada, a Secretaria de Segurança Pública não informou uma estimativa de público até a publicação deste texto.
Em cima de um carro de som, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) ecoou falas passadas do pai e criticou o TSE. “Quem é o TSE para dizer que nós temos que confiar neles? Não, eles é que têm que colocar a contagem pública dos votos. Esse direito que nos foi retirado em 1996 com as urnas eletrônicas”, afirmou o filho do presidente.
Na live da última quinta, Bolsonaro não apresentou as provas de supostas fraudes eleitorais que vinha prometendo há anos, apresentando apenas teorias sobre a vulnerabilidade das urnas eletrônicas que circulam há anos na internet e já desmentidas anteriormente.https://player.mais.uol.com.br/?mediaId=16953140&onDemand=true
Na praia de Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro, manifestantes inflaram um “pixuleco” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vestido de presidiário e colaram nele uma imagem de Barroso, com os dizeres: “Eu roubo a grana, meu moleque [Barroso] os votos”.
O presidente também se dirigiu a apoiadores no ato em Belo Horizonte. A videochamada se deu pelo celular do deputado federal Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG), ex-ministro do Turismo. Ele foi denunciado pelo Ministério Público sob acusação de envolvimento em um esquema de candidaturas laranjas do PSL, caso revelado pela Folha em 2019.
Também foram registrados atos em capitais como Salvador e Belém, mas sem a participação de Bolsonaro por videochamada.
O advogado Rodrigo Mondego, da comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, afirmou nas redes sociais que um homem foi agredido por bolsonaristas e atropelado em Ipanema, na zona sul do Rio, por volta das 10h30 deste domingo. A vítima, segundo ele, se chama Eduardo Debaco, um economista de 49 anos.Mondego disse à reportagem que um amigo ligou para ele buscando um advogado criminalista para assessorar um colega que havia sido atacado.
"Ele mora em Ipanema e foi correr na praia. Quando passou na frente de um grupo de pessoas, todas sem máscara e camisa da CBF, comentou que bolsonarista não usa máscara. Um cara ouviu e foi pra cima dele, dando socos, golpes. Ele desequilibrou e, quando estava levantando, o cara o empurrou em direção à rua e um carro passou por cima da perna dele. Quebrou em quatro partes", afirmou.
Segundo Mondego, o economista teve uma fratura exposta, está internado e pode ter que passar por cirurgia. O advogado diz que irá esperar a Polícia Civil abrir de ofício uma investigação e que, se isso não ocorrer, o registro da ocorrência será feito após seu cliente ter alta.
Em nota, a Secretaria de Estado de Polícia Militar informou que esteve no hospital onde a vítima está internada.
“Chegando ao local, os policiais localizaram a vítima, um homem de 49 anos, que, de acordo com as primeiras informações, teria entrado em luta corporal com outro homem, e que, após ser jogado na pista, foi atropelado, e sofreu fratura exposta”, diz a nota. A PM relata ainda que não foi acionada para a ocorrência e que os policiais acompanharam os parentes da vítima para o registro da ocorrência na delegacia.
Ricardo Della Coletta , Washington Luiz , Ana Luiza Albuquerque , Renata Galf e Waleska Borges
Fonte:
Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/em-ato-por-voto-impresso-bolsonaro-novamente-coloca-eleicao-de-2022-em-duvida.shtml