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Presidenciáveis: Debate, revigoramento da democracia e o futuro do país
Discussão de temas fundamentais poderia ajudar a revigorar a democracia brasileira
José Eduardo Faria / Blog Horizontes Democráticos
Não fosse o candidato que disputará a reeleição, em 2022, conhecido por sua ignorância, pela compulsão à mentira, pelo desprezo ao diálogo construtivo e pela obsessão em desqualificar adversários, os debates entre os candidatos à presidência da República poderiam recolocar na ordem do dia alguns temas esquecidos, como, por exemplo, os relativos à capacidade organizadora, indutora e administrativa do Estado. Como esses temas são fundamentais para o futuro do País, sua discussão poderia ajudar a revigorar a democracia após a deterioração e a polarização do debate público que marcaram a vida política após o pleito de 2018.
Um dos temas mais importantes é a ideia de planejamento, o que exige a definição de objetivos, a fixação de metas, a formulação de indicadores, o estabelecimento de estratégias de longo prazo e a coordenação das ações necessárias. A ideia de planejamento é fundamental, dados os efeitos sociais dramáticos decorrentes da política de austeridade fiscal sem critérios sociais adotada por este e pelo governo que o antecedeu. Trata-se de uma política que, por estar focada somente na solvência do poder público, promoveu cortes orçamentários sem escalas de prioridade e sem consideração de suas repercussões sociais.
Ao ampliar o alcance da política de privatizações, convertendo em negócio privado o que até então eram determinados serviços públicos, essa política hiper-responsabilizou cada cidadão pelo seu destino, independentemente de sua condição social. A premissa era de que cada cidadão dependeria de suas capacidades, de seu empenho e de seus méritos, o que, no fundo, acaba culpando os mais desvalidos por sua situação. E como isso ocorreu num contexto de reformas trabalhistas, de enxugamento de direitos sociais e de baixas taxas de crescimento econômico, o resultado foi darwinista. Ou seja, preservou o poder dos que já tinham autonomia econômica, financeira e patrimonial e excluiu os que já estavam marginalizados.
Para reverter esse cenário de agravamento das desigualdades, uma vez que essa híper-responsabilização reduz dramaticamente a capacidade dos cidadãos de controlarem os fatores que determinam sua situação pessoal e social, o planejamento é fundamental. Contudo, para que uma política de planejamento seja posta em pratica, é preciso que os candidatos apresentem seu projeto de poder para o País e que tenham consciência de que parte de seus esforços, em matéria de planificação, somente oferecerá resultados no governo do sucessor daquele que for eleito em 2022.
Outro tema não menos importante diz respeito ao modo como os candidatos encaram as funções do poder público, a regulação das atividades socioeconômicas e a atuação dos agentes econômicos privados. Esse tema implica a distinção entre função pública, por um lado, e negócio, por outro. Como dizia Rolf Kuntz, que considero até hoje meu professor de filosofia política, embora seja possível analisar uma função pública em termos de eficiência e de rentabilidade financeira, esses critérios não podem ser determinantes para sua manutenção. No plano político, a ideia de função pública envolve a noção de responsabilidade. E, se as atividades na prestação de um serviço público podem ser transferíveis, a responsabilidade não pode. Por isso, concluía ele, a questão politicamente importante é determinar o que é ou não é a responsabilidade estatal.
Nas duas ou três últimas gestões presidenciais, falou-se muito a respeito disso. No entanto, os dirigentes governamentais se comportaram de modo bastante contraditório. Os mais recentes pareceram desconhecer até mesmo que, em determinadas áreas da máquina administrativa, somente o poder público tem autoridade efetiva para decidir e regular. Igualmente, pareceram ignorar que um dos aspectos básicos da implementação e execução de políticas públicas diz respeito, justamente, aos meios e instrumentos públicos.
Por causa desse desconhecimento e da incapacidade de compreender a diferença entre público e privado, esses dirigentes se imiscuíram de modo abrupto no livre jogo de mercado, tentando controlar preços e interferindo desastrosamente na administração das políticas de tarifas e preços. Com isso, passaram por cima de atos jurídicos perfeitos, desprezando assim o fato de que garantias contratuais são inerentes ao Estado democrático de Direito. Ao agir desse modo, enfraqueceram a segurança jurídica, que é fundamental para que o País possa atrair os investimentos de que necessita para retomar o crescimento.
Esses governantes também se revelaram incapazes de diferenciar funções que são intrínsecas do poder público – e, portanto, não intransferíveis, das funções governamentais que podem ser executadas por meio de convênios com a iniciativa privada. Neste caso, especificamente, o problema foi que não souberam conjugar a lógica do lucro privado (já que os empresários concessionários de determinados serviços públicos encaram a concessão como negócio), com os objetivos de prestação de serviços públicos, que são de interesse de toda a sociedade. Não compreenderam que o público é mais do que a interação das ações privadas, o que leva à distinção entre Estado e mercado. Esqueceram-se de que o próprio livre jogo de mercado necessita de uma ordem legal que ultrapasse a perspectiva particular.
Associado aos demais, um terceiro tema envolve a questão do tempo, que é de longo prazo em matéria de planejamento, e de curtíssimo prazo, com relação ao funcionamento dos mercados financeiros. À medida que as novas tecnologias de comunicação propiciaram as decisões em tempo real, tomadas on-line, e os investimentos no setor industrial passaram a depender cada vez mais de emissão de ações, de bancos de investimento e de fundos de pensão, os mercados financeiros ganharam enorme poder de pressão sobre os governos e os bancos centrais dos Estados.
A história recente revela que os capitais financeiros se tornaram hegemônicos no campo da economia, a ponto de influenciar e – até de capturar – o braço monetário dos Estados. Baseando-se nas premissas do máximo de lucro no menor período de tempo possível, e com o máximo de segurança e o menor risco igualmente possível, os mercados financeiros levaram os Estados a perder progressivamente o horizonte de longo prazo. Dito de outro modo, com o avanço da globalização econômica, que restringe a autonomia nacional para definir seus próprios impostos e seus mecanismos regulatórios, dada a liberdade que os capitais têm para cruzar fronteiras, os mercados impuseram essas premissas como critérios aferidores de rentabilidade e atratividade dos investimentos.
Por operar basicamente no horizonte de curto prazo, perseguindo ganhos correntes crescentes e se protegendo somente de riscos imediatos, os mercados financeiros levaram as decisões alocativas dos Estados a ficarem distantes da sociedade, não sendo mais resultantes – ainda que indiretamente – de escolhas coletivas por meios democráticos. Desse modo, à medida que as escolhas coletivas foram sendo substituídas por escolhas seletivas dos mercados financeiros, a capacidade de planejamento dos Estados foi ficando progressivamente comprometida.
Este é um dos dilemas que os presidenciáveis têm de enfrentar e que tem de ser discutido nos debates eleitorais. Como disse acima, para um país tão desigual e excludente como o Brasil, o planejamento é fundamental para a reorganização da economia, propiciando a remoção dos gargalos estruturais que impedem uma distribuição de renda mais equitativa e acesso a serviços públicos, principalmente nas áreas de educação e saúde – condições necessárias, ainda que não suficientes, para propiciar inclusão socioeconômica.
Um último tema, entre outros não menos importante, diz respeito à formulação de uma política externa em um mundo de incertezas globais – algo que foi desprezado por um governo que chegou até a afirmar, por meio de seu chanceler, que não haveria problema algum caso o país se tornasse um “pária” nas relações internacionais. Política externa envolve uma discussão sobre a afirmação ou renúncia às interconexões globais após a pandemia, especialmente por causa da interdependência do comércio e da produção de fármacos, nos quais os países avançados se especializavam em produtos sofisticados de alta tecnologia, vendendo-os para mercados mais remuneradores, como os países desenvolvidos e em desenvolvimento, enquanto países tecnologicamente menos avançados e com baixo custo de produção forneciam peças, equipamentos e remédios mais simples.
A excessiva dependência de bens intermediários e a concentração de sua produção na China foram uma armadilha para as cadeias globais de valor, que são redes complexas que propiciam vantagens de custos baixos, alta escala e flexibilidade espacial. Esses processos de produção fragmentados e espacialmente espalhados em vários continentes, com diferentes estágios localizados em distintos países mostraram sua vulnerabilidade quando a Covid atingiu a China e o governo destinou sua produção para atender à demanda interna, restringindo suas exportações, apoiando fornecedores internos e deixando de cumprir suas obrigações contratuais com os demais países. Em resposta, as chancelarias dos países que ficaram sem receber o que haviam contratado passaram a ver na produção local de vacinas uma forma de defesa de seus respectivos interesses nacionais.
Ao lado de questões fundamentais, como desenvolvimento sustentável financiado pela emissão dos chamados “títulos verdes e sociais”, ação climática, segurança alimentar, comércio internacional e tecnologias fundamentais, a política externa agora também envolverá a discussão sobre o multilateralismo num mundo pós-Covid, num contexto de crescente rivalidade entre China e Estados Unidos. Envolve, igualmente, discussões sobre como neutralizar riscos geopolíticos daí advindos, que podem abrir caminho para tensões internacionais.
Esses são alguns temas fundamentais que presidenciáveis têm de debater, para que o País possa revigorar sua democracia e os cidadãos tenham plena condição de escolher em quem votar. Contudo, pelo perfil do candidato que disputará a reeleição, com seu círculo de assessores primatas, civis e militares, esse debate poderá não ocorrer. E, caso essa previsão não se confirme, esse debate, infelizmente, correrá o risco de acabar em picadeiro de circo por quem, no exercício do poder, vem confundindo a presidência da República com o banco da Praça da Alegria.
(Publicado simultaneamente em Estado da Arte, em 24 de outubro de 2021; https://estadodaarte.estadao.com.br/jose-eduardo-faria-debates-democracia/)
Fonte: Horizontes Democráticos
https://horizontesdemocraticos.com.br/o-debate-entre-presidenciaveis-o-revigoramento-da-democracia-e-o-futuro-do-pais/
Eleições 2022: Terceira via se torna bandeira majoritária de generais
Oficiais veem risco de País repetir erros que levaram à estagnação política na Argentina e defendem alternativa à disputa Lula-Bolsonaro
Marcelo Godoy / O Estado de S.Paulo
Romper a polarização e impedir que o Brasil siga o exemplo da Argentina é a preocupação que generais do Exército expõem, atualmente, aos seus interlocutores. Após o voto majoritário para Jair Bolsonaro, em 2018, os generais defendem a necessidade de consolidar uma candidatura da terceira via, pois acreditam que a vitória de um dos candidatos que encarnam a polarização – Luiz Inácio Lula da Silva ou Bolsonaro – estenderia por mais um ou dois mandatos um cenário de conflitos, com a piora do ambiente político.
Acrescentar ao antipetismo o abandono da aposta em Bolsonaro é um cenário que ganha cada vez mais adeptos na caserna. Essa é a análise da maioria dos generais da ativa e da reserva consultados nas duas últimas semanas pelo Estadão.
O exemplo argentino, onde, na avaliação militar, governos de esquerda e de direita se sucedem, destruindo o que antecessores fizeram, é citado para descrever o que pode acontecer no Brasil, com paralisia econômica e decadência social. Os generais veem o País como uma nação de moderados, apesar da visibilidade dos “extremos”.
A maioria dos generais ouvidos participou dos governos de Michel Temer e de Bolsonaro. Dois aceitaram fazer declarações públicas: os generais Carlos Alberto Santos Cruz e Francisco Mamede de Brito Filho. O primeiro ocupou a Secretaria de Governo em 2019, no mesmo período em que Brito Filho trabalhou na Educação. “Romper a polarização atual é importante para que o País possa reconquistar um nível mínimo de consenso político e de diálogo social, que são essenciais ao desenvolvimento nacional e ao bom funcionamento de qualquer democracia”, disse Brito. Para ele, é preciso conter o “sentimento de ódio que vem desumanizando a sociedade”.
Santos Cruz é parte da esperança militar na terceira via. Ele afirma ser preciso “afastar as duas opções que já tiveram sua oportunidade”. “E deu no que deu.” Para ele, uma foi marcada por escândalos, corrupção, demagogia e pela “destruição da democracia com o mensalão”. A outra se caracterizaria pelo “despreparo, desrespeito pessoal, funcional e institucional, ignorância, boçalidade, irresponsabilidade, desinformação, manipulação da opinião pública, falta de liderança e por destruir a democracia com um ‘mensalão de última geração’, o tal orçamento secreto”.
Cruz repete os colegas ao dizer ser necessário um “outro governante que restaure o respeito, a honestidade, o combate à corrupção e a união nacional”. “É preciso interromper o acesso ao poder de um bando viciado em dinheiro público.”
Os militares escutam críticas à ação de colegas no governo, como dos generais Eduardo Pazuello, que ocupou a Saúde, e Rocha Paiva, na Comissão de Anistia. O Exército quer se dissociar do governo e do desastre da gestão da pandemia. Não esquece episódios, como a participação de Pazuello em um comício e a demissão do comandante Edson Pujol. Seu substituto, o general Paulo Sérgio de Oliveira, evita entrevistas para não criar atritos.
Mesmo assim, muitos ainda apoiam Bolsonaro. “É preciso admitir que o apelo de cunho demagógico a ideias conservadoras por parte do atual governo, aliado à política de distribuição de benesses e cargos a uma numerosa parcela de militares (mais de 6 mil) e parentes de militares, tem conseguido cooptar um segmento significativo de seguidores no âmbito da família militar”, disse Brito.
Ele resume o pensamento dos colegas para 2022. “Cabe a todos os comandantes, em todos os níveis, e não apenas os das Forças Armadas, mas os de todas as forças de segurança do País, garantir a condução do processo eleitoral pelas instituições democráticas e a subsequente posse do candidato eleito democraticamente.”
Dissociar-se de Bolsonaro surge como necessidade para quem apoiou o governo e pensou que seria possível controlar o presidente. Embora ainda haja quem diga que, se é ruim com ele, pior seria sem, diante da perspectiva de uma reeleição difícil, cada vez mais militares lembram que Bolsonaro é apenas um capitão.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,terceira-via-se-torna-bandeira-majoritaria-de-generais,70003878216
Cristina Serra: Uma CPI para a história
O relatório da comissão vai estarrecer historiadores e as gerações futuras
Cristina Serra / Folha de S. Paulo
As descobertas da CPI da Covid no Senado trazem fortes elementos a indicar a duração do bolsonarismo entre nós. Que outro presidente foi acusado de crimes contra a humanidade no exercício do cargo, sem estar em guerra com outros países ou em guerra civil, e, ainda assim, permaneceu no poder e com base social de apoio significativa, como mostram as pesquisas?
A gargalhada de Flávio Bolsonaro ao tomar conhecimento do relatório também é um lembrete sinistro de que o bolsonarismo terá muitos herdeiros, mesmo que Bolsonaro não se reeleja, fique sem mandato, seja processado e preso. Infelizmente, essa corrente política veio para ficar. Por quanto tempo? Difícil saber, mas é certo que não vai se desintegrar como poeira cósmica, porque se ampara em traços fundadores da sociedade brasileira: violência, desapreço à vida, banalização da morte.
O documento nos confronta com o horror que seres humanos são capazes de produzir. E isso é o mais perturbador. O mal em grande escala foi produzido por seres humanos, não por monstros. São pessoas de índole monstruosa, mas são pessoas, de carne e osso, como eu e você.
Que bom seria se o mal fosse produzido apenas por monstros do cinema. Mas, repito, o mal em quantidade industrial foi perpetrado por pessoas. O presidente do país, ministros, autoridades, políticos, servidores públicos, sabujos e capachos em geral, empresários, médicos"¦ Além de terem contribuído para a mortandade, zombam dela.
Zombaram no começo da "gripezinha", zombaram da asfixia em massa, zombaram de um suicídio, zombarão sempre, porque é da sua natureza fazer e propagar o mal.
O relatório da CPI vai estarrecer historiadores e as gerações futuras. Eles irão se perguntar: como o Brasil elegeu Bolsonaro? A pergunta mais difícil e incômoda de responder, porém, será: como os brasileiros o mantiveram no poder mesmo depois de tudo o que fez e/ou deixou de fazer? Carregaremos esse horror para o resto das nossas vidas.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/cristina-serra/2021/10/uma-cpi-para-a-historia.shtml
Bolsonaro pensa que é preciso colocar 'dinheiro na veia do povo' para ganhar a eleição
O teto morreu. Só não foi enterrado porque não há outra âncora fiscal para ficar no lugar
Adriana Fernandes / O Estado de S.Paulo
Podem dizer o que quiserem. O teto de gastos morreu. Só não foi enterrado porque no momento não há outra âncora fiscal para ficar no lugar, e o governo (Centrão) precisa sustentar a narrativa enganosa de que o teto está vivo para não piorar a crise econômica.
É falsa a versão do presidente Jair Bolsonaro de que não houve furo no teto e que o aumento de gastos será feito dentro das regras orçamentárias.
Não foi uma revisão do teto com discussão ampla sobre a eficácia ou não dessa regra, criada há apenas cinco anos.
O que ocorreu foi uma manobra casuística para conseguir quase R$ 90 bilhões de espaço para gastar mais nas eleições. Querem furar, mas querem dizer que gostam do teto… E buscam ainda mais licença para gastar no programa eleitoral do presidente.
O teto vem segurando muitas tentativas de ampliação de gastos. Os técnicos que lidam no dia a dia da gestão do Orçamentotêm absoluta convicção de que, se tirassem o teto, as despesas explodiriam.
Quem participa das reuniões da Junta de Execução Orçamentária (JEO), colegiado em que a equipe econômica e a Casa Civil decidem as prioridades do Orçamento, fica horrorizado com as manobras e dribles que vem se tentando emplacar por ali nos últimos tempos.
Apesar de ter essa barreira, a mudança na regra incluída na PEC dos precatórios representou um turning point de ruptura do teto e da política econômica, virada que só era esperada para o início de 2023, já no próximo governo. Não tem mais nenhuma credibilidade.
O teto se mostrou incapaz de entregar o que prometeu: as escolhas das melhores prioridades de políticas públicas. Há apagão em muitas áreas e abundância em outras, como nos gastos dos militares. Na escassez do limite de despesas imposto pelo teto, instalou-se o feudalismo fiscal, termo tão bem cunhado pela procuradora de Contas de São Paulo Élida Pinto.
O ponto central de toda essa crise em torno do Auxílio Brasil, da ruptura do teto e da debandada da equipe de Paulo Guedes é que o presidente e as lideranças do Centrão tiraram a máscara e estão ignorando a reação nervosa do mercado.
A avaliação no Palácio do Planalto é de que é preciso ganhar a eleição de 2022 e, para isso, será necessário colocar “dinheiro na veia do povo”.
Apesar de toda a boataria de nomes do Centrão para suceder o ministro, Bolsonaro deu apoio a Guedes porque ele está jogando o mesmo jogo. O ministro ficou para ajudar a remar até a reeleição. Ao lado do presidente, que foi até o Ministério da Economia, Guedes não só negou que tenha pedido demissão como deu seu recado: “Peço compreensão. Vamos trabalhar até o fim do governo”.
*É REPÓRTER ESPECIAL DE ECONOMIA EM BRASÍLIA
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,adriana-fernandes-bolsonaro-eleicao-de-2022-teto-de-gastos-auxilio-brasil,70003877455
Bolívar Lamounier: Piada pronta, ideias fixas
Na AL, o clássico absoluto é o de que o sistema presidencialista de governo é o único que se coaduna com nossa ‘índole’
Bolívar Lamounier / O Estado de S. Paulo
Tem-se dito que o Brasil é o país da piada pronta, e exemplos disso não faltam; mas não nos esqueçamos de que somos também mestres em ideias fixas.
Piadas prontas não fazem mal a ninguém, ao contrário das ideias fixas, que podem causar sérios danos. Destas, na América Latina, o clássico absoluto é o de que o sistema presidencialista de governo é o único que se coaduna com nossa “índole”. Certa vez ouvi um presidente latino-americano dizer com toda seriedade que o presidencialismo é irremovível porque expressa a ideia do “chefe”, uma necessidade do inconsciente popular que remonta às comunidades indígenas de séculos atrás. No Brasil, desde a proclamação da República, os adeptos desse sistema não se cansam de afirmar que a concentração das duas funções, chefia de Estado e de governo, numa entidade unipessoal, o presidente, assegura a estabilidade do regime democrático e confere unidade aos programas de governo. Consumado o golpe militar encabeçado pelo marechal Deodoro, o Brasil não tinha como retornar ao parlamentarismo do Império, porque as regiões exigiam a Federação e porque, em tal hipótese, o sucessor de D. Pedro II na chefia do Estado seria uma mulher, ainda por cima casada com um conde estrangeiro.
Nos primeiros anos do regime de 1891, toda uma geração de intelectuais influenciados pelo fascismo em ascensão concordou com Rui Barbosa por ter ele elaborado uma Constituição presidencialista, mas lhe desceram o cacete por ter escolhido um modelo “fraco”, o dos Estados Unidos, por mero instinto de imitação. Queriam uma ditadura presidencial.
Deixemos, porém, de lado a República Velha e vejamos o que tem sido o nosso presidencialismo desde aqueles tristes primórdios. Em meu livro Da Independência a Lula e Bolsonaro, recentemente reeditado pela Editora FGV, citei este parágrafo do celebrado mestre Maurice Duverger, adepto de uma atenuação do presidencialismo: “O sistema presidencial (puro) é intrinsecamente propenso à instabilidade. É o que evidencia toda a América
Latina. O sistema presidencial jamais funcionou a contento a não ser nos Estados Unidos. Noutros países, ele degradou-se em presidencialismo – vale dizer, em ditadura”. Penso que o mestre francês seria menos benévolo mesmo em relação aos Estados Unidos, se tivesse testemunhado o confronto de 2016 entre Hillary Clinton e Donald Trump e o desempenho deste na presidência.
Mas o melhor exemplo da relação entre presidencialismo e estabilidade é, com certeza, a Argentina, país que logrou a proeza de regredir ao subdesenvolvimento após atingir um alto grau de riqueza. Reproduzo, aqui, o registro de Carlos H. Waisman, um destacado estudioso da história de seu país: “De 1930 até o restabelecimento da democracia em 1983, a Argentina sofreu seis portentosos golpes militares (1930, 1943, 1955, 1962, 1966, e 1976), e numerosos outros de menor importância. Naquele período, o país teve 25 presidentes. Excluindo a ditadura de Perón, que durou dez anos (19461955), foram, portanto, 24 presidentes em 38 anos, ou seja, governos com uma duração média de 1,6 ano! Estabilidade para ninguém botar defeito.
O ciclo brasileiro de governos militares (1964-1985) não chegou a tanto, mas enganase quem se atém à superfície dos acontecimentos, esquecendo-se da instabilidade que lavrou continuamente dentro da corporação militar durante aqueles 21 anos. O marechal Costa e Silva não acatou as diretrizes de seu antecessor, o marechal Castelo Branco, e se impôs como candidato. Quando faleceu, em 1969, o Alto Comando recorreu a um golpe sem rebuços, impedindo a posse do vice, deputado Pedro Aleixo, legitimamente eleito pelos critérios que a própria corporação militar antes estabelecera, e instalou no
Planalto o general Emílio Garrastazu Médici. A sucessão deste pelo general Ernesto Geisel foi, digamos assim, tranquila, graças ao detalhe de que seu irmão, Orlando Geisel, era então o titular do Ministério da Guerra. Mas o próprio Ernesto Geisel foi obrigado a sobrestar um golpe que seu ministro da Guerra, general Sylvio Frota, começara a articular contra ele. Para demitir Sylvio Frota, Ernesto Geisel deixou de lado as formalidades e disse-lhe na lata: “O cargo é meu”. Geisel precisou também aparar arestas na caserna quando decidiu delegar ao general João Figueiredo a incumbência de encerrar o ciclo militar.
Uma das muitas diferenças relevantes entre os dois sistemas de governo é a de que a única fórmula legítima de que o presidencialismo dispõe para afastar do cargo a pessoa que concentra as duas funções, chefe de Estado e de governo, é o sempre traumático impeachment, que requer a demonstração de “crime de responsabilidade”, conceito que só uma minoria da sociedade compreende. O parlamentarismo, para recorrer ao voto de não-confiança, só precisa demonstrar que o titular do cargo é incompetente ou corrupto, ou não conta com o respeito do Congresso. Dilma Rousseff, por exemplo, poderia ter sido afastada em três semanas, poupando-nos todo aquele tormento.
*Sócio-diretor da Augurium Consultoria, é membro das Academias Paulista de Letras e Brasileira de Ciências
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,piada-pronta-ideias-fixas,70003876909
Marco Antonio Villa: Bolsonaro e a extrema direita
Voto de protesto, em 2018, acabou sendo canalizado para candidaturas que ocultavam a perspectiva reacionária
Marco Antonio Villa / Revista IstoÉ
A extrema-direita brasileira veio para ficar. Nada indica que seja um fenômeno passageiro. Pelo contrário, sempre esteve presente nas bordas do sistema político. Não era levada a sério, era motivo de riso e de desprezo. Eventualmente obtinha algum êxito eleitoral, mas em momento algum ditou os rumos do País, de um estado ou, sequer, de um município.
Os acontecimentos da segunda década deste século permitiram que o que era considerado uma excrescência se transformasse em um ator importante na cena política. Vale ressaltar que o extremismo nativo tem tinturas de nazifascismo combinado com o velho reacionarismo brasileiro. Em meio ao processo, que nasceu nas ruas, do impeachment de Dilma Rousseff, os extremistas, de forma oportunista, entraram no vácuo e ocuparam um espaço que não era deles. E isto ficou claro quando das eleições de 2018 acabaram sendo eleitos parlamentares de extrema-direita em quantidade nunca vista na história republicana.
Tudo indica que nas próximas eleições deverá ocorrer uma sensível alteração na composição dos parlamentos, especialmente. E o espaço da extrema-direita estará bem reduzido. O voto de protesto, em 2018, acabou sendo canalizado para candidaturas que, sob a capa democrática, ocultavam a perspectiva reacionária. O fracasso, neste ano, das mobilizações bolsonaristas, demonstraram que a tendência é de acentuada diminuição da extrema-direita no primeiro plano da cena política. O desgaste do governo Bolsonaro colabora, em muito, para isso. Mas o agravamento da crise econômica é um importante fator. Deve também ser recordado que o extremismo não conseguiu produzir intelectuais orgânicos e estruturas permanentes de intervenção, como partidos e organizações de massa. A ação da extrema-direita, neste sentido, sem organização e planejamento, apontou para um esgotamento das mobilizações. Não se imagina que até, no mínimo, o início do processo eleitoral de 2022, possa ocorrer manifestações tais quais as de Sete de Setembro. É provável que os extremistas concentrem sua atuação na construção de candidaturas que possam manter o espaço que conquistaram em 2018. Nada indica que isso possa ocorrer. A tendência é um sensível enfraquecimento da extrema-direita, mas a sua permanência no processo político eleitoral como força política minoritária, e sempre perigosa ao Estado Democrático de Direito.
Fonte: Revista IstoÉ
https://istoe.com.br/bolsonaro-e-a-extrema-direita/
Marcus Pestana: Prévias, o centro e o futuro do país
A questão posta hoje é: quem disputará o segundo turno com Lula?
Marcus Pestana / O Tempo
Ainda que tenhamos doze longos meses pela frente até as eleições presidenciais no Brasil, o debate sobre as candidaturas e o que representam, ganha cada vez mais força nos bastidores políticos, na imprensa e nas redes sociais.
Lula usufrui de seu recall e presença política, para acumular forças, cativar apoiadores e aguardar os desdobramentos, tendo aparentemente presença segura no segundo turno, embora em política nada seja definitivo.
A questão posta hoje é: quem disputará o segundo turno com Lula? Bolsonaro fez um recuo tático depois do 7 de setembro, moderou sua polarização radical diária e busca alternativas para o Auxílio Brasil e conquistas governamentais, que possam reverter sua significativa perda de apoio. Ciro Gomes prossegue sua caminha um tanto solitária em torno de seu carisma pessoal e das ideias materializadas em seu livro “Projeto Nacional: o dever da esperança”.
Mas as novidades no cenário estão surgindo na órbita do chamado centro democrático. A fusão do Democratas com o PSL, dando lugar ao União Brasil, foi um importante fato. Sérgio Moro voltou a ser assediado e ter seu nome colocado em campo. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, se movimenta claramente como alternativa nas eleições presidenciais.
Já o PSDB, que liderou este bloco político de 1994 a 2018, está se reinventando ao realizar inéditas e inovadoras prévias partidárias, radicalizando a democracia interna e alcançando os objetivos traçados por sua direção, Bruno Araújo à frente: construir democraticamente a unidade partidária; aumentar o grau de conhecimento nacional de seus pré-candidatos; mobilizar ativamente seus militantes e lideranças; e, começar a lapidar um programa de governo para o futuro do país. O primeiro debate entre Arthur Virgílio, Eduardo Leite e João Dória, promovido pelos jornais O GLOBO e VALOR, no último dia 19 de outubro, alcançou grande repercussão. Reuniões com os pré-candidatos em todos os estados têm reunido centenas de pessoas, como há muito não se via. As prévias ocorrerão no dia 21 de novembro.
Na falta de melhor nome a imprensa apelidou esta candidatura potencial de terceira via ou de centro democrático. Na verdade, não houve batizado porque não houve ainda nascimento de uma aliança política. Os termos não me parecem felizes e adequados. Terceira via carrega um sentido defensivo de negação de outras duas vias – Lula e Bolsonaro – e não um sentido afirmativo de uma alternativa para o país. O termo “centro” confunde-se com o de “Centrão” muito difundindo e carregando significados diversos. Talvez o melhor seria algo como “Via Democrática”, “Campo Democrático” ou “Alternativa Democrática”, já que o que une estas forças é a defesa da democracia e da liberdade: política, econômica, social e individual, numa convergência entre o social-liberalismo, verdes, social democracia e o socialismo democrático.
Trata-se de rechear de significado a alternativa, traduzindo para a sociedade de forma clara, pedagógica e eficiente, quais são as “utopias”, posturas, os sonhos, projetos e programas, que diferenciam uma possível candidatura presidencial das já postas no cenário.
A publicação do PSDB “O BRASIL pós-pandemia” e os debates do seminário “UM NOVO RUMO PARA O BRASIL” promovido pelo Cidadania, Democratas, MDB e PSDB, dão boas pistas para este esforço.
*Presidente do Conselho Curador ITV – Instituto Teotônio Vilela (PSDB)
Fonte: O Tempo
https://www.otempo.com.br/politica/marcus-pestana/subscription-required-7.5927739?aId=1.2559487
Brasil em queda livre: imagem e participação nacional na política externa
A sensação é de que o Brasil está virando as costas para o mundo e se recusando a entrar na brincadeira
Renata Bueno / Plural Curitiba
O mundo conta atualmente com mais de 190 países que se relacionam de forma pensada e planejada, de acordo com seus interesses e objetivos. Para esse planejamento, que ocorre tanto em nível nacional quanto internacional, damos o nome de política externa. Uma espécie de jogo que ninguém é capaz de vencer sozinho e tem o intuito de oferecer mais qualidade de vida a todos os participantes.
Para estar apto a jogar é preciso diplomacia e reconhecimento internacional, duas características bastante presentes na história do Brasil e que premiam os países mais bem colocados com a vantagem de exercer um papel cada vez mais importante no sistema político, com facilidade de compra e venda de matéria-prima e acesso a novas tecnologias. Entretanto, a percepção do Brasil no âmbito mundial vem sofrendo uma grande decadência.
Devido às inúmeras riquezas e recursos naturais, o Brasil poderia facilmente ocupar um lugar de protagonismo mundial. Porém, hoje, quando falamos em grandes grupos internacionais, não vemos quase nenhuma participação brasileira. A sensação é de que o Brasil está virando as costas para o mundo e se recusando a entrar na brincadeira, como uma criança mimada. E para piorar, poucos líderes internacionais têm demonstrado interesse em se aproximar do Brasil, visto que o país não aparenta ser um bom aliado.
Mas por que essa decadência na imagem do Brasil?
Primeiramente, quero deixar claro que não acredito que o erro seja somente do governo, que claramente peca em diplomacia e planejamento, mas também de seus eleitores. Precisamos entender o porquê dessas escolhas para conseguir mudar a imagem do Brasil no exterior. Afinal, por mais que muitos pensem que não, há uma relação direta entre política internacional e hábitos populacionais. A pandemia foi um grande exemplo de como a internacionalização faz parte do nosso dia a dia.
Além da crise sanitária, o Brasil vem há mais de ano sofrendo com falta de água e queda de energia em diversas regiões do país, dois temas diretamente interligados às discussões de política externa. E mais do que nunca, neste cenário pós-pandemia, a sustentabilidade ganhou espaço na agenda das grandes potências mundiais, não como um padrão a ser alcançado, mas sim como uma estratégia de melhoria contínua dentro de cada setor da economia.
Agora, cabe ao Brasil tentar se adequar, não só como governo, mas como população em geral, dentro dos termos que vão de encontro com um futuro sustentável. Mais do que carros elétricos, precisamos de incentivo governamental para adequação das práticas diárias dos brasileiros e alinhamento com os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), da ONU. O Brasil precisa ganhar confiança no cenário mundial e a sustentabilidade pode ser definitivamente um grande caminho.
*Renata Bueno é advogada internacionalista e política brasileira. Foi eleita vereadora de Curitiba pelo Cidadania no ano de 2009 e, mais tarde, entre 2013 e 2018, atuou como deputada do Parlamento da República Italiana pela União Sul-Americana dos Emigrantes Italianos.
Fonte: Plural Curitiba
https://www.plural.jor.br/artigos/brasil-em-queda-livre-imagem-e-participacao-nacional-na-politica-externa/
Com entrada de Moro e Pacheco, terceira via já tem 11 nomes para 2022
Podemos prepara filiação do ex-juiz e ingresso na sigla deve ocorrer em 10 de novembro
Lauriberto Pompeu, Daniel Weterman e Marcelo de Moraes / O Estado de S.Paulo
O Podemos já prepara uma cerimônia para marcar a filiação do ex-ministro da Justiça Sérgio Moro ao partido. O ex-juiz da Operação Lava Jato deve sacramentar o ingresso na sigla em 10 de novembro. A decisão de Moro de estrear na política partidária e o anúncio da filiação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, ao PSD, ampliaram o cenário de potenciais pré-candidatos à sucessão do presidente Jair Bolsonaro, em 2022, na chamada terceira via.
No campo expandido do centro político já há 11 nomes que postulam ou são indicados como possíveis candidatos para quebrar a polarização entre Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no ano que vem.
No caso de Moro, o assunto é tratado com reserva, já que ele ainda é consultor da Alvarez & Marsal e mora nos Estados Unidos. O contrato, porém, termina no fim deste mês e, a partir daí, a entrada do ex-ministro na política partidária poderá ser oficializada.
Pacheco, por sua vez, já anunciou a saída do DEM e vai se filiar ao PSD do ex-ministro Gilberto Kassab na próxima quarta-feira. Nem Moro nem o presidente do Senado bateram o martelo sobre a candidatura ao Planalto, mas todas as conversas se desenrolam nesse sentido, inclusive com a procura de vices para possíveis chapas. O ex-juiz da Lava Jato tem ainda no radar uma vaga no Senado – ele poderia concorrer por São Paulo ou pelo Paraná.
No cenário atual, não apenas uma ala da política como representantes do mercado financeiro estão à procura de um nome que possa se contrapor à polarização entre Bolsonaro e Lula. “É muito importante que haja uma união do centro para que isso possa ocorrer, para que haja um único candidato mais forte”, disse em entrevista ao Estadão o banqueiro Roberto Setubal, copresidente do Conselho de Administração do Itaú Unibanco.
Em pesquisa do Ipec divulgada em setembro, em um cenário com dez nomes, Moro aparece com 5%. Lula lidera todos os levantamentos e Bolsonaro, acuado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid – que recomendou seu indiciamento em nove condutas criminosas –, vem perdendo cada vez mais popularidade diante de uma sucessão de crises, que vão da política à economia.
Além da filiação de Moro, outra definição importante ocorrerá em novembro. Trata-se do resultado das prévias do PSDB que vão escolher o pré-candidato do partido à Presidência. Os concorrentes são os governadores João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS) e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio.
O PSDB integra o grupo de nove partidos de espectro político de centro que têm se reunido na tentativa de construir uma chapa única ao Planalto. De todas as legendas que se movimentam para construir uma alternativa a Bolsonaro e a Lula, porém, a única que não admite mudança de candidato é o PDT. O partido vai lançar Ciro Gomes (PDT) e está em busca de um vice. Nesta sexta-feira, 22, o PDT projetou em prédios de São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Salvador, Belém e Porto Alegre a nova marca da campanha, intitulada “Prefiro Ciro”.
A lista dos 11 potenciais pré-candidatos da terceira via à eleição presidencial de 2022 inclui, ainda, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM), os senadores Alessandro Vieira (Cidadania) e Simone Tebet (MDB), o jornalista e apresentador de TV José Luiz Datena (PSL) e o cientista político Luiz Felipe d’Ávila (Novo).
Movimentação. Além de uma recepção para Moro no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, o Podemos também planeja outros eventos semelhantes em São Paulo e em Curitiba.
No fim de setembro, o ex-ministro esteve no Brasil para ter conversas políticas e tratar da possibilidade de participar da disputa eleitoral. A primeira reunião foi com a cúpula do Podemos, em Curitiba, na casa do senador Oriovisto Guimarães, com a presença da presidente do partido, a deputada Renata Abreu, e dos senadores Alvaro Dias e Flávio Arns. Em São Paulo, Moro se encontrou com Doria e com Mandetta.
'Centro expandido' : veja quais são os pré-candidatos da terceira via à eleição presidencial de 2022
- João Doria (PSDB)
Governador de São Paulo
- Eduardo Leite (PSDB)
Governador do Rio Grande do Sul
- Arthur Virgílio (PSDB)
Ex-prefeito de Manaus
- Ciro Gomes (PDT)
Ex-ministro
- Alessandro Vieira (Cidadania-SE)
Senador
- Simone Tebet (MDB-MS)
Senadora
- Luiz Henrique Mandetta (DEM)
Ex-ministro da Saúde
- Sérgio Moro
Ex-juiz da Lava Jato e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública
- Rodrigo Pacheco (DEM-MG)
Presidente do Senado
- José Luiz Datena (PSL)
Jornalista e apresentador de TV
- Luiz Felipe d’Avila (Novo)
Cientista político e fundador do Centro de Liderança Pública (CLP)NOTÍCIAS RELACIONADAS
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,com-entrada-de-moro-e-pacheco-terceira-via-ja-tem-11-nomes-para-2022,70003877441
Marco Aurélio Nogueira: Oliveiros Ferreira, uma ausência sentida
Oliveiros ficou quase meio século vinculado ao Estadão, como editorialista, redator chefe e diretor
Marco Aurélio Nogueira / O Estado de S. Paulo
Nos momentos mais agudos de crise e confusão institucional, muitos o procuravam, em busca de uma opinião diferenciada, fora do mainstream, uma compreensão mais abrangente da vida.
Oliveiros S. Ferreira (1929-2017), que faleceu há exatos quatro anos, é uma voz cuja ausência nos faz falta. Heterodoxo, provocador, observador atento dos processos políticos e de seus bastidores, era um intelectual completo, que não fugia da responsabilidade de trabalhar com ideias. Não evitava as críticas, gostava de atrai-las, transformando-as em alimento para as próprias elucubrações.
Oliveiros ficou quase meio século vinculado ao Estadão, como editorialista, redator chefe e diretor. Trabalhou também como professor na USP (desde 1953), na PUC, na Unesp. Notabilizou-se como um dos pioneiros no estudo das relações internacionais. Foi meu orientador no doutoramento, período em que descobri quanto ele era um intelectual diferenciado, que reunia o erudito ao analista político minucioso, os grandes quadros interpretativos aos fatos cotidianos muitas vezes apagados pela valorização unilateral das estruturas. Era um professor cativante, sabia ensinar e instigar, atiçava os estudantes com suas elipses e metáforas.
Ainda hoje me valho da “teoria das posses essenciais” (das almas, dos corpos, do poder, do excedente), que fundamentava a ciência política de Oliveiros. Nela havia influências múltiplas: Durkheim, Weber, Marx, Ortega y Gasset, Rosa Luxemburgo, Oliveira Viana, Hobbes, Maquiavel, Clausewitz, Rousseau, Trotsky, Gramsci. Ao marxista italiano, Oliveiros dedicou estudo sistemático, convencido de que Gramsci era um vigoroso pensador do Estado. Sua tese de livre-docência, defendida na USP, foi uma leitura dos Cadernos do Cárcere de Gramsci. Oliveiros deu-lhe o título de Os 45 Cavaleiros Húngaros, numa remissão à história dos soldados húngaros que, em reduzido número, submeteram a população inteira de uma cidade.
Em seu pensamento, a teoria social, as relações internacionais, a História e a política mantinham-se sempre articuladas. Estava convencido de que não pode haver teoria política sem Sociologia, o “nacional” é sempre parte do “global” e os fatos políticos devem ser compreendidos “à luz do Espaço e do Tempo em que se
Hoje, o intelectual poderia dizer que a ascensão da extrema-direita populista ‘prostituiu’ o Estado e suas instituições
dão”, da “densidade e do volume dos grupos sociais” que se relacionam e lutam entre si.
Em momentos de crise como o que enfrentamos hoje, a teorização de Oliveiros é esclarecedora. A dominação política não se reduz a posses materiais e uso da força. Domina quem exerce uma “direção intelectual e moral” (Gramsci), ou seja, unifica pensamento e vida prática, emoções, valores e interesses, de modo a soldar “as experiências de vida num projeto votado a transformar o mundo, ou a conservá-lo aparentemente como tal”, escreveu Oliveiros.
Assim ele chegava ao Estado, o ente que organiza, define uma ordem normativa, garante a soberania. O Estado, para ele, era unidade de decisão e ação, mas também um “espaço” onde as classes sociais lutavam para se tornar dirigentes, ou seja, um lócus de disputa hegemônica, no qual venciam os que conseguissem elaborar uma concepção do mundo que alcançasse o “grande número” e neutralizasse os adversários.
Oliveiros foi um unitarista preocupado em ver o Estado como articulador da sociedade, defensor de seu território e de seu patrimônio. Pensou a política a partir desse registro, sem nunca aceitar que em nome da unidade estatal (ou do “amor pela Pátria”) se aniquilassem as diversidades regionais, a cultura e a democracia.
Para ele, no Brasil, as classes sociais não souberam unir politicamente o País e sobrecarregaram o Estado. Passamos a viver sob a sombra ameaçadora de ditaduras e guinadas autoritárias. Com isso, um pedaço da estrutura estatal – os “militares” – terminou por agir com maior desenvoltura política, como Oliveiros salientou no livro Os elos partidos (2007).
Após a democratização dos anos 1980, o capitalismo se reorganizou, a sociedade se diferenciou e o País enveredou por trilhas inquietantes. Piorou com a eleição, em 2018, de um governo que age sem responsabilidade, limites e escrúpulos. Oliveiros poderia dizer que a ascensão da extrema-direita populista “prostituiu” o Estado e suas instituições. A política deixou de fixar grandes objetivos nacionais com que alimentar os órgãos do Estado e, por meio deles, chegar à população. Oliveiros estaria atento aos fatos, mobilizando sua “dialética da Ordem” para analisar o que muda e como pode mudar a realidade.
Hoje, ainda falta ao Brasil a solução de seu enigma fundacional: a organização autônoma da sociedade e a articulação entre Estado e vida social. Continuamos sem sujeitos capazes de promover “políticas dirigidas para o futuro”.
Oliveiros ajudou-nos a compreender melhor o mundo em que vivemos. Foi uma referência para jornalistas e cientistas sociais, para os que se dedicam à ciência política e às relações internacionais sem esquemas atrofiadores. Sua ausência faz uma falta danada.
*Professor titular de teoria política da Unesp
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,oliveiros-ferreira-uma-ausencia-sentida,70003876927
Alon Feuerwerker: A força do convencimento
Eleição brasileira de 2022 ameaça ser um caso típico. O espectro político está dividido em três grandes campos
Alon Feuerwerker / Veja / Análise Política
O sistema político-eleitoral brasileiro, a exemplo das engenharias de qualidade duvidosa, tem uma falha estrutural: o processo de escolha dos governantes procura contornar o debate sobre o que farão caso eleitos. E isso é potencializado pela esperteza dos diretamente interessados: quanto menos se antecipa o plano de ação, teoricamente mais liberdade de ação haverá.
A eleição brasileira de 2022 ameaça ser um caso típico. O espectro político está dividido em três grandes campos. Uns querem evitar a volta de Luiz Inácio Lula da Silva. Outros desejam impedir a continuidade de Jair Messias Bolsonaro. Outros ainda propõem ao eleitor derrotar ambos. E, portanto, escolher algo ainda desconhecido, mas que segundo esse campo certamente será preferível às duas alternativas.
A crítica aqui não pretende ser moral, pois os políticos estão apenas escolhendo o caminho aparentemente mais fácil. Como quando o votante é convencido a votar no “novo”, em contraposição ao “velho”. Foi mais ou menos o ocorrido em 2018. E nem dá para condenar o eleitor que de tempos em tempos decide fazer uma faxina, a única atitude à mão diante do descalabro geral, real ou construído no imaginário.
Mas, infelizmente, a conta tem sido pesada. A experiência brasileira com a democracia representativa instituída em 1984-85 não vem sendo boa. Os donos da pátria declaram dia sim outro também o apreço pela Carta de 1988, mas o produto do sistema por ela formalizado é uma cena persistente de baixo crescimento econômico, resiliência da desigualdade social e desorganização política.
Qual a conexão entre as duas coisas, um método de escolha dos governantes baseado na obscuridade e as imensas dificuldades para enfrentar os desafios históricos do Brasil? Toda. Um poder político não se sustenta só no convencimento pela força, precisa da força do convencimento. O processo de escolha do líder é a oportunidade para reunir a musculatura política necessária ao enfrentamento de interesses encastelados na economia e na política.
E aqui se explica aquele “teoricamente” no primeiro parágrafo. O líder que se acha esperto, e surfa só a rejeição do outro para ascender, percebe rapidamente nos espelhos do palácio a imagem de um pato manco prematuro, ocupado somente em sobreviver, enquanto observa o poder de decisão sobre as políticas governamentais ser retalhado por concorrentes que não foram eleitos para tal, mas reinam, inclusive por antiguidade, sobre o Estado real.
E o problema multiplica-se quando o governante, por erros ou circunstâncias, tanto faz, entra num ciclo de dificuldades novas e crescentes. É a hora em que talvez olhe para trás e note a sabedoria do ditado, que dizem ser mineiro e segundo o qual esperteza quando é muita vira bicho e come o dono. E costuma ser o momento do vale-tudo. No qual única a pergunta que não apenas o líder, mas o grupo, se coloca é: “o que devemos fazer para continuar?”.
E ai de quem ousar lembrar “mas isso não é o contrário do (pouco) que dizíamos que faríamos?”.
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Publicado na revista Veja de 27 de outubro de 2021, edição nº 2.761
Fonte: Análise Política
http://www.alon.jor.br/2021/10/a-forca-do-convencimento.html
Bolsonaro sacrifica o Orçamento para salvar sua popularidade
Benefícios sociais para eleitorado esquecer descalabros da pandemia: será que vai funcionar?
DW Brasil
Governo passa por cima das regras orçamentárias a fim de abrir comportas para gastos sociais e presentes eleitoreiros antes de 2022. Os mercados financeiros reagem com severas turbulentas. E talvez seja tudo em vão.
O fato de o banqueiro e economista seguidor da Escola de Chicago Paulo Guedes estar no governo de Jair Bolsonaro era para a economia algo assim como a garantia de que o presidente adotaria um curso de reforma liberal. Porém as esperanças de que, apesar de ter como chefe o capitão da reserva, Guedes conseguiria impor esse curso há muito se desfizeram.
Desde o começo desta semana, ficou evidente que Guedes tampouco impedirá altas orçamentárias acima do limite permitido por lei. Com manobras grosseiras, agora o governo quer alterar o teto de gastos, que estava claramente fixado pelo orçamento público de 2020, corrigido pela inflação.
Por um lado, Bolsonaro propõe considerar a inflação mais alta de janeiro a dezembro de 2021 (em vez da dos 12 meses até junho último), a fim de poder gastar mais. Por outro, quer possibilitar por emenda o parcelamento de precatórios, aumentando ainda mais o campo para gastos. O teto só foi introduzido em 2017 e proporcionou ao Brasil os juros mais baixos de sua história econômica. Agora isso acabou.
Pânico nos mercados financeiros
Em protesto, nesta quinta-feira (21/10), quatro secretários do Ministério da Economia – três economistas e uma economista – anunciaram inesperadamente sua renúnica. Supõe-se que estão deixando o governo agora para no futuro não serem penalizados por terem ignorado as regras orçamentárias.
Os mercados reagiram com choque aos pedidos de exoneração: desde o início da semana – quando se acumularam os boatos de que o governo desrespeitaria o teto de gastos –, o índice da bolsa de valores de São Paulo caiu 10%; o dólar subiu quase 5%; os juros nos mercados de futuro saltaram para mais de 12%.
Em resumo: os investidores reagiram com pânico, temendo a reação em cadeia que agora, após a quebra das regras orçamentárias, se materializa. Assim, o Banco Central provavelmente terá que elevar em breve a taxa Selic para mais de 10% (dos atuais 6,25%), como única forma de manter a inflação abaixo do limite de 5%, até o fim de 2022.
O encarecimento geral já passa de 10%, no momento; os preços da cesta básica chegaram a aumentar 16% nos últimos 12 meses. Além disso, a desvalorização do real aumenta a pressão inflacionária.
Como o Banco Central terá que manter por mais tempo ainda os juros altos, os bancos de investimentos reduziram a menos de 1% os prognósticos de crescimento para 2022 (depois de 5% no ano corrente). O desempenho econômico segue cerca de três pontos porcentuais abaixo do nível de 2014, o último ano de crescimento.
Aumento de popularidade improvável para Bolsonaro
O motivo para a alteração da fórmula do teto de gastos são os esforços de Bolsonaro contra sua queda de popularidade. No relatório final da CPI no Senado, o presidente acaba de ser incriminado por cometer nove delitos no decorrer da pandemia de covid-19.
Para desviar as atenções da situação deplorável, ele pretende aumentar o auxílio às classes de renda mais baixa já um ano antes das eleições, visando impulsionar sua pouca popularidade entre os pobres. No ano da pandemia 2020, ele conseguiu incrementar sua popularidade, justamente junto às classes de renda mais baixa, com generosos benefícios sociais.
Mas será que vai conseguir repetir a proeza? O desemprego está estagnado num nível alto, de cerca de 14%, a ocupação só cresce no setor informal, onde, porém, se paga menos. A massa salarial dos brasileiros caiu em 2021 6%, em relação ao ano interior. E, tradicionalmente, o consumo é o motor do crescimento.
Acima de tudo, entretanto, a inflação alta deverá prejudicar de forma duradoura a popularidade de Bolsonaro: os pobres são, de longe, os mais afetados pela desvalorização. Os R$ 400 do novo Auxílio Brasil não vão adiantar muito.
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/an%C3%A1lise-bolsonaro-sacrifica-o-or%C3%A7amento-para-salvar-sua-popularidade/a-59600777