lula
Míriam Leitão: Transporte de provas
Decisão da 2ª turma ignora engenharia financeira da corrupção. A ação penal que trata do Instituto Lula está na fase das alegações finais, a do sítio de Atibaia está começando a ouvir as testemunhas e agora, por decisão da 2ª turma do STF, os documentos das delações da Odebrecht sobre isso serão enviados para São Paulo. É só o transporte de provas, ou é o começo de algo muito maior que levaria os processos do ex-presidente Lula para longe de Curitiba?
Pode ser muito mais, pode ser apenas um detalhe confuso criado por ministros do Supremo no processo da Lava-Jato. Não será a primeira vez que isso ocorre. Procuradores da Força Tarefa anexaram, ontem, declaração nos processos em que afirmam que não houve discussão sobre a competência, como o próprio ministro Dias Toffoli disse. No voto, ele registrou que não firmaria “em definitivo a competência do juízo". A porta está aberta. O único que se sabe é que isso não afeta, obviamente, o caso do triplex, que já está julgado. Mas dos outros não há certeza.
É curioso o argumento do voto do ministro Toffoli, acompanhado pelos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandovsky, de que não há ligação entre esses casos investigados nas duas ações penais e as propinas pagas nos negócios escusos com a Petrobras.
É preciso ter estado em Marte nos últimos anos para desconhecer que as empresas corruptas trabalhavam com uma espécie de "caixa geral da propina". Alguns delatores chegaram a usar essa expressão em suas delações. A Odebrecht tinha um departamento secreto no qual estruturava o pagamento de suborno e a distribuição de vantagens. Não havia propinas em compartimentos estanques que, por algum tipo de compliance, não pudessem ser usadas em outra ponta do mesmo negócio de comprar benefícios no setor público. É preciso também ser estrangeiro aos fatos para desconhecer que esses casos começaram a ser investigados em Curitiba e, portanto, pegar alguns papeis e enviá-los para São Paulo, por qualquer minudência jurídica, é uma forma de confundir.
No voto, o ministo Dias Toffoli disse que o empresário Emílio Odebrecht falou em hidrelétricas do Rio Madeira como parte dos benefícios a Lula. Alexandrino Alencar falou em gastos no sítio de Atibaia feitos “como contrapartida pela influência política exercida pelo ex-presidente", e Marcelo Odebrecht disse que os valores para a compra do Instituto Lula sairiam da conta “amigo”, onde foram provisionados R$ 35 milhões, em 2010, “para suportar gastos e despesas do então presidente Lula”.
Diante disso, o ministro concluiu: “não diviso, ao menos por ora, nenhuma imbricação específica dos fatos descritos nos termos de colaboração com desvios de valores operados no âmbito da Petrobras". Como não se pode acusar o ministro, e os que o acompanharam, de ingenuidade, a conclusão é de que eles se esqueceram da forma imbricada como a engenharia financeira da corrupção sempre funcionou. Tirou-se dinheiro de vários negócios com o governo, mas a Petrobras sempre foi ordenhada para financiar o esquema.
Várias investigações de corrupção no passado foram sepultadas por detalhes levantados pelos advogados para se requerer a nulidade das provas. Inúmeras manobras deram certo. O Brasil poderia estar bem mais adiantado na luta contra a corrupção, se os tribunais superiores não tivessem derrubado os processos por questiúnculas.
O ex-senador Demóstenes está livre para se candidatar por uma dessas. O ministro Dias Toffoli suspendeu a inelegibilidade porque houve a nulidade da prova do processo contra ele. A prova foi considerada nula porque um juiz de primeira instância não poderia determinar uma escuta telefônica envolvendo um senador da República, já que ele tem foro privilegiado. Com esse argumento foram invalidadas as interceptações telefônicas das operações Vegas e Monte Carlo. O problema é que ninguém na primeira instância havia autorizado ouvir o senador. Os telefones que estavam sendo gravados eram os de Carlinhos Cachoeira e outros integrantes da quadrilha. O então senador é que tinha relação com eles e só por isso foi ouvido. Mas por este detalhe, as provas obtidas com o esforço de sempre dos investigadores foram anuladas, e o ex-senador poderá limpar sua ficha e se candidatar.
O risco nessa decisão da 2ª turma não é esse transporte de provas, é o que pode vir em consequência disso.
El País: Decisão sobre Lula expõe volatilidade do STF e submete Lava Jato a incertezas
Advogados aproveitam brecha para pedir que Moro envie todo o processo envolvendo o petista para a Justiça de São Paulo
A decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal que retirou das mãos do juiz Sérgio Moro trechos de um processo envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva lança incertezas na relação da Corte com a Operação Lava Jato e é mais um exemplo da inquietante volatilidade das posições do tribunal, pois contraria determinação tomada seis meses atrás. Três analistas ouvidos pelo EL PAÍS acreditam que a decisão abre um precedente para outros casos similares - ou seja, mais ações em curso podem sair da alçada de Moro. Ponderam, porém, que não é razoável dizer que, se processos forem julgados por outros juízes, a operação será estancada ou que todos os políticos, doleiros, marqueteiros e empresários implicados acabarão inocentados.
“Criou-se uma ideia de que o Moro é o juiz universal do Brasil. Que vai salvar todo o mundo e acabar com a corrupção. O que não é verdade”, afirmou o professor de direito processual penal Afrânio Silva Jardim, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e crítico da Lava Jato. Na visão deste jurista, que é livre docente, outros juízes que trabalham nos desdobramentos da Lava Jato acabaram sendo mais rigorosos que o próprio Sérgio Moro. “No Rio, o Marcelo Bretas é muito mais severo que o Moro. Aliás, o Moro é severo com alguns. Os diretores e gerentes da Petrobras, que admitiram desvios e devolveram 60% do que pegaram, estão em prisão domiciliar. E o Lula está preso”.
A dúvida que pairava nos casos envolvendo Lula, e outros investigados pela Lava Jato, é a seguinte: em qual comarca o processo deve tramitar, na em que os crimes teriam ocorrido ou na que se descobriu os delitos? O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti, diz que é “absolutamente normal” a discussão sobre a competência dos processos envolvendo qualquer investigado. Afirma que, se atuasse no caso Lula, ele próprio poderia defender tanto os que querem que o caso tramite em Curitiba como os que querem que siga para São Paulo. Mas disse estranhar e ver com preocupação a mudança de posicionamento da segunda turma do STF. “O que causou estranheza foi o giro de 180 graus, em embargos de declaração sobre uma causa decidida em unanimidade”.
Em outubro, os cinco ministros da turma negaram um pedido da defesa e decidiram que os trechos nos quais os delatores relatam o suposto repasse de verbas indevidas para Lula, incluindo a reforma de um sítio de Atibaia (SP), não estavam relacionados diretamente com a Petrobras, que é a investigação original da Lava Jato, portanto, não deveriam ficar com o magistrado em Curitiba. Essa decisão foi revista ontem. Mantiveram o posicionamento de outubro os ministros Edson Fachin e Celso de Mello. Aderiram ao novo entendimento os ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandovski. “Neste momento há insegurança jurídica. E isso é o oposto do que deveria fazer o Supremo. Sem julgar o mérito. Dar guinadas em qualquer matéria só porque algum ministro mudou de opinião não é positivo para o sistema jurídico brasileiro”, avaliou o procurador Robalinho.
Dizendo-se perplexo com a decisão, o promotor de Justiça em São Paulo e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, Roberto Livianu, afirma que espalhar por diversas seções judiciais processos que aparentemente têm relação entre si é negativo para a eficiência processual. “Agora, você tem a óbvia possibilidade de se ter decisões conflitantes.” A opinião é compartilhada pelo procurador Robalinho. “O juiz Moro e os colegas da força-tarefa em Curitiba fazem um trabalho excepcional. Retirar de um juiz que já está em conhecimento profundo do processo, em fase final de instrução, nunca é positivo seria uma atitude temerária da Justiça”, afirmou.
Já o professor Silva Jardim diz que o Supremo pode estar tentando arrumar erros cometidos no passado, quando alguns dos réus já haviam solicitado essa transferência de comarca, mas não haviam conseguido. “A euforia com a Lava Jato está acabando. O endeusamento dos procuradores e do juiz, as premiações, as entrevistas midiáticas, tudo tem diminuído”.
Embates judiciais
Neste ambiente de incertezas, iniciou-se um embate entre os procuradores da Força-Tarefa da Lava Jato e os advogados de Lula. Embasados na decisão da 2ª Turma do STF, os procuradores enviaram um documento ao juiz Moro no qual defendem a permanência dos processos de Lula na vara de Curitiba. Dizem ainda que há um “lamentável tumulto processual”.
Já os defensores do petista entraram com um pedido na mesma vara judicial para que o magistrado Moro encaminhe para livre distribuição da Justiça de São Paulo as ações penais a que o petista responde sobre o sítio de Atibaia (onde Lula é suspeito de tê-lo recebido em um ato de corrupção) e sobre a compra de um terreno para seu instituto.
O ex-presidente é réu em sete processos e está preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba por ter sido condenado em um deles, o que tratava do triplex do Guarujá. Lula cumpre pena de 12 anos de prisão.
Luiz Carlos Azedo: A reação garantista
Assim como houve uma blindagem no Congresso, via legislação eleitoral, para salvar os grandes partidos, começa a reação do mundo jurídico para blindar a elite política contra a Lava-Jato
As pesquisas de opinião são inequívocas: a corrupção é a principal preocupação dos brasileiros, maior até do que a saúde, a educação e a segurança, cujas mazelas são associadas pelo eleitor à roubalheira dos cofres públicos. Mesmo se a Lava-Jato estivesse com os dias contados — ainda não é o caso —, esse cenário não mudaria até as eleições. O ambiente econômico de estabilidade da moeda, redução de juros e retomada da geração de emprego modesta diante das necessidades do país, faz com que a questão da ética na política venha a ter o mesmo peso que teve para a sociedade o combate à inflação durante o Plano Real. Houve uma mudança de paradigma quanto a isso, quem quiser que se engane.
Esse diagnóstico, porém, não foi capaz de produzir um novo consenso político nacional, como foi a luta contra a inflação, por exemplo. O motivo é o modus operandi da política nacional e o envolvimento das lideranças dos principais partidos do país nos escândalos investigados pela Lava-Jato e outras operações de combate à corrupção. Nesta semana, por exemplo, as investigações chegaram à cúpula do PP, partido que ampliou sua bancada exponencialmente no recente troca-troca partidário. Saltou de 38 deputados eleitos para 53 parlamentares, atrás apenas do PT, que ainda tem a maior bancada, com 60 deputados, mesmo perdendo 9 parlamentares ao longo da atual legislatura.
O PP é a bola da vez nas investigações da Operação Lava-Jato, com a realização de operações de busca e apreensão nos gabinetes e residências do presidente da legenda, senador Ciro Nogueira (PI), e do líder da bancada na Câmara, deputado Dudu da Fonte (PE). O crescimento do PP contrasta com a perda de deputados do MDB, cuja bancada foi reduzida de 65 para 50 deputados, mesmo com o partido no poder, e também do PSDB, que tinha 54 deputados e agora está com 48. Outro partido que cresceu muito no troca-troca foi o DEM, que elegeu 21 deputados e está com 43 representantes, graças à atuação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ). Uns mais, outros menos, todos têm em comum o envolvimento de ex-presidentes na Operação Lava-Jato.
De certa forma, a cúpula do Congresso conseguiu se blindar na reforma política, que garante vantagem estratégica para os grandes partidos, em termos de tempo de televisão e recursos financeiros, principalmente nas eleições proporcionais; nas eleições majoritárias, as disputas regionais sofrerão grande impacto da Operação Lava-Jato, mas os políticos enrolados nas investigações poderão concorrer à Câmara dos Deputados e, assim, tentar permanecer no Congresso. O catalisador da insatisfação popular com a corrupção, porém, é a disputa para presidente da República. Esse é o rubicão para quem quiser se eleger. Seja porque pode ficar fora da disputa por causa de condenações, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seja em razão do ambiente tóxico de seu próprio partido, como está acontecendo com o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin.
Blindagem
Assim como houve uma blindagem no Congresso, via legislação eleitoral, para salvar os grandes partidos, começa uma forte reação do mundo jurídico para blindar a elite política do país em relação às condenações da própria Lava-Jato. As grandes bancas de advocacia reagem com astúcia processual e poder de articulação junto aos tribunais, principalmente no Supremo, onde se trava hoje um grande choque de concepções: o velho Direito romano-germânico, que serve de alicerce para as nossas instituições, está sendo confrontado pelo “americanismo” de jovens juízes e promotores, inspirados no Direito anglo-saxão. A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) lidera a reação garantista; por isso, é chamada de Jardim do Éden pelos advogados.
Há duas linhas de frente nesse embate. Uma é o caso de Lula, que está preso em Curitiba e impedido de disputar as eleições por causa da Lei da Ficha Limpa. A disputa se dá em torno da questão da execução da pena após condenação em segunda instância, jurisprudência que já foi objeto de três decisões do Supremo, mas que pode ser revista se o assunto for posto novamente em pauta devido à correlação de forças existente na Corte.
A outra frente é a discussão sobre a amplitude da Operação Lava-Jato, da qual o juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara de Curitiba, em primeira instância, e o ministro-relator Edson Fachin, no Supremo Tribunal Federal (STF), são responsáveis. Ambos estão sendo questionados como “juízes naturais”, o primeiro em relação às investigações que não estão diretamente ligadas ao escândalo da Petrobras; o segundo, quanto aos pedidos de habeas corpus, recursos e embargos dos réus e condenados da Lava-Jato. Esse embate vem se repetindo nas últimas semanas e deve se intensificar depois de setembro, quando Dias Toffoli assumirá a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF); em compensação, a ministra Cármen Lúcia, atual presidente da Corte, ocupará seu lugar na Segunda Turma, que passaria a ser uma espécie de “purgatório”.
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-reacao-garantista/
El País: STF muda de ideia e retira de Moro delação da Odebrecht que cita Lula
Segunda turma, que em outubro havia enviado trechos a Curitiba, agora diz que caso não é da Lava Jato. Defesa de Lula celebra e Gilmar Mendes sinaliza que decisão pode ter repercussão ampla
A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde 7 de abril em Curitiba, teve uma rara e surpreendente vitória contra a Operação Lava Jato e o juiz Sérgio Moro cujas implicações completas ainda estão por ser conhecidas. Por maioria de votos, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça retirar das mãos de Moro parte das delações da Odebrecht que citam Lula e remetê-las à Justiça de São Paulo. Para três dos cinco ministros, os trechos nos quais os delatores relatam o suposto repasse de verbas indevidas para Lula, incluindo a reforma de um sítio de Atibaia (SP), não estão relacionados diretamente com a Petrobras, que é a investigação original da Lava Jato, e portanto, não deveriam ficar com o magistrado em Curitiba. O mais curioso é que os mesmos ministros haviam negado um recurso da defesa do petista em outubro no mesmo caso - e por unanimidade. Agora, mudaram de ideia os ministros Antonio Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que acabou desempatando o jogo a favor do ex-presidente.
O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, comemorou e disse que a decisão corrobora o argumento reiterado da defesa de que nenhum caso do ex-presidente deveria estar nas mãos de Moro - uma vara que seus advogados consideram artificial em Curitiba após o desmembramento da Lava Jato para juízes em vários Estados. "Entendemos que essa decisão da Suprema Corte faz cessar de uma vez por todas o juízo de exceção criado para Lula em Curitiba, impondo a remessa das ações que lá tramitam para São Paulo", disse Zanin, em nota.
Apesar das palavras de Zanin, no entanto, Moro - que condenou Lula no caso do triplex do Guarujá pelo qual ele está preso - segue, pelo menos por ora, como o juiz que sentenciará o petista em dois outros casos, só que não poderá, a princípio, usar os trechos das delações da Odebrecht que o STF resolveu enviar a São Paulo. Porém, é inegável que a decisão é um revés tanto para juiz como para os procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Em um dos processo que estão em Curitiba, Lula é acusado de supostamente ter recebido propina no valor de 12,5 milhões de reais da Odebrecht. O valor é referente a um terreno em São Paulo onde, segundo delatores, seria construída a nova sede do Instituto Lula, e um imóvel vizinho ao seu apartamento em São Bernardo do Campo. Na outra ação, o ex-presidente é acusado de receber das empreiteiras OAS, Odebrecht e Schahin vantagens indevidas no valor de 1,1 milhão de reais por meio de reformas em um sítio em que frequentava em Atibaia (SP). No caso do sítio, por exemplo, a denúncia contra Lula, de março do ano passado, fala especificamente que entre 2010 e 2011, o ex-presidente se associou criminosamente à Odebrecht, "e em detrimento da Petrobras", para desviar 700.000 reais em reformas em Atibaia.
Não foi assim que entenderam nem Toffoli nem os ministros que concordaram com ele. “Não diviso, ao menos por ora, nenhuma imbricação específica dos fatos descritos (na delação) com desvios de valores operados no âmbito da Petrobras”, lançou o ministro, de acordo com o relato da assessoria do STF. Em outro momento, o magistrado comenta que os delatores falam de favores prestados "como contrapartida pela influência política exercida pelo ex-presidente em favor do grupo", mas não especificamente ligado aos contratos da estatal petroleira.
Porta aberta para questionar Moro
A forma de desmembramento da Lava Jato, que começou em Curitiba, é um dos grandes debates da operação. Não só Lula, mas réus como Paulo Skaf (MDB), da FIESP e pré-candidato ao Governo de Estado de São Paulo, já tentaram tirar os casos de Moro - Skaf com sucesso. Nesse sentido, a derrota desta terça pode ser um sinal de alerta para Curitiba. Gilmar Mendes, que costuma enviar recados em suas frequentes manifestações à imprensa, disse que a sentença pode, sim, abrir a porta para questionar os casos sob a responsabilidade da Lava Jato no Paraná. Após o julgamento, Mendes respondeu: "Qual vai ser a implicação? Obviamente que, se se declinou para São Paulo, os processos terão que ir para lá". "Poderá haver recurso em relação a processos que estão com Moro sob argumento de que não se trata de Petrobras. E isso pode vir até aqui em outro contexto. Eu não sei quais implicações em todos os casos", disse o magistrado, segundo O Globo.
Gilmar Mendes minimizou ter mudado de ideia sobre o recurso da defesa de Lula tão pouco tempo - ele que também alterou seu entendimento sobre a questão da prisão após condenação em segunda instância. Seja como for, na imprevisibilidade que domina o STF, Toffoli deixou a porta aberta para mudar de opinião mais uma vez. Disse, de acordo com a assessoria, que "a investigação se encontra em fase embrionária" e que, por isso, "sua decisão não firma, em definitivo," com qual juiz devem ficar as delações.
Demétrio Magnoli: O partido que não temos
Uma muralha separou FHC de Lula. O resultado foram as alianças sucessivas do PSDB e do PT com o PMDB — e o colapso do sistema político da Nova República
FHC disse, há pouco, que se arrepende de, no passado, não ter se aproximado de Lula. Em entrevista recente, Fernando Haddad, possível candidato lulista à Presidência, reconheceu o avanço econômico e institucional obtido pelo Plano Real. As duas declarações reinstalam uma questão histórica especulativa, mas relevante num sentido tão atual quanto inesperado: o que teria sido o Brasil se o PSDB e o PT tivessem optado pela aliança, no lugar da letal rivalidade?
“Opção” não é o termo apropriado. A rivalidade é fruto de escolhas anteriores dos dois principais partidos que nasceram na transição à democracia. Na sua complexa trajetória ideológica, o PT roçou a social-democracia para, imediatamente, trocá-la pela tradição populista da esquerda latino-americana. O PSDB, por sua vez, afastou-se da social-democracia para conduzir as reformas liberais de estabilização da economia e, depois daquela etapa heroica, dissolveu seus ensaios programáticos na mera pregação da ortodoxia econômica e num defensivo antipetismo. Uma muralha separou FHC de Lula. O resultado foram as alianças sucessivas do PSDB e do PT com o PMDB — e o colapso do sistema político da Nova República.
A crise política brasileira inscreve-se, como singularidade, na crise mais ampla das democracias ocidentais. Na Europa e nos EUA, sob formas distintas, regridem os grandes partidos de centro-esquerda e centro-direita. Na América Latina, o “Extremo-Ocidente”, o esgotamento do neopopulismo não parece abrir caminho a uma nova onda sustentada de reformas liberais. O traço marcante do cenário brasileiro é a fadiga do centro político: Lula e Bolsonaro emergem como relevos notáveis na planície desolada. As escolhas do PSDB e do PT têm forte responsabilidade pela desolação.
A “fórmula Macron” tornou-se, com boas razões, uma obsessão entre os que investigam saídas para o declínio do centro político no Brasil. Contudo, de modo geral, como atesta a fracassada “operação Luciano Huck”, não se entendeu que a ascensão de Emmanuel Macron nada tem a ver com a rejeição da política ou dos políticos. O presidente francês deflagrou seu movimento por um gesto de ruptura, com o Partido Socialista, e um de construção, de um novo partido com nítida definição ideológica.
O “Em Marcha”, de Macron, ergueu-se sobre dois pilares que se completam e se contestam: o socialismo democrático e o liberalismo progressista. Nenhum deles é uma novidade no universo das democracias ocidentais. A novidade está na fusão de tradições ideológicas aparentemente inconciliáveis. O primeiro é o que o PT poderia ter sido; o segundo, o que o PSDB poderia ter sido.
O liberalismo progressista nasce da herança liberal, mas rejeita sua massacrante carga conservadora. Os liberais clássicos puseram o acento nas liberdades econômicas e políticas — isto é, na limitação do arbítrio estatal. Mas, oriundos dos sistemas políticos elitistas do passado, desprezaram a importância das liberdades públicas — isto é, do direito de reivindicar salários e proteções sociais. O liberalismo progressista, um fruto das democracias de massas, abraça a luta contra a pobreza, a exclusão e a discriminação.
O socialismo democrático emana da herança social-democrata, mas distingue-se pela sua abordagem do tema da igualdade. Na social-democracia tardia, o “bem público” tornou-se quase indistinguível dos interesses corporativos: a inflexível regra trabalhista, a aposentadoria precoce, os subsídios aos “campeões nacionais”, os privilégios das castas superiores do funcionalismo. O socialismo democrático, em contraste, sublinha o valor dos direitos sociais universais e dos serviços públicos: o hospital, a escola, o metrô, a água limpa, o teatro, a biblioteca, a praça e o parque.
As duas tradições são estranhas à história política latino-americana. No “Extremo-Ocidente”, o liberalismo importado da Europa revestiu sociedades patriarcais, patrimonialistas, assentadas na propriedade fundiária. O DEM e o MBL, cada um a seu modo, explicitam a natureza corrompida do liberalismo caboclo. Já o socialismo, também importado, contaminou-se com os metais pesados do caudilhismo, do populismo e, mais depois, do stalinismo em versão castrista. O PT e sua pobre dissidência psolista evidenciam o caráter farsesco do socialismo brasileiro.
Mas a fórmula dual de Macron oferece respostas para nossos impasses crônicos que, na campanha em curso, manifestam-se pela fragmentação de candidaturas situadas entre a centro-esquerda e a centro-direita. A régua do liberalismo progressista descortina um horizonte além do capitalismo de estado de raízes varguistas e atualização lulopetista. O compasso do socialismo democrático propicia uma reinterpretação das políticas sociais, afastando-as da armadilha corporativista.
Os caminhos do PSDB e do PT se desencontraram. Seguindo trilhos divergentes, os dois partidos nucleares da “Nova República” consumiram totalmente seu combustível ideológico. Mas, sem qualquer nostalgia, vale a pena imaginar o que poderia ter sido: o exercício servirá, talvez, para reinventar o presente.
---------------------
Demétrio Magnoli é sociólogo
Folha de S. Paulo: Presidenciáveis enfrentam mais de 160 investigações em tribunais pelo país
Problemas judiciais vão de Lava Jato a barbeiragem no trânsito, mostra balanço da Folha
Por Ranier Bragon , Camila Mattoso e Laís Alegretti
Pelo menos 15 dos 20 políticos cotados para disputar a Presidência da República em outubro são alvo de mais de 160 casos em tribunais do país inteiro.
De Lava Jato a barbeiragem no trânsito, há investigados, denunciados, réus, condenados e um preso, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que lidera as pesquisas eleitorais. Levantamento feito pela Folha nos tribunais superiores, federais e estaduais mostra que a Lava Jato e suas derivações, além de outras investigações de desvio, são pedras no sapato de ao menos oito presidenciáveis.
Esse pelotão é liderado por Lula —condenado a 12 anos e um mês—, o presidente Michel Temer (MDB) — alvo de duas denúncias e de duas investigações em andamento—, o senador e ex-presidente Fernando Collor (PTC) —réu na Lava Jato e alvo de outros quatro inquéritos— e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), investigado em dois inquéritos na maior operação de combate à corrupção da história do país.
Com exceção de Lula, que tem até 31% das intenções de voto, Temer, Collor e Maia não ultrapassam 2%, segundo o Datafolha. A condenação e prisão praticamente inviabilizaram a candidatura de Lula, mas o PT afirma que fará o registro do ex-presidente na disputa. Nos bastidores, no entanto, são cogitados para substituí-lo o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e o ex-governador da Bahia Jaques Wagner.
Sobre Haddad, há uma investigação aberta por suposto caixa dois, em decorrência da delação do empresário Ricardo Pessoa, da empreiteira UTC, um dos delatores da Lava Jato. Em relação a Wagner, ele foi alvo recentemente da Operação Cartão Vermelho (que apura suspeita de propina na reforma da Arena Fonte Nova). Outros dois outros casos foram enviados para o juiz Sergio Moro, responsável pela Lava Jato no Paraná.
O ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) teve seu caso enviado para a Justiça Eleitoral, o que o tirou da mira imediata da Lava Jato. Nesta sexta (20), o Ministério Público de São Paulo afirmou que também irá investigar se o tucano cometeu improbidade administrativa no episódio, que é a suspeita de recebimento caixa dois de mais de R$ 10 milhões. Delatores da Odebrecht afirmam ter direcionado o dinheiro à campanha do tucano ao governo paulista em 2010 e 2014. Segundo o Datafolha, Alckmin tem 8% das intenções de voto, no melhor cenário.
Tanto Alckmin quanto Haddad são alvos também de ações por questões administrativas, motivadas pela passagem de ambos pelo comando do Executivo paulista e paulistano. O ex-prefeito, por exemplo, responde a ação do Ministério Público por suposta falta de planejamento na construção de ciclovias. O tucano é alvo, entre outras, de ações da bancada do PT sob o argumento de ilegalidades em licitações e outras ações de governo. Outro investigado é o ex-presidente do BNDES Paulo Rabello de Castro (PSC).
Como representante de uma empresa de qualificação de risco, ele foi alvo de quebra de sigilo bancário e fiscal e depôs em investigação sobre possíveis fraudes em investimentos do fundo de pensão dos Correios, em fevereiro. Castro também tem quase um traço nas pesquisas (1%).
Um segundo grupo de presidenciáveis responde por declarações que podem ser consideradas crime. É puxado por Jair Bolsonaro (PSL), um dos líderes na corrida ao Planalto na ausência de Lula (17%).
O deputado responde a duas ações penais no STF sob acusação de injúria e incitação ao estupro, além de uma denúncia por racismo por palestra em que criticou quilombolas —na área cível, Bolsonaro foi condenado nesse último caso, em primeira instância, a pagamento de indenização de R$ 50 mil. Ele recorreu. As acusações de incitação ao estupro são motivadas por um bate-boca em 2014 com a deputada Maria do Rosário (PTRS). Bolsonaro disse, na ocasião, que não não a estupraria porque ela não merece.
“O emprego do vocábulo ‘merece’ (...) teve por fim conferir a este gravíssimo delito, que é o estupro, o atributo de um prêmio, um favor, uma benesse à mulher, revelando interpretação de que o homem estaria em posição de avaliar qual mulher ‘poderia’ ou ‘mereceria’ ser estuprada”, diz parte do acórdão da 1ª turma do Supremo ao acolher em 2016 a denúncia.
Ciro Gomes (PDT) é o campeão, em volume, de casos na Justiça. Ele acumula mais de 70 processos de indenização ou crimes contra a honra, movidos por adversários. Temer, chamado de integrante do “lado quadrilha do PMDB”, é um deles. Ciro foi condenado em primeira instância e recorreu.
Outros adversários que o processam são Bolsonaro (chamado de “moralista de goela”), os tucanos José Serra (“candidato de grandes negócios e negociatas”) e João Doria (“farsante”), e o presidente do Senado, Eunício Oliveira (“pinotralha, uma mistura de Pinóquio com Irmão Metralha”). O pedetista tem 9% das intenções de voto.
O ministro aposentado do STF Joaquim Barbosa (PSB), que chega a 10% das intenções de voto, foi condenado por danos morais por ter dito que um jornalista “chafurdava” no lixo. Cabe recurso. A Folha localizou ainda casos como o de Guilherme Boulos (PSOL). Além de processos relacionados ao Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, do qual é líder, ele teria batido em setembro na traseira de uma moto, arremessando-a contra a traseira de outro carro, segundo o boletim de ocorrência.
O dono do outro veículo disse à Justiça que Boulos prometeu falar com seu advogado sobre o conserto. “Desde então o requerido [Boulos] não mais atende suas ligações.” O número de investigações e processos pode ser maior porque o levantamento não inclui ações em segredo de Justiça, processos trabalhistas e eventuais ações movidas na Justiça de primeira instância de estados que não são os de origem ou atuação política do presidenciável. Há também tribunais que dificultam o acesso público.
OUTRO LADO
Os presidenciáveis negaram irregularidades e disseram que serão absolvidos. A defesa de Lula e as assessorias de Michel Temer e de Fernando Collor, alvos da Lava Jato não quiseram se manifestar. Joaquim Barbosa não respondeu.
Advogado de Jair Bolsonaro, Gustavo Bebianno afirmou que a Procuradoria-Geral da República agiu com viés político na denúncia sobre racismo e que o deputado fez apenas uma brincadeira. “O Jair é contrário a qualquer tipo de cotas. O que aconteceu no passado, com índio, negro, seja lá quem for, tem que ficar no passado. A gente tem que construir é daqui pra frente, um Brasil igualitário.”
Sobre acusação de incitar estupro, afirmou que Bolsonaro só revidou a agressão, em momento de cabeça quente. Também por meio de sua assessoria, Geraldo Alckmin afirmou que está à disposição para esclarecimentos e que tem “total consciência da correção de seus atos”.
Sobre ações populares relacionadas a sua gestão, afirmou que elas foram movidas pela oposição e grupos de interesse e que “visam prejudicar o nome íntegro de um homem dedicado à vida pública”.
Ciro Gomes disse, via assessoria, que não teve o nome citado “na Lava Jato nem em qualquer roubalheira” e que todos os processos estão relacionados a opiniões, não a desvio moral. “É um caso muito semelhante ao Grupo Folha, que sempre primou pela liberdade de expressão e acumula contra ela cerca de 75 processos de injúria, calúnia e difamação.”
Rodrigo Maia, investigado na Lava Jato, afirmou que tem prestado os esclarecimentos necessários, que confia na Justiça e aguarda que “tudo seja esclarecido com a maior brevidade possível”. Sobre a rejeição das contas do DEM durante sua gestão, em 2010, afirmou que o partido recorreu porque o julgamento ocorreu sem que a defesa fosse ouvida.
Paulo Rabello disse confiar na elucidação do caso: “A partir da análise do material entregue os investigadores terão total condição de elucidar o caso, esclarecer as responsabilidades e enquadrar os eventuais culpados”.
Jaques Wagner não comentou as investigações contra ele. Fernando Haddad disse que o caso relativo à delação de Ricardo Pessoa será em breve arquivado, assim como as ações por questões dministrativas de sua gestão na prefeitura.
Guilherme Boulos afirmou, via assessoria, que “o próprio autor da reclamação diz que quem atingiu o veículo dele foi um motociclista, que teria fugido depois do acidente —e não o pré-candidato”.
O advogado de Flávio Rocha (PRB), Marcellus Ferreira Pinto, disse que na única ação a que responde, por coação, calúnia e injúria, movida pelo Ministério Público para defender uma procuradora do Trabalho, “a mesma será julgada improcedente.”
Manuela D’Ávila (PC do B), investigada ao lado de outros políticos por uso de cota parlamentar na emissão de passagens áreas para terceiros quando era deputada federal, disse que já houve pedido de arquivamento em um dos casos, além de decisões favoráveis aos réus.
Guilherme Afif (PSD) disse que só respondeu a duas ações na área cível, sendo uma extinta. A outra, de propaganda política irregular, está na “fase de apuração do valor a ser
ressarcido por oito requeridos.”
Aldo Rebelo (SD) foi processado pelo ex-presidente da CBF Ricardo Teixeira, que tentou censurar um livro sobre CPI que envolveu a entidade. O STJ revogou em 2017 a censura que fora acolhida.
Alvaro Dias (Pode) figura em antiga ação de execução do INSS. Sua assessoria jurídica disse que as peças do processo não estão disponíveis.
A Folha encontrou no nome de Henrique Meirelles (MDB) dois casos. Sua assessoria afirmou que se referem a cobrança de indenização por evento que ele não compareceu, mas que o ex-ministro ganhou as causas. A assessoria não respondeu se há outras ações.
Marina Silva (Rede) e João Amoêdo (Novo) afirmaram que não respondem a processos.
Merval Pereira: Bombas desarmadas
Duas bombas foram desarmadas ontem no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), uma pela argúcia do ministro Edson Fachin, auxiliado pela presidente Cármen Lúcia, outra pela maioria mais uma vez apertada de 6 a 5. A questão dos embargos infringentes, que permitem reabrir um julgamento quando o réu não for condenado por unanimidade, era talvez a mais grave, pois a sua admissão nos julgamentos das Turmas, não prevista no regimento interno do Supremo, vai atrasar os processos, levando os recursos para decisão do plenário. No entanto, era uma decisão inevitável já que, no julgamento do mensalão em 2013, a existência dos embargos infringentes acabou sendo admitida, embora muitos juristas e cinco dos 11 ministros consideraram que eles não mais existiam, pois as normas que regem os procedimentos do STF e do STJ não se referiam a eles.
Mas eles subsistiram no regimento interno do Supremo, provavelmente por um descuido do Tribunal, que não atualizou seu regimento interno após a Constituição. Sua simples permanência num regimento ultrapassado fez com que seis dos ministros à época os aceitassem, proporcionando a alguns dos réus, entre eles José Dirceu, se livrarem de condenações por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Cometido o erro lá atrás, nada mais natural que também as Turmas, que só recentemente passaram a tratar de casos penais, os admitissem, para dar aos condenados uma possibilidade de usar os embargos infringentes da mesma maneira que os julgados no plenário.
O que demonstra certa manobra jurídica por parte do ministro Dias Toffoli é que ele considerou que Paulo Maluf tinha direito aos embargos infringentes quando o ministro Fachin havia decretado o trânsito em julgado, encerrando o processo. Alegando motivos humanitários, ele conseguiu levar o assunto ao plenário, e conseguiu a maioria para sua aplicação. O que ele queria, na verdade, era reabrir o processo de Maluf. Sua proposta de que apenas um voto divergente bastasse para dar direito aos embargos infringentes, seguida por outros quatro ministros, faria com que grande parte dos casos julgados nas Turmas acabasse no plenário, postergando uma decisão final e talvez mesmo possibilitando a revisão de penas.
Acabou vencendo a maioria que vem se impondo, de 6 a 5, com uma troca de ministros: Alexandre de Moraes votou a favor de um voto divergente, e o ministro Celso de Mello deu a maioria para os dois votos, o que minimiza os estragos que possam ser causados pela criação de mais um embargo nos julgamentos das Turmas.
O outro incêndio apagado ontem pela perspicácia do ministro Edson Fachin foi a possibilidade de um ministro desautorizar outro em decisão monocrática, como aconteceu com Toffoli dando um habeas corpus quando o relator Fachin já havia encerrado o processo. Toffoli voltou a garantir que não pretendeu desautorizar seu colega, mas agiu em situação excepcional em caráter humanitário. Embora sua explicação, e todo o seu comportamento no episódio, evidenciem que não tinha mesmo a intenção de descumprir uma súmula do próprio STF que proíbe que um ministro desautorize decisão de outro, Toffoli abriu espaço para a discussão da questão.
O ministro Gilmar Mendes defendeu enfaticamente que essa prática fosse aceita, alegando que “o estado de direito não comporta soberanos”. Mas Fachin encerrou a discussão dando de ofício um habeas corpus a Maluf, permitindo que fique em prisão domiciliar. A presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, rapidamente encerrou a sessão, não dando margem a que outros ministros forçassem uma mudança de orientação, que poderia criar os maiores problemas para o Supremo, com um ministro cassando a decisão de outro.
A presidente Cármen Lúcia vai ter de usar toda sua delicada autoridade para tratar, na próxima semana, de um assunto delicado: a tentativa do ministro Marco Aurélio de levar a julgamento nova ação que propõe acabar com a prisão em segunda instância. Essa ação é objetivamente feita para soltar Lula da cadeia, sendo o PCdoB mero laranja do PT. O jurista que a encabeça, Celso Bandeira de Mello, está empenhado há muito em uma campanha contra a Operação Lava-Jato, defendendo que Lula está sendo perseguido pela Justiça brasileira. A predominância do colegiado sobre posições pessoais, defendida pela ministra Rosa Weber, está ganhando espaço no Supremo, tanto que o ministro Dias Toffoli ontem negou liminar para que José Dirceu ficasse em liberdade o fim do processo na segunda instância, alegando justamente a jurisprudência em vigor, mesmo contra sua opinião.
Eliane Cantanhêde: Dispersão leva à derrota
Depois de Lula, o centro também tenta reaglutinar suas forças políticas
Depois da pulverização desenfreada das candidaturas à Presidência, é hora de começar o movimento inverso, de reaglutinação das forças políticas. O ex-presidente Lula saiu na frente para trazer de volta a tropa unida, mas os articuladores dos demais, particularmente de Geraldo Alckmin e de Joaquim Barbosa, também se mexem. A união faz a força, a dispersão leva à derrota.
No seu comício de despedida antes de voar para Curitiba, naquele que teria sido o ato ecumênico para Marisa Letícia e não foi, Lula encheu Guilherme Boulos (PSOL) de elogios, acariciou o ego de Manuela d’Ávila (PCdoB) e convocou a militância para um projeto comum.
A questão é que Lula se esforça para reunir as esquerdas com a mesma intensidade com que as esquerdas se esforçam para se isolar de todo o resto. A invasão do triplex no Guarujá, comandada por Boulos, apavora a classe média. As investidas internacionais do PT, pela voz de sua presidente, Gleisi Hoffmann, margeiam o patológico e sacodem as redes sociais.
Difícil compreender o objetivo da invasão do apartamento, que só atende as alas mais radicais e imprudentes. Mais difícil ainda é entender o que a senadora petista pretende ao manifestar apoio ao regime calamitoso de Nicolás Maduro e fazer uma conclamação ao mundo árabe pró-Lula e contra o Brasil. O que Lula acha disso?
Nos campos adversários, vislumbram-se movimentos para conter o estouro da boiada que soam como gritos de desespero. Os tucanos, que têm as melhores condições objetivas, até aqui não apenas afastam velhos aliados como continuam digladiando entre eles.
Um movimento esperado, até natural, seria a reunião do MDB e do DEM em torno do PSDB, com Henrique Meirelles e Rodrigo Maia desistindo de suas pretensões presidenciais e, eventualmente, até disputando a vaga de vice de Geraldo Alckmin, com o patrocínio de Michel Temer. Mas com Alckmin asfixiado regionalmente, sem atingir 10% nas pesquisas?
O PSDB envia emissários para atrair o senador Álvaro Dias, que foi tucano, é candidato a presidente pelo Podemos e abre um flanco preocupante para os tucanos no Sul, contraponto ao Nordeste petista. Assediado, Dias dá de ombros. Além disso, há uma questão estrutural no PSDB: a divisão entre Alckmin, José Serra e Aécio Neves, agravada pela Lava Jato e pela guinada radical de Aécio, que deixou de ser um troféu para ser um peso na campanha.
Com esses obstáculos ao PT e ao PSDB, o foco se desvia para Jair Bolsonaro, incapaz até aqui de ampliar seu leque de alianças, Marina Silva, que está na cola de Bolsonaro, mas pilota um teco-teco partidário, o franco-atirador Ciro Gomes, que assusta potenciais parceiros, e Aldo Rebelo, que saiu do PCdoB e concorre pelo Solidariedade.
Todos vão manter as candidaturas até o fim? Improvável. E eles agora têm um alvo: Joaquim Barbosa, que veio da pobreza, como Lula e Marina, é apolítico, como o deputado Bolsonaro diz que é, e não deve à Lava Jato, muito pelo contrário. Joaquim, porém, precisa começar a aglutinação em casa, já que o PSB está dividido entre paulistas pró-Alckmin e pernambucanos pró-Lula. E, como Bolsonaro, precisa dizer o que pensa para a economia, num país em que o populismo fiscal gerou 14 milhões de desempregados.
Se passar por esse três testes – unidade no PSB, programa consistente e fugir do populismo barato, que sai caro –, Joaquim pode ser o barco salva-vidas de partidos e políticos à deriva e de milhões de eleitores sem candidato. Aliás, numa eleição tão pulverizada, a opção que não for radical e demonstrar capacidade de vitória tende a virar uma atração irresistível ainda mais quando ficar claro quem está dentro e quem está fora. É aí, nesse ponto, que a onda se forma e vira tsunami do segundo turno.
Merval Pereira: Ação para soltar Lula
O Supremo Tribunal Federal (STF), que ontem teve uma sessão sem grandes divergências e num clima ameno começou a decidir se cabem embargos infringentes nos julgamentos das Turmas, vai voltar ao olho do furacão na próxima semana quando uma nova Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) com liminar, impetrada pelo PCdoB, deve ser apresentada para o plenário.
Ao contrário das anteriores, que acabaram prejudicadas porque os responsáveis — Partido Nacional Ecológico (PEN) e OAB — desinteressaram-se do caso justamente para evitar que suas ações, impetradas há muito tempo, fossem confundidas com uma manobra para tirar Lula da cadeia, esta tem claramente esse objetivo, embora não explícito.
A ADC tem à frente o advogado Antônio Celso Bandeira de Mello, jurista respeitado, ultimamente ligado a movimentos de juristas que condenam os métodos do juiz Sérgio Moro e dos procuradores da Operação LavaJato e consideram que Lula está sendo perseguido.
Essa ADC entrou no Supremo na noite de terça-feira, e o ministro Marco Aurélio Mello foi escolhido relator por ser o juiz prevento, o primeiro a cuidar do caso. Eles alegam que com a mudança de voto do ministro Gilmar Mendes, já anunciada, formou-se uma nova maioria no plenário do Supremo, e por isso é preciso retomar o julgamento da decisão que permite a prisão após a condenação em segunda instância.
Se o ministro Marco Aurélio se dispuser a levar a ação à Mesa, com pretendia antes de o PEN desistir, ela ganha prioridade na pauta, e terá que ser colocada em julgamento. A questão, no entanto, não se limita a uma possível mudança de maioria a favor do trânsito em julgado para permitir a prisão de um condenado, mas à razão para o Supremo retomar o julgamento de uma questão que foi aprovada há pouco mais de um ano e meio. Fica explicito que se trata de uma ação de partidários para tentar livrar Lula da cadeia.
A tese da ministra Rosa Weber de que uma simples mudança de voto de um ministro, ou a mudança da composição do plenário, não justifica a alteração tão cedo de uma jurisprudência, deveria ser um paradigma no plenário.
Ela, que na votação de 2016 ficou vencida na tese de que só após o trânsito em julgado deveria ser permitida a prisão do condenado, tem votado com a maioria, respeitando a jurisprudência em vigor.
Rosa Weber defende o respeito à colegialidade, uma tese recorrente em seus votos, e deu, na sessão em que o habeas corpus de Lula foi negado, uma aula de como se curva à maioria dentro do critério de que o estado de direito necessita de “estabilidade” da jurisprudência e não pode estar sujeito a “variações frívolas”. Para ela, a segurança jurídica é valor característico da democracia, do estado de direito e do próprio conceito de Justiça.
Na sessão de ontem houve uma espécie de catarse no plenário do STF, com ministros e o subprocurador-geral da República ressaltando que é normal a divergência entre membros de um colegiado como o do Supremo e, mais que isso, ficou claro que no caso do habeas corpus dado pelo ministro Dias Toffoli a Maluf, não houve qualquer intenção de confrontar a decisão inicial do ministro Edson Fachin, que negara o habeas corpus:
“(...) Eu não subverti a decisão de trânsito em julgado. Eu não decidi contra a aplicação imediata da prisão. Na decisão liminar, ad referendum do plenário, que tomei num dia de feriado judiciário após a internação do paciente, deferi em caráter humanitário, não sem antes entrar em contato com o relator da AP 863 (ministro Edson Fachin) e não sem antes entrar em contato com a ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, reportar o quadro em que se encontrava e a situação de um juiz diante deste quadro. (...) Jamais decidi contra decisão do ministro relator. Não é uma questão, portanto, de cassar decisão de colega.”
Toffoli fez questão de ressaltar que quando recebeu o HC, em fevereiro, não deu a liminar, mas que em março permitiu a prisão humanitária pois a situação de Maluf era diversa, com o agravamento do estado de saúde.
O julgamento continua hoje, mas já há maioria aceitando a utilização dos embargos infringentes nos julgamentos das Turmas, restando definir quantos votos são necessários para que eles possam ser usados. A discussão está em se basta um voto a favor do réu ou se são necessários pelo menos dois, já que no plenário são necessários quatro votos num colegiado de 11 ministros.
Com embargos infringentes, haveria um novo julgamento no plenário do STF. A concessão do habeas corpus a Maluf também será decidida hoje, e se for aprovada, o ministro Toffoli defendeu que Maluf seja colocado em liberdade, pois com a decisão de acatar os embargos infringentes, seu julgamento não se encerrou.
William Waack: A pobreza do debate
A Lava Jato traçou a linha entre o que é política e o que é bandidagem
Assim como a prisão do ex-presidente Lula, Aécio Neves agora réu no Supremo Tribunal Federal é um acontecimento político de importância muito maior do que o destino reservado ao agente político, ao indivíduo. O episódio do senador tucano que passou de quase presidente para candidato a presidiário oferece uma boa leitura do momento político brasileiro.
Não estou falando aqui de quem está dentro da Lava Jato nem das consequências para as diversas agremiações políticas e como se movimentam visando às próximas eleições. O caso Aécio virou uma bem acabada expressão do que é a falência política brasileira.
Pois quatro dos cinco ministros que aceitaram a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) tornaram o senador réu por obstrução da Justiça (além de corrupção passiva), isto é, por tentar atrapalhar a Operação Lava Jato. Aécio teria praticado esse crime, segundo a acusação, utilizando-se da sua atividade como parlamentar para discutir, entre outras coisas, projetos de lei como o que previa punição a agentes públicos por abuso de autoridade.
Não vou entrar no mérito da acusação nem nas alegações da defesa do senador. O que me interessa aqui é registrar um fato que me parece de vital importância para a política brasileira. Onde está a linha que divide a atividade do parlamentar (que inclui, claro, discutir projetos como abuso de autoridade) e a pura e simples bandidagem? Mais ainda: quem traça essa linha e decide se uma articulação política no parlamento passou a ser uma articulação para proteger políticos do alcance da Justiça?
No atual momento político brasileiro, não importa se a gente gosta ou não do que está acontecendo, as respostas a essas duas perguntas são evidentes. Procuradores, delegados, juízes e, agora, também ministros do Supremo leram História (ou saíram atrás de quem leu o que aconteceu na Itália) e estão convencidos de que políticos, deixados entregues a si próprios, vão se articular para defender apenas seus próprios interesses, sobretudo os interesses espúrios. E decidiram eles mesmos, os integrantes da Lava Jato, traçar a linha entre o que é política e o que é bandidagem. Traçado que interpretam como julgam necessário.
Reitero aqui a inutilidade, neste momento, de se estabelecer quem domina a objetividade dos fatos, se é a acusação que está com a “verdade” ou se é a defesa no caso do senador. Fato, em política, costuma em geral ser a percepção que se faz de um “fato”, e a percepção que tomou conta do momento brasileiro, e desfruta de extraordinária popularidade, é a que está contida na denúncia da Procuradoria-Geral da República: políticos não prestam, política é coisa suja e, mesmo quando parlamentares parecem estar discutindo projetos “sérios” (como o do abuso de autoridade), estão, no fundo, apenas se protegendo.
O fato dessa narrativa acima ter se tornado tão abrangente (talvez Gramsci a tratasse como “bloco histórico”) explica em parte a pobreza do atual debate político no Brasil, subordinado ao tema do combate à corrupção. Claro que combater a corrupção é essencial em qualquer parte e a qualquer momento. A falência da política brasileira está em não ter sido capaz, também por falta de lideranças, de desenvolver qualquer outro eixo relevante de debate.
Vamos aplaudir a prisão de Lula e outros, eventualmente de Aécio e outros, o que nos orgulha e enche de esperanças. E vamos continuar nos perguntando por que as coisas mudam tão pouco.
Luiz Carlos Azedo: Lula indica
A pesquisa DataFolha estimula a “candidatura” de Lula, mas fragiliza a legenda na hora de substituí-lo, pois seus votos não migram facilmente para os petistas
A juíza Carolina Moura Lebbos, da 12ª Vara da Justiça Federal de Curitiba (PR), autorizou a visita, hoje, dos senadores da Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado à Superintendência da Polícia Federal para verificar as condições da prisão de Luiz Inácio Lula da Silva e outros presos. O ex-presidente está preso na sede da PF desde o dia 7 de abril, quando se entregou em meio a manifestações de solidariedade de petistas e aliados de esquerda, no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo (SP).
Os senadores Regina Sousa (PT-PI), Paulo Paim (PT-RS), Vanessa Grazziotin (PC do B-AM), Lindbergh Farias (PT-RJ, Gleisi Hoffmann (PT-PR), Roberto Requião (MDB-PR), Paulo Rocha (PT-AM), João Capiberibe (PSB-AP), Fátima Bezerra (PT-RN), Lídice da Mata (PSB-BA), Humberto Costa (PT-PE), José Pimentel (PT-CE), Telmário Mota (PTB-RR) e Ângela Portela (PDT-RR) estão em campanha eleitoral, a maioria pela reeleição ao Senado, e dão ao ex-presidente da República o status de preso político, embora Lula tenha sido condenado por crime comum: corrupção.
A última pesquisa DataFolha, na qual Lula aparece em primeiro lugar nas pesquisas em todos os cenários em que seu nome foi apresentado, só aparentemente corrobora a estratégia petista de politizar o processo judicial, com objetivo de tirar o maior proveito eleitoral possível. Repete-se uma velha tática da esquerda brasileira, adotada pelo falecido líder comunista Luís Carlos Prestes depois que teve seu mandato cassado e a legenda do PCB posta na ilegalidade: “Prestes indica”. Seguia-se a nominata de candidatos, que disputavam o pleito por outras legendas.
O expediente funcionou precariamente até 1964, mas foi particularmente desastroso naquele ano, porque a linha adotada pelos comunistas após o Manifesto de Agosto de 1950, de radical oposição ao governo Dutra e resistência à repressão às suas atividades, resultou na derrota de todos os candidatos indicados, com exceção do sindicalista Roberto Morena, que era um dissidente da política de confronto e radicalização, mas sobreviveu aos expurgos stalinistas em razão de sua trajetória romanesca.
Em 1924, ele ingressou no PCB. Preso em 1932 na Ilha Grande (RJ), em função de sua participação na organização da greve da São Paulo Railway, foi posto em liberdade em 1934, ano em que se exilou no Uruguai — lá foi detido duas vezes. De volta ao Brasil, assumiu em fins de 1935 um posto na direção do PCB. Foi preso novamente em 1936, sendo detido no Rio de Janeiro até a “Macedada” (anistia que serviu de armadilha para o Plano Cohen e o golpe do Estado Novo), em junho de 1937. Seguiu para a Espanha, para integrar as forças republicanas na Guerra Civil Espanhola. Com a vitória dos franquistas, refugiou-se na Argélia. Nesse mesmo ano, transferiu-se para a União Soviética, onde trabalhou em uma fábrica de tratores.
De volta ao Brasil, Morena assumiu, em 1943, o trabalho de reorganização do PCB, sendo novamente preso. Em 1945, tornou-se secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores do Brasil (CTB), fundada na ocasião. Com a repressão de Dutra (1946-1951) e o fechamento da CTB, exilou-se em 1947 no México. Retornando ao Brasil em 1950, elegeu-se deputado federal na legenda do Partido Republicano Trabalhista (PRT).
Erro estratégico
A situação do PT é diferente da descrita acima, a legenda não está proscrita nem existe guerra fria; em contrapartida, o PCB não estava envolvido em denúncias de corrupção, ao contrário do PT, que ocupa o vértice do “mecanismo” investigado pela Operação Lava-Jato, a ponto de Lula acabar indiciado em vários processos, entre os quais, o que o levou à condenação e à prisão. A semelhança principal, porém, está no discurso político radical e na tática de enfrentamento com a Justiça, que para o PCB foi um desastre maior que a guerra fria. Por incrível que pareça, há uma linha de continuidade de ideias cujo elo é a glamourização, pelos comunistas, do levante militar de 1935, comandado por Prestes, e da luta armada na resistência ao regime militar, liderada por Carlos Marighela, após o golpe de 1964, pelos petistas.
Mas onde está o erro estratégico? Na tática eleitoral. A “vitimização” de Lula e a tentativa de desmoralizar todos os magistrados que o condenaram até agora — o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba; os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4); e os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF) — não têm a menor chance de dar certo. Lula está fora da disputa eleitoral por causa da lei da Ficha Limpa, é irreversível.
Manifestações como a de ontem, em Guarujá, quando militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) e da Frente Povo Sem Medo (FPSM) ocuparam o triplex atribuído a Lula no processo que o condenou, somente servem para agravar sua situação do ponto de vista jurídico. De igual maneira, o acampamento nas imediações da Superintendência Polícia Federal em Curitiba, que motivou um pedido da Prefeitura da cidade para que Lula seja transferido de local de prisão, somente serve para afrontar a Justiça.
Mas o maior erro estratégico é a tática de caracterização da prisão de Lula como um ato político da Justiça contra sua candidatura, que está sendo mantida. A pesquisa deste fim de semana estimula a permanência da “candidatura” de Lula, mas fragiliza a legenda na hora de substituí-lo, pois, seus votos não migram facilmente para os petistas Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo, e Jaques Wagner, ex-governador da Bahia. O mesmo pode se dizer quanto aos parlamentares que acreditam que sua reeleição estará garantida à sombra da prisão de Lula, principalmente os enrolados na Lava-Jato.
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-lula-indica/
Ricardo Noblat: Em breve, “pesquisa sem Lula é fraude”
Para não ser esquecido
Em nome do PT, sua presidente, a senadora Gleisi Lula Hoffmann (PR), protestou contra o fato de o nome de Lula só ter sido testado pela mais recente pesquisa Datafolha em 3 dos 9 cenários pesquisados.
Ora, ora, ora. Não deveria ter sido testado em nenhum. Simplesmente porque Lula foi condenado e está preso. Mesmo se for solto, candidato não será porque virou “ficha suja”. É o que está na lei.
Só falta, em breve, começarmos a ouvir que “pesquisa sem Lula é fraude”. O grito de “eleição sem Lula é fraude” parece ter sido arquivado. Primeiro porque perdeu sua força. Segundo porque o PT disputará a eleição.
Se eleição sem Lula fosse fraude, o PT, no mínimo para ser coerente, não poderia participar dela, por ilegítima. Alguns malucos do partido chegaram a propor isso. Levaram um chega pra lá.
A direção do PT estava convencida de que o espetáculo encenado em São Bernardo do Campo por ocasião da prisão de Lula teria sido mais do que suficiente para convulsionar o país.
E, assim, as futuras pesquisas de intenção de voto registrariam o crescimento de Lula. Não deu certo. Lula caiu seis pontos percentuais no Datafolha. Aumentou o índice dos que acharam justa sua prisão.
O empenho, doravante, é para que Lula permaneça sob os holofotes e possa chegar a agosto com a mesma capacidade atual de transferir votos, beneficiando quem por ele for indicado.
O Datafolha conferiu que um terço dos eleitores de Lula já se bandeou para outros candidatos. Se nada de positivo para Lula ocorrer até agosto, ele deverá perder mais uma fatia dos eleitores que ainda retém.
Eleitor é um sujeito pragmático. Costuma ser. E até lá, Lula possivelmente será condenado em mais um processo. Crescerá a percepção de que ele cometeu de fato crimes. E de que traçou o próprio destino.
Vida que segue.
https://veja.abril.com.br/blog/noblat/em-breve-pesquisa-sem-lula-e-fraude/