Lava Jato
Bernardo Mello Franco: Rio, o estado a que chegamos
A Lava-Jato pôs um ponto final no ciclo de poder e corrupção do PMDB fluminense. Neste período, o estado quebrou e quatro governadores foram para a cadeia
A prisão de Luiz Fernando Pezão não é uma surpresa para quem acompanha a Lava-Jato no Rio de Janeiro. O governador já havia sido acusado de receber propina por diversos delatores do esquema que saqueou o estado. A novidade está no fato de ele ir para a cadeia antes do fim do mandato.
Pezão esperava ter mais um mês de tranquilidade até passar o cargo ao governador eleito Wilson Witzel. Até janeiro, contava com a proteção do foro privilegiado no Superior Tribunal de Justiça.
O sucessor de Sérgio Cabral tentava escapar do mesmo destino do padrinho político, preso no fim de 2016. A blindagem resistiu por dois anos e 12 dias. Neste período, a crise do estado se agravou e ele conquistou o título de governador mais impopular do Brasil.
Com os cofres raspados, o Rio passou a atrasar salários de servidores e aposentados. A falta de verbas fechou leitos de hospitais e deixou carros da polícia sem gasolina. A Uerj, umas das principais universidades públicas do país, ficou quase seis meses parada.
Pezão foi esvaziado de vez no início deste ano, quando o governo federal decretou a intervenção na segurança pública. Desde então, contava os dias para deixar o poder. Seu principal desafio era continuar solto.
O governador insistia que a corrupção não foi a causado colapso financeiro do Rio. Atribuía todos os problemas à quedada arrecadação e à crise da Petrobras. Em entrevistas, ele se dizia amargurado com o que chamava de “vida cruel” dos políticos. Também demonstrava solidariedade com os amigos presos.
No mês passado, Pezão disse ao jornal “O Estado de S. Paulo” que queria abraçar Cabral na cadeia. Não vai realizar o desejo agora porque foi levado para o presídio da PM em Niterói, a 50 quilômetros de Bangu.
A Operação Boca de Lobo põe um ponto final no ciclo de poder do PMDB fluminense. Nos últimos tempos, a população assistiu ao ocaso dos personagens mais poderosos deste período. Foram em cana quatro governadores, três presidentes da Assembleia Legislativa e um procurador-geral. Atualizando a frase famosa do Barão de Itararé, o Estado do Rio é o estado a que chegamos.
Luiz Carlos Azedo: Aventuras da Lava-Jato
“O indulto de Natal já é jogo jogado. Revela que a maioria no Supremo que pode revogar a jurisprudência das prisões em regime fechado após condenação em segunda instância”
O principal eixo das eleições de 2018 foi a Operação Lava-jato, que sepultou as pretensões de muitos políticos tradicionais e alavancou a vitória do presidente eleito, Jair Bolsonaro, além da eleição de governadores, senadores e deputados que surfaram a onda de ojeriza dos eleitores ao establishment político. A prisão do governador Luiz Fernando Pezão (MDB), na manhã de ontem, no Rio, por determinação do ministro Félix Fischer, a pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, é uma demonstração de que a Lava-Jato está revigorada e uma nova ofensiva do Ministério Público Federal está em curso para punir os políticos corruptos.
Aos 63 anos, Pezão foi preso durante a Operação Boca de Lobo, após delação premiada de Carlos Miranda, operador de Cabral, que detalhou o pagamento de mesada de R$ 150 mil para o governador fluminense na época em que ele era vice. Haveria também pagamento de 13º de propina e ainda dois bônus de R$ 1 milhão como prêmio. Raquel Dodge acusou Pezão de ter dado continuidade ao esquema de corrupção que levou à prisão o ex-governador Sérgio Cabral, além de montar um sistema próprio de arrecadação. O vice-governador Francisco Dornelles assumiu o comando da administração estadual e deu uma entrevista na qual disse que a prisão de Pezão foi uma violência.
Os quatro últimos governadores eleitos do Rio de Janeiro já foram presos, mas somente Pezão o foi em pleno exercício do mandato, caso semelhante ao do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda. Sérgio Cabral, Anthony Garotinho e Rosinha Matheus foram presos quando já não eram mais governadores. Dornelles permanecerá no cargo até o fim do ano. O futuro governador Wilson Witzel, que começará sua gestão em 1º de janeiro de 2019, foi eleito na onda de rejeição aos políticos ligados a Cabral, entre os quais o ex-prefeito Eduardo Paes (DEM), que era o favorito na disputa, mas acabou contaminado pelo desgaste dos aliados presos.
Há um verdadeiro pânico no Congresso em relação às investigações ainda em curso, porque muitos políticos que não se elegeram ou ocupam cargos nos governos que estão se encerrando perderão o foro privilegiado. A prisão de Pezão sinaliza que os desdobramentos da Operação Lava-Jato nos estados ainda não se encerraram.
Prisões
É nesse contexto que o julgamento do indulto de Natal de 2017 concedido pelo presidente Michel Temer, em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), passou a ser o centro das atenções em relação à Lava-Jato. A maioria dos ministros, ontem, votou pela manutenção do decreto de indulto, mas um pedido de vista do ministro Luiz Fux, que pleiteou mais tempo para análise do processo, adiou a decisão.
Editado em outubro do ano passado, o decreto estabeleceu que poderia receber o perdão quem cumpriu 1/5 da pena em caso de crimes sem violência ou grave ameaça. Para a Procuradoria-Geral da República, o decreto beneficia presos por crimes de colarinho-branco, como corrupção e peculato. Com a maioria (6 votos a 2) favorável à manutenção do decreto, o ministro Gilmar Mendes propôs a revogação da liminar do ministro Luís Barroso, que sustou o decreto, para permitir a aplicação do indulto.
O presidente do STF, Dias Toffoli, pôs em votação a proposta de revogação da liminar, mas, quando o placar estava 5 a 4 a favor da revogação, o próprio Toffoli pediu vista e suspendeu o julgamento. É que o ministro Ricardo Lewandowski, que votou com a maioria a favor do indulto, estava ausente e, nesse caso, o voto de Toffoli poderia levar a um empate. Votaram pela validação do indulto os ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Celso de Mello. Somente Barroso, ministro-relator, e Fachin votaram pela derrubada de parte do decreto.
Embora não tenha sido formalizada, a decisão sinaliza uma tendência do STF a mitigar os efeitos da Lava-Jato, pois o indulto de Natal de 2018 teria como referência a decisão e, segundo os procuradores, poderia beneficiar mais de 20 condenados de colarinho-branco que cumprem pena em regime fechado.
Entretanto, a decisão do STF sobre o indulto de Natal já é jogo jogado. Revela uma maioria que pode revogar a jurisprudência das prisões em regime fechado após condenação em segunda instância, quando o assunto for posto em pauta novamente. Essa polêmica voltará ao Supremo no próximo dia 4, quando será julgado o pedido de habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado no caso do tríplex do Guarujá. Ontem, por decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sediado em Porto Alegre, o ex-ministro Antônio Palocci recebeu o benefício da prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica, em razão de sua “delação premiada”, na qual denuncia Lula.
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Luiz Carlos Azedo: Blindagem dos negócios
“Militares passaram a controlar as áreas mais suscetíveis a escândalos de corrupção. São setores que sempre foram muito cobiçados por partidos e lobistas”
Depois da blindagem da equipe econômica, que foi escalada pelo futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, as nomeações recém-anunciadas pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, sinalizam uma blindagem para o programa de obras, privatizações e concessões do governo, que deverá ficar a cargo do futuro ministro Santos Cruz, da Secretaria de Governo. A escolha do novo ministro de Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, que responderá pelas áreas de Transportes, Portos e Aviação Civil, vai na mesma direção.
“Vamos intensificar as parcerias em rodovias, ferrovias e aeroportos, tal qual está sendo feito hoje. Isso vai ser intensificado. A ideia é trazer o setor privado para a área de infraestrutura”, disse o futuro ministro, que dirigiu o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Tarcísio de Freitas já acompanha o leilão dos próximos 12 aeroportos, cujo edital foi aprovado, ontem, pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), e da Ferrovia Norte-Sul.
Bolsonaro anunciou que somente iniciará obras quando houver recursos no orçamento para concluí-las, mas pretende dar continuidade àquelas que já foram iniciadas e estão paralisadas: “Não podemos abandonar isso, porque custaria muito caro para nós”, disse. Consultor legislativo da Câmara dos Deputados, Tarcísio de Freitas é engenheiro civil formado pelo Instituto Militar de Engenharia, com pós-graduação em gerenciamento de projetos e engenharia de transportes. Ex-capitão do Exército, foi chefe da seção técnica da Companhia de Engenharia do Brasil na Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti.
Com as novas nomeações, os generais que integram a cúpula do governo passaram a controlar as áreas mais suscetíveis a escândalos de corrupção, por envolverem grandes contratos e concessões com empresas privadas. São setores que sempre foram muito cobiçados por partidos e lobistas, que passarão a ser gerenciados pelos militares. Os interesses envolvidos são os mesmos; entretanto, mudaram os gestores e o ambiente, em razão da Operação Lava-Jato.
Indulto de Natal
O procurador Deltan Dallagnol denunciou, ontem, no Twitter, uma “intensa articulação” nos bastidores do Supremo Tribunal Federal (STF) para liberar o indulto de 2017, concedido pelo presidente Michel Temer, que “perdoava 80% da pena dos corruptos”. Segundo o procurador, se isso ocorrer, Temer poderá fazer a mesma coisa no Natal deste ano. O indulto é um perdão de pena e costuma ser concedido todos os anos em período próximo ao Natal, atribuição do presidente da República.
O julgamento deve continuar hoje, com o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, que concedeu liminar (decisão provisória), em março, limitando a aplicação do indulto e aumentou o período de cumprimento para, pelo menos, um terço da pena. Barroso permitiu o indulto somente para quem foi condenado a mais de oito anos de prisão e vetou a concessão para crimes de colarinho-branco e para quem tem multa pendente. O governo recorreu, alegando que Barroso invadiu a “competência exclusiva” do presidente da República ao alterar as regras do indulto fixadas por Temer. O julgamento no STF se limita à validade do decreto editado em 2017.
Um parecer do criminalista Nabor Bulhões, da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil e advogado de Temer na Lava-Jato, defende a constitucionalidade do decreto de indulto de Natal do ano passado, que foi suspenso por liminar do Supremo Tribunal Federal a pedido da Procuradoria-Geral da República. Segundo o parecer, não há inconstitucionalidade na inclusão dos crimes relacionados à corrupção no perdão presidencial, e a intervenção do Judiciário pode representar uma afronta ao princípio da separação de poderes.
Ao editar o decreto, Temer modificou algumas regras e, na prática, reduziu o tempo de cumprimento de pena pelos condenados, o que gerou críticas da Transparência Internacional e da força-tarefa da Operação Lava-Jato. O artigo 84 da Constituição, XII, estabelece que “compete privativamente ao Presidente da República conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos por lei”.
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Luiz Carlos Azedo: O Haiti é aqui
“A manutenção da Secretaria de Governo com status de ministério e a atual configuração esvaziará a Casa Civil, principalmente a relação política com o Congresso e com os movimentos sociais”
A indicação do general de divisão Carlos Alberto dos Santos Cruz para comandar a Secretaria de Governo consolidou na cúpula do governo um grupo de ex-integrantes da missão de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti, formado ainda pelo general Augusto Heleno, futuro chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e pelo general Fernando Azevedo e Silva, que será o ministro da Defesa. Sua missão mais importante, porém, foi comandar a missão de paz na República Democrática do Congo, integrada por 23,7 mil militares de 20 países, de 2013 a 2015.
Santos Cruz foi o chefe da Secretaria Nacional de Segurança Pública durante parte da gestão do presidente Michel Temer, ostentando ainda no currículo uma passagem por Moscou, como adido militar, em 2001 e 2002, e atuação como conselheiro do Banco Mundial para a elaboração do Relatório de Desenvolvimento Mundial 2011 e do grupo da ONU para a revisão do reembolso aos países que contribuem com tropas em missões de paz. Sua indicação surpreendeu, pois a Secretaria de Governo inicialmente seria incorporada à Casa Civil, sob comando do ministro Ônix Lorenzoni.
Hoje, a Secretaria de Governo da Presidência reúne as subsecretarias de Assuntos Parlamentares, Assuntos Federativos e Juventude, além da Secretaria Nacional de Articulação Social. A manutenção da pasta com status de ministério e essa configuração esvaziará a Casa Civil, principalmente a relação política com o Congresso e com os movimentos sociais. Além disso, fortalece o grupo de generais que forma o estado-maior do governo Bolsonaro, integrado ainda pelo vice-presidente Hamilton Mourão, que não passou pelo Haiti, mas atuou na Missão de Paz em Angola e foi adido militar na Embaixada do Brasil na Venezuela.
Outro militar deverá comandar o Ministério da Infraestrutura, para o qual está cotado o general Joaquim Brandão, atual chefe de gabinete do ministro Sérgio Etchegoyen, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do governo Michel Temer. O tenente-coronel da Aeronáutica Marcos Pontes, ex-astronauta, no Ministério de Ciência e Tecnologia, completa o naipe de militares que ocupam posições no primeiro escalão. Até agora, ninguém da Marinha foi nomeado para um cargo de destaque no governo.
Segurança
Ontem, o futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, anunciou a criação de uma Secretaria de Operações Policiais Integradas, que ficará a cargo do delegado da Polícia Federal Rosalvo Franco, ex-superintendente da PF no Paraná, que atuou na Operação Lava-Jato. “A ideia da secretaria é coordenar operações policiais a nível nacional. Hoje nós temos muitos grupos criminosos que transcendem as fronteiras estaduais, e essa ação precisa muitas vezes de coordenação a nível nacional”, explicou. Atualmente, esse tipo de operação vem sendo realizada pelo Ministério da Segurança Pública, que será extinto.
Moro também escolheu o delegado da Polícia Federal (PF) Fabiano Bordignon para o comando do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), também com atuação no Paraná. Além de chefiar a PF em Foz do Iguaçu, Borgidnon foi diretor de penitenciária federal de Catanduvas (PR). Moro teve contato com o delegado quando era juiz corregedor da penitenciária. “É uma função estratégica, nós todos sabemos que os presídios no Brasil constituem uma espécie de problema devido à questão de superlotação e fragilidade de certos presídios”, declarou Moro.
A indicação de procuradores e delegados federais para funções estratégicas no Ministério da Justiça, porém, já está gerando insatisfação entre os integrantes da chamada “bancada da bala” no Congresso, principalmente entre os parlamentares que são policiais militares e estão sendo pressionados pelos coronéis da ativa. O maior foco de insatisfação está em São Paulo, corporação à qual pertence o deputado e recém-eleito senador Major Olímpio.
Diretor da Associação dos Oficiais da Polícia Militar do Estado de São Paulo, o parlamentar é uma estrela em ascensão na política paulista e já exerce grande liderança entre os parlamentares do PSL, partido de Bolsonaro, porque é um dos mais experientes da bancada. Foi deputado estadual e assumiu seu primeiro mandato como deputado federal após ser eleito no pleito de 2014, com 179.196 votos. Agora, em 2018, foi eleito senador por São Paulo, com 9.039.717 votos.
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Luiz Carlos Azedo: O enxugamento da Petrobras
Para Castello Branco, futuro presidente da estatal, a empresa precisa intensificar a exploração e a extração de petróleo, porque, em algumas décadas, o combustível “perderá relevância”
A indicação do economista Roberto Castello Branco para a presidência da Petrobras, confirmada ontem pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, consolidou o poder do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, na equipe econômica e sinaliza que nenhuma empresa estatal está a salvo de enxugamento e fora do programa de privatizações. “É uma indicação do Paulo Guedes. Eu estou dando carta branca a ele. Tudo que é envolvido com economia é ele que está escalando o time. Eu só, obviamente, e ele sabe disso, estamos cobrando produtividade. Enxugar a máquina e buscar, realmente, fazê-la funcionar para o bem-estar da nossa população”, disse Bolsonaro.
O futuro presidente da estatal, que é formado em Chicago, como Guedes, já anunciou que a empresa vai focar sua atuação nas áreas de exploração e extração de petróleo. Para Castello Branco, a Petrobras precisa intensificar a exploração e a extração de petróleo, porque, em algumas décadas, o combustível “perderá relevância”, ou seja, será substituído por outras fontes de energia. Também defende que a empresa, que praticamente monopoliza o refino, venda suas refinarias. Não adiantou se pretende privatizar a BR Distribuidora, mas esse é o espírito da coisa. O atual presidente da empresa, Ivan Monteiro, que também estava cotado para presidir a Petrobras, talvez seja indicado para comandar o Banco do Brasil.
A indicação de Castello Branco encerrou uma queda de braços entre Guedes e o grupo de militares encabeçado pelo vice-presidente eleito, Hamilton Mourão, e o general Augusto Heleno, futuro ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), pelo controle da estatal. Ícone do desenvolvimentismo brasileiro e fruto da maior campanha nacionalista da história do país, “O petróleo é nosso”, a Petrobras sempre foi uma linha divisória do nosso patriotismo, explorada em sucessivas campanhas eleitorais. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, alavancou sua campanha à reeleição contra o tucano Geraldo Alckmin, acusando-o de pretender privatizar a estatal e o Banco do Brasil.
A Petrobras, porém, foi alvo do maior escândalo de corrupção investigado pela Operação Lava-Lato, o que levou à prisão diversos executivos da empresa. Ontem mesmo, a juíza substituta Gabriela Hardt condenou o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque em uma ação da Lava-Jato pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e dissimulação de produto de crimes. Duque foi condenado a três anos e quatro meses apenas, e não a 6 anos e 8 meses, porque colaborou com a Justiça. Segundo as investigações, era o principal quadro ligado ao PT na operação de caixa dois da Petrobras. A juiza Hardt é a mesma que interrogou o ex-presidente Lula na semana passada.
Também foram condenados João Bernardi Filho e Julio Gerin de Almeida Camargo, a 5 anos e 6 meses de reclusão, mas ambos têm acordo de delação premiada e cumprem penas acordadas com o Ministério Público. Renato Duque e João Bernardi Filho participaram de um esquema de corrupção e lavagem de dinheiro para favorecer a empresa italiana Saipem na contratação de obras da Petrobras. Bernardi, que era representante da Saipem, ofereceu e prometeu o pagamento, em 2011, de vantagem indevida a Renato Duque em troca da obtenção pela Saipem de um contrato para a instalação do gasoduto submarino de interligação dos campos de Lula e Cernambi com a Petrobras.
Haddad
A propósito, ontem, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) virou réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, após o juiz Leonardo Barreiros, da 5ª Vara Criminal da Barra Funda, aceitar denúncia do Ministério Público com base em delações feitas na Operação Lava-Jato. Além de Haddad, cinco pessoas viraram rés na ação, incluindo o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e o doleiro Alberto Youssef. De acordo com a denúncia, entre abril e maio de 2013, Ricardo Ribeiro Pessoa, presidente da empreiteira UTC Engenharia S/A, recebeu um pedido de Vaccari da quantia de R$ 3 milhões para pagamento de uma dívida de campanha de Haddad nas eleições de 2012.
O ex-prefeito de São Paulo e candidato derrotado do PT à Presidência da República nega as acusações. Segundo a denúncia, o valor serviria para o pagamento de uma dívida de campanha do então prefeito de São Paulo Fernando Haddad com gráfica do ex-deputado estadual do PT Francisco Carlos de Souza, o Chicão. João Vaccari Neto, segundo a acusação, representava e falava em nome de Haddad. A denúncia é uma pedra no sapato do petista, que obteve 47 milhões de votos (44% do total) no segundo turno das eleições presidenciais. Com Lula preso, Haddad seria o principal líder da oposição a Bolsonaro, mas sua transformação em réu, sem direito a foro especial, limitará sua capacidade de atuação.
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Merval Pereira: #Elanão
O empoderamento feminino não anda fazendo bem aos machos-alfa dessa parte de baixo do Equador
O empoderamento feminino não anda fazendo bem aos machos-alfa dessa parte de baixo do Equador, onde não existe pecado, segundo relato do holandês Barlaeus no século XVII. Nos últimos dias tivemos exemplos, uns menos, outros mais degradantes desse comportamento machista, vindos de personalidades que supostamente fazem parte de nossa elite.
Desde o famoso apresentador de televisão que assediou a cantora ao vivo e a cores, passando pelo ex-presidente da República que sugeriu que a Juíza que o interrogava, por ser mulher, deveria entender mais de cozinha do que ele. Sem contar com o presidente eleito do maior país da América do Sul, que não cansa de parecer homofóbico e misógino.
Estamos falando do Brasil dos tempos atuais, em que a campanha #Mexeu com ela mexeu comigo, decorrência da americana #meToo, que alcançou centenas de celebridades e subcelebridades hollywoodianas por assédio sexual ou moral, conseguiu tirar de cena um famoso ator global, mas não impedir a repetição de cenas de machismo explícito.
A semana foi marcada pela cena constrangedora de Silvio Santos declarando-se “excitado” com a roupa de cantora Claudia Leite, na frente de milhões de pessoas e da própria mulher e filhas na platéia de seu programa de auditório. Assédio duplo, sexual e moral, já que ele é o dono do programa e da televisão.
As reações vieram, até mesmo da cantora que, se no dia o máximo que conseguiu dizer é que seu namorado não ia gostar, no seguinte tomou coragem para postar um protesto no Facebook. O comportamento machista ou homofóbico continuou durante os dias seguintes com líderes políticos de peso, o ex-presidente Lula e o presidente eleito Jair Bolsonaro.
Ao ser interrogado pela Juíza Gabriela Hardt, que ficou no lugar de Sérgio Moro, sobre as obras do sítio de Atibaia e a instalação de uma cozinha moderna, exatamente igual à do apartamento triplex pelo qual já foi condenado, feitas por empreiteiras para, segundo a acusação, pagar favores recebidos do ex-presidente, Lula tentou constranger a Juíza insinuando que, como homem, não entendia nada de cozinha, assim como o suposto marido da Juíza. Gabriela Hardt foi seca: “Sou divorciada e não falo de cozinha”.
Lugar de mulher é na cozinha, parecia querer dizer Lula, em mais uma das muitas vezes em que demonstrou ser um machista da velha estirpe. Como quando convocou “as mulheres de grelo duro” do PT para um protesto. Ou quando disse que sua assessora Clara Ant, “dormindo sozinha”, ao ver vários homens chegarem em sua casa de madrugada, “pensou que era um presente de Deus”. Eram policiais.
O presidente eleito Bolsonaro também voltou a repetir piadas homofóbicas, quando disse que o escolhido para o Ministério das Relações Exteriores poderia ser homem ou mulher, mas também um gay. E perguntou para o repórter que fizera a pergunta: “Você aceitaria?”.
Lula também já foi flagrado, na gravação de programa de propaganda eleitoral, comentando com um candidato de Pelotas que a região era “polo exportador de viados”. São piadas de mau gosto, comuns em ambientes masculinos como mesas de bar ou na caserna, próprias do espírito machista que predomina, não apenas por aqui.
Bolsonaro já disse que a deputada Maria do Rosário não merecia ser estuprada por ser “feia”. E seu espelho, o presidente Donald Trump, é especialista em tentar desqualificar as mulheres que o incomodam, desde a atriz pornô que diz ter tido um caso com ele, até a assessora que pediu demissão.
Ele as chamou de “cara de cachorra”, de “chorona, vagabunda e louca”, e disse a uma repórter na Casa Branca que ela “não sabia pensar”. É surpreendente que seja esse o homem que vai, segundo o futuro chanceler brasileiro, salvar o Ocidente da decadência moral, resgatando os valores cristãos.
Nos Estados Unidos, o presidente Trump abusa dessas grosserias, mas é constantemente confrontado por movimentos feministas. O mesmo se dá com Jair Bolsonaro, que provocou até passeatas organizada por feministas com o mote #elenão. O ex-presidente Lula, no entanto, continua passando incólume por essas e outras grosserias. É por isso que, depois de ter tentado sem sucesso constranger a Juíza Gabriela Hardt, surgiu na internet o hashtag ironicamente atribuído a petistas temerosos: #Elanão
El País: Após críticas, Sergio Moro pede exoneração e deixará a magistratura
Juiz estrela da Lava Jato entregou seu pedido de exoneração no TRF-4. A partir de segunda, ele se dedicará exclusivamente à transição do Governo Bolsonaro
Por Afonso Benites, do El País
A partir da próxima segunda-feira, Sergio Moro, o juiz símbolo da operação Lava Jato, deixará a magistratura. Ele entregou nesta sexta seu pedido de exoneração ao desembargador Thompson Flores, presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. A partir de janeiro, Moro será ministro da Justiça e Segurança Pública no Governo do ultradireitista Jair Bolsonaro (PSL). A exoneração de Moro foi assinada pelo desembargador horas depois de entregue.
O futuro ministro estava afastado da 13ª Vara Federal de Curitiba desde o início deste mês, quando aceitou o convite do presidente eleito para ingressar em seu Governo. Em princípio, ele gozaria de férias até janeiro e só depois pediria seu desligamento do cargo, que ocupa há 22 anos.
Mesmo estando em período de férias, Moro participou das reuniões da equipe de transição de Bolsonaro, em Brasília, na semana passada. Como não estava desligado de sua função, recebeu críticas por estar atuando concomitantemente em dois poderes, Executivo e Judiciário. “Houve quem reclamasse que eu, mesmo em férias, afastado da jurisdição e sem assumir cargo Executivo, não poderia sequer participar do planejamento de ações do futuro governo”, afirmou Moro. Ele chamou essas queixas de “controvérsias artificiais”.
Na justificativa de seu pedido de exoneração, o ainda juiz justificou que não havia solicitado a demissão porque gostaria de manter a “cobertura previdenciária” de seus familiares até que pudesse assumir o ministério. Na prática, ele queria que seus dependentes recebessem pensão caso ele viesse a sofrer algum acidente ou morrer antes de assumir o ministério. No documento, ele cita que é alvo de ameaças.
Em 22 anos de carreira, Moro se destacou no combate a crimes financeiros. Primeiro, entre 2003 e 2007 quando tocou o caso Banestado. Depois, a partir de 2013, quando foi o responsável por julgar as ações em primeira instância da operação Lava Jato. Era a assinatura dele que constava das condenações de uma série de políticos, doleiros e empreiteiros envolvidos no esquema de desvio de recursos públicos.
Entre as estrelas retiradas do cenário político por Moro estão o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT) e o ex-deputado federal Eduardo Cunha (MDB). Todos condenados por ele nos últimos anos. Foi por conta de uma decisão do juiz que Lula foi impedido de concorrer à presidência da República neste ano contra Bolsonaro.
No Ministério da Justiça, caberá a Moro debelar as suspeitas de que ele teve uma atuação política enquanto era juiz. Nos últimos dias, ele começou a fazer um rascunho da equipe que o assessorará na pasta. Entre os cotados para ocuparem cargos especiais estão três delegados que atuaram na Lava Jato: Érika Marena, Luciano Flores e Igor de Paula.
Com a saída de Moro da Justiça Federal, a magistrada Gabriela Hardt, que é a substituta dele, assume interinamente suas funções. Nas próximas semanas, deve ser aberto um concurso interno de remoção para a 13ª Vara Federal. Apenas os magistrados que atuam na 4ª região (nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná) participam da disputa. Só depois da análise dos documentos dos inscritos é que o novo titular será definido. Pra definir o responsável, primeiro leva-se em conta o tempo no cargo de juiz federal. Depois, a antiguidade no exercício no cargo de juiz substituto na 4ª Região. Por último, o critério de classificação no concurso público.
Vinicius Torres Freire: Ministro terá poder de investigação do governo e informação sobre crimes financeiros
O ministério que Sergio Moro deve assumir não seria mais do que a velha pasta da Justiça não fosse a incorporação de duas instituições importantes: a CGU (Controladoria-Geral da União) e o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
Com a CGU, Moro passaria a comandar uma espécie de polícia administrativa e a inspetoria do governo.
Com o Coaf, terá algum controle sobre uma agência de inteligência que recebe, analisa e encaminha ao Ministério Público e à polícia denúncias de lavagem de dinheiro e uso de recursos para fins criminosos, terrorismo inclusive.
Desde que foi criada, em 2003, a CGU teve ligação direta com o presidente da República —ora é um ministério. O Coaf é filho da lei de lavagem de dinheiro, de 1998, desde sempre abrigado no Ministério da Fazenda.
No mais, a Justiça de Moro vai reabsorver as polícias federais, deslocadas neste ano para o breve Ministério da Segurança.
Moro não será o xerife absoluto de CGU e Coaf, regulados por leis até bem estritas. Mas instituições podem ter sua atuação reforçada, ampliada ou até laceada, a depender de quem as comande e componha.
Além do mais, CGU e Coaf devem mudar, até porque serão necessárias leis para transferi-las para a Justiça e redefinir seus comandantes, pelo menos.
Não foi possível confirmar se Moro reivindicou a CGU, mas próximos de Jair Bolsonaro dizem que o futuro ministro pediu para ficar com o Coaf. Lê-se por aí que Moro levará apenas "parte do Coaf", o que ora não faz sentido.
A CGU avalia, audita, controla e pode investigar procedimentos, programas e servidores do governo inteiro.
É uma espécie de promotoria de defesa contra ineficiências, corrupção e outras irregularidades no Executivo. Agora, será subordinada a um ministro.
Quem vai comandá-la, com qual autonomia? Seja como for, um órgão de controle supraministerial estará sob Moro —como inspetor-geral, digamos, terá mais poder.
A lei de lavagem de dinheiro de 1998 obriga pessoas e instituições a prestar informações de transações suspeitas.
A lista de obrigados é aqui impublicável, de tão grande, mas o setor financeiro, seus órgãos de fiscalização e todos os envolvidos em transações de bens e serviços de grande valor estão obrigados a registrar ou notificar negócios a partir de certa monta ou suspeitos. Incluem-se aí transações financeiras, com imóveis, joias, arte e outros bens de luxo, produtos do agronegócio ou passe de atletas.
Tais informações devem ser enviadas ao Coaf, que pode requisitar dados cadastrais de pessoas, analisa o caso e reporta possíveis rolos ao Ministério Público ou à polícia. Órgãos muito parecidos existem em vários países civilizados. Gente graúda do Ministério Público diz que o Coaf funciona de modo razoável.
O Coaf não tem poder de investigação autônomo e no máximo aplica penas administrativas. É comandado por 11 conselheiros, funcionários de carreira indicados por vários ministérios e agências de Estado, com presidente nomeado pelo ministro da Fazenda. Vai mudar, claro. Mas como?
Em sua carreira, Moro trabalhou essencialmente com lavagem de dinheiro. Escreveu um livro sobre o assunto ("Crime de Lavagem de Dinheiro", Saraiva). Quer que as informações do Coaf sejam utilizadas para orientar sistematicamente a polícia e inquéritos.
No mais, sabemos apenas que os poderes e os inimigos de Moro não serão poucos.
Bernardo Mello Franco: Moro será colega de clientes em potencial
Moro descumpriu a promessa de não entrar na política. Agora será colega de figuras com o mesmo perfil da sua clientela em Curitiba
Ao virar ministro de Jair Bolsonaro, Sergio Moro contraria suas próprias palavras como chefe da Lava-Jato. O juiz repetiu diversas vezes, nos últimos anos, que “jamais” aceitaria entrar na política.
“Não existe jamais esse risco”, ele garantiu ao jornal O Estado de S. Paulo, em 2016. “Não seria apropriado da minha parte postular qualquer espécie de cargo político, porque isso poderia, vamos dizer assim, colocar em dúvida a integridade do trabalho que eu fiz até o presente momento”, reforçou à revista Veja, em 2017.
O cargo de ministro da Justiça é político por natureza. Por lá passaram raposas como Nelson Jobim e Renan Calheiros. A pasta também projetou futuros presidentes, como Epitácio Pessoa e Tancredo Neves. Na equipe de Bolsonaro, Moro já é cotado como opção para 2022.
Fãs incondicionais do juiz aplaudiram a mudança de emprego. Não foi uma reação unânime. José Carlos Dias, ministro de FH, considerou a troca “lamentável”. “Mostra um partidarismo, uma posição política que é absolutamente contrária à índole do magistrado”, disse.
Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF, foi além. “Esse tipo de mudança de camisa, tão rapidamente, projeta no inconsciente coletivo (...) uma imagem pouco favorável dos membros do Poder Judiciário”, afirmou.
Na nova função, Moro será colega de políticos com o mesmo perfil de sua clientela em Curitiba. O juiz já disse que a prática de caixa dois é pior que a corrupção. Agora se sentará ao lado de Onyx Lorenzoni, que admitiu ter recebido R$ 100 mil “por fora” da JBS. Ontem o futuro chefe da Casa Civil estava eufórico com o “sim” do juiz.
O presidente eleito também festejou, e com razão. Símbolo dos feitos da Lava-Jato, Moro emprestará prestígio e popularidade ao novo chefe. Num acesso de sinceridade, Bolsonaro reconheceu que a atuação do juiz o “ajudou a crescer politicamente”. Impossível discordar.
A médio prazo, a escolha embute alguns riscos. O que acontecerá se a PF prender aliados importantes do novo governo? O ex-prefeito Cesar Maia lembra outro detalhe que pode virar problema. Ao convidar Moro, o capitão ignorou uma máxima de políticos mais experientes: “Nunca nomeie quem você não pode demitir”.
Bernardo Mello Franco: O juiz e o capitão
Na campanha, o juiz da Lava-Jato tomou três decisões que facilitaram a eleição de Bolsonaro. Agora ele se diz ‘honrado’ com o convite para servir ao governo do capitão
Sergio Moro não disfarça. O juiz da Lava-Jato está animado com o convite para virar ministro de Jair Bolsonaro. Em nota, ele se declarou “honrado com a lembrança” do presidente eleito. Em conversas informais, foi além. Disse que sua presença no governo dissiparia temores em relação ao capitão.
O magistrado foi um personagem chave na corrida presidencial. A seis meses do primeiro turno, ele prendeu o candidato que liderava as pesquisas. Três meses depois, suspendeu as férias para contestar a decisão de um desembargador que mandou soltá-lo.
A liminar era exótica, mas um juiz de primeira instância não tinha poderes para derrubá-la. Moro não se limitou a afrontar a hierarquia judicial. Ainda orientou a polícia a descumprir a ordem que o contrariava.
Na semana da eleição, o juiz voltou a interferir na político. Ele divulgou trechos de uma delação antiga, mas com potencial para atingir um dos lados da disputa. Mais uma vez, o lado que oferecia risco a Bolsonaro.
As três decisões facilitaram a chegada do capitão ao poder. Em todos os casos, os petistas acusaram Moro de parcialidade. Se ele aceitar o convite para servir ao novo regime, ficará muito difícil discordar.
O jurista Wálter Maierovitch, que apoiou o juiz na batalha de liminares, diz que ele cometerá um erro grave se virar ministro de Bolsonaro. “Seria muito estranho e eticamente reprovável. Estamos vivendo uma época de patifarias, mas isso não dá”, critica.
O professor lembra que um ministro da Justiça “não tem autoridade própria”. “Ele é subordinado ao presidente e pode ser demitido com um balançar de cabeça. Como diz a sabedoria portuguesa, não se deve passar de cavalo a burro”, conclui.
Ao anunciar que o novo governo terá 15 ministérios, Onyx Lorenzoni disse que Bolsonaro promoverá um “enxugamento como nunca aconteceu no Brasil”. O deputado se esqueceu de outro presidente que prometeu renovar a política e reduziu a Esplanada a 12 pastas. Chamava-se Fernando Collor.
Merval Pereira: Força à Lava-Jato
Moro está convencido de que sua nomeação não empanaria a atuação na Operação Lava-Jato
Além de uma escolha simbólica, que marca o compromisso, não apenas retórico, do futuro governo Bolsonaro com o combate à corrupção no país, o Ministério da Justiça poderia ser uma etapa para a nomeação do juiz Sergio Moro para o Supremo Tribunal Federal (STF) mais adiante.
Não é usual, embora não haja nada proibindo, que um juiz de primeira instância seja nomeado para o Supremo, mas é comum que o ministro da Justiça o seja. A atuação de Moro no ministério seria uma oportunidade para implementar reformas anticorrupção e anticrime organizado. E poderia servir como anteparo a eventuais excessos.
Convencido de que sua nomeação não empanaria a atuação na Operação Lava-Jato, e que os oposicionistas criticarão de qualquer maneira, como já criticam a operação em si, Moro aguarda um contato oficial para saber se as intenções do presidente eleito Jair Bolsonaro nessa área correspondem ao que pensa.
Moro não acredita que, a partir da nomeação, a tese lulista de que todo o seu trabalho nesses últimos anos foi feito por motivações políticas seja crível para a população. Nada mais natural que um presidente eleito muito por causa do combate à corrupção, e ao apoio à Lava-Jato, convide o símbolo dessa luta para seu ministério.
Em vez de atrapalhar a condução dos processos, Moro poderá ajudar a tornar realidade medidas de combate à corrupção em sintonia com as propostas apresentadas pelos procuradores de Curitiba e ampliadas, a partir da reunião das melhores práticas nacionais e internacionais pela Transparência Internacional e as escolas de Direito da FGV do Rio e São Paulo.
São propostas de reformas legislativa, administrativa e institucional apresentadas ao Congresso, visando a oferecer soluções permanentes para o enfrentamento do crime. Se for confirmado que o governador eleito do Rio, Wilson Witzel, pretende mesmo convidar o procurador aposentado Carlos Fernando Lima para a Secretaria de Justiça no Rio, seria o embrião de um grupo que poderia dar respaldo político às propostas de combate à corrupção gestadas em Curitiba.
Carlos Fernando era um dos coordenadores dos procuradores da Operação Lava-Jato, e um dos que ativamente atuam, através das redes sociais, para disseminar as ideias do grupo e atacar o que considera ameaças de retrocesso na política de combate à corrupção.
Existe a especulação de que esse grupo poderia ser formalizado em um Conselho de Combate à Corrupção sob o comando de Moro no Ministério da Justiça, que também manteria a Polícia Federal, outra corporação fundamental no combate à corrupção dos últimos anos.
Outros estados poderiam seguir o mesmo caminho, e acabaria se formando, mesmo que informalmente, um grupo unido pelas mesmas ideias para combater a corrupção e o crime organizado, formado por servidores públicos com experiência nessa luta. Uma maneira de tornar a operação Lava-Jato irreversível.
Curiosidades
Com relação ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma curiosidade é que, como para ser indicado é necessário “notório saber jurídico e reputação ilibada”, mas não ser advogado ou juiz, houve cinco casos de recusa, como lembra o decano do STF, ministro Celso de Mello, em seu livro “Notas sobre o Supremo Tribunal Federal”, todos no governo de Floriano Peixoto. O mais famoso deles é o do médico Barata Ribeiro, prefeito do Rio entre 1892 e 1893.
Os parlamentares concluíram que Barata Ribeiro não tinha, de acordo com documentos da época, “notório saber jurídico”, requisito fundamental para o cargo. Ele foi ministro do STF por pouco mais de dez meses e barrado na sabatina, que podia ser feita após a posse. Foi vítima da maioria oposicionista que dominava o Senado, que integrara por oito anos, a partir de 1900. Os outros quatro barrados foram os generais Ewerton Quadros e Innocêncio Galvão de Queiroz, e Antônio Sève Navarro e Demosthenes da Silveira Lobo.
Vera Magalhães: Moro dá adeus?
A designação para o Supremo Tribunal Federal é a ambição natural e justa de alguém com a carreira do juiz federal
Quando precisou negar que seria candidato a presidente, diante de inúmeras especulações a respeito, Sérgio Moro foi direto. Disse, em diversas ocasiões, que a política não era um caminho vislumbrado por ele, e que continuaria fazendo seu trabalho de juiz.
Ao agradecer a menção pública a seu nome feita por Jair Bolsonaro, sem que haja sequer um convite oficial para o Ministério da Justiça ou para o Supremo Tribunal Federal, Moro muda radicalmente essa diretriz. Quando admite que analisará qualquer um dos convites, o coordenador da Lava Jato, numa tacada só: 1) encoraja Bolsonaro a fazê-lo oficialmente; 2) deixa antever que pode aceitar o ministério e, dali, esperar placidamente pela aposentadoria de Celso de Mello do STF, em 2020.
Os convites incluídos no mesmo pacotão por Bolsonaro e Moro são de natureza diversa. O Ministério da Justiça é um posto político, não jurídico. Aceitá-lo fará com que Moro deixe não só a Lava Jato, mas sua carreira de juiz. Mais: contribuirá para a narrativa (falsa) do PT de que o juiz agiu com intenção política ao ajudar a desnudar o petrolão e condenar Lula e outros próceres petistas.
Ele precisa disso? Certamente não. Precisa pagar este “pedágio” para ser ministro do Supremo? Tampouco.
Já a designação para a Corte é a ambição natural e justa de alguém com a carreira de Moro. Ele já teve uma passagem pelo Supremo, como juiz auxiliar de Rosa Weber, e certamente reúne os atributos de notório saber jurídico e reputação ilibada para substituir o decano.
A interlocutores, Moro tem descartado o argumento de que seu eventual aceite a um ou outro convite de Bolsonaro enfraquece a Lava Jato ou joga água no moinho da queixa petista.
Integrantes da força-tarefa da operação dizem que outro juiz assumirá as funções de Moro caso ele, de fato, deixe a 13.ª Vara da Justiça Federal em Curitiba, sem prejuízo para os trabalhos.
Resta, por fim, um argumento bem esgrimido por Marcelo de Moraes no BR18: cabem dois “mitos” num governo logo em seu nascedouro? Moro não é grande demais para ser um “soldado” de Bolsonaro? O fato é que o juiz não parece ter levado nada disso em consideração ao se assanhar diante de um convite nem sequer formulado. Para um enxadrista como ele, foi um lance bastante precipitado.
PREVIDÊNCIA
Bolsonaro pede contagem de votos de projeto de Temer
Na reunião com a equipe que atuou na campanha e vai estar na transição, Jair Bolsonaro pediu a Onyx Lorenzoni (DEM) que promova uma contagem dos votos com os quais poderá contar caso decida pôr em marcha o plano de votar ainda neste ano a proposta de reforma da Previdência de Michel Temer. Aliados do presidente eleito negam que haja ruídos entre o futuro ocupante da Casa Civil e o czar da área econômica, Paulo Guedes.
PRÓXIMO ROUND
Márcio França deve disputar Prefeitura de São Paulo
O bom desempenho na disputa do 2.º turno para o governo de São Paulo, que o tirou da condição de governador-tampão desconhecido para a quase vitória, deve selar a candidatura de Márcio França (PSB) à Prefeitura de São Paulo em 2020. Para ter espaço a partir do qual fazer política e não cair no esquecimento, França está sendo lançado por aliados para a presidência nacional do PSB, com a missão de fazer a ponte entre a bancada e os governos da sigla.