lula
Merval Pereira: Proximidades conceituais
Não há nenhuma lógica na sugestão de Ciro Gomes, candidato a candidato à Presidência da República pelo PDT, de Lula renunciar à sua candidatura e tentar unir o que chama de “ala progressista” em torno de uma alternativa. A não ser a lógica própria de quem pretende ser o beneficiário da desistência do ex-presidente. Como costuma fazer, Ciro antecipou-se aos fatos, revelando uma ambição que é natural, mas fora de hora.
Mesmo que todas as indicações sejam de que o TRF-4 confirmará a condenação de Lula no caso do tríplex do Guarujá, não faz sentido antecipar-se aos acontecimentos, especialmente para quem está à frente nas pesquisas e precisa ganhar tempo para lutar por sua candidatura, na tentativa de criar um fato consumado que constranja os tribunais superiores.
Vai ser difícil, pois, segundo juristas consultados, nenhum dos recursos possíveis, especial ou extraordinário, a partir de eventual sentença condenatória de Lula, tem efeito suspensivo. Sem essa suspensão automática dos efeitos da sentença, os tribunais superiores vão ter que atribuir esse efeito eles mesmos, o que não será simples.
Para frear a sentença, se ela for unânime, sobra só o embargo de declaração. Vai retardar o trânsito em julgado por, no máximo 30 dias, ou nem isso. Em resumo, não basta recorrer. O ex-presidente vai ter que contar com a simpatia de algum tribunal superior nessa suspensão. A menos que algum ministro, em decisão individual, conceda monocraticamente essa suspensão, para favorecer Lula, para deixar o tempo passar.
Com relação à suposta celeridade do processo, há explicações técnicas. A 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, observando a proximidade do recesso forense e a necessidade de respeito ao prazo hábil mínimo para intimação dos advogados para pauta de julgamentos, fixou a data de 24 de janeiro do ano que vem para realização da primeira sessão ordinária do ano de 2018, com início às 8h30m. Ontem, o TRF-4 divulgou a situação dos processos relacionados à Lava-Jato: dos 893 processos que chegaram ao tribunal até hoje, 795 já foram analisados e julgados, o que representa 89,02% do total. Os outros 98 estão em tramitação.
A marcação da data de julgamento não guarda qualquer relação com a conclusão do processo de elaboração dos votos que conduzirão o julgamento. A data apenas delimita que os três desembargadores federais que compõem a Turma continuarão estudando o caso até o momento do julgamento.
Durante a sessão, as defesas e o Ministério Público Federal poderão fazer uso da palavra e realizar as respectivas sustentações orais dentro dos prazos regimentais. Somente a partir de tal momento, munidos de todas as informações necessárias, é que os julgadores irão: ou proferir seus respectivos votos, ou pedir nova vista dos autos para aprofundamento da análise do caso na hipótese de sobrevirem eventuais dúvidas.
A tendência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região tem sido confirmar, com raras exceções, as sentenças de Sergio Moro, e muitas vezes sendo mais duro que o juiz de primeira instância. A proximidade conceitual entre Moro e os juízes da Segunda Instância é demonstrada não apenas nas decisões tomadas, mas em declarações.
O desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, presidente do TRF-4, já disse em entrevista que a sentença em que o juiz Sergio Moro condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a nove anos e seis meses de prisão, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, “é tecnicamente irrepreensível, fez exame minucioso e irretocável da prova dos autos e vai entrar para a História do Brasil” (...) “não tem erudição e faz um exame irrepreensível da prova dos autos”.
O desembargador federal João Pedro Gebran Neto, relator do processo contra Lula, disse recentemente em palestra na “Conferencia Latinoamericana de Periodismo de Investigación” (Colpin), em Buenos Aires, na Argentina, que “acabou a ingenuidade” nos julgamentos de casos de corrupção, nos quais não se deve esperar mais uma “prova insofismável” para eventualmente condenar um acusado, sendo bastante uma “prova acima de dúvida razoável”, desde que seja possível identificar uma “convergência” nos elementos probatórios de determinado processo. Um conjunto de indícios e provas bastaria em alguns casos para condenar.
Hubert Alquéres: Pedras no caminho
“Mongezinho, Mongezinho, tens um duro caminho”. As palavras que Martinho Lutero ouviu de um frei amigo quando da sua peregrin ação para Worms caem como uma luva para o duro caminhar do governador Geraldo Alckmin para se tornar protagonista da sucessão presidencial.
Sua maratona começa no próximo fim de semana quando, por consenso, será sacramentado presidente do PSDB na convenção partidária. Com a Pax tucana do momento, procura saltar a primeira pedra no meio do caminho: a eterna divisão interna que tantos prejuízos trouxeram em outras campanhas.
Se a balcanização do tucanato não fosse temporariamente estancada seriam diminutas suas chances de inverter a centrifugação do campo político situado entre os extremos Lula-Bolsonaro. Por falta de um polo catalizador, o centro navega à deriva, com suas possíveis candidaturas sofrendo de raquitismo eleitoral como mostram os dados do último Datafolha.
Diz-se de Geraldo Alckmin ser um político bafejado pela fortuna. A sorte parece lhe sorrir de novo, uma semana após a desistência de Luciano Huck. A conclusão do voto do juiz relator do julgamento de Lula no Tribunal Regional Federal da Quarta Região é uma confirmação da informação de Lauro Jardim, segundo a qual este julgamento acontecerá em marços ou abril.
Nunca se sabe o que se passa em cabeça de juiz, mas nove entre dez analistas acreditam na condenação de Lula. Nem ele mesmo acredita na sua absolvição. Mesmo que seja um cabo eleitoral fortíssimo, uma coisa é a urna eletrônica com Lula, outra é sem ele.
No mínimo caciques do PMDB vão refrear seu ímpeto de embarcar na canoa do caudilho. Ora, Alckmin ganha tempo com isso. A sorte pode estar tirando outra baita pedra do seu caminho. Sem Lula, o fantasma Bolsonaro perde gás. Eleitores que estão em sua órbita por ser antilulista podem voltar o leito do centro democrático.
E mesmo nos números do Datafolha é possível ver frestas de luz onde só se enxerga breu.
Ainda que a recuperação da economia acelere o passo, o impacto sobre o humor dos brasileiros não se dará a ponto de tornar competitiva uma candidatura saída do ventre do governo, tipo Henrique Meirelles ou Rodrigo Maia.
Com Maia não se dispondo a entrar em aventuras e Meirelles comportando-se como um elefante em loja de louça, sua entrevista à Folha mostrou isso, é bem capaz de o tucano virar o candidato do centro por W.O, assim como foi ungido presidente do PSDB.
Ninguém se elege só com a sorte. Sem a virtude, ela é de pouca monta. O candidato tucano terá de provar a sua competência para superar os próximos vários obstáculos na corrida presidencial. Sem um projeto para o país ser uma nação desenvolvida e socialmente justa, o PSDB não irá muito longe.
Outra pedra é o chamado“desembarque elegante”, uma verdadeira esfinge. A qualquer hora pode surgir novo curto circuito na relação com o governo Temer. A dubiedade da bancada do PSDB na Câmara Federal para aprovar a reforma da previdência pode inviabilizar a estratégia do paulista de ficar com o bônus do tempo televisivo dos partidos governistas sem o ônus de ser governo.
Esta é a parte mais delicada da estraté gia de Alckmin. De um lado, tem de fazer gestos a Michel Temer e ao PMDB, de outro, não pode colar sua imagem à de um governo de popularidade baixíssima. Político que se preza não dá o beijo da morte com ninguém. E Temer é o próprio beijo da morte.
Sobretudo é preciso construir uma explicação para a sociedade, a essas alturas pouco tolerante com a ambiguidade do tucanato. Há que se arrumar uma explicação convincente para duas perguntas caraminholadas na cabeça do seu eleitorado tradicional: por que sair do governo só agora? E qual a razã o para sair?
Tudo será inócuo se não promover a reconciliação do PSDB com seus eleitores. Seu baixo índice de intenção de votos no Datafolha também é produto da mágoa dos 51 milhões de brasileiros que votaram em Aécio e, legitimamente, se sentem traídos. Para Alckmin é fundamental a aliança com os partidos tradicionais, mas só terá chances reais de vitória se incorporar os sentimentos de renovação da política e de valorização da ética.
Só assim não será punido pelos eleitores e terá um final bem mais feliz do que o de Lutero que, ao encerrar sua dura caminhada, se salvou da morte, mas foi excomungado e condenado ao silêncio pela Dieta de Worms.
* Hubert Alquéres é professor e membro do Conselho Estadual de Educação (SP). Lecionou na Escola Politécnica da USP e no Colégio Bandeirantes e foi secretário-adjunto de Educação do Governo do Estado de São Paulo
Míriam Leitão: Volatilidade política
A dez meses das eleições, há tempo para muita mudança no quadro eleitoral porque os processos eleitorais brasileiros são voláteis. Ciro Gomes, Garotinho, Roseana, nas disputas presidenciais, Celso Russomanno e Francisco Rossi, em São Paulo, conheceram esses movimentos que os levaram a ter altos índices de preferência em ondas que quebraram antes. Lula e Bolsonaro são eventos de natureza diferente.
Lula conhece a volatilidade da intenção de votos, nas duas eleições que perdeu para Fernando Henrique. Agora, o que o mantém na liderança é o recall e a campanha que tem feito com sua experiência e a estratégia de fugir da Justiça. Quando ele deixou o governo, o país estava crescendo 7,5% e a inflação era baixa. A recessão foi provocada pelo governo Dilma, mas Lula pode dizer que nos seus oito anos as famílias estavam usufruindo do aumento da renda e do consumo. Principalmente no Nordeste, endereço de 27% do eleitorado brasileiro. Ao mesmo tempo, Lula segue a estratégia de se fortalecer nas intenções de voto para acuar a Justiça. O Judiciário terá coragem de vetar o candidato que estiver na preferência do eleitorado?
Jair Bolsonaro é outro em campanha intensa e isso explica em parte sua pontuação nas pesquisas. Ele tenta usar o sentimento anticorrupção e tem sido beneficiado pelo pensamento de direita extremada que sempre existiu no Brasil, mas que agora se sente liberado para se assumir. Sua tentativa de se apresentar como um candidato liberal na economia não tem qualquer correlação com tudo o que ele disse e votou ao longo da sua vida pública. Ele sempre seguiu às cegas o que foi feito pelo governo militar na área econômica. Às cegas porque Bolsonaro é incapaz de aprofundar qualquer pensamento econômico. Agora, socorrido por economistas liberais, tenta justificar frases como a ameaça de fuzilar Fernando Henrique pelo programa de privatização. Ao contrário do que supõe seu novo guru, Paulo Guedes, a ordem não vai se encontrar com o progresso na campanha de Bolsonaro. E isso porque a ordem autoritária nunca foi capaz de encontrar o progresso no Brasil. Os principais avanços ocorreram na democracia.
Lula pode estar com o nome na urna. Ou não. Se não estiver, será um grande influenciador. A capacidade de transferência de votos é um dos maiores mistérios da política. Lula conseguiu transferir para Dilma, mas jamais elegeu alguém para o governo de São Paulo. Quem atrair os eleitores de São Paulo tem uma grande alavanca, porque o estado representa 22% do eleitorado brasileiro. Lula terá chances — na hipótese de se livrar da Justiça — se conseguir atrair de novo a classe média e por isso está tentando com uma nova Carta ao Povo Brasileiro. Provavelmente uma parte da classe média ele perdeu definitivamente.
O PSDB, que pode ter boa votação em São Paulo na hipótese da candidatura Alckmin, tem uma infinidade de contradições e fraturas a superar. O partido está em frangalhos, o discurso anticorrupção é difícil após o caso Aécio Neves e a maneira como o partido se portou diante dele. Além disso, sua identidade, como partido da modernização econômica, se perdeu em parte nas contradições da atividade parlamentar.
Marina tem as dificuldades de tempo de TV e de clareza do discurso. Em várias votações a Rede atuou como linha auxiliar do PT. O discurso que Marina sustentou em outras eleições foi o de consolidar ganhos de governos do PSDB e do PT para garantir novos avanços. Isso bate de frente com o histórico de escolhas dos seus poucos parlamentares.
O governo acha que pode ter um candidato porque aposta no cenário de melhora da economia no ano que vem. A economia deve melhorar sim, mas não a ponto de produzir um conforto tal que influencie a massa dos votantes a favor de um governo altamente impopular. O ministro Henrique Meirelles se posiciona para ser esse candidato. O mais importante é que ele tome o cuidado de não usar a força da cadeira na qual está sentado para favorecer esse projeto, porque isso seria irregular e comprometeria o pouco de ajuste fiscal que está propondo.
A eleição ainda está longe, todos os candidatos têm problemas, há parcelas grandes do eleitorado sem preferência, as pesquisas captam apenas as intenções. E elas são voláteis.
José Roberto de Toledo: Lula segura Bolsonaro
Sem Lula, eleitores que declaram voto no ex-presidente elevariam o militar reformado a patamar acima de 20%
Não é só ao PT que convém manter viva a candidatura presidencial de Lula, pelo menos por enquanto. Aos partidos que buscam ocupar o centro do espectro político também - especialmente ao PSDB. A mais recente pesquisa Datafolha mostra que, hoje, o petista é um obstáculo ao crescimento mais acelerado de Bolsonaro. Sem Lula, eleitores que declaram voto no ex-presidente elevariam o militar reformado a patamar acima de 20%, um passaporte para o 2º turno.
Com Lula fora do páreo, Bolsonaro aumenta em 26% sua intenção de votos no Datafolha. O militar reformado cresce 4,5 pontos na média dos cenários testados: vai de 16,8% a 21,3% quando o ex-presidente não aparece na lista. Mais: Bolsonaro se distancia de Alckmin e abre 12 pontos do tucano. Esse nem é o único problema do PSDB causado por uma eventual saída prematura de Lula.
Marina Silva e Ciro Gomes herdam ainda mais eleitores lulistas do que Bolsonaro: 6 e 5 pontos, respectivamente. Como resultado, ambos se destacam de Alckmin quando o candidato petista é outro. Com Fernando Haddad, Marina vai de 10% para 16%, e Ciro quase dobra, de 7% para 12%. Ambos deixam o tucano sozinho no quarto lugar, com 9%, e a sete pontos de uma vaga no 2º turno.
É certo que a esta altura da corrida presidencial as pesquisas de intenção de voto não passam de simulações que, olhando-se eleições passadas, guardam pouca relação com o resultado das urnas. Mesmo assim, são ferramentas fundamentais para entender as afinidades, simpatias e antipatias do eleitorado. O que o Datafolha confirma é que Alckmin é o mais atrasado na disputa.
Não estivesse o líder sob grande risco de ser sacado da corrida pela Justiça, os adversários imediatos do tucano estariam ainda mais adiantados do que ele na conquista de votos. O problema de Alckmin não é se tornar conhecido, mas ficar palatável aos eleitores mais pobres, principalmente do Nordeste. É um eleitorado que sabe quem ele é, só não votaria nele.
Hoje, o tucano é apenas a quarta ou quinta opção da massa de eleitores que esteve do lado vencedor da disputa presidencial em 2006, 2010 e 2014. Se, em vez do ex-prefeito paulistano Fernando Haddad, o ex-governador baiano Jaques Wagner vier a substituir Lula na chapa petista, ainda mais tortuoso será o caminho nordestino de Alckmin para chegar a Brasília. Por isso o governador paulista precisa do tempo que a candidatura-tampão de Lula lhe dá, para tentar melhorar sua imagem fora de São Paulo.
O raciocínio também vale para o PT. Se Lula deixasse hoje a disputa, as chances de ele conseguir transferir votos para seu substituto seriam muito menores do que se isso viesse a ocorrer na reta final da campanha, quando a candidatura petista disporá de tempo garantido de TV e rádio para martelar a troca e pregar na cabeça do eleitorado lulista o nome de Wagner ou de Haddad.
Quanto a Bolsonaro, a pesquisa confirma que ele é um fenômeno sem precedente na história das disputas presidenciais pós-ditadura. Nunca antes um candidato que vai ter muito pouco tempo de TV no horário eleitoral na reta final da campanha partiu de um patamar tão elevado quanto Bolsonaro. Collor teve 10 minutos em 1989 - uma eternidade se comparado ao tempo do Patriotas.
A intenção de voto em Bolsonaro só faz se consolidar. É o único que segue crescendo na pesquisa espontânea. Saiu de 3% um ano atrás para 7% em abril, foi a 9% em setembro e chegou agora a 11%. Fora ele e Lula, ninguém supera 1% nesse tipo de pergunta, em que o eleitor responde sem que lhe informem quem são os concorrentes. Bolsonaro tem um eleitorado convicto, que comunga um ideário com ele e é menos propenso a mudar de candidato.
Alon Feuerwerker: Lula retoma músculos conforme aumentam as tensões que atrapalham a convergência da coalizão antilulista
Eleições em dois turnos, ou com apenas dois candidatos viáveis, como nos Estados Unidos, tendem a ser decididas com forte influência da taxa de rejeição. Mais que para eleger, a urna mobiliza-se para evitar a eleição de alguém, ou alguéns. As últimas quatro disputas presidenciais no Brasil, por exemplo, deram a vitória a blocos liderados pelo PT, mas antitucanos.
O Datafolha deste fim de semana traz como maior novidade a ampliação da vantagem de Lula sobre os adversários no segundo turno. Isso é consistente com duas variáveis. Uma mensurável: a taxa de rejeição do ex-presidente vem caindo. A outra não se mede com números: são as dificuldades objetivas e subjetivas para montar uma ampla coalizão antilulista.
A maior dificuldade objetiva é que os dois partidos-guia do impeachment de Dilma Rousseff querem ambos o protagonismo político no novo governo, a caneta. Temer não vê por que ceder aos tucanos sem luta. E o PSDB, como outros, cultiva um permanente “projeto de poder”. Considera-se, e não se pode impedi-lo de achar isso, naturalmente indicado para governar.
O problema é contornável, se se quiser contornar, conforme o tempo decantar as ambições inviáveis e o establishment pressionar por uma “alternativa racional”. O recente antitemerismo de parte da elite cederá espaço ao temor de uma polarização definitiva Lula x Bolsonaro. O apelo “programático” virá forte, assim como as desconstruções focalizadas nos indesejáveis.
É sempre arriscado contar em excesso com a racionalidade política dos agentes, mas essa aliança à direita ainda é viável. O desafio maior é subjetivo: a forte dispersão ideológica. É muito mais simples hoje agrupar uma frente lulista do que uma antilulista. As tensões centrífugas operam com muito mais intensidade no segundo campo do que no primeiro.
O antilulismo de agora é formado por cinco afluentes principais: o antipetismo político, o pró-capitalismo radical, o conservadorismo moral, o horror à esquerda e a rejeição ao que se convencionou chamar de velha política. O problema dos alquimistas da direita é juntar todos esses ingredientes num único bolo que seja digerível. A busca frustrada do novo é sintoma da dificuldade.
Quanto do bolsonarismo se disporia a trocá-lo por um tucano clássico para vitaminar a frente antilulista? Quantos eleitores tucanos estariam dispostos a apoiar Bolsonaro contra Lula? O eleitorado de Marina na hora h vai à direita ou à esquerda? Em 2014 ele se dividiu. O agronegócio apoiaria Marina contra Lula? E a velha política, teria alguma razão para priorizar o antilulismo?
Outro complicador: o antilulismo popular declina à medida que a memória do governo Dilma dilui e ela vai ficando com o passivo, e Lula com o ativo. A campanha eleitoral reavivará a lembrança de “Dilma, a indicada de Lula”, mas convencer de que, por isso, um eventual governo Lula será ruim exigirá competência única dos construtores de narrativas. Não vai ser trivial.
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Outra escolha não trivial é a do PSDB. Se ajudar a aprovar a reforma da Previdência, o otimismo econômico fortalecerá o governo. Se a reforma empacar e isso levar os investidores a colocar o pé no freio, à espera de qual bicho vai dar em outubro, quem se beneficia é Lula, ou o candidato de Lula. O PSDB, em resumo, conseguiu ser sitiado numa posição perde-perde.
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Um efeito da resiliência de Lula e da anemia do festejado (por enquanto só na imprensa) centro será os olhares voltarem-se cada vez mais para o Judiciário. Não se faz omelete sem quebrar os ovos. Mas conforme o tempo passa aumenta a capacidade de transferência de votos de Lula para o “candidato do Lula”. É outro dado importante do Datafolha. Meio disfarçado, mas está lá.
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A Lava-Jato vem com tudo no ano eleitoral, anunciam seus comandantes. Há duas maneiras de ela influir na eleição: 1) pedindo votos para candidatos que defendam as propostas da Lava-Jato e 2) criando fatos policiais e judiciais com impacto potencial no ânimo do eleitor. Esta eleição não terá como ser chata. Promete ser a mais animada de todos os tempos.
* Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação
Luiz Carlos Azedo: Huck, Temer e Alckmin
A polarização ainda não chegou ao centro; ou seja, há um enorme espaço a ser ocupado, o que alimenta a ideia de um candidato antipolítico
Para a reconstrução do centro democrático como alternativa de poder, apareceu uma espécie de teoria do pó de pirlimpimpim: bastaria um candidato que simbolize a antipolítica, com bom trânsito entre os nossos intelectuais e técnicos iluministas e conhecido no povão para que isso acontecesse num passe de mágica. O apresentador Luciano Huck, por exemplo, preenche muito bem esses requisitos. Vem de uma família de professores universitários, é carinhoso com seu público e tem as ideias liberais que caracterizam a maioria das nossas celebridades quanto aos costumes, o sucesso individual e o glamour social, alavancados pelo empreendedorismo bem-sucedido e pelo alto e bom gosto no padrão de consumo.
Huck é o sujeito que qualquer um que acredita no próprio taco e na ascensão social via “sociedade do espetáculo” gostaria de ser. Seu ingresso na política é um avanço: reflete uma força que vem se manifestando na sociedade de maneira multifacetada: a do nosso “americanismo”, que está em toda parte. No estilo de vida que levamos, nos nossos padrões de consumo urbano e rural, no “neotaylorfordismo” que a “internet das coisas” começa a engendrar, na música, nos movimentos negro e de gênero, mas que ainda não havia chegado com força à nossa política.
Nela emergiu por onde menos se esperava: a alta burocracia do chamado “poder instalado”, via Polícia Federal, Receita Federal, Ministério Público e Justiça Federal. O abre-alas do nosso “americanismo” é a Operação Lava-Jato, que protagoniza uma limpeza ética nas relações promíscuas do Estado com os interesses privados patrocinada pelos políticos e grandes empresários. Mas esbarra nas muralhas de nossa fortaleza ibérica: o Congresso Nacional, com seu patrimonialismo, seu fisiologismo e seu clientelismo atávicos. Desde as jornadas de junho de 2013, nas quais os jovens de todos os matizes protestaram contra as obras e desperdícios da Copa do Mundo (como se viu, um grande butim para os políticos se financiarem nas eleições de 2014), o “americanismo” rondava a política com um discurso antipolítico e moralizador.
Não foi à toa que jovens investidores do mercado financeiro e da inovação tecnológica emergiram como líderes dos protestos organizados pelas redes sociais na campanha do impeachment de Dilma Rousseff, formando movimentos e grupos organizados em rede que agora buscam canais de expressão na grande política institucional. Como não foram capazes de se unificar e formar um grande partido renovador da política brasileira, seja porque não fosse esse o projeto original, seja porque a reforma política foi feita para impedir que isso ocorresse, estão diante da pergunta clássica: o que fazer em 2018? Em todos esses movimentos — Vem Pra Rua, Renova, Agora, etc. —, há jovens empresários que viveram nos Estados Unidos e observaram de perto as campanhas do ex-presidente democrata Barack Obama e do republicano Donald Trump, que alavancaram suas campanhas nas chamadas “novas mídias”, embora com objetivos, estratégias e momentos diferentes. Ambos flanquearam seus respectivos partidos para impor suas candidaturas de fora para dentro.
Bloqueio
Muita água ainda vai rolar até as eleições, porém o roteiro da candidatura de Luciano Huck é mais ou menos esse. A eleição parece polarizada pela dicotomia direita-esquerda, alimentada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pelo deputado Jair Bolsonaro (PSC), que exploram o medo recíproco dos eleitores mais à esquerda e mais à direita. Entretanto, a polarização ainda não chegou ao centro; ou seja, há um enorme espaço a ser ocupado, o que alimenta a ideia de um candidato antipolítico. Bastaria encontrar um partido com o mínimo de estrutura nacional, algum tempo de televisão e disposição de servir à causa de um projeto transformista liberal pós-moderno. Será?
Depende. Os grandes partidos brasileiros ainda não morreram. Pode ser que se enfraqueçam muito nas eleições, mas resistem. O PMDB, por exemplo, domou a Lava-Jato e controla o governo federal. Enquanto o presidente Michel Temer não desistir de sua enrustida candidatura à reeleição, essa máquina poderosa inviabiliza qualquer candidatura que unifique as forças que apoiaram o impeachment. Não deixa, por exemplo, que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB, consiga articular a coalizão dessas forças em nível nacional. A candidatura unificadora do centro democrático é apenas uma narrativa. Não surgirá de articulações iluministas, mas do resultado do primeiro turno, que não terá um candidato único do centro democrático.
Gaudêncio Torquato: Um deserto de ideias
O que Bolsonaro pensa do Brasil? Que ideia tem trazido ao debate nacional?
E Lula, conhecido pela expressão farta, sempre pronto para atacar adversários e defender o “petismo salvador da Pátria”, que propostas tem apresentado para melhorar a economia ou os serviços básicos de responsabilidade do Estado?
O que pensam Ciro Gomes, Marina Silva, Geraldo Alckmin ou, ainda, o animador de auditório Luciano Huck?
Quem souber de uma boa sacada, um projeto interessante, uma proposta crível e factível que tenha sido expressa por um desses pré-candidatos à presidência da República, está convidado a trazê-la ao conhecimento público.
O fato é que, até esse momento, sobram blábláblás e falta algo inovador, capaz de chamar a atenção e gerar interesse pela originalidade.
Se as campanhas não conseguem empolgar plateias, seja por ausência de novidade, seja pela sensação de que as propostas mais parecem uma teia de retalhos e fragmentos, dispostos um ao lado do outro sobre o pano de fundo de nossa realidade, imaginem as besteiras que surgem nesse momento.
De Lula em suas caravanas, brotam roças de demagogia, sob um tiroteio ao atual governo, para ele o responsável pelo descalabro que afundou o país nos últimos anos. Como é sabido, a defesa do Lula é o ataque.
O petismo-lulismo, inspiração do dilmismo, afundou a Nação.
Os bolsões que receberam da era petista melhorias para mudar de patamar na pirâmide social acabaram voltando ao estágio inicial.
De Bolsonaro, não se espera grandes coisas. Ele mesmo reconhece que ignora fundamentos de economia. Claro, é capaz de identificar o mapa do Brasil, mas não se cobre dele conhecimento profundo sobre o Nordeste, o Norte, o Centro-Oeste e o Sul.
Nesse instante em que eventuais candidatos à presidência da República começam a povoar espaços midiáticos com suas ideias (???), seria oportuno virem à público para oferecer pautas densas que chamem a atenção pela relevância e oportunidade. Nada disso se vê.
Áreas vitais como saúde, segurança, educação ou polêmicas sobre as reformas (política, previdenciária, tributária) ganham adendos superficiais e bordões escondidos na frou¬xa promessa “vamos continuar isso e aquilo, fazer mais e melhor”. Nunca foi tão importante para o Brasil debater seu futuro.
O atual governo se empenha em desamarrar as reformas necessárias à alavancagem do país. Por que os pré-candidatos não se voltam ao debate substantivo em torno dessas reformas, trazendo subsídios que possam colaborar com o debate, em vez de apenas se posicionar contra ou a favor?
Partidos de oposição, sem enxergar o mérito, tratam a reforma trabalhista, por exemplo, como um atraso, quando ela coloca o trabalho na linha dos avanços.
Velho roteiro
O fato é que, nos últimos tempos, o clima eleitoral puxou novos adereços, decorrentes da tecnologia da informação e sob a fosforescência do Estado-espetáculo, onde os atores procuram esmerar-se na estética e esquecendo a semântica.
Seu esforço consiste em aparecer bem aos olhos dos eleitores de 2018, recitando slogans, decorado frases de efeito, declamando uma linguagem tatibitate, sem consistência. A campanha eleitoral de 2018 já começou, e o Tribunal Superior Eleitoral ainda não dá conta do fato.
Pré-candidatos circulam para cima e para baixo, fazem caravanas, são recebidos por multidões em aeroportos, usando artifícios de um marketing que parece saturado: militantes com vestes coloridas, passeatas, carros de som entoando refrãos, flagrantes de ruas tomadas pelas mobilizações.
Redes sociais
As redes sociais formam o novo instrumento que as campanhas eleitorais estão adicionando ao arsenal de marketing.
O acesso do eleitor aos candidatos e a seus exércitos se dá por meio do uso de canais eletrônicos da internet.
Da naturalidade das ruas do passado para o artificialismo dos laboratórios do marketing – essa é a mudança nas campanhas. Abertas, emotivas, participativas tornaram-se fechadas, frias, racionais. Em 1950, Getúlio Vargas fez uma das mais brilhantes campanhas da história eleitoral.
Em 10 de agosto, em São Paulo, pronunciava um discurso versando sobre o poderio da terra bandei¬rante, o dever da União para com o Estado, o saneamento financeiro do País, as diretrizes para uma política industrial e as bases do trabalhismo, concluindo com a exaltação do vínculo entre democracia política e democracia econômica.
Regiões e cidades recebiam expressão própria, com diagnósticos e solução para os problemas. O eixo do discurso era a descentralização.
Na peroração de São Borja, em 30 de setembro, Vargas confessava a receita do sucesso: “Da vastidão amazônica a estas fronteiras meridionais, das populações de beira-mar às do Brasil central, o povo me acolheu carinhosamente, e mais me falou dele do que eu de mim, transmitindo-me as suas queixas, as amarguras e dificuldades atuais.” Ouvir o povo, eis o mote.
Quem ouve o povo hoje?
Passemos aos tempos de Juscelino Kubitschek. Na campanha de 1955, fez seis viagens pelo País, percorrendo 168 municípios num DC-3, equipado com escriva¬ninha e cama, e adotando a mesma estratégia de Vargas, ou seja, combinava temas gerais com específicos.
Os roteiros cobriam cidades e capitais próximas, permitindo a ele conhecer e estudar as questões regionais. Grupos de mobilização puxavam o povo para as ruas. As campanhas arrebanhavam multidões. Os comícios terminavam sempre com perguntas formuladas por ouvintes, em “diálogo com o povo”.
As temáticas, entremeando situações nacionais e locais, tinham como foco o desenvolvimentismo, a partir das áreas de energia e transportes, com textos elaborados por figuras tarimbadas, como o poeta Augusto Frederico Schmidt, o romancista Autran Dourado e os jornalistas Álvaro Lins, Horácio de Carvalho e Danton Jobim, entre outros.
Hoje, essa tarefa é de marqueteiros, muitos sem preparo.
Hoje, a descrença e a desmotivação do eleitorado, a pasteurização ideológica, o declínio dos partidos e o distanciamento entre a esfera política e a esfera social mancham a moldura eleitoral. Se o país recuou no campo das grandes ideias, avançou nas técnicas de engodo.
* Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP, consultor político e de comunicação
Jose Roberto de Toledo: Voto de juiz vale mais
A campanha presidencial será muitas coisas, menos serena e previsível. Nem é por causa dos #ParadisePapers da vida que, vira e mexe, tiram o sono de candidatos. O principal criadouro de incertezas é a judicialização da eleição. Líderes das pesquisas, Lula e Bolsonaro logo serão julgados por “campanha antecipada”. São os primeiros de muitos julgamentos com impacto determinante nas urnas. A despeito da eleição, a política continuará sendo, em 2018 e além, uma derivada da Justiça.
“Campanha antecipada” é jabuticaba eleitoral brasileira. O tipo de dispositivo legal que encena ignorar o óbvio: que todo político está permanentemente em campanha, antes mesmo de ter certeza de que será candidato. Ou as bilionárias emendas ao orçamento transacionadas com parlamentares pelo atual e por todos os governos passados visam o estrito interesse público?
As emendas não são tão cobiçadas à toa. São armas de campanha, tão ou mais poderosas do que o horário eleitoral na TV e no rádio. Com uma diferença fundamental: só estão disponíveis para quem já está lá e faz parte do clube dos eleitos. Por isso, contra elas quase nenhum partido grita “campanha antecipada”.
Do mesmo modo, o prazo determinado e cada vez mais curto para a campanha eleitoral “oficial” beneficia quem já tem cargo eletivo, já é conhecido e possui eleitorado cativo. Campanhas longas favoreceriam a competição, pois dariam tempo de o público se familiarizar com candidatos desconhecidos – ou de descobrir que os nem tão desconhecidos assim são candidatos.
É falacioso o argumento de que campanhas curtas são mais baratas. Os bilhões liberados em emendas nos últimos meses provam o contrário. Mas não é só isso. As estruturas financiadas com dinheiro público para deputados e senadores manterem escritórios nos seus redutos eleitorais são campanha mais do que antecipada: são comitês eleitorais permanentes. O mesmo vale para as estruturas de comunicação de seus gabinetes.
Nos últimos tempos, as mídias sociais tornaram o conceito de campanha antecipada ainda mais cínico. A quase totalidade dos parlamentares têm conta própria e terceirizada no Facebook, Twitter, Instagram etc. Alguns, de tão viciados nessas plataformas, estão trocando as visitas de fim-de-semana às chamadas bases eleitorais por “lives” – as transmissões de vídeo a vivo pela internet. É parte da campanha virtual sem fim.
Foram vídeos transmitidos via mídias sociais que levaram o Tribunal Superior Eleitoral a julgar Lula e Bolsonaro. O que estará em julgamento não é nada amplo ou profundo. É o detalhe do detalhe. O candidato pode fazer quase tudo, menos pedir voto e dizer que é candidato. Mentir e dizer que não é o que é pode.
O faz-de-conta se torna ainda mais ridículo ao se acompanhar as investigações sobre o quanto a Rússia conseguiu influir nas eleições presidenciais do ano passado nos EUA. Em um dos exemplos mais eloquentes, US$ 250 gastos em “impulsionamentos” no Facebook foram suficientes para os russos insuflarem dois grupos antagônicos a fazerem manifestações de rua ao mesmo tempo e no mesmo lugar. Resultado: pancadaria generalizada.
No Brasil, isso não parece estar entre as preocupações do Judiciário. Terceiros podem fazer campanha para candidatos – os próprios candidatos não. Quer dizer, podem desde que neguem.
A campanha antecipada não é o único vetor da judicialização eleitoral. O ministro Fux, do ex-Supremo, antecipou seu voto para o julgamento mais importante: contra Lula, condenado, obter registro como candidato. Outros acham que o petista conseguirá, mesmo que sua candidatura venha a ser cassada depois. Seja como for, votos nos tribunais pesarão tanto ou mais que os nas urnas.
Alon Feuerwerker: As pesquisas não mostram polarização entre extremos, mostram Lula e uma momentânea pulverização
A ideia de que as pesquisas trazem uma polarização entre extremos para as eleições do ano que vem é útil para vender a necessidade de uma candidatura dita de centro, mas tem pouca aderência à realidade. Ainda não há polarização, o autodeclarado centro não é tão de centro assim e é duvidoso que Lula venha com uma plataforma radical.
1) Ainda não há polarização
As pesquisas mostram Lula com algo entre 40% ou um pouco mais de votos válidos. Tem sido o patamar dele ou do candidato dele desde 2002, no primeiro turno. Há portanto uma aglutinação natural de bases sociais a favor de um nome, Lula, que tem clara liderança sobre esse pedaço da sociedade, à esquerda no leque político.
Do outro lado, há uma ainda dispersão, também natural, por causa de um certo vácuo de liderança política e de movimentos especulativos. A direita hoje se divide entre conservadores radicais, liberais de vários tons e outsiders sobrevoando a batalha à espera da hora de pousar para devorar os cadáveres. É razoável supor também aqui certa convergência futura.
2) Só o grupo de Marina está ao centro
O centro político é construção mercadológica útil para uma direita ou uma esquerda que buscam evitar a estigmatização político-eleitoral. Um centrismo mais viável é o ajuntamento de gente de direita e de esquerda por ganhos táticos, com uma disputa mortal já contratada para depois da chegada ao poder. A única pré-candidatura hoje com esses traços é Marina.
No segundo turno de 2014, os votos dela migraram em proporções substanciais para os dois lados. Caso ela não vá à decisão ano que vem, é razoável supor que o fenômeno se repita. No caso dos demais, a migração será maciçamente para o nome da direita que estiver na disputa. Assim como os votos de Ciro Gomes teriam destino certo para Lula.
3) Fazer previsões definitivas sobre Lula é um risco
Os adversários caracterizarem Lula como radical é caminho tão previsível quanto arriscado. O próprio Lula pode desmontar isso facilmente com gestos simples em direção ao empresariado e ao sistema político tradicional, movimentos para os quais tem know-how acumulado. O antilulismo é uma escolha óbvia, mas é também uma armadilha.
O maior desafio do eleito em 2018 será acelerar e melhorar a qualidade da criação de empregos. A agenda será de libertação de forças produtivas. A disputa de 2018 não será entre pró-capitalistas e anticapitalistas, mas sobre como fazer o bolo crescer e melhor distribuí-lo. Lula leva vantagem até agora pois está mais identificado com a prosperidade e o distributivismo.
Entretanto...
4) O centro não existe, mas é uma marca. Ser “de centro” é um ativo
A construção em torno do centrismo é ficcional, mas a realidade virtual também é real. Por isso, não só Lula, mas também os candidatos da direita fazem e farão movimentos para mostrar que não estão nos extremos. Uns vão aos Estados Unidos para elogiar o liberalismo, outros mostram preocupação social, outros ainda apoiam causas comportamentais da moda.
*
Lula levar a candidatura até o limite do limite do limite faz sentido como cálculo eleitoral. A barafunda jurídica não vai economizar confusões, e não apenas na corrida presidencial. O espírito do tempo faz prever grande protagonismo e ativismo do Judiciário na eleição. Com sentenças e recursos em profusão. A bagunça vem aí.
Quanto mais perto da eleição Lula estiver quando -e se- for finalmente impugnado, maior será seu poder de transferência de votos para um eventual substituto ou até, em hipótese aí sim extrema, para o puro e simples boicote. Que não seria totalmente inédito, pois já aconteceu no regime militar. Talvez inéditas seriam suas proporções.
* Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação
El País: O camaleão que corre por fora
Todos os caminhos hoje, indicam que se Lula não conseguir ser candidato, o segundo turno será disputado entre Luciano Huck e Jair Bolsonaro
Por Marcello Faulhaber
Em outubro do próximo ano, os brasileiros irão às urnas eleger um novo presidente da República. Assim como outros analistas e estrategistas político-eleitorais, venho fazendo pesquisas e acompanhando de perto a movimentação dos potenciais candidatos – tenham eles declarado oficialmente a intenção de concorrer ou não.
Tudo isso demonstra que Huck é candidatíssimo. De acordo com as pesquisas qualitativas que tenho feito em vários municípios do país e com o modelo de projeções de resultados eleitorais que eu adoto (que cruza variáveis como nível de conhecimento, rejeição e intenção de voto dos diversos candidatos) ele, assim como Lula, Jair Bolsonaro e Joaquim Barbosa, já tem o dobro de chances de ir para o segundo turno se comparados com Marina Silva, Geraldo Alckmin, João Doria e Ciro Gomes.
Se Lula, realmente, não conseguir ser candidato; João Doria se vir obrigado a recuar do seu sonho presidencial; e Joaquim Barbosa decidir não disputar as eleições como cabeça de chapa, ouso afirmar, com doze meses de antecedência, que Luciano Huck, inevitavelmente, será um dos dois nomes do segundo turno das eleições. Mais que isso: poderá até ganhar a corrida presidencial já no primeiro turno, especialmente se conseguir fazer de Joaquim Barbosa o seu vice.
Para compreendermos o porquê disto, é preciso, em primeiro lugar, entender como o eleitorado brasileiro está segmentado. A maior parte dos analistas tende a segmentar o eleitorado brasileiro a partir de uma percepção unidimensional do eleitor. Com esse tipo de percepção, divide-se o eleitorado em esquerda e direita, ou, na melhor das hipóteses, em esquerda, centro-esquerda, centro, centro-direita e direita.
Nos polos desse tipo de segmentação, situam-se “entidades míticas” que habitam o inconsciente coletivo da classe média e que coincidem com os posicionamentos das tradicionais elites políticas do país: A “esquerda” – defensora do Estado grande e de valores comportamentais liberais; e a “direita” – defensora do Estado pequeno e de valores comportamentais conservadores.
Esse tipo de segmentação funciona muito bem em alguns países desenvolvidos, mas não no Brasil. De fato, em território tupiniquim, existe um problema grave nesse tipo de segmentação: a suposta correlação entre os valores comportamentais do eleitor e a sua visão a respeito do papel do Estado.
No Brasil, esse tipo de correlação é absolutamente falsa - mesmo no ambiente polarizado das redes sociais que tende a reduzir as pessoas a “coxinhas” e “mortadelas”. Não é verdade, especialmente entre eleitores das classes C2, D e E, que quanto mais conservador (do ponto de vista comportamental) for um eleitor, maior a sua preferência por um Estado pequeno; ou que, quanto maior a preferência de um eleitor por um Estado grande, mais liberais serão seus valores do ponto de vista comportamental.
Na realidade, o eleitor brasileiro, mesmo sem se dar conta, faz suas escolhas políticas, primordialmente, de acordo com essas duas variáveis não-correlacionadas: seus valores comportamentais e a sua visão a respeito do papel do estado. Em 2018, esse fenômeno será mais forte do que nunca. Dessa forma, para segmentar corretamente o eleitorado brasileiro, precisamos percebe-lo a partir de dois grandes eixos: o “eixo valores” e o “eixo visão do Estado”.
O “eixo valores” tem a ver com a opinião dos eleitores a respeito de assuntos como homossexualidade, religião, drogas, aborto e formas de combate à violência, entre outros. Os elementos causais mais críticos que definem o posicionamento do eleitor em relação a esses diversos temas são sua percepção sobre a família (o que é e como preservá-la) e sua defesa dos valores cristãos mais tradicionais. A forte correlação que existe no posicionamento dos eleitores em relação a esses diversos temas comportamentais, nos permite estabelecer dois polos no “eixo valores” e aqui - já consciente das críticas que virão de alguns teóricos - usarei a nomenclatura “liberais” e “conservadores”.
O “eixo visão do Estado” tem a ver com a opinião do eleitor a respeito do papel do Estado na provisão de renda (por meio de transferências) e de serviços para a população, além do quanto ele deve intervir na economia, seja como indutor do crescimento, seja como regulador. As duas variáveis mais críticas na definição do posicionamento do eleitor nesse eixo são a sua formação política na juventude e, principalmente, o seu nível de renda. Há também uma forte correlação nas preferências do eleitor em relação aos temas deste eixo. Chamarei o primeiro polo do “eixo visão” de “Estado grande” e o segundo, de “Estado pequeno”.
A partir desses dois eixos, podemos segmentar o eleitorado brasileiro em quatro grandes grupos: 1) eleitores com valores conservadores que preferem (ou precisam de) um Estado grande; 2) eleitores com valores liberais que preferem (ou precisam de) um Estado grande; 3) eleitores com valores conservadores que preferem um Estado pequeno; 4) eleitores com valores liberais que preferem um Estado pequeno.
Como já me referi anteriormente, nossas elites políticas se dividem entre os “liberais do Estado grande” (“a esquerda”) e os “conservadores do Estado pequeno” (“a direita”). Já as maiores fortunas e as lideranças dos principais grupos empresariais do país (o establishment) que, em larga medida, tem forte influência sobre a mídia, identificam-se com valores liberais e preferem um Estado pequeno (com exceção da conta de juros, evidentemente).
A última pesquisa que realizei, indica os seguintes percentuais para cada um desses segmentos do eleitorado: 55% para os “conservadores do Estado grande”, 23% para os “liberais do Estado grande”, 16% para os “conservadores do Estado pequeno” e apenas, 6% para os “liberais do Estado pequeno”. Esses percentuais nos demonstram o porquê da maioria da população se sentir tão pouco representada, seja por nossas elites políticas, seja pelos mais importantes veículos de comunicação do país.
A única candidatura que provavelmente adotará uma narrativa coincidente com um segmento específico será a do PSOL: seu discurso será liberal do ponto de vista comportamental e em defesa do “Estado grande”. Lula (apesar do PT), Bolsonaro, Doria, Alckmin e Ciro são candidatos que se posicionam exclusivamente em um polo de um eixo específico e são difusos no outro eixo: Lula e Ciro são os champions do “Estado grande”; Bolsonaro e Alckmin são os champions dos valores comportamentais conservadores; e Doria é o championdo “Estado pequeno” – não por acaso até muito recentemente, era o mais querido do mercado financeiro.
Huck, Marina e Joaquim Barbosa são candidatos “camaleônicos”: conseguem expressar imagens e discursos variados dependendo do público. Eles podem, por exemplo, ser percebidos por eleitores das classes C2, D e E como “conservadores do Estado grande” e simultaneamente, serem percebidos como “liberais do Estado pequeno” pelos eleitores das classes A, B e C1. No mundo de hoje, a figura que mais classicamente encarna esse tipo de posicionamento é a chanceler alemã, Angela Merkel: a líder que há mais tempo comanda um país democrático no mundo.
Num primeiro olhar, esse tipo de posicionamento pode parecer infalível, mas não é bem assim. No segundo turno das eleições, ele é bem próximo da invencibilidade, mas, no primeiro turno, ele pode ser bastante arriscado, especialmente num momento de forte polarização política como é o caso do Brasil atual. De fato, a fluidez nos posicionamentos pode se tornar alvo fácil dos adversários no primeiro turno – candidatos camaleônicos podem acabar ficando marcados por uma imagem de indecisão, incoerência e ambiguidade. Por isso, esse tipo de posicionamento demanda cuidados extras na comunicação política: a imagem pode sim ser camaleônica, mas o discurso jamais.
Além da correta segmentação do eleitorado e do posicionamento dos principais candidatos dentro dela, há uma terceira variável que será determinante na projeção do resultado da eleição presidencial de 2018: a habilidade dos candidatos se comunicarem com os eleitores das classes C2, D e E (que juntos, equivalem a 55% do eleitorado brasileiro). Apesar da eventual multiplicidade de candidatos e da possível pulverização dos votos, aqueles candidatos que não conseguirem se fazer ouvir pelos eleitores mais pobres, fatalmente ficarão fora do segundo turno. E aí, é preciso distinguir a imagem do candidato da capacidade dele se fazer ouvir. A imagem, de fato, potencializa a capacidade de se fazer ouvir. Mas, a imagem sem a capacidade de se fazer ouvir torna-se inócua.
Dentre os diversos candidatos, os únicos que podem desenvolver de forma crível uma imagem de quem conhece os problemas dos mais pobres, que se solidariza com eles e que trabalhará prioritariamente por eles, são: Lula, Marina, Luciano Huck, Joaquim Barbosa e Geraldo Alckmin (apenas em São Paulo). Por outro lado, os únicos que tem demonstrado capacidade retórica de serem ouvidos pelos mais pobres são: Lula, Bolsonaro e Luciano Huck – Marina se perdeu na complexidade dos próprios pensamentos “progressistas”; Joaquim Barbosa, depois de tantos anos de atividade jurídica, trocou a linguagem popular pela retórica da lei e terá dificuldades de fazer a viagem reversa; Ciro tem a capacidade de ser ouvido pelas massas, mas, há muito tempo, optou pela retórica tecnocrática a qual ele domina melhor que qualquer outro pleiteante ao maior cargo da república.
Sendo assim, por conta das características dos eleitores mais pobres, os candidatos que podem mais se beneficiar da eventual ausência de Lula das eleições são o apresentador Luciano Huck e por incrível que pareça (mas, em menor escala), Jair Bolsonaro - afinal, não há nada mais próximo de um extremo do que o outro extremo, especialmente num momento de grave crise econômica e de convulsão social.
É verdade que Ciro e Marina poderiam ser os herdeiros naturais dos eleitores de Lula, mas os problemas na retórica e na linguagem de ambos assim como suas críticas periódicas ao ex-presidente, tornam essa possibilidade cada vez mais remota. Quanto à possibilidade dos votos de Lula serem herdados por um “poste” do PT, esqueçam. É verdade que preso ou condenado, Lula se tornará o maior eleitor do país, mas ele conseguir levar um representante orgânico do PT para o segundo turno é algo muito improvável por conta da enorme rejeição ao partido – muito maior que a dele próprio. Se, como se vem falando, esse nome for o do Haddad - um “poste” derrotado e paulista - o que já era improvável tornar-se-á impossível.
Em resumo, todos os caminhos hoje indicam que se Lula não conseguir ser candidato, o segundo turno será disputado entre Luciano Huck e Jair Bolsonaro. Mas, o caminho é longo e erros fatais poderão ser cometidos.
No caso de Bolsonaro, há três erros possíveis no horizonte: 1) Ele adotar um discurso liberal na economia - Bolsonaro não pode perder a imagem do militar nacionalista, defensor do Estado forte, que induz o crescimento econômico e que protegerá a população da ganância de grandes grupos empresariais; 2) Ele não suavizar um pouco sua retórica conservadora - ele precisa fazer isso para evitar o crescimento da candidatura Alckmin (ou Doria) e principalmente, para ter alguma chance de vitória no segundo turno; 3) Ele permitir que uma outra candidatura do seu campo, como, por exemplo, a do General Hamilton Mourão, ganhe força nos próximos meses.
No caso de Luciano Huck, há também três erros que podem inviabilizar o sucesso de sua jornada rumo ao Palácio do Planalto: 1) Ele ser identificado pelos eleitores, especialmente os mais pobres e a classe média, como o candidato dos ricos, do establishment, da Globo. Afinal, a revolta da população com os principais veículos de comunicação do país é tão grande quanto sua revolta com nossas elites políticas - não adianta surgir como um não-político e ao mesmo tempo, ser percebido como o candidato do grande baronato do crony capitalismbrasileiro; 2) Ele cair na armadilha, assim como Aécio fez em 2014, de bater em Lula.
Aécio, incensado pelo establishment nacional e pelo tucanato paulista, não concentrou suas baterias sobre a presidente Dilma e seu governo, mas sobre Lula e o PT. Esse erro foi fatal na medida em que permitiu que os estrategistas do PT levassem o debate para a comparação dos 12 anos desse partido com os 8 anos de FHC. Foi essa estratégia equivocada de pregar para os convertidos que, em última análise, fez Aécio perder uma eleição que estava ganha. O fato é que milhões de brasileiros continuam extremamente gratos ao ex-presidente pela melhora histórica de suas condições de vida na década passada e o tempo tem nos mostrado que não há acusação, denúncia ou condenação capaz de mudar esse sentimento; 3) Ele não saber usar corretamente a estratégia do camaleão. No fundo, para ganhar essa eleição e fazer um governo histórico, será preciso que Luciano Huck seja mais coração e menos razão, que se guie mais por seus valores de homem de família que quer melhorar a vida das pessoas do que pela ideologia que há em sua cabeça.
O tempo vem consolidando Lula e Bolsonaro, duas reconhecidas figuras anti-establishment, como favoritos para o segundo turno das eleições. O não-político que parecia poder ameaça-los, segundo “analistas torcedores” do mercado financeiro, tornou-se mais político que todos os outros: colocou seu mandato recém conquistado em segundo plano para fazer campanha, passando por cima até mesmo de quem lhe criou politicamente - sua candidatura não tem futuro.Mas, agora, surge um não-político de verdade, correndo por fora e com chances reais de complicar a vida de Lula e Bolsonaro: o “camaleão” Luciano Huck.
Em maio deste ano, eu escrevi neste jornal que a eleição presidencial de 2018, da mesma forma como ocorreu nas principais capitais do país em 2016, seria ganha por um outsider: um não-político ou uma figura anti-establishment. A cada dia que passa, essa certeza só aumenta.
* Marcello Faulhaber é mestre (MSc.) em Economia Política pela London School of Economics e foi o estrategista da campanha de Marcelo Crivella à Prefeitura do Rio em 2016.
Rogério Furquim Werneck: A eleição presidencial começa a tomar forma
Lula aposta na possibilidade de ‘gerar uma comoção nacional’, caso venha a ser condenado em segunda instância
Ao cabo de intermináveis 160 dias, a crise política deflagrada em 17 de maio parece ter chegado ao fim, na semana passada. É hora de avaliar danos e verificar em que medida a travessia de 2018 ficou mais difícil. Com o país já a 11 meses das eleições, a sucessão presidencial passa a ser agora a questão crucial.
Boa parte do ano foi consumida em manobras para bloquear denúncias da Procuradoria- Geral da República contra o presidente. No final das contas, além de passar incólume pelo julgamento do Tribunal Superior Eleitoral, Temer conseguiu que a Câmara preservasse seu mandato. O que não é pouco.
Mas a preservação do mandato lhe saiu muito cara. A janela de oportunidade para aprovação da reforma previdenciária parece ter sido perdida. O capital político com que contava Temer no Congresso foi, em boa parte, dilapidado. A bancada governista encolheu, tornou- se menos confiável, mais conflagrada e incomparavelmente mais voraz. O vale- tudo para reforçar o apoio ao bloqueio das denúncias contribuiu para corroer ainda mais a imagem do presidente.
Como a travessia dos próximos 12 meses poderá ser afetada? As metas fiscais tiveram de ser relaxadas. E é quase certo que a reforma previdenciária terá de ser adiada. O governo ainda parece acreditar que, até dezembro, terá tempo para melhorar em alguma medida as perspectivas do quadro fiscal. Mas, com a proximidade do ano eleitoral, já não parece haver, no Congresso, disposição para aprovar medidas que possam contrariar o eleitorado.
É bem verdade que inflação abaixo da meta, taxa real de juros prestes a cair a menos de 3% e a perspectiva de uma retomada relativamente vigorosa da economia, em 2018, podem compensar, em alguma medida, as apreensões com o quadro fiscal mais adverso e ajudar a travessia.
Mas o destravamento de decisões de investimento ainda depende de um desfecho favorável na disputa presidencial do ano que vem. Ainda há muita água para passar debaixo da ponte. Mas, em meio a poucas certezas e muitas dúvidas, a configuração da disputa começa a tomar forma.
Enredado em sérias dificuldades com a Justiça, Lula parece empenhado em ser candidato a qualquer custo. E aposta na possibilidade de “gerar uma comoção nacional”, caso venha a ser condenado em segunda instância. O PT continua alegando não ter plano B. E vem tentando se eximir de qualquer culpa pelo desastre em que meteu o país. Seu último programa veiculado na televisão é um primor de mistificação. Atribui o descalabro deixado por Dilma Rousseff à “crise internacional de 2015”, ano em que a economia mundial cresceu 3,1%, e as economias emergentes, nada menos que 4%!
No lado oposto do espectro, o discurso extremado de Bolsonaro continua lhe assegurando bom desempenho nas pesquisas de intenção de votos. Ainda há quem acredite que sua candidatura poderá vir a ser sufocada por falta de recursos. Mas o mais provável, por ora, é que Bolsonaro tenha votação expressiva, que candidatos de centro terão de levar em conta, caso queiram chegar ao segundo turno.
O que mais importa, no momento, é como o centro do espectro de forças políticas deverá se apresentar na disputa presidencial. Por sorte, já há sinais de que os principais pré- candidatos de centro perceberam, afinal, que o mais prudente, tendo em vista o que lhes espera, à esquerda e à direita, é unir forças e tentar construir uma ampla coalizão, multipartidária, em torno de um deles.
Não se pode subestimar as enormes dificuldades envolvidas nesse desafio. Mas não há como deixar de enfrenta-las. E parece a cada dia mais claro que a única argamassa que pode dar solidez a uma coalizão tão ampla e heterogênea — que vá de tucanos “cabeças pretas”, de um lado, à tropa de choque de Temer, do outro — é o compromisso comum com a manutenção, no próximo mandato presidencial, da política que vem sendo levada à frente pela equipe econômica do atual governo. Política que Lula vem prometendo, país afora, desmantelar.
É isso que estará em jogo em 2018. E não há tempo a perder.
* Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC- Rio
Merval Pereira: Luz de advertência
A luz amarela que o prefeito de São Paulo João Doria acendeu depois da primeira pesquisa Ibope para a Presidência da República em 2018 indica que a possibilidade de uma polarização entre Jair Bolsonaro e Lula assusta, ou deveria assustar, as demais forças políticas que começam a se organizar para a disputa.
Doria parece disposto a não se chocar com seu patrono, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, mas, para ele, o susto com a radicalização da campanha é um bom motivo para mantê-lo em uma corrida que parece perdida internamente no PSDB.
Ele não pretende sair do partido para disputar a eleição presidencial, mas diz que aprendeu que, em política, um dia é uma eternidade, quanto mais seis meses, o tempo máximo para uma definição. Isso significa que até lá há possibilidade de uma mudança na tendência tucana, hoje francamente favorável a Alckmin.
Se não acontecer, Doria fará uma composição com o governador de São Paulo, para disputar sua sucessão ou, mais provavelmente, permanecer na prefeitura, tornando-se o candidato natural do partido para voos mais altos logo adiante.
No fundo, ele não perde as esperanças de que o PSDB se convença de que seu estilo agressivo de ser anti-Lula ainda é a melhor opção para vencer a eleição de 2018, mesmo com a queda de popularidade que abalou seu favoritismo.
Essa queda, aliás, parece ter tido o poder de levar Doria a uma posição mais reflexiva, admitindo ter cometido erros na ânsia de cumprir metas e realizar promessas. O político arrojado que queria abraçar o mundo com as mãos e as pernas parece estar se convencendo de que é preciso dar tempo ao tempo.
Desacelerar, dar dois passos atrás para depois avançar, como ele mesmo definiu ontem em conversas diversas no Rio. O sinal de advertência que anunciou, pedindo a união entre os políticos de centro para combater os que identifica como extremistas de esquerda e de direita, é uma demonstração de que não pretende esgarçar sua relação com o governador Geraldo Alckmin, que esteve a ponto de se romper, ou mesmo inviabilizar sua permanência no PSDB.
Doria parece convencido de que se candidatar a presidente depois de uma disputa interna com seu mentor lhe daria uma vitória de Pirro, identificando-o como traidor, marca difícil de superar. Mas está convencido também de que a campanha será dura e renhida e, por isso, considera que um outsider como Luciano Huck não aguentaria o tranco.
A união em torno de uma candidatura de centro, que, não sendo a dele, seria a do governador Geraldo Alckmin, daria a ela um respaldo eleitoral para superar a radicalização dos extremos. É sempre bom lembrar que Aécio Neves, o candidato do PSDB em 2014, saiu de São Paulo com uma vantagem de sete milhões de votos, mesmo sendo mineiro.
O último candidato paulista à Presidência, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, saiu do estado com cinco milhões de votos de vantagem e venceu Lula no primeiro turno duas vezes. Pacificados os tucanos em São Paulo, o candidato de consenso pode sair do estado com uma vitória maior ainda, que pode viabilizar a chegada ao segundo turno.
A questão é melhorar a performance em outras regiões do país hoje claramente tendentes a Lula, como no Nordeste, onde o ex-presidente chega a ter 50% dos votos. A primeira pesquisa do Ibope, confirmando a polarização entre os candidatos dos extremos políticos, fez com que as forças políticas de centro se convencessem de que é preciso unir esforços para se viabilizarem na disputa, que promete ser mais favorável aos que fazem da política uma guerra do “nós contra eles”.
Doria tentou se colocar como o anti-Lula e acabou perdendo terreno dentro do próprio partido, mas continua fazendo questão de manter essa marca. Como já sabe que, até a decisão final, há uma eternidade política pela frente, ainda acredita que reverterá a queda de popularidade.
Mas já se convenceu de que não terá chances se não for o candidato de consenso dentro de uma coalizão centrista.