meio ambiente
Aquecimento global: mudanças podem ser irreversíveis entre 2040 e 2050
Produção agrícola pode cair 30% sem redução de emissões até 2030
Akemi Nitahara / Agência Brasil
A capacidade de adaptação dos países às mudanças causadas pelo aquecimento global pode acabar, caso as emissões de gases de efeito estufa não sejam drasticamente reduzidos nesta década. Segundo relatório da Chatham House, think tank (instituições que se dedicam a produzir conhecimento sobre temas políticos, econômicos ou científicos) britânica de pesquisa sobre o desenvolvimento internacional, fundada em 1920, as mudanças podem ser irreversíveis entre 2040 e 2050.
O alerta está na Avaliação de Riscos das Mudanças Climáticas, documento desenvolvido para subsidiar as tomadas de decisões dos chefes de Governo e ministros antes da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021 (COP26), marcada para ocorrer de 31 de outubro a 12 de novembro, em Glasgow, na Escócia.
Para o pesquisador sênior do Programa de Meio Ambiente e Sociedade da Chatham House, Daniel Quiggin, um dos autores do relatório, as metas estabelecidas por muitos países para neutralizar as emissões de carbono e a maior ambição com relação às metas nacionais de redução de gases de efeito estufa são uma esperança. Embora, segundo ele, não passem de promessas.
“Muitos países não têm políticas, regulamentações, legislação, incentivos e mecanismos de mercado proporcionais para realmente cumprir essas metas. Além disso, os NDCs [da sigla em inglês para Contribuição Nacionalmente Determinada] revisados globalmente ainda não fornecem uma boa chance de evitar o aquecimento em 2ºC. Devemos lembrar que muitos cientistas do clima estão preocupados que, além dos 2ºC, uma mudança climática descontrolada possa ser iniciada”, alerta.
As metas nacionais foram determinadas a partir do Acordo de Paris, tratado negociado durante a COP21, em 2015, no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima. O acordo rege a redução de emissão de gases de efeito estufa a partir de 2020, para tentar manter o aquecimento global abaixo de 2ºC até o fim do século, num contexto de desenvolvimento sustentável.
Quiggin alerta que as metas definidas ainda não garantem a neutralidade do carbono.
“O balanço zero líquido das emissões depende de tecnologias de emissão negativa, que atualmente não são comprovadas empiricamente em escala comercial. Em resumo, as metas que os países buscam estão se movendo na direção certa, mas ainda não conseguem evitar a devastadora mudança climática. E as políticas de apoio às metas existentes são insuficientes para atingir essas metas”, disse.
Ondas de calor
A avaliação, lançada essa semana em Londres, aponta que a falta de medidas concretas por parte dos governos pode levar a temperaturas extremas a partir da década de 2030, causando 10 milhões de mortes ao ar livre. Ondas de calor anuais podem afetar 70% da população mundial e 700 milhões de pessoas estarão expostas a secas severas e prolongadas todos os anos.
O documento também alerta para a redução de 30% na produção agrícola até 2050 e que 400 milhões de pessoas não poderão mais trabalhar ao ar livre por causa do aquecimento global. Para 2040, há uma expectativa de perda de rendimento de pelo menos 10% nos quatro principais países produtores de milho: Estados Unidos, China, Brasil e Argentina.
Na virada do próximo século, um aumento de 1 metro no nível do mar pode aumentar a probabilidade das grandes inundações em cerca de 40 vezes para Xangai, 200 vezes para Nova York e mil vezes para Calcutá.
Segundo Quinggin, os atuais esforços globais para conter o aquecimento dão ao mundo menos de 5% de chance de manter o aquecimento abaixo de 2°C.
“Sem ações radicais em todos os setores, mas especialmente dos grandes emissores, temperaturas extremas, quedas dramáticas nos rendimentos agrícolas e secas severas prolongadas provavelmente resultarão em milhões de mortes adicionais na próxima década. Ainda há uma janela de oportunidade real (embora ela esteja se fechando) para uma ambição muito maior de todos os governos, para evitar os impactos mais catastróficos das mudanças climáticas”.
A avaliação da Chatham House indica que o ritmo atual dos esforços de descarbonização podem segurar o aquecimento até 2100 em 2,7°C, mas a chance de a temperatura média do planeta subir 3,5°C é de 10%. O pesquisador explica que as restrições de mobilidade ocorridas por causa da pandemia da covid-19 contribuíram apenas momentaneamente para a redução das emissões.
“Nós consideramos isso, mas dado que as emissões se recuperaram muito rapidamente, e agora estão subindo novamente, o breve alívio oferecido pelos bloqueios nas emissões foi insuficiente para mudar nossa avaliação do ritmo e gravidade das mudanças climáticas”, explica.
A Avaliação de Riscos das Mudanças Climáticas é o primeiro de uma série de relatórios de pesquisa aprofundados que a Chatham House vai lançar até a COP26, analisando as consequências do aquecimento do planeta e indicando as ações que precisam ser tomadas para evitar o desastre climático. O trabalho é feito por cientistas e analistas políticos no Reino Unido e na China.
Fonte: Agência Brasil
https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2021-09/aquecimento-global-mudancas-podem-ser-irreversiveis-entre-2040-e-2050
IHU Online: O oceano é crucial em nossas vidas e precisa de cuidado
Ao perdermos a qualidade do ambiente marinho, perdemos benefícios para as pessoas e inúmeras oportunidades de desenvolvimento de atividades socioeconômica
"É preciso mais atenção aos desafios do oceano, pois, embora a temática esteja presente na agenda internacional, não há muito a comemorar", escreve Alexander Turra, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), professor titular do Instituto Oceanográfico da USP e responsável pela Cátedra UNESCO para Sustentabilidade dos Oceanos, em artigo publicado por EcoDebate, 17-09-2021.
Eis o artigo.
Ao perdermos a qualidade do ambiente marinho, além de colocar em risco os serviços ecossistêmicos e benefícios providos para as pessoas, reduzimos oportunidades de desenvolvimento de atividades socioeconômicas sustentáveis e ameaçamos o simbolismo do mar em nossa cultura.
Fonte de inspiração para a música, a literatura, as artes plásticas e as mais diversas manifestações da cultura popular, o oceano desempenha um papel crucial em nossas vidas. Mas, mesmo com sua enorme importância para a economia, a saúde, a alimentação, a ciência, o bem-estar, entre outras áreas, e frente aos reconhecidos serviços ecossistêmicos essenciais para a manutenção da vida no planeta, o oceano ainda parece distante de muitos de nós. Sem conhecê-lo, deixamos de estabelecer a conexão necessária para protegê-lo.
Desde a Rio 92, a histórica conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável, realizada no Rio de Janeiro em 1992, líderes mundiais buscam formas de fazer frente aos desafios e ameaças que o oceano enfrenta. No entanto, a mobilização internacional ganhou um pouco mais de força apenas em 2009, quando foi estabelecido o Dia Mundial do Oceano, lembrado no dia 8 de junho, que surgiu com o intuito de celebrar a nossa ligação com o mar, bem como aumentar a conscientização sobre a necessidade de cuidar melhor dele.
Esse hiato de 17 anos teve consequências para a saúde do oceano. A degradação é como um câncer que rapidamente se alastra e que demanda imediata remediação. Demorar em tomar atitudes pode ser a diferença entre a vida e a morte. E quanto antes as medidas forem tomadas, inclusive na prevenção, melhor tende a ser o resultado. Essa morosidade em cuidar do oceano pode ser considerada como negligência da humanidade em relação a um grande aliado de sua existência. Por outro lado, essa demora pode também ilustrar uma falta de clareza dos líderes mundiais sobre esse papel central do oceano na sustentabilidade do planeta.
Recentemente, o movimento em prol do oceano recebeu reforços. Além de contar com um dia para lembrar sua importância, em 2017, a ONU propôs que a década entre 2021 e 2030 fosse dedicada à Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável. Surgia assim a proposta de somar esforços em nível global entre os governos nacionais, convidando também a sociedade civil organizada a se engajar na luta por um oceano limpo e saudável.
É preciso mais atenção aos desafios do oceano, pois, embora a temática esteja presente na agenda internacional, não há muito a comemorar. A qualidade do ambiente marinho continua sendo perdida ao longo do tempo. Infelizmente, o mar torna-se um grande sumidouro dos rejeitos gerados pelas atividades humanas, como o esgoto, o lixo e os poluentes industriais, a exemplo do petróleo e do mercúrio, e também sofre com outros tipos de agressões. Extinções de espécies que sequer foram conhecidas pela ciência; invasão de espécies exóticas; destruição de ambientes como manguezais e recifes de coral; pesca irregular, ilegal e não reportada; e mudanças do clima correspondem a importantes ameaças que ilustram a ampla crise que assola o oceano.
Essas alterações se desdobram em catástrofes para a humanidade. Ao perdermos a qualidade do ambiente marinho, perdemos benefícios providos para as pessoas e inúmeras oportunidades de desenvolvimento de atividades socioeconômicas, como turismo, pesca e aquicultura. Estamos falando de cerca de 20% do Produto Interno Bruto do Brasil, valor que depende direta e indiretamente do oceano. Estamos falando de oportunidades para ampliar a oferta de alimento e a segurança alimentar para o planeta. Estamos falando de condições para gerar milhões de empregos e produzir a energia limpa e renovável que tanto precisamos para caminharmos na direção de uma economia de baixo carbono e combatermos os efeitos das mudanças climáticas.
"Ao perdermos a qualidade do ambiente marinho, perdemos benefícios providos para as pessoas e inúmeras oportunidades de desenvolvimento de atividades socioeconômicas, como turismo, pesca e aquicultura" - Alexandre Turra Tweet
Mas perdemos mais ainda. Perde-se o próprio simbolismo que o oceano tem para a humanidade. Sem o simbolismo do oceano não teríamos a suíte dos pescadores de Dorival Caymmi, os quadros de José Pancetti, os romances de Jorge Amado, os contos populares compilados por Câmara Cascudo e as aventuras de Júlio Verne.
Essa simbologia move inúmeras pessoas a conhecer o mar. Cito duas histórias que repercutiram amplamente e que ilustraram a magia que o mar exerce sobre as pessoas. Em 1995, Maria do Carmo Jerônimo, mineira de 124 anos, conheceu o mar. Tendo sido escrava até os 17 anos, aguardou muito tempo até ter podido realizar esse desejo, uma segunda alforria, que só se igualava à sua vontade de conhecer o Papa.
Em 2021, Pâmella Rocha, uma menina goiana de 9 anos, também conheceu o mar. Com um câncer em fase avançada e que levou à amputação de uma de suas pernas, Pâmella tinha um enorme desejo de estar próxima ao mar. E ela o fez. Junto com sua família e diversos apoiadores, o sonho virou realidade e ela veio a conhecer o que achava que era uma “grande represa”. “Foi maravilhoso ver os olhinhos dela brilhando”, registrou sua mãe, Vannina Rocha.
A exemplo de dona Maria do Carmo e de Pâmella, cerca de 70 milhões de brasileiros nunca tiveram a oportunidade de ver, sentir e se banhar no mar. De sentir a energia das ondas, o sal no corpo, a brisa na face e a areia salpicando na pele. De ver o sol nascer, “emergindo” de um horizonte oceânico.
"Podemos aproveitar a Década do Oceano para refletirmos e para nos questionarmos sobre o que de fato conhecemos sobre ele, sobre o entendimento que temos a respeito da importância dele para nossas vidas e sobre o papel de nossas atitudes cotidianas na saúde do oceano" - Alexandre Turra Tweet
Podemos aproveitar a Década do Oceano para refletirmos e para nos questionarmos sobre o que de fato conhecemos sobre ele, sobre o entendimento que temos a respeito da importância dele para nossas vidas e sobre o papel de nossas atitudes cotidianas na saúde do oceano. Mas, mais que isso, que possamos resgatar o simbolismo do oceano em nossas vidas, renovando a importância dele para a garantia da nossa saúde e a necessidade de seu uso sustentável para superarmos as mais desafiadoras adversidades e progredirmos enquanto humanidade. Falando em simbolismo, considerando o planeta como um ser vivo, certamente o oceano seria sua alma. E sem alma jamais seremos um planeta efetivamente vivo!
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Fonte: IHU Online
http://www.ihu.unisinos.br/612958-o-oceano-e-crucial-em-nossas-vidas-e-precisa-de-cuidado
ONU alerta que pandemia não freou aquecimento global
Chefe das Nações Unidas diz que será impossível alcançar meta do Acordo de Paris sem cortes de emissões imediatos e em grande escala
Um relatório sobre as mudanças climáticas divulgado pela ONU nesta quinta-feira (16/09) alerta que a pandemia de covid-19 não diminuiu o ritmo das mudanças climáticas.
A desaceleração econômica e os lockdowns relacionados ao coronavírus causaram apenas uma queda temporária nas emissões de CO2 no ano passado, de acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM).
"Houve quem pensasse que os lockdowns devido à covid teriam um impacto positivo na atmosfera, mas não foi o caso", disse o secretário-geral da OMM, Petteri Taalas, em entrevista coletiva.
O documento reúne os últimos dados científicos e descobertas relacionadas às mudanças climáticas, afirmando que, entre janeiro e julho, as emissões globais de CO2 associadas ao uso de combustíveis fósseis nos setores de energia e indústria já voltaram ao mesmo nível ou estão acima do mesmo período em 2019, antes da pandemia.
O Acordo de Paris sobre mudanças climáticas de 2015 estabeleceu como objetivo limitar o aumento da temperatura global a até 2 °C em relação ao nível pré-industrial, ficando idealmente mais perto de 1,5 °C.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou que essa meta de limitar o aquecimento global a 1,5 °C será impossível sem cortes de emissões imediatos. "Ainda estamos significativamente atrasados para cumprir as metas do Acordo de Paris", disse.
"A menos que haja reduções imediatas, rápidas e em grande escala nas emissões de gases de efeito estufa, será impossível limitar o aquecimento a 1,5 ºC, com consequências catastróficas para as pessoas e o planeta do qual dependemos", acrescentou o chefe da ONU. "Este é um ano crítico para a ação climática", disse, avisando que os resultados do estudo trazem uma "avaliação alarmante de quão longe estamos do rumo".
Intitulado Unidos na Ciência 2021, o relatório foi publicado por várias agências da ONU e parceiros científicos poucas semanas antes da reunião de cúpula do clima COP26. O texto alerta também que a mudança climática e seus impactos estão acelerando.
Pausa pandêmica foi breve
A OMM disse que as reduções de emissões durante a primeira onda de covid-19, no início do ano passado, representaram um "breve lapso".
"As reduções gerais de emissões em 2020 provavelmente reduziram o aumento anual das concentrações atmosféricas de gases de efeito estufa de longa duração, mas esse efeito foi muito pequeno para ser distinguido da variabilidade natural", concluiu o relatório.
Neste ano, embora as emissões de CO2 provenientes do tráfego rodoviário tenham ficado abaixo dos níveis anteriores à pandemia, as concentrações dos principais gases de efeito estufa que contribuem para o aquecimento global continuaram a aumentar, de acordo com o relatório.
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/onu-alerta-que-pandemia-n%C3%A3o-freou-aquecimento-global/a-59202494
CNI divulga estudo sobre mercado de carbono no mundo
Ações de precificação cobrem 21,5% das emissões mundiais de gases
Agência Brasil
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) lançou nesta terça-feira (14) o estudo Mercado de Carbono: Análise de Experiências Internacionais. O documento apresenta iniciativas da União Europeia, do México, do Western Climate Initiative (WCI) no Canadá e Califórnia, do Japão e da Coreia do Sul. O objetivo é apontar elementos comuns que possam ser úteis para a reflexão sobre a governança de um mercado de carbono no Brasil.
Os principais pilares apontados no estudo para mercados de carbono estão liderança no Executivo, descentralização, criação de novas estruturas, organização dos sistemas de compensação, interface com o setor privado e formas de interação com setores não regulados.
De acordo com dados do Banco Mundial, as iniciativas de precificação de carbono cobrem cerca de 21,5% das emissões mundiais de gases de efeito estufa, com 64 iniciativas implementadas ou em estudo. Os preços de comercialização variam entre US$ 1 e US$ 137 por tonelada de CO² equivalente, sendo que mais de 51% das emissões cobertas por sistemas de precificação de carbono têm preço médio de US$ 10 por tonelada de CO² equivalente.
O estudo mostra que, nos países analisados, o sucesso na implementação de programas duradouros esteve associado a três elementos: governos com forte capacidade de articulação com o setor privado, vontade política para avançar na agenda climática como um tema de Estado, e não de governo, com um sistema de relato obrigatório de emissões.
Segundo o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, o mercado regulado de carbono precisa ser planejado com uma estrutura de governança adequada para que seja viável e atrativo a investimentos. O objetivo do estudo, que foi entregue a representantes do governo e parlamentares, é subsidiar os debates da regulamentação desse mercado.
Os cinco mercados analisados têm modelos de governança distintos e, portanto, com graus diferentes de descentralização. Os programas que nascem com o desafio de integrar jurisdições de países diferentes, como o sistema de comércio de carbono europeu (EU-ETS) e a WCI, apresentam maior grau de descentralização.
De acordo com o documento, todos os programas estudados têm um ou mais entes privados em sua estrutura de governança. A função mais frequente atribuída a um ente privado é a verificação dos relatos, que é feita total ou parcialmente por ele nos cinco modelos.
A segunda função mais frequente é a de plataforma de comércio de permissões, que é executada por bolsas de valores na União Europeia e Coreia do Sul, por uma empresa privada na WCI e que, potencialmente, também será executada pela bolsa de valores no México.
Ouça na Radioagência Nacional:
Fonte: Agência Brasil
https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2021-09/cni-divulga-estudo-sobre-mercado-de-carbono-no-mundo
Luiz Carlos Azedo: Três tenores e um anjo torto
Grupo acompanhou a trajetória política do Brasil desde o golpe que destituiu João Goulart, em 1964, até a recente confusão armada por Bolsonaro
Luiz Carlos Azedo / Nas entrelinhas / Correio Braziliense
Um evento importante para a política será realizado, hoje, para discutir a crise brasileira, com a participação dos ex-presidentes José Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, no qual o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Nelson Jobim fará uma abertura sobre a crise institucional que estamos atravessando, com mediação do ex-governador fluminense Moreira Franco. O seminário “Um novo rumo para o Brasil” é promovido pelas fundações do MDB, PSDB, DEM e Cidadania, e contará ainda com os presidentes dos respectivos partidos — o deputado federal Baleia Rossi (SP), o ex-ministro das Cidades Bruno Araújo, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto e o ex-senador Roberto Freire, respectivamente.
O evento estava sendo organizado havia meses, para começar em 8 de setembro, mas o ex-presidente Michel Temer, premonitoriamente, sugeriu que fosse adiado por uma semana, não apenas por causa do feriadão do 7 de setembro, mas porque se temia que, no Dia da Independência, algum fato relevante ocorresse, como acabou acontecendo, exigindo certa decantação para que o evento não se transformasse numa operação de apagar incêndio. Ou seja, que deixasse de discutir saídas para a crise política que o país atravessa e o choque entre Poderes. Acabou que foi exatamente isso o que ocorreu no dia 8 de setembro, uma operação para conter as chamas dos discursos incendiários de Bolsonaro, que provocaram um locaute de caminhoneiros e que assombraram os agentes econômicos e aliados do governo.
O título da coluna, obviamente, é uma analogia, porque Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer nem de longe têm a potência de voz dos três tenores aos quais se remete: Plácido Do- mingo, José Carreras e Luciano Pavarotti, que cantaram juntos, em concertos, durante a década de 1990 e no início da década de 2000. A primeira performance do trio ocorreu nas Termas de Caracala, em Roma, Itália, em 7 de julho de 1990 — no encerramento da Copa do Mundo de Futebol de 1990. Zubin Mehta conduziu a Orquestra Maggio Musicale Fiorentino e a Orquestra do Teatro da Ópera de Roma.
Potência de voz no sentido figurado, porque são vozes influentes ainda hoje na política brasileira. Sarney virou um oráculo de muitos senadores influentes; FHC é o único que pode juntar os cacos do PSDB e continua sendo a referência política do grupo de economistas que salvou o país da hiperinflação; finalmente, Temer renasceu das cinzas, sendo o único interlocutor do presidente Jair Bolsonaro no mundo da alta política — os demais são operadores do baixo clero. O ex-ministro Nelson Jobim dispensa apresentação: é um personagem importante na calibragem das propostas que podem surgir do evento, porque foi ministro da Justiça de Fernando Henrique, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e ministro da Defesa do ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de personagem muito importante na elaboração da Constituição de 1988.\
O anjo torto
Do time de presidentes de partidos, Roberto Freire (Cidadania) é o único que participou da Constituinte. Viveu todos os momentos da transição à democracia, desde sua eleição a deputado federal em 1978. Baleia Rossi (MDB), Bruno Araújo (PS- DB) e ACM Neto (DEM) pertencem à nova geração que comanda o Congresso. No seminário, formarão uma espécie de backing vocal. Na música, muita gente subestima o coro que dá sustentação aos tenores e outros solistas, mas é preciso muita habilidade para desempenhar esse papel. É necessário percepção e habilidades que são desenvolvidas com estudos. Ter um ouvido bem apurado e prestar bastante atenção para não “entrar” na voz principal.
O encontro será transmitido ao vivo pelas redes sociais, a partir das 18h30, o primeiro da série de oito debates programáticos (economia, meio ambiente, saúde, educação, segurança, diversidade, relações exteriores), com grandes especialistas, na tentativa de formular uma agenda nova para o país, entre as quais uma saída sustentável para a crise econômica. Há muita experiência vivida nesse grupo, que acompanhou a trajetória política do Brasil desde o golpe que destituiu o presidente João Goulart, em 1964, até a confusão armada por Bolsonaro, na semana passada.
Para resumir a linha de pensamento vitoriosa nesse processo, há dois eixos: a defesa da democracia e a conciliação política. Mas ninguém se iluda: todos nesse grupo foram capazes de tomar decisões firmes em momentos difíceis e liderar rupturas. Por isso mesmo, não se deve esperar um debate monocórdico, um coro perfeito. Quem será o anjo torto?
Incêndios florestais causam hospitalização de 47 mil brasileiros por ano
Pacientes sofrem principalmente de problemas respiratórios e doenças cardiovasculares. Crianças são as mais afetadas
DW Brasil
A cada ano mais intensos, incêndios que consomem as florestas brasileiras, sobretudo na região amazônica, vêm afetando a saúde da população. Em um estudo publicado neste mês pelo periódico científico The Lancet, um grupo de pesquisadores concluiu que mais de 47 mil internações por ano em hospitais do país têm como causa a poluição decorrente de incêndios florestais.
É a primeira vez que uma pesquisa abrangente sobre o assunto é feita. No total, foram analisados 143 milhões de registros de hospitalizações, de 2000 a 2015, de 1.814 municípios do país — o que significa uma rede de atendimento de saúde que cobre praticamente 80% da população nacional.
Foram identificados 766.091 casos em que a internação pode ser considerada, segundo os pesquisadores, consequência da poluição resultante de incêndios florestais. São 47.880 por ano — cerca de 35 hospitalizações a cada 100 mil habitantes. A maior parte das internações ocorreu por problemas respiratórios, seguida por doenças cardiovasculares.
"Para chegarmos a essa conclusão, pegamos as informações das internações e cruzamos com dados de satélite. Por meio de modelagem de computador, a análise da poluição do ar foi observada, com desvio da normalidade decorrente de dias de queimadas florestais na região", explica o médico patologista Paulo Saldiva, professor na Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do estudo, que foi coordenado por pesquisadores da Universidade Monash, da Austrália.
"Vimos que o problema existe e tem maior efeito, proporcionalmente, nas regiões Norte e Centro-oeste, onde mais ocorrem as queimadas, e Sudeste, porque correntes de ar trazem a poluição diretamente para essa região", acrescenta ele.
"Como um fumante"
Também pesquisadora da USP, a meteorologista Micheline de Sousa Zanotti Stagliorio Coêlho, outra autora do trabalho, atenta para o fato de que a pesquisa humaniza o problema ambiental, ao focar em danos diretos às pessoas.
Crianças são as mais afetadas, sendo que menores de 5 anos responderam por 254 mil casos no período analisado, e quase metade do total são menores de 10 anos.Volume 90% Assistir ao vídeo06:40
Incêndios florestais: como evitar que o mundo queime
O patologista Saldiva explica que a inalação constante da poluição decorrente de incêndios florestais causa efeitos no corpo humano "semelhantes ao que ocorre com um fumante". "Crianças são mais afetadas porque ainda não amadureceram o sistema de defesa. A [inalação da] queimada de biomassa provoca uma inflamação pulmonar e o enfraquecimento da capacidade de defesa [imunológica]", esclarece o médico.
Idosos também precisam de mais cuidados, já que com o envelhecimento o sistema imunológico fica naturalmente mais comprometido. "Isso pode facilitar que um agente infeccioso prospere, necessitando de internação", diz Saldiva.
No âmbito respiratório, essa inalação de partículas de poluentes pode desencadear diminuição da função pulmonar e quadros de asma, entre outros problemas de saúde. Mas há também um efeito na pressão arterial.
"O que faz com que aumente a carga que o coração precisa fazer, aumentando o trabalho cardíaco, com consumo maior de oxigênio e, eventualmente, a obstrução arterial de uma coronária, favorecendo [a ocorrência de] infarto ou arritmias cardíacas", contextualiza.
Metodologia
Os pesquisadores utilizaram imagens de satélite para suprir uma lacuna do monitoramento brasileiro. "Praticamente não temos, no Brasil, medições em solo de poluentes atmosféricos", afirma a meteorologista Coêlho.
São Paulo é uma exceção, onde tais aferições são executadas pela agência governamental Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). Longe dos grandes centros, justamente onde ocorrem as queimadas, esse tipo de monitoramento não é realizado.
"Mas é claro que sabemos que materiais particulados, poluentes, como enxofre e ozônio, têm impacto tanto na saúde humana quanto na alteração do tempo e do clima", ressalta ela. A solução encontrada foi utilizar informações de satélites, observando os desvios que indicavam incêndios.
Em maio, um grupo multidisciplinar de cientistas, do qual também fizeram parte Saldiva e Coêlho, publicou um artigo na Nature Climate Change mostrando que o aquecimento global já responde por 37% das mortes decorrentes de calor no planeta — a força-tarefa compilou e analisou dados de óbitos de 732 cidades, de 43 países.
Para Saldiva, esses trabalhos servem de alerta: como o ser humano, ao destruir o meio ambiente, também está se destruindo. "O Brasil vive um período de sucessivos aumentos de desmatamento ilegal [geralmente acompanhado de queimadas], e isso tem repercutido em questões climáticas", ressalta.
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/inc%C3%AAndios-florestais-causam-hospitaliza%C3%A7%C3%A3o-de-47-mil-brasileiros-por-ano/a-59174630
Cerrado teve 15% mais incêndios este ano que no mesmo período de 2020
Inpe registrou 35.846 focos de fogo na região neste ano, que aumentam degradação no bioma e ameaçam vazão de rios
Cleide Carvalho / O Globo
SÃO PAULO - As queimadas no cerrado aceleram a degradação da vegetação nativa e ameaçam a vazão de alguns dos principais rios brasileiros. Neste ano, de janeiro até dia 9 de setembro, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou 35.846 focos de incêndio no bioma, 15% a mais do que no ano passado. É o maior número desde 2012. A professora Mercedes Bustamante, da Universidade de Brasília, uma das principais especialistas em cerrado no país, explica que o fogo degrada justamente as áreas preservadas, dificultando ainda mais o serviço hidrológico do ecossistema e reduzindo o volume de água dos rios.
Avanço: Agropecuária já ocupa quase metade do Cerrado, diz monitoramento do MapBiomas
Os focos de incêndio se espalham por todas as regiões do país. Este ano, a maior quantidade de focos está nos estados do Tocantins (20%), Maranhão (18,6%), Mato Grosso (15%) e Minas Gerais (10,2%). Alberto Setzer, responsável pelo monitoramento de queimadas do Inpe, afirma que a situação de 2021 ainda não está dada, pois setembro é o pior mês para ocorrência de incêndios.
Dados do Mapbiomas divulgados nesta sexta-feira alertam que 87% do fogo que atingiu o cerrado desde 1985 queimou exatamente áreas de vegetação nativa. Apenas 13% ocorreram em pastos ou áreas de agricultura, que ocupam quase metade do bioma.
Aumento: Desmatamento tem queda de 32% na Amazônia em agosto, mas sobe 137% no Cerrado, aponta Inpe
Além disso, 60% das áreas queimadas pegaram fogo mais de uma vez, o que prejudica ainda mais a recuperação.
– Na Bacia do Paraná, que está em plena crise, temos apenas 21% de vegetação remanescente. Ainda que o Código Florestal permita desmatar até 80% das propriedades, é importante assinalar que a preservação de 20% não é suficiente para manter a conservação – diz Mercedes, acrescentando que outro rio abastecido pelo cerrado, o Paraguai, é o provedor de água do Pantanal.
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A cobertura de água natural no cerrado diminuiu 55% de 1985 para cá, o que significa a perda de 473 mil hectares. A queda foi compensada pela criação dos grandes reservatórios de hidrelétricas.
Para se ter uma ideia, o levantamento do MapBiomas mostra que, em 1985, 60% da cobertura de água do cerrado era natural. Em 2020, a situação inverteu: 70% da água superficial é de origem antrópica – pela ação do homem. A inversão se deve aos reservatórios criados por hidrelétricas.PUBLICIDADE
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Um estudo feito pelo hidrólogo Jorge Werneck Lima, pesquisador da Embrapa Cerrados e hoje diretor da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa), mostra que o cerrado responde por 90% da vazão do Rio São Francisco e mais de 100% da vazão dos rios Parnaíba e Paraguai, considerando as perdas durante o curso. Na Bacia Tocantins-Araguaia a contribuição atinge mais de 60%.
No total, indica Lima, as águas do cerrado abastecem oito das 12 regiões hidrográficas do país, o que justifica o título de "caixa d'água" do Brasil atribuído ao bioma.
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O Mapbiomas identificou redução na superfície de água natural em todas as bacias entre 1985 e 2020, medida em hectares. A mais atingida foi a Bacia do Paraguai, com redução de 70%. No São Francisco, de 47%. Na Bacia Atlântico Leste, de 43% – nela estão entre os mais volumosos os rios de Contas, Jequitinhonha, Mucuri e Pardo, por exemplo. No Rio Paraná, a redução foi de 35% e, no Tocantins, de 10%.
A redução na vazão ameaça a geração de energia. Segundo Lima, cerca de metade da energia hidrelétrica produzida no país utiliza águas que vertem do cerrado. A maior das hidrelétricas é Itaipu, no Rio Paraná, com 57 grandes reservatórios, que enfrenta a pior seca em 40 anos.
O relatório de 2020 da Chesf, que administra oito das hidrelétricas instaladas no Rio São Francisco, como o complexo Paulo Afonso e a UHE Luiz Gonzaga, informa que, devido à longa estiagem, verificada desde 2013 na Bacia, tem recebido sucessivas autorizações do Ibama para reduzir a vazão dos reservatórios de Sobradinho e Xingó.
– É preciso usar e saber o que preservar. Monitorar, planejar e gerir de forma racional e inteligente. É preciso integrar os setores e colocá-los na mesa de discussões para ver o que é mais inteligente e possível fazer – diz Lima.
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Bráulio Dias, ex-secretário Executivo da Convenção de Diversidade Biológica das Nações Unidas e professor da UnB, chega a dizer que, se medidas não forem tomadas, o Brasil corre o risco de passar a ter rios intermitentes no cerrado, como ocorre no semiárido.
O agrônomo Edegar Oliveira, diretor de conservação e restauração de ecossistemas da WWF-Brasil, que integra a rede MapBiomas, afirma que o cerrado é estratégico por sua capacidade de funcionar como "esponja" para garantir a água dos rios e o desmatamento está em alta. Os alertas de desmatamento em agosto, por exemplo, cresceram 136% em relação a 2020.
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– O inferno astral do cerrado está muito pior este ano – resume.
Para ele, o contexto de negacionismo em que vive o Brasil impede que seja visto o impacto no desenvolvimento do país.
– Não é mais uma questão de médio prazo. O impacto no clima já está ocorrendo e não faz mais sentindo seguir nessa linha de degradação. Estamos escolhendo ir pelo caminho errado – diz ele.
Permacultura: um caminho sustentável possível para o Cerrado
Conheça mais sobre as ideias inspiradas na própria natureza
Fabíola Sinimbu / Agência Brasil
Hoje (11) é Dia do Cerrado, em mais um ano de pandemia, que nos lembra diariamente o quanto estamos inseridos em um sistema além do ser humano e que é preciso cuidar de todos os aspectos desse sistema. A permacultura, um conceito criado ainda na década de 70, foi a ferramenta escolhida por muitos responsáveis pela preservação do que ainda resta do segundo maior bioma brasileiro.
O brasiliense Cláudio Jacinto é um deles e, há mais de 20 anos, mergulhou fundo no método criado pelos Australianos Bill Mollison e David Holmgren. Desde então, cuidar da terra, das pessoas e partilhar o que se produz de forma justa são princípios básicos na agenda do engenheiro florestal.
Ele conta que antes mesmo de entrar em contato com a permacultura já sentia uma necessidade de buscar mais igualdade social, mas não encontrava o caminho para isso. Foi na faculdade de engenharia florestal que teve contato com o conceito do que ele mesmo define como uma “metodologia científica para o planejamento de ocupações humanas sustentáveis”. Segundo ele, uma ciência baseada em conhecimentos de engenharia, ciências agrárias, arquitetura e inspirada por saberes tradicionais antigos para que seres humanos ocupem o planeta sem exaurir os recursos.
BIOMAS
Cláudio explica que essa “cultura permanente” também considera que o ser humano é parte integrante de todo esse sistema e precisa ter suas necessidades atendidas, mas não da forma como acontece atualmente.
“É construir um modo de vida que seja sustentável, sendo que o conceito de sustentável é que o que eu faço hoje para construir a minha casa, para produzir a minha comida, para gerar e consumir a minha energia, para ter água disponível e ter um destino adequado para água utilizada, minimamente essas quatro necessidades básicas; sejam feitas de um modo que a geração futura e as próximas possam continuar fazendo do mesmo jeito”, explica.
A ideia é tão viável que muitas das soluções apresentadas pela permacultura são amplamente utilizadas em diversas áreas do conhecimento e apontadas como soluções para problemas ambientais como o aquecimento global. São ações como melhor utilização dos recursos naturais e locais na construção de habitações, substituição da monocultura por agroflorestas, diversificação da matriz energética por meio das fontes renováveis e melhor utilização do ciclo da água.
Com as ideias adquiridas em um curso extracurricular na universidade, Cláudio conseguiu criar a primeira disciplina de permacultura em universidade pública do país, dentro do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Brasília; passou a lecionar permacultura, e hoje mantém uma Organização Não Governamental que leva iniciativas permaculturais às comunidades mais carentes, por meio dos recursos provenientes de ações socioeducativas.
Água
Um dos projetos desenvolvidos por Cláudio Jacinto, em Brasília, foi a implantação da Unidade Demonstrativa de Permacultura do Jardim Botânico de Brasília. Uma réplica de uma casa de pau-a-pique, em formato hexagonal, inspirada nas colmeias das abelhas; que tem um sistema completo de abastecimento e tratamento da água.
O educador ambiental do Jardim Botânico de Brasília Lucas Miranda explica que além de cumprir a função de explicar a permacultura ao público que participa do circuito educativo, a unidade demonstrativa é uma vitrine para mostrar que é possível pôr em prática as ideias trazidas pela filosofia permacultural. “Ela é uma casinha, ela é superlinda, ela tem a estética assim muito bonita e ela, principalmente, fecha esse ciclo da água. Então, cuidar da água, o Cerrado é o berço das águas, então a gente cuidar da água já é muito importante”, diz.
Habitação
A arquiteta Talita Maboni também teve contato com o conceito ainda na faculdade, quando decidiu aprofundar os conhecimentos sobre a bioconstrução junto à comunidade quilombola Kalunga, que vive em Goiás. Em dois anos de convivência, ela aprendeu técnicas de construção com terra e bambu e, depois de formada, fundou um coletivo feminino com as arquitetas Natália Cortes e Marina Patury.
Juntas, elas desenvolvem projetos que buscam na natureza soluções para atender às necessidades humanas da melhor forma. “A bioconstrução nada mais é do que um resgate desses saberes. Claro, que hoje em dia a gente já introduz algumas tecnologias que vão aprimorar essas técnicas, que vão deixá-las mais eficientes”, explica Talita Maboni.
Segundo Lucas Miranda, além da inspiração na natureza e também no conhecimento buscado nos povos tradicionais, a permacultura também se preocupa em não criar excedentes, evitando um processo de desperdício, que ainda pode gerar poluição no meio ambiente.
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, estima-se que mais de 50% dos resíduos sólidos gerados pelo conjunto das atividades humanas sejam provenientes da construção civil.
Preservação
No caso da Unidade Demonstrativa de Permacultura do Jardim Botânico, além de ter sido construída com paredes da pau-a-pique, uma técnica de construção tradicional do Brasil que utiliza a terra e o barro, elementos abundantes e que não geram poluição; a estrutura também resgatou elementos de resíduos da construção civil e integrou no sistema de tratamento sanitário. “A gente ainda intercepta esse lixo e dá um destino mais adequado do que o lixão, do que o aterro sanitário. Não deixa ele ser jogado no Cerrado de qualquer forma”, diz Miranda.
Impacto Ambiental
Para Talita Maboni, trabalhar com projetos que aplicam o conceito de permacultura por meio da bioconstrução é ir além da preservação ambiental, pois o patrimônio humano também pode durar muitos anos se as técnicas forem empregadas da forma certa. Talita diz que é preciso desmitificar a ideia de que bioconstrução é sinônimo de insalubridade ou pouca durabilidade. “É a forma mais rica que se tem pra construir. É você saber ocupar o espaço, saber olhar para ele e ver como vocês podem trabalhar em conjunto”, diz
Todas as soluções e ações propostas pela permacultura são possíveis de serem adotadas em qualquer lugar ou forma de vida escolhida pelas pessoas, segundo Cláudio Jacinto. “Eu acredito que todas as pessoas que têm a consciência ambiental podem colocar um pouquinho em prática sem precisar virar um permacultor que foi morar no mato e abandonou tudo e planta a sua própria comida”, explica e conclui “a permacultura propõe um novo jeito de fazer tudo que precisamos fazer para viver.”
Fonte: Agência Brasil
https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2021-09/permacultura-um-caminho-sustentavel-possivel-para-o-cerrado
O aquecimento global no limite: Brasil também paga caro pela devastação
Senado deve analisar, ainda em 2021, um projeto para incorporação às leis brasileiras de uma emenda ao Protocolo de Montreal
Nelson Oliveira / Agência Senado
Gás bastante utilizado em refrigeração, o hidrofluorcarbono (HFC) é um exemplo de solução que um dia se converte em problema. Aplicado em substituição a outros gases para diminuir os danos à camada de ozônio, acabou por contribuir para o efeito estufa, que impulsiona o aquecimento global e está provocando efeitos indesejáveis, como incêndios de grande proporção, derretimento de geleiras, aumento do nível dos oceanos e desertificação.
Com o objetivo de reduzir gradualmente a produção e utilização de gases não agressivos à camada de ozônio, mas causadores de efeito estufa, deverá chegar neste ano ao Senado um projeto para incorporação às leis brasileiras de uma emenda ao Protocolo de Montreal, o acordo que trata dos cuidados com a camada que nos protege da ação dos raios ultravioleta emitidos pelo sol. O PDC 1.100/2018 é uma das proposições da agenda que está sendo montada na Câmara dos Deputados para votação, antes que comece, em 31 de outubro, a 26ª Conferência do Clima, a COP 26, a ser realizada em Glasgow, na Escócia. Ali, representantes de quase 200 países vão discutir medidas mais ousadas e urgentes para manter o aquecimento global em no máximo 1,5 grau (ºC) em relação aos níveis pré-industriais. Se providências “ambiciosas” não forem adotadas, alertam os cientistas, a catástrofe climática pode se tornar irreversível e de efeitos totalmente inesperados.
Essa demanda por maior ambição e compromisso acompanhou a elaboração e divulgação do último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), instância das Nações Unidas que subsidia as reuniões do Acordo do Clima, igualmente conhecido como Acordo de Paris.
Um dos objetivos do encontro é balancear as contribuições dos países, de modo a obter algum tipo de desenvolvimento que possa ser considerado sustentável.
DESMATAMENTO NO BRASIL
O dilema gerado pelo HFC ilustra um dos muitos que acompanham o estabelecimento dos seres humanos sobre a Terra, principalmente a partir do forte desenvolvimento industrial iniciado ainda na primeira década do século 19. A cada solução encontrada para gerar energia, agilizar os transportes, aumentar a produtividade da agropecuária e tornar mais segura e confortável a vida das pessoas, uma penca de problemas foi surgindo, sendo a poluição do ar e dos rios a primeira a ser notada. Hoje se estendem a uma miríade de sequelas, entre as quais o excesso de plástico que segue para as águas do planeta ou se acumulam nos lixões, a redução da disponibilidade de água, a extinção de espécies — úteis a elas mesmas e à pesquisa de remédios para os seres humanos — e a liberação de patógenos causadores de epidemias.
Já não há mais dúvidas de que o atual nível de aquecimento está sendo causado principalmente por dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) resultantes das atividades humanas. Não se trata, como chegaram a defender alguns, de um novo ciclo climático. O mundo levou três milhões de anos para atingir um aquecimento global de mais de 2,5 graus. As emissões causadas pelo homem, como a queima de combustíveis fósseis e o corte de árvores, são responsáveis pelo aquecimento recente. Do 1,1 grau de aumento da temperatura média experimentado desde a era pré-industrial, o IPCC concluiu que menos de 0,1 grau se deve a forças naturais, como vulcões ou variações do Sol.
O apelo dramático do IPCC é pela redução drástica de emissões, de modo a não esgotarmos o que os pesquisadores chamam de “orçamento de carbono”, cerca de 400 giga toneladas de CO2 equivalente, medida de equiparação com outros gases de efeito estufa. Mesmo com metas ambiciosas, o cenário projetado pelo painel inclui um pico potencial de aumento da temperatura média de 1,6 grau entre 2041 e 2060, após o qual as temperaturas cairiam abaixo de 1,5 grau até o final do século, caso as emissões cheguem a zero grau em 2050, ou seja, o planeta seja capaz de absorver tudo o que for emitido, já que não se espera que o mundo simplesmente pare.
No Senado, o conteúdo do relatório, cuja versão definitiva foi divulgada em agosto, é motivo de preocupação. Nesta sexta-feira (10), o presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), Jaques Wagner (PT-BA), reuniu em debate virtual um grupo de personalidades e parlamentares para a avaliarem o diagnóstico e as recomendações lançadas pelo IPCC.
O debate foi requerido pelo próprio Jaques Wagner e subscrito por outros 15 senadores. Ao pedir a sessão temática, ele classificou o relatório firmado por mais de 200 cientistas de diversos países como o documento mais abrangente e conclusivo já feito sobre a crise climática.
“O modo de vida do ser humano está afetando todo o planeta, com efeitos que já podem durar centenas de anos, mesmo que as emissões de gases de efeito estufa sejam reduzidas a zero no dia de amanhã”, diz o senador no requerimento.
Participaram do encontro, a embaixadora da COP26, Fiona Clouder; o químico David King, líder do Conselho Consultivo de Crise Climática e ex-assessor científico do governo do Reino Unido; a ativista ambiental sueca Greta Thunberg; o arcebispo de Belo Horizonte e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Walmor Oliveira de Azevedo; a ativista ambiental, estudante de biologia e apresentadora Samela Sateré-Mawé, integrante da Associação de Mulheres Indígenas Sateré Mawé (AMISM), que tem sede em Manaus (AM); e o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande. Este último é o articulador do movimento Governadores pelo Clima. O grupo propõe o modelo de governança Consórcio Brasil Verde, que pretende buscar recursos para financiar projetos destinados à redução das emissões e que incentivem a geração de energia renovável, de acordo com informe oficial do governo capixaba.
"O tema das mudanças climáticas é importante para o Brasil. Os estados querem ajudar o país a alcançar suas metas. A criação desse consórcio, que será gerenciado pelos estados, terá um fundo único para se apresentar de forma transparente às instituições internacionais e a outros países", declarou o governador, que participou em julho de reunião virtual com o enviado especial dos Estados Unidos para o clima, John Kerry.
Também participaram da audiência na CMA as senadoras Eliziane Gama (Cidadania-MA) e Zenaide Maia (Pros-RN) e o senador Espiridião Amin (PP-SC). O evento foi aberto pela cantora baiana Margareth Menezes, que entoou os versos da canção Matança, de Augusto Jatobá, na qual são mencionadas 39 espécies vegetais brasileiras (um cipó e 39 árvores) e dois biomas: a Amazônia e a Mata Atlântica. O compositor avisa para o perigo da derrubada inclemente da vegetação.
Confira quais são os países que mais emitem carbono
Brasil está em 6º lugar.
(Clique no gráfico para ver os números)
Fonte: Climate Watch
Uma das dificuldades em reverter o quadro atual é que o aquecimento global se retroalimenta pela ação do próprio calor que, ao facilitar ou mesmo provocar incêndios e inibir o pleno funcionamento dos ecossistemas, acaba gerando mais emissão de gases ou inviabiliza a sua absorção. A lição que se tira é que, perturbados agressivamente, os mecanismos que propiciaram o desenvolvimento da vida na Terra, num período historicamente muito curto de 200 anos adquiriram potencial para revertê-la de paraíso em inferno.
“A coalizão global para emissões líquidas zero precisa crescer exponencialmente”, disse ainda em fevereiro deste ano o secretário-geral da ONU, António Guterres, lembrando que esse é um objetivo “central” das Nações Unidas para 2021 e que, na ocasião, faltavam apenas nove meses para a COP 26, “marco crítico nos esforços para evitar uma catástrofe climática.”
Segundo ele, os países que representam 70% da economia mundial e 65% das emissões globais de dióxido de carbono já haviam assumido o compromisso com emissões liquidas zero até 2050, mas isso não era suficiente. Seria necessário que todos apresentassem contribuições mais ambiciosas, com metas claras até 2030, por meio de “planos claros e confiáveis, uma vez que palavras não são suficientes”.
Em uma economia global repleta de desequilíbrios acirrados pela pandemia, as concessões não deverão ser conseguidas muito facilmente na COP26. A liderança do processo, advertiu o secretário-geral da ONU, é das principais economias e membros do G20. Um dos caminhos é a eliminação do carvão até 2030 nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), clube no qual o Brasil tenta entrar, e em todos os outros países até 2040. Os investimentos em carvão e outros combustíveis fósseis (petróleo, por exemplo) devem ser redirecionados para a transição energética. Para abrir mão de continuarem apoiando seus esforços de crescimento em modelos predatórios, os países em desenvolvimento poderão contar com um aporte de US$ 100 bilhões anuais por parte dos países desenvolvidos. Além disso, doadores e bancos multilaterais de desenvolvimento devem dedicar metade de todo o seu apoio nesta área para projetos de adaptação e resiliência aos efeitos do aquecimento.
O Brasil está na tripla condição de país em desenvolvimento, explorador de petróleo e um dos maiores emissores de carbono (6º ou 5º lugar, dependendo de como se faz a conta), principalmente em razão do desmatamento, segundo a ex-presidente do Ibama e especialista sênior em Políticas Públicas do Observatório do Clima, Suely Araujo.
— O desmatamento equivale a 44% das nossas emissões. Se somado ao que emitem as atividades agropecuárias, temos 70% das nossas emissões na categoria das Mudanças do Uso da Terra — explicou a especialista durante audiência pública na Comissão de Meio Ambiente do Senado (CMA), em 20 de agosto. A reunião foi coordenada pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), responsável por avaliar a política climática executada pelo governo Federal, com ênfase na prevenção e no controle de desmatamentos e queimadas nos biomas Amazônia, Cerrado e Pantanal, com o objetivo de identificar falhas, omissões e propor recomendações.
Suely Araujo observa que o lugar do Brasil no ranking de emissões o deixa numa posição de grande responsabilidade e na obrigação de ir além do habitual.
— Os compromissos do Brasil, como o de outros países, são insuficientes. É preciso reduzir não só o desmatamento ilegal, mas também aquele para o qual se pode obter autorização, de modo que nos aproximemos do desmatamento zero. Este ano ainda devemos desmatar dez mil quilômetros quadrados na Amazônia, o que é muito ruim, quando deveríamos desmatar no máximo três mil [quilômetros] de acordo com a política climática — afirmou.
A analista do Observatório do Clima assinala o embaraço causado pelo que se convencionou chamar de “pedalada climática”: O Brasil refez sua contabilidade de emissões no ano-base de 2005, para cima, mas não alterou os percentuais de corte propostos originalmente ao Acordo do Clima, em 2015. Resultado: abriu espaço para continuar emitindo muito CO2, inclusive por meio do desmatamento. A questão está na Justiça.
— Não adianta apenas reativar a fiscalização, mas fazê-la dentro de um planejamento amplo que envolva a retomada de planos setoriais para a Amazônia e o Cerrado e a utilização de recursos de R$ 3 bilhões do Fundo Amazônia que estão parados por implicância do governo Bolsonaro. A pressão tem de ser para o que o governo trabalhe, execute política públicas — sugeriu Suely Araujo.
A julgar pelas verbas orçamentárias planejadas e pagas, levando em conta apenas o Ministério do Meio Ambiente, a condução dessas políticas públicas tem destino incerto. Em 2021, os recursos destinada ao MMA são da ordem de R$ 2,9 bilhões, ou 0,1% do bolo destinado à área federal. Até o dia 8, haviam sido pagos R$ 1,6 bilhão, mas isso inclui restos a apagar de outros anos. A verba reservada a um fundo específico para programas relacionados à política climática é, percentualmente, ainda mais modesta: meros R$ 91,6 mil, ou 0,01% do orçamento da pasta.
Além da sentida desarticulação das áreas de fiscalização ambiental, que têm sido hostilizadas pelo atual governo, o país se ressente de estruturas e mecanismos que tornem mais dinâmico o trabalho de reduzir as emissões de carbono. Um desses instrumentos inclusive poderia carrear recursos externos ao Brasil, mas sequer está normatizado. Trata-se do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), mais conhecido como mercado de créditos de carbono. Ele está previsto na lei que instituiu a Política Nacional de Mudança do Clima (lei 12.187, de 2009) e é uma recomendação do Protocolo de Quioto, tratado internacional ratificado pelo Brasil. Está, portanto, há 12 anos esperando regulamentação — que poderá vir antes da COP26 — caso seja aprovado na Câmara dos Deputados e depois, no Senado, o Projeto de Lei (PL) 528/2021.
Conforme a Agência de Notícias da Câmara, o crédito de carbono é um certificado que atesta e reconhece a redução de emissões de gases do efeito estufa (GEE). Pelo projeto, um crédito de carbono equivalerá a uma tonelada desses gases que deixarem de ser lançados na atmosfera. Quem mantiver uma floresta em pé, fizer reflorestamento ou adotar qualquer medida que ajude a tirar carbono da atmosfera, poderá vender esse crédito para quem emite carbono — indústrias, projetos agropecuários ou de urbanização, por hipótese.
“Os títulos gerados serão negociados com governos, empresas ou pessoas físicas que têm metas obrigatórias de redução de emissão de GEE, definidas por leis ou tratados internacionais”, informa a mesma agência de notícias. O projeto em análise naquela Casa foi apresentado pelo deputado Marcelo Ramos (PL-AM).
Corremos contra o relógio
Estamos a caminho de atingir 1,5 grau de aquecimento mais cedo do que o previsto anteriormente.
Nos cenários estudados pelo IPCC, há mais de 50% de chance de que a meta de 1,5 grau seja atingida ou ultrapassada entre 2021 e 2040. Em um cenário de altas emissões, o mundo atingirá o limite de 1,5 grau ainda mais rapidamente — entre 2018 e 2037.
Se os países seguirem um caminho de altas emissões de carbono, o aquecimento global poderá subir para 3,3 graus a 5,7 graus acima dos níveis pré-industriais no final do século.
Em comparação, o mundo levou 3 milhões de anos para atingir um aquecimento global de mais de 2,5 graus. As emissões causadas pelo homem, como a queima de combustíveis fósseis e o corte de árvores, são responsáveis pelo aquecimento recente. Do 1,1 grau de aquecimento que vimos desde a era pré-industrial, o IPCC concluiu que menos de 0,1 grau se deve a forças naturais, como vulcões ou variações do Sol.
A terra pode parar de absorver CO2
O relatório do IPCC alerta para a possibilidade muito alta de que os sumidouros de carbono — a própria Terra e os oceanos — correm grande risco. Atualmente, eles absorvem mais da metade do dióxido de carbono que o mundo emite, mas se tornam menos eficazes na absorção de CO2 conforme as emissões aumentam. Em alguns cenários estudados, a terra deixa de ser um sumidouro de carbono e acaba se transformando em uma fonte, emitindo CO2 em vez de sugá-lo, o que pode levar a um aquecimento descontrolado. Já estamos vendo isso na floresta amazônica, devido a uma combinação de aquecimento local e desmatamento. Além de afetar os esforços climáticos mundiais, tal fenômeno representa riscos significativos para a segurança alimentar e hídrica dos países da região e pode levar à perda irreversível da biodiversidade.
O pior poderá vir
Muitas consequências das mudanças climáticas se tornarão irreversíveis com o tempo, principalmente o derretimento das camadas de gelo, a elevação dos mares, a perda de espécies e a acidificação dos oceanos. E os impactos continuarão a aumentar e se agravar à medida que as emissões aumentem.
A chance de passarmos dos pontos de não retorno, como o aumento do nível do mar devido ao colapso das camadas de gelo ou mudanças na circulação dos oceanos, não pode ser excluída de um planejamento futuro. A 3 graus e 5 graus, respectivamente, as projeções sugerem:
- Uma eventual perda quase completa da camada de gelo da Groenlândia, que contém gelo suficiente para elevar o nível do mar em 7,2 metros.
- Perda total da camada de gelo da Antártica Ocidental, que contém gelo equivalente para elevar o nível do mar em 3,3 metros.
Isso mudaria completamente a feição dos litorais em todos os lugares do planeta.
Estamos todos no mesmo barco
O relatório do IPCC mostra que nenhuma região ficará intocada pelos impactos das mudanças climáticas, com enormes custos humanos e econômicos que superam em muito os custos da ação. O sul da África, o Mediterrâneo, a Amazônia, o oeste dos Estados Unidos e a Austrália verão um aumento de secas e incêndios, que continuarão a afetar os meios de subsistência, a agricultura, os sistemas hídricos e os ecossistemas. As mudanças na neve, gelo e inundações de rios são projetadas para impactar a infraestrutura, transporte, produção de energia e turismo na América do Norte, Ártico, Europa, Andes e diversas outras regiões. As tempestades provavelmente se tornarão mais intensas na maior parte da América do Norte, Europa e Mediterrâneo.
Mais resiliência é a resposta ao estrago feito
Já induzimos tanto aquecimento no sistema climático que, mesmo com medidas rigorosas de redução de emissões, é certo que vamos enfrentar eventos climáticos extremos mais perigosos e destrutivos do que vemos hoje.
Conforme o IPCC, o sistema climático não responderá imediatamente à remoção de carbono. Alguns impactos, como a elevação do nível do mar, não serão reversíveis por pelo menos vários séculos, mesmo após a queda das emissões.
Uma das formas de nos contrapormos a isso é investir fortemente em resiliência, ou seja, na capacidade dos ecossistemas e dos seres humanos de recuperarem o equilíbrio depois de terem sofrido perturbações e danos, mas também de resistirem a agressões. Um sistema resiliente é capaz de absorver distúrbios, choques e ainda assim manter suas funções e estruturas básicas. Para isso é preciso converter a gestão ambiental convencional, que usualmente busca controlar mudanças em uma nova, que tenha capacidade de acolher as mudanças (lentas ou rápidas) dentro dos ecossistemas.
O modelo de comando e controle deve ser substituído pela cooperação entre agentes públicos e privados afetados pelas mudanças: governos, parlamentos, Poder Judiciário, usuários locais dos recursos, cientistas e membros da comunidade com conhecimento tradicional.
É preciso ter metas ambiciosas
Limitar o aquecimento global a 1,5 grau até o final do século ainda está ao nosso alcance, mas requer mudanças transformadoras, por meio de ações rápidas e de grande envergadura.
Mesmo com metas ambiciosas, o cenário projetado pelo IPCC inclui um pico potencial de 1,6 grau entre 2041 e 2060, após o qual as temperaturas caem abaixo de 1,5 grau até o final do século.
A quantidade total de carbono (o chamado orçamento de carbono) que podemos emitir para limitar o aquecimento a 1,5 grau é de apenas 400 gigatoneladas de dióxido de carbono (GtCO2) no início de 2020. Esse volume pode variar em 220 GtCO2 ou mais, levadas em consideração as emissões de outros gases de efeito estufa, como o metano. Presumindo níveis de emissões globais recentes de 36,4 GtCO2 por ano, em cerca de 10 anos o “orçamento” estará esgotado. Um dado que nos situa quanto à capacidade de reduzir o carbono: embora as emissões globais tenham caído devido à covid-19, elas voltaram a aumentar rapidamente.
Há que mudarmos hábitos
A forma como usamos e produzimos energia, fazemos e consumimos bens e serviços e administramos nossas terras terá de ser redefinida. Limitar os efeitos perigosos da mudança climática exige que o mundo alcance emissões líquidas zero de CO2 e faça grandes cortes nos outros gases de efeito estufa, como o metano. A remoção de carbono pode ajudar a compensar as emissões mais difíceis de abater, seja por meio de abordagens naturais, como o plantio de árvores, ou de abordagens tecnológicas, como a captura e armazenamento direto de ar.
Embora seja difícil atingir a meta de 1,5 grau — e isso vai exigir um gerenciamento das compensações — também há uma grande oportunidade: a transformação pode levar a empregos de melhor qualidade, benefícios para a saúde e para a vida na Terra. Governos, empresas e outros atores estão lentamente reconhecendo esses benefícios, mas é necessário agir com mais determinação, ousadia e rapidez.
Uma questão de compromisso
A mensagem do relatório é clara: esta é a década decisiva para limitar o aumento da temperatura a 1,5 grau. Se coletivamente falharmos em reduzir as emissões na década de 2020 e zerar as emissões líquidas de CO2 por volta de 2050, limitar o aquecimento a 1,5 grau está fora de alcance. O IPCC entende que agora é hora de governos, empresas e investidores intensificarem suas ações na proporção e na escala da crise. Durante os últimos meses antes das negociações climáticas da COP26, em Glasgow, Escócia, é crucial que os países proponham metas de redução de emissões mais fortes para 2030 e se comprometam a atingir a neutralidade de carbono até a metade do século, se não antes. Esses compromissos precisam ser assumidos com as conclusões do relatório do IPCC em mente, para que haja chance de um futuro menos catastrófico.
Temos a ciência a nosso favor
Nossa compreensão do clima e da conexão dos eventos meteorológicos extremos com o aquecimento induzido pelo homem tornou-se muito sofisticada. Estão disponíveis dados observacionais, reconstruções paleoclimáticas aprimoradas, modelos de alta resolução, capacidade de simular o aquecimento recente e novas técnicas analíticas. Um estudo recente descobriu que o calor extremo (que se tornou pelo menos duas vezes mais provável como resultado da mudança climática induzida pelo homem) foi um dos principais impulsionadores dos recentes incêndios na Austrália, por exemplo. Outro estudo preliminar sugere que o recente calor extremo no noroeste do Pacífico dos EUA e Canadá seria "virtualmente impossível" sem as mudanças climáticas causadas pelo homem.
Os cientistas também descobriram que a influência humana é o principal motor de muitas mudanças na neve e no gelo, nos oceanos, na atmosfera e na terra. As ondas de calor marinhas, por exemplo, tornaram-se muito mais frequentes no século passado, e o IPCC observa que as atividades humanas contribuíram com 84% a 90% delas desde pelo menos 2006.
Todo esse arsenal de conhecimento e capacidade tecnológica de monitoramento será crucial para acompanhar a trajetória das mudanças climáticas e apontar caminhos para minorar os danos e fortalecer ecossistemas e comunidades humanas.
Mas para isso é preciso que os países garantam investimentos à continuidade e ao aumento das pesquisas, além de incentivarem o desenvolvimento de tecnologias e ouvir os cientistas na hora de formularem políticas públicas voltadas ao clima.
Uso da terra
A derrubada de cobertura vegetal mostra-se um dos aspectos mais danosos da relação do Brasil com seu meio ambiente, que acaba se refletindo historicamente em outros, como a ocorrência de incêndios, a redução da superfície das águas e a degradação dos rios por garimpos (ver matéria sobre garimpos no "Saiba mais").
Esses três temas foram abordados em relatórios amplos divulgados recentemente pela organização MapBiomas cobrindo o período de 1985 a 2020 a partir do processamento detalhado de imagens de satélites.
Nesses 36 anos, o Brasil perdeu 82 milhões de hectares de vegetação nativa, área equivalente a três vezes e meia o território do estado de São Paulo, principalmente para a agropecuária. A superfície de rios e outras fontes naturais de água foi reduzida em 7,6%, mas se observado apenas o período de 1991 a 2020, a perda dobra para 15,7%.
“O sinal mais assustador, mais preocupante, foi a perda de água nas várzeas. Essas áreas têm uma dinâmica de expansão e contração, mas nos últimos anos nós temos observado que a água não está expandindo mais”, disse o coordenador do Grupo de Trabalho de Águas do MapBiomas, Carlos Souza, durante o lançamento desse relatório específico.
“Essas pesquisas têm correspondência com os relatos de campo. Há escassez maior de água, maior intensidade do período de estiagem. Outro aspecto muito importante: a gente tem uma frequência e uma intensidade maior das queimadas em Roraima”, disse Haron Xaud, pesquisador da Embrapa naquele estado e líder do Projeto Terraamz.
A perda de água detectada pelo MapBiomas é circunstancialmente agravada, dependendo das condições metereológicas de curto prazo, o que está levando a prejuízos além do puramente ambiental, com fortes impactos na economia e na vida social. No momento, a diminuição do nível dos reservatórios de água para a abastecimento vai voltando a níveis da última grande crise hídrica. Isso porque o desmatamento na Amazônia prejudica o fluxo de umidade dos chamados rios voadores em direção ao Sudeste, conforme Pedro Luiz Cortês, professor do Programa de Pós Graduação em Ciência Ambiental na Universidade de São Paulo (USP), explicou na apresentação do relatório.
Os lagos das hidrelétricas estão do mesmo modo em níveis muito baixos, com sérios riscos ao fornecimento de energia elétrica, o que já repercute nas contas de luz. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou aumento no preço de cada 100 quilowatts hora de R$ 6,24, em junho, para R$ 9,49, em julho, aumento de 52,04%, mas já está previsto novo aumento de 15% em setembro. Para não causar um colapso na geração de oito usinas localizadas ao longo das bacias dos rios Tietê e Paraná, o governo determinou a retenção de água nos reservatórios das hidrelétricas, mas isso acabou levando à diminuição do volume da hidrovia Tietê-Paraná e, por conseguinte, do transporte de soja por aquele modal. Já estão previstas demissões no setor, sem contar a necessidade de desvio de parte substancial da carga das barcaças para rodovias, com aumento de custos e de poluição. Esta vai igualmente aumentar pelo uso de termoelétricas, que ainda por cima geram energia mais cara. Só no setor de transporte hídrico, estima-se prejuízo de R$ 3 bilhões, mas a seca combinada a geadas de um inverno incomum está prejudicando a própria safra de grãos, que não sairá ilesa este ano.
A crise hídrica e energética foi discutida na quarta-feira (8) em reunião da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados. Lá, o representante da Aneel informou que a capacidade geral dos reservatórios das usinas hidrelétricas pode ficar abaixo dos 19% registrados na crise de 2014. Atualmente está em 28,8%. Segundo a Agência Câmara de Notícias, especialistas presentes na audiência disseram achar que "o governo agiu tarde diante da falta de chuvas".
Cerrado perdeu quase a metade de sua cobertura natural
Amazônia perdeu 44 milhões de hectares em 36 anos
O aspecto mais dramático dos relatórios do MapBiomas é o fogo, que não dá sossego em várias regiões e provoca cenas de horror pela visão de animais selvagens e domésticos calcinados, principalmente no Pantanal Matogrossense, mas também do desespero de ribeirinhos e fazendeiros. Segundo o MapBiomas Fogo, em 36 anos o Brasil queimou 1,7 milhão de quilômetros quadrados, ou cerca de 20% do território nacional, numa escala crescente. A cada ano, uma área maior que a Inglaterra foi afetada, sendo que 61% queimou duas vezes ou mais.
Ao contrário do que se poderia pensar, o fogo não afeta apenas o Pantanal, a Amazônia, o Cerrado e até a já bastante devastada Mata Atlântica. Bioma exclusivamente nosso, no qual imaginamos uma agropecuária de convivência passiva na região do semiárido, a Caatinga é palco de queimadas, hábito cultural arraigado nos brasileiros. Associado à criação de gado e caprinos, o fogo está degradando tanto o solo em vários estados nordestinos que o risco do aparecimento de desertos é altíssimo:
— A desertificação é causada por fatores climáticos, associados à degradação ambiental, como desmatamento, sobrepastoreio [pecuária acima do limite suportável], queimadas, práticas agrícolas inadequadas, que levam à perda do solo, à erosão e, consequentemente, à degradação grave e à desertificação — explica o doutor em meteorologia Humberto Barbosa, professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e coordenador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis). (ver entrevista na íntegra mais à frente).
Na reunião da CMA do dia 20, a coordenadora do Programa Cerrado e Caatinga (ISPN), Isabel Figueiredo, chamou a atenção para a urgência de se estabelecer um sistema de alertas de incêndios nesses biomas nos mesmos moldes do que já é feito na Amazônia.
— As áreas de vegetação aberta, como as do Cerrado, podem dar a impressão de que não absorvem carbono, mas as raízes profundas são muito úteis nessa tarefa — disse a pesquisadora.
Entre as medidas sugeridas à CMA para a redução nas emissões de CO2, a coordenadora do ISPN deu ênfase à ampliação do Manejo Integrado do Fogo (MIF), um conjunto de técnicas e práticas que visam, além de reduzir os incêndios, proteger regiões e territórios que são mais sensíveis, como as veredas, as matas e também moradias e lavouras.
— Hoje o ICMBio e o Ibama já utilizam o MIF em algumas unidades de conservação e terras indígenas, mas esse uso precisa ser ampliado para todas as áreas protegidas, pelo menos no Cerrado e no Pantanal. E para as áreas privadas. As reservas legais das fazendas também têm de ser manejadas, de modo que não queimem e o fogo passe eventualmente a uma área protegida. Até porque elas são também áreas protegidas.
O manejo tem como uma de suas providências a queima preventiva de trechos escolhidos no final da estação chuvosa e início da estação seca, sob a vigilância de brigadistas e em horários específicos, de maneira que o excesso de biomassa seja eliminado, evitando incêndios de grandes proporções e criando barreiras à progressão do fogo.
— O fogo é, sim, um aliado para reduzir incêndios no caso no Cerrado, do Pantanal. Isso já está bastante estudado, já tem uma série de artigos científicos mostrando os benefícios. A redução é de até 40% a mais nas emissões de carbono do que essa se essa mesma área fosse queimada no auge da seca, em setembro, outubro.
Segundo Isabel Figueiredo, há um projeto de lei parado na Câmara sobre o assunto desde 2018, apesar de requerimento de urgência assinado por todos os líderes, inclusive o agora presidente da Casa, Arthur Lira. Entre as mudanças propostas, O PL 11.276/2018 envolve mais gente na formulação e na estratégia do manejo e profissionaliza os brigadistas.
Do ponto de vista socioambiental, a pesquisadora enfatizou a premência de se reconhecer os territórios ocupados por povos indígenas, por comunidades tradicionais e agricultores familiares, por manterem grandes áreas de vegetação nativa em meio às suas áreas produtivas, o que é chamado tecnicamente de "mosaico".
— A gente pode observar nesses locais a continuidade dos ciclos de água, a fixação e a continuidade dos ciclos de carbono, além de outros processos ecológicos, como a conservação do solo, a polinização, a dispersão, os fluxos de biodiversidade. A FAO [braço da ONU para a alimentação] publicou recentemente um relatório mostrando evidências do papel fundamental dessas comunidades e desses povos indígenas na conservação da vegetação nativa e na manutenção de estoques de carbono no planeta inteiro — disse Isabel Figueiredo.
A argumentação dela encontra apoio numa das descobertas do MapBiomas Fogo: embora ameaçadas e, muitas vezes, invadidas, as terras indígenas estão entre as áreas que menos queimaram de1985 a 2020.
A representante do ISPN pediu também que seja feito um esforço para engajar a sociedade como um todo na questão do clima e da emissão de gases de efeito estufa, visto muitas vezes como um assunto distante dos cidadãos comuns que, a despeito disso, sentem na pele o aumento da temperatura local e a falta de chuvas.
— A gente pode estar muito próximo do momento a partir do qual o colapso se deu e já não se pode voltar. Essas informações ainda são mistério para a ciência e a gente precisa se antecipar. Ainda não é, não é ainda, mas a gente está quase lá — advertiu.
Na mesma reunião, Leonardo Gomes, diretor de Relações Institucionais do Instituto SOS Pantanal, deu um exemplo do que pode ser esse ponto sem retorno, ao citar estudo coordenado por José Marengo, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais.
— Levando em conta o cenário da pior seca dos últimos 50 anos em 2021, quando algumas regiões do Pantanal vão chegar próximo dos 40 graus de temperatura e 10% de umidade, é possível imaginar esse cenário ainda mais intensificado até o final do século, um cenário de muita preocupação, e até de desertificação de muitas áreas do Pantanal.
Se o Pantanal passar a abrigar desertos, não será por falta de aviso.
Entrevista com Ivan Anjo Diniz, coordenador da Rede Contra o Fogo
Projetos de lei relacionados às mudanças climáticas:
- PL 11.276/2018: institui a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo;
- PL 528/2021: institui o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), por meio do qual se dará a compra e a venda de créditos de carbono no país;
- PL 191/2020: estabelece as condições específicas para a realização da pesquisa e da lavra de recursos minerais e hidrocarbonetos e para o aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica em terras indígenas e institui a indenização pela restrição do usufruto de terras indígenas;
- PL 490/2007: estabelece que as terras indígenas serão demarcadas através de leis e, na prática, estabelece 1988 como o marco temporal para a ocupação de terras legalizáveis por comunidades indígenas;
- PL 2.847/2021: amplia o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, localizado nos municípios de Alto Paraíso de Goiás, Cavalcante, Nova Roma, Teresina de Goiás e São João da Aliança, para o estado de Goiás;
- PDC 1.100/2018, com origem na MSC 308/2018: aprova o texto da Emenda de Kigali ao Protocolo de Montreal. A emenda prevê reduções graduais na produção e utilização de gases não agressivos à camada de ozônio (hidrofluorcarbonbos-HFCs), mas causadores de efeito estufa;
- PDL 406/2019, com origem na MSC 600/2018: aprova o texto do Acordo de Cooperação Antártica entre Brasil e Chile, de 2013, com repercussão na proteção ambiental da Antártida.
- Projeto de Lei (PL) 2159/2021: estabelece normas gerais para o licenciamento de atividade ou de empreendimento utilizador de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidor ou capaz de causar degradação do meio ambiente.
Normas ambientais relacionadas às mudanças climáticas
- Lei 12.187, de 2009: institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC)
- Lei 11.284, de 2006: dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável, institui o Serviço Florestal Brasileiro (SFB) no âmbito do Ministério do Meio Ambiente e cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF)
- Compilado de normas ambientais federais e estaduais - Senado, 2013
Entrevista
Humberto Barbosa, pesquisador do Lapis/Ufal
“A mudança climática precisa integrar a agenda governamental”
Professor associado do Instituto de Ciências Atmosféricas da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e coordenador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), Humberto Barbosa é uma das principais referências no Brasil em recepção, processamento, análise e distribuição de dados de satélites para fins metereológicos. Graduado em 1995 no curso de Meteorologia da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), é mestre em Sensoriamento Remoto pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), doutor em Ciência do Solo/Sensoriamento Remoto pela Universidade do Arizona (Uofa) e pós-doutor pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme). Além de outras colaborações em projetos internacionais voltados a estudos metereológicos, participou como editor e coordenador de capítulos do último relatório do IPCC sobre as mudanças climáticas, com destaque para o que trata da degradação dos solos.
Uma de suas mais importantes pesquisas resultou no livro Um Século de Secas, que amplifica a análise de problemas ambientais complexos, como desertificação e mudança climática em municípios do Semiárido brasileiro. O resultado é a constatação, por meio de uma metodologia própria, da convergência de vulnerabilidades ecológicas, socioeconômicas e institucionais que levam à falta de resposta desses municípios aos problemas ambientais em si. “A questão passa necessariamente pela agenda das políticas e deve ser direcionada à esfera local, onde cada município enfrenta os impactos crescentes da mudança climática”, opina Barbosa, que defende ainda uma participação mais efetiva do Poder Legislativo na definição dos rumos que o país deve adotar para cumprir suas responsabilidades com a limitação do aquecimento global.
Agência Senado — O IPCC fez aquele que foi o alerta mais contundente em toda a sua história no início de agosto. O senhor acha que a repercussão na imprensa, nos meios governamentais e na sociedade está altura do conteúdo do relatório?
Humberto Barbosa — Sim. Em 2019, eu participei da elaboração do relatório especial do IPCC sobre mudança climática e degradação das terras. Desde aquela ocasião, já percebi uma cobertura mais abrangente por parte da mídia brasileira e da comunidade científica. Porém, com relação à governança, percebo que a mudança climática ainda não integra a agenda governamental, com a dimensão que deveria, na definição das políticas. E aí eu incluo a participação da sociedade civil nesse processo de governança.
Nós fizemos uma pesquisa, que resultou no livro Um Século de Secas, na qual definimos uma metodologia para analisar a governança de problemas ambientais complexos, como desertificação e mudança climática, em municípios do Semiárido brasileiro. Identificamos uma convergência de vulnerabilidades (ambiental, climática, à desertificação, institucional), que quando associadas à vulnerabilidades socioeconômicas (pobreza, baixo Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), insegurança hídrica e alimentar), resulta em falta de capacidade institucional desses municípios para lidar com esses problemas ambientais.
A questão passa necessariamente pela agenda das políticas e deve ser direcionada à esfera local, onde cada município enfrenta os impactos crescentes da mudança climática. Por exemplo, a perda de produtividade do solo, pois o Semiárido brasileiro já conta com 13% do seu território em processo de desertificação.
Agência Senado — Quais são, na sua opinião, as grandes novidades desse relatório? O que deveria nos deixar mais mobilizados, se é que tudo não é assustador na mesma medida?
Humberto Barbosa — Destaco dois pontos: em primeiro lugar, a parte do aumento do nível dos oceanos, que vão continuar mesmo se cumprirmos todas as metas previstas, de redução a zero nas emissões. E o processo irreversível de derretimento do gelo nas regiões polares e de derretimento do gelo nas geleiras das montanhas. Em segundo, a frequência e a intensidade dos eventos extremos, aumentando as áreas de inundações e secas, em várias regiões do globo.
Desde o último relatório de avaliação do IPCC em 2013, há evidências crescentes de que os furacões têm se tornado mais intensos e intensificados mais rapidamente do que há 40 anos.
O que deveria nos deixar mais mobilizados é o controle do desmatamento na Amazônia, pelo papel que ela exerce no clima regional e global. Vale lembrar que a Amazônia é responsável diretamente pelas chuvas na região Sudeste, que abriga, de longe, a maior parte da população, além dos principais setores econômicos.
Agência Senado — No papel de um estudioso dos processos de desertificação, como vê o avanço desse fenômeno no Brasil? O que pode ser feito para frear a marcha dos desertos?
Humberto Barbosa — O que pode ser feito é o manejo adequado dos recursos naturais, principalmente no Semiárido brasileiro e nas áreas subúmidas secas, que concentram o processo de desertificação no Brasil. A desertificação é causada por fatores climáticos, associados à degradação ambiental, como desmatamento, sobrepastoreio [pecuária acima do limite suportável], queimadas, práticas agrícolas inadequadas, que levam à perda do solo, à erosão e, consequentemente, à degradação grave e à desertificação.
Como vejo o avanço no Brasil: As áreas desertificadas, ou seja, com solos degradados de forma grave ou muito grave são um laboratório da possível expansão que pode ocorrer em outras áreas e que aumenta a fome da população que vive da agricultura de sequeiro. Então, é preciso conter os principais mecanismos dessa degradação, citados acima. Por outro lado, tem a questão ecológica, de perda da diversidade biológica, de muitas espécies que sequer foram exploradas pela ciência. É por isso que o aumento das áreas de conservação é necessário, para que possa garantir esse patrimônio biológico para as futuras gerações.
Agência Senado — Nas últimas semanas, uma série de estatísticas estarrecedoras têm sido divulgadas. É o fogo novamente no Pantanal, na Amazônia, em áreas do Cerrado e até na Mata Atlântica. Há dados também sobre a diminuição da superfície de cursos d’água e de lagoas. Dizem que “o Brasil está secando” e, no caso dos reservatórios usados para gerar eletricidade, há uma seca temporária gravíssima, até com risco de apagões. Para onde caminha o país?
Humberto Barbosa — São os chamados eventos extremos e temos chamado atenção, do ponto de vista climático, para o aumento na frequência e intensidade da seca, que influencia as próprias queimadas na Amazônia, é claro, associadaacabei de liberar e ia fazer à ação humana. Todos esses fatores estão interligados. Recentemente, publicamos um artigo, em um periódico internacional, sobre o aumento das secas extremas na Amazônia. Identificamos que, desde os anos 1970, esse fenômeno se tornou mais frequente e intenso na Amazônia. Agora, está para sair um novo artigo, no qual analisamos toda a Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, que segue um padrão similar. Ou seja: nas últimas décadas aumentou a quantidade de secas de intensidade extrema.
Nos últimos anos, toda aquela área do Rio São Francisco vem enfrentando degradação, com a mudança no uso e ocupação do solo, que inclui a conversão de terras para a agricultura, em detrimento da vegetação nativa.
Outra característica é que tanto a Amazônia quanto a Bacia do Rio São Francisco, principalmente no oeste da região Nordeste, têm aumentado a quantidade de queimadas, em razão justamente dessas atividades antrópicas, associadas ao próprio processo de mudança ambiental.
Agência Senado — Como avalia, do ponto de vista da sustentabilidade, projetos de distintos governos como a entrega de parques nacionais à iniciativa privada, a Usina de Belo Monte e a transposição do Rio São Francisco?
Humberto Barbosa — O Brasil já deveria ter se engajado efetivamente na agenda ESG [sigla em inglês para “boas práticas ambientais, sociais e de governança”]*, ou seja, uma agenda de políticas que atenda as demandas sociais e econômicas, mas tendo a sustentabilidade ambiental como diretriz. Nessa agenda, cabe a parceria público-privada, faz parte da governança, desde que seja efetivamente participativa. Foi isso que trabalhamos na pesquisa do livro Um Século de Secas, com relação à governança participativa das águas no Brasil. E vale lembrar que não é possível atender a uma agenda ESG sem investimentos fortes em educação, ciência, tecnologia e inovação.
(*) “Environmental, Social and Governance”.
http://www.ibama.gov.br/noticias/66-2015/393-parecer-do-ibama-identifica-pendencias-que-impedem-a-emissao-da-licenca-de-operacao-para-belo-monte
Agência Senado — Assim como a maior parte dos países, o Brasil vinha tendo dificuldades de avançar com mais força e rapidez em direção a uma economia limpa e uma diminuição das emissões de CO2. Nos últimos anos, houve um rompimento desses esforços no discurso e na prática. Quais devem ser as consequências se o país quiser, em algum momento, retomar de fato seus compromissos com a desaceleração do aquecimento global?
Humberto Barbosa — Em primeiro lugar, retomar o papel de protagonismo ambiental que o Brasil sempre exerceu e cumprir as metas do Acordo de Paris. Em novembro vai acontecer a COP26, na qual haverá a negociação sobre a precificação do carbono. E isso é de grande interesse para o Brasil. O nosso maior problema com as emissões hoje, é conter o desmatamento/queimadas e boas práticas de produção agropecuária, que inclui a agricultura de baixo carbono.
Agência Senado — Individualmente ou como parte de algum grupo ou instituição, o senhor tem propostas de metas ou estratégias para cortes de emissão de carbono pelo Brasil. Em outros termos, quais as propostas de metas e estratégias a comunidade científica brasileira tem a apresentar aos governantes, lembrando que a COP26 será daqui a pouco, em novembro?
Humberto Barbosa — De forma geral, a comunidade científica tem chamado atenção para a retomada das políticas de proteção aos biomas brasileiros, principalmente Amazônia, Cerrado e Caatinga, sendo esta última a mais impactada pela mudança climática. A proteção desses biomas inclui monitoramento contínuo. A Caatinga, por exemplo, ainda não conta com um programa institucional de monitoramento de desmatamento, como o Prodes da Amazônia, que foi implantado em1988. São necessários também a fiscalização dos crimes contra o patrimônio ambiental brasileiro; o cumprimento das leis ambientais para coibir ações como desmate e queimadas; a valorização das comunidades indígenas e quilombolas, que exercem um papel importante nessa conservação e prospecção de espécies nativas desses biomas para fomentar econegócios nas comunidades, ou seja, promover a sustentabilidade com iniciativas inovadoras, que reduzam a pobreza.
Agência Senado — O relatório do IPCC fala da necessidade de se adotar metas ousadas, de se ter compromisso e efetividade na redução das emissões. Vê o Brasil com disposição e capacidade política para uma tarefa dessa envergadura?
Humberto Barbosa — O Parlamento brasileiro exerce um papel importante nesse processo, pois não só define as políticas como fiscaliza o cumprimento da legislação. Nesse sentido, com uma participação ativa dos parlamentares, é possível reverter a atual conjuntura ambiental brasileira. A capacidade política, nós já mostramos, em alguns momentos históricos, que tivemos, como a Constituição de 1988, que garantiu vários direitos socioambientais, em um momento em que ainda se falava muito pouco sobre esse assunto, em todo o mundo. A ECO-92 trouxe essa discussão da sustentabilidade para o Brasil, com os primeiros movimentos ambientalistas que contaram com a participação política. Então, temos expectativa de que a participação do Parlamento, nos próximos anos, recupere o papel histórico de protagonismo que exerceu em um passado recente.
Agência Senado — O que cabe a cada parte nessa tarefa desafiadora: setor público, setor privado empresarial e sociedade? Vale a pena pedir a pessoas que deixem de usar sacolinhas plásticas de supermercado ou isso não vai ter maiores consequências se a poluição de grandes fontes continuar acelerada e as fiscalização ambiental, desmantelada?
Humberto Barbosa — Mais uma vez, destaco a governança participativa, que envolve os três setores, para a gestão conjunta dos recursos naturais. Por exemplo, a questão da água, que requer uma adaptação de vários setores econômicos, para se ajustar a essa demanda contemporânea da mudança climática. A água se tornou uma commodity, que vai indexar as economias, sendo preciso iniciativas de conservação desse recurso natural, como um dos maiores ativos econômicos do futuro. No livro, discutimos amplamente esse processo, relacionado à mudança climática.
Agência Senado — A ciência avançou muito na detecção e no monitoramento de fenômenos climáticos e ambientais em geral, mas muita gente ainda duvida da palavra dos cientistas. E nos centros de decisão muitas vezes o apoio político e financeiro é negado à ciência. Com que forças, ela continuará a exercer seu papel?
Humberto Barbosa — O Brasil depende da ciência, para conseguir avançar em algumas áreas. Há a necessidade de ter a ciência como pauta das políticas públicas. O Brasil tem muitos problemas sociais e econômicos, de modo que a ciência, tecnologia e educação são primordiais para que o país ao menos recupere sua posição anterior.
Como autor de um relatório do IPCC, identificamos justamente essa necessidade de que países tropicais, como o Brasil e a África, pautem ações econômicas e decisões, em função do conhecimento científico que produzem. A agricultura tropical do Brasil é um exemplo de como a ciência fortaleceu essa área estratégica. Só a ciência pode ajudar nesse salto de competitividade, para superarmos as crises econômicas que enfrentamos, desde os anos 1970. É o caso da Embraer, que foi fundamental para o avanço da tecnologia espacial.
Agência Senado — A redução do aquecimento global é uma tarefa a ser compartilhada pelo conjunto das nações. O que pensa que pode ser realmente efetivo nesse concerto: ajuda financeira direta, programas de crédito de carbono, transferência de tecnologia?
Humberto Barbosa — A implementação e o cumprimento das metas do Acordo de Paris são o passo principal. Mas zerar as emissões até 2050 é o maior desafio dos países, que passa pelo investimento em uma matriz energética mais limpa, bem como na reestruturação do setor de transporte e da maneira como produzimos alimentos.
BIOMAS
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Reportagem: Nelson Oliveira Pauta, coordenação e edição: Nelson Oliveira Coordenação e edição de multimídia: Bernardo Ururahy Edição de tratamento de fotos: Ana Volpe Infografia: Cássio Costa, Cláudio Portella e Diego Jimenez Arte da capa: Bruno Bazílio Veja mais Infomatérias
Fonte: Agência Senado
https://www12.senado.leg.br/noticias/infomaterias/2021/09/o-aquecimento-global-no-limite
Desastres em todo o mundo podem estar interconectados
Relatório conclui que distintas catástrofes climáticas, pandemias e outras crises podem ser geradas e agravadas por mesmos fatores
DW Brasil
Uma onda de frio no Texas; uma nuvem de gafanhotos na África Oriental; um peixe da China que, depois de sobreviver à extinção dos dinossauros, em 2020 sucumbiu irreversivelmente aos seres humanos. Embora separados por fronteiras e oceanos, e afetando espécies individuais ou ecossistemas e comunidades inteiros, desastres como esses têm mais em comum do que se percebe ou se planeja.
Essa é uma conclusão-chave de um relatório publicado nesta quarta-feira (08/09) pela Universidade das Nações Unidas (UNU). Seus pesquisadores descobriram que algumas das piores catástrofes dos últimos dois anos se superpuseram, agravando-se mutuamente. Em diversos casos, foram impulsionadas pelas mesmas ações humanas.
"Quando a gente vê desastres no noticiário, eles costumam parecer distantes", comenta Zita Sebesvari, chefe de pesquisas da UNU e uma dos principais autores do relatório. "Porém mesmo os que ocorrem a milhares de quilômetros de distância muitas vezes estão relacionados entre si."
Três causas básicas afetaram a maior parte dos eventos contemplados na análise da UNU: a queima de combustíveis fósseis, má gestão de risco e a falha de dar o devido valor ao meio ambiente na tomada de decisões.
Algas, uma solução mágica para o clima?
Muitos dos eventos registrados estão relacionados a situações meteorológicas extremas. No Vietnã, uma cascata de nove tempestades separadas, chuvas pesadas e inundações devastaram o país em apenas dois meses. Um ciclone mortal, potencializado pela mudança climática, se abateu sobre Bangladesh em meio à pandemia de covid-19, enquanto trabalhadores cumpriam quarentena nos abrigos anticiclone.
Ocorrências como essas "se alimentam reciprocamente", explica o também coautor do estudo da UNU Jack O'Connor: se os abrigos de emergência estão sendo usados para proteger a população de intempéries e alojar pacientes de covid-19, menos cidadãos vão poder – ou querer – utilizá-los. Quem o faz, fica mais exposto ao coronavírus.
E então quando o ciclone chega, ele danifica os hospitais e interrompe as cadeias de fornecimento necessárias ao tratamento médico. "Não se configuram as medidas contra ciclones tendo em mente uma pandemia", nota O'Connor. "Mas é o tipo de coisa que vamos ter que começar a fazer."
DESMATAMENTO NO BRASIL
O perigo dos eventos extremos compostos
O relatório da UNU chega uma semana após uma análise da Organização Meteorológica Mundial (OMM) mostrar que, nos últimos 50 anos, em média ocorreu um desastre de fundo meteorológico por dia – de furacões a secas –, matando 115 pessoas e causando perdas de 202 milhões de dólares.
Por outro lado, embora os humanos sigam queimando combustíveis fósseis e aquecendo o planeta, o saldo fatal do mau tempo extremo está diminuindo, principalmente graças aos avanços na previsão e nos sistemas de aviso precoce, os quais permitem aos governos evacuarem as populações das áreas em risco antes que as intempéries ocorram.
Assim, tormentas e enchentes devastadoras estão matando menos, porém deixando mais desabrigados. No entanto não está garantido que essa proporção vá se manter, à medida que o planeta se aquece e mais catástrofes se sobrepõem.
Segundo um relatório referencial do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) publicado em agosto, provavelmente a influência humana já vem elevando a probabilidade de "eventos extremos compostos" desde a década de 1950.
Ondas de calor e secas concomitantes, por exemplo, são mais comuns por todo o mundo. Em algumas regiões observam-se tendências semelhantes de chuvas pesadas, tormentas súbitas ou incêndios.
Caso o planeta se aqueça 4 ºC acima dos níveis pré-industriais, as ondas de calor que costumavam ocorrer a cada 50 anos podem se tornar 39 vezes mais frequentes, segundo as projeções do IPCC. O aumento atual já é de 1,1 ºC. Embora os líderes mundiais tenham se comprometido a limitar o aquecimento a 1,5 ºC até o fim do século, suas presentes políticas miram antes o dobro dessa marca.
Três exemplos: China, Austrália, Brasil
O relatório da UNU destaca três exemplos específicos de crises ecológicas estreitamente ligadas à mudança climática. Cerca de 25% da Grande Barreira de Coral da Austrália já se branqueou gravemente em 2020, e os recifes de corais se reduzirão em 70% a 90%, caso o aquecimento global chegue 1,5 ºC. Com um acréscimo de 2 ºC, praticamente todos os corais do mundo desaparecerão.
Embora a mudança climática seja o principal fator dessa ameaça, a resiliência de um recife também depende de agravantes como a poluição e a sobrepesca, lembra O'Connor, que em seu treinamento como cientista marinho teve ocasião de ver recifes de coral antes e depois do branqueamento.
"É como Procurando Nemo, cheio de cor e vida", compara, referindo-se ao popular filme de animação 3D. "Quando se visita um recife branqueado devido ao aumento das temperaturas oceânicas, toda a cor se foi, tudo fica branco. Mas não só isso: é como um cemitério, todos os animais foram embora."
Na Amazônia, centenas de milhares de hectares de vegetação foram queimados para satisfazer a demanda global de carne, tanto para transformar a mata em pastos como para plantar soja para alimentar o gado. Isso reduziu o volume de poluição carbônica que a floresta era capaz de absorver. Alguns estudos sugerem que o desmatamento e o aquecimento global acelerarão a extinção da vegetação até um ponto de guinada em que a floresta tropical se transformará em savana seca.
No rio Yangtzé, China, o peixe-espátula-chinês foi exterminado em 2020, após décadas de sobrepesca, poluição e a construção de diversas represas, isolando-os de sua área de procriação, corrente acima. Como no caso dos recifes de coral, a perda de uma espécie num ecossistema pode bastar para que todo o sistema entre em colapso.
Todos podem sair lucrando?
O resultado do relatório da UNU enfatiza como os tomadores de decisões podem se concentrar num punhado de "soluções win-win", em que todos saiam ganhando, a fim de prevenir desastres – como reduzir as emissões carbônicas ou planejar a infraestrutura com mais respeito pela natureza.
Tanto na Amazônia como no Yangtzé, observam os autores, governo e empresas alteraram as paisagens para explorar recursos economicamente valiosos, porém muitas vezes sem levar em conta os custos ambientais. O estudo também reflete sobre o custo de ignorar as conexões entre desastres e impor soluções que pioram outros extremos.
As represas que contribuíram para a extinção do peixe-espátula-chinês, por exemplo, geram energia hidrelétrica limpa, oferecendo uma alternativa à queima de combustíveis fósseis. Em alguns casos, o retorno talvez não valha a pena; em outros, políticas direcionadas podem compensar os danos. "Não podemos nos permitir mais adotar soluções míopes, que acabam saindo pela culatra mais tarde", exorta said O'Connor. "Precisamos fazer melhor."
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/desastres-em-todo-o-mundo-podem-estar-interconectados/a-59125593
A catastrófica reação em cadeia à seca do rio Paraná
Quando um rio seca, a tragédia é visível. Suas águas desaparecem, dando lugar a uma paisagem terrosa e estampada com novas ilhas
Juliana Gragnani / BBC News Brasil
Por trás dessa imagem, contudo, uma série de eventos catastróficos começam a acontecer em cadeia, como num efeito dominó.
O caudaloso rio Paraná, que percorre quase 5 mil quilômetros desde sua nascente no Brasil até sua foz no Rio da Prata, está secando. Trata-se do segundo maior rio da América do Sul depois do Amazonas, um que alimenta importantes afluentes, como o Iguaçu, onde ficam as cataratas, e que drena o sul do continente - Paraguai, Argentina, Bolívia e o sul do Brasil. É ali, na fronteira entre Brasil e Paraguai, que fica a Usina Hidrelétrica de Itaipu.
A pior seca em 91 anos no Brasil causou uma diminuição histórica das águas do rio, afetando sua navegabilidade, por onde há exportação agrícola e industrial, e quem depende dele para sobreviver. Com a estiagem, sofrem pescadores da beira do rio, trabalhadores de hidrovias, operadores logísticos, empresários do agronegócio e, claro, a população brasileira, vítima da alta de preços e de uma grave crise energética.
Sem contar os vizinhos argentinos e paraguaios, com problemas semelhantes, principalmente em relação ao escoamento de produção.
Essa reação em cadeia a um só evento ilustra temores do que nos espera no futuro, com a emergência do clima e mais eventos climáticos extremos, como previsto no último relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre o Clima da ONU). Por causa da ação humana, o planeta está aquecendo, fato que já vem provocando consequências alarmantes. Na América do Sul, o aumento da seca e da aridez é uma das previsões do grupo de cientistas da ONU.
No caso do Paraná, especialistas apontam o desmatamento descontrolado, a crise do clima e ciclos naturais como causas da seca dos últimos anos. A diferença, diz Oscar Fernandez, professor de Geografia da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (campus de Marechal Cândido Rondon), é que a população que habita essa região hoje em dia é muito mais numerosa. "Há 91 anos, quando houve uma seca assim nessa região, a população era muito menor, então o impacto sobre a população também era muito menor."
Com tanta gente que depende das águas do rio Paraná - alguns de maneira óbvia, outros de forma indireta -, a BBC News Brasil explica nesta reportagem a reação em cadeia causada por sua seca.
A vida dos peixes e a pesca
"Ao sul de Iguaçu, já tem lugares que pessoas estão passando à pé porque o rio está muito raso", diz Fernandez. E isso afeta diretamente a fauna do rio.
"Com a diminuição da profundidade do rio, o peixe vai perdendo seu habitat, e sua reprodução é afetada. Os peixes têm espaços exclusivos para a desova e espaços para seu desenvolvimento. Todos esses habitats diminuem ou desaparecem com a seca do rio."
O turismo pesqueiro e a pesca para subsistência são atividades comuns no rio Paraná. No trecho do rio do outro lado da fronteira brasileira, na Argentina, há várias colônias de pescadores e relatos de milhares de famílias de pescadores enfrentando uma crise pela seca do rio.
No Brasil, também há registros de que peixes estão sendo afetados. Para guardar água e conseguir suprir a demanda de energia nos próximos meses (mais sobre isso no fim da reportagem), o Ministério de Minas e Energia recomendou que algumas usinas do rio Paraná reduzissem sua vazão.
Entre elas, a Porto Primavera, que fica entre os estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul. A diminuição de sua vazão, segundo a Companhia Energética de São Paulo (Cesp), foi "parte de uma forma emergencial de mitigar os efeitos da seca nas demais usinas que compõem o sistema".
Com a redução da vazão, as laterais do rio baixaram e lagoas isoladas se formaram, ameaçando a fauna que vive ali.
Por isso, foi preciso fazer o resgate de peixes. A Cesp diz ter realizado avaliação, rastreio, resgate e transposição de peixes para áreas seguras.
Foram resgatadas cerca de 2 toneladas de peixes nativos, que foram transportados para o leito do rio. Além disso, foram retiradas 2,5 toneladas de peixes mortos. Segundo a Cesp, 90% desses peixes eram de espécies exóticas, da região amazônica, que foram introduzidas na bacia do rio Paraná e são mais sensíveis ao frio.
O uso da hidrovia e a alternativa mais poluente
Uma das principais hidrovias do país, a Tietê-Paraná encerrou os trabalhos em 2021. O motivo? Falta água para viabilizar a navegação.
Pelos 2,4 mil quilômetros de extensão da hidrovia escoam grãos do Centro-Oeste, parte de Rondônia, Tocantins, Minas Gerais e São Paulo. Parte dos produtos seguem em ferrovia ou rodovia para o porto de Santos e saem para exportação - daí a localização da hidrovia ser tão estratégica. O porto de Santos é o maior da América Latina.
Cerca de 3,5 a 4 milhões de toneladas de produtos agropecuários, como milho, soja, cana-de-açúcar e etanol, são transportados por ano por ali, diz o presidente do Sindicato dos Armadores de Navegação Fluvial do Estado de São Paulo (Sindasp), Luizio Rizzo.
A hidrovia já havia ficado paralisada por quase todo 2014 e 2015 também por causa da escassez hídrica. Dessa vez, diz Rizzo, a expectativa é voltar em janeiro.
Segundo ele, a estimativa de produtos agropecuários que seriam levados pela hidrovia entre agora e dezembro é em torno de 1,5 milhão de toneladas. O impacto econômico, estima ele, é de R$ 3,5 bilhões, considerando perdas com transporte, renda geral dos municípios e dos produtores.
Além disso, o fechamento da hidrovia impacta também seus trabalhadores: ao longo do rio, trabalham os estaleiros de manutenção e de construção naval, além dos marinheiros que viajam nas barcaças, com chefe de máquina, cozinheiro, entre outros. Há 1.500 pessoas empregadas diretamente. E há empresas, diz Rizzo, que já demitiram 90% de seus funcionários.
"Esse fantasma da paralisação da hidrovia do Tietê, sem expectativa de retorno, estava nos assombrando", diz Elisangela Pereira Lopes, assessora técnica de infraestrutura e logística da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil.
Outro fechamento como o de 2014-2015 acaba afastando investimentos privados e criando insegurança jurídica, diz ela. Rizzo cita este problema como o mais grave de todos: "Hoje há muitas empresas que querem investir, mas não investem por falta de confiança no modal. As empresas estão recuando com projetos", diz ele.
O dissabor com o desincentivo ao investimento se acentua porque essa forma de transporte é uma das mais sustentáveis e baratas. Lopes elenca as vantagens de uma hidrovia: apesar de ser a matriz de transporte minoritária no Brasil (só 4% dos grãos são transportados assim), a hidrovia é muito mais sustentável que o transporte rodoviário.
Enquanto o transporte por caminhões produz 100 gramas de Co2 a cada tonelada por quilômetro transportado, na hidrovia são 20 gramas. Além disso, é um transporte mais barato, já que carrega muito mais: uma barcaça pode transportar até 6 mil toneladas, enquanto caminhões carregam de 35 a 40 toneladas. O valor chega a ser 35% do valor do transporte rodoviário.
Ou seja, no caso da Hidrovia Tietê-Paraná, que transporta 10 milhões de toneladas de produtos por ano (incluindo os 3,5 milhões de produtos agropecuários), são 250 mil viagens de caminhões retiradas por ano das estradas.
"Caminhões produzem externalidades negativas, como acidentes, depreciação da via, altos custos de transporte e poluição", diz Lopes.
A logística do agronegócio e o consumidor
Assim, a suspensão da hidrovia afeta a logística do agronegócio, que não pode escoar grãos por ali nem subir insumos pelo rio, afetando a safra seguinte.
Com a paralisação da hidrovia, diz Lopes, "o produtor rural terá de assumir o custo, reduzindo sua margem de lucro".
Também entram na conta o embarcador, o transportador, o elo todo, diz ela.
E, como a alternativa rodoviária é mais cara, isso pode chegar até o consumidor. Se os produtos estiverem atendendo o mercado interno, "acaba ficando mais caro também para a sociedade como um todo, para o Brasil", diz Lopes. "O produto chega mais caro na gôndola de supermercado."
Rizzo concorda. "Os produtos vão ter que sair de caminhão e de trem, que têm um frete mais caro que a hidrovia. Quando aumenta o frete, isso acaba refletindo em tudo. Na cadeia, sobe o preço da ração, do óleo… e quando esse produtor for comprar insumo, como aumentou o preço do frete, vai encarecer o fertilizante que ele vai comprar. No final da conta, quem paga somos nós. Vai refletir na mesa do consumidor", diz.
Exportação dos países vizinhos
Apesar de o Brasil sofrer com a seca do rio, são nossos vizinhos que pagam uma conta mais alta.
O Paraguai, por exemplo, exporta a maior parte de sua produção por meio do transporte fluvial. O país utiliza a via do rio Paraguai, que nasce no Brasil, passa pela Bolívia, atravessa o Paraguai e se junta ao rio Paraná. Por meio desse extenso caminho da hidrovia Paraguai-Paraná, o Paraguai leva cargas a portos do Uruguai e da Argentina para exportação.
A Argentina, maior exportador de farelo de soja do mundo, também sente a crise, já que utiliza o rio Paraná para escoar sua produção pelo porto de Rosário. Como os produtores brasileiros, os argentinos estão tendo de buscar outras rotas para exportar sua carga, aumentando o custo do frete. Além disso, navios já tiveram de cortar a quantidade de carga que estão transportando para poder navegar no rio.
O presidente da Argentina, Alberto Fernández, declarou em julho um estado de emergência hídrica durante 180 dias em diversas províncias, incluindo a de Buenos Aires.
A crise de energia
Com a pior crise hidrológica desde 1930 e um país que produz a maior parte de sua energia por meio de hidrelétricas (63,2%, segundo dados do ONS), é possível que o Brasil tenha problemas na geração de energia elétrica. Nos últimos sete anos, os reservatórios das usinas no país receberam volume de água inferior à média histórica, segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).
O ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque fez um pronunciamento em cadeia nacional na semana passada sobre a crise energética. Ele pediu que a população desligasse luzes e aparelhos fora de uso, reduzisse o uso de chuveiros elétricos, aparelhos de ar-condicionado e ferro de passar roupa.
"O período de chuvas na região Sul foi pior que o esperado. Como consequência, o nível dos reservatórios de nossas usinas hidrelétricas das regiões Sudeste e Centro-Oeste sofreram redução maior que a prevista", declarou.
O temor é que o país não tenha energia elétrica suficiente para atender a demanda nos horários de maior consumo no fim do ano, com risco de apagão.
O rio Paraná entra nessa conta, claro - faz parte da bacia com maior capacidade instalada de geração de energia hidroelétrica no país, por volta de 60%. Além disso, cerca de um terço da população brasileira vive nesta região.
Para Paulo César Cunha, consultor da área de energia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o conjunto de bacias que deságuam na bacia do Paraná é "a mais relevante" do Brasil. "É nosso principal conjunto de rios e barragens, onde ficam os principais sítios de geração de energia."
Uma seca nessa região, portanto, "é preocupante".
A seca afeta a geração de energia de duas formas, ele explica: na vazão da água, ou seja, a quantidade de água que passa nas turbinas, e na altura da água do rio, que define a potência de energia que a máquina consegue produzir.
Em um estudo prospectivo de agosto deste ano, o ONS declarou que "os níveis de armazenamento dos reservatórios localizados na bacia do rio Paraná não se recuperaram de forma satisfatória ao longo do período úmido 2020/2021".
A situação hidrológica da bacia do rio Paraná, que engloba as bacias dos rio Paranaíba, Grande, Tietê e Paranapanema, é "crítica", e as usinas dessa bacia são "de extrema importância para a operação do SIN (o Sistema Interligado Nacional, ou sistema de produção e transmissão de energia elétrica do Brasil), pois os recursos neles estocados são capazes de garantir energia nos períodos secos, quando não há contribuições significativas das usinas instaladas na região Norte do País", diz o relatório.
Por isso a diminuição da vazão adotada em algumas usinas, com o objetivo de guardar água para a geração de energia. "Só que isso prejudica os outros usos da água, como a navegação, a pesca e a irrigação", diz Cunha.
O relatório da ONS diz que não há expectativas de chuva que proporcionem melhoria nos armazenamentos dos reservatórios até o próximo período chuvoso e que, "considerando a relevância hidroenergética das usinas hidroelétricas localizadas na bacia do rio Paraná (...), a situação hidroenergética desfavorável na qual se encontra a bacia do rio Paraná requer atenção".
Na perspectiva de médio prazo, avalia Cunha, a situação é "muito ruim". Os anos seguidos com poucas águas vai fazendo o terreno ficar "impróprio, muito seco", diz ele. "Até conseguir uma nova situação de água acumulada que permita voltar à normalidade, teria que ter bastante água por bastante tempo."
Contudo, para ele, até o final de 2021, o país terá condições para gerar energia. "Sempre tem o risco de apagão, e o risco aumentou. Mas 2022 é uma incógnita. Se as chuvas que começarem em novembro forem tão ruins como do ano passado, será preocupante. O que pode salvar 2022 é a chuva do período úmido."
De qualquer forma, o preço da energia já subiu. A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) anunciou na semana passada uma nova modalidade de bandeira tarifária, a "Escassez Hídrica", com valor de R$ 14,20 /100 kWh, que já entrou em vigor e terá validade até 30 de abril de 2022. O Ministério de Minas e Energia estimou que a nova bandeira gerará aumento de 6,78% na tarifa de luz para os consumidores.
"O preço sobe, os custos de maneira geral sobem, e espera-se que o consumo se reduza", diz Cunha. "Isso tem interferência no conforto e na produção: surtos de crescimento econômico acabam sendo frustrados porque a energia fica tão cara que as pessoas não conseguem usar adequadamente", diz ele, citando mais algumas das reações em cadeia à seca nessa região.
Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58441586
Amazônia: Área de 500 mil campos de futebol é devastada em apenas um ano
464 mil hectares da Floresta Amazônica foram alvos de ações — legais ou ilegais - em apenas um ano
Arthur Leal / O Globo
RIO — Um estudo com base em imagens produzidas por satélites concluiu que, em apenas um ano, 464 mil hectares da Floresta Amazônica foram afetados pela exploração madeireira. A área equivale a quase três vezes a cidade de São Paulo ou meio milhão de campos de futebol. O levantamento, feito pela Rede Simex, com participação integrada do instituto Imazon e das ONGs Idesam e Imaflora, foi publicado à véspera do Dia da Amazônia, que é celebrado neste domingo (5).
Dia da Amazônia: Entenda tudo sobre a degradação do bioma e como as ameaças à floresta impactam a vida dos brasileiros
Os dados mostram que mais da metade destes desmatamentos, entre agosto de 2019 e julho de 2020, aconteu no estado do Mato Grosso (50,8%). O estado também lidera o ranking de mais explorações em terras indígenas. Por lá, ao todo, 236 mil hectares foram alvo da exploração madeireira. Houve sinal de exploração também no Amazonas (71 mil hectares), Rondônia (69,7 mil hectares), Pará (50 mil hectares), Acre (27,4 mil hectares), Roraima (9,4 mil hectares) e Amapá (730 hectares).
O estudo reforça que ainda não é possível apontar quantos destes hectares foram explorados com autorização dada pelo governo, pois vários dos estados não divulgam essas informações. Os pesquisadores cobraram maior transparência por parte dos governos.
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A maioria das áreas exploradas no período, segundo o relatório, concentra-se em imóveis rurais cadastrados (362,4 mil hectares, 78% do total). Os números destas categorias fundiárias também geram alerta. Houve registro também de perda de madeira em terras indígenas (24,8 mil hectares, 5% do total), em unidades de conservação (28,1 mil hectares, 6% do total), em assentamentos rurais (19 mil hectares, ou 4% do total), vazios cartográficos (17,9 mil hectares, ou 4% do total), e também em terras consideradas como "não destinadas" (12 mil hectares, ou 3% do total).
Os 464 mil hectares com exploração madeireira
- Mato Grosso — 50,8% do total — 236.091 hectares explorados
- Amazonas — 15,3% do total — 71.092 hectares explorados
- Rondônia — 15% do total — 69.794 hectares explorados
- Pará — 10,8% do total — 50.139 hecctares explorados
- Acre — 5,9% do total —27.455 hectares explorados
- Roraima — 2% do total — 9.458 hectares explorados
- Amapá — 0,2% do total — 730 hectares explorados
Raio-X das áreas mais afetadas
- Imóveis cadastrados: 362.428 hectares, 78% do total
- Terras não destinadas: 12.291 hectares, 3% do total
- Terras indígenas: 24.866 hectares, 5% do total
- Unidades de conservação: 28.112 hectares, 6% do total
- Assentamentos rurais: 19.016 hectares, 4% do total
- Vazios cartográficos: 17.956 hectares, 4% do total
Maitê Piedade:'As enchentes na Amazônia eram a cada 10 anos; agora são entre 2 ou 3'
Municípios mato-grossenses lideram ranking de exploração
- Aripuanã (MT) — 30.666 hectares
- Colzina (MT) — 29.999 hectares
- Porto Velho (RO) — 29.646 hectares
- Manicoré (AM) — 21.038 hectares
- Lábrea (AM) — 20.288 hectares
- Nova Maringá (MT) — 14.682 hectares
- Feliz Natal (MT) — 13.189 hectares
- Marcelândia (MT) — 13.089
* Título original modificado para publicação no portal da FAP