jornada
Luiz Sérgio Henriques: A jornada ao centro
Defesa das instituições está longe de se restringir à esquerda ou mesmo aos setores progressistas
Luiz Sérgio Henriques / O Estado de S. Paulo
Nas nossas sociedades o centro político não é a região habitada pelos mornos – os que não são nem quentes nem frios – de que nos falam as Escrituras e que, por isso, serão impiedosamente vomitados no Apocalipse. Ao contrário, há teóricos para quem o centro é o “lugar” em que se cruzam e se confrontam por vezes com contundência, e também entram em algum tipo de acordo, as diversas propostas hegemônicas presentes na comunidade política. E, se de hegemonia se trata, sempre há movimento e mudança, sempre se registram avanços e recuos, mas nunca a eliminação física ou espiritual do adversário. O centro, em suma, move-se, indica o estabelecimento (provisório) de equilíbrios mais ou menos progressistas, mais ou menos permeáveis aos impulsos democratizadores.
A existência de um centro é o que nos permite logicamente identificar a presença de forças desestabilizadoras e, portanto, ex-cêntricas. Estas aparecem como risco e ameaça, especialmente quando são vetores de destruição pura e simples e dão vazão a forças irracionais em períodos de intensa mudança social. Como diz a frase famosa, em tais períodos tudo o que é sólido se desfaz no ar, e o desafio de entender e assimilar dialeticamente os novos termos do mundo – desafio que indivíduos sensatos se colocam – pode ser varrido por uma vontade particularmente anômala de retornar a um passado harmonioso, mas inexistente.
Este risco e esta ameaça operam concretamente entre nós. E operam não como força evanescente, mas como realidade política concreta. A direita dita iliberal, ou antiliberal, tem nossa democracia como seu troféu desde 2018. O rastro de destruição está à vista de todos e se estende do meio ambiente ao mundo da cultura, das normas básicas de civilidade aos fundamentos do Estado democrático. Particularmente perverso o ataque desferido contra a ciência e seus pressupostos em tempo de pandemia e num país, como o nosso, de firme adesão prática a regras sanitárias. A perversidade se conta, como sabemos, em algumas centenas de milhares de compatriotas mortos, muitos deles de modo cruel e desnecessário. Sem exagero retórico, a maior tragédia nacional em cinco séculos de existência coletiva.
Muito penoso ter testemunhado, desde o início, a retórica antiestablishment mobilizada por figuras reconhecidamente menores do próprio establishment em qualquer uma das suas áreas, na economia ou na política, na vida civil ou na militar. Rancor e ressentimento foram, e são, os traços distintivos do “estilo de época” que se impôs a partir de 2018. E não por acaso o “subversivismo elementar” a que tal estilo serve volta-se violentamente, em primeiro lugar, contra a própria noção de centro político, tal como acima mencionamos.
Para dar dois exemplos no plano discursivo. A fala inaugural do presidente da República, ainda no parlatório de Brasília, traz os elementos mais primários da alucinada guerra ultradireitista de valores, como, entre outros, a luta contra a “correção política” identificada com o solerte “socialismo”. E a última “declaração à nação”, na qual o presidente recua dos graves atropelos institucionais do Dia da Independência, conclui com o lema integralista (fascista ou filofascista) em desafiadora caixa alta. Ora, com tais simulacros de ideias, não há como “ir ao centro” para travar a saudável batalha hegemônica com os demais atores que compõem a sociedade aberta. A ex-centricidade está dada, é elemento constitutivo de uma força que, tendo obtido maioria eleitoral, se inscreve entre as que têm promovido ativamente a “recessão democrática” destes nossos tempos.
A defesa das instituições está longe de se restringir à esquerda ou mesmo aos setores que se autodefinem como progressistas. Recentemente, a propósito, a historiadora Anne Applebaum, ao deplorar a metamorfose do velho Partido Republicano em instrumento da “grande mentira” trumpista, chamou a atenção para a importância de haver bons partidos de centro-direita capazes de esvaziar o chamado selvagem da extrema direita. Uma consideração realista, que evidentemente se aplica a nós. Os adeptos do liberalismo político, não importa sua filiação específica, têm uma visão de mundo por demais sofisticada para regredirem ao território das distopias organicistas, por definição anuladoras do indivíduo e da tradição iluminista.
A esquerda política, ao menos nas suas expressões mais significativas, terá de apetrechar-se para sua própria “jornada ao centro”, afastando-se dos caudilhismos que assolaram a última “onda rosa” latino-americana. Por certo, divergências legítimas à parte, o ex-presidente Luiz Inácio da Silva não é a versão espelhada do atual presidente, mas, entre outros, Hugo Chávez ou Nicolás Maduro o são, razão pela qual nenhuma complacência é possível ou justificável. De resto, só uma esquerda finalmente animada pela ideia da “democracia (política) como valor universal” poderá reivindicar para si coerência programática e lealdade institucional, mais além das tentações iliberais que periodicamente costumam rondá-la. Hic Rodhus.
*Tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das ‘Obras’ de Gramsci no Brasil
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,a-jornada-ao-centro,70003868692
Cristovam Buarque: Porque sou favorável à reforma trabalhista
Senador do PPS explica motivos do apoio às mudanças na legislação trabalhista
Nosso País não tem obstáculos naturais ao seu progresso, como outros países: dividido em etnias, línguas, seitas; com o território desértico ou submetido a intempéries periódicas; tampouco somos uma destas minúsculas ilhas perdidas no oceano, distantes do resto do mundo. Apesar disto, não temos conseguido acompanhar o progresso dos países ricos, com elevado nível civilizatório, porque sempre nos recusamos a fazer as reformas que toda sociedade necessita para ajustar-se às transformações que ocorrem no mundo: fugimos do progresso como uma nação conservadora, presa ao passado. Criamos nossos próprios obstáculos que nos amarram. A principal causa disto tem sido a dominação das estruturas sociais pelas elites.
A falta de sentimento nacional e de compaixão de nossa elite nos fez manter o obstáculo do latifúndio e da escravidão, amarrando nosso progresso, enquanto os outros países entravam na revolução industrial, promovendo o trabalho livre, a educação das massas e o incentivo à criatividade tecnológica.
Foi preciso esperar o final do século XIX para abolirmos a escravidão, mesmo sem completar a educação: mantivemos nossas amarras por falta de oferta de educação pública e da necessária reforma agrária. Mantivemos amarrados o potencial do conhecimento e da terra distribuída. Quando a proposta da Lei Áurea chegou ao Parlamento, por meio de um governo conservador, o grande abolicionista Joaquim Nabuco apoiou essa reforma libertadora, manifestando sua posição de que ainda faltava muito para liberar as forças criativas do Brasil.
Ao longo do século XX demos saltos na produção, sem quebrar os obstáculos e as amarras, sem fazermos as reformas necessárias para liberar nosso potencial. Quando o governo Goulart tentou levar adiante as reformas, a elite reacionária derrubou sua presidência e implantou uma longa ditadura. O regime militar investiu em infraestrutura, criou leis de incentivo, ofereceu créditos, conseguiu fazer o Brasil crescer, mas não eliminou qualquer dos obstáculos que nos amarravam.
A democracia, apesar de 30 anos de governos socialdemocratas, não fez as reformas necessárias – nenhuma delas. Organizou as finanças públicas para logo depois arruiná-las; montou uma rede de proteção social, um sistema único de saúde, mas não derrubou os obstáculos, manteve o país amarrado. Foram governos de um partido intitulado social democrata e outro dos trabalhadores, ambos reacionários, que impediram a participação de nossa economia no mundo global.
Mas continuamos um país sem produtividade elevada, com reduzidíssima capacidade para a inovação, com um número estável ou crescente de cidadãos analfabetos, incapazes até de ler a palavra progresso escrita na bandeira, uma sociedade com a pobreza persistente que não reduz a concentração da renda, sem educação, imersa na violência e na corrupção. Esses são os obstáculos que nos amarram e nos condenam ao fracasso como país.
O mundo está inovando produtos industriais todos os dias e nós continuamos com uma economia baseada na mesma velha produção primária; mudaram as máquinas e as técnicas, mas continuam os mesmos produtos. Enquanto isso, nosso debate político continua preso a velhos temas e com as forças reacionárias contra a derrubada dos obstáculos, por interesses ou por preguiça.
O mundo está criando e usando automóveis sem motoristas e nós discutindo se aceitamos o uso de aplicativos para o sistema de taxi; muitos países já adotam sistemas flexíveis que permitem aos trabalhadores definirem os regimes de trabalho que melhor lhes convém, inclusive adotando o trabalho em casa, e nós querendo regular cada minuto de vida do trabalhador, até mesmo quanto tempo ele deve usar para almoçar. O Brasil precisa derrubar as amarras que impedem seu ingresso no mundo moderno.
As atuais propostas de reforma serão capazes de adaptar as relações trabalhistas minimamente e permitir com isto desamarrar o funcionamento da economia e assim merecem nosso apoio, mesmo sabendo que, devido ao rápido avanço tecnológico, não resistirão aos próximos 10 anos e precisarão de novas adaptações.
Quanto à presente proposta de reforma trabalhista:
a) Sou favorável à prevalência do negociado sobre o legislado porque, na dinâmica atual, se não quisermos amarrar a economia, as legislações devem ser modificadas a cada instante; o mundo dinâmico na velocidade atual exige flexibilização das regras trabalhistas na velocidade que permita ficar em sintonia com o progresso técnico.
A alternativa a isto seria impedir o progresso técnico, na linha das velhas lutas do século XIX, de quebrar máquinas para impedir o progresso. Mas isso exigiria o isolamento do Brasil em relação ao mundo. Sem a flexibilização, o Brasil continuará perdendo investimentos para outros países.
Outra opção seria uma revolução que imponha regras internacionais ao capital, mas nada indica a possibilidade política desta mudança no prazo de algumas décadas, e nem se vê alternativa para colocar no lugar do atual sistema global, mesmo sabendo-o perverso.
b) Os atuais direitos fundamentais como 44 horas de trabalho por semana e 30 dias de férias por ano, entre outros, serão mantidos, mas agora dando ao trabalhador o direito de ter liberdade para ajustar sua relação com a empresa e com suas outras atividades.
O trabalhador, em acordo com o empregador, poderá definir a estrutura das férias e mesmo o número de horas de trabalho a cada dia, aumentando até o limite de 12 horas em um dia e usando um banco de horas para reduzir a jornada em outros dias, como diversas categorias já fazem depois de conquistarem este direito que a reforma agora oferece a todos.
c) Sou favorável e considero uma conquista a possibilidade de o trabalhador sair meia hora mais cedo do trabalho, graças a opção de reduzir meia hora no seu horário de almoço, hoje engessado em uma hora. Sou favorável porque, com esta redução de meia hora no almoço por opção, acredito que milhões de jovens poderão sair mais cedo do trabalho, eliminando a tragédia de chegar atrasado na escola ou mesmo ficar impossibilitado de frequentar cursos universitários noturnos por causa da jornada de trabalho regulamentada por leis que não lhes dão liberdade. Também sou favorável porque acredito no discernimento dos trabalhadores de só fazerem esta opção se for de seu interesse, sem necessidade do protecionismo defendido por aqueles que veem nossos trabalhadores como incapazes de defenderem seus direitos, como antes se dizia dos escravos.
d) Sou favorável ao que se está chamando de trabalho intermitente porque ele será a base para a contratação de trabalhadores desempregados e subempregados por empresas que não precisam do trabalhador em caráter permanente. Daqui para frente, querendo ou não, o trabalho deste tipo será cada vez mais generalizado.
Sou favorável a esta modernização porque ela vai beneficiar a juventude, que poderá desempenhar diversas funções, como estar um período em uma empresa e outro como trabalhador em empresa diferente ou como empreendedor de seu próprio auto-emprego, como digitador, programador, garçom, etc, ou em serviços de Uber. A reforma não amarra o trabalhador à empresa e ainda exige da empresa convocá-lo com no mínimo três dias de antecedência.
Mais uma vez é uma reforma criticada pelos que defendem o status-quo do trabalho permanente e presencial, quando o mundo já está nos tempos do trabalho à distância, o chamado trabalho-desde-casa.
e) Sou favorável à reforma porque ela vai permitir o uso de terceirização, que já é uma realidade espalhada, mas agora será protegida passando a ter os mesmos direitos dos efetivos, como atendimento ambulatorial, alimentação, segurança, transporte, capacitação e qualidade de equipamentos. Além disto, a reforma garante um período mínimo de 18 meses durante o qual o trabalhador permanente não poderá ser recontratado como terceirizado, evitando-se assim o uso dos recursos de precarização que a partir de agora deixa de ser vantajoso para as empresas, uma vez que os terceirizados também terão proteção.
f) Voto pelo fim da contribuição obrigatória aos sindicatos (como também defendo acabar com a contribuição do Estado ao Fundo Partidário), porque esta contribuição terminou servindo para criar impérios sindicais com dinheiro assegurado independente do serviço que presta. Resta ao cidadão o discernimento para escolher o sindicato e o partido com o qual quer colaborar. Acredito que isto vai melhorar o serviço de cada sindicato e sua relação com o trabalhador, sem peleguismo. Concordo, entretanto, que esta mudança exija um período de transição, para evitar a falência brusca das máquinas sindicais, e por isso apresentei emenda com redução gradual deste imposto em três anos.
g) Voto porque a reforma mantém a possibilidade de o trabalhador reclamar seus direitos na Justiça do Trabalho, ao mesmo tempo que incentiva, o que é uma medida positiva desburocratizadora, as negociações diretas na linha do direito moderno, como os diversos tipos de juizados de pequenas causas. Sei que isto quebra o monopólio de verdadeiros cartéis-do-direito-formal, mas apesar de suas reações, considero ser mais um passo na direção de desamarrar o Brasil de seus latifúndios.
h) Sou favorável porque a reforma não toca em nenhum direito garantido pela Constituição e nem acaba com o concurso e não desmonta a estabilidade e o Estado. É hora de acabar com a mentira e o populismo eleitoreiro querendo ganhar votos enganando a população.
Votarei a favor da reforma porque ela é para o Brasil, não importa qual seja o presidente da República do momento e porque não vejo como sua aprovação vai beneficiar a continuação do governo Temer que caminha para terminar, completando-se assim o impeachment, iniciado em 2016.
Voto contando com o veto de vários artigos que vieram no projeto da Câmara dos Deputados, cuja rejeição neste momento forçaria a volta do projeto à Câmara, o que provocaria adiamento ou mesmo a interrupção da reforma. E o Brasil tem pressa de se desamarrar.
VETOS
Nesse sentido, o Presidente da República enviou ao Senado Federal, na pessoa de seu Líder, carta assumindo o compromisso de vetar questões apontadas pelo relator da reforma, senador Ricardo Ferraço e, concomitantemente a editar medida provisória contendo as modificações que forem negociadas entre os parlamentares, seu relator e o Líder do governo no Senado. Entre os pontos que foram relacionados pelo Líder do governo para ajustes estão:
a. Criação de quarentena de 18 meses para eventual migração, dentro da empresa, de trabalho permanente para intermitente. Ainda sobre essa forma de contratação, elimina-se a multa de 50% do trabalhador no caso de falta.
b. A jornada de 12/36 horas só será possível por acordo coletivo.
c. Será obrigatória a participação sindical nas negociações coletivas.
d. Será restabelecida a vedação do trabalho de gestantes em local insalubre e o enquadramento da insalubridade será feito por acordo coletivo.
e. Será retirado o texto que fala sobre dano extrapatrimonial, cujo conteúdo vinculava o ressarcimento ao salário do empregado.
f. Não poderá haver nenhuma cláusula de exclusividade para o trabalho autônomo.
g. Será adotada a redução gradual da contribuição sindical, ao invés de sua eliminação abrupta.
EMENDAS
Voto achando que a reforma poderia ter sido melhor e por isso eu apresentei sete emendas:
a. Criação de licença capacitação de cinco dias úteis para o empregado, por ano trabalhado, não podendo acumular mais de três anos. Essa licença deverá ser utilizada para reciclagem profissional, curso de aperfeiçoamento, ou aprendizado de novo ofício. A intenção é criar uma cultura de aperfeiçoamento profissional, valorizando a formação do empregado e sua contribuição à empresa, gerando efeitos positivos para todo o Brasil, ao criar instrumentos de qualificação da mão de obra.
b. Ao retirar o termo “entre outros” do texto do artigo sobre negociação coletiva, criamos uma restrição do uso desta aos itens citados no projeto de reforma. Nossa ideia é soltar as amarras da economia dando alguma previsibilidade sobre o tópico a ser negociado, reduzindo o grau de incertezas.
c. Nossa terceira emenda restringe e dá previsibilidade ao trabalho intermitente. Garantimos ao trabalhador que a recusa da oferta não caracteriza falta ou motivo para sanção contratual. Além disso, propomos a vedação da convocação de mais de um período no mesmo dia – que poderia resultar na disponibilização não remunerada do trabalhador nos intervalos, criamos a figura da hora extra quando o trabalhador tiver que ficar em horário subsequente ao da convocação e propomos a criação de quarentena para a contratação de trabalhador por tempo indeterminado como intermitente, por período de dezoito meses.
d. Embora sejamos favoráveis ao fim do imposto sindical, permitimos um período de três anos para sua eliminação gradual (60%, 40% e 20% nos anos que seguem a aprovação da reforma). Com isso, queremos dar aos sindicatos tempo para se adaptar e conquistar associados entre os membros da categoria que representam.
e. Emenda proibindo a terceirização do trabalho docente em sala de aula quando os assuntos tratados na aula são do núcleo essencial de cada curso. Com isso pretendemos valorizar os profissionais envolvidos no núcleo essencial de cada curso e garantir a qualidade do ensino nessas disciplinas.
f. Emenda vedando terceirização de atividades estatais finalísticas relativas a cargos ou empregos públicos. Embora acreditemos que a contratação de trabalho terceirizado possa oxigenar algumas atividades do setor público, nossa intenção aqui é preservar a prevalência da contratação por concurso nas atividades fins do setor público.
g. Emenda que cria a possibilidade de aproveitamento de trabalhador em outras áreas da empresa, permitindo a contratação por multifunção ou multiqualificação. Isto possibilitará maior mobilidade do trabalhador dentro da empresa, permitindo, tanto aos trabalhadores como aos empregadores, aproveitamento da relação trabalhista em caso de modificação de tecnologia.
Estas emendas, recusadas pelo relator em nome da agilidade que considero necessária, já foram transformadas em projetos de lei que vou apresentar – até porque esta e todas as outras reformas são um processo. Acabou o tempo da ilusão da permanência que seduz aos conservadores e que Marx havia desfeito, quando 150 anos atrás, muito antes de imaginar-se as atuais transformações ele disse:
“Tudo que é sólido se desmancha no ar”.
Plenário do Senado aprova reforma trabalhista e texto segue para sanção
Por 50 votos contra 26, o Senado aprovou nesta terça-feira (11) a reforma trabalhista (PLC 38/2017). A proposta, que segue agora para sanção presidencial, altera mais de 100 pontos da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), permitindo, dentre as mudanças, que o acordado entre patrões e empregados prevaleça sobre o legislado nas negociações trabalhistas.
A mudança é considerada prioridade para o governo de transição não só para modernização da legislação trabalhista como para fazer frente aos 14 milhões de trabalhadores desempregados no País, resultado do fracasso do governo do PT. Um estudo divulgado pelo banco Santander em junho (veja aqui) mostra que a aprovação da reforma trabalhista tem potencial para gerar cerca de 2,3 milhões de vagas de trabalho em pouco mais de um ano. A estimativa leva em consideração a flexibilização de regras e consequente redução de custos para o empregador, que voltaria a contratar.
Atraso
A votação, prevista para a iniciar no fim da manhã de ontem (11), só iniciou cerca de sete horas depois. O atraso foi provocado por senadoras da oposição. Gleisi Hoffmann (PT-PR), Fátima Bezerra (PT-RN), Ângela Portela (PT-ES), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Lídice de Mata (PSB-BA), Regina Sousa (PT-PI) e Kátia Abreu (PMDB-TO) ocuparam a mesa do plenário e se negaram a sair.
A sessão só começou após o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), dar um ultimato às oposicionistas e afirmar que começaria a sessão no plenário ou em outra sala do Senado. Quando se aproximava das 19h, Eunício conseguiu sentar na cadeira de presidente e deu início à sessão.
Texto
A proposta de reforma trabalhista prevê, além da supremacia do negociado sobre o legislado, o fim da assistência obrigatória do sindicato na extinção e na homologação do contrato de trabalho. Além disso, acaba com a contribuição sindical obrigatória de um dia de salário dos trabalhadores.
Há também mudanças nas férias, que poderão ser parceladas em até três vezes no ano, além de novas regras para o trabalho remoto, também conhecido como home office. Para o patrão que não registrar o empregado, a multa foi elevada e pode chegar a R$ 3 mil. Atualmente, a multa é de um salário-mínimo regional.
Para que a proposta não voltasse a ser analisada pela Câmara dos Deputados, que aprovou o texto em abril, os senadores governistas não aceitaram nenhuma mudança de mérito no texto e rejeitaram também as emendas apresentadas de modo individual. No entanto, como resposta aos pontos polêmicos da proposta, há um compromisso do presidente Michel Temer de vetar seis pontos da reforma. A ideia é aperfeiçoar esses pontos para que eles sejam reapresentados via medida provisória ou projeto de lei.
Veja o que muda na legislação com a reforma trabalhista:
ACORDOS COLETIVOS
Terão força de lei e poderão regulamentar, entre outros pontos, a jornada de trabalho de até 12 horas, dentro do limite de 48 horas semanais, incluindo horas extras.
Parcelamento das férias, participação nos lucros e resultados, intervalo, plano de cargos e salários, banco de horas também poderão ser negociados.
Pontos como FGTS, salário mínimo, 13º salário, seguro-desemprego, benefícios previdenciários, licença-maternidade e normas relativas à segurança e saúde do trabalhador não poderão entrar na negociação.
Atualmente, acordos coletivos não podem se sobrepor ao que é previsto na CLT.
JORNADA PARCIAL
Poderá ser de até 30 horas semanais, sem hora extra, ou de até 26 horas semanais, com acréscimo de até seis horas (nesse caso, o trabalhador terá direito a 30 dias de férias).
Atualmente, a jornada parcial de até 25 horas semanais, sem hora extra e com direito a férias de 18 dias.
PARCELAMENTO DE FÉRIAS
As férias poderão ser parceladas em até três vezes. Nenhum dos períodos pode ser inferior a cinco dias corridos e um deles deve ser maior que 14 dias (as férias não poderão começar dois dias antes de feriados ou no fim de semana).
Atualmente, as férias podem ser parceladas em até duas vezes. Um dos períodos não pode ser inferior a dez dias corridos.
GRÁVIDAS E LACTANTES
Poderão trabalhar em locais insalubres de graus “mínimo” e “médio”, desde que apresentem atestado médico. Em caso de grau máximo de insalubridade, o trabalho não será permitido.
Atualmente, grávidas e lactantes não podem trabalhar em locais insalubres, independentemente do grau de insalubridade.
CONTRIBUIÇÃO SINDICAL
Deixará de ser obrigatória. Caberá ao trabalhador autorizar o pagamento.
Atualmente, é obrigatória e descontada uma vez por ano diretamente do salário do trabalhador.
TRABALHO EM CASA
A proposta regulamenta o chamado home office (trabalho em casa).
Atualmente, esse tipo de trabalho não é previsto pela CLT.
INTERVALO PARA ALMOÇO
Se houver acordo coletivo ou convenção coletiva, o tempo de almoço poderá ser reduzido a 30 minutos, que deverão ser descontados da jornada de trabalho (o trabalhador que almoçar em 30 minutos poderá sair do trabalho meia hora mais cedo).
Atualmente, a CLT prevê obrigatoriamente o período de 1 hora para almoço.
TRABALHO INTERMITENTE
Serão permitidos contratos em que o trabalho não é contínuo. O empregador deverá convocar o empregado com pelo menos três dias de antecedência. A remuneração será definida por hora trabalhada e o valor não poderá ser inferior ao valor da hora aplicada no salário mínimo.
Atualmente, a CLT não prevê esse tipo de contrato.
AUTÔNOMOS
As empresas poderão contratar autônomos e, ainda que haja relação de exclusividade e continuidade, o projeto prevê que isso não será considerado vínculo empregatício.
Atualmente, é permitido a empresas contratar autônomos, mas se houver exclusividade e continuidade, a Justiça obriga o empregador a indenizar o autônomo como se fosse um celetista.
Sugestões de mudanças
No relatório aprovado pela CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado, Ricardo Ferraço (PSDB-ES) recomendou a aprovação do projeto conforme a redação enviada pela Câmara, mas sugeriu as seguintes mudanças, a serem feitas pelo governo, quando o presidente Temer sancionar a proposta.
Mudanças propostas
Veto ao trecho sobre gestantes e lactantes;
Veto ao ponto que retira o descanso de 15 minutos para as mulheres antes do início da hora extra;
Regulamentação por medida provisória do trabalho intermitente;
Decisão por acordo coletivo sobre a possibilidade de acordos individuais determinarem jornada de 12 horas de trabalho com 36 horas de folga. (Com informações das agência de notícias)