Milton Ribeiro

‘Nós não queremos o inclusivismo’, diz ministro da Educação de Bolsonaro

Milton Ribeiro voltou a defender que algumas crianças com deficiência fiquem em 'classes especiais' no ensino público

Gabriel Shinohara / O Globo

BRASÍLIA — O ministro da Educação, Milton Ribeiro, voltou a defender que algumas crianças com deficiência não estudem na mesma sala de outros alunos. Segundo ele, o governo não quer “inclusivismo” e argumentou que certos graus e tipos de deficiência necessitam de classes especiais.

— Nós não queremos o inclusivismo, criticam essa minha terminologia, mas é essa mesmo que eu continuo a usar — disse em entrevista para a rádio Jovem Pan nesta segunda-feira.

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Segundo o ministro, 12% das crianças com deficiência nas escolas públicas têm um grau que “impede dela ter o convívio” dentro da sala de aula. Ele então comparou essas crianças com atletas paralímpicos.

— Isso é interessante, porque esse diagnóstico de limitações que as pessoas possuem é um diagnóstico feito pela sociedade. Estamos no meio das paralimpíadas, nós descobrimos que tem pessoas que têm limitações físicas, no caso, que não podem competir com outras que não tem. Nesse paralelismo, embora com grandezas diferentes, foi que eu me referia a esses 11,9%, 12% — explicou.

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De acordo com o ministro, entre essa porcentagem de estudantes que não teriam condições de acompanhar estão cegos, surdos e alguns graus de autismo.

— Dentro desses 12% temos algumas crianças que têm problemas de visão, elas não podem estar na mesma classe. Imagina uma professora de geografia: “aqui é o rio Amazonas” para uma criança que tem deficiência visual, são elas também. Tem outras que são surdas, por exemplo, tem uma gama de crianças, tem alguns graus de autismo e tem um grupo que a gente esquece que são os superdotados, que também estão nesse grupo, que precisam de uma atenção especial  — disse.

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O ministro ressaltou que a escola pública não pode recusar uma criança com deficiência e disse que a escolha continua sendo dos pais.

— A escolha quem faz é o pai e mãe, é ele quem coloca o filho lá, nenhum diretor tem autoridade de negar a matricula de uma pessoa que tem deficiência em uma escola pública,  elas não podem fazer isso, não é isso que estou falando.  Ele vai caminhar e vai poder entender, um pai que tenha condição de perceber que seu filho tem limitações e que aquilo não vai ajudá-lo de maneira alguma, então ele vai preferir colocar nessas classes especiais — apontou.

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As falas ocorrem após o Ministério da Educação (MEC) ter divulgado uma nota, na quinta-feira (19), para reafirmar o pedido de desculpas do ministro por declarar, em entrevista no dia 9 de agosto ao programa Sem Censura, da TV Brasil, que alunos com deficiência "atrapalham" em sala de aula.

Na terça-feira (17), Ribeiro havia tentado explicá-la durante uma palestra no Rio, mas repetiu que algumas crianças com deficiência "criam dificuldades" em sala de aula. As declarações foram criticadas por entidades de direitos de pessoas com deficiência.

Nesta segunda-feira, Ribeiro voltou a admitir que cometeu um erro quando falou que as crianças com deficiência “atrapalhavam” o aprendizado de outros estudantes, mas disse que um prejudica o desenvolvimento do outro.

— Não deixando de lado os deficientes, mas olhando também os outros 88% dos alunos que eventualmente podem ter também… Eu, quando usei a palavra atrapalhar eu fui infeliz, eu disse isso, mas usando com todo cuidado, vou fazer novamente, se usei a palavra atrapalhar, um atrapalha o outro. Nesse sentido de caminhar na educação. A palavra atrapalhar não é a melhor, a gente se equivoca, mas um prejudica o progresso do outro.

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E completou:

— A criança com deficiência tem que ter um olhar e um cuidado especial e é isso que o nosso governo quer ter, nosso governo quer ter um cuidado especial para com a criança com deficiência — finalizou o ministro.

Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/brasil/nos-nao-queremos-inclusivismo-diz-ministro-da-educacao-sobre-criancas-com-deficiencia-nas-escolas-25167927


Ribeiro, do MEC, diz que alunos com deficiência 'atrapalham' demais estudantes

Milton Ribeiro afirmou que crianças com deficiências "atrapalhavam" alunos sem a mesma condição

Nathalia Galvani / Correio Braziliense

Uma nova declaração polêmica do ministro da Educação Milton Ribeiro está repercutindo nas redes sociais. Em entrevista ao programa 'Sem Censura', da TV Brasil, na última segunda-feira (9/8), o político disse que crianças com deficiências "atrapalhavam" os demais alunos sem a mesma condição quando colocadas na mesma sala de aula.

“O que é inclusivismo? A criança com deficiência é colocada dentro de uma sala de alunos sem deficiência. Ela não aprendia, ela ‘atrapalhava’ — entre aspas, essa palavra eu falo com muito cuidado – ela atrapalhava o aprendizado dos outros, porque a professora não tinha equipe, não tinha conhecimento para dar a ela, atenção especial”, declarou o ministro.

Outras declarações feitas por Milton Ribeiro na mesma entrevista também causaram irritação em parte da população. Entre elas, o ministro disse que a "universidade deveria, na verdade, ser para poucos, nesse sentido de ser útil à sociedade".

"Tenho muito engenheiro ou advogado dirigindo Uber porque não consegue colocação devida. Se fosse um técnico de informática, conseguiria emprego, porque tem uma demanda muito grande", completou.

Além disso, ele também afirmou que reitores das universidades federais não podem ser 'esquerdistas, nem lulistas'. “Alguns optaram por visões de mundo socialistas. Não precisa ser bolsonarista. Mas não pode ser esquerdidas, nem lulista. Reitor tem que cuidar da educação e ponto final. E respeitar todos que pensam diferente. As universidades federais não podem se tornar comitê político, nem direita, muito menos de esquerda”, disse.

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/euestudante/2021/08/4944022-ministro-da-educacao-alunos-com-deficiencia-atrapalham.html


Cristina Serra: O MEC e o exterminador do futuro

Ministro-pastor vê crianças como pequenos demônios contaminados pelo pecado

Quando o ministro da Educação, Milton Ribeiro, foi nomeado, em julho, a imprensa chamou a atenção para um vídeo de 2016 no YouTube em que ele, também pastor presbiteriano, prega aos fieis sobre o uso da “dor” como método pedagógico para disciplinar as crianças.

Depois de dois meses de silêncio, Ribeiro deu uma entrevista a “O Estado de S. Paulo” e, pela quantidade de disparates que falou, procurei o vídeo para melhor entender o personagem e o assisti na íntegra. Basicamente, o pastor considera que crianças são pequenos demônios, contaminados pelo pecado, e cabe aos pais aplicar “a vara da disciplina” para corrigi-los. Diz o reverendo: “Há uma inclinação na vida da criança para o pecado, para a coisa errada”. Daí, segundo ele, a necessidade da violência.

Ele segue com provérbios da Bíblia, como este: “Tu a fustigarás [a criança] com a vara e livrarás a sua alma do inferno”. Para que não haja dúvida, o dicionário aponta como sinônimos de fustigar: chicotear, açoitar, surrar, flagelar, machucar, espancar, entre outros.

O pastor insiste: “Castiga a teu filho, enquanto há esperança, mas não te excedas a ponto de matá-lo (…)”; “Não estou aqui dando uma aula de espancamento infantil. Mas a vara da disciplina não pode ser afastada da nossa casa”. Talvez um psiquiatra possa explicar a insistência na expressão “vara da disciplina”.

Na recente entrevista ao jornal, Ribeiro demonstrou homofobia, eximiu-se da responsabilidade de coordenar a rede pública de educação no país, menosprezou o sonho de milhões de brasileiros de conseguir formação de nível superior e, por fim, lavou as mãos quanto ao papel da educação na redução de desigualdades, tão agravadas pela pandemia. “Esse não é um problema do MEC, é um problema do Brasil. Não tem como, vai fazer o quê?”. Foi como se dissesse: “E daí?”. Soa familiar? Na marcha acelerada do Brasil rumo ao retrocesso civilizatório, Milton Ribeiro não é um ministro. É o exterminador do futuro.


Bruno Boghossian: Ministro tenta superar antecessores em intolerância e improdutividade

Governo Bolsonaro usa educação como palanque para sua cruzada obscurantista

Jair Bolsonaro só não fechou o Ministério da Educação até agora porque precisa dele em sua cruzada obscurantista. Por quase dois anos, o governo ignorou o ensino público, tentou sabotar o financiamento do setor e explorou a pasta como palanque para seus retrocessos.

O terceiro chefe da área se esforça para superar Ricardo Vélez e Abraham Weintraub em improdutividade e intolerância. De uma só vez, Milton Ribeiro conseguiu fazer propaganda de visões preconceituosas e fingir que não têm nada a ver com disfunções da educação brasileira.

O doutor sugeriu ao jornal O Estado de S. Paulo que o ministério não tem interesse em melhorar a tecnologia nas escolas. Para ele, a dificuldade do ensino a distância durante a pandemia é problema dos outros.

“A sociedade brasileira é desigual, e não é agora que a gente vai conseguir deixar todos iguais”, afirmou. “Esse não é um problema do MEC, é um problema do Brasil.”

Talvez Ribeiro estivesse mais interessado em conseguir um cargo no governo da Noruega, mas acabou ficando por aqui. Se estivesse insatisfeito, ele poderia procurar países onde ressoam alguns de seus valores, como o Iêmen ou a Mauritânia.

O ministro deu um show de discriminação e disse que a homossexualidade é uma “opção”, que ele atribui ao que chamou de “famílias desajustadas”. “Normalizar isso e achar que está tudo certo é uma questão de opinião”, declarou, na entrevista.

Ele sabe que não se trata de uma mera “questão de opinião”, mas usa a velha tática bolsonarista de esconder seus insultos atrás do argumento da liberdade de expressão. O ministro, que é pastor da igreja presbiteriana, alega que essa é apenas uma pauta conservadora, como se isso legitimasse o desaforo.

Ribeiro chegou ao governo com a chancela da ala militar e o carimbo de “moderado”, após a queda do piromaníaco Abraham Weintraub. Houve quem comprasse essa imagem. A única coisa que o doutor pretende moderar é a descrição dos horrores da ditadura nos livros didáticos.


Joel Pinheiro da Fonseca: Fé e religião no governo Bolsonaro

Ministro Milton Ribeiro deve saber separar melhor igreja e Estado; oremos

A religião de um ministro não deveria importar para sua avaliação. A partir do momento, contudo, em que a religião é um dos critérios pelos quais foi escolhido, ela se torna relevante, para o bem ou para o mal.

Ainda em novembro de 2018, a equipe do presidente eleito Jair Bolsonaro sondava Mozart Neves Ramos, na época diretor do Instituto Ayrton Senna, para o Ministério da Educação.

Assim que a informação veio a público, contudo, gerou reação imediata da bancada da Bíblia, que vetou o nome. Bolsonaro acatou. Depois de um ano e meio perdidos, Bolsonaro finalmente nomeia um ministro da Educação evangélico.

O Estado laico é daquelas conquistas sociais que, quanto mais de perto examinamos, mais fica difícil de definir. Afinal de contas, o que difere um valor "religioso" de um valor "laico"? Todos nós partimos de certos pressupostos normativos —os fins que desejamos para nós e para a sociedade— que não têm embasamento racional.

Quando deixamos as sutilezas filosóficas de lado, contudo, e olhamos para o todo, é um avanço inestimável de nossa civilização ter não só separado a autoridade religiosa da autoridade secular (separação que, pode-se dizer, está já na origem do cristianismo) como também ter desobrigado esta de qualquer tipo de subordinação àquela.

Desde então, todas as religiões e igrejas têm a liberdade de existir, sem qualquer favorecimento ou obstáculo do Estado, desde que respeitem a lei.

Isso exigiu de todos, e especialmente de autoridades religiosas, o reconhecimento de que a pluralidade de visões de mundo, bem como a necessidade da convivência pacífica, exigem que se trate visões discordantes com respeito.

A Igreja Católica, hoje em dia —assim como os principais ramos das igrejas protestantes históricas (como a Igreja Presbiteriana, do ministro Milton Ribeiro)—, convive em paz e relativa harmonia com o Estado laico.

Foi uma guerra de séculos para que o aceitassem.

A convivência de diferentes perspectivas só pode funcionar se reconhecemos uma esfera de conhecimento e ação comum, na qual conflitos possam ser resolvidos por um critério anterior a qualquer fé específica: nossa razão (também ela falível e, portanto, sempre aberta ao contraditório). Assim, é possível avaliar um ministro por critérios técnicos que independem da fé.

Até a saída de Weintraub, o discurso do governo era de que não existe excelência técnica: existe apenas a guerra de narrativas, ideologias e fés.

Os grandes problemas da educação brasileira não eram a má gestão, a falta de recursos, o despreparo e desamparo de professores, a indicação política dos cargos de diretores de escolas, e sim a ideologia ensinada por professores comunistas em sala de aula. Ateísmo, socialismo, sexo.

Em vídeo em que prega a sua congregação, o pastor Milton Ribeiro aterroriza os fieis com o espectro da revolução sexual; as universidades estariam, sob a inspiração do existencialismo, ensinando aos jovens ("os nossos filhos") o sexo sem limites. (Como egresso da Faculdade de Filosofia, lamento ter passado batido por essa matéria.) A fala não o abona.

Ao mesmo tempo, contudo, tem um doutorado (real) em educação. É cedo para dizer que também fará um ministério ideológico. Como bom presbiteriano, apesar do conservadorismo, deve saber separar melhor igreja e Estado. Talvez seja o equilíbrio possível dentro deste governo. Oremos.

*Joel Pinheiro da Fonseca, economista, mestre em filosofia pela USP.