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João Doria: 'Polarização favorece os extremistas que destroem o País'

Cotado para 2022, governador de São Paulo diz em entrevista que forças de centro não serão engolidas se tiverem 'juízo'

Pedro Venceslau, O Estado de S. Paulo

Apontado como um dos presidenciáveis do PSDB - o outro é o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite -, o governador de São Paulo, João Doria, disse em entrevista ao Estadão que, caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva confirme a disposição de disputar o Palácio do Planalto em 2022, o cenário eleitoral vai mudar, mas as forças de centro não serão engolidas se "tiverem juízo".

Doria não descarta até a possibilidade de o PSDB apoiar um outro nome na disputa presidencial do ano que vem: "Nada deve ser excluído. Uma aliança pelo Brasil não pode estabelecer prerrogativas de nomes".

Como a decisão do ministro Edson Fachin que devolveu os direitos políticos ao ex-presidente Lula impacta o campo político do centro?

Primeiro é preciso saber se o presidente Lula será candidato. A medida do Supremo traz um impacto muito grande no mundo da política, mas é preciso saber se o presidente Lula tem disposição. Se ele confirmar que será candidato em 2022, então o cenário político para a sucessão presidencial muda. 

Muda como? 

Estabelece desde já a polarização extremista entre Bolsonaro e Lula, que é o que mais deseja o atual presidente.

A polarização também interessa ao Lula? 

Ao Lula resta saber. Ao Bolsonaro eu tenho certeza. Tem que perguntar para ele. 

Com Lula no tabuleiro eleitoral, as forças de centro precisam acelerar a escolha de um nome? 

A polarização favorece os extremistas que destroem o País. Já destruíram uma vez e estão completando o serviço com Bolsonaro. Portanto vejo como um impacto positivo para o centro democrático estar unido na defesa de um programa de governo que salve o Brasil dos extremistas. 

Por que o impacto é positivo? 

É preciso ver se os russos vão jogar a partida. Está todo mundo supondo. Caso o presidente Lula tome a decisão de ser candidato, se configura uma conflagração para a eleição de 2022 de alto risco para o Brasil. O extremismo não traz uma solução conciliadora diante da pandemia e da gravidade dos efeitos na economia. 

Teme que o centro seja engolido por essa polarização? 

Se tiver juízo, não. 

E o que significa ter juízo?

Capacidade de dialogar, formular um programa econômico e social para o Brasil e escolher um candidato que seja competitivo para disputar a eleição e, ao vencer, governar a Nação. Não basta a análise de popularidade, que é parte do processo. É preciso conciliar popularidade com capacidade. De nada vai adiantar ter um popular na Presidência da República que seja incapaz. 

O antipetismo e o antibolsonarismo são duas forças que ainda dominam a política brasileira?

Não vou dizer que dominam, mas são latentes. 

Qual é o momento de escolher o nome que vai encabeçar essa frente de centro?

No limite até outubro deste ano, caso contrário não haveria tempo de trabalhar esse nome nacionalmente. 

O PSDB pode apoiar o candidato de outro partido?

Nada deve ser excluído. Uma aliança pelo Brasil não pode estabelecer prerrogativas de nomes. 

Como o sr avalia que será o impacto político das medidas restritivas causadas pela pandemia nas eleições de 2022?

Não há dúvida que a pandemia vai impactar na decisão eleitoral. É a pior tragédia da história do Brasil nos últimos 100 anos. Em breve vamos alcançar o número de 300 mil mortos. Não há tragédia mais triste do que 300 mil vidas perdidas. 

O PSDB marcou para outubro as prévias para definir o candidato do partido ao Palácio do Planalto...

Sou amplamente favorável às prévias. Elas fortalecem, somam e constroem candidaturas fortes para a disputa eleitoral. Aliás, sou filho das prévias. As duas únicas prévias feitas até hoje no Brasil foram feitas pelo PSDB e em São Paulo, em 2016 e 2018. Disputei e venci as duas. 

Em 2014 e 2018 o PSDB reuniu um arco de partidos para disputar o Palácio do Planalto. Acredita que em 2022 esses partidos estarão reunidos em torno de uma candidatura de centro ou apoiarão Bolsonaro?

É possível, embora o ideal seja a conciliação. O fracionamento só atenderá o  interesse dos extremos. 

O antipetismo ainda tem a mesma força que teve em 2018 ou o PT com Lula pode aglutinar as forças de oposição ao Bolsonaro?

O governo Bolsonaro em dois anos provou a sua incompetência e fez da sua gestão um mar de fracassos e uma usina de mortes. Já provou, portanto, a sua incapacidade. 

Como avaliou a decisão do Fachin?

O Brasil é muito maior que Lula e Bolsonaro.


Bruno Boghossian: Disputa no PSDB é prenúncio de dificuldades para Doria em 2022

Projeto eleitoral do governador enfrenta resistências internas e risco de traições

Os problemas do PSDB começaram cedo em 2018. Na largada, poucos tucanos se empolgaram com a candidatura de Geraldo Alckmin. Vendo poucas chances de vitória, passaram a cuidar de suas próprias campanhas ou se bandearam para o lado de Jair Bolsonaro, que ocupava um eleitorado alinhado ao campo do partido. O desfecho é conhecido.

Na última semana, João Doria conheceu alguns desses obstáculos internos. Para lançar as bases de sua campanha ao Planalto, o governador tentou forçar o PSDB a adotar uma postura de oposição a Bolsonaro, eliminar potenciais desertores e assumir o controle da burocracia do partido para evitar traições. Foi derrotado em todas as investidas.

Doria antecipou batalhas inevitáveis dentro da legenda, mas deu tiros prematuros e passou longe dos alvos. O resultado é um sinal de que sua candidatura já enfrenta resistências dentro de casa e de que ele pode ter dificuldades para manter a máquina do partido distante da zona de influência do bolsonarismo.

À exceção de alguns integrantes instalados por Doria na seção paulista da sigla, os tucanos nunca demonstraram grande entusiasmo com o projeto eleitoral do governador –um forasteiro que não criou vínculos dentro da legenda. Esses políticos poderiam torcer o nariz e embarcar na ideia se acreditassem que ele poderia vencer, mas esse não é o cenário que se enxerga hoje.

Além disso, os movimentos do governador para reforçar a coloração de seu rótulo antibolsonarista se chocaram com a política que é exercida nos gabinetes tucanos. Deputados e prefeitos do partido preferem manter boa relação com o Planalto para ter acesso à máquina do governo. Mesmo que Doria seja candidato pelo PSDB, alguns deles devem trabalhar por Bolsonaro em 2022.

O governador paulista ganhou tração nos primeiros meses do ano graças aos planos de vacinação, mas mesmo seus companheiros de partido entendem que esse lance não será suficiente para elegê-lo. A disputa no PSDB é um prenúncio para 2022.