lula
Luiz Carlos Azedo: A chave da cadeia
“A Segunda Turma do Supremo é pródiga na concessão de habeas corpus para os réus da Operação Lava-Jato. Dirceu deverá permanecer em liberdade até ser julgado pelo Superior Tribunal de Justiça”
A pesquisa eleitoral divulgada ontem provocou nova alta do dólar – ultrapassou a barreira dos R$ 4 e chegou a R$ 4,48 nas casas de câmbio –, porém, a imprevisibilidade do cenário eleitoral aumentou ainda mais com a decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que decidiu manter em liberdade o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o ex-tesoureiro do PP José Cláudio Genu, ambos condenados em segunda instância na Operação Lava-Jato. A decisão consolidou o entendimento da Turma de que a execução imediata da pena após condenação em segunda instância precisa ser examinada caso a caso. Com isso, a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem uma porta aberta para conseguir um habeas corpus em favor do petista, cuja candidatura a presidente da República ainda não foi impugnada. Embora, pela Lei da Ficha Limpa, o petista seja inelegível.
Conhecida como Jardim do Éden, a Segunda Turma é pródiga na concessão de arquivamentos e habeas corpus para os réus da Operação Lava-Jato. Dirceu está condenado a mais de 30 anos de prisão, mas deverá permanecer em liberdade até ser julgado pelo Superior Tribunal de Justiça. O ex-ministro começou a cumprir pena em maio, por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa, mas foi solto um mês depois por ordem do STF. Toffoli votou pela soltura, mas o relator da Lava-Jato, o ministro Luiz Edson Fachin, pediu vista, ou seja, mais tempo para analisar a questão. Mesmo com o pedido de vista, os outros três ministros da Turma (Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski) decidiram conceder liberdade a Dirceu até que Fachin devolvesse o processo para julgamento.
Ontem, o caso voltou à pauta da Segunda Turma. Fachin votou pelo entendimento majoritário do Supremo no sentido de autorizar as prisões após condenação em segunda instância e sustentou que não se pode conceder habeas corpus de ofício nesse caso. Foi atropelado pelo ministro Dias Toffoli, que citou vários precedentes no Supremo. Os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski acompanharam Toffoli. Decano do STF, o ministro Celso de Mello votou com Fachin, mas ambos foram votos vencidos por 3 a 2. Fachin vem sendo voto vencido constantemente. Além de Lula, outros réus da Lava-Jato que estão presos deverão pleitear habeas corpus para sair da prisão, entre os quais os ex-deputados Eduardo Cunha e Geddel Vieira Lima, ambos do MDB.
O Supremo está se tornando um fator de instabilidade no processo eleitoral, por causa das disputas entre seus ministros. A Primeira Turma e a Segunda, por exemplo, têm entendimentos distintos em relação à jurisprudência sobre execução da pena após condenação em segunda instância. Caso se confirme a ida da ministra Cármen Lúcia para a Segunda Turma, no lugar de Toffoli, que assumirá a Presidência do Supremo, pode ser que se forme uma nova maioria sobre o mesmo assunto, com entendimento contrário à decisão de ontem. Em contrapartida, embora negue essa intenção, Toffoli pode pautar nova votação sobre o mérito da questão no plenário do Supremo.
Pesquisa
A pesquisa divulgada pelo Ibope na segunda-feira está sendo decantada por analistas e candidatos. Revela que a estratégia de Lula para se manter na mídia deu certo, pois está com 37% de intenções de votos, mas gerou estresse entre os petistas porque outros números mostram as dificuldades para a transferência de votos em favor do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, seu vice e substituto virtual. Quatro de cada 10 eleitores consultados dizem que não votarão em Haddad, mesmo que esse seja uma indicação de Lula. O efeito imediato na campanha de Lula foi acirrar a divergência entre fazer a substituição logo ou protelar ao máximo a manutenção da candidatura do ex-presidente da República, cuja impugnação está prevista na Lei da Ficha Limpa, mas essa é uma batalha jurídica que pode chegar a 17 de setembro.
Também houve tensão na campanha de Alckmin, que subiu nas pesquisas de 5% para 7% no cenário sem Lula. Está atrás de Bolsonaro, que sobe para 20%; Marina, para 12%; Ciro, que vai a 9%. Para Alckmin, o grande desafio é chegar ao segundo turno. O tucano conta com a vantagem estratégica de ter mais tempo de televisão, recursos financeiros e capilaridade da campanha. Esse raciocínio valeria também para Haddad, daí a expectativa de que possa ultrapassar Bolsonaro, Marina e Ciro. Entretanto, a pesquisa está mostrando que essa não será uma tarefa fácil, principalmente porque Bolsonaro, Marina e Ciro estão com bases eleitorais muito resilientes. Com um cenário tão imprevisível, as turbulências no mercado financeiro já começaram, com alta do dólar e queda da bolsa de valores.
Luiz Carlos Azedo: Pacaraima
“O governo brasileiro pisa em ovos em relação ao regime de Maduro. Tudo o que não interessa ao Brasil é uma escalada no conflito”
Com pouco mais de 12 mil habitantes, Pacaraima surgiu após a demarcação da fronteira com a Venezuela pelo Exército, em torno do marco conhecido como BV-8, portal de entrada para o Brasil a partir daquele país, ocupado por garimpeiros brasileiros. A “corrida do ouro” prometia enriquecimento fácil e rápido para os aventureiros que desbravaram a região, a maioria do Nordeste. Fica apenas a 15 quilômetros da cidade venezuelana de Santa Elena de Uairén. Por ser uma fronteira seca, é o caminho mais fácil para os refugiados venezuelanos que chegam a pé e vão para Boa Vista e outras cidades brasileiras.
A 220 quilômetros de Boa Vista, a cidade foi emancipada em 1995, na onda de criação de municípios que ocorreu naquele período. Devido às temperaturas baixas, é conhecida como o Polo Norte de Roraima. Pacaraima e Uairén funcionam como centros de abastecimento uma da outra: a energia elétrica e o combustível vêm da Venezuela, onde a gasolina é barata; os gêneros de primeira necessidade e bens de consumo duráveis, de Boa Vista, pela BR-174. Os incidentes ocorridos no fim de semana, nos quais refugiados venezuelanos foram atacados por moradores de Pacaraima, foram provocados porque alguns venezuelanos atacaram um comerciante brasileiro, com intuito de roubá-lo. Mas esse foi apenas um catalisador da tensão crescente entre os refugiados e os moradores da cidade.
Entre 2017 e junho deste ano, quase 128 mil venezuelanos entraram no Brasil por Pacaraima. Mais da metade deles, porém, deixou o país: 31,5 mil voltaram para a Venezuela pelo mesmo caminho, e os outros 37,4 mil saíram de avião ou por outras fronteiras terrestres. Ficam em Pacaraima e Boa Vista os venezuelanos mais pobres, com menos instrução, que não conseguem meios para buscar outras regiões. Os venezuelanos mais instruídos e com posses preferem o Equador, a Colômbia, o Peru e o Chile, por causa da facilidade da língua, e outras cidades do país, como São Paulo.
Acampados como sem-teto em Pacaraima, os venezuelanos eram 1.500 até a crise de sábado. Ou seja, mais de 10% da população da cidade, que também começa a sofrer os efeitos da crise econômica venezuelana no comércio local. Não se sabe até que ponto a disputa política entre a governadora Suely Campos (PP) e seus principais adversários, Anchieta (PSDB), que lidera a disputa, e Antônio Denarium (PSL), que está em segundo, agrega complicações à crise. Suely Campos já tentou fechar a fronteira com a Venezuela e volta a insistir na medida, recorrendo ao Supremo Tribunal Federal (STF), o que o governo federal rejeita. Para o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Sérgio Etchegoyen, é “impensável” fechar a fronteira entre o Brasil e a Venezuela. O caso está nas mãos da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal.
O cenário é mais complicado por causa da crise econômica e política na Venezuela. Ontem, entrou em vigor a nova moeda no país, o Bolívar Soberano. Nicolas Maduro cortou cinco zeros nas cédulas e multiplicou por 34 vezes o valor do salário mínimo, ancorado no “petro”, a criptomoeda criada pelo regime bolivariano para obter liquidez. Promete acabar com a inflação, mas pode ser o colapso total. O Fundo Monetário Internacional (FMI) projetou inflação de 1.000.000% no país em 2018, o que não vai se alterar com a “mágica” feita para reduzir a quantidade de papel-moeda em circulação. Com isso, aumenta o número de pedidos de refúgio por parte de venezuelanos.
O governo brasileiro pisa em ovos em relação ao regime de Maduro. Tudo o que não interessa ao Brasil é uma escalada no conflito. Até agora, as autoridades dos dois países estão cooperando. Um dos pretextos dos moradores revoltados de Pacaraima para as agressões aos venezuelanos foi o fato de o Exército brasileiro manter uma ambulância à disposição dos refugiados, que não teria sido acionada para socorrer o comerciante ferido. O ataque aos venezuelanos pelos moradores de Pacaraima envergonha o Brasil, porque foi um gesto de barbárie. Está sendo muito condenado nas redes sociais, mas o que espanta é o silêncio dos nossos “internacionalistas” em relação ao regime de Maduro.
Os votos de Lula
A pesquisa do Ibope divulgada ontem pela TV Globo revela que a estratégia de Lula para se manter na mídia deu certo: com 37% de intenções de votos, o petista foi o único candidato pesquisado que cresceu. Os demais estão estacionados: Jair Bolsonaro (PSL): 18%; Marina Silva (Rede): 6%; Ciro Gomes (PDT): 5%; Geraldo Alckmin (PSDB): 5%; Alvaro Dias (Podemos): 3%; Eymael (DC), Guilherme Boulos (PSOL), Henrique Meirelles (MDB) e João Amoêdo (Novo): 1%; Cabo Daciolo (Avante), Vera (PSTU) e João Goulart Filho (PPL) não pontuaram. Branco/nulos: 16%; Não sabe/não respondeu: 6%.
Com Lula fora da disputa, seus votos migram principalmente para Marina, que sobe para 12%; Ciro, que vai a 9%; Bolsonaro, que sobre para 20% e até Alckmin, que chega a 7%. Haddad, substituto virtual de Lula, tem 4% de intenções de votos. Branco/nulos sobem para 29% e Não sabe/não respondeu, 9%. Esse é o gargalo da estratégia do PT.
Marco Aurélio Nogueira: Como se não houvesse amanhã
Candidatos à Presidência precisam ensaiar mais, ser mais sérios e cuidadosos em todos os fundamentos
Um novo debate eleitoral sempre cria expectativas e esperanças. Fica-se na torcida para que haja um avanço, para que cada candidato mostre finalmente a que veio.
Não foi bem o que ocorreu ontem na RedeTv.
O tom foi um só, basicamente: eles falam como se não houvesse amanhã. Limitam-se a brandir promessas, frases genéricas, pegadinhas e compromissos, como se tudo dependesse deles e nada mais precisasse ser feito a não conseguir que um novo personagem ocupe a cadeira presidencial. São ilusionistas. Atores de uma pantomima típica da vida de exposição que levamos, feita de insights, caras e bocas, frases curtas, minutos controlados, pressa.
Dá para apontar o dedo, seletivamente, para os momentos em que alguém foi além disso, embasando de modo mais “técnico”, político-administrativo, seus planos de governo.
Somente três candidatos se destacaram. Ciro e Alckmin mostraram firmeza, serenidade e conhecimento prático. Marina cresceu ao enquadrar Bolsonaro e ser mais propositiva. Os demais perderam uma boa oportunidade para esclarecer o que estão a fazer ali, que papel estão se propondo a representar.
Bolsonaro tropeçou nas próprias palavras e teve de ver Daciolo pressioná-lo pelos flancos. Álvaro e Meireles, muito pouco à vontade, limitaram-se a repetir slogans e chavões. Boulos, uma caricatura forçada do Lula de bem antes, mostrou ter língua afiada, mas continuou a se perder nas propostas maximalistas e de “ataque frontal”.
São políticos antipolíticos, que recusam a política realmente existente como se lhes fosse possível eliminá-la por decreto. Políticos que não falam de alianças e negociações, a não ser para demonizá-las ou justificá-las envergonhadamente. Que não se dedicam a falar do “como”, das concessões inevitáveis, dos “sacrifícios” que precisarão pedir ao povo. Derramam-se em elogios ao “novo” sem se darem ao trabalho de qualificá-lo.
Sempre haverá quem faça um desconto e diga que, num palco de TV, rola um show e nele o comportamento é fictício: estão a jogar para a plateia, obedecendo a roteiros traçados por assessores e especialistas em marketing eleitoral, onde o que menos importa é o conteúdo, já que o fundamental é produzir efeito e fumaça com uma performance calculadamente eficiente.
É verdade. Mas deve-se considerar também que existem dramas e dramas, roteiros melhores e piores, bons e maus desempenhos cênicos. Candidatos à Presidência precisariam, no mínimo, ensaiar mais e ser mais cuidadosos em todos os fundamentos. Não podem ser artistas, nem mesmo quando estão no palco.
Afinal, estão se dispondo a fazer girar a roda da História, a interferir na nossa vida, a direcionar um País que assiste ao show com várias pulgas atrás da orelha.
Luiz Carlos Azedo: Je suis la Loi
A tática eleitoral do PT ganhou uma nova dimensão: agora é uma estratégia para desmoralizar a Justiça brasileira internacionalmente e virar a mesa, impondo a candidatura de Lula
Luís XIV reinou durante 72 anos (1643-1715), ou seja, por três gerações, o que lhe permitiu consolidar o absolutismo francês como modelo de Estado-Nação fundado na teoria do “direito divino” (ele parecia imortal). A frase “Je suis la Loi, Je suis l’Etat; l’Etat c’est moi (Eu sou a Lei, eu sou o Estado; o Estado sou eu!)”, graças à sua aliança com a emergente burguesia francesa e à redução do poder da nobreza, virou marca registrada do seu longo reinado e inspiração para os demais autocratas europeus, com exceção da Inglaterra, cuja monarquia parlamentarista existe desde a Declaração de Direitos de 1689 (Bill Of Rights).
Xará do rei Sol, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se comporta como se estivesse acima das leis e o Estado brasileiro, à mercê de seus desejos, embora esteja preso em Curitiba, condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) a 12 anos e um mês de prisão, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso do tríplex do Guarujá (SP). A Lei da Ficha Limpa prevê que uma pessoa se torna inelegível após ser condenada por órgão colegiado da Justiça. Assim mesmo, Lula registrou sua candidatura e promove uma grande chicana jurídica, que agora ganhou foro internacional.
Graças às articulações do ex-chanceler Celso Amorim, o Comitê de Direitos Humanos da ONU pediu, na sexta-feira, que o Brasil garanta direitos políticos ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na prisão e não o impeça de concorrer na eleição de outubro, até que sejam completados todos os recursos de sua condenação. O comitê decidiu a galope, por solicitação da defesa de Lula, apresentada no fim do mês passado. Em resposta, o Ministério das Relações Exteriores divulgou uma nota na qual afirma que a manifestação é uma “recomendação” e não tem efeito jurídico. E que a Delegação Permanente do Brasil, em Genebra, tomou conhecimento da decisão “sem qualquer aviso ou pedido de informação prévios”.
O Brasil é signatário do Pacto de Direitos Civis e Políticos. Os princípios de igualdade diante da lei, de respeito ao devido processo legal e de direito à ampla defesa e ao contraditório são também princípios constitucionais brasileiros, respeitados pelo Supremo Tribunal Federal. A defesa de Lula, porém, quer enquadrar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde já tramitam mais de uma dezena de impugnações da candidatura de Lula, e o próprio Supremo, com base numa decisão de especialistas, que nem magistrados são em seus países. O Judiciário brasileiro não deve obediência à comissão, ao contrário do que afirmam o advogado de Lula e o ex-chanceler.
Composto por 18 personalidades independentes ligadas aos movimentos de defesa dos direitos humanos, de diversos países, nenhuma das quais é brasileira, o comitê não ouviu nossas autoridades. A vice-presidente do Comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas), a norte-americana Sarah Cleveland, uma das signatárias de decisão, chegou a dizer à imprensa brasileira que o Brasil tem obrigação de cumprir a decisão. Parece até piada, professora da Universidade de Colúmbia, talvez devesse ter se manifestado antes sobre os direitos humanos dos brasileiros presos e separados dos filhos nos Estados Unidos, por conta da política de imigração de Trump.
Desestabilização
Há muita polêmica sobre as relações entre a ONU e os países que integram a organização, que estão de luto devido à morte de seu ex-secretário geral e Nobel da Paz Kofi Annan, mas nem de longe suas comissões, por mais importantes que sejam, exercem o papel de “governo mundial” nas suas respectivas áreas. Inspirada no antigo Império Romano, a ideia de um Estado soberano mundial, longe de ser a fundação de uma cidadania mundial, seria o fim de qualquer cidadania. Nesse sentido, essa intromissão nas eleições brasileiras não tem nenhuma justificativa. É um disparate, ainda mais em se tratando de uma comissão da qual fazem parte apenas especialistas.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se organiza para julgar com brevidade o registro da candidatura de Lula, cuja impugnação foi apresentada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge. O relator é o ministro do STF Luís Barroso. Coincidentemente, a defesa de Lula apresentou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), também na sexta-feira, um pedido para que a inelegibilidade do petista seja sustada, enquanto seu caso não transitar em julgado no Supremo, o que contraria a Lei da Ficha Limpa.
Com isso, a tática eleitoral do PT ganhou uma nova dimensão: agora é uma estratégia para desmoralizar a Justiça brasileira internacionalmente e virar a mesa, impondo a candidatura de Lula, que busca voltar ao poder num ambiente da radicalização política e ajuste de contas.
Como candidato a presidente da República, Lula declarou patrimônio de R$ 7,9 milhões, sem contar o tríplex do Guarujá e o sítio de Atibaia, propriedades que não reconhece como suas. Segundo a assessoria, a fortuna foi amealhada com 70 palestras, para 41 empresas e instituições, entre 2011 e 2015. Entre os candidatos a presidente da República, o patrimônio do petista perde apenas para João Amoêdo, Henrique Meirelles e João Goulart Filho.
Luiz Carlos Azedo: O “tipo ideal”
‘Havia dois tipos de dominação no governo Lula: a “tradicional”, muito bem representada pelas oligarquias patrimonialistas, e a “carismática”, representada pelo líder petista’
Chave da sociologia de Max Weber, o conceito de “tipo ideal” é uma espécie de ovo de Colombo. Serve para equilibrar a relação entre a subjetividade do analista e a objetividade do fato social. Quando desenvolveu esse conceito, o sociólogo alemão não se enquadrava nas principais correntes de pensamento de sua época, que eram influenciadas por gigantes como Friedrich Hegel, Karl Marx e Immanuel Kant, mas respeitava a todos. As obras mais conhecidas de Weber são A Ética Protestante e O Espírito do Capitalismo, que analisa a relação entre as religiões e o desenvolvimento do capitalismo, e A Política como Vocação, que trata da relação Estado, partido e sociedade, e conceitua os tipos de dominação em “legal”, “tradicional” e “carismática”.
Como outros intelectuais alemães de sua geração, Weber foi um crítico do totalitarismo. Morreu de gripe espanhola, em 1920, logo após a I Guerra Mundial. Ele admitiu, “a priori”, que toda pesquisa tem um ponto de partida subjetivo, estabelecido por seu autor, mas a objetividade de seu trabalho poderia ser assegurada com sistematização e padronização, para que o ponto de chegada fosse realmente objetivo. O “tipo ideal” é uma construção subjetiva do pesquisador, feita a partir de seus interesses. Com base na definição de um determinado conceito, são selecionados certos elementos da realidade que, reunidos, formam um tipo idealmente perfeito.
Conceitos não emanam diretamente da realidade, nem são formados apenas pela abstração genérica. Na visão weberiana, servem para acentuar e tornar compreensíveis determinados elementos da realidade. A narrativa do “golpe” contra a presidente Dilma Rousseff é uma espécie de “tipo ideal”, a partir da qual se constrói toda a lógica de atuação do PT no sentido de deslegitimar o seu impeachment e varrer para debaixo do tapete as responsabilidades dos governos Lula e Dilma em relação à crise econômica que o país atravessa e ao escândalo da Petrobras, considerado o maior do gênero em todo o mundo.
A partir desse conceito, a realidade é interpretada de acordo com os interesses do partido e possibilita a construção de um discurso ideológico, que unifica os militantes petistas e seus aliados. A realidade é explicada de acordo essa narrativa, desprezando e distorcendo fatos que não se coadunam com as teses petistas. Por exemplo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) acaba de divulgar os números do desemprego: 3,16 milhões de brasileiros procuram emprego há mais de 2 anos. Trata-se do maior número da série histórica da pesquisa, iniciada em 2012.
Esse número corresponde a cerca de 24% do total de desempregados no país, que ficou em 13 milhões no segundo trimestre. Na comparação com o primeiro trimestre do ano, houve um aumento de 238 mil no número de brasileiros que estão desempregados há mais de 2 anos. Desde o início da crise econômica, em 2014, ano da reeleição de Dilma Rousseff, esse contingente cresceu 162%. Ao todo, segundo o IBGE, são 27,6 milhões de brasileiros subutilizados, o que representa 24,6% da força de trabalho. O grupo reúne os desempregados, aqueles que estão subocupados (menos de 40 horas semanais trabalhadas), os desalentados (que desistiram de procurar emprego) e os que poderiam estar ocupados, mas não trabalham por motivos diversos.
Dominação
Tudo isso o PT joga na conta do presidente Temer, que assumiu o governo com uma queda no Produto Interno Bruto (PIB) de 8,1%. Da posse de Dilma ao impeachment da petista, entre abril de 2014 e agosto de 2016, foram nove trimestres de quedas praticamente contínuas, na mais longa recessão no Brasil desde 1992. Somente em outubro de 2017, a recessão acabou. Para usar uma categoria weberiana, Dilma foi afastada, porque seu governo estava fundado na “dominação legal”, que pressupõe a aceitação das normas estabelecidas pela sociedade, no caso, a Constituição e a Lei de Responsabilidade Fiscal. A condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do tríplex de Guarujá, que o tornou inelegível, tem o mesmo fundamento.
A Operação Lava-Jato demonstrou que havia dois tipos de dominação no governo Lula: a “tradicional”, muito bem representada pelas oligarquias patrimonialistas, e a “carismática”, representada pelo líder petista. Weber tomou emprestado do cristianismo esse conceito, conferindo-lhe sentido sociológico, e lhe atribuiu um poder de força revolucionária na história, por ser capaz de romper as formas normais de exercício do poder. Entretanto, a confiança dos dominados no carisma do líder é volúvel, mais cedo ou mais tarde, morrerá na praia da dominação tradicional ou legal. Esse é o ponto em que estamos na novela da candidatura de Lula a presidente da República, que caminha para ser impugnada.
Luiz Carlos Azedo: Acidentes e suicídios
A campanha eleitoral começa sem nenhuma notícia trágica, apenas uma carta-manifesto do ex-presidente Lula, que está preso em Curitiba, e o registro de sua candidatura, que será impugnada
Agosto costuma ser um mês agourento na política brasileira, os políticos são os mais supersticiosos quanto a isso. O caso mais emblemático é o suicídio de Getúlio Vargas, em 1954, tema obrigatório dos vestibulares. O romance Agosto (Nova Fronteira), de Rubens Fonseca, narra a crise que provocou seu gesto extremo. O catalisador foi o atentado da Rua Toneleros, contra o jornalista Carlos Lacerda (que foi ferido na perna), no qual o major Rubens Vaz, da Aeronáutica, que o acompanhava, morreu. Lacerda era o maior opositor do governo. A partir do episódio, toda a oposição se uniu contra Vargas, de comunistas a udenistas, responsabilizando-o pelo atentado.
A Aeronáutica resolveu fazer uma investigação paralela à da polícia e conseguiu descobrir e prender o atirador, Alcino, o motorista do carro, Climério, subchefe da segurança do Palácio do Catete. Por meio deles, chegou-se ao mandante do crime, Gregório Fortunato, o Anjo Negro, chefe da guarda pessoal de Getúlio Vargas. Aeronáutica, Marinha e Exército, imprensa e opinião pública passaram a exigir a renúncia de Vargas. Acuado e sem apoio, o presidente da República apelou para o suicídio, e em carta-testamento escreveu que saía da vida para entrar na história. Deixou o legado de suas realizações e um manifesto nacionalista, que ainda hoje norteia boa parte da esquerda brasileira.
Outro episódio emblemático foi a renúncia de Jânio Quadros, gesto teatral e enigmático, cuja melhor narrativa é do jornalista Carlos Castelo Branco, o melhor colunista político que Brasília já conheceu. Jânio assumiu o mandato em janeiro de 1961, depois de eleição consagradora, mas não completou sete meses na Presidência. No dia 25 de agosto do mesmo ano, renunciou ao mandato, com uma surpreendente carta-denúncia contra as “forças ocultas”. Foi um suicídio político, que o levou ao ostracismo e ao exílio, embora tenha sido eleito prefeito de São Paulo em 1986, derrotando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
No seu brevíssimo governo, Jânio bateu de frente com os Estados Unidos, ao defender a autodeterminação dos povos, condenar as intervenções estrangeiras, o envolvimento norte-americano no episódio da Baía dos Porcos e o isolamento de Cuba. Restabeleceu relações com a antiga União Soviética e a China, e condecorou o líder comunista Che Guevara com a Ordem do Cruzeiro do Sul. Essas atitudes abalaram as relações de Jânio com os aliados, principalmente com a UDN. Na véspera da renúncia, que o Congresso aceitou de pronto, Lacerda chamou Jânio de golpista, em cadeia de rádio e tevê. Somente em 1992, Jânio admitiu que a renúncia foi um blefe, que acabou levado a sério por adversários e antigos aliados.
Desastres
Já a morte de Juscelino Kubitschek, o criador de Brasília, se inscreve na categoria dos desastres. Em 22 de agosto de 1976, o ex-presidente viajava de São Paulo para o Rio de Janeiro no banco de trás de seu Opala, quando sofreu o acidente fatal. O motorista Geraldo Ribeiro, que trabalhava com JK havia 30 anos, também morreu. Segundo a perícia, o automóvel seguia pela rodovia Presidente Dutra, na altura do quilômetro 165, próximo à cidade de Resende, quando foi atingido por um ônibus. Desgovernado, o veículo cruzou o canteiro de segurança em alta velocidade e se chocou contra uma carreta na contramão, sendo arrastado por 30 metros. Apesar da censura oficial do regime militar, que proibiu menção ao fato de que JK tivera os direitos políticos cassados pelo governo militar, e também qualquer alusão aos anos de seu mandato presidencial (1956-1961), sua morte comoveu o país. Em Brasília, 20 mil pessoas foram ao enterro de JK, cujo memorial é uma atração turística da capital federal.
Na segunda-feira, completaram-se quatro anos de outro desastre: a morte do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, num desastre aéreo, em plena campanha para a Presidência da República. Uma missa reuniu parentes e amigos no Recife. A queda do avião ocorreu por volta das 10h do dia 13 de agosto, em Santos. O avião havia decolado do Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, com destino ao Aeroporto de Guarujá, também no litoral. Além de Campos, outras seis pessoas estavam na aeronave: Alexandre Severo Silva, fotógrafo; Carlos Augusto Leal Filho (Percol), assessor; Geraldo Magela Barbosa da Cunha, piloto; Marcos Martins, piloto; Pedro Valadares Neto e Marcelo de Oliveira Lyra. Recentemente, a Aeronáutica concluiu que uma falha mecânica ou colisão com ave pode ter causado o acidente.
A campanha eleitoral para presidente da República começa hoje sem nenhuma notícia trágica, apenas uma carta-manifesto do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está preso em Curitiba, e o registro teatral de sua candidatura pela cúpula do PT, mesmo sabendo que o ex-presidente está inelegível pela Lei da Ficha Limpa. A candidatura de Lula a presidente da República é um blefe, pois será impugnada. Se a manobra para transferir votos para a chapa Haddad-Manoela não der certo, será um suicídio político.
Luiz Carlos Azedo: O truco de Lula
Os advogados de Lula vão requerer o registro da sua candidatura com o argumento de que sua condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) não chegou à última instância
O registro da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a presidente da República, previsto para hoje, com direito à marcha do MST, é uma jogada de marketing eleitoral com poder de tornar ainda mais tenso e confuso o quadro político e tumultuar as eleições deste ano. Lula está preso em Curitiba, condenado a 12 anos e um mês de prisão em regime frechado, e pela Lei da Ficha Limpa não pode ser candidato. Ao registrar sua candidatura, força a barra para criar um fato consumado e embaralhar as cartas da eleição, mantendo-se na mídia e tensionando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Joga no colo da ministra Rosa Weber, que ontem assumiu a presidência da Corte, a responsabilidade de rejeitar o registro da candidatura de pronto ou dar início a um processo de julgamento de sua inelegibilidade, que lhe permitiria disputar as eleições sub judice.
Rosa Weber faz parte do grupo de ministros “garantistas” do Supremo Tribunal Federal (STF). Doutrinariamente, não concorda com a execução imediata das penas após condenação em segunda instância, jurisprudência firmada pelo Supremo em três decisões sobre o tema. Entretanto, tem afirmado que não é favorável a uma mudança de entendimento sobre a questão em pleno processo eleitoral, pois geraria mais insegurança jurídica, e tomado decisões com base nessa jurisprudência. Sob esse aspecto, critica as chicanas feitas por advogados em nome do chamado “transitado em julgado”. Segundo a nova presidente do TSE, “o princípio da presunção de inocência, apesar de cardeal no processo penal, não pode ser compreendido como um véu que cobre a realidade e imobiliza a ação humana”.
Os advogados de Lula vão requerer o registro da candidatura com o argumento de que sua condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) não chegou à última instância. Rosa Weber, porém, defende a lei da Ficha Limpa e advoga a tese, no próprio TSE, de que os recursos cabíveis à condenação “não comportam, como regra, efeito suspensivo”. A mesma interpretação rígida em relação à ficha limpa, porém, é adotada pela ministra em relação aos ritos processuais. A presidente do Supremo pode não querer rejeitar de pronto o registro da candidatura e levar a decisão ao plenário da Corte, o que permite pedidos de vista. Nesse caso, a defesa de Lula se aproveitará do julgamento para manter a candidatura e Lula em campanha eleitoral, mesmo em cana. Truco!
Para isso, não pretendem apresentar a certidão de antecedentes criminais de Lula, que seria motivo para rejeição imediata do registro. Alegam que a legislação eleitoral exige que a certidão seja do estado no qual o candidato tem domicílio eleitoral, ou seja, São Paulo. Lula foi condenado em Curitiba e Porto Alegre. É óbvio que isso é uma grosseira chicana dos advogados, para ganhar tempo e forçar a abertura de um processo para julgar a inelegibilidade de Lula, com ele na disputa. Parece até piada, mas não é. Lula e o PT têm uma visão diferente sobre o processo pelo qual foi condenado, o caso do tríplex de Guarujá. O petista se diz inocente, diz que foi condenado sem provas, se intitula um preso político e denuncia seus julgadores, acusando-os de golpistas. Ontem mesmo, em artigo no New York Times, reitera o argumento de que está preso só porque venceria as eleições.
Supremo
As disputas entre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação à Operação Lava-Jato acabam servindo de pano de fundo para as manobras dos advogados de Lula. A Segunda Turma do STF decidiu retirar da alçada do juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, trechos das delações premiadas que executivos da Odebrecht se referiram ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As delações estavam originalmente no STF, porém, em abril do ano passado, o relator da Lava-Jato, ministro Edson Fachin, enviou os depoimentos a Moro. As defesas de Lula e de Mantega recorreram da decisão. Os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Gilmar Mendes discordaram de Fachin, que manteve seu voto. Celso de Mello, que também compõe a Segunda Turma, não participou da sessão.
A maioria da Segunda Turma, conhecida como Jardim do Éden, tem votado sistematicamente contra o relator da Lava-Jato. Agora, parte dos depoimentos será transferida para a Justiça Federal em Brasília. Para a maioria dos ministros, o caso tem correlação com investigação já aberta na capital federal. Nos depoimentos retirados de Moro, o empresário Emílio Odebrecht descreveu o relacionamento mantido com Lula desde sua campanha. Pedro Novis, ex-executivo da empresa, relata o relacionamento do grupo empresarial com os ex-presidentes Lula e Dilma. Também foram retirados os depoimentos que narram como os pagamentos teriam sido feitos ao governo Lula e o funcionamento das planilhas “Italiano” e “Pós-italiano”, em suposta referência a Antônio Palocci e Guido Mantega. Em outro recurso, foram retiradas as delações da Odebrecht sobre o financiamento de campanhas eleitorais em 2014, em Angola, República Dominicana, Panamá, El Salvador e Brasil.
El País: Sem marqueteiro oficial e fora dos debates, PT aposta em campanha de ‘corpo ausente’
Partido terá que lidar com a ausência de Lula nos palanques e a falta de novas imagens para os programas de TV. Gleisi diz que PT tomará medidas jurídicas para ter ex-presidente ou Haddad nos debates
O PT terá pela frente uma de suas disputas eleitorais mais difíceis desde que Lula concorreu pela primeira vez à presidência, em 1989. A campanha deste ano será feita com o ex-sindicalista e principal cabo-eleitoral da legenda de corpo ausente. Preso em Curitiba, ele não deverá ter acesso aos palanques e câmeras de TV. Neste cenário inédito, o partido terá que contornar uma série de problemas, como a exclusão dos debates na TV e a difícil tarefa de colar nos dois vices da chapa, o oficial, Fernando Haddad (PT), e a reserva, Manuela D'Ávila (PC do B), o rótulo de candidatos de Lula.
Nesta última quinta-feira, o desafio se tornou claro. A insistência em manter Lula como o candidato fez com que o partido com o presidenciável líder das pesquisas ficasse de fora do primeiro debate, na TV Bandeirantes. O ex-presidente não foi autorizado a deixar a cadeia pela Justiça. E, para tentar compensar, Haddad e Manuela D'Ávila promoveram uma conversa paralela na internet, que nem de longe atingiu a popularidade do encontro televisivo. No dia seguinte, na porta da carceragem de Curitiba, a presidenta da legenda, Gleisi Hoffmann, afirmava em entrevista coletiva, após "uma longa conversa com Lula", que o partido tomará todas as medidas jurídicas necessárias para que ele participe dos próximos debates. E que, se não conseguir, haverá um esforço para que Haddad vá em seu lugar. O próximo encontro entre presidenciáveis já acontece na próxima sexta-feira, na Rede TV.
Esta será apenas uma das dificuldades que o partido terá nos próximos meses. Nem mesmo a propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV, que começa em 31 de agosto, trará novas imagens do ex-presidente. Desde que foi preso, em abril deste ano, a Justiça negou vários pedidos do PT para que equipes do partido –e até mesmo seu fotógrafo pessoal– pudessem captar vídeos de Lula. Assim, apenas imagens e áudios de arquivo do ex-presidente poderão ser utilizados. “Tem muito material que o Lula gravou antes de ser preso, já pensando nesse cenário de golpe”, disse uma fonte da legenda ao EL PAÍS. A ideia dos programas será colocar eminências petistas para apresentar Haddad, com o reforço de vídeos antigos do ex-presidente elogiando seu pupilo, que é quem deve tomar a cabeça da chapa caso a Justiça Eleitoral declare a inelegibilidade de Lula, condenado em segunda instância e, por isso, passível de ser enquadrado na Lei da Ficha Limpa. O material é vasto: o ex-presidente foi o principal fiador e cabo eleitoral da campanha que levou Haddad à Prefeitura de São Paulo em 2012.
A tônica dos programas, conforme confirmado por petistas próximos à campanha, também será insistir na tese do golpe político-jurídico que levou o ex-presidente à prisão e o impediu de disputar a presidência em igualdade de condições. “O horário político será um instrumento de defesa da candidatura do Lula. E caso ela seja barrada [pelo Tribunal Superior Eleitoral], será uma denúncia disso. Assim vamos transformando acontecimentos jurídicos em elementos de campanha”, afirmou uma fonte do PT.
Pela primeira vez em décadas, o partido também chega à campanha sem um marqueteiro todo-poderoso, geralmente responsável não só pelos programas de rádio e TV, mas também por algumas decisões estratégicas da campanha. O histórico dos antigos marqueteiros do partido não é dos melhores. João Santana, que trabalhou na segunda campanha de Lula e na de Dilma Rousseff, foi condenado pela Lava Jato este ano e firmou acordo de colaboração premiada que prejudica o partido. Antes de Santana, o nome da propaganda petista era Duda Mendonça, um dos responsáveis por levar pela primeira vez na história o PT ao Planalto. Ele se viu envolvido no escândalo do Mensalão —do qual terminou absolvido em 2012—, apenas para voltar aos holofotes com a Lava Jato em 2016, o que o levou a também assinar acordo de delação premiada.
Desta vez, diz o partido, caberá a uma equipe formada principalmente por militantes e quadros internos se encarregar da propaganda da chapa de Lula. “É um trabalho coletivo mais adequado ao cenário das campanhas atuais”, explica o PT, em nota. O partido afirma ainda que a decisão de adotar este novo modelo não foi tomada “por questão de custos”, e sim para “superar o modelo antigo do marqueteiro”. Questionada, a campanha não respondeu sobre os problemas deste "modelo antigo".
Dois ex-marqueteiros do partido se se viram envolvidos em escândalos de corrupção e se tornaram delatores
Pessoas ligadas à campanha petista afirmaram que o modelo da campanha controlada por um grande marqueteiro “estava ligado a uma grande preponderância dos programas de TV”, e que no cenário atual aposta-se em um aumento da importância relativa de outros meios de comunicação. Um exemplo disso foi o debate paralelo feito na última quinta-feira. Segundo o PT, o ao vivo realizado no Facebook teve “mais de um milhão de visualizações”. As menções ao nome de Lula, no entanto, foram inferiores às feitas aos outros candidatos que participaram do evento na Band.
Além disso, fontes petistas afirmam que “as campanhas hoje são mais baratas”, e que “praticamente não existem mais aqueles profissionais com perfil exclusivo de marketing político”. Apesar de ter trazido para dentro da estrutura do partido o papel de propaganda e marketing, petistas afirmam que o publicitário Sidônio Palmeira, responsável pelas campanhas vitoriosas dos petistas Jaques Wagner e Rui Costa na Bahia em 2006, 2010 e 2014, será uma espécie de “consultor informal” do partido. Ele nega, mas confirma que foi sondado: “Eu não sou nada [na campanha] (...) me procuraram pra fazer a campanha, eu estava fazendo a do Rui Costa, e me consultaram em algumas coisas, mas não estou no dia a dia, não estou em condições de falar sobre isso”, afirmou Sidônio à reportagem. O publicitário, no entanto, frisou que será importante que o PT resgate os feitos econômicos “da época do Lula, para contrapor à situação atual”.
A campanha petista será coordenada pelo economista Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras no período de 2005 a 2012. Sua passagem pela estatal foi marcada pelo crescimento da empresa, turbinado principalmente pela descoberta das reservas do Pré-Sal e pelo alto preço do barril de petróleo no mercado internacional. Anos depois de deixar o comando da Petrobras, no entanto, ele se viu arrastado para o furacão da Operação Lava Jato que varreu as gestões petistas. Gabrielli chegou a ter seus bens congelados pela Justiça e foi condenado em 2017 pelo Tribunal de Contas da União a ressarcir a estatal em mais de 100 milhões de reais. Segundo as investigações, ele teria tido um papel ativo na aquisição da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, que segundo o TCU causou prejuízos de mais de 790 milhões de dólares à petroleira.
Transferência de votos pode ser trunfo petista
Em um cenário no qual existem boas chances de Lula ser barrado das urnas, o partido aposta no fenômeno conhecido como transferência de votos para fazer com que os pouco mais de 30% de eleitores que o apoiam até o momento votem em seu vice, Haddad. De acordo com as últimas pesquisas, o ex-prefeito de São Paulo tem entre 6 e 8% das intenções de voto em um cenário sem o ex-presidente. No entanto, segundo levantamento do Instituto Datafolha, 30% dos eleitores afirmaram que votariam “com certeza” em um candidato indicado por Lula, enquanto 51% “não votariam jamais” e 17% votariam “talvez”.
A capacidade de transmissão de votos em uma situação como a de Lula, preso, “é algo difícil de mensurar, e o fenômeno é pouco conhecido neste contexto”, diz o cientista político Leonardo Avritzer, da Universidade Federal de Minas Gerais. De qualquer forma, o professor ressalta que o ex-presidente “conseguiu manter intenção de votos alta durante um grande período de tempo e em uma situação muito adversa, que foi a prisão”, o que é um sinal de que ele manteve seu “capital político”. “Existem variáveis como a empatia que o eleitor terá com o nome indicado pelo ex-presidente. Isso tudo depende do trabalho feito nas propagandas do partido para colar Haddad em Lula”, conclui.
Haddad disse que será “a voz de Lula” na corrida eleitoral, mas é difícil saber o quanto suas palavras ecoarão como sendo as do ex-presidente. Enquanto Lula for mantido como cabeça de chapa, o partido navegará praticamente às cegas com relação à popularidade de seu possível substituto. Isso porque enquanto não for barrado pela Justiça o nome do ex-presidente continuará aparecendo nas pesquisas, o que obrigará o PT a fazer seus próprios levantamentos para saber o desempenho do vice.
Ricardo Noblat: Lula pede para ficar preso
Deixar de ser candidato, jamais!
Onde se lê coisas do tipo: “Lula retira pedido de soltura no STF para impedir discussão sobre elegibilidade”. Ou: “Com medo de ter candidatura impugnada, Lula desiste de pedido de liberdade”.Ou ainda: “Temendo inelegibilidade, Lula retira recurso do STF”. Leia-se simplesmente: Lula prefere ficar a preso a ter sua candidatura barrada pela Justiça. Pois foi isso o que se tratou.
Em junho último, a defesa de Lula entrou com recurso no Supremo Tribunal Federal pedindo que ele fosse solto e autorizado a disputar as eleições de outubro próximo. Agora desistiu do recurso com medo de que o Supremo declarasse desde já que ele não poderá ser candidato. Em resumo: a tirar a fantasia de candidato a presidente, Lula escolheu manter a fantasia de preso político.
O pedido de desistência do recurso será examinado pela ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no tribunal. Ele poderá aceitá-lo, negá-lo ou submetê-lo ao julgamento dos seus colegas em plenário. Está chegando a hora da Justiça decidir o futuro de Lula. E a Lula só interessa atrasar o relógio. Desistiu há muito tempo do papel de mediador de conflitos. Quer mais é agravá-los.
O que o general acha dos brasileiros
Preconceito e ignorância
Imagine ter como presidente da República ou como vice, o substituto, portanto, do titular do cargo, alguém que pense assim sobre os seus governados: os brasileiros herdaram dos índios a indolência (preguiça), dos negros a malandragem e dos povos ibéricos (portugueses, de preferência), a tendência a querer privilégios.
Se o deputado Jair Bolsonaro (PSL) se eleger presidente, fique desde já sabendo que o vice dele, o general da Antonio Hamilton Mourão, pensa assim de nós. Foi o que ele mesmo disse ontem em sua primeira aparição pública como vice em uma reunião na Câmara de Indústria e Comércio (CIC) de Caxias do Sul, na serra gaúcha.
Por que o general não disse, por exemplo, que os brasileiros herdaram dos índios o amor pela natureza? E dos negros o amor pela liberdade? E dos portugueses o amor pela aventura? Porque ele não pensa assim, ora bolas.
Repetindo, pensa que os índios foram ou ainda são preguiçosos, que os negros foram ou são sujeitos repletos de artimanhas para extrair vantagens, e que os portugueses foram ou são gente que gosta de desfrutar o direito concedido a poucos em detrimento da maioria.
Em tempo: o general comentou que não é racista. Preconceituoso e ignorante, ele é.
Blog do PPS-SP: Para ajudar a entender Lula e Bolsonaro
Dizíamos aqui, outro dia:
Pensamento semelhante tem o eleitor de Jair Bolsonaro, ainda que no sentido inverso. Quanto mais os políticos e a mídia tradicional o apontarem como um boçal com ideias esdrúxulas, maior apoio e repercussão terá entre o exército anônimo de indignados e revoltados anencéfalos contra o atual sistema político. O folclórico Bolsonaro segue a linhagem dos Enéas, Tiriricas e Cacarecos da história brasileira. Periga ser o herdeiro legítimo de quem elegeu Fernando Collor em 1989. Aí estaremos fritos de verdade.
É evidente (para quem se propõe a enxergar fora da caixinha), assim, que a polarização que traz Lula e Bolsonaro na liderança das pesquisas pré-eleitorais também carrega em si o desejo da mudança. Não se trata, em sua grande maioria, do voto racional, partidário ou ideológico, mas do simbolismo dessas duas candidaturas. Com Lula fora por conta da prisão e da ficha suja, restará conferir a sua capacidade de transferência de votos. Quem será o maior beneficiário do espólio lulista? O PT vai lançar Fernando Haddad? Ou será que Ciro Gomes personifica melhor esse eleitor órfão de Lula? E Marina Silva, somará quanto desses indignados ao legado de 20 milhões de eleitores cativos das duas últimas eleições? (…)”
Agora, com a confirmação das candidaturas, Bolsonaro com seu vice que é general da reserva, e Lula telegrafando o Plano B para a sua insistente não-candidatura, à espera da impugnação, com Haddad presidente e Manuela vice, as coisas começam a clarear.
Dois excelentes artigos nos ajudam a compreender a situação de Lula e de Bolsonaro. Um, do jornalista Clóvis Rossi (“PT entroniza dom Sebastião Lula da Silva“).Outro, do cientista político Marco Aurélio Nogueira (“Falando a sério sobre Bolsonaro“). Valem a leitura.
El País: Haddad, vice e plano B de Lula, ganha reforço de Manuela D'Ávila no último minuto
Plano do ex-presidente era adiar o máximo possível anúncio de companheiro de chapa, mas recomendação do TSE precipitou desfecho. PCdoB repete aliança com petistas que mantém há décadas
Por Afonso Benites e Flávia Marreiro, do El País
O PT esticou até praticamente o último minuto o suspense sobre quem seria indicado a vice na chapa de Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do partido à Presidência apesar de estar preso e virtualmente impedido de concorrer por causa da Lei Ficha Limpa. A espera que entrou noite adentro no domingo não trouxe surpresas: o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad ficou com a vaga e ganhou, no último suspiro do prazo legal, o apoio do PCdoB. A pré-candidata comunista Manuela D'Ávila abriu mão de sua candidatura a presidenta e será uma espécie de vice stand by - por enquanto, não tem o posto, mas uma vez definida a situação de Lula, será a companheira de chapa do próprio ex-presidente, uma possibilidade considerada remotíssima, ou de Haddad.
O anúncio foi feito, já passada a meia noite, na sede do PT, pela presidenta da sigla, Gleisi Hoffmann. Ao lado dela, Haddad fez um breve discurso agradecendo a indicação. Manuela D'Ávila não estava, mas os militantes, ensaiados, já entoavam músicas aclamando a deputada gaúcha, o ex-prefeito paulistano e Lula, preso desde abril em Curitiba. Segundo Gleisi, é Haddad quem vai representar Lula em atividades de campanha, como os debates.
Dada a situação, o ex-prefeito começa o percurso de vice, mas com o escrutínio de um cabeça de chapa - Lula lidera as intenções de voto, e o Haddad, quando posto nas simulações, não decola nas pesquisas. Se não está envolvido nos megaescândalos de corrupção que marcaram a reunião do PT, o ex-prefeito tampouco foi bem em sua última campanha: ele perdeu a disputa pela prefeitura de São Paulo para João Doria em 2016.
As redes sociais do partido já divulgaram imagens da dupla Lula-Haddad. Foi a explicitação do Plano B do PT: o partido vai insistir até quando possível no nome do ex-presidente, mas não deve flertar demasiado com o abismo legal, como era ventilado numa ala do partido considerada mais radical. Uma prova disso aconteceu neste próprio domingo. Enquanto na sexta Gleisi afirmava que o prazo legal para apresentar as candidaturas era dia 15 de agosto, neste domingo, mesmo reclamando publicamente, a decisão do PT foi seguir a recomendação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de apresentar as chapas até esta segunda-feira.
As negociações na reta final com o PCdoB transpareceram tensas. "Cada um tem seu jeito, sua vida. Vou sair da minha casa agora, 22h, domingo, ficar longe de meus filhos que vejo tão pouco, para uma reunião com a direção do PT. Espero que se justifique, né?", queixou-se no Twitter Orlando Silva, integrante do PCdoB e ex-ministro de Lula, sobre as negociações neste domingo. Seja como for, o PCdoB cedeu. Após ensaiar não apoiar os petistas pela primeira vez em sete eleições, os comunistas aceitaram. Além do discurso de Manuela D'Ávila de que o partido trabalharia pela união do chamado campo progressista, pesou também o temor do PCdoB pela própria sobrevivência: as alianças regionais com o PT são importantes para ultrapassar a cláusula de barreira. Apesar da situação esdrúxula, Manuela se transforma na terceira vice mulher entre as candidaturas tidas como competitivas num momento de fortalecimento do movimento feminista no país e quando elas são a maioria do eleitorado e a maioria do contingente de indecisos neste momento.
Gosto amargo para Ciro Gomes, mas também para o PSB
Enquanto a novela PT-PCdoB se esticou até o último minuto, a do PSB encerrou-se com um gosto amargo para a sigla: nenhum partido político concluiu a sua convenção nacional tão rachado quanto os socialistas. O partido realizou sua convenção nacional e confirmou que ficará neutro no pleito, uma decisão que sufoca Ciro Gomes (PDT) e, por tabela, beneficia Geraldo Alckmin (PSDB) e o PT. Se já havia ficado isolado coma decisão do PSB, a vitória do PT com o PCdoB fortalece a candidatura do PT, mesmo com problemas maiúsculos, como a mais competitiva no campo progressista.
O clima acirrado entre os delegados no congresso deste domingo foi um retrato das divisões internas do partido. Quando Carlos Siqueira, presidente do PSB, apresentou a proposta de neutralidade, o salão do hotel em Brasília que recebeu a reunião se dividiu entre vaias e aplausos. “Um partido sem posições diferentes é um partido autoritário”, minimizou Siqueira, logo após o encontro.
O PSB tem atualmente uma bancada de 26 deputados federais e é dono de cerca de 40 segundos no horário eleitoral. Por isso, era visto como a sigla que poderia resgatar Ciro Gomes do isolamento depois que o pedetista foi rejeitado pelo Centrão (grupo de cinco partidos políticos de centro-direita que terminaram fechando uma coligação com Alckmin). O próprio Siqueira não escondia de aliados que preferia uma aliança eleitoral com Gomes.
Prevaleceu, no entanto, a vontade dos caciques dos diretórios regionais mais importantes do PSB, entre eles Pernambuco e São Paulo. Ironicamente, o governador pernambucano, Paulo Câmara, e o paulista, Márcio França, uniram forças para beneficiar dois inimigos históricos que tinham interesse em isolar o pedetista. Câmara defendeu a neutralidade dos socialistas para atender uma demanda do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cabo eleitoral praticamente imbatível em seu Estado. França, por sua vez, agiu para ajudar Alckmin, seu padrinho político e candidato à presidente da República.
A ala do PSB que defendia apoiar Ciro Gomes foi derrotada na votação deste domingo que sacramentou a neutralidade, mas as sequelas do embate ficaram evidentes. “Infelizmente a força convencional de Pernambuco e São Paulo é muito grande e a vontade dos outros Estados não foi capaz de superar essa força para defender a candidatura do Ciro Gomes”, disse o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg.
Vácuo
Legenda de porte médio, o PSB perdeu em 2014 a seu principal expoente, o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, morto em um acidente aéreo. Desde então, os socialistas não conseguiram encontrar uma liderança com força para unificar as diferentes facções da sigla. Uma situação que neste ano foi agravada por outro vácuo, a desistência do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, de disputar a presidência.
Embora neófito no PSB, Barbosa aparecia nas sondagens com 10% da preferência do eleitorado e figurava como um outsider com chances reais de chegar ao Palácio do Planalto. Sua recusa em se lançar na corrida presidencial acentuou o conflito interno entre os que queriam apoiar Ciro, o PT ou mesmo Alckmin. Como não havia forma de conciliar os diferentes interesses e a neutralidade trazia algum benefício aos aliados de petistas e tucanos, venceu a tese de não realizar uma aliança no cenário nacional. "Talvez ela [a neutralidade] seja a decisão menos traumática do partido, mas de forma alguma mostra uma unidade", avalia Marco Antônio Teixeira, professor de ciência política da Fundação Getúlio Vargas.
A fratura mais sentida no partido ocorreu em Minas Gerais e criou um impasse que ainda não foi solucionado. O PT havia condicionado retirar a candidatura de Marília Arraes ao Governo de Pernambuco, o que acabou acontecendo neste domingo apesar da resistência da petista, a um gesto semelhante por parte do ex-prefeito de Belo Horizonte, o socialista Márcio Lacerda, que aparecia em terceiro nas pesquisas de intenção de voto na corrida pelo comando de Minas Gerais. Lacerda, entretanto, não aceitou ser apenas uma “baixa colateral” do acerto celebrado pela cúpula do PSB. Ele realizou a reunião estadual que o oficializou candidato ao governo do Estado no sábado e entrou na convenção nacional deste domingo cobrando um preço para desistir das suas pretensões: que o PSB local não se alie formalmente ao petista Fernando Pimentel. Até esta segunda-feira, último dia que os partidos têm para comunicar a Justiça eleitoral do resultado das suas respectivas convenções, os socialistas correrão contra o tempo para tentar encontrar um arranjo em Minas que atenda os interesses do ex-prefeito de Belo Horizonte. "Eu não posso [me aliar ao PT] de jeito nenhum. Eu não vou ter os votos do PT e perco os votos que eu tenho”, justificou Lacerda.
OS CANDIDATOS E SEUS VICES
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Fernando Haddad
Ciro Gomes (PDT) e Kátia Abreu (PDT)
Geraldo Alckmin (PSDB) e Ana Amélia (PP)
Marina Silva (REDE) e Eduardo Jorge (PV)
Álvaro Dias (PODEMOS) e Paulo Rabello (PSC)
Henrique Meirelles (MDB) e Germano Rigotto (MDB)
Guilherme Boulos (PSOL) e Sonia Guajajara (PSOL)
João Amoêdo (NOVO) e Christian Lohbauer (NOVO)
O Globo: Lula, preso e sem vice, é escolhido pelo PT como candidato ao Planalto
Após condenação em 2ª instância, ex-presidente se torna inelegível
Bruno Goes e Sérgio Roxo, de O Gllobo
SÃO PAULO / Sem o candidato que está preso em Curitiba desde 7 de abril e sem a definição do candidato a vice, o PT referendou ontem a indicação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para disputar a Presidência pela sexta vez. Condenado em segunda instância no caso do tríplex do Guarujá, o líder petista está enquadrado na Lei da Ficha Limpa e deve ter a candidatura impugnada. Internamente, a legenda discute a indicação de um plano B quando isso acontecer.
O adiamento da indicação do vice pode trazer implicações jurídicas à chapa petistas, e por isso o PT avalia anunciar até hoje o nome do companheiro de chapa, preferencialmente do próprio partido. São opções o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, tido como favorito, a presidente da legenda, Gleisi Hoffmann, e o ex-ministro Jaques Wagner. Reunida à tarde, a executiva do PT informou que ainda negocia aliança com o PCdoB, que indicaria Manuela D’Ávila, e com o PDT, mas Ciro Gomes nega a possibilidade.
As discussões sobre a indicação ou não de um vice até domingo dominaram os bastidores da convenção. Pela manhã, dirigentes petistas se encontraram com caciques do PCdoB, mas não houve entendimento. O PT também anunciou o apoio de dois partidos à candidatura: PROS e PCO.
Na impossibilidade de contar com Lula no ato realizado em uma casa de eventos no centro de São Paulo, a organização distribuiu máscara com a imagem do ex-presidente para os militantes presentes. Na hora de fazer a aclamação simbólica da indicação de Lula, Gleisi pediu que os presentes vestissem as máscaras. Lula apareceu em um painel no fundo do palco.
Em carta lida pelo ator Sergio Mamberti, Lula disse que, pelo primeira vez, em 38 anos, não comparecia a um encontro nacional do PT. O ex-presidente reclamou das restrições colocadas à sua candidatura.
“Já derrubaram uma presidenta eleita; agora querem vetar o direito do povo escolher livremente o próximo presidente. Querem inventar uma democracia sem povo”.
ENTREVISTA
Especialistas em legislação eleitoral afirmam que, até 2016, havia consenso: a escolha do vice podia ser feita depois da convenção, até a data do registro (15 de agosto, neste ano), desde que a convenção deliberasse nesse sentido. Mas uma resolução do TSE, com as regras da eleição de 2018, estabeleceu prazo de 24 horas do fim do período de convenções para o registro da ata da convenção na Justiça Eleitoral.
Há divisão na interpretação de especialistas ouvidos pelo GLOBO se o prazo final para indicação de vice é de 24 horas após o fim das convenções, ou se a decisão pode acontecer só na data final do registro.
O jornal italiano “La Repubblica” publicou ontem uma entrevista com Lula. O expresidente está proibido de conceder entrevista pela Justiça. O deputado italiano Roberto Gualtieri, do parlamento europeu, visitou Lula na cadeia, levado por Gleisi Hoffmann, e fez as 19 perguntas enviadas pelo jornal.