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O Globo: Centrão pressiona governo para ocupar pastas hoje com militares

Grupo político defende que a Casa Civil e a Secretaria de Governo, por exemplo, passem a ser chefiadas por políticos

Natália Portinari e Gustavo Maia, O Globo

BRASÍLIA — Com a proximidade da reforma ministerial, programada para acontecer depois da eleição para as presidências de Câmara e Senado, vem crescendo a pressão do centrão para a mudança naquele que é um dos pilares do governo de Jair Bolsonaro: a presença maciça de militares em postos estratégicos do primeiro escalão. O grupo, cada vez mais próximo ao presidente, defende a nomeação de mais políticos em ministérios e mira, especialmente, duas pastas sediadas no próprio Palácio do Planalto: a Casa Civil, hoje a cargo de Braga Netto, e a Secretaria de Governo, responsável pela articulação política, ocupada por Luiz Eduardo Ramos.

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A impressão de aliados de Bolsonaro no Congresso é que a “militarização” do governo atrapalha na interlocução com os partidos, além de ser um entrave para a liberação de cargos e emendas, moeda de troca importante para os parlamentares. Até agora, o Planalto sondou nomes como o do ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM-BA), e de José Múcio Monteiro, ex-presidente do Tribunal de Contas União (TCU) e ex-ministro das Relações Institucionais do governo Lula. Ambos rejeitaram a hipótese de assumir a articulação política do Planalto.

À frente da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos é alvo frequente de críticas de líderes partidários próximos a Bolsonaro — os parlamentares o acusam de não cumprir promessas. Para alguns deputados, a falta de histórico de atuação no Congresso prejudica o ministro, classificado frequentemente como alguém que “não é do ramo” e que não teria habilidade em articular politicamente. O grupo pressiona pela substituição de Ramos, general da reserva, por um nome com trajetória política. Auxiliares de Bolsonaro ouvidos pelo GLOBO, porém, minimizam a hipótese de troca — Ramos é amigo do presidente. Uma alternativa seria deslocá-lo para outro posto no governo como a Secretaria-Geral, hoje comandada interinamente por Pedro Cesar Sousa — ex-chefe de gabinete do presidente.

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O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, de origem na Marinha, é outro militar do primeiro escalão que recebe críticas de parlamentares do centrão. O apagão no Amapá no fim do ano passado e a demora na apresentação de soluções tem sido usado como argumento para a troca.

Apesar da forte pressão sobre o presidente para que demita os ministros da Saúde, Eduardo Pazuello, e das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, aliados próximos a Bolsonaro afiançam que os dois não serão defenestrados do governo. A manutenção da dupla já teria virado uma espécie de “questão de honra” para o chefe do Executivo, que nos últimos dias fez questão de defendê-los publicamente.

Mesmo se houver a possibilidade de retirar Pazuello do cargo, integrantes do centrão avaliam que não é o momento de ocupar o Ministério da Saúde, já que, durante a pandemia, a pasta está no centro das atenções e pode gerar problemas. Imaginam também que Bolsonaro queira indicar um nome de sua “cota pessoal” para ministro.

Cotado para assumir a Saúde sempre que a especulação sobre a demissão de Pazuello surge, o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), nega que exista qualquer negociação em torno de ministérios.

— Isso não está sendo estudado. Está sendo cobiçado. Do lado de fora do Palácio do Planalto. O presidente Bolsonaro tem dois ministros do DEM, o DEM diz que é independente e ele não demite os ministros. A régua dele não é essa — disse Barros ao GLOBO.

Caso a candidatura do deputado Arthur Lira (PP-AL) seja vitoriosa na Câmara — na semana passada, ele reverteu o apoio do PSL, partido que abriga bolsonaristas e que, antes, estava ao lado de seu adversário, Baleia Rossi (MDB-SP) —, a correlação de forças no entorno de Bolsonaro será alterada, com o fortalecimento do centrão. Aliados acreditam que o resultado poderá dar tração à ampliação do espaço do grupo no primeiro escalão.

Congressistas defendem que o governo acomode partidos que apoiaram os candidatos do Planalto — além de Lira, Bolsonaro está ao lado de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) no Senado, em acordo costurado pelo atual presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP). As negociações devem ocorrer entre os partidos mais próximos ao governo, como PP, PL, PSD e Republicanos. Também está em análise a recriação de pastas, como Planejamento e Indústria e Comércio, que hoje são parte do Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes (leia mais abaixo).

Alcolumbre no senado

Uma mudança dada como certa por interlocutores de Bolsonaro, por outro lado, é a saída de Onyx Lorenzoni (DEM) do Ministério da Cidadania. A vaga é cobiçada pelo PP, de Ciro Nogueira e Arthur Lira. Deputado federal licenciado do Rio Grande do Sul, Onyx pode ganhar outro cargo no governo. Um dos únicos parlamentares que apoiaram a pretensão presidencial de Bolsonaro ainda muito antes da eleição, Onyx tem a gratidão do presidente, ainda que sua passagem pela Casa Civil no começo do governo seja avaliada como malsucedida.

Outra certeza consolidada nos últimos dias entre interlocutores de Bolsonaro é que o atual presidente do Senado, Davi Alcolumbre, não ganhará um ministério, e continuará no mandato de senador. O presidente alega que o parlamentar não poderia entrar no governo por estar muito “desgastado”.

Recentemente, Alcolumbre disse a aliados que fora convidado para o Ministério do Desenvolvimento Regional, onde assumiria a cadeira de Rogério Marinho. Mas governistas garantem, nos bastidores, que o ministro permanecerá no cargo.

Bolsonaro também é pressionado a ceder o comando do Ministério do Turismo, que passou por uma turbulenta troca de comando no mês passado, quando Gilson Machado assumiu o posto de Marcelo Álvaro Antônio. O ex-ministro deixou a pasta um dia depois de atacar Ramos. Em mensagem enviada pelo WhatsApp em um grupo de ministros, ele acusou o colega de pedir sua cabeça a Bolsonaro para entregar o ministério ao centrão “para obter êxito na eleição da Câmara dos Deputados”.

A avaliação interna entre alguns auxiliares do presidente é que Gilson Machado, apesar de ser muito próximo a Bolsonaro, não traz dividendos políticos para o governo.


Adriana Fernandes: Vitória de Pirro

Ao deixar muitos restos a pagar, ministérios gastadores podem virar caloteiros

Por completo descaso e até com apoio do governo Bolsonaro, os parlamentares vão deixar a votação do Orçamento de 2021 para o ano que vem. Não é a primeira vez nem será a última que isso acontece.

Tem até quem diga que essa foi a melhor decisão para governo e parlamentares ganharem tempo, apararem arestas provocadas pelas eleições do comando da Câmara e Senado e chegarem, ao final, a um consenso sobre medidas que viabilizem a retomada, o ajuste das contas e o enfrentamento daquele que deverá ser o maior problema da economia em 2021: o aumento do desemprego.

A procrastinação está sendo comemorada.

Acontece que, no vácuo da ausência da votação, o Orçamento de 2021 já começa a ganhar forma antes mesmo de qualquer decisão dos parlamentares e certamente antes da virada do ano em 31 de dezembro, que marca também o fim do auxílio emergencial.

O quadro não é nada animador, porque a demarcação de território dentro do Orçamento por vias alternativas traz mais incerteza e tem consequências ainda difíceis de avaliar, enquanto a economia real sente os efeitos da pandemia.

Duas decisões importantes foram tomadas pelo Tribunal de Contas da União em julgamento nessa semana. Na prática, elas antecipam o Orçamento de 2021 ao permitir que um volume maior de gastos de 2020 “transborde” para o ano que vem.

O tamanho potencial desse vazamento de despesas é ainda uma incógnita, com governo, TCU e analistas do mercado ainda debruçados cada um à sua maneira para fazer as contas.

Mas a melhor tradução do que aconteceu é dizer que essas despesas vão “comer” o Orçamento de 2021 e deixar ainda mais confusa a sua gestão.

Na primeira decisão, o TCU decidiu que despesas ordinárias, sujeitas ao limite do teto de gastos e sem relação com o orçamento de guerra de enfrentamento à pandemia, ganham mais tempo e podem ser executadas até 31 de dezembro de 2021. Algumas delas nem sequer existem de fato ou passaram pelo primeiro estágio do processo orçamentário.

Na segunda decisão, créditos extraordinários fora do teto, abertos em 2020 para viabilizar despesas emergenciais de combate à covid-19 no período da calamidade, também poderão ser estendidos até 31 de dezembro de 2021.

É sobre esse segundo grupo de despesas que ronda no momento a atenção de todo mundo. Se novos créditos extraordinários forem apresentados ainda em 2020, é por aí que se poderá buscar mais recursos para a prorrogação do auxílio emergencial no ano que vem, com a “sobra” desses créditos. Esses gastos ficariam fora do teto. Qualquer novo crédito, porém, dependeria da assinatura de uma Medida Provisória pelo presidente Jair Bolsonaro, que até agora disse que não o fará.

Até a decisão do TCU, o governo estava prestes a editar uma portaria para controlar o empenho do estoque de créditos extraordinários já aprovados nessa reta final do ano. Agora, estuda um decreto para diminuir o vazamento das despesas em 2021.

O fato é que a decisão do TCU pode representar uma vitória de Pirro para os ministérios gastadores.

Isso porque a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) determina que os recursos financeiros de cada ministério, em cada ano, têm que ser iguais aos créditos orçamentários, para que não haja risco de descumprimento da meta de primário. Na prática, só pode desembolsar efetivamente o mesmo valor já previsto no Orçamento.

Então, se o ministério levar de 2020 para 2021 muitos restos a pagar (RAPs), como são chamadas no jargão econômico as despesas transferidas de um ano para outro, a quitação dessas despesas vai consumir grande parte dos recursos disponibilizados. Ou seja, sobra menos dinheiro para pagar as despesas correntes do ano. A escolha precisará ser feita.

O que vai acontecer?

Vai chegar o segundo semestre de 2021 e o dinheiro terá acabado. E não adianta tentar tirar de outros ministérios, porque como o orçamento de despesas está pequeno para todos, ninguém vai liberar o limite financeiro para outro ministério e deixar de pagar as suas despesas.

Logo, os ministérios que enfiarem o pé na jaca e registrarem RAPs fora da regra vão começar a atrasar os seus pagamentos, passando de ministérios gastadores para ministérios caloteiros.

Quanto mais eles exagerarem nos RAPs, mais tempo levarão para voltar a pagar em dia as suas despesas.

A outra consequência poderá ser uma situação de pressão adicional em favor da quebra do teto, já que mais ministérios poderão entoar a narrativa de que ficaram sem dinheiro por causa do limite de despesas, e não porque exageraram nas promessas de gastos.

Bem parecido com aquela jiboia que come um bezerro e fica dias tentando digerir.


Eliane Cantanhêde: Atrasado e na contramão

Virou rotina: atrasado em tudo, o governo ou é miragem ou é mais problema que solução

O governo parece estar sempre atrasado, correndo atrás do prejuízo e atrapalhado na formulação e condução das propostas. Os exemplos são muitos e o mais recente, e gritante, é o Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Nem é preciso dizer o quanto esse fundo é essencial para o Brasil e os brasileiros pobres, mas o governo chegou tarde e pela contramão, levou uma lavada histórica na Câmara e está para levar outra no Senado.

O Fundeb é apenas um caso, porque o governo Bolsonaro está atrasado na maioria das discussões e ações fundamentais para o País: reforma tributária, reforma administrativa, meio ambiente (Amazônia em particular) e, além de Fundeb e Educação como um todo, o que falar da Saúde e do combate a uma pandemia que parece não ter fim? Em todos, ou o governo federal é uma miragem ou é mais problema que solução.

O MEC nem sequer se deu ao trabalho de estudar, liderar a discussão ou mesmo apresentar uma proposta para tornar permanente o Fundeb, questão de vida ou morte para o ensino básico e a inclusão social. Não teve tempo, trocando um ministro atrás do outro e Abraham Weintraub, o mais longevo, ocupado em brincar de Gene Kelly, Cebolinha, balbúrdia, guerra contra a China e de mandar prender os “vagabundos” do Supremo.

Assim, a proposta do Executivo foi apresentada, ora vejam, pelo Ministério da Economia. E na véspera da votação na Câmara! Não bastasse, driblava o teto de gastos e tirava de um fundo da Educação para inflar a popularidade de Bolsonaro. A derrota foi acachapante, por 499 a 7 (todos bolsonaristas). Do outro lado, ficaram com o relatório da deputada Professora Dorinha (DEM-TO) todas as entidades de Educação e a opinião pública. Quando a sociedade quer, o Congresso vota.

Um ano e meio depois, o governo também só apresentou sua primeira proposta de reforma tributária nesta semana, prevendo a unificação de PIS e Cofins, uma ideia vaga, superficial, muito aquém das da Câmara e do Senado e sob tiroteio do setor de serviços. A reforma administrativa, o gato comeu. Leia-se: Bolsonaro engavetou.

E a Amazônia? Enquanto o desmatamento crescia “só” 13 meses seguidos e eram “só” França, Alemanha e Noruega gritando, o governo dava de ombros. Acordou ao ser encurralado por fundos internacionais e o grande capital nacional e, agora, tem de engolir o plano dos três maiores bancos do País, subitamente de esquerda (como ONGs e Igreja Católica) ou seriam também tubarões prontos a devorar as riquezas brasileiras (como os países desenvolvidos)?

Na pandemia, o TCU revela que, de março a 25 de junho, o Ministério da Saúde só aplicou 29% da verba emergencial. E lá se vão 83 mil mortos… O resultado é macabro, mas a explicação parece simples: sem ministro e sem médicos e especialistas em saúde pública e em SUS, a Saúde não sabe como, onde e com o que gastar os recursos que salvam vidas, famílias e o próprio sistema, além de reduzir as dores da Economia.

Os brasileiros estão espremidos entre um governo federal que não sabe aplicar os recursos contra a pandemia e governos estaduais e municipais que, aqui e ali, usam o dinheiro em proveito próprio. E o presidente faz escola. Assim como ele desdenhou dos documentos do Exército e da Abin defendendo o isolamento, o general Eduardo Pazuello ignorou o alerta do Comitê de Operações Emergenciais (COE), da Saúde, de que, sem isolamento, a crise pode durar dois anos e é pior, inclusive, para a Economia.

Fortão para trucidar a realidade da pandemia, o governo chega tarde, frágil, trôpego e atabalhoado no essencial, enquanto o Brasil caminha celeremente para contabilizar cem mil mortos. A cloroquina é uma quimera e a vacina é promissora, mas vai demorar.


Correio Braziliense: Cobiça do Congresso se impõe, Bolsonaro cede e começa a negociar cargos

Embora tenha prometido só preencher os postos do governo com perfis técnicos, Bolsonaro se vê diante da realidade de ter que atender a indicações de parlamentares para fazer avançar a agenda no Congresso. Políticos não economizam nos pedidos

Por Denise Rothenburg e Luiz Calcagno

Um líder partidário acostumado às benesses do poder foi ao Planalto dia desses para saber como seria a nova relação do presidente Jair Bolsonaro com o Parlamento. Lá, foi informado por um ministro de que todos os ocupantes de cargos de segundo e terceiro escalões indicados por políticos seriam substituídos, de forma a acabar com os feudos dos parlamentares nas repartições. O tal líder atravessou a rua e espalhou a notícia entre os comandantes dos partidos na Câmara. Foi um alvoroço e a senha para que o governo experimentasse o gosto amargo de uma derrota logo no primeiro mês, com a rejeição do decreto que ampliava o número de pessoas capazes de determinar o sigilo de documentos oficiais.

À exceção do PSL, que é novo no “pedaço”, os partidos que formavam a base do governo Michel Temer são os que agora vão ajudar os atuais ocupantes do Poder Executivo a aprovar as propostas de melhoria do ambiente econômico, leia-se a nova Previdência. E todos têm cargos nos escalões inferiores da máquina pública. A derrota do decreto mostrou a Bolsonaro que não será possível passar pela prova de fogo da reforma da Previdência sem fazer política com esses partidos. Embora tenha anunciado durante a campanha que só ocuparia a Esplanada dos Ministérios com perfis técnicos, o presidente teve que dar o braço a torcer na tentativa de acelerar a votação da proposta que definirá a força do Executivo no Congresso e a capacidade de diálogo para governar.

Bolsonaro tentará fazer um “balanceamento” entre o atendimento aos políticos e o discurso de campanha. Isso passa por uma leva de exonerações, que começou na semana passada com a demissão de 21 dos 27 diretores regionais do Ibama. Outras virão, e em áreas de muito apelo junto às bases eleitorais de deputados e senadores. Na Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf), por exemplo, padrinhos como o líder do PP na Câmara, deputado Arthur Lyra, já foram avisados das exonerações. Porém, depois da derrota, há quem aposte que a leva não será mais tão extensa quanto o governo planejava. No momento, o Planalto faz o mapeamento de cargos para avaliar quais oferecerá aos políticos em futuras indicações. Os parlamentares vão forçar a mão a fim de ver se o presidente desiste de exonerar todos os ocupantes de cargos de segundo e terceiro escalões.
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O Correio fez um levantamento de quais são as cadeiras mais cobiçadas, seja porque movimentam muitos recursos, seja por permitirem uma ação mais direta junto às prefeituras. Os ministérios do Desenvolvimento Social, da Saúde e da Educação, por exemplo, estão entre os que recebem mais dinheiro da Lei Orçamentária Anual. São considerados as joias da coroa, ao lado da Agricultura. Cargos de menor visibilidade, mas com poder de execução de políticas públicas e contratação de pessoal e serviço, como o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), e a própria Codevasf, além de superintendências, também são benquistos (veja quadro nesta página).

O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) já foi feudo do MDB no governo de Fernando Henrique Cardoso. Nos tempos de Lula, os cargos foiram cedidos ao PR, de Valdemar Costa Neto, comandante oculto da agremiação que controlou a pasta. Quem está lá não quer sair de jeito nenhum. O mesmo vale para as regionais da Saúde, onde o PP domina.

Os líderes têm evitado falar abertamente sobre esse tema. Mas o representante do Democratas na Câmara dos Deputados, o eleito pela Bahia Elmar Nascimento, vem de peito aberto comentar esse tema. Ele trabalha para desmistificar o discurso de “nova política”, e defende a eficiência de parlamentares em escalões do Executivo federal. “Não existe nova e velha política. Existe boa e má política. Se o presidente disser que tem um cargo e pergunta se tem alguém com perfil, temos alguém para indicar”, abre o jogo.

Porém, o parlamentar coloca a negociação de cargos sob a responsabilidade do presidente. “Sou, talvez, a pessoa menos apropriada para falar disso. O DEM ficou 14 anos na oposição. Se fosse por cargos, não teríamos sido oposição. Os cargos são do governo federal, que os entrega a quem quiser. O Bolsonaro se elegeu sem precisar de partidos”, afirma.

Relacionamento
Elmar ressalta que o governo tem cargos a negociar também em outros estados. E pondera que a conjuntura em que o presidente da República se elegeu o colocou em uma situação delicada no que diz respeito a fazer nomeações. “O político não quer problema, vai pensar duas vezes nas nomeações. Mas, quem é técnico, às vezes, coloca o namorado da filha. O importante é saber com quem se relacionar”, pondera o parlamentar.

“Estamos comprometidos com a agenda e queremos tirar o Brasil da crise. Isso não significa que estejamos comprometidos com o governo. Estamos acostumados a ser bem tratados, ter acesso até ao presidente, quanto mais aos ministros. Sem cumplicidade, as coisas não andam. Cargos que nos deem condições de exercer políticas pública nos interessam. Essas vagas são do presidente, mas ele não pode fechar os olhos para os partidos. O parlamentar dá o recado no voto”, conclui Elmar.

Fiscalização deficitária
Cientista político da Fundação Getúlio Vargas, Sérgio Praça faz uma avaliação crítica e lembra que, embora não se possa colocar todos os casos no mesmo patamar, o modelo de indicações políticas pode favorecer a corrupção. “Quanto mais oportunidade para a corrupção, mais interesse para o cargo. Disso, não há dúvida”, afirma. Segundo o pesquisador, a fiscalização sobre alguns postos de grande visibilidade é falha. Isso porque a estrutura sob a gestão é muito grande e intrincada. “No caso da saúde, por exemplo, é muito dinheiro e uma política muito complexa, com organizações estaduais e municipais. As oportunidades de fraude são muitas”, reflete.

Por outro lado, cargos com menos visibilidade também podem atrair, a depender do grau de poder de contratar pessoal, obras e outros serviços. “Claro que, para quem é corrupto, é melhor não ter atenção e uma boa verba. O político não precisa ser ministro para redirecionar a verba para o seu reduto eleitoral, por exemplo. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e o Dnit são do segundo escalão, mas controlam muitos recursos. Também tem os cargos das superintendências de órgãos federais. Dependendo da entidade, esses superintendentes têm liberdade para realizar contratos, e isso é poder”, explica Sérgio Praça.


Andrea Jubé: "Braço forte, mão amiga". Até quando?

Governo Bolsonaro claudica sem o apoio das Forças Armadas

Na política, quase sempre, os gestos são mais eloquentes do que as palavras. É sintomático que em seu primeiro compromisso oficial em Brasília após a eleição, o presidente eleito Jair Bolsonaro tenha se reunido reservadamente apenas com oficiais da cúpula das Forças Armadas. Um dos auxiliares civis que o acompanhavam - o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes - foi convidado depois a se somar ao grupo. O outro civil da comitiva teve de aguardar do lado de fora.

Quando aterrissou em Brasília pela primeira vez depois da consagração nas urnas, no dia 6 de novembro, Bolsonaro fez uma visita institucional ao ministro da Defesa, Joaquim Silva e Luna. Estava acompanhado dos filhos, do vice-presidente, general Hamilton Mourão, do futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, e de dois auxiliares civis: Paulo Guedes e Gustavo Bebianno, que assumirá a Secretaria-Geral da Presidência.

Ao fim da reunião fechada no gabinete do ministro, com um grupo restrito de oficiais - da qual participaram os filhos, Mourão e Heleno -, Guedes foi chamado para tratar do orçamento das três Forças e da reforma previdenciária dos militares. Bebianno aguardou do lado de fora, segundo relato de um dos presentes.

O retrato da reunião com os oficiais, sem os civis, fala por si: Bolsonaro tem deferência especial pelas Forças, instituição que considera um escudo moral de sua gestão. Somente no Palácio do Planalto, são três os generais da reserva escalados: Heleno e Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo), na linha de frente; Floriano Peixoto, "vice-ministro" da Secretaria-Geral, na retaguarda. Além do general Mourão na Vice-Presidência.

Em síntese, sem o apoio das Forças Armadas - instituição na qual os brasileiros mais confiam, segundo pesquisas recentes -, o governo Bolsonaro claudica.

A novidade é que, a depender dos desdobramentos do episódio revelado pelo jornal "O Estado de S. Paulo" na quinta-feira, sobre as movimentações financeiras do ex-assessor do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho mais velho do presidente, esse apoio pode ruir.

"Foi um balde de água fria", define um oficial da reserva, com trânsito na cúpula das Forças, sobre a divulgação do relatório do Coaf, sobre as operações financeiras do ex-motorista do filho do presidente, incluindo um depósito na conta da futura primeira-dama.

"Foi um susto", completa. Segundo este oficial, o que levou os brasileiros a manter a confiança nas Forças foi a moralidade e a transparência, valores da instituição". Diante da denúncia que desgastou o governo antes da largada, ele diz que é preciso "seguir o caminho do dinheiro", e afastar quem estiver envolvido com irregularidades.

No mesmo tom, um general da ativa, com trânsito no alto comando do Exército, alerta que o respaldo das Forças ao futuro governo não é incondicional. O lema da Força "braço forte, mão amiga" não será autoaplicável na nova gestão.

"Se Bolsonaro não tomar, no momento certo, medidas duras que promovam o saneamento de sua equipe, ele perderá o apoio da instituição e da população".

Este oficial diz que não há surpresa com a revelação do caso. "Da política brasileira tudo se pode esperar". Por isso, avisa que o Exército manterá "distância segura" do governo, lembrando que os quadros nomeados são da reserva.

O relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) revelado na semana passada mostrou que o ex-motorista do filho mais velho de Bolsonaro movimentou R$ 1,2 milhão em sua conta durante um ano, valor incompatível com seu patrimônio. Um cheque de R$ 24 mil foi parar na conta da futura primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

Ao site "O Antagonista", Bolsonaro explicou que, na verdade, trata-se de um empréstimo de R$ 40 mil ao ex-assessor do filho. O esclarecimento sobre o depósito na conta de sua mulher soa incoerente. Ele alega que o dinheiro foi depositado na conta de Michelle "porque eu não tenho tempo de sair".

No entanto, há exatamente um mês, mesmo em convalescença, Bolsonaro saiu de sua casa, na Barra da Tijuca, para ir pessoalmente ao caixa eletrônico sacar dinheiro para promover um churrasco para seus seguranças.

É de conhecimento público que a família Bolsonaro gosta de oferecer churrascos aos amigos: o ex-assessor responsável pela movimentação dos recursos milionários, Fabrício José Carlos de Queiroz, participou de alguns deles, como revelam fotos do ex-assessor com os Bolsonaro que circulam nas redes sociais.

Recuos
Um governador eleito em outubro tenta a todo custo convencer uma determinada empresa europeia, do segmento de alta tecnologia, a investir em seu Estado. As conversas estavam avançadas, relata o futuro mandatário, até a eleição de Jair Bolsonaro.

Quando os representantes da multinacional high tech se depararam com os diversos ministros de formação militar no primeiro escalão, deram um passo atrás. A constatação foi de que os quadros militares vão "fechar a economia" brasileira.

O segundo recuo se deu com o anúncio da extinção do Ministério do Trabalho. O governador ouviu dos executivos que a empresa tem uma "reputação internacional" a zelar, e por isso não investirá em um país que "não respeita direitos trabalhistas".

Há exagero sobre o "fechamento" da economia: o general Hamilton Mourão declarou recentemente ao Valor que a visão econômica dos militares evoluiu e está em sintonia fina com os preceitos liberais.

Em contrapartida, Bolsonaro não conforta os potenciais investidores com "reputação internacional" com declarações como as da semana passada. Ele disse que os empregadores devem pressionar por mudanças nas leis trabalhistas. "O trabalhador vai ter que decidir, um pouquinho menos de direitos e emprego ou todos os direitos e desemprego".


Luiz Carlos Azedo: O fim anunciado

“O fim do Ministério do Trabalho não enfrentará grande oposição. Os sindicatos se opõem à mudança, mas estão derrotados por antecipação”

O futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, anunciou ontem que o Ministério do Trabalho será realmente extinto e suas atribuições distribuídas entre três pastas: Justiça, Cidadania e Economia. Com a vitória de Jair Bolsonaro, o fim do ministério era favas contadas. Apesar de o novo governo que está sendo montado ter algumas características que lembram a chegada do positivismo castilhista ao poder central, entre as quais a forte presença de militares na equipe de governo e a relação corporativista com a política, o fim do ministério é um sinal de que a Era Vargas está se esgotando. O governo deverá ter 22 pastas no primeiro escalão, das quais o futuro presidente já anunciou 20 ministros. Faltam ainda os titulares do Meio Ambiente e dos Direitos Humanos.

Lorenzoni detalhou o esquartejamento de forma superficial: “O atual Ministério do Trabalho, como é conhecido, ficará uma parte no ministério do doutor Moro, outra parte com Osmar Terra e outra parte com Paulo Guedes”, disse, ao anunciar o “humanograma”. O Ministério da Justiça, que será comandado por Sérgio Moro, cuidará da concessão de cartas sindicais. A fiscalização do trabalho escravo também deve ficar com o ex-juiz federal. As políticas ligadas ao emprego ficarão uma parte no Ministério da Economia, cujo titular será Paulo Guedes, e outra parte na pasta da Cidadania, com o ministro Osmar Terra.

O Ministério do Trabalho surgiu ligado à Indústria e ao Comércio, em 26 de novembro de 1930, como uma das primeiras iniciativas do governo revolucionário implantado no Brasil sob a chefia de Getúlio Vargas. Chamado de “Ministério da Revolução” pelo ministro Lindolfo Collor, o primeiro titular da pasta, surgiu para regular o conflito entre capital e trabalho. Até então, no Brasil, as questões relativas ao mundo do trabalho eram tratadas como “caso de polícia” ou no âmbito do Ministério da Agricultura.

Joaquim Pimenta e Evaristo de Morais Filho, que advogavam para os sindicatos, e o empresário paulista Jorge Street, em cujas fábricas os trabalhadores eram respeitados, elaboraram os fundamentos da legislação trabalhista. Lindolfo Collor, porém, concebeu os sindicatos como um instrumento para mediar o conflito entre empregados e patrões e, por essa razão, ficaram subordinados ao novo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, ou seja, controlados pelo Estado. Também tratou de organizar os sindicatos patronais, o que deu à estrutura sindical uma base corporativista claramente inspirada na Carta del Lavoro da Itália, de natureza fascista.

Também houve atrelamento das Caixas de Aposentadoria e Pensões de marítimos, portuários, ferroviários e outras categorias profissionais. A criação de Comissões de Conciliação entre empregadores e empregados daria origem à atual Justiça do Trabalho. Foram regulamentados a jornada de trabalho na indústria e no comércio e o trabalho das mulheres e dos menores de idade. Em 1933, foi criada a carteira profissional; em 1938, já no Estado Novo, foi estabelecido o salário mínimo. Nessa época, o então ministro Alexandre Marcondes Filho iniciou a cobrança do imposto sindical e sistematizou toda a legislação social até então produzida, na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com ajuda de Arnaldo Sussekind e João Segadas Viana. Com a redemocratização do país, em 1945, Marcondes Filho foi um dos organizadores do PTB, partido cuja existência sempre esteve fortemente vinculada ao Ministério do Trabalho.

Desestruturação
O fim da Era Vargas chegou a ser anunciado algumas vezes, mas nunca aconteceu. O regime militar implantado após o golpe de 1964 simplesmente reproduziu o modelo do Estado Novo, com intervenções nos sindicatos, reforçado atrelamento da estrutura sindical e unificação da Previdência. O presidente Fernando Henrique Cardoso até tentou modernizar as relações entre trabalho e capital, mas não teve força para enfrentar a oposição dos sindicatos, que acabaram controlados pelo PT. Durante os governos Lula e Dilma Rousseff, os sindicatos brasileiros chegaram ao auge do seu prestígio e poder, mas nenhum dos dois quis desatrelar a estrutura sindical do Estado, nem acabar com o imposto sindical, antigas bandeiras da fundação do PT.

Foi a reforma trabalhista do presidente Michel Temer, aprovada pelo Congresso, que pôs fim ao imposto sindical. Essa mudança enfraqueceu tremendamente os sindicatos, que estão passando por uma crise financeira sem precedentes, com a demissão em massa de funcionários e a venda de imóveis para pagar dívidas trabalhistas. O enfraquecimento decorre também da reestruturação acelerada do mundo do trabalho, com impacto em categorias poderosas, como metalúrgicos e bancários, por exemplo. Por essa razão, o fim do Ministério do Trabalho não enfrentará grande oposição. Os sindicatos se opõem à mudança, mas estão derrotados por antecipação.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-fim-anunciado/


Valor Econômico: Governo Bolsonaro terá 22 ministérios, 7 além do prometido

O futuro ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni detalhou ontem a estrutura do governo Jair Bolsonaro, que toma posse em 1º de janeiro, com 22 ministérios - sete a menos do que os atuais 29 e sete a mais do que os 15 prometidos durante sua campanha à Presidência da República

Por Fabio Murakawa e Marcelo Ribeiro, do Valor Econômico

Faltam apenas duas pastas para terem os titulares definidos: a de Meio Ambiente e a de Direitos Humanos. O novo organograma da Esplanada cria um superministério, o da Economia, comandado por Paulo Guedes, fortalece a pasta da Justiça e estabelece um sólido núcleo de origem militar, com seis integrantes até o momento.

Onyx disse ainda acreditar que o governo Bolsonaro começará com uma base parlamentar de cerca de 350 de um total de 513 deputados na Câmara e com "pouco mais de 40" senadores, ante 81 membros daquela Casa.

Saem da esplanada as pastas do Desenvolvimento Social e Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior, (Mdic), além de Cultura, Esporte, Integração Nacional, Planejamento, Segurança Pública e Trabalho.

Segundo Onyx, dos 22 ministérios que restaram, "20 serão funcionais e dois, eventuais" - o Banco Central e a Advocacia-Geral da União (AGU). O BC terá status de ministério até que seja aprovada uma lei sobre a autonomia da instituição.

"AGU e BC terão ministros transitórios. No caso do BC, terá status de ministério até que a lei lhe confira autonomia, assim como o titular da AGU também terá o status até que uma mudança constitucional seja feita", explicou.

Essa mudança será para estabelecer que todos os processos judiciais envolvendo a União tramitem no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF). Quando isso ocorrer, no entender do futuro governo, será desnecessário o status de ministério para a AGU.

Vice-presidente eleito, o general Hamilton Mourão não ficará a cargo da coordenação dos ministérios, como chegou a ser cogitado. Isso poderia esvaziar a Casa Civil de Onyx, que tem essa atribuição.

"No Brasil, o vice-presidente da República tem uma missão constitucional. O Gerenal Mourão vai ajudar e muito em muitas áreas, principalmente de formulação do governo", afirmou Onyx. "Ele tem que ter liberdade e autonomia para contribuir na formulação de políticas públicas."

Para Onyx, "o general Mourão tem que estar plenamente disponível para substituir o presidente". Isso deve ocorrer em janeiro, quando está prevista uma cirurgia para a retirada da bolsa de colostomia que Bolsonaro carrega desde setembro, quando foi esfaqueado em Juiz de Fora (MG).

Onyx explicou que o Ministério do Trabalho deixará de existir e que as estruturas da pasta serão divididas entre os Ministérios da Justiça e da Segurança Pública, da Economia e da Cidadania (ver nesta página).

Ele revelou ainda que a Fundação Nacional do Índio (Funai) pode deixar a pasta da Justiça e passar para o Ministério da Agricultura. O futuro ministro ponderou, no entanto, que a decisão não está tomada.

"O Brasil há muitos anos cuida de seus índios através de ONGs, que nem sempre fazem esse trabalho de forma adequada", disse Onyx. "Temos conversado com as comunidades indígenas e o que elas querem é liberdade, mantendo suas tradições."

A respeito da resolução de conflitos envolvendo indígenas no país, Onyx disse que é preciso "identificar o que é conflito fabricado".

Onyx, que ficará encarregado da relação com o Congresso, começa a receber nesta semana representantes dos partidos políticos no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), onde funciona o governo de transição. Até o momento, a equipe de Bolsonaro vinha conversando de maneira mais formal com as bancadas temáticas.

O futuro ministro descartou, porém, um retorno à prática do "toma lá dá cá", com a concessão de cargos em troca de apoio político. Ao dimensionar a base do governo no Congresso, disse que o cálculo é feito com base nas "bancadas partidárias". Afirmou ainda que o novo governo será mais maleável e que parlamentares não serão punidos automaticamente caso votem diferente da orientação da base aliada do governo - uma prática na gestão Michel Temer.

"Parlamentar será considerado da base se, ao longo do conjunto, tiver posição a favor do governo", disse. "Teremos a capacidade de compreender quando ele não puder votar a favor de uma matéria. O governo vai compreender aquilo que permeia a vida de um parlamentar, seu foro íntimo e seu compromisso com um setor especifico. Não haverá exclusão por isso."

Onyx negou haver estremecimento entre o eleito e a bancada evangélica. Esse grupo tem dado sinais de insatisfação por não ter visto atendidas indicações como no caso do Ministério da Cidadania. Na semana passada, Bolsonaro confirmou Osmar Terra para o cargo, ignorando os nomes - Marco Feliciano, Gilberto Nascimento e Ronaldo Nogueira - apresentados pela bancada. "Quando o elo é feito em cima de princípios e valores cristãos, ele é indissolúvel. Esse elo não se desfará", afirmou.

Questionado sobre a insatisfação do senador Magno Malta (PR-ES) por não ter sido indicado a uma vaga no primeiro escalão, Onyx disse que, "na eleição, Bolsonaro nunca prometeu ministério para ninguém". "O Magno Malta tem o carinho e respeito de todos nós e vai ser parceiro de todos com um espaço relevante." Mas ele descartou alocá-lo no time de ex-parlamentares responsáveis pela relação entre Planalto e Congresso.

"Teremos um time de ex-deputados e ex-senadores para fazer o trabalho de duas secretarias, que cuidarão da relação com Câmara e com Senado. Não haverá tomá-lá-dá-cá na relação com o Congresso. Parlamentares serão atendidos através de suas bancadas, frentes parlamentares e de seus estados. Não haverá titular de mandato em nenhum espaço de articulação".

Onyx disse que estão estudando o estabelecimento de conselhos setoriais, embora reconheça que "há conselhos demais no Brasil". "Há uma certa perda de esforço, muita conversa e pouco esforço".

Indagado sobre o número de ministérios, Onyx justificou dizendo que algumas fusões não foram possíveis, como a da Agricultura com Meio Ambiente. Segundo ele, Bolsonaro entendeu que seria estratégico manter uma pasta para cuidar do Turismo e se deixou convencer sobre a importância de ter um Ministério dos Direitos Humanos e Mulheres. "O Ministério dos Direitos Humanos será importante não para os direitos dos manos, para proteger os bandidos, mas para as pessoas do bem".


El País: Olavo de Carvalho, o Brasil só fala dele

Ignorado nas universidades do país e tido como figura folclórica da direita nas redes sociais, filósofo sai da obscuridade ao indicar dois ministros do novo Governo

O homem por trás da indicação de dois dos mais importantes ministros do governo Jair Bolsonaro não é militar nem político. Não lidera qualquer bancada de deputados na Câmara nem é porta-voz de uma frente parlamentar temática que apoie o capitão reformado do Exército, como a Evangélica ou a Agropecuária. Aos 71 anos, Olavo de Carvalho vive desde 2005 nos Estados Unidos, de onde ministra cursos de Filosofia que são transmitidas por vídeos na Internet. Até pouco tempo atrás era tratado como uma espécie de caricatura da extrema direita e do neoconservadorismo no Brasil, mas algo definitivamente mudou com a eleição de Bolsonaro para a presidência da República. Não só descobriu-se que Carvalho é o guru intelectual de alguns dos mais próximos assessores do presidente eleito, como ele mesmo foi o padrinho direto das nomeações de Ernesto Araújo para comandar o Ministério de Relações Exteriores e de Ricardo Vélez Rodríguez para o Ministério da Educação (MEC).

A chamada nova direita que chegou ao poder pelas mãos de Bolsonaro, que mistura a defesa do liberalismo econômico com o conservadorismo moral, tem no filósofo brasileiro Olavo de Carvalho uma clara referência intelectual. Tanto Flávio Bolsonaro, senador eleito pelo Rio de Janeiro e filho do futuro presidente do Brasil, quanto seu irmão Eduardo já foram a Richmond, na Virgínia, e participaram de transmissões no YouTube ao lado dele. A lista de seguidores não para por aí: também estão entre os discípulos de Carvalho personagens como o blogueiro de direita Felipe Moura Brasil e a deputada federal eleita por São Paulo Joyce Hasselmann, do mesmo partido do presidente eleito.

"Muito embora não seja um acadêmico, o Olavo de Carvalho é um intelectual de influência considerável na opinião pública brasileira. E já exerce uma atividade intelectual há várias décadas, primeiro como articulista em grandes jornais e depois nas redes sociais, onde ele difunde o seu pensamento e encontra os seus aderentes", explica Alvaro Bianchi, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Apesar de ressalvar que "há pouca verdade" na narrativa filosófica apresentada por Carvalho, Bianchi explica que ela se mostra persuasiva e eficaz por abordar "os medos e as inseguranças do homem comum perante as transformações do mundo contemporâneo."

Além de filósofo, Olavo de Carvalho é escritor —são 18 livros, segundo seu perfil no Twitter—, conferencista e jornalista. Ele se apresenta como um intelectual (venerado por seu apoiadores como a mente que se rebelou contra um suposto monopólio do pensamento de esquerda na imprensa e na academia brasileira), mas construiu sua carreira sempre de costas para os círculos universitários (não tem, por exemplo, um título acadêmico formal e boa parte do seu trabalho concentra-se justamente em desqualificar a academia).

O desprezo parece ser recíproco nas faculdades brasileiras, onde a obra de Carvalho é praticamente ignorada ou tratada como algo sem valor científico. "Na minha geração e entre os meus colegas ninguém leu Olavo de Carvalho. [Ele] é absolutamente irrelevante do ponto de vista filosófico", afirma José Arthur Giannoti, professor emérito da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP) e membro fundador do Centro Brasileiro de Análise e Plenajemento (Cebrap). "Não tenho nenhum interesse em ler o Olavo de Carvalho, a não ser [para] explicar como é que a nova direita o tenha como um ídolo e que tanta gente no Brasil seja influenciado por ele", acrescenta.

Olavo de Carvalho na Virgínia (EUA), em cena de 'O jardim das aflições'.
Olavo de Carvalho na Virgínia (EUA), em cena de 'O jardim das aflições'. REPRODUÇÃO

A imagem de outsider entre a intelectualidade brasileira só é reforçada pelo seu passado pouco ortodoxo. Na década de 80 deu cursos de astrologia e, por aqueles tempos, chegou a fazer parte de uma confraria mística muçulmana (tariqa). Hoje denuncia em vídeos o que considera o perigo da islamização do Ocidente e o abandono de valores judaico-cristãos.

O sucesso que Olavo de Carvalho atingiu na nova direita brasileira, ao ponto de converter-se num fenômeno editorial e alcançar o status de um verdadeiro guru, se deve principalmente à sua militância online ao longo dos últimos anos. Ele mantém um perfil no Facebook que conta com mais de 543.000 seguidores. Para além disso, disponibiliza em sua web oficial um seminário de filosofia —"o único que pode ajudar você a praticar a filosofia em vez de apenas repetir o que outras pessoas, ilustres o quanto se queira, disseram a respeito dela"— com videoaulas e cuja mensalidade custa 60 reais.

Os temas dos vídeos publicados por Carvalho na Internet são vários. Já definiu o ex-presidente Lula como "líder supremo do comunismo latino-americano"; considera o Foro de São Paulo, fórum criado nos anos 90 que reúne partidos de esquerda da América Latina, "a maior organização política que já existiu no continente"; classificou o fascismo de "variante do movimento socialistas" e afirmou que "ideologia de gênero, abortismo e gayzismo" são parte de uma "revolução cultural" coordenada por esquerdistas.

Nas publicações, não raro as suas análises se misturam com teorias conspiratórias de procedência duvidosa —ou em alguns casos comprovadamente falsas. Em um texto de novembro de 2008 intitulado Milagres da fé obâmica, por exemplo, Olavo de Carvalho descreve Barack Obama, então o presidenciável democrata prestes a arrematar a Casa Branca, como um político "apoiado entusiasticamente pela Al-Qaeda, pelo Hamas, pela Organização de Libertação Palestina, pelo presidente iraniano [Mahmoud] Ahmadinejad, por Muammar Khadafi, por Fidel Castro, por Hugo Chávez e por todas as forças anti-americanas, pró-comunistas e pró-terroristas do mundo, sem nenhuma exceção visível."

Num episódio mais recente, já na última campanha presidencial brasileira, Carvalho publicou em suas redes sociais uma mensagem na qual afirmava que Fernando Haddad, candidato do PT que acabou derrotado, fez em um livro apologia à prática do incesto. O conteúdo da postagem, posteriormente apagada por Carvalho, foi considerado mentiroso por sites de checagem de informações no Brasil.

Para Esther Solano, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e organizadora do livro Ódio como política (editora Boitempo), assim como ocorreu no caso de Bolsonaro, a força de Olavo de Carvalho no movimento neoconservador brasileiro só pode ser entendido a partir do fenômeno das redes sociais. "[Ele] é a típica pessoa que soube se capitalizar com base nesse novo formato de se comunicar: fácil, rápido, polêmico e combativo", afirma. "Ele sabe se comunicar com base em frases polêmicas, conteúdos curtos, mensagens fáceis e ataques. É a forma comunicativa do best seller, daquele palestrante que tem um conteúdo muito simples e mastigado. Uma coisa fácil, polêmica e que faz sucesso."

Guerra cultural

Se em seus textos e vídeos Olavo de Carvalho mostra-se como alguém que transita com naturalidade entre diversos temas filosóficos e da atualidade, um assunto parece merecer sua atenção especial. Trata-se da ideia de "marxismo cultural", teoria conspiratória difundida em diversos círculos de extrema direita ao redor do mundo. Basicamente, ela se apropria de textos do filósofo marxista italiano Antonio Gramsci para atacar uma suposta infiltração do pensamento comunista em diversas instituições culturais —de escolas e universidades à própria imprensa— com o fim de destruir valores civilizatórios.

Carvalho trata de adaptar essa teoria ao contexto brasileiro. Há gravações na Internet nas quais ele diz que essa ação coordenada de avanço da esquerda sobre as instituições brasileiras ocorreu a partir do golpe militar de 1964. "Na estratégia do [Antonio] Gramsci [filósofo marxista italiano] a maior parte da militância envolvida não saía pregando ideias comunistas. Ao contrário, [ela] atacava pontos específicos que representavam pilares da civilização, como a própria ideia de família, moral sexual e as bases do direito penal e civil", diz Carvalho em um dos seus vídeos. "Gradativamente eles [comunistas] foram ocupando todos os espaços. Para se fazer uma ideia de como levaram isso a sério, no tempo do governo militar a esquerda já dominava a imprensa brasileira inteira. Você não tinha um jornal cujo diretor de redação não fosse comunista", conclui. A teoria propagada por Carvalho pode ter pouco ou nenhum amparo entre historiadores e especialistas, mas encontra solo fértil no neoconservadorismo brasileiro.

De acordo com Bianchi, da Unicamp, Carvalho "reciclou" para o contexto brasileiro "de modo bastante eficaz" um assunto que começou a ser discutido nos Estados Unidos na década de 70. "A ideia de um marxismo cultural que estaria ameaçando os valores e as tradições intelectuais das nossas sociedades é um tema recorrente no debate político norte-americano já há bastante tempo", diz o professor. Para Bianchi, que estuda justamente a obra de Gramsci, não há dúvidas de que as teses apresentadas por Carvalho nessa área são teorias conspiratórias. "Ele [Olavo de Carvalho] atribui um peso ao marxismo nas universidades brasileiras que simplesmente não existe", pontua.

A ascensão de Bolsonaro tirou Olavo de Carvalho das sombras e o colocou como uma das figuras centrais para compreender o que pensam tanto o capitão reformado do Exército quanto algumas pessoas do seu círculo de confiança. Carvalho tem sido alvo de elogios do secretário de relações internacionais do partido do presidente eleito (PSL), Filipe Martins. "O imaginário do jornalista brasileiro médio não é capaz de abarcar um homem de pensamento, dedicado à vida interior e à construção de uma vida bem examinada, como Olavo de Carvalho", publicou Martins recentemente no Twitter.

Para além disso, Carvalho já provou todo o alcance da sua influência sobre Bolsonaro. Na formação do novo governo, o filósofo conseguiu emplacar dois nomes na Esplanada dos Ministérios, justamente os de perfil mais ideológico. Ernesto Araújo, por exemplo, é um diplomata que, à frente das Relações Exteriores, promete combater o "alarmismo climático" e as "pautas abortistas e anticristãs em foros multilaterais", segundo um artigo que ele publicou na semana passada no jornal Gazeta do Povo. Os dias em que Carvalho era retratado apenas como um excêntrico agitador de direita nas redes sociais, sem maiores consequências, ficaram para atrás.


Vinicius Torres Freire: Bolsonaro no apocalipse estatal

Presidente delegou a gente que mal conhece a liberdade de fazer uma revolução

A esquerda dizia que o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) era "neoliberal". A esquerda, petistas inclusive, dizia até que o primeiro governo de Lula da Silva (2003-2006) se rendera ao "neoliberalismo". Que nome vai dar ao projeto de governo da economia de Jair Bolsonaro?

Sim, projeto, pois sabe-se lá o que vai Paulo Guedes "entregar", como diz o anglicismo horrível dos mercadistas.

Guedes levou para o governo seus companheiros de escola, mercado, conselhos empresariais e dos institutos Liberal e Millenium, as bestas do apocalipse, aliadas do Satanás da conspiração liberal globalizada, segundo a demonologia de esquerda.

Desde que há um Estado com derramamentos importantes pela economia (isto é, depois de Getúlio Vargas), não houve no governo do Brasil equipe liberal como esta de Guedes. Relaxando as dificuldades de comparação, mesmo quando o Estado era uma merreca, sob o governo dos fazendeiros de Império e República Velha, jamais houve essa unanimidade liberal radical.

Sim, ainda é projeto, é ambição, restritos desde o início porque a Casa Militar e o velho espírito de Bolsonaro acham que o "Petróleo é Nosso" e que bancos públicos têm funções sociais e estratégicas. Sabe-se lá o que Jair Bolsonaro vai pensar desse projeto, se e quanto dele for implementado, se e quando compreendê-lo, se ou quando houver revolta antiliberal (de servidores a industriais, passando por políticos e o povo das aposentadorias).

Assim como a esquerda não tem nome para a coisa, Bolsonaro não sabe e, aparentemente, não quer saber do sentido e do tamanho da coisa. Gosta mesmo é de cruzadas, para as quais nomeou essas pessoas que vão comandar Itamaraty e Educação, as quais também mal conhece, no entanto.

O presidente eleito converteu-se a alguma ideia vaga liberal em algum momento do governo Dilma Rousseff, uma história que ainda se está a apurar. Conheceu Guedes de fato apenas no ano passado.

Jamais teve ligação com grupos organizados da elite econômica, menos ainda de grupos de estudo ou de pensamento da elite econômica, liberais ou outros. A julgar pela sua incompreensão quase total do que seja um Banco Central, do que se passa com a dívida pública ou o que são estatísticas econômicas, deve ter remota ideia das consequências do que propõe Guedes, se alguma.

No entanto, não parece dar a mínima para isso, como ficou evidente desde que encaminhou todas as questões de programa a Paulo Guedes durante a campanha. Apenas calou seu economista-chefe quando a conversa econômica baixava às redes sociais como polêmica (o caso da CPMF, por exemplo). Como vai ser se houver mais furor nas redes insociáveis?

Também relevante, Bolsonaro não se importa ou faz questão de ser um estranho no ninho da imensa equipe econômica. O presidente eleito arrendou a economia a Guedes e o insulou do restante do governo ou, melhor dizendo, do seu núcleo palaciano, sob controle maior dos generais, seus amigos de escola, irmãos mais velhos, conselheiros maiores.

É neles, nos oficiais-generais, que Bolsonaro confia a fundo, com eles compartilha mentalidade e camaradagem, faz mais de 40 anos. São eles que vão coordenar seu governo, formal ou informalmente. No limite, Guedes e seus colegas de mercado são fusíveis que podem queimar. Os militares são a estação de força.


Luiz Carlos Azedo: O governo enxuto

“Bolsonaro falava em 10 ministérios. Agora, já são 15, incluídas duas polêmicas incorporações: Indústria e Comércio Exterior na Economia e Meio Ambiente na Agricultura”

A montagem de um governo mais enxuto, que caiba na Esplanada dos Ministérios, pode provocar uma crise no mercado imobiliário de Brasília, com o esvaziamento de dezenas de prédios e outros imóveis alugados pelo governo federal; afora isso, a ideia está sendo bem recebida pela opinião pública. É uma promessa que quase todos os candidatos fizeram, porém, muito difícil de cumprir.

Bolsonaro falava em 10 ministérios. Agora, já são 15, incluídas duas polêmicas fusões: a absorção da Indústria e Comércio Exterior pelo superministério da Economia, cujo titular será Paulo Guedes, um dos homens fortes do novo governo; e a incorporação do Ministério do Meio Ambiente pelo Ministério da Agricultura

No primeiro caso, a forte reação do lobby das indústrias provocou um recuo de Bolsonaro no segundo turno, mas acabou prevalecendo a intenção inicial. Ao anunciar a decisão, Paulo Guedes rebateu as críticas com o argumento de que a decisão fará bem à indústria, apesar dos industriais. A frase foi vista como uma demonstração de truculência e inabilidade política do novo ministro, mas precisa ser apreciada com mais objetividade e menos partidarismo.

A existência de um superministério da Economia é estigmatizada em razão do fracasso do Plano Collor, lançado pelo então presidente Fernando Collor de Mello, que havia confiado a pasta à economista Zélia Cardoso de Mello. O confisco das cadernetas de poupança, peça fundamental no plano para acabar com a hiperinflação, iniciativa voluntarista, virou um tiro n’água, porque frustrou fortemente a classe média que havia apoiado Collor, e o plano de combate à hiperinflação deu errado.

Entretanto, o trabalho feito pelo então Departamento de Indústria e Comércio, que havia substituído o antigo ministério, deixou o grande legado do governo Collor: abertura da economia brasileira à globalização. Na época, o então diretor de Planejamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luiz Paulo Velozzo Lucas, mais tarde eleito prefeito de Vitória pelo PSDB, foi convidado para o cargo. Entre os anos 1990 e 1992, sua equipe coordenou diversas ações para abrir e reestruturar a economia brasileira, entre as quais as negociações do Mercosul e da Rodada Uruguai do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), da Organização Mundial de Comércio.

Meio Ambiente e Justiça
Outra polêmica tem sinal trocado. A incorporação do Ministério do Meio Ambiente ao Ministério da Agricultura, que está gerando protestos de todos os ex-ministros da pasta e até mesmo de líderes do agronegócio, como o atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi. Há um viés ideológico e regressista na decisão de Bolsonaro, que desconsidera questões de ordem técnica.

Pesa a visão dos militares sobre as reservas indígenas na Amazônia e a presença de ONGs internacionais que atuam na região, financiadas por governos estrangeiros e grandes empresas multinacionais. Essa questão, porém, já foi tratada no âmbito legislativo e tem vasta jurisprudência no Supremo Tribunal Federal, inclusive quanto à liberdade de ação das Forças Armadas para defender o território. Há também o lobby dos parlamentares ligados a setores que estão mais preocupados em lutar contra os órgãos de fiscalização que combatem o desmatamento, a grilagem de terras, a violência no campo e o trabalho escravo.

O problema, porém, é muito mais amplo. Não se trata apenas da Amazônia. Há a ocupação desenfreada do Cerrado pela pecuária e a soja, que vem provocando a desertificação de algumas regiões, inclusive no Planalto Central. Mais do que a preservação da Mata Atlântica, cuja ocupação e manejo está sob relativo controle, a poluição do ar e dos rios nas cidades brasileiras, além da destinação dos resíduos sólidos, são assuntos completamente fora do âmbito do Ministério da Agricultura.

Outra proposta é o fortalecimento do Ministério da Justiça, que incorporaria as atribuições do recém-criado Ministério da Segurança Pública, pasta para a qual deve ser convidado o juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Criminal de Curitiba. A pasta será responsável por duas agendas fundamentais para a eleição de Bolsonaro: o combate ao crime organizado e à corrupção no governo federal.

O Ministério da Segurança Pública, sob comando de Raul Jungmann, iniciativa do governo Temer, possibilitou a criação de um sistema nacional de segurança pública e mudou a postura do governo federal em relação ao problema, que sempre ficou a cargo dos governos estaduais. Se o Ministério da Justiça mantiver o sistema unificado de segurança pública, pode ser que esse avanço seja preservado.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-governo-enxuto/