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‘Programa de ‘destruição’ pauta governo Bolsonaro’, afirma Alberto Aggio
Em artigo publicado na revista Política Democrática Online de agosto, historiador explique porque ‘a guerra do presidente’ não é efetiva
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
“O que pauta o governo Bolsonaro, em autodeclaração contundente, é o programa de ‘destruição’ dos atores, das instituições e da cultura política de convivência democrática que se erigiu nas últimas três décadas, sob a égide da Constituição de 1988”. A avaliação é do historiador Alberto Aggio, professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista), em artigo que publicou na revista Política Democrática Online de agosto, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília.
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Todos os conteúdos da revista podem ser acessados, gratuitamente, no site da FAP. Segundo o historiador, em momentos nos quais a eloquência do presidente buscou mobilizar seus partidários, Bolsonaro chegou a ser explícito: “Isso é uma guerra, pô”. “Em outras situações, nas quais quis aparentar concórdia e distensão, seu discurso procurou operar com o antônimo, pedindo ‘paz, em nome do Brasil’”, observa o autor.
Na avaliação de Aggio, a “guerra de Bolsonaro” não é “a continuação da política por outros meios”. “Não é uma guerra efetiva, embora ambicione impor uma ‘suspensão da política’, como se estivesse num contexto revolucionário, à la Lenin, para quem a guerra deveria ser vista como desdobramento da revolução. Não é sem propósito observar também que Mussolini venerava a guerra e se dizia um revolucionário” explica Aggio.
Em outro trecho, o historiador lembra que, sentindo o mandato ameaçado, o presidente acusou o golpe e, depois disso, assumiu estratégia híbrida de congelamento do movimentismo e adoção de uma “guerra de posições”, para evitar o impeachment. “A estratégia de ‘suspensão da política’ esgotou-se. Cooptar os parlamentares do centrão para o campo governista tornou-se elemento essencial”, analisa.
No artigo publicado na revista Política Democrática Online, o professor da Unesp também observa que a ameaça de destruição integral da democracia parece estancada, embora o estrago tenha sido enorme. “Desorientada, a oposição viu o impeachment fugir-lhe entre os dedos, o que inevitavelmente voltou a aprofundar suas divisões. Isso fez com que Bolsonaro se recuperasse e saísse das cordas”, diz Aggio.
“Uma coisa é certa: Bolsonaro vacilou e criou obstáculos para não ‘abrir o cofre’ para salvar vidas (empresas e empregos), mas parece não ter dúvidas em fazê-lo para garantir sua reeleição, o que poderá agregar às crises que já temos um aprofundamento da nossa eterna crise fiscal, de consequências imprevisíveis”, acentua o historiador.
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Luiz Carlos Azedo: O esgotamento do milagre
“Os militares se retiraram em ordem para os quartéis, após a eleição de Tancredo Neves, em 1985. Agora, estão de volta ao poder, na garupa do presidente Jair Bolsonaro”
No Brasil republicano, houve dois longos ciclos de modernização do Estado e da economia, ambos em regimes ditatoriais. O primeiro, após a Revolução de 1930, que culminou no Estado Novo, durou 15 anos e se esgotou com o fim da II Guerra Mundial e a redemocratização; o segundo, após o golpe militar de 1964, resultou numa ditadura de 21 anos. Em dois momentos, porém, foi possível realizar ciclos de modernização do Estado e da economia em bases democráticas, durante os governos Juscelino Kubitschek (1956 a 1961), com seu Plano de Metas, e Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002), com o Plano Real.
Como foi a ascensão e queda do “milagre econômico” dos militares? O I Plano Nacional de Desenvolvimento, no governo do general Garrastazu Médici, idealizado pelo ministro do Planejamento João Paulo dos Reis Veloso, pretendia pôr o Brasil entre as nações desenvolvidas no espaço de uma geração. Para tanto, duplicaria a renda per capita do país até 1980; elevaria o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) até 1974, com base numa taxa anual entre 8% e 10%; e elevaria a taxa de expansão do emprego até 3,2% em 1974, além de reduzir a inflação.
A meta foi ultrapassada: o crescimento do PIB, de 1967 a 1973, foi de cerca de 10,2%, e de quase 12,5% entre 1971 e 1973, diante de uma média de 7% no pós-guerra, até o início dos anos 1960. Diante do crescimento da população de 2,9% ao ano, a segunda grande meta, de aumento do PIB per capita à taxa de cerca de 6%, também foi alcançada. Entre 1967 e 1973, população aumentou de 85,1 milhões para 99,8 milhões de habitantes, o produto per capita cresceu à taxa média de 7,2%. O nível de emprego passou “de 2,8% para a ordem de 3,3% em 1973”. Outra “grande meta” era o aumento do investimento fixo bruto em 58% de 1969 para 1973. Entre 1971 e 1973, a formação bruta de capital fixo correspondeu, em média, a 21% do PIB, alcançando 22,4% em 1973. Apenas no período de 1970 a 1973, o aumento real do nível de investimento foi de 62,9% –– novamente ultrapassou a meta estabelecida em 1970.
Tudo isso foi “financiado” pela poupança nacional bruta. Entre 1967 e 1973, a absorção líquida de recursos do exterior foi de apenas 0,8% do PIB, elevando-se um pouco para 1,2%, de 1970 a 1973. Houve excessivo endividamento externo e concentração de renda, porque os salários cresceram a taxas inferiores à da produtividade, porém com ganhos expressivos para a classe média, que cresceu.
Para corrigir essas distorções, no governo Ernesto Geisel foi lançado o II Plano Nacional de Desenvolvimento, que pretendia elevar a renda per capita a mais de US$ 1 mil e fazer com que o PIB ultrapassasse os US$ cem bilhões em 1977. A meta para o quinquênio 1975-1979 era enfrentar a escassez de petróleo e promover novo ciclo de industrialização, alavancado pelo setor produtivo estatal, com implantação de indústrias básicas, sobretudo bens de capital e eletrônica pesada, para substituir as importações e abrir novas frentes de exportação. A agropecuária também teria um novo papel.
Abertura
O II PND mirava uma sociedade industrial moderna, tendo por núcleo básico a região Centro-Sul. Exigia investimentos de Cr$ 700 bilhões para a indústria de base, o desenvolvimento científico e tecnológico e da infraestrutura econômica. A política de energia seria decisiva para reduzir a dependência do país em relação às fontes externas. Havia um programa de aplicação de recursos no Nordeste, ocupação produtiva da Amazônia e da região Centro-Oeste.
A crise do petróleo e a falta de capacidade de financiamento do setor público, porém, levaram ao colapso o projeto de capitalismo de estado dos militares. Havia muito voluntarismo, o modelo de substituição de importações havia se esgotado com o avanço da globalização, ao mesmo tempo que a sobrevivência política do regime militar era ameaçada pela oposição democrática, apesar da brutal repressão.
Na prática, o projeto de abertura política de Geisel, que teve seu curso no governo Figueiredo, diante das sucessivas derrotas eleitorais dos militares e seus aliados, foi mais bem-sucedido do que o II PND. Os militares se retiraram em ordem para os quartéis, após a eleição do oposicionista Tancredo Neves, um liberal-conservador, em 1985. Entretanto, agora, estão de volta ao poder, na garupa do presidente Jair Bolsonaro. Saudosistas do “milagre econômico”, porém, movem uma guerra surda contra o ministro da Economia, Paulo Guedes, para mudar a política econômica e retomar o velho projeto nacional-desenvolvimentista. Sem chances de dar certo.
Covid-19 destrói vidas e impõe ameaças à cultura indígena, mostra reportagem
Revista Política Democrática de agosto revela Estados com mais mortes de indígenas vítimas da doença e o caminho do coronavírus até as aldeias
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
"Quando morre um cacique, a comunidade perde um líder. Quando morre um mestre e um ancião, é um livro cheio de informações que se fecha para sempre". No início do mês, a frase do neto do cacique Raoni Metuktire, Patxon Metuktire, repercutiu na internet em honra à vida e história do líder do Alto Xingu, Aritana Yawalapitit (71 anos), que morreu por complicações da covid-19. Entre os povos indígenas, os efeitos da doença são ainda muito maiores, já que a falta de atenção à saúde e proteção deles os deixam ainda mais vulneráveis à destruição de vidas, mitos, línguas e tradições milenares.
O trecho acima é parte da reportagem especial da revista Política Democrática Online de agosto, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. A instituição disponibiliza, gratuitamente, o acesso a todas as edições da publicação em seu site.
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Levantamento publicado pela reportagem detalha os Estados com mais mortes de indígenas vítimas da covid-19 no Brasil. No total, quase 24 mil foram infectados pelo coronavírus, em 148 comunidades dos povos tradicionais. O texto também revela o caminho da contaminação, destacando que a doença chega às aldeias principalmente por meio das rodovias e profissionais de saúde que não vivem nas comunidades.
“Não há monitoramento de acesso aos territórios tradicionais para fazer testagem das pessoas, como caminhoneiros, que trafegam nas estradas do país, além de garimpeiros e madeireiros ilegais que invadem os territórios para devastarem a floresta”, diz um trecho da matéria.
Ao todo, 900 mil indígenas vivem em todo o país. Nos territórios, cada morte provoca um apagão sobre a cultura milenar, já que anciãos servem como autoridades morais, conselheiros espirituais e detentores de conhecimento e memória para os povos indígenas.
Cacique desde os 19 anos e um dos líderes mais antigos e respeitados do Alto Xingu, Aritana Yawalapitit era um dos últimos falantes da língua yawalapiti, do tronco linguístico aruak, e conhecido por lutar pela defesa dos povos indígenas, principalmente pela preservação das terras conquistadas. Ficou internado por duas semanas após ser contaminado pelo coronavírus. Morreu, em Goiás, em 5 de agosto, no mês em que é celebrado o Dia Internacional dos Povos Indígenas. O líder havia sido transferido de Mato Grosso.
A reportagem da revista Política Democrática Online de agosto também mostra que tem aumentado a tensão entre o governo brasileiro e as lideranças indígenas. Além disso, mostra avaliação do antropólogo Mércio Pereira Gomes, ex-presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), dizendo que “os índios não vão se acabar”.
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Luiz Carlos Azedo: A modernização autoritária
“Cingapura virou uma referência em desenvolvimento em todos os quadrantes, da Europa à América Latina, da África à Ásia. Muitos sonham com a longevidade do poder de Lee Yew”
Ao contrário do que muitos imaginam, o paradigma do projeto comunista da China não é o velho livro vermelho com as ideias de Mao Zedong, é o pensamento modernizador de Xi Jinping e o modelo de Cingapura, estudado na nova escola de quadros do Partido Comunista chinês. Fundada há 86 anos numa caverna da província de Jiangxi, o complexo da academia hoje ocupa centenas de hectares junto ao Palácio de Verão de Pequim e abriga 1,5 mil alunos. Em 2018, a escola se fundiu com a Academia Chinesa de Governo para incorporar um novo objetivo: “investigar e disseminar o pensamento de Xi sobre o socialismo com caraterísticas chinesas para uma nova era”.
A grande preocupação dos dirigentes chineses continua sendo vencer a desigualdade social na China de hoje, uma contradição com as teses históricas do PCCh. Centenas de milhões de chineses saíram da pobreza nas últimas décadas, mas as grandes fortunas acumuladas na economia de mercado coexistem com salários baixíssimos e condições de vida precárias, em muitas regiões do país. O medo dos comunistas é que o avanço tecnológico e as vertiginosas mudanças possam afastar os jovens do regime. O massacre de Tiananmen, de 1989, e a Revolução Cultural (1966-1976) são temas proibidos nos currículos da escola de quadros, vértice de um sistema com 2,5 mil centros distribuídos por todo o país. Onde Cingapura entra nessa história?
Com seus arranha-céus, jatinhos particulares e carros de luxo, a cidade-estado, apesar de ter apenas 5,6 milhões de habitantes — contra 1,393 bilhão da China —, é o quarto país mais rico do mundo em poder de compra de seus habitantes, superado por Catar, Luxemburgo e Macau. Tornou-se um dos principais centros financeiros do Oriente, com número crescente de milionários e o custo de vida mais alto do mundo. Há 50 anos, porém, era apenas uma ilha pobre e sem recursos naturais, uma ex-colônia britânica que se separou da Malásia em 1965, sob a liderança de Lee Kuan Yew, cofundador do Partido da Ação Popular (PAP, na sigla em inglês), que governa o país desde 1959. Lee foi primeiro-ministro de Cingapura por 31 anos, vencendo sete eleições, até deixar o poder em 1985. Vem daí o paradigma político que interessa aos chineses: o regime de partido dominante, hoje comandado por Lee Hsien Loong, seu filho mais velho.
O sistema legal de Cingapura é baseada em leis herdadas do colonialismo britânico na Índia, sem seus valores liberais. Não existe tribunal de júri, por exemplo. Há castigos físicos e até a pena de morte para homicídios e tráfico de drogas, o que leva à maior taxa de execuções do mundo por habitante. Entretanto, é considerado um dos países menos corruptos do mundo, embora seja um notório paraíso fiscal para lavagem de dinheiro. Não existe ampla liberdade de expressão nem de reunião. Qualquer manifestação com mais de cinco pessoas precisa de autorização policial. Entretanto, o modelo econômico que viabilizou a modernização de Cingapura é estudado em todo mundo, principalmente nos países emergentes.
Corrida mundial
Advogado formado na Universidade de Cambridge, Lee foi uma espécie de déspota esclarecido moderno. Comandou o país durante sua fusão e a subsequente separação da Malásia, com a ambição de construir uma nação meritocrática e multirracial. Elaborou um extenso programa de reformas para tirar Cingapura do “buraco negro da miséria e da degradação” e transformá-la em um país industrializado e moderno, sob um modelo capitalista com controle estatal rígido. Beneficiou-se do fabuloso porto que abrigava a esquadra britânica da Ásia e sua localização estratégica, na rota comercial da China, da Índia e do Sudeste Asiático, além da proteção dos Estados Unidos.
O governo promoveu grandes programas de geração de emprego e a construção de moradias sociais, ao lado de uma política que acompanhava o controle da vida privada e a supressão de liberdades individuais, incluindo a prisão de opositores sem levá-los a julgamento e a aplicação de castigos corporais. Impressiona pelos altos níveis de educação, saúde e competitividade econômica, saltando de uma economia baseada na manufatura tradicional para um centro financeiro e tecnológico, com grandes investimentos estrangeiros, com uma população que fala quatro línguas: malaio, inglês, mandarim e tamil. Suas forças armadas são modernas, seguem o modelo israelense, e consomem 4,5% do orçamento, com bases aéreas na Austrália, Estados Unidos e França.
Cingapura virou uma referência para a modernização autoritária em todos os quadrantes, da Europa à América Latina, da África à Ásia. Muitos governantes sonham com a longevidade do poder de Lee Kuan Yew, como Vladimir Putin, na Rússia, e Tayyip Erdogan, na Turquia, sem falar nos ditadores de antigas repúblicas soviéticas e da África, além dos xeiques árabes. Tornou-se um ponto de referência na corrida mundial para reinventar o Estado, na qual o Ocidente enfrenta os problemas da economia de mercado aliados às disputas próprias dos regimes democráticos. Por isso, é melhor é ficar de olho no que acontece na política brasileira. Historicamente, sempre estivemos numa encruzilhada entre o Oriente e o Ocidente.
‘Congresso tem se omitido na definição do papel das Forças Armadas’, diz Raul Jungmann
Em artigo publicado na revista Política Democrática Online de agosto, editada pela FAP, ex-ministro alerta para o risco de ‘ilusão suicida’
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
Congresso Nacional deve assumir suas responsabilidades e definir os rumos da defesa nacional e das Forças Armadas, sob pena de amanhã ser qualificado como agente omisso do nosso destino, defesa e democracia, avalia o ex-ministro Raul Jungmann, em artigo que publicou na edição de agosto da revista Política Democrática Online. A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), em Brasília. A instituição disponibiliza, gratuitamente, o acesso a todas as edições em seu site.
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Jungmann é ex-deputado federal. Foi ministro do Desenvolvimento Agrário e ministro Extraordinário de Política Fundiária do governo FHC (Fernando Henrique Cardoso), ministro da Defesa e ministro Extraordinário da Segurança Pública do governo Michel Temer. “Num mundo com riscos de conflito em alta, em que armas baseadas em tecnologias disruptivas são desenvolvidas, em que o sistema de contenção da corrida nuclear vem sendo desmontado e no qual países incrementam seus orçamentos de defesa, nos imaginarmos uma ilha de paz perpétua é ilusão suicida", alerta.
Em sua análise, Jungmann faz duras críticas ao parlamento brasileiro. "Até aqui, o Congresso tem se omitido na definição do papel das Forças Armadas nesse abrangente contexto”, afirma, para continuar: “Exemplo disso, a política e a estratégia anteriores, de 2016 a 2020, foram aprovadas pelo Senado e Câmara em votação simbólica sem debates e sem participação da sociedade".
O autor lembra, em seu texto, que a política de defesa e a estratégia de defesa de 2016, enviadas em 18 de novembro daquele ano, só lograram aprovação em 17 de dezembro de 2018, dois anos após. “Não sancionadas pelo presidente Temer, de saída, também não o foram pelo presidente atual, ficando o Brasil com oito anos de defasagem nessa área, contando apenas como os textos de 2012”.
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‘Falta tudo à educação brasileira’, diz Arnaldo Niskier à Política Democrática Online
Em entrevista à revista mensal da FAP, professor alerta para o apagão educacional no país
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
Membro da Academia Brasileira de Letras e ex-membro do Conselho Nacional de Educação, o professor Arnaldo Niskier avalia que o país sofre sem um plano nacional de educação e com o principal órgão – o Ministério da Educação – minado por uma gestão precária que mistura ideologia com gestão escolar. "Essa mistura não é saudável: prejudica os beneficiários do processo – os estudantes", avalia, em entrevista concedida ao ex-senador Cristovam Buarque e ao sociólogo Caetano Araújo, publicada na revista Política Democrática Online de agosto. “Falta tudo à educação brasileira”, diz.
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A revista mensal é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. Todas as edições podem ser acessadas, gratuitamente, no site da instituição. Niskier é autor de mais de 100 livros, especialmente sobre educação, professor aposentado de História e Filosofia da Educação da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e doutor em Educação pela mesma instituição. Foi membro do Conselho Federal de Educação, do Conselho Estadual de Educação e do Conselho Nacional de Educação e secretário de Estado do Rio de Janeiro por quatro vezes.
Na entrevista exclusiva, Niskier lembra que o Brasil tem 60 milhões de estudantes nas escolas do país, os quais, na opinião do especialista, estão mal servidos. “Não estão tendo a cobertura devida para suas necessidades, e isso é, sem dúvida, negativo”, lamenta.
De acordo com Niskier, “o país precisa que o Ministério da Educação acorde definitivamente” para montar uma equipe positiva, que se preocupe com os verdadeiros problemas da educação, e não faça da ideologia um procedimento prioritário. “Porque não é essa a prioridade do nosso país", avalia.
Em outro trecho, ele critica à falta de estrutura de tecnologia nas escolas. “"A grande maioria de nossas escolas, de um total de 190 mil escolas em todo o Brasil, ainda não tem condições operacionais legítimas, diante da ausência da internet. E como funcionar sem internet? Não dá", afirma.
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Luiz Carlos Azedo: O projeto conservador
“A dois anos do bicentenário da independência, as ideias de Oliveira Viana parecem renascer das cinzas, como fênix, diante da grande interrogação: que país seremos daqui a 100 anos?”
Há 100 anos, o livro de um autor até então desconhecido, com 37 anos, fez estrondoso sucesso literário e político: Populações Meridionais do Brasil, de Oliveira Viana. Escrito entre 1916 e 1918, levou dois anos para ser publicado, pela livraria José Olympio. Somente um intelectual da época ousou contestá-lo, Astrojildo Pereira, um dos grandes biógrafos de Machado de Assis, jornalista, crítico literário e anarquista, que se converteria ao marxismo e, dois anos depois, fundaria o Partido Comunista. O que dizia Viana? Ele definia três arquétipos para o povo brasileiro: o sertanejo, o matuto e o gaúcho, os quais pretendia analisar, desenvolvendo um projeto de pesquisa ambicioso, ao qual deu sequência com a publicação meteórica de mais quatro ensaios: O Idealismo da Constituição (1920), Pequenos Estudos da Psicologia Social (1921), Evolução do Povo Brasileiro (1923) e O Ocaso do Império (1924). O primeiro volume de Populações Meridionais do Brasil dedicou aos paulistas, fluminenses e mineiros; o segundo, ao campeador rio-grandense. Partia do homem para criticar as instituições da época.
“O sentimento das nossas realidades, tão sólido e seguro nos velhos capitães gerais, desapareceu, com efeito, das nossas classes dirigentes: há um século vivemos praticamente em pleno sonho. Os métodos objetivos e práticos de administração e legislação desses estadistas coloniais foram inteiramente abandonados pelos que têm dirigido o país depois da independência. O grande movimento democrático da Revolução Francesa; as agitações parlamentares inglesas; o espírito liberal das instituições que regem a república americana, tudo isto exerceu e exerce sobre nossos dirigentes, políticos, estadistas, legisladores, publicistas, uma fascinação magnética que lhes daltoniza completamente a visão nacional dos nossos problemas. Sob esse fascínio inelutável, perdem a noção objetiva do Brasil real e criam para uso deles um Brasil artificial e peregrino, um Brasil de manifesto aduaneiro, made in Europa, sorte de Cosmorama extravagante. Sobre o fundo de florestas e campos, ainda por descobrir e civilizar, passam e repassam cenas e figuras tipicamente europeias.”
Oliveira Viana faz um ataque frontal aos liberais brasileiros, corroborado pela iniquidade social que havia sido desnudada por Euclides da Cunha, ao descrever a Guerra de Canudos, n’Os Sertões. Concluía que era preciso “coragem infinita” para “contravir ostensivamente às ideias de liberdade e construir um poderoso Estado centralizado, capaz de impor-se a todo o país pelo prestígio fascinante de uma grande missão nacional”. Ao dizer que era impossível reproduzir aqui no Brasil o parlamentarismo inglês, o liberalismo democrático à francesa, ou o federalismo e descentralização republicana ao estilo americano, como lembra o falecido jornalista e cientista político Gildo Marçal Brandão, em Linhagens do Pensamento Político Brasileiro (Hucitec), Oliveira Viana recomendava uma intervenção radical pelo Estado, destinado a promover a industrialização e criação de bases sociais aptas a sustentar governos liberais, o que alguns viram como uma espécie de “autoritarismo instrumental”.
Estado Novo
Música para a jovem oficialidade do Exército, que daria início às rebeliões tenentistas, e para o castilhismo gaúcho, o suprassumo do nosso republicanismo positivista mais autoritário, que desaguariam na Revolução de 1930. A consagração das ideias antissistema de Oliveira Viana viria com o Estado Novo, do qual foi o grande ideólogo, e a “Polaca”, a Constituição de 1937, redigida por Francisco Campos e outorgada pelo ditador Getúlio Vargas. Ironicamente, Jorge Caldeira, em História da Riqueza no Brasil (Estação Brasil), destaca que o colapso político da República Velha interrompe mudanças importantes que estavam em curso, alavancadas por nosso mercado interno e a economia do sertão, como o aumento de rentabilidade da exportação de café, a grande acumulação de capital dos cafeicultores paulistas, que apostaram na industrialização, e não no patrimonialismo, ao contrário das oligarquias rurais que Viana enaltecera.
Segundo Caldeira, em 1920, o Brasil tinha 30 milhões de habitantes, 13,3 mil indústrias, 275 mil operários, produzia 775Gwh de energia elétrica. O Correio transportava 642 milhões de itens. Havia 28,5 mil quilômetros de ferrovias, que transportavam 16,5 milhões de toneladas. Os investimentos, estagnados durante a guerra, eram de 1,1 milhão de libras esterlinas e chegariam a 2,8 milhões, em 1929. Exportava-se 11,5 milhões de sacas de café, cujo rendimento era de 40,4 milhões de libras esterlinas. O percentual da população alfabetizada chegava a 28,8%. Era uma época em que o Estado arrecadava 6% do PIB, ou seja, o setor privado ficava com 94%. A União era responsável por 3,5% desse montante, os Estados com 2,% e os municípios com 0,5%. O país crescia graças ao desenvolvimento capitalista, a conexão entre a economia do sertão e a economia de exportação financiava a industrialização.
Entretanto, o Centenário da Independência desencadearia o questionamento de quase tudo, com a Semana de Arte Moderna, a criação do Partido Comunista, as rebeliões tenentistas, como a Revolta Paulista de 1924 e a Coluna Prestes, no mesmo ano. Qual seria o projeto de país para os 100 anos seguintes? À época, esse debate foi hegemonizado pelas ideias de Oliveira Viana, que tiveram sua grande recidiva após o golpe de 1964, no Sesquicentenário da Independência, no auge “milagre econômico” do regime militar. Agora, no governo Bolsonaro, a dois anos do bicentenário da independência, elas parecem renascer das cinzas, como fênix, diante da grande interrogação: que país seremos daqui a 100 anos?
Oposições devem impulsionar convergência, diz revista Política Democrática Online
Revista mensal da FAP alerta para “calmaria aparente” do governo do presidente Jair Bolsonaro
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
“Mais do que nunca”, é preciso impulsionar o processo de convergências das oposições democráticas no Brasil, diz o editorial da revista mensal Política Democrática Online de agosto. A calmaria por parte do governo do presidente Jair Bolsonaro, segundo o texto, é “aparente”. “As movimentações autoritárias prosseguem: o momento da tempestade está contratado por atores relevantes da política”, afirma. A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. A entidade disponibiliza todas as edições, gratuitamente, em seu site.
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De acordo com o editorial, a convergência das oposições democráticas deve ter três objetivos: envolver na estratégia de defesa da democracia setores do próprio governo; atuar conjuntamente no sentido de esclarecer a opinião pública acerca das perdas colossais impostas aos brasileiros hoje; e cooperar nos embates institucionais que se avizinham, das mudanças na composição do STF (Supremo Tribunal Federal) às eleições municipais, de modo a maximizar o fortalecimento da democracia.
O editorial observa que completou-se mais um mês o novo figurino adotado por Bolsonaro. “Não mais confrontos com o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal; não mais ameaças, veladas ou não, ao funcionamento regular das instituições”, diz o texto, para continuar: “Aparentemente, o bloco parlamentar apelidado de ‘centrão’ teria logrado surpreendente e rápido sucesso, tanto na tarefa na de convencer o Presidente a transitar pelos meandros da ordem democrática, como na de guiá-lo nesse percurso”.
Dois fatos recentes, de acordo com o editorial da nova edição da revista Política Democrática Online, evidenciam a fragilidade dessa avaliação otimista. “Em primeiro lugar, os relatos da reunião de 22 de maio, na qual a possibilidade de destituição da totalidade dos membros do STF, mediante força militar, teria sido debatida, com seriedade, por ministros militares e civis”, observa, em um trecho.
O texto também diz que a denúncia do funcionamento, na estrutura do Ministério da Justiça, de um órgão encarregado da investigação de servidores públicos suspeitos de ativismo antifascista. Destaca, também, que a polícia política não tem lugar no ordenamento legal do país, e as ameaças concretas à ordem democrática não partem exatamente de militantes que trabalham na defesa dos direitos humanos.
“Tudo indica, portanto, que a calmaria que experimentamos se limite à superfície da política, ao passo que, nas profundezas, prosseguem os movimentos na direção do fortalecimento do presidente e da criação de condições para a decretação da ‘intervenção’ almejada no momento propício”, alerta.
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Luiz Carlos Azedo: Cheiro de queimado
“Bolsonaro quer transformar o abono emergencial no Renda Brasil, uma espécie de Bolsa Família três vezes maior do que o programa que herdou do ex-presidente Lula”
Quem quiser que se iluda, o ministro da Economia, Paulo Guedes, arde numa frigideira em plena Esplanada dos Ministérios. Ontem, o subsecretário de Política Macroeconômica do Ministério da Economia, Vladimir Kuhl Teles, deixou o cargo. Era o número dois da Secretaria de Política Econômica do ministério, comandada por Adolfo Sachsida. Publicamente, alegou razões pessoais. Na semana passada, dois membros do primeiro time da equipe de Guedes haviam deixado a pasta: os secretários de Desestatização, Salim Mattar, e de Desburocratização, Paulo Uebel. Guedes tem sinalizado para o mercado que não pretende deixar o cargo, porém perde liderança sobre sua própria equipe.
A fritura de Guedes segue um rito que está se consolidando no Palácio do Planalto como um método de descarte dos ministros. O presidente Jair Bolsonaro prestigia o auxiliar publicamente, mas nos bastidores nada faz para evitar que seja desgastado por notícias de que o ministro já não está mais afinado com o presidente da República. Em termos de política econômica, Bolsonaro pretende “furar o teto de gastos” e só falta encontrar um meio para disfarçar a pedalada fiscal. Não à toa, todo o mercado já precifica a flexibilização da política fiscal, com a Bolsa em queda e o dólar em alta. Mas há duas leituras sobre o futuro de Guedes: uma de que acabará substituído no cargo por Bolsonaro; outra, de que está lutando para ficar, fazendo o que pode para aumentar os gastos do governo sem perder a narrativa da responsabilidade fiscal.
Os dados estão sendo lançados no tabuleiro. A situação da economia não é fácil. Bolsonaro sobrevoa o Nordeste em céu de brigadeiro, por causa do abono emergencial, mas Guedes navega num mar proceloso. Ontem, o relatório do Instituto Fiscal Independente, mantido pelo Senado, registrava queda de 8% do PIB no segundo trimestre (menos mal, a previsão era um tombo de 10,6%); recuperação de alguns setores da indústria e do comércio; recessão de 6,5% em 2020. Redução do número de pessoas ocupadas de 93,3 milhões em junho de 2019 para 83,3 milhões em junho deste ano. Perda de receita líquida de 2,5% do PIB no primeiro semestre; crescimento de 40,3% da despesa primária no semestre; aumento de 9,7% da dívida bruta do governo entre dezembro 2019 e junho de 2020.
Abono permanente
O xis da questão é que os créditos extraordinários para o combate à covid-19 já somam R$ 511,3 bilhões. Calcula-se que o deficit fiscal deste ano deve chegar a R$ 800 bilhões, o que elevará a dívida pública a quase 100% do PIB. Perto desses valores, os R$ 35 bilhões a mais pretendidos pelos ministros da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, e do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, seriam um aumento de mais de 6% do montante do que o governo gastou com a pandemia. O problema é que não dá para enquadrar esses gastos, que se destinam à realização de obras nos estados e municípios controlados pelos aliados do governo, no programa de emergência aprovado pelo Congresso. Por isso, Guedes somente se comprometeu com a liberação de R$ 5 bilhões.
Mas o problema maior não é esse. É o abono emergencial de R$ 600, que alavancou a popularidade de Bolsonaro junto às parcelas mais pobres da população, com reflexo, inclusive, na redistribuição de renda, transferida da classe média para as famílias na miséria absoluta ou quase. Ele quer transformar o abono emergencial na Renda Brasil, uma espécie de Bolsa Família turbinada, isto é, três vezes maior do que o programa que herdou do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Guedes precisa resolver essa equação. Se não atender ao desejo de Bolsonaro, que mira a reeleição, terá de deixar o governo.
No fundo, consolidou-se na Esplanada dos Ministérios e no Congresso um bloco político que deseja uma mudança de rumos na política econômica. O velho nacional-desenvolvimentismo renasce das cinzas no Palácio do Planalto.
Gargalos da educação e covid-19 entre indígenas são destaques da Política Democrática Online
Edição do mês de agosto também analisa governo Bolsonaro e aproximação dele com Joe Biden
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
Prejuízos da mistura de ideologia e gestão educacional no Brasil, efeito devastador da covid-19 nos povos indígenas, apelo contra omissão do Congresso na definição do papel das Forças Armadas e possível aproximação do presidente Jair Bolsonaro com o americano Joe Biden são destaques da revista Política Democrática Online de agosto. A nova edição da publicação mensal, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), em Brasília, foi lançada nesta sexta-feira (14) e tem acesso totalmente gratuito no site da entidade.
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No editorial, a revista observa que completa-se mais um mês o novo figurino adotado por Bolsonaro. “Não mais confrontos com o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal; não mais ameaças, veladas ou não, ao funcionamento regular das instituições”, diz um trecho. “Aparentemente, o bloco parlamentar apelidado de ‘centrão’ teria logrado surpreendente e rápido sucesso, tanto na tarefa na de convencer o presidente a transitar pelos meandros da ordem democrática, como na de guiá-lo nesse percurso”, afirma.
Na entrevista especial concedida à nova edição da revista Política Democrática Online, o professor Arnaldo Niskie, membro da Academia Brasileira de Letras e ex-membro do Conselho Nacional de Educação, avalia que o país sofre sem um plano nacional de educação e com o principal órgão – o Ministério da Educação – minado por uma gestão precária que mistura ideologia com gestão escolar. "Essa mistura não é saudável. Prejudica os beneficiários do processo – os estudantes", avalia.
A reportagem exclusiva desta edição faz ecoar o grito de socorro dos povos indígenas no Brasil, que, cada vez mais, tornam-se vítimas da Covid-19. A doença já matou mais de 600 indígenas no país, como é o caso do líder do Alto Xingu Alto Xingu, Aritana Yawalapiti. Mais de 23 mil indígenas já foram infectados pelo coronavírus. “Entre os povos indígenas, os efeitos da doença são ainda muito maiores, já que a falta de atenção à saúde e proteção deles os deixam ainda mais vulneráveis à destruição de vidas, mitos, línguas e tradições milenares”, diz um trecho.
Em seu artigo, o ex-ministro da Defesa ex-ministro Extraordinário da Segurança do governo Michel Temer, Raul Jungmann faz um apelo ao Congresso Nacional para “assumir suas responsabilidades e definir os rumos da defesa nacional e das Forças Armadas, sob pena de ser qualificado como agente omisso do destino, da defesa e da democracia”. “Até aqui, o Congresso tem-se omitido na definição do papel das Forças Armadas”, alerta.
Já o diretor do Irice (Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior), o diplomata Rubens Barbosa, observa, em seu artigo, que, diante de uma provável vitória de Joe Biden, Bolsonaro está seguindo o conselho de John Bolton, ex-secretário de segurança nacional de Trump, que recomendou ao Brasil fazer pontes com o candidato democrata. O desafio geopolítico talvez seja o dilema mais sério para o governo brasileiro, caso Trump seja derrotado.
A revista Política Democrática Online de agosto também tem artigos sobe modulações da guerra de Bolsonaro, novas perspectivas da covid-19 sobre a economia e novo contexto da política monetária, além de análises sobre cultura. A publicação é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado e tem o conselho editorial formado por Alberto Aggio, Caetano Araújo, Francisco Almeida, Luiz Sérgio Henriques e Maria Alice Resende de Carvalho.
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Luiz Carlos Azedo: A fome do Centrão
“A vida de Guedes não será fácil: remanejar R$ 5 bilhões do orçamento deste ano, cujo deficit deve chegar a R$ 800 bilhões, para investir em obras públicas nos estados e municípios”
O acordo com o Centrão custará R$ 5 bilhões ao Tesouro da União, em plena pandemia, por causa das eleições municipais deste ano. Esse foi o trato feito pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, com o presidente Jair Bolsonaro, para manter o “teto de gastos” e, ao mesmo tempo, atender à demanda de investimentos em obras dos parlamentares do Centrão, que se articulam com os ministros da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, e do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e os militares do Palácio do Planalto, entre os quais o general Luiz Ramos, secretário de Governo. A pressão decorre das demandas de prefeitos e vereadores que apoiam os parlamentares que agora integram o esquema de sustentação política de Bolsonaro no Congresso.
O velho toma lá, dá cá renasce das cinzas a cada eleição municipal. O acordo foi sacramentado na reunião de Bolsonaro com Guedes, os ministros e os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), além dos senadores Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo no Senado, e Eduardo Braga (AM), líder do MDB; e os deputados Arthur Lira (AL), líder do Progressistas, e Ricardo Barros (Progressistas-PR), novo líder do governo na Câmara. Todas raposas felpudas do Congresso, profissionais da política que conhecem o caminho das pedras das verbas federais e as articulações parlamentares que miram as eleições municipais.
Em princípio, o tsunami que ocorreu nas eleições passadas pode até não se repetir, mas mesmo que venha a ocorrer nas municipais, sobretudo nas grandes cidades, não será com o protagonismo do presidente. Bolsonaro voltou ao leito natural em que sempre atuou ao longo da carreira parlamentar: a defesa de interesses corporativos e as alianças com parlamentares das bancadas evangélica, ruralista e da bala, além do baixo clero. Não se deve subestimar, também, a lógica própria das eleições municipais. As disputas locais, desde a primeira eleição, na antiga comarca de São Vicente, em São Paulo, em 1532, sempre foram muito “fulanizadas” e polarizadas em função do controle das respectivas prefeituras. Entretanto, estabelecem as bases para a eleição ou não da maioria dos deputados estaduais, federais e senadores.
A vida de Guedes não será fácil, pois cumprir o acordo significa remanejar recursos do orçamento deste ano, cujo deficit deve chegar a R$ 800 bilhões, devido aos gastos emergenciais com a pandemia. R$ 5 milhões, porém, são café pequeno em comparação às verbas de investimento que os ministros “gastadores”, como são chamados na equipe econômica, exigem para o programa de investimentos para o ano de 2021: R$ 35 bilhões. De onde virá esse dinheiro? Até agora ninguém sabe, porque a proposta da nova Lei de Diretrizes Orçamentárias ainda não foi apresentada. Ou seja, teremos ainda grandes emoções pela frente nessa queda de braço de Guedes com os ministros Tarcísio de Freitas e Rogério Marinho, apoiados pelos militares.
Arapongagem
A maioria do Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento realizado ontem, resolveu pôr limites à arapongagem no governo Bolsonaro. Com base em relatório da ministra Cármem Lúcia, decidiu que o fornecimento de informações por órgãos do governo à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) só seja feito com motivação específica e levando em conta o interesse público. Os ministros julgaram ação apresentada pela Rede Sustentabilidade e pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). As legendas questionavam o fornecimento à Abin de dados fiscais, bancários, telefônicos e informações de inquéritos policiais ou da base de dados da Receita Federal e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), atual Unidade de Inteligência Fiscal (UIF), sem autorização judicial. A decisão deve influenciar o julgamento, no próximo dia 19, do caso do dossiê de servidores antifascistas elaborado pelo setor de inteligência do Ministério da Justiça, que extrapolou suas funções.
Na prática, a decisão barra a formação de um Sistema Brasileiro de Inteligência nos moldes do antigo Serviço Nacional de Informações (SNI) do regime militar, que seria composto por 42 órgãos de ministérios e instituições federais, de áreas como segurança, Forças Armadas, saúde, transportes, telecomunicações, fazenda e meio ambiente —, todos centralizados pela Abin. Bolsonaro, por decreto, havia aumentado o poder da agência em obter dados de cidadãos e de investigações. Segundo a ministra, relatora da ação, o compartilhamento de dados com a Abin tem de ser feito obedecendo ao que prevê a Constituição, que veda o acesso a informações sigilosas. A ministra afirmou que a “arapongagem (para usar uma expressão vulgar, mas que agora está em dicionário: ‘aquele que ilicitamente comete atividade de grampos’) é crime”. Foi acompanhada pelos ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Rosa Weber e Alexandre de Moraes. Marco Aurélio votou contra.
Luiz Carlos Azedo: A âncora da estabilidade
”Embora desanuviada, a crise permanece, porque o cobertor está curto para fazer o que Bolsonaro deseja: aumentar os investimentos com recursos do Tesouro, sem reformas”
Foi um dia de muito nervosismo no mercado e no Palácio do Planalto, a ponto de o presidente Jair Bolsonaro ter de chamar uma reunião de ministros e parlamentares de sua base, com o ministro da Economia, Paulo Guedes, em razão da péssima repercussão da saída de dois integrantes da equipe econômica, que jogaram a toalha devido à falta de compromisso do governo com a reforma administrativa e as privatizações. Os secretários especiais de Desestatização e Privatização, Salim Mattar, e de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Paulo Uebel, pediram demissão na terça-feira, o que pegou Guedes de surpresa. O ministro abriu o jogo para opinião pública: há uma “debandada” na equipe, por causa dos rumos do governo.
Guedes não escondeu seu desconforto e revelou a crise interna do governo na terça-feira, após uma reunião com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), hoje o seu principal aliado na defesa do chamado “teto de gastos”, que vincula as despesas do Orçamento da União à inflação passada, como uma maneira de conter e reduzir, ao longo do tempo, o deficit fiscal. O que era um deficit previsto de R$ 134 bilhões neste ano, com os gastos decorrentes das medidas emergenciais para enfrentar a pandemia, deve chegar à casa dos R$ 800 bilhões, fazendo a dívida pública se aproximar dos 100% do PIB no fim do ano. Esse é o tamanho do problema. O mercado vê com desconfiança a capacidade de Guedes administrar essa dívida.
Colabora para isso o fato de que outros cinco integrantes da equipe econômica já haviam deixado o governo desde o ano passado: Marcos Cintra (ex-secretário da Receita Federal), Caio Megale (ex-diretor de programas da Secretaria Especial de Fazenda), Mansueto Almeida (ex-secretário do Tesouro Nacional), Rubem Novaes (ex-presidente do Banco do Brasil) e Joaquim Levy (ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BNDES). Mas nenhum deles tinha a mesma proximidade de Mattar e Uebel com Guedes, com o agravante de que o primeiro é um líder empresarial carismático, cuja saída teve muito mais repercussão no mercado.
Nos bastidores do Ministério da Economia, a avaliação é de que o grupo de executivos e empresários liberais que cercava Guedes não aguentou o giro da moenda da administração pública federal e o jogo bruto de poder na Esplanada dos Ministérios, principalmente com os militares. A saída dos dois auxiliares e amigos deixou Guedes muito abalado, mas o ministro amanheceu, ontem, disposto a partir para a briga pela manutenção do teto de gastos contra seus colegas de Esplanada, aparentemente com a solidariedade do presidente Jair Bolsonaro. A reunião de ontem à tarde, no Palácio do Planalto, com Guedes e seus desafetos na Esplanada, os ministros Rogério Marinho, do Desenvolvimento Regional, que foi seu secretário de Previdência, e o ministro Tarcísio Freitas, da Infraestrutura, foi para Bolsonaro pôr ordem na tropa e começar a negociação da manutenção do teto com o Congresso.
Novo líder
Também participaram do encontro os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP); e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ); os deputados Arthur Lira (PP-AL) e Ricardo Barros (PP-PR), e os senadores Eduardo Gomes (MDB-TO) e Fernando Bezerra (MDB-CE). A novidade foi a presença de Barros, ministro da Saúde no governo Michel Temer, que será o novo líder do governo na Câmara. Bolsonaro trocou o deputado Major Vítor Hugo (PSL-GO), seu fiel escudeiro, por um dos quadros mais importantes do Centrão na Câmara, unificando o grupo, cuja liderança Barros divide com Arthur Lira, o líder da bancada do PP.
Embora a crise tenha sido desanuviada, permanece, porque o cobertor está curto para fazer o que Bolsonaro deseja: aumentar os investimentos com recursos do Tesouro. Na equipe econômica, a avaliação é de que a antecipação da estratégia de reeleição de Bolsonaro está sendo um fator perturbador da política econômica. De certa forma, Guedes também tem culpa nesse cartório: na polêmica reunião ministerial de 22 de abril, foi um que pôs pilha em Bolsonaro, ao vincular o abono emergencial ao projeto eleitoral de 2022. Todo o problema, agora, é o fato de que Bolsonaro já está em campanha.
Há uma conta que não fecha. Guedes não consegue fazer as privatizações, seja porque os militares que comandam as estatais fazem obstrução, seja por falta de investidores, ou as duas coisas. Não faz a reforma administrativa porque Bolsonaro não quer confusão com os servidores públicos. Não consegue aprovar a nova CPMF porque essa sigla é palavrão para a opinião pública e para a maioria do Congresso. Sem reforma administrativa nem aumento de impostos, não tem teto de gastos que resista.