Instituto Brasileiro de Economia
Samuel Pessôa: Sangue-frio
O Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV) tem revisto o cenário de crescimento para pior, apesar de não ter havido grandes revisões para o crescimento em 2017 em comparação a 2016.
Há um ano prevíamos crescimento de 0,5% em 2017, com aceleração contínua ao longo do ano. A economia fecharia o ano crescendo 0,8% no último trimestre, ou 3,2% considerando a taxa anualizada.
Hoje, prevemos crescimento de 0,2% em 2017, com expansão de 1% no primeiro trimestre (já conhecida e fruto de um choque positivo de oferta de produção agrícola), seguida pela estagnação da economia –respectivamente, crescimento de -0,4%, 0,1% e 0% nos segundo, terceiro e quarto trimestres.
Há uma tendência entre os formuladores de política econômica de achar que crescimento sempre pode ser estimulado. Assim, agora que o cenário de menor expansão se consolida, principalmente em seguida ao agravamento da crise política que acomete o governo Temer, há a tentação de produzir crescimento a qualquer custo. Discutem-se no Congresso e no Executivo vários puxadinhos de Nova Matriz Econômica.
Como exemplos, temos:
a) reajustes nas faixas de renda e de financiamento dos instrumentos públicos de financiamento (financiamentos do FGTS para compra de imóvel, faixas de renda elegíveis ao Minha Casa, Minha Vida);
b) ampliação do volume de crédito direcionado subsidiado;
c) não devolução antecipada de empréstimos do BNDES ao Tesouro, para aumentar o funding de créditos subsidiados do banco;
d) subsídio para a renovação da frota de veículos (a pretexto de tirar veículos antigos e poluentes das ruas, o governo subsidiaria a troca de carro usado por novo);
e) novo modelo de subsídio à indústria automobilística para substituir o Inovar-Auto, com alguns penduricalhos para disfarçar os subsídios, tipo estimular indústria 4.0 e reduzir impacto ambiental;
f) medidas de compensação à indústria nacional fornecedora da cadeia de petróleo, a pretexto de perdas geradas pela redução do conteúdo local etc. A criatividade vai longe.
Como vimos de 2009 a 2014, essas medidas geram pouco crescimento e, por outro lado, criam inúmeros problemas a médio prazo. Adicionalmente, essas medidas impedem que o Banco Central alongue de forma sustentável o ciclo de queda dos juros.
Ou seja, com exceção de uma vitória de Pirro contra o baixo crescimento, puxadinhos de "Nova Velha Matriz Econômica" só produzem tristeza.
A economia brasileira tem um seriíssimo problema de baixa produtividade. A dificuldade da recuperação é consequência do estrago que a desastrosa condução da política econômica, principalmente entre 2009 e 2014, promoveu na economia real.
Os únicos antídotos são sangue-frio, a aprovação das reformas - para alongar o horizonte do cálculo empresarial- e deixar que as seguidas surpresas desinflacionárias coloquem a Selic em mínimas históricas de forma sustentável.
Novamente houve, na sexta (9), surpresa positiva na inflação, no IPCA de maio. O número de 0,31% foi 0,18 ponto percentual abaixo do que se esperava. Sem puxadinhos e solucionando a crise política, podemos divisar Selic muito baixa, e de forma sustentável, à frente.
* Samuel Pessôa é físico com doutorado em economia, ambos pela USP, sócio da consultoria Reliance e pesquisador associado do Ibre-FGV.