Lava Jato
O Globo: Palocci compromete Lula e Dilma em depoimentos já feitos à PF
Em delação, ex-ministro narra relação do partido com as empresas investigadas na Lava-Jato
Por Jailton de Carvalho e Robson Bonin, do O Globo
O acordo de delação premiada assinado pelo ex-ministro Antonio Palocci com a Polícia Federal, revelado ontem pelo GLOBO, é uma reunião de fatos que envolvem, em grande parte, o esquema de arrecadação do PT com empreiteiras citadas na Lava-Jato e a atuação dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff nos crimes apurados pela operação. Por se tratar de uma colaboração negociada na primeira instância, os temas abordados pelo ex-ministro dizem respeito a fatos investigados — ou passíveis de investigação — pela 13ª Vara Federal de Curitiba, comandada pelo juiz Sergio Moro, que terá o papel de homologar o acordo.
Palocci está preso em Curitiba desde setembro de 2016. Ele foi condenado por Moro a 12 anos, dois meses e 20 dias de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Nas últimas semanas, além de fixar as bases dos benefícios concedidos ao ex-ministro — ainda sob sigilo —, os investigadores concluíram a fase de depoimentos. O acordo estaria na fase de homologação por Moro, o que deve acontecer em até duas semanas.
O GLOBO apurou ontem que boa parte das histórias abordadas por Palocci — que ainda poderão ser detalhadas no curso das investigações — reconstitui o esquema de corrupção na Petrobras, as relações das empreiteiras com políticos do PT e a forma como Lula e Dilma se envolveram nas tratativas que resultaram em um prejuízo de cerca de R$ 42 bilhões aos cofres da estatal, segundo estimativa da própria PF. Durante o processo de delação, Palocci também poderá apresentar anexos suplementares com novos casos considerados relevantes pelos investigadores.
Lula e Dilma negam acusações
Ao falar de Lula, Palocci detalhou ocasiões em que foi pessoalmente levar pacotes de dinheiro vivo ao ex-presidente e relacionou datas e valores entregues por um de seus principais assessores, Branislav Kontic, na sede do Instituto Lula. Segundo Palocci, os pagamentos a Lula, feitos nos últimos meses de 2010, quando ele se preparava para deixar o Planalto, chegavam a somar R$ 50 mil. Dinheiro que seria usado pelo ex-presidente para bancar despesas pessoais.
Na ocasião das entregas, relata o ex-ministro, ele e Lula combinavam o local de encontro para o pagamento. Como o ex-ministro não dirigia o próprio carro, costumava levar um auxiliar ao volante que agora, na delação, poderá ser chamado a testemunhar sobre o caso. Além do assessor, cuja identidade é mantida em sigilo, Palocci listou datas e horários das entregas de dinheiro a Lula como parte do conteúdo probatório. A partir dessas informações, investigadores teriam condições de atestar encontros, por meio de ligações telefônicas entre Lula e Palocci, e pela posição dos aparelhos celulares no mapa de antenas.
Ao falar da relação de Lula com empreiteiras, o ex-ministro disse que parte do dinheiro entregue nas mãos do ex-presidente e na sede do instituto teria saído diretamente da “conta Amigo”, a reserva de propina atribuída ao petista no Departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht. Já ao citar Dilma, Palocci afirmou aos investigadores que ela teria atuado para atrapalhar as investigações da Lava-Jato no episódio da nomeação de Lula para ministro da Casa Civil, em março de 2016.
Conversa no Planalto
O ex-ministro narrou ainda pelo menos uma conversa com Lula no Palácio do Planalto na qual teria tratado do esquema envolvendo a construção de sondas para exploração de petróleo em águas profundas. O objetivo da negociação, feita na presença de Dilma, seria levantar dinheiro para bancar a eleição da ex-presidente, em 2010.
Em nota divulgada ontem, Dilma afirmou que “o ex-ministro mente para sair da cadeia e não tem provas para sustentar acusações a ela ou Lula”.
Advogado de Lula, Cristiano Zanin negou envolvimento de seu cliente nos fatos narrados:
— Qualquer afirmação de entrega de dinheiro ao ex-presidente Lula é mentirosa e, por isso mesmo, desacompanhada de qualquer prova. Lula jamais pediu ou recebeu vantagens indevidas.
Em nota, o PT afirmou que Palocci “rendeu-se às chantagens da Lava-Jato” e faz “falsas acusações” contra Lula para receber benefícios.
Além de detalhar os casos de corrupção dos quais participou ou teve conhecimento, o ex-ministro terá de apresentar provas do que diz. Se mentir ou quebrar algumas das cláusulas firmadas, poderá perder os benefícios negociados. Não está claro se Palocci irá apresentar anexos tratando dos casos de corrupção envolvendo clientes de sua consultoria, a Projeto. Também não há sinal de que ele irá citar casos que estão fora da jurisdição de Moro, como o caso dos pagamentos de propina pela J&F ao PT e fatos relacionados a antigas campanhas eleitorais do partido.
Fundador do PT, ex-prefeito de Ribeirão Preto, ex-ministro da Fazenda do governo Lula e ex-chefe da Casa Civil de Dilma, Palocci participou das decisões mais importantes do partido nas últimas duas décadas. O PT sempre negou irregularidades nas doações de campanha do partido.
Lúcio Flávio Pinto: Mais um golpe. Na Lava-Jato
A maioria da 2ª turma do Supremo Tribunal Federal começou a estripar os autos do segundo processo contra o ex-presidente Lula, que o juiz Sérgio Moro está instruindo. Por 3 a 2, a turma mandou extrair a participação da Odebrecht na produção de provas que atestam ser de Lula o sítio de Atibaia, em São Paulo.
São testemunhos dados em delação premiada, perícias e outros documentos que revelam, por trás da inexistência de registro imobiliário em nome de Lula, robustas provas indiretas de que o sítio, melhorado à custa de 800 mil reais gastos em obras nele realizadas, constituía, junto com o terreno para o Instituto Lula, um caixa de transações no valor de R$ 12 milhões, em operações de favorecimento à Odebrecht e à OAS.
Não é por outro motivo que as duas empreiteiras executaram as benfeitorias no sítio, tão significativas que não será um despropósito compará-lo à Casa da Dinda, a residência que Collor transformou em atração turística à beira do lago Paranoá, em Brasília, com as melhorias que promoveu, a mais famosa delas sendo uma exuberante cascata.
A decisão de ontem não tira o processo das mãos de Moro, mas enfraquece a sua capacidade de decidir sem o material mais relevante para provar a triangulação: as empreiteiras pagam propina, essa propina é disfarçada em obras, e, em troca, Lula manteve (e Dilma também, apesar da meteórica turbulência de Graça Foster) os diretores da Petrobrás que garantiam as “operações estruturadas” em favor das empreiteiras do cartel batizado de clube das 13.
As peças, desapartadas, serão remetidas para a justiça federal de São Paulo. Obviamente, não terão a mesma serventia que tinham em Curitiba. O prejuízo será duplo. Inviabilizará uma nova condenação de Lula?
Provavelmente, não. Os três patetas (para lembrar a classificação que Ulysses Guimarães deu aos três integrantes da Junta Militar que substituíram o enfermo presidente-general Costa e Silva, em 1969, no período mais negro da ditadura) terão que agir novamente para continuar a desconstrução. Agirão?
Audácia eles têm de sobra. Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli são crias de Lula. O personagem inusitado (e o mais nefando) entre eles, Gilmar Mendes, era execrado pelos petistas como o mensageiro de Fernando Henrique Cardoso, que o nomeou para a corte suprema da justiça brasileira.
Agora que ele é o defensor perpétuo de Lula, os petistas se calaram. Preferem ignorar, por sua utilidade, um fato evidente: Gilmar passou a tutelar Lula para proteger os seus amigos tucanos e empresários, mesmo os de maus bofes, como o dono de ônibus Jacó Barata.
A tríade está naquele plenário para dar um nó na Operação Lava-Jato. Por isso, os fundamentos jurídicos, a coerência e a compostura estão sendo deixados de lado. Seis meses depois que a 2ª turma, à unidade, decidiu manter em Curitiba as provas ligadas à Odebrecht, os três dissentiram e mudaram o entendimento.
A fugacidade é tal que parecem ter decidido tirar as provas do juiz no momento em que ele começa a entrar na fase da sentença, sem sequer olhar para o que dizem os papéis e demais elementos de prova. O relator, Edson Fachin, e o decano, Celso de Mello (cujo voto tem variado, o que o distingue da tríade, arrematada em plenário pelo inefável Marco Aurélio Mello), não tiveram qualquer dúvida: os autos fizeram o nexo entre o sítio, o terreno para o Instituto Lula, a Petrobrás, os diretores corruptos, os favores e as propinas. Logo, a materialidade estava provada.
Para os três paladinos da liberdade de colarinhos brancos, isso não interessa. Lula tem que sair da prisão. Outros têm que sair e vários outros não têm que entrar. A Lava-Jato tem que acabar. Farinha pouca, meu pirão primeiro. E, para rimar: o que fará diante disso o brasileiro?
* Lúcio Flávio Pinto é o editor do Jornal Pessoal, de Belém, e do blog Amazônia hoje – a nova colônia mundial. Entre outros, é autor de O jornalismo na linha de tiro (2006), Contra o poder. 20 anos de Jornal Pessoal: uma paixão amazônica (2007), Memória do cotidiano (2008) e A agressão (imprensa e violência na Amazônia) (2008).
Luiz Carlos Azedo: Truco no Jardim do Éden
O ministro-relator Edson Fachin está em minoria na Segunda Turma do STF e perde quase todas as votações, embora conheça profundamente as investigações e os processos da Lava-Jato
O truco é muito popular entre paulistas e goianos. Apesar de parecer simples, é um jogo de cartas que exige muita astúcia e possui diferentes táticas, o que complica a vida dos iniciantes. A primeira delas é manipular o adversário. Para isso, o bom jogador precisa ser agressivo, fazer o máximo possível para intimidá-lo. O jogador truca gritando, com objetivo de assustar e prejudicar o desempenho do concorrente durante o resto da disputa. Outra tática importante é escolher bem o parceiro. É preciso ter confiança e química para que possam se comunicar com um olhar. Quando o parceiro é perfeito, metade do jogo está ganho. Conhecer a ordem das cartas também é fundamental para não trucar na hora errada. E, finalmente, ter confiança em si mesmo, para convencer os demais jogadores de que suas cartas são as melhores, mesmo que não sejam. Por isso, o bom jogador nunca reclama do jogo que tem nas mãos, mesmo quando ele é fraco. Se blefar com convicção, ganha o jogo.
A sessão de ontem da segunda turma do Supremo Tribunal Federal (STF) foi como uma partida de truco bem jogada. Por 3 votos a 2, essa turma (chamada de Jardim do Éden pelos advogados) decidiu retirar trechos da delação de executivos da construtora Odebrecht que envolvem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva da alçada do juiz Sérgio Moro, do Paraná, enviando esses depoimentos para a Justiça Federal de São Paulo. Os ministros Antônio Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes concluíram que as informações dadas pelos delatores da Odebrecht sobre o sítio de Atibaia e sobre o Instituto Lula não têm relação com a Petrobras e, portanto, com a Operação Lava-Jato. Votaram pela manutenção o relator da Lava-Jato, Edson Fachin, e o decano da Corte, Celso de Mello.
Segundo Toffoli, Lewandowski e Mendes, não há razão para os depoimentos dos delatores serem direcionados a Moro, que é o responsável pela Lava-Jato na primeira instância da Justiça Federal. Essa interpretação pode ter sérias consequências para a Operação Lava-Jato, em especial para os processos aos quais responde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sua defesa, que considera Moro “um juiz de exceção”, já anunciou que fará um pedido para retirar da Justiça Federal do Paraná os processos aos quais o ex-presidente responde. Tanto a força-tarefa da Lava-Jato quanto o juiz federal foram pegos de surpresa e ainda não se pronunciaram sobre a decisão.
Há uma profunda divergência de entendimento entre a maioria da segunda turma do STF e o Ministério Público Federal, uma vez que a delação premiada da Odebrecht tem origem no esquema de corrupção da Petrobras investigado pela força-tarefa da Operação Lava-Jato. Acontece que o ministro-relator Edson Fachin está em minoria na turma e perde quase todas as votações, embora conheça profundamente o andamento das investigações e os autos dos processos da Lava-Jato. O recurso de Lula estava sendo analisado desde março, quando o ministro Toffoli pediu vista e interrompeu o julgamento. Ao retomá-lo, encaminhou o voto que mudou o rumo do processo. O julgamento só não foi relâmpago (durava 20 minutos) porque aguardou o ministro Gilmar Mendes, que estava viajando, chegar ao STF, para desempatá-lo, num voto curto e grosso.
O bem e o mal
A segunda turma é chamada de Jardim do Éden pelos advogados por causa da maioria “garantista” formada pelos três ministros, que votam em bloco. Todas as decisões são na direção de circunscrever a Lava-Jato e conceder habeas corpus, ao contrário da primeira turma, apelidada de “Câmara de Gás” pelos advogados dos réus, porque joga mais duro com os acusados e manda prendê-los. No Jardim do Éden, segundo o relato judaico-cristão, por ordem divina, o homem podia comer os frutos de todas as árvores, exceto os da árvore do conhecimento. Ao desobedecer essa ordem e comer esse fruto proibido, Adão e Eva conheceram o bem e o mal, e do pecado nasceu a vergonha e o reconhecimento de estarem nus.
Os teólogos debatem muito o significado dessa passagem bíblica. Todas as questões morais eram objetivas e não subjetivas. Havia uma moralidade absoluta. Alguém poderia fazer a coisa errada, mas a escolha estaria clara. A árvore cria uma confusão moral. Comer da árvore seria confundir o certo e o errado. Quando Adão e Eva comem da árvore, porém, os sentidos se tornam mais poderosos do que o intelecto e cada pessoa se sente com poderes para decidir por si mesma entre o certo e o errado, e a confusão moral entra no mundo.
A propósito do certo e do errado, a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a condenação do ex-governador Eduardo Azeredo (PSDB) em segunda instância a 20 anos e um mês de prisão. A defesa do tucano pedirá embargos declaratórios, mas isso não muda mais a sentença, e pode recorrer a tribunais superiores. De acordo com a denúncia, o mensalão tucano teria desviado recursos para a campanha eleitoral de Azeredo, que concorria à reeleição ao governo do estado, em 1998. Ele nega envolvimento nos crimes.
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Luiz Carlos Azedo: Na rota da Lava-Jato
O eixo da disputa eleitoral deste ano deslocou-se dos problemas que afetam o dia a dia da população — saúde, segurança, educação, transportes, habitação, etc. — para o tema da corrupção
Os fatos mais importantes do dia de ontem, em circunstâncias normais, seriam o embargo das importações de frango de 20 frigoríficos brasileiros pela União Europeia, que representa 35% das nossas exportações do setor, e o decreto assinado pelo presidente Michel Temer que autoriza os estudos para a privatização da Eletrobras, a holding brasileira de energia elétrica. Mas o noticiário foi tomado pela Operação Lava-Jato, que motivou pelo menos meia dúzia de decisões da Justiça, a começar pela concessão de habeas corpus ex ofício ao deputado afastado Paulo Maluf, pelo ministro Edson Fachin, depois de dois dias de sessões do Supremo Tribunal Federal (STF) só para discutir o caso do ex-prefeito de São Paulo.
O eixo da disputa eleitoral deste ano deslocou-se dos problemas que afetam o dia a dia da população — saúde, segurança, educação, transportes, habitação, etc. — para o tema da corrupção. Por 6 votos a 5, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) negaram o pedido de Maluf, atualmente em prisão domiciliar, para apresentar mais um recurso contra a condenação que sofreu no ano passado por lavagem de dinheiro. O pano de fundo da discussão era a dilatação das possibilidades de recurso e protelação do chamado “transitado em julgado”.
Depois de dois dias de sofisticados debates sobre o processo penal e a Constituição, o assunto foi encerrado como poderia ter começado: “de ofício” (por iniciativa própria), Fachin permitiu ao deputado, em razão do estado de saúde, continuar cumprindo em casa a pena de 7 anos, 9 meses e 10 dias de prisão que se iniciou em dezembro do ano passado. Maluf está internado no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, e corria o risco de ter que voltar para o Presídio da Papuda, em Brasília, para cumprir pena em regime fechado. Ele foi condenado por usar contas no exterior para lavar dinheiro desviado da Prefeitura de São Paulo quando foi prefeito da capital paulista, entre 1993 e 1996.
Quem corre mais risco de voltar para a cadeia é o ex-ministro José Dirceu, que cumpre pena em regime domiciliar, com tornozeleira eletrônica. O ministro Dias Toffoli negou liminar para impedir a volta do histórico líder petista à prisão. Dirceu pretende continuar em liberdade após o julgamento de recurso contra sua condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ontem, no qual teve mantida a pena de mais de 30 anos de prisão. Com a prisão de Lula, é praticamente impossível que isso ocorra.
Em meio a notícias de que a Polícia Federal pedirá a prorrogação do inquérito que investiga a corrupção no Porto de Santos, no qual estão envolvidos amigos do presidente Michel Temer, e de que o ministro Gilmar Mendes já ampliou por 60 dias o inquérito que investiga o senador Aécio Neves (PSDB-MG), o ministro Marco Aurélio Mello assoprou o braseiro das divergências no Supremo. Pediu que o plenário da Corte julgue uma ação sobre prisão após condenação em segunda instância apresentada pelo PCdoB, que pleiteia liminar para impedir a prisão de condenados antes do trânsito em julgado, ou seja, antes de condenação definitiva pelo próprio STF. Na semana passada, pela quarta vez em dois anos, o STF discutiu e manteve a jurisprudência que determina a prisão. Segundo o ministro, porém, o entendimento firmado em 2016 pelo STF poderá mudar em uma nova análise pelo plenário da Corte. E tome Lava-Jato!
Eleições
Fora da agenda oficial, o presidente Michel Temer recebeu, no Palácio do Planalto, o juiz Ali Mazloum, que atua como juiz instrutor do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. É quem o auxilia a ouvir testemunhas e interrogar réus. Nem o Palácio do Planalto nem o magistrado deram informações sobre a conversa. Temer e Mazloum são amigos e fazem parte da comunidade árabe de São Paulo. Hoje, Temer fará um pronunciamento à nação, a propósito do aniversário da morte de Tiradentes: 21 de abril de 1792. Não pretende tratar da Lava-Jato, mas do sucesso de sua política econômica, ancorado nas últimas análises do Fundo Monetário Internacional (FMI).
É a tal história: não se fala de corda em casa de enforcado. O Palácio do Planalto não descarta uma terceira denúncia contra Temer, que poderia ser uma espécie de pá de cal nos esforços do governo para melhorar a aprovação popular. A anunciada candidatura presidencial à reeleição corre risco de ser abatida na pista. Esse não é um problema somente do presidente da República e seu partido, o MDB. O PSDB também vive um inferno astral, com a aceitação da denúncia contra Aécio Neves (PSDB) e o escândalo do Metrô de São Paulo, que estão respingando no ex-governador Geraldo Alckmin, pré-candidato a presidente da República. Mesmo não estando diretamente envolvido na Lava-Jato, o tucano sente o drama da crise ética. Sua candidatura está isolada e não ganha aderência popular.
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William Waack: A pobreza do debate
A Lava Jato traçou a linha entre o que é política e o que é bandidagem
Assim como a prisão do ex-presidente Lula, Aécio Neves agora réu no Supremo Tribunal Federal é um acontecimento político de importância muito maior do que o destino reservado ao agente político, ao indivíduo. O episódio do senador tucano que passou de quase presidente para candidato a presidiário oferece uma boa leitura do momento político brasileiro.
Não estou falando aqui de quem está dentro da Lava Jato nem das consequências para as diversas agremiações políticas e como se movimentam visando às próximas eleições. O caso Aécio virou uma bem acabada expressão do que é a falência política brasileira.
Pois quatro dos cinco ministros que aceitaram a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) tornaram o senador réu por obstrução da Justiça (além de corrupção passiva), isto é, por tentar atrapalhar a Operação Lava Jato. Aécio teria praticado esse crime, segundo a acusação, utilizando-se da sua atividade como parlamentar para discutir, entre outras coisas, projetos de lei como o que previa punição a agentes públicos por abuso de autoridade.
Não vou entrar no mérito da acusação nem nas alegações da defesa do senador. O que me interessa aqui é registrar um fato que me parece de vital importância para a política brasileira. Onde está a linha que divide a atividade do parlamentar (que inclui, claro, discutir projetos como abuso de autoridade) e a pura e simples bandidagem? Mais ainda: quem traça essa linha e decide se uma articulação política no parlamento passou a ser uma articulação para proteger políticos do alcance da Justiça?
No atual momento político brasileiro, não importa se a gente gosta ou não do que está acontecendo, as respostas a essas duas perguntas são evidentes. Procuradores, delegados, juízes e, agora, também ministros do Supremo leram História (ou saíram atrás de quem leu o que aconteceu na Itália) e estão convencidos de que políticos, deixados entregues a si próprios, vão se articular para defender apenas seus próprios interesses, sobretudo os interesses espúrios. E decidiram eles mesmos, os integrantes da Lava Jato, traçar a linha entre o que é política e o que é bandidagem. Traçado que interpretam como julgam necessário.
Reitero aqui a inutilidade, neste momento, de se estabelecer quem domina a objetividade dos fatos, se é a acusação que está com a “verdade” ou se é a defesa no caso do senador. Fato, em política, costuma em geral ser a percepção que se faz de um “fato”, e a percepção que tomou conta do momento brasileiro, e desfruta de extraordinária popularidade, é a que está contida na denúncia da Procuradoria-Geral da República: políticos não prestam, política é coisa suja e, mesmo quando parlamentares parecem estar discutindo projetos “sérios” (como o do abuso de autoridade), estão, no fundo, apenas se protegendo.
O fato dessa narrativa acima ter se tornado tão abrangente (talvez Gramsci a tratasse como “bloco histórico”) explica em parte a pobreza do atual debate político no Brasil, subordinado ao tema do combate à corrupção. Claro que combater a corrupção é essencial em qualquer parte e a qualquer momento. A falência da política brasileira está em não ter sido capaz, também por falta de lideranças, de desenvolver qualquer outro eixo relevante de debate.
Vamos aplaudir a prisão de Lula e outros, eventualmente de Aécio e outros, o que nos orgulha e enche de esperanças. E vamos continuar nos perguntando por que as coisas mudam tão pouco.
Luiz Carlos Azedo: E la nave va
No Supremo Tribunal Federal (STF), seus ministros se digladiam para decidir se concedem a Paulo Maluf (PP-SP), em prisão domiciliar, o direito de apresentar mais um recurso
Parece uma espécie de ópera bufa. Em Porto Alegre, os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região rejeitaram ontem o último recurso da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra sua condenação a 12 anos e um mês de prisão em regime fechado, o que levou o advogado do petista, Cristiano Zanin Martins, a qualificar a decisão de ilegal: “Mesmo levando em consideração os fatos analisados pelo TRF-4, colide com a lei e com a Constituição Federal”, disse. Lula está preso em Curitiba e mantém sua candidatura a presidente da República, mesmo estando inelegível.
O protesto do advogado está em linha com a entrevista concedida à rede de televisão do mundo árabe Al Jazeera pela presidente do PT, senadora Gleisi Hoffman (PR), também enrolada na Operação Lava-Jato. Ela denuncia a condenação de Lula, ataca a Justiça brasileira, faz um apelo à solidariedade do mundo árabe, a pretexto de que teria havido um golpe de Estado no Brasil, e afirma que Lula é um preso político. É o caso de perguntar: que tipo de apoio ela está querendo da esquerda árabe, notoriamente ligada ao terrorismo?
Enquanto isso, no Supremo Tribunal Federal (STF), trava-se mais uma batalha ao vivo e em cores entre seus ministros, desta vez para decidir se concedem ao deputado afastado Paulo Maluf (PP-SP), atualmente em prisão domiciliar, o direito de apresentar mais um recurso contra a condenação que sofreu no ano passado por lavagem de dinheiro. Votaram contra os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux, enquanto Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski manifestaram-se a favor. O julgamento será concluído hoje, quando votarem os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Cármen Lúcia.
Condenado em maio, o ex-prefeito de São Paulo teve um primeiro recurso negado em outubro pela Primeira Turma do STF. Em dezembro, o ministro Edson Fachin rejeitou um segundo recurso e determinou o cumprimento da pena em regime fechado, mas seu colega Dias Toffoli, a pedido da defesa, concedeu prisão domiciliar a Maluf por razões humanitárias. O episódio é a síntese das divergências na Corte, cujas turmas foram apelidadas pelos advogados de “Câmara de Gás”, a primeira, liderada por Barroso, que manda prender; e “Jardim de Éden”, a segunda, na qual Gilmar é o grande protagonista, que manda soltar.
Caso a Corte derrube a decisão de Fachin, Maluf poderá responder ao processo em liberdade; caso seja recusado, os ministros decidirão se permanecerá em prisão domiciliar ou voltará para o regime fechado. A votação é importante porque pode mudar a jurisprudência da Corte contra os recursos infringentes, ampliando as possibilidades de protelação dos julgamentos e de prescrição das penas. Os políticos enrolados na Operação Lava-Jato, sem distinção, torcem por Maluf.
Cortejo fúnebre
Para os que já estão enfadados de acompanhar os julgamentos, uma boa pedida é ver ou rever o clássico de Frederico Fellini, que empresta o título à coluna. Último grande filme desse mestre do cinema, E La Nave Va foi lançado em 1983, inspirado na mais original criação artística italiana: a ópera. Numa de suas passagens mais antológicas, os passageiros cantam um trecho de La Forza del Destino, de Giuseppe Verdi. Recortes das obras de Bellini, Tchaikovsky e Rossini tecem a trilha sonora, numa homenagem ao compositor Nino Rota, responsável pelas trilhas originais de todos os seus filmes anteriores, que havia falecido.
O navio Glória N. parte com a nata do mundo artístico clássico em direção à Ilha de Erimo, com o propósito de jogar no mar as cinzas da grande diva Edmea Tetua, inspirada em Maria Callas, a célebre cantora grega que foi casada com o magnata Aristóteles Onassis. Matronas fellinianas, palhaços, tenores, sopranos, gente de todas as inclinações sexuais, e uma equipe de jornalismo que registra a viagem, além de um rinoceronte, são os passageiros da nave louca. Acabam surpreendidos pela dura realidade da Primeira Guerra Mundial quando resgatam um náufrago sérvio.
Durante a viagem, as personalidades, os temores e os defeitos dos passageiros são revelados por uma câmera onipresente, que mostra uma verdadeira guerra de egos entre eles. O jornalista ironiza o próprio trabalho: “Dizem: faça a crônica, conte o que acontece… Mas quem é que sabe o que acontece?” A guerra, porém, muda o rumo da história. Os temas da política e da diplomacia roubam a cena com a chegada de mais náufragos. A elite do navio desdenha do que acontece no convés, enquanto os miseráveis observam tudo pelas janelas do salão principal. É uma bela alegoria para o que está acontecendo na política brasileira, às vésperas de mais uma sucessão presidencial.
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El País: Aécio Neves, réu na Lava Jato e um fardo incontornável para o PSDB
Senador por Minas Gerais se divide entre defesa no STF e a busca por seu futuro político. Alckmin tenta se blindar dizendo que "lei é para todos" e cúpula tucana evita cravar destino
Por Afonso Benites, do El País
De candidato que quase venceu a eleição presidencial de 2014 a uma incógnita eleitoral em 2018 e um fardo para seu próprio partido. Esse é Aécio Neves, o senador do PSDB de Minas Gerais que nesta terça-feira, dia 17, tornou-se réu no Supremo Tribunal Federal pelos crimes de corrupção passiva e obstrução à Justiça no âmbito da Operação Lava Jato. Algumas horas após da derrota sacramentada, quase nenhum tucano mineiro se animava a comentar o futuro político do principal nome do partido no Estado. Extraoficialmente, três deles disseram ao EL PAÍS que dificilmente Aécio se candidatará a algum cargo eletivo. E, se o fizer, tentará concorrer a uma das 53 vagas mineiras na Câmara dos Deputados. Uma tentativa de reeleição ao Senado é incerta. Apesar de essa ser sua vontade principal.
Entre a cúpula nacional do PSDB também há uma incógnita sobre qualquer candidatura de Aécio. O EL PAÍS questionou os senadores Cássio Cunha Lima (PB) e Tasso Jereissati (CE) se, diante do atual cenário, eles achavam que Aécio teria alguma chance nas eleições deste ano. A resposta de ambos foi exatamente a mesma: “Tem de perguntar aos mineiros”.
Aécio Neves se tornou um constrangimento algo incontornável para os tucanos, pelo menos por enquanto. Como ainda comanda a máquina partidária do PSDB em seu Estado, o segundo maior colégio eleitoral do país, e tem certa influência no diretório nacional, do qual era presidente até o ano passado, só Aécio poderá anunciar sua decisão se concorre ou não a um cargo eletivo.
"Cabe a ele definir o que vai fazer e como fazer", limitou-se a dizer o pré-candidato à presidência do PSDB, Geraldo Alckmin. Antes, no entanto, fez coro com outro senador peessedebista, Ricardo Ferraço (ES), que gravou vídeo para dizer que a “lei é para todos”. "Não existe justiça verde, amarela, azul ou vermelha. Só existe Justiça. Decisão judicial se respeita e a lei é para todos, sem distinção", afirmou Alckmin, segundo a Folha de S. Paulo.
Capital político minguante
Desde que se viu envolvido no escândalo da JBS, no qual foi flagrado em diálogos duvidosos com o empresário e criminoso confesso Joesley Batista, Aécio viu seu capital político ruir. De Joesley, Aécio recebeu 2 milhões de reais em espécie. O empresário diz que o dinheiro era propina. O senador, empréstimo.
Após esse escândalo vir à tona, o parlamentar chegou a ser afastado do Senado Federal, se licenciou da presidência do PSDB e foi vaiado na convenção do próprio partido. Até correligionários de primeira hora, como o senador Antônio Anastasia, que é seu afilhado político e foi seu vice-governador, afastaram-se. No PSDB mineiro Anastasia é o único nome para concorrer ao Governo. Mas enfrenta a rejeição de Aécio, que tem remado contra ele.
As escolhas eleitorais de Aécio nos dois últimos pleitos se demonstraram equivocadas. Pimenta da Veiga perdeu para o petista Fernando Pimentel no primeiro turno para o Governo em 2014. Em 2016, foi a vez de João Leite perder para Alexandre Kalil (PHS) a disputa por Belo Horizonte, a capital mineira. “O PSDB no nosso Estado era o Aécio. Mas os últimos movimentos eleitorais, sua derrota para a Dilma [Rousseff] no próprio Estado e agora a denúncia aceita pelo Supremo o enfraquecem, sem dúvida”, afirmou um deputado tucano.
“Estou sendo acusado tendo como base uma ardilosa armação"
Seja como for, a inflexão mais importante no calvário político de Aécio foi mesmo nesta terça, quando, por unanimidade, os juízes da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal aceitaram a denúncia da Procuradoria Geral da República contra ele. Por quatro votos a um, os magistrados concordaram que ele também deveria responder pelo delito de obstrução à Justiça. O voto contrário, neste quesito, foi dado pelo ministro Alexandre de Moraes. A acusação dá conta que Aécio teria tentado usar de sua influência enquanto líder político e senador para embaraçar as investigações pela Polícia Federal. O caso teria ocorrido em 2017, quando Moraes era ministro da Justiça do Governo Michel Temer e filiado ao PSDB. A Polícia Federal era, na época, subordinada a esse ministério.
Durante o julgamento, o ministro relator, Marco Aurélio Mello, entendeu que surgiram sinais de práticas delituosas e, por essa razão, a acusação contra Aécio deveria ser aceita. A defesa do tucano reclamou que as principais provas da denúncia foram obtidas de maneira ilícita, por meio de uma ação controlada sem autorização judicial. Para Alberto Toron, defensor do senador, deverá haver uma investigação sobre a atuação do Ministério Público para comprovar que a atuação de Joesley ocorreu para prejudicar Aécio. “Houve uma ação dirigida sem autorização judicial”.
Nas redes sociais, o ex-procurador-geral da República que apresentou a denúncia, Rodrigo Janot, comemorou a decisão. “Provas obtidas por ação controlada validadas. Reconhecimento de que ex-procurador agiu por conta própria. Reconhecida a validade das gravações feitas de conversas nada republicanas com autoridades da República. O discurso vazio que tentava invalidar tudo isso virou sal na água”, afirmou em seu Twitter.
Ainda não há data para o julgamento do caso Aécio Neves no Supremo Tribunal Federal - a pauta da corte é essencialmente discricionária. Até lá, ele se dividirá entre uma definição de seu futuro político e em sua defesa de uma acusação que pode lhe render de 2 a 20 anos de prisão (se somados os dois crimes em que é réu). “Estou sendo acusado tendo como base uma ardilosa armação de criminosos confessos, aliados a membros do Ministério Público, que construíram um enredo para aparentar que cometi alguma ilegalidade. Não cometi crime algum”, disse o tucano a jornalistas, sem responder diretamente se seria ou não candidato.
Nos próximos meses, o senador aguardará o desenrolar da pré-campanha eleitoral e as costuras pelas coligações. Se, remotamente, decidir concorrer a uma das duas vagas ao Senado que estarão em aberto poderá reeditar uma disputa com Dilma Rousseff (PT). A ex-presidenta transferiu seu domicílio eleitoral para Belo Horizonte e o seu partido estuda se a lança ao Senado ou à Câmara.
Luiz Carlos Azedo: Vinte minutos
Aécio é acusado de pedir propina de R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, dono da J&F, em troca de favores políticos; e também de tentar atrapalhar o andamento da Operação Lava-Jato
Uma conversa pelo telefone volatilizou o projeto político do senador Aécio Neves (PSDB-MG) — “tudo o que é sólido se desmancha no ar” —, iniciado há 32 anos, sob a proteção de um dos políticos mais hábeis, probos e sagazes da história republicana, o presidente Tancredo Neves, que faleceu antes de tomar posse. Seu sonho era resgatar o mandato do avô e se tornar presidente da República. Por unanimidade, os cinco ministros da primeira turma do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber e Alexandre de Moraes, admitiram a abertura de processo contra o tucano por corrupção; por 4 votos a 1, por obstrução de Justiça, graças ao voto contrário de Moraes.
Aécio é acusado pela Procuradoria-Geral da República de pedir propina de R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, dono da J&F, em troca de favores políticos; e também de tentar atrapalhar o andamento da Operação Lava-Jato. Uma conversa de 20 minutos entre os dois foi gravada pelo empresário. Agora, o tucano é mais um político seriamente enrolado na Operação Lava-Jato, embora sustente que o pedido de dinheiro a Joesley era uma operação pessoal: “Não houve dinheiro público envolvido, ninguém foi lesado nessa operação. O que houve foi uma gravíssima ilegalidade, no momento em que esses empresários, réus confessos de inúmeros crimes, associados a membros do Ministério Público, o que é mais grave, tentaram dar impressão de alguma ilegalidade em toda essa operação, repito, privada, para se verem livres dos inúmeros crimes que cometeram”, disse o tucano em entrevista logo após a decisão.
A aceitação da denúncia era pedra cantada até para o advogado de Aécio, Alberto Zacharias Toron: “Não vejo como um revés. Como nós dissemos e como disse o ministro Luiz Fux, com muita propriedade, neste momento, a decisão se faz pró-sociedade. Então é um momento muito peculiar do processo penal. Na dúvida, não se decide a favor do réu, se decide a favor da sociedade. É isso que o Supremo Tribunal Federal, por sua primeira turma, entendeu. Portanto, vamos aguardar o desenvolvimento do processo”. Como todo político, Aécio acredita em ressurreição: “Não esmorecerei enquanto não provar minha inocência. Vou fazê-lo em respeito à minha vida pública, à minha família e aos milhares de brasileiros, e especialmente mineiros, que confiaram em mim durante 32 anos de mandatos consecutivos”.
Até a divulgação do acordo de delação premiada da JBS, Aécio Neves era a bola da vez na disputa pela Presidência da República. Derrotado por Dilma Rousseff no segundo turno das eleições de 2014, praticamente bateu na trave, com 51 milhões de votos (48,36%). Com o impeachment de Dilma Rousseff, do qual foi um dos artífices, seria um candidato natural às eleições deste ano, com a vantagem de não ter que enfrentar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Pau que dá em Chico dá em Francisco”, como disse o ex-procurador-geral da Republica Rodrigo Janot. Aécio caiu na armadilha de Joesley Batista, em condições ainda piores do que as do presidente Michel Temer, que também foi gravado, em conversa tête a tête no Palácio do Jaburu, mas que dá margens a dúvidas quanto à interpretação de seu teor por causa do formalismo institucional, enquanto a do tucano escandaliza pela linguagem mundana, completamente fora do padrão que ele próprio utiliza nas conversas em público.
Lava-Jato
Com a decisão de ontem, já são seis os senadores enrolados na Lava-Jato: Agripino Maia (DEM-RN), Fernando Collor (PTC-AL), Gleisi Hoffmann (PT-PR), Romero Jucá (MDB-RR) e Valdir Raupp (MDB-RO), além de Aécio. As investigações derivadas do escândalo da Petrobras também tiraram da disputa presidencial o senador José Serra (PSDB-SP) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva; quase levaram de roldão o presidente Michel Temer, que escapou de duas denúncias na Câmara e aguarda uma terceira a qualquer momento, mas fazem de seu governo um dos mais impopulares da história. Sobra também para o ex-governador Geraldo Alckmin, que deixou o Palácio dos Bandeirantes para ser candidato a presidente da República, mas não consegue decolar. O tucano não está na Lava-Jato, mas responde à denúncia de uso de caixa dois na Justiça Eleitoral.
A Lava-Jato fez um strike na elite política do país, que ficou desarvorada. Esta é uma variável poderosa do processo eleitoral: a corrupção, ao contrário de eleições passadas, ocupa o primeiro lugar entre as grandes preocupações da população, desbancando a saúde, a educação, a segurança e até o desemprego. O resultado é a roleta-russa na qual se transformou as eleições para a Presidência de outubro próximo, na qual se destacam Jair Bolsonaro (PSL), Marina Silva (Rede), Joaquim Barbosa (PSB), Ciro Gomes (PDT) e Álvaro Dias (Podemos). A histórica polarização entre tucanos e petistas ainda não pode ser descartada, mas, para que isso ocorra, tanto Alckmin quanto o substituto de Lula, provavelmente o ex-prefeito paulistano Fernando Haddad ou o ex-governador baiano Jaques Wagner, terão que desencabular e se livrar do estigma da Lava-Jato.
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Míriam Leitão: O inferno são os outros
O senador Aécio Neves pediu dinheiro a um empresário que confessou comprar parlamentares e avisou que a encomenda teria que ser carregada por alguém “que a gente mata antes de fazer delação". É difícil imaginar prova mais clara, e mortal, de obstrução de Justiça. O ex-governador Geraldo Alckmin recebeu em espécie, e não declarou, R$ 10 milhões da Odebrecht, mas responderá apenas na Justiça Eleitoral.
O ex-presidente do PSDB, ex-governador de Minas e ex-senador Eduardo Azeredo está nas raízes do primeiro escândalo de corrupção da nova safra. Ele fez em Minas o rascunho do que viria depois a ser o mensalão. A mesma engenharia financeira, o mesmo Marcos Valério, a mesma SMP&B, o mesmo Banco Rural. Foi condenado a 20 anos e o tempo corre contra a execução da pena. Ele tem abusado da patologia recursal brasileira, e com sucesso.
Aécio Neves está solto e exercendo seu mandato. O Supremo decidiu que o Senado poderia anular a ordem do próprio Supremo de suspensão do mandato. No caso de Alckmin, a decisão da Procuradoria-Geral da República de enviar o caso à Justiça Eleitoral porque há “só” caixa dois, e é “prática comum em caixa dois a entrega do numerário em espécie”, nas palavras do subprocurador-geral, revoga tudo que o país aprendeu com a Lava-Jato. Quase todos os acusados disseram que seus casos eram “só” de caixa dois, mas normalmente isso está conectado a outros delitos. Dinheiro em espécie entregue pela notória Odebrecht é indício de lavagem.
O inferno desse momento que o Brasil atravessa são os outros, para pegar emprestada a frase do filósofo Jean-Paul Sartre. São todos os outros que mostram como é persistente e longa a história de impunidade dos crimes de colarinho branco no Brasil. O mensalão e a Lava-Jato são uma quebra de paradigma. Podem ser o começo de um novo tempo, ou agravar ainda mais a sensação de uma Justiça seletiva.
Os tucanos sempre foram opostos aos petistas na economia, e adversários na arena política. Pois quando a denúncia chegou aos seus, se comportaram de forma idêntica. O PSDB era presidido por Eduardo Azeredo quando estourou o mensalão mineiro e continuou presidindo a legenda até o fim da gestão. Era presidido por Aécio Neves quando veio a público a conversa dele com o empresário Joesley Batista. Permaneceu presidente de fato. O PSDB fingiu afastá-lo, mas ele mostrou sua força no episódio em que forçou a saída do interino Tasso Jereissatti.
Há uma lista de outros, soltos por aí, porque seus inquéritos andam lentamente quando estão em tribunais superiores. O presidente Michel Temer conseguiu barrar duas denúncias contra ele e, diante da pressão contra seus amigos, o Planalto usa a surrada desculpa de que é denúncia “requentada". Como se as suspeitas se dissolvessem por repetição.
A lentidão tem sido o outro nome da impunidade. O símbolo disso é Paulo Maluf. A chegada da Justiça foi tão demorada que o encontra octogenário e, como disse o Hospital Sírio-Libanês, com “confusão mental". Ele faz parte da geração dos políticos que tinham certeza de que nada os alcançaria, se tivessem bons advogados especialistas na quase infinita estrada recursal. Agora a Justiça está se apressando. Mas não para todos.
A defesa do senador Aécio Neves diz que ele foi “vítima de uma situação forjada arquitetada por criminosos confessos que buscavam firmar um acordo de delação premiada fantástico". Há pedaços de verdade aí, mas a tese é falsa. Joesley Batista é criminoso confesso e estava em busca de provas para fazer a delação com um pedido fantástico: o da inimputabilidade. O prêmio foi concedido e depois, felizmente, suspenso. O inferno para o senador é que ninguém o forçou a procurar o empresário, pedir dinheiro e dizer os absurdos que disse, como a ameaça de morte feita ao carregador de malas; seu primo, a propósito.
O líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer, disse que a Justiça não pode fazer “compensação”, querendo dizer que não pode apertar o cerco sobre os tucanos porque prendeu o ex-presidente Lula. Não se trata de compensação, mas de Justiça. Todos os suspeitos precisam ser investigados, todos os condenados precisam cumprir suas penas. É assim em países onde funciona o império da lei.
Luiz Carlos Azedo: Falta combinar
O clima na Câmara, após o troca-troca de partidos, é de descompromisso com o Palácio do Planalto, não somente em relação à privatização da Eletrobras
A reestruturação da equipe ministerial, com a substituição dos ministros que se desincompatibilizaram para disputar as eleições, desorganizou a base do governo Temer na Câmara, ainda mais porque o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não esconde de ninguém o desconforto com a indicação de Moreira Franco para o Ministério de Minas e Energia. Soma-se a isso o descontentamento da bancada mineira, que não aceita de jeito nenhum a privatização de Furnas, uma das subsidiárias da Eletrobras.
O clima na Câmara, após o troca-troca de partidos, é de descompromisso com a agenda do Palácio do Planalto, não somente em relação à privatização da Eletrobras, uma prioridade para o governo. “Aqui só passa o que for consensual”, garante o deputado Fábio Ramalho (MDB-MG), vice-presidente da Câmara, um dos insatisfeitos com a reforma ministerial. A agenda subiu no telhado, ainda mais porque o novo ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, não tem o mesmo trânsito nem as mesmas motivações de seu antecessor, Henrique Meirelles, que se filiou ao MDB e também pleiteia a vaga de candidato a presidente da República.
Como as reformas da Previdência e tributária, a agenda microeconômica, cujo objetivo é melhorar o ambiente de negócios, encalhou. Autonomia do Banco Central; marco legal de licitações e contratos; nova lei de finanças públicas; regulamentação do teto remuneratório; reforço das agências reguladoras; depósitos voluntários do Banco Central; redução da desoneração da folha; programa de recuperação e melhoria empresarial das estatais; cadastro positivo; atualização da Lei Geral de Telecomunicações; e extinção do Fundo Soberano — nada disso anda na Câmara.
O governo Temer passa por um momento de inflexão, que frustra as suas próprias expectativas. Os resultados obtidos pela política econômica, principalmente em relação à inflação e à recessão, entre os quais destaca-se a redução da taxa de 6,5% (Selic), não proporcionaram uma melhoria significativa da avaliação do governo. A expectativa era tanta que o próprio presidente da República avançou três casas e se lançou candidato à reeleição. Faltou combinar com os desempregados e a bancada governista.
Lava-Jato
Os parlamentares de um modo geral dão sinais de que estão sentido a pressão do eleitorado em razão da Operação Lava-Jato. E que não estão dispostos a garantir a blindagem do presidente Michel Temer e seus ministros, como aconteceu nas votações das duas denúncias do ex-procurador-geral Rodrigo Janot. Essa situação já foi detectada pelo Palácio do Planalto, que se prepara para a eventualidade de ter que lidar com uma terceira denúncia do Ministério Público contra Temer, em razão da Operação Skala, que investiga a corrupção no Porto de Santos. Por essa razão, a rejeição do pedido de prisão preventiva do advogado e ex-assessor da Presidência José Yunes, do ex-deputado e ex-assessor do presidente Rodrigo Rocha Loures e do coronel aposentado da Polícia Militar de São Paulo João Baptista Lima Filho pela Justiça foi comemorada pelos governistas. Foi um sinal de que uma nova denúncia contra Temer pode morrer na beira da praia, isto é, no Supremo Tribunal Federal (STF).
Ontem, em cerimônia no Palácio do Planalto, Temer conclamou deputados e senadores a usarem a tribuna para fazer a “defesa” dos políticos: “Ao longo desses últimos tempos, vocês sabem que a classe política tem sido muito desvalorizada. E se nós não levantarmos a voz, e aqui eu a levanto, no maior nível possível, e espero que os senhores usem a tribuna a todo o momento para fazer essa defesa”. Quem seguiu à risca o conselho foi a bancada do PT, que saiu em defesa de Lula e atacou Temer, o tucano Geraldo Alckmin e a Justiça.
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Luiz Carlos Azedo: Lula no xadrez
O juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, cumprindo determinação do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), deu prazo até as 17h de hoje para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se apresentar à Polícia Federal em Curitiba para cumprir pena de 12 anos e 1 mês de prisão em regime fechado. Proibiu o uso de algemas, em qualquer hipótese. “Relativamente ao condenado e ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, concedo-lhe, em atenção à dignidade do cargo que ocupou, a oportunidade de apresentar-se voluntariamente”, diz o mandado. Moro deu um xeque-mate na defesa de Lula.
A notícia caiu como uma bomba. Embora o Supremo Tribunal Federal (STF), por 6 na 5, em polêmico julgamento, houvesse rejeitado o pedido de habeas corpus da defesa de Lula, a ficha de que o ex-presidente da República poderia ser preso a qualquer momento ainda não havia caído — nem para seus aliados nem para seus adversários. As atenções ainda estavam voltadas para o STF, onde os advogados criminalistas Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, Cláudio Pereira de Souza Neto e Ademar Borges de Sousa Filho ingressaram ontem com um pedido de liminar para que a Corte somente permita a prisão após condenação no Superior Tribunal de Justiça (STJ), terceira instância do Judiciário.
Relator da ação, o ministro Marco Aurélio disse ontem que pode levar o caso para decisão dos 11 ministros “em mesa”, isto é, sem necessidade de que a presidente da Corte, Cármen Lúcia, marque uma data previamente. “De início, eu sou avesso à atuação individual”, disse. A decisão de Moro, porém, também pegou de surpresa o ministro e os advogados de Lula, que estavam trabalhando com o prazo de 10 de abril para apresentar um “embargo dos embargos” no TRF-4 e protelar a prisão. O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, em nota, disse que a “expedição de mandado de prisão nesta data contraria decisão proferida pelo próprio TRF-4 no dia 24/01, que condicionou a providência — incompatível com a garantia da presunção da inocência — ao exaurimento dos recursos possíveis de serem apresentados para aquele tribunal, o que ainda não ocorreu”.
Ontem, porém, o TRF-4 encaminhou ofício a Moro autorizando a execução da pena. A defesa de Lula ainda pode apresentar um último recurso ao TRF-4, que Moro desconsiderou. “Hipotéticos embargos de declaração de embargos de declaração constituem apenas uma patologia protelatória e que deveria ser eliminada do mundo jurídico”, justificou. Segundo Moro, “embargos de declaração não alteram julgados, com o que as condenações não são passíveis de alteração na segunda instância.”
Resistência
O ex-presidente estava na sede do Instituto Lula quando soube da decisão. Rumou para o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, transformado num búnquer petista. Estavam lá reunidos a ex-presidente Dilma Rousseff, o deputado Paulo Pimenta (SP), o senador Lindbergh Farias (RJ), o ex-prefeito de São Bernardo Luiz Marinho, os governadores Camilo Santana (Ceará) e Wellington Dias (Piauí), Guilherme Boulos, líder do MTST e candidato a presidente do PSol, e Wagner Santana, presidente do sindicato. Lula chegou por volta das 19h à sede do sindicato. A senadora Gleisi Hoffmann (SC), presidente do PT, falou em nome do partido: “Consideramos uma prisão política. É uma prisão que vai expor o Brasil ao mundo. Viraremos uma republiqueta de bananas.”
A notícia da ordem de prisão teve realmente repercussão mundial, isso animou os militantes e dirigentes petistas. A primeira reação da cúpula foi não aceitar a prisão. O próprio presidente Lula, na linha de confrontação com Moro, manifestou a intenção de não se apresentar em Curitiba. A predisposição de Lula é aguardar a execução da prisão pela Polícia Federal em São Bernardo. Liderada pela CUT, uma grande concentração está sendo convocada pelas centrais sindicais para as 10h de hoje, na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo. Os sindicalistas querem fazer um cordão de isolamento e impedir a prisão de Lula.
Resistir à prisão não costuma ser uma boa ideia, mesmo quando o gesto é revestido de uma narrativa política. Todas as vezes em que resolveu afrontar a Justiça, desde os depoimentos perante o juiz Sérgio Moro, politizando o julgamento, Lula atrapalhou a própria defesa e deu com os burros n’água. Apenas reforça o senso comum de que se considera um cidadão acima das leis e das instituições. Lula está inelegível em razão da Lei da Ficha Limpa, mas insiste na candidatura a presidente da República. Essa reação, porém, é previsível. Há um certo desespero na cúpula petista com o desfecho da estratégia equivocada que adotou no plano eleitoral. A legenda contava com a possibilidade de fazer a pré-campanha com Lula em caravana pelo país, agora terá que antecipar a escolha de um candidato que o substitua na urna eletrônica.
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Luiz Carlos Azedo: A rosa e a náusea
Lula está inelegível, todas as tentativas de desmoralizar o juiz federal Sérgio Moro fracassaram. Esse é um sinal de que nenhum político enrolado na Operação Lava-Jato estará acima das leis
“Um inseto cava / Cava sem alarme / Perfurando a terra / Sem achar escape / Que fazer, exausto / Em país bloqueado / Enlace de noite / Raiz e minério? / Eis que o labirinto / (oh razão, mistério) / Presto se desata: / Em verde, sozinha / Antieuclidiana / uma orquídea forma-se.” Esse poema de Carlos Drummond de Andrade se chama Áporo, faz parte da coletânea de poemas A Rosa do Povo, publicada em 1945. São poesias marcadas pela II Guerra Mundial e o Estado Novo, mas que transcendem àquele momento e ao lirismo social da época.
Na Rosa do Povo, o indivíduo aparece fragmentado, perturbado por seus dilemas pessoais, mas engajado nas questões sociais. Drummond também brinca com as palavras, pois áporo, que denomina um inseto, também é usado na filosofia e na matemática como um problema sem solução, uma espécie de beco sem saída. É uma espécie de continuação de outro poema, intitulado a Flor e a náusea: “Não, o tempo não chegou de completa justiça / O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera / O tempo pobre, o poeta pobre / Fundem-se no mesmo impasse / Em vão me tento explicar, os muros são surdos / Sob a pele das palavras há cifras e códigos / O sol consola os doentes e não os renova / As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase / Uma flor nasceu na rua!”
O voto da ministra Rosa Weber no julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi como a flor que nasceu no asfalto. Todas as pressões políticas sobre o Supremo Tribunal Federal, desde a Páscoa, convergiram para ela, cuja posição parece uma esquizofrenia jurídica para o cidadão comum. A ministra é a favor do princípio de que a prisão deve obedecer ao chamado “transitado em julgado” nas quatro instâncias do Judiciário, porém, como existe uma jurisprudência determinando a execução imediata da pena após a condenação em segunda instância, desde 2016 (quando se firmou esse entendimento na Corte), tem rejeitado todos os habeas corpus nesses casos, fiel ao decidido pela maioria dos seus colegas. Assim, recusou o habeas corpus de Lula. Não aceitou a tese de que a decisão era de repercussão geral, ou seja, que discutia-se o princípio e não o caso específico, tese também rechaçada em plenário pela presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia.
Foi um banho de água fria nos ministros liderados por Gilmar Mendes (que mudou seu posicionamento anterior), que esperavam a formação de uma nova maioria, contra a prisão de Lula, condenado a 12 anos e 1 mês de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com execução imediata da pena. Rosa Weber rechaçou a tese da defesa de que o Superior Tribunal de Justiça havia errado ao indeferir o pedido. Seguiu os votos dos ministros Edson Fachin, o relator, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e foi acompanhada por Luiz Lux, todos favoráveis à rejeição do habeas corpus. Gilmar Mendes havia proposto uma solução “intermediária”: a execução da pena se desse após condenação em terceira instância, ou seja, pelo STJ.
Lava-Jato
O ministro Dias Toffoli insistiu na tese de que a decisão deveria ter repercussão geral, mas já era voto vencido no julgamento; de igual maneira, Ricardo Lewandowski. Faltavam ainda votar os ministros Marco Aurélio e Celso de Mello, o decano da corte, ambos favoráveis ao habeas corpus. Havia hipótese de um pedido de vista, que interromperia novamente o julgamento, como tentavam articular os advogados de defesa, entre eles o ex-presidente da própria Corte Sepúlveda Pertence, o que não se concretizou. Ambos votaram a favor do habeas corpus. A tese de Toffoli era a mesma de Gilmar Mendes. Trocando em miúdos, a decisão da maioria do tribunal estava dependendo apenas do voto da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo, que a defesa tentou embargar, sem sucesso. Cármen votou contra. Agora, a prisão de Lula é apenas uma questão de tempo. Sua defesa deve apresentar um novo recurso ao TRF-4. Somente após a rejeição desse recurso, o juiz federal Sérgio Moro, que condenou Lula na primeira instância da Justiça Federal, comunicada a decisão, poderá mandar a Polícia Federal prender o ex-presidente.
Lula está inelegível, todas as tentativas de desmoralizar o juiz federal Sérgio Moro fracassaram. Esse é um sinal de que nenhum político enrolado na Operação Lava-Jato estará acima das leis. “Façam completo silêncio, paralisem os negócios / Garanto que uma flor nasceu / Sua cor não se percebe / Suas pétalas não se abrem / Seu nome não está nos livros / É feia. Mas é realmente uma flor / Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde / E lentamente passo a mão nessa forma insegura / Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se / Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico / É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio”.
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