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'Não vejo o governo Bolsonaro capaz de se impor’, avalia Carlos Melo à Política Democrática online
Professor do Insper analisa política nacional e defende reforma da previdência justa, em entrevista da edição de dezembro da revista produzida pela FAP
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
O cientista político Carlos Melo, mestre e doutor pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), afirma que a deficiência do Executivo provocou uma transferência de poder para o Legislativo. “Não vejo o governo Bolsonaro capaz de se impor, de tomar a contento e moderadamente as rédeas do processo político”, destaca ele, em entrevista exclusiva concedida à revista Política Democrática online de dezembro. É gratuito o acesso a todos os conteúdos da publicação, no site da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), que produz e edita a revista. “A grande incógnita é se o Congresso terá o tipo de liderança necessária, após a presidência de Rodrigo Maia”, acrescenta.
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A FAP é vinculada ao Cidadania. Professor em tempo integral do Insper desde 1999, Carlos Melo é analista político com participação ativa em vários veículos de comunicação, palestrante e consultor de empresas nacionais e estrangeiras. Ele tem buscado contribuir com o debate político, econômico e social do Brasil por meio de uma análise conjuntural isenta e reflexão desapaixonada, conforme apresentado na revista Política Democrática online.
Na entrevista concedida ao consultor político e diretor da FAP Caetano Araújo, algumas reformas devem ser entendidas como clássicas e inevitáveis. “A reforma da previdência, uma reforma tributária, a questão do federalismo. Isso não tem a ver com direita ou esquerda, e o necessário ajuste deveria ser um ponto pacífico. Um imperativo”, afirma, para acrescentar: “Ninguém governa com desajustes fiscais. É necessária uma estrutura tributária que incentive a atividade econômica, senão não haverá emprego”, acentua.
Na avaliação do professor do Insper, a falta de líderes reflete na oposição ao governo Bolsonaro. “É preciso definir o que unifica a oposição. Qual é a pauta mínima para as oposições, no plural?”, questiona. “Eu diria que é a questão da democracia. Poderia haver também algum acordo em relação as reformas como a da Previdência”, avalia.
Colaborador de vários veículos de comunicação, é também colunista do UOL onde alimenta um Blog com análises a respeito da política brasileira (carlosmelo.blogosfera.uol. com.br), Melo é pesquisador de temas como eleições, partidos, conflito político e liderança política. “É imperativo uma reforma da previdência que seja justa e que envolva todos os setores da sociedade, que não proteja corporações; que não se volte apenas para o regime geral da previdência”, afirma.
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'A fiscalização do uso dos agrotóxicos no Brasil é inexpressiva', critica Randolfe Rodrigues à revista Política Democrática
Senador alerta para a crescente contaminação da água no país; publicação pode ser acessada de graça no site da FAP
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
“A fiscalização do uso dos agrotóxicos no Brasil é inexpressiva”, afirma o senador Randolfe Rodrigues (Rede), em artigo de sua autoria publicado na revista Política Democrática online de dezembro. A publicação tem acesso gratuito no site da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. “Governo Bolsonaro envenena o Brasil”, diz o parlamentar.
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De acordo com Randolfe, os critérios usados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para liberação de agrotóxicos, produzidos em uma escala nunca antes vista, são, no mínimo, questionáveis. “Essa situação pode ser bem ilustrada com o caso da reavaliação, em fevereiro deste ano, do agrotóxico glifosato, na qual o órgão concluiu que a substância não apresenta perigo para a saúde”, afirma ele. “No entanto, essa conclusão colide com estudos desenvolvidos em diversas instituições brasileiras e internacionais, como o Instituto Nacional do Câncer e a Agência Internacional para a Pesquisa do Câncer, ligada à OMS (Organização Mundial da Saúde)”, critica.
O senador da Rede cita, no artigo publicado pela revista Política Democrática online, que a contaminação da água está crescendo rapidamente. Em 2014, segundo ele, 75% dos testes realizados pelas empresas de abastecimento de 1.396 municípios detectaram todos os 27 agrotóxicos que são obrigados, por lei, a testar. Destes 27 produtos, conforme acrescenta, 21 estão proibidos na Europa. Esse percentual subiu para 84% em 2015, para 88% em 2016, chegando a 92%, em 2017.
“Toda essa grave situação piorou muito com o novo governo”, afirma Randolfe. Em outro trecho, o senador diz que “controle de agrotóxicos é assunto de grande complexidade e envolve poderosos interesses”. “Uma coisa é certa: não se pode mais admitir que, sob o pretexto de produzir alimentos baratos, a população brasileira seja obrigada a comer alimentos contaminados com substâncias cancerígenas e ter os recursos hídricos, o solo e o ar poluídos por tantas substâncias perigosas”, assevera o parlamentar.
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Brasil e Argentina têm nova tensão, explica Rubens Barbosa na Política Democrática de dezembro
Embaixador analisa relação entre os dois países da América do Sul em artigo publicado na revista produzida e editada pela FAP
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
O embaixador e presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), Rubens Barbosa, a relação entre os centros do poder do Brasil e da Argentina é marcada por nova tensão. Em artigo exclusivo de sua autoria publicado na edição de dezembro da revista Política Democrática online, ele afirma que “declarações de lado a lado acirraram os ânimos entre os presidentes, ministros e altos funcionários”.
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De acordo com o embaixador, a nova tensão entre Brasília e Buenos Aires ocorre por causa de uma escalada retórica em função de divergências ideológicas. No Brasil, há um governo de direita, liberal na economia e conservador nos costumes, e, na Argentina, um governo de centro-esquerda, que acabou de assumir o poder, avalia o autor, no artigo. Todos os conteúdos da revista podem ser acessados, gratuitamente, no site da FAP (Fundação Astrojildo Pereira) e são compartilhados nas redes sociais.
A política econômica e comercial do novo governo argentino, conforme o artigo publicado na revista Política Democrática online, passou a ser preocupação do governo brasileiro. Isto, segundo Barbosa, por causa da possibilidade de a abertura da economia e a ampliação da negociação externa do Mercosul serem contestadas por políticas protecionistas.
“Sinalizações, nesse sentido, poderiam questionar o comércio bilateral e a aprovação do acordo com a União Europeia. A retórica confrontacionista põe em risco, de um lado, o relacionamento político e diplomático e a cooperação econômica e comercial entre os dois parceiros. E, de outro lado, o futuro do Mercosul”, analisa o presidente do Irice para a Política Democrática online.
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Revista Política Democrática || Ruy Fabiano: O plágio, de Borges a Machado
Já se disse quase tudo de Machado de Assis, avalia Ruy Fabiano. Para ele, pouco, no entanto, se mencionou sobre o Machado vítima de plágio. Não um plágio qualquer, mas um cometido por outro gênio da literatura – ninguém menos que o argentino Jorge Luís Borges
A respeito de Machado de Assis já se disse quase tudo. Quase. Sua gigantesca fortuna crítica, que não para de crescer, é marcada por antagonismos. A controvérsia, que em vida lhe causava tédio, o enriquece e o torna ainda mais esfíngico perante a posteridade.
Como todo artista de gênio, Machado é um ser poliédrico, que pode ser lido e compreendido sob ângulos diversos, que aparentemente se contradizem, mas, ao final, formam uma unidade. Já se falou das influências francesas, inglesas, portuguesas, alemãs, espanholas, greco-romanas e judaicas na obra de Machado de Assis.
Já se falou do Machado cético, ateu, irônico, humorista; Machado apolítico e, inversamente, político; Machado alienado, habitante de uma torre de marfim ou, muito pelo contrário, engajado a seu modo nas questões políticas e sociais do Segundo Reinado, como constatou o crítico e ensaísta Astrojildo Pereira.
Poucos, no entanto, mencionaram (ou mesmo perceberam) o Machado vítima de plágio. Não um plágio qualquer, mas um cometido por outro gênio da literatura – ninguém menos que o argentino Jorge Luís Borges. Tudo começa no capítulo VI, de Memórias Póstumas de Brás Cubas, o Delírio, que Eça de Queiroz recitava de cor e proclamava antológico. Nele, Brás descreve sua própria alucinação.
Não bastasse a circunstância singular dessa descrição – já que o delírio interrompe a razão, ao passo que o relato literário é um exercício que exige razão –, seu conteúdo é ainda mais espantoso. E esotérico. Brás, depois de se constatar transformado na Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino, vê-se arrebatado por um hipopótamo, que o informa que irão “à origem dos séculos”. E o conduz ao alto de uma montanha, de onde, de certo ponto específico, vê passar por seus olhos, como “coisa única” uma redução dos séculos, “um desfilar de todos eles, as raças todas, todas as paixões, o tumulto dos impérios, a guerra dos apetites e dos ódios, a destruição recíproca dos seres e das coisas”.
Faz aí menção a um lugar do Universo em que a história humana – toda ela – estaria armazenada: passado e futuro, unificados num presente contínuo. Para descrever esse desfile dos séculos em turbilhão – diz Machado – seria preciso uma impossibilidade física: “fixar o relâmpago”.
Vejamos agora Borges.
O conto chama-se “O Aleph”, talvez o mais festejado de seu magnífico acervo. Na história de Brás Cubas, a perda de uma mulher, Virgília, que o troca por outro, o leva àquele estado delirante.
Em Borges, também uma perda feminina, a morte de Beatriz Viterbo, o leva a encontrar o Aleph, que, na definição do homem que dele lhe dá notícia, um poeta medíocre, que julga louco, chamado Carlos Argentino, é “um dos pontos do espaço que contém todos os pontos”. A mesma ideia de Machado, o mesmo fundamento esotérico.
Para contemplar o Aleph, o observador, em vez de subir ao topo de uma montanha (como Brás), deita-se ao rés do chão, no porão de uma casa em ruínas, prestes a ser demolida, e fixa o olhar numa escada velha. Muda o cenário em que cada personagem se instala, mas não o essencial, o que vê.
O personagem de Borges fixa o olhar na parte inferior do degrau, à direita, e percebe uma pequena esfera furta-cor, o Aleph. A partir daí, o que descreve é uma variante do delírio machadiano.
Diz ele:
“Naquele instante gigantesco, vi milhões de atos deleitáveis ou atrozes; nenhum me assombrou tanto como o fato de todos ocuparem o mesmo ponto, sem superposição e sem transparência. O que meus olhos viram foi simultâneo (...). ”
E descreve cenas análogas às de Brás Cubas: o desfile dos séculos, dos impérios, cenas locais de sua cidade, de seu bairro, de seu quarto, mescladas a cenas de outras civilizações e de outras eras, coisas que não entendia, coisas que reconhecia. O Todo em simultaneidade; o relâmpago fixo. A Memória Universal em desfile.
Em um e noutro – em Machado e em Borges –, o tom quase bíblico do relato, à maneira do Apocalipse de São João, igualmente arrebatado, na Ilha de Patmos, por visões místicas, que um psiquiatra não hesitaria em diagnosticar como “alucinações”.
Mas o que é uma alucinação: algo que se vê e não existe ou algo que existe, mas só se vê em estados especiais de consciência, como aqueles que Dostoiévski atribuía às pessoas acometidas de patologias mais graves? Em síntese, é uma ilusão ou uma instância da realidade, acessível e acessável apenas em momentos especiais?
Tais questionamentos permeiam tanto o relato de Machado como o de Borges. Mas há ainda outras coincidências: os personagens Brás e Carlos Argentino evocam seus respectivos países: Brás, de Brasil, e Argentino, de Argentina; e há ainda a semelhança dos nomes Virgília e Viterbo. Atos falhos?
Provavelmente, sim, o que não macula ou diminui a obra de Borges, que é indiscutivelmente original e grandiosa.
Mas, por óbvias razões cronológicas, Borges leu Machado, e Machado não leu Borges. Machado morreu em 1908, quando Borges tinha nove anos. Susan Sontag, no ensaio Vidas Póstumas – O Caso de Machado de Assis, se engana, ao afirmar que Memórias Póstumas só foi traduzido para o espanhol em 1960.
A obra de Machado começou a ser traduzida para o espanhol exatamente em Buenos Aires, a partir de 1940, quando Borges estava em plena atividade, não só como escritor, mas também como crítico literário e ensaísta. E o primeiro livro de Machado em castelhano foi, muito a propósito, Memórias Póstumas de Brás Cubas.
Carlos Fuentes, no ensaio Machado de La Mancha (Editora Fondo de Cultura, México, 2001), captou essas “coincidências” e registra que o próprio Borges, posto diante delas, as reconheceu, declarando: “Por incrível que pareça, acredito que exista (ou tenha existido) outro Aleph” – a que Fuentes acrescenta: “De fato: o de Machado de Assis”.
Maria Esther Vasquez, colaboradora e amiga de Borges por décadas, informou, em entrevista à Folha de S. Paulo, em 1999, por ocasião do lançamento da biografia Borges, Esplendor e Derrota, de sua autoria, que “havia dois escritores de língua portuguesa que ele (Borges) amava: Camões e Machado de Assis”. Borges, porém, nas numerosas entrevistas que concedeu ao longo de sua vida, jamais fez referências a Machado de Assis.
O escritor brasileiro que ele mencionava com frequência era Euclides da Cunha, mais especificamente, seu épico Os Sertões, que considerava obra-prima universal. Citava também dois outros autores de língua portuguesa, Eça de Queiroz e Camões. Ninguém mais.
É possível que tenha omitido Machado de Assis exatamente para não trair a influência. Euclides da Cunha, estilisticamente falando, nada tem a ver com Borges. Nem muito menos Eça ou Camões. Já Machado tem – e muito. Possuem afinidades de concisão, elegância, ironia e erudição, destilada com critério e precisão, em frequentes citações. Os dois tinham ainda em comum o amor à literatura inglesa. Shakespeare os unia.
E mais: foram ambos leitores de Schopenhauer e mesclaram a visão pessimista daquele filósofo à busca aflitiva de transcendência em seus escritos. Ambos se proclamavam sem religião, mas não sem espiritualidade. A busca do conhecimento, em qualquer nível que se dê, vinculada ou não a uma doutrina específica ou a uma crença religiosa, conduz à religação buscada pelos místicos.
Constitui, pois, ato religioso por excelência – que tanto Machado como Borges souberam cultivar, com genialidade.
Revista Política Democrática || Rubens Barbosa: Encontros e desencontros entre Brasil e Argentina
Nova tensão entre Brasília e Buenos Aires ocorre por conta de uma escalada retórica em função de divergências ideológicas entre um governo de direita, liberal na economia e conservador nos costumes, no Brasil, e um governo de centro-esquerda, prestes a assumir o poder na Argentina
Como é normal entre países vizinhos, Brasil e Argentina passaram por muitos desencontros e crises ao longo de suas histórias.
Poderíamos começar ainda no século XIX, quando, em 1826, as Províncias Unidas (hoje Argentina) organizaram complô para sequestrar Dom Pedro II, de modo a pôr fim à guerra com o Brasil pelo controle da Banda Oriental (hoje, Uruguai). No início do século XX, de 1906 a 1910, nova crise por um incidente menor: apreensão de um barco uruguaio no Rio da Prata, em área de demarcação contestada entre Argentina e Uruguai. O governo uruguaio pediu apoio ao governo brasileiro. O conflito aumentou e só foi resolvido por ação do barão do Rio Branco e do presidente argentino, Saenz Peña.
Mais recentemente, tivemos momentos de tensão bilateral por ocasião da construção da Hidrelétrica de Itaipu – com questionamentos públicos pela Argentina nos organismos multilaterais, por conta da questão do compartilhamento das águas –, durante a Guerra das Malvinas e no período de governos militares nos dois países.
Agora, nova tensão entre Brasília e Buenos Aires em decorrência não de uma crise, mas de uma escalada retórica em função de divergências ideológicas entre um governo de direita, liberal na economia e conservador nos costumes, no Brasil, e um governo de centro-esquerda, prestes a assumir o poder na Argentina. Declarações de lado a lado acirraram os ânimos entre os presidentes, ministros e altos funcionários, que, do lado argentino, sequer tomaram posse.
A política econômica e comercial do novo governo argentino passou a ser preocupação do governo brasileiro, pela possibilidade de a abertura da economia e a ampliação da negociação externa do Mercosul serem contestadas por políticas protecionistas. Sinalizações nesse sentido poderiam questionar o comércio bilateral e a aprovação do acordo com a União Europeia.
A retórica confrontacionista põe em risco, de um lado, o relacionamento político e diplomático e a cooperação econômica e comercial entre os dois parceiros. E, de outro lado, o futuro do Mercosul.
O processo de integração sub-regional foi reforçado nas últimas reuniões presidenciais por medidas de modernização, enxugamento da burocracia e negociação de acordos comerciais com parceiros extra-zona. Na reunião presidencial do dia 4 de dezembro, encerrando a presidência brasileira, todos apoiaram o fortalecimento do Mercosul, e a sugestão de redução da Tarifa Externa Comum, sem acordo, ficou para 2020.
A Argentina e o Brasil têm, no âmbito do Mercosul, interesses comerciais importantes a preservar. O mercado brasileiro é fundamental para as exportações argentinas, que ajudarão na recuperação da economia, junto com políticas econômicas voltadas para a estabilização que o novo governo vier a tomar. Quanto ao setor privado brasileiro, o mercado argentino é importante para a indústria automobilística e a linha branca. A Fiesp recentemente emitiu nota a favor do fortalecimento do Mercosul, ressaltando que os problemas de funcionamento do bloco devem ser resolvidos de maneira consensual entre os países membros.
A diplomacia parlamentar do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, quebrou o gelo e propiciou encontro com Alberto Fernández, que deveria assumir a Presidência no dia 10. Vozes moderadas do Itamaraty preferem aguardar as definições das novas autoridades argentinas e, depois de informados sobre a nova realidade, buscar consultas bilaterais em nível técnico. Ao Brasil interessa uma Argentina que volte a crescer, estável política e economicamente. Para tanto, Brasília deveria deixar de lado divisões ideológicas e mesmo provocações políticas, como os gestos em relação ao ex-presidente Lula, e manter a “paciência estratégica”.
O bom senso começa a prevalecer e declarações mais moderadas apontam para uma distensão retórica.
Ao longo da história, em todos os momentos de tensão entre os dois países, as crises foram superadas pela ação pragmática da nossa diplomacia, que sempre levou em conta interesses concretos. Essa lição do passado pode ser útil quando a Argentina e o Brasil atravessam mais um momento delicado na relação bilateral.
O determinismo geográfico da vizinhança é um fator que o governo brasileiro não poderá deixar de levar em conta. Diferenças ideológicas não podem contaminar o relacionamento civilizado entre os dois países.
Como disse Saenz Peña, ao superar a crise no início do século passado, “tudo nos une e nada nos separa”. Que suas palavras nos sirvam agora de exemplo. E que prevaleça o que é do interesse nacional dos dois países.
Revista Política Democrática || Reportagem especial || Vale quer cortar metade de auxílio a 98 mil atingidos por tragédia em Brumadinho
Quase um ano após um dos maiores crimes ambientais do País, que deixou 257 mortos e 13 desaparecidos, famílias reclamam de falta de indenização da mineradora
Cleomar Almeida, enviado especial a Brumadinho (MG)
Luto intenso, medo, sofrimento e desamparo castigam sobreviventes e famílias vítimas do rompimento da barragem B1, da mineradora Vale, na mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, a 50 quilômetros de Belo Horizonte. Quase um ano depois da tragédia, que deixou 257 mortos e 13 desaparecidos, a maioria dos atingidos ainda não foi indenizada pela multinacional, que ameaça cortar pela metade a ajuda de custo paliativa a até 98 mil moradores da região, a partir do dia 25 de janeiro de 2020.
Pesadelos e noites mal dormidas marcam o dia a dia da população de Brumadinho, como é o caso do produtor rural Isterides de Oliveira, 65 anos. “Fiquei meio bobo. Só penso no tanto de gente que conhecia e morreu. Não perdi familiares, mas não existe mais paz aqui. A gente vive com uma confusão mental danada”, afirma. A cerca de 100 metros da casa dele, cuja estrutura foi comprometida e desvalorizada, máquinas buscam corpos no mar de lama e deixam a paisagem ainda mais pesada.
Isterides viu a lama engolir amigos, animais, casas e a vegetação. Ele é um dos que recebem o pagamento emergencial da Vale, chamado de “bolsa tragédia” por alguns moradores e que tem aumentado a tensão entre eles e a mineradora, conforme apurou equipe de reportagem da revista Política Democrática enviada a Brumadinho.
No dia 5 de dezembro, a população se reuniu no Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) para contestar um acordo firmado com a multinacional na 6ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Autarquias, e reivindicar a manutenção do pagamento a todos, sem redução.
O acordo, realizado no dia 28 de novembro com a presença de representantes do estado e de órgãos do sistema de Justiça, garantiu aos atingidos o direito à prorrogação do pagamento emergencial, que iria terminar em janeiro de 2020, quando a tragédia completará um ano. O pagamento foi estendido por dez meses, mas será reduzido.
Hoje, conforme prevê o acordo firmado em fevereiro, a Vale paga um salário mínimo para adultos, metade do valor para adolescentes e um quarto para crianças, a todos os residentes da cidade de Brumadinho e pessoas que viviam a até 1 km da margem do rio Paraopeba, na área atingida.
A partir de janeiro do próximo ano, o valor integral deverá ser mantido somente a moradores de cinco comunidades atingidas (Córrego do Feijão, Parque da Cachoeira, Alberto Flores, Cantagalo e Pires), a quem vive às margens do córrego Ferro-Carvão e pessoas atingidas que são cadastradas em programas de apoio da Vale, como auxílio moradia e assistência social.
Os valores serão reduzidos pela metade para todas as demais pessoas que recebem o pagamento, como os moradores da cidade de Brumadinho. De acordo com a Vale, a redução atingirá de 93 mil a 98 mil beneficiários entre as 106 mil pessoas que recebem a verba emergencial. Em protesto, no início deste mês, o comércio de Brumadinho chegou a fechar as portas como represália. A atividade já foi normalizada.
“É uma aberração a ousadia dessa mineradora, que praticou um grave crime ambiental que matou muitas pessoas”, reclama a produtora rural Maria Helena da Silva, 56 anos, que perdeu dois irmãos e um sobrinho na tragédia. “A justiça deverá ser feita porque a gente não pode ficar à própria sorte, recebendo migalhas para tentar amenizar a dor que vai marcar o resto de nossas vidas”, acrescenta.
O promotor de Justiça da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Social do MPMG, André Sperling, reforça que a população considera o acordo insuficiente e, por isso, tentará reabrir as negociações. “O MP está do lado da população. Se as pessoas entendem que o acordo é insuficiente, o pedido é para que a Vale reabra as negociações. Vamos esperar a mineradora dar nova resposta, mas não temos a data da reunião”, afirma.
Insatisfeita, a população atingida tem-se mobilizado cada vez mais. “É evidente que a população está se mobilizando e um acordo pode ser mudado a qualquer tempo”, ressalta Sperling. “Esperamos que a Vale tenha sensibilidade e veja que o acordo, para a população, está sendo insuficiente neste momento”, assevera.
A Secretaria Municipal de Saúde de Brumadinho estima que houve um aumento da população cadastrada ao longo do ano. Apesar de o levantamento não ter a validade de um censo, dados oficiais apontam que a cidade passou de 38 mil para 43 mil moradores registrados no período. O prefeito de Brumadinho, Avimar de Melo Barcelos (PV), diz que o município “sofre muito com o crime praticado pela Vale”.
Desolado, o produtor Isterides diz que sofre profundamente por causa da tragédia. “A região tinha muitas cachoeiras, córregos onde a gente tomava banho, peixes para pescar. Acabou tudo”, afirma. “Só quem é daqui sente na pele o que todo esse crime da Vale causa na vida da gente”, acentua.
Em nota, a Vale informa que já celebrou mais de quatro mil acordos, indenizando integralmente as pessoas. Nestas ações, segundo a multinacional, já foram provisionados pagamentos de cerca de R$ 2 bilhões. A empresa diz que realiza encontros regulares com representantes legítimos dos atingidos pelo rompimento da barragem em Brumadinho, com o objetivo de garantir “uma reparação célere e respeitosa”.
Os valores do pagamento emergencial não poderão ser descontados de indenizações individuais a serem pagas pela mineradora no futuro, apenas do montante de possíveis indenizações coletivas.
O defensor público Antônio Lopes de Carvalho Filho, do Núcleo Estratégico de Proteção aos Vulneráveis em Situação de Crise da Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPE-MG), diz que não há dinheiro que possa reparar as perdas provocadas pela tragédia. “O pagamento emergencial é uma medida paliativa. A dor de perder uma pessoa na família ou amigos é extrema. Outra dor é a da pessoa que tinha vínculo com a comunidade e foi obrigada a se deslocar. As pessoas perdem um pouco o chão. Fica uma comunidade abalada”, lamenta.
Perdeu a casa própria, vive em ‘situação de pânico’
Na porta de uma casa alugada pela mineradora Vale, onde mora, Adélia Oliveira de Souza Gomes, 56 anos, é o retrato da desolação. Aguarda todos os dias por uma resposta da multinacional que considere digna e justa para reparar os danos decorrentes da tragédia em Brumadinho. Até hoje, vive uma espera em vão.
“Eu estava almoçando na varanda de casa. Nós escutamos um barulho, achamos que era alguma explosão. Meu marido foi lá fora e disse que a barragem tinha estourado. A gente saiu correndo e deixou tudo para trás. Não pegou nada”, lembra a dona de casa. “Houve muita gritaria. Saímos desesperados. Em menos de dez minutos, vimos a lama destruir a nossa casa, tudo o que a gente conquistou ao longo da vida”, lamenta.
Adélia e a família recebem pagamento emergencial. Ela nasceu em Ibirité, a 32 quilômetros de Brumadinho, para onde se mudou porque foi o único lugar em que conseguiu comprar um lote, na parte mais afastada do centro da cidade. Constituiu família. Criou sete filhos com o marido. Em poucos segundos, viu a lama destruir tudo.
“Vivemos um momento de pavor. A lama engoliu tudo, felicidade, sonhos, bem-estar. Aqui, ninguém tem mais paz”, diz a moradora, que ainda aguarda indenização definitiva. “Hoje, vivo em situação de pânico. Quando começa a chover, fico assustada. Olho para o telhado e parece que está querendo descer em cima de mim”.
Assim como Adélia, muita gente ainda não se sente segura para fazer um acordo extrajudicial com a Vale. Além disso, reclama do caos que virou a cidade. Como muita gente ainda trabalha na região para reconstruí-la, o trânsito é caótico. O tráfego de caminhões da mineradora é intenso. Alguns profissionais também se dirigem ao local para tentar amparar as famílias, de alguma maneira. Nada, porém, será capaz de resgatar a tranquilidade em que viviam os moradores, antes da tragédia.
O defensor público Antônio Lopes de Carvalho Filho reconhece a dificuldade das pessoas, de reconstruir a vida no local. “O luto vivenciado pelas famílias atingidas dura um certo tempo, e cada uma delas precisa ser respeitada”, afirma.
Para tentar diminuir a dor dos moradores, o órgão foca em uma iniciativa que visa à reparação individual, conforme termo de compromisso firmado com a Vale no dia 5 de abril, sem a necessidade de protocolar processo judicial. No total, segundo o defensor público, apenas 230 pessoas foram indenizadas pela mineradora por meio dessa iniciativa.
“O valor médio das indenizações é em torno de R$ 600 mil”, afirma Antônio. “No geral, até o momento, houve indenização entre R$ 680, no caso de gastos com combustível, até R$ 3 milhões, envolvendo bens imóveis”, diz ele.
O termo de compromisso se baseia em critérios de justiça social. O valor, portanto, deve considerar a possibilidade de a pessoa comprar um bem idêntico ou de adquirir outro parecido com o mínimo de garantia de dignidade. “Tudo é valorado, inclusive o vínculo que o morador tinha com o local ou o bem”, explica.
Sem expectativa, Adélia passa o dia em casa. Tenta manter sob controle os problemas de saúde, como a hipertensão. Na cabeça resta apenas a memória da vida que tinha na região e que foi cruelmente dilacerada, deixando em todos um profundo vazio e uma aflição contínua.
Barragem da maior mina da Vale em MG continua em alerta
A Barragem Laranjeiras, em São Gonçalo do Rio Abaixo, a 130 quilômetros de Brumadinho, está com as operações paralisadas temporariamente desde o dia 2 de dezembro, quando entrou em nível 1 de emergência. A estrutura integra o complexo da Mina de Brucutu, a maior da Vale em Minas Gerais, conforme apuração da equipe de reportagem da revista Política Democrática enviada ao local.
A paralisação temporária da barragem pode levar até dois meses e suspende a disposição de rejeitos na barragem, advindos da mina de Brucutu. A Vale informa que, nesse período, deverá realizar avaliação sobre as características geotécnicas da barragem. A multinacional não informou quais são os problemas que causaram a interrupção do lançamento de rejeitos no local.
O protocolo de emergência em nível 1, de acordo com a Agência Nacional de Mineração (ANM), não requer a retirada de moradores da área de risco nem toque de sirene. A barragem teve a sua Declaração de Condição de Estabilidade (DCE) emitida em 30 de setembro de 2019, que permanece válida.
No período em que a disposição de rejeitos estiver suspensa, a usina de Brucutu opera com cerca de 40% de sua capacidade por meio de processamento a úmido com rejeito filtrado e empilhado. De acordo com a Vale, o impacto estimado da paralisação temporária é de 1,5 milhão de toneladas de minério de ferro por mês.
Em fevereiro, a Justiça já havia determinado a paralisação da Barragem Laranjeiras, assim como a de outras sete. A decisão atendeu a uma ação civil pública que tramita em segredo de Justiça. A mineradora chegou a voltar a operar, mas houve nova suspensão no dia 6 de maio.
Em junho, a Vale obteve o direito de retomar as atividades. Na ocasião, a Prefeitura de São Gonçalo do Rio Abaixo alegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) que a paralisação de qualquer estrutura que impossibilite a operação da mina afeta diretamente a economia da cidade. Desde a tragédia de Brumadinho, segundo a Defesa Civil, mais de 20 barragens estão em estado de alerta em Minas Gerais.
Revista Política Democrática || Randolfe Rodrigues: Governo Bolsonaro envenena o Brasil
O Brasil ocupa, desde 2008, a posição de maior consumidor de agrotóxicos do mundo em números absolutos. Entre 2000 e 2010, o consumo indiscriminado de pesticidas aumentou 200% no Brasil, enquanto no restante do mundo foi de 100%. Só nos primeiros 11 meses de governo Bolsonaro foram autorizados 467 novos agrotóxicos
A agricultura desempenha papel importante na economia brasileira, garantindo alimento barato e superávit na balança comercial pela sua competitividade internacional. No entanto, o País precisa prestar mais atenção ao controle do uso de agrotóxicos, pois estamos diante de uma permanente exposição crônica a esses produtos. Não só trabalhadores rurais e camponeses estão vulneráveis, mas a população urbana de qualquer idade e classe social.
Entre 2000 e 2010, a utilização de pesticidas no mundo aumentou em 100%. No Brasil, o crescimento foi o dobro: 200%. Hoje, 20% dos agrotóxicos comercializados no mundo são vendidos no Brasil. O país ocupa, desde 2008, a preocupante posição de maior consumidor de agrotóxicos do mundo em números absolutos. Em 2017, cerca de 540 mil toneladas de substâncias tóxicas foram usadas nas lavouras do país, segundo o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama).
Se considerarmos o volume de agrotóxicos usados por hectare, o Brasil ficaria na sétima posição em 2017. No entanto, esse indicador não é muito confiável, pois existe forte suspeita de que, nessa conta, estão incluídas as extensas áreas de pastagens degradadas, onde não se aplicam agrotóxicos. Esse artifício matemático subestimaria o uso por hectare e não refletiria a realidade do consumo médio das lavouras brasileiras.
Outro grave problema vem do sistema brasileiro de registro, gestão e controle de agrotóxicos, que é extremamente precário. Há grande permissividade no registro de defensivos agrícolas de altíssimo grau de toxicidade para a saúde humana e o meio ambiente. Cerca de 30% das substâncias tóxicas usadas no Brasil foram banidas em outros países, principalmente Estados Unidos e Europa, por causarem gravíssimos problemas de saúde como o câncer, deformações em fetos, mutações genéticas, distúrbios hormonais e danos ao aparelho reprodutor, bem como provocarem severos impactos no meio ambiente, como a contaminação da água e a morte de abelhas e outros polinizadores.
O nível de resíduos permitidos nos alimentos e na água potável é escandalosamente mais alto no Brasil do que na União Europeia, por exemplo. No caso do cancerígeno inseticida Malationa, usado na produção do feijão, componente essencial da nossa dieta, o limite é 400 vezes maior do que na União Europeia. No caso do glifosato, considerado como cancerígeno pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o limite aceito na água potável que ingerimos é cinco mil vezes maior, e o nível aceito na soja é 200 vezes maior.
A fiscalização do uso dos agrotóxicos no Brasil é inexpressiva. Diferentemente dos Estados Unidos e União Europeia, que contam com forte estrutura fiscalizatória, aqui no Brasil o trabalho de inspeção do Ministério da Agricultura, Ibama e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), além de ser insuficiente, está praticamente paralisado no atual governo.
Como resultado de sua defesa ardorosa por uma grande bancada parlamentar e por diversas autoridades de governo, as empresas fabricantes de agrotóxicos pagam poucos impostos. Os Estados reduziram em 60% a base de cálculo do ICMS para agrotóxicos, e o Governo Federal concede isenção total do IPI.
Os critérios usados pela Anvisa para liberação de agrotóxicos, produzidos em uma escala nunca antes vista, são, no mínimo, questionáveis. Essa situação pode ser bem ilustrada com o caso da reavaliação, em fevereiro deste ano, do agrotóxico glifosato, na qual o órgão concluiu que a substância não apresenta perigo para a saúde. No entanto, essa conclusão colide com estudos desenvolvidos em diversas instituições brasileiras e internacionais, como o Instituto Nacional do Câncer e a Agência Internacional para a Pesquisa do Câncer (IARC), ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS). A Agência publicou relatório no qual confirma que o agrotóxico RoundUp (glifosato), produto fabricado pela multinacional Monsanto, é um agente potencialmente causador de câncer, mais precisamente do linfoma não-Hodgkin.
Importante salientar que o glifosato é o agrotóxico mais vendido no Brasil. Seu consumo em 2017 alcançou 173 mil toneladas. O volume corresponde a 22% das estimativas de vendas para esse químico em todo o mundo no mesmo ano. Isso dá uma dimensão da pressão exercida sobre a Anvisa e demais órgãos de registro, para mantê-lo no mercado.
Pesquisa da Universidade Federal do Piauí constatou contaminação pela substância em 83,4% das amostras de leite humano obtidas na maternidade do município de Uruçuí. O município é o maior produtor de soja do Estado. Igual contaminação foi encontrada em amostras coletadas entre lactantes do município de Oeiras, 340 km distante, onde a produção agrícola é inexpressiva.
Entre as mães que participaram do estudo cedendo amostras de leite, 23,1% tiveram a gravidez interrompida de uma a quatro vezes e estão sujeitas a outros fatores de risco como a prematuridade, baixo peso do bebê ao nascer, peso reduzido para a idade gestacional e microcefalia.
Pesquisa recente realizada pelo Laboratório de Mutagênese da Universidade Federal de Goiás constatou que trabalhadores rurais que atuam na aplicação de agrotóxicos em lavouras do Sudeste e Sudoeste de Goiás apresentam 4,5 vezes mais lesões no DNA que pessoas que não exercem essa atividade. Esses resultados foram obtidos a partir da análise de sangue e mucosa oral de 200 trabalhadores.
Os números revelam que a contaminação da água está crescendo rapidamente. Em 2014, 75% dos testes realizados pelas empresas de abastecimento de 1.396 municípios detectaram todos os 27 agrotóxicos que são obrigados, por lei, a testar. Destes 27 produtos, 21 estão proibidos na Europa. Esse percentual subiu para 84% em 2015, para 88% em 2016, chegando a 92%, em 2017. Nesse ritmo, em alguns anos pode ficar difícil encontrar água sem agrotóxico nas torneiras do país.
Toda essa grave situação piorou muito com o novo governo. O Ministério da Agricultura está liberando agrotóxicos em uma escala inédita no Brasil. Nos primeiros 11 meses de governo Bolsonaro, foram autorizados 467 novos produtos, o que representa 20% de todos os agrotóxicos liberados no país nesta década. Entre 2010 e 2018, foi liberada uma média de 16 agrotóxicos por mês. Esse número aumentou 261% em 2019, chegando a 42 agrotóxicos. É a prova inconteste de que o governo Bolsonaro está inundando com venenos, não só a mesa dos brasileiros, mas também todo o meio ambiente.
Levantamento do jornal Folha de S. Paulo, publicado em 19/09/2019, informa que grande parte dos 96 ingredientes ativos que compõem os agrotóxicos liberados no Brasil até aquela data não é registrada em outros importantes produtores agrícolas. Na União Europeia, essa proporção chega a 29%; Austrália, 38%; Índia, 31%; e 19%, no Canadá.
Controle de agrotóxicos é assunto de grande complexidade e envolve poderosos interesses. Mas uma coisa é certa: não se pode mais admitir que, sob o pretexto de produzir alimentos baratos, a população brasileira seja obrigada a comer alimentos contaminados com substâncias cancerígenas e ter os recursos hídricos, o solo e o ar poluídos por tantas substâncias perigosas. Existem tecnologias, métodos e práticas agrícolas que permitem reduzir significativamente o uso de agrotóxicos e banir completamente as substâncias extremamente perigosas, que inclusive já são proibidas em outros países.
Não há argumento ético que justifique que esses agrotóxicos continuem sendo usados e estimulados no Brasil. O povo brasileiro não é mais resistente a esses venenos do que os habitantes dos países que os proibiram. Nem são pessoas menos dignas do que as de lá para que sejam obrigadas a consumir esses produtos.
O debate está aberto e deverei apresentar, na volta da COP 25, um Projeto de Lei para estabelecer um sistema mais rigoroso de controle de agrotóxicos, mantendo as condições para que a agricultura possa se desenvolver de forma economicamente próspera, mas sem abrir mão das medidas necessárias para tornar cada vez mais seguros os químicos usados na agricultura, através do melhor controle da contaminação do ambiente e da saúde de homens, mulheres, crianças e idosos e das próximas gerações.
Revista Política Democrática || Martin Cezar Feijó: AOS QUE VÃO NASCER - Uma política cultural para o século XXI
Brasil vive em tempos sombrios, obscuros, avalia Martin Cezar Feijó. Terra plana, bruxas e conspirações são alguns dos temas que permeiam a mente de alguns brasileiros em pleno século XXI, em um país moderno e democrático há mais de trinta anos, escreve o articulista
Vivemos em tempos sombrios, lembrando Brecht. Na verdade, obscuros. Quem poderia imaginar que, em pleno século XXI, em um país moderno e democrático há mais de trinta anos, como o Brasil, com todos seus problemas de desigualdade ainda existentes, se acreditasse em Terra Plana, em bruxas e conspirações satânicas? E não por pessoas comuns, que não tivessem nenhuma educação formal e responsabilidade social, mas por pessoas que ocupam cargos públicos importantes na esfera federal. E, mais ainda, com poder em áreas como a Cultura e a Educação?
Claro que, como dizia o jornalista Paulo Francis, pessoas “que despontam para o anonimato”... Até porque eles passam, todos passarão, e nós, talvez, passarinhos.
E o Brasil é bem maior que qualquer abismo, já dizia o filósofo português Agostinho da Silva, que inspirou o último trabalho poético-musical-filosófico de Jorge Mautner: Não há abismo que caiba. Mas o quadro é grave, até assustador. Lembra até o período de uma narrativa que marcou os anos 1930-1940: o nazismo. Havia um dirigente alemão nazista que citava um dramaturgo também alemão, também nazista, que dizia o seguinte:
- “Quando ouço a palavra cultura, logo carrego meu revólver”.
Eram tempos sombrios, como definiu uma filósofa alemã judia refugiada, Hannah Arendt. Quando acabou a guerra, um milionário norte-americano, Nelson Rockefeller, tripudiou sobre a fala do nazista:
- “Quando ouço a palavra cultura, logo pego um talão de cheques”.
A cultura é assim, plena de contradições. Principalmente riscos. Mas o maior risco é o de sua instrumentalização. Seja satanizando o rock como causador de aborto e adorador do Diabo, ou questionando a escolha de uma poeta para uma homenagem em um encontro literário em Parati, como o caso de Elisabeth Bishop. Ambos padecem de um mal anunciado, o da confusão entre conhecimento e estética e política no sentido de partidarização e ideologia. Claro que um caso se insere na questão de liberdade de opinião, mas o primeiro se trata de um claro posicionamento, com implicações práticas, como imposição de uma política que abre caminho para cerceamentos e censuras. O pior dos cenários, portanto.
E é disso que se fala aqui, de bases para uma política cultural em um sentido específico. Como pensar uma política cultural para os que vão nascer, ou que nasceram neste século, e vão vivenciar todas as transformações em curso. Uma verdadeira revolução, nunca antes imaginada, ou prevista.
Quem se debruçou sobre este cenário foi o historiador israelense, Yuval Noah Harari, autor dos best-sellers mundiais, Homo Sapiens e Homo Deus, em seu livro 21 Lições para o Século 21, chama a atenção para o fracasso das três narrativas que predominaram no século XX - fascista, comunista e liberal – e que acabaram por gerar profunda desilusão. E que a revolução em curso, no âmbito da biotecnologia e Big Data, pode comprometer uma das maiores conquistas da narrativa liberal: o regime democrático, sem o qual não há solução possível, independente do lado que se esteja. E nesse aspecto, a cultura tem papel decisivo, seja no âmbito dos empregos, da civilização e do meio-ambiente.
Por isso, a destruição da cultura é o principal aspecto que marca uma emergência do que podemos chamar de neofascista, mesmo que nascida das democráticas urnas. E isto vem ocorrendo em grande parte do mundo, apesar dos alertas de uma imprensa livre, por isso perseguida e atacada pelos fakenews através de milícias digitais; assim como a arte de modo geral, seja no teatro, no cinema, na literatura, nas artes plásticas. Nesse sentido, a cultura passa a ser não apenas um apêndice da política, mas um eixo central na sobrevivência da própria espécie.
E cultura em seu sentido amplo, que envolve não só uma radical liberdade de expressão que garanta uma diversidade plena, mas também um investimento na educação em todos os níveis. Em uma atualização constante, e respeito às nossas crianças, que merecem um mundo melhor, como demonstram os ativismos de jovens como a paquistanesa Malala e a sueca Greta; uma chamada de “pirralha” por um pretenso ditador, e outra levando um tiro no rosto só porque querida estudar. Uma reconhecida com um Nobel, e outra, como Personalidade do Ano pela revista Time. Aí está a promessa de futuro contra as reações que ocorrem!
Uma política cultural para o século XXI deve levar em conta a complexidade do quadro, as ameaças do emprego, as restrições às liberdades e um descrédito do conhecimento científico e filosófico como marca de uma direita agressiva e ativa. Recorrendo mais uma vez aos alertas do historiador israelense:
“O...surgimento da inteligência artificial pode expulsar muitos humanos do mercado de trabalho – inclusive motoristas e guardas de trânsito (quando humanos arruaceiros forem substituídos por algoritmos, guardas de trânsito serão supérfluos). No entanto, poderá haver algumas novas aberturas para os filósofos, haverá subitamente grande demanda por suas qualificações – até agora destituídas de quase todo valor de mercado. Assim, se você for estudar algo que lhe assegure um bom emprego no futuro, talvez a filosofia não se seja uma aposta tão ruim.”
Em outras palavras, seja no âmbito das novas tecnologias, seja no âmbito dos riscos políticos, o conhecimento e a cultura serão decisivos. E uma política cultural que leve isso em conta será fundamental.
‘Coringa é um filmaço’, afirma Lilia Lustosa à Política Democrática online
Análise do filme de Todd Phillips é da doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL)
Cleomar Almeida, da Ascom/FAP
O filme Coringa, do diretor Todd Phillips, “é um filmaço, daqueles que você sai e fica por horas discutindo, refletindo”. A afirmação é da doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL), Lilia Lustosa, em artigo produzido para a nova edição da revista Política Democrática online. “Excesso de verdade atirada na nossa cara. Excesso quase insuportável quando entendemos que nós, que estamos ali sentados confortavelmente naquela sala de cinema, somos a elite ali representada”, diz ela.
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O público tem acesso gratuito a todos os conteúdos da revista no site da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), que produz e edita a publicação. De acordo com a Lilia Lustosa, “obviamente, Coringa é uma grande alegoria de nossa sociedade, e, por isso mesmo, se permite trabalhar com excessos e metáforas”. Segundo ela, são justamente essas extrapolações ou caricaturas que fazem entender a tela como um espelho do que as pessoas estão se tornando ou do que já são.
Segundo Lilia Lustosa, ao acompanharmos o passo a passo da construção do “monstro” em que vai se convertendo Arthur Fleck (magistralmente interpretado por Joaquin Phoenix), enxergamos muitos conhecidos nossos, quer seja na pele do próprio Arthur, quer seja na pele dos que estão em seu entorno, ajudando a construir a “criatura”.
“Enxergamos, no início, um homem com um sonho: vencer na vida como comediante. Uma pessoa que, apesar das adversidades sociais (pobreza) e psicológicas (doença mental em que não controla o riso), tenta alcançar licitamente seu sonho”, diz ela, no artigo publicado na revista Política Democrática online.
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Como evitar neutralização da Lava Jato? André Amado explica em artigo na Política Democrática online
Diretor da revista produzida pela FAP cita precedente italiano como alerta ao caso brasileiro
Cleomar Almeida, da Ascom/FAP
O diretor da revista Política Democrática online, André Amado, compara as operações Mãos Limpas, na Itália, e Lava Jato, no Brasil, e destaca que o precedente italiano serve de alerta para impedir a “neutralização” da campanha anticorrupção ocorrida em nosso país. A revista é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
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O público pode acessar todos os conteúdos da revista, de forma gratuita, no site da FAP. Em três anos, a operação Mãos Limpas investigou 4.500 pessoas, enquanto a Lava Jato focou em 300 investigadas, no mesmo período. “A classe política italiana foi quem reagiu no sentido de promover uma série de alterações legislativas, que, pouco a pouco, neutralizaram o sucesso dos efeitos das investigações”, cita um trecho do artigo.
Em sua análise exclusiva para a revista Política Democrática online, André Amado diz que setores influentes da política italiana desmobilizaram, paulatinamente, a campanha anticorrupção. Em seu artigo, ele traça uma linha histórica de repercussão da operação:
Em 1993, editou-se decreto que descriminalizava o financiamento ilícito dos partidos. O que era crime deixou de sê-lo, reintroduzia-se o sigilo nas investigações.
Em 1994, editou-se outro decreto que proibia a prisão preventiva para crimes contra a administração pública e o sistema financeiro (Na ocasião, 2.764 pessoas que estavam presas por crimes dessa natureza foram colocadas em liberdade, das quais 350 delas eram da Operação Mãos Limpas).
Em 1995, reformou-se a prisão cautelar e suspendeu-se o processo por delito de falso testemunho, que havia sido uma conquista de Antonio Di Pietro, conquista que lograra permitir prisão em flagrante de falso testemunho e outros crimes de máfia.
Em 1997, atenuou-se o crime de abuso de officcio, crime de prevaricação que foi muito usado para criminalizar as condutas na Itália. Acrescentaram mais um elemento para caracterização do delito, e, com isso também reduziram a pena, proibiram a prisão preventiva, por tabela – com a diminuição da pena, não cabia mais a prisão preventiva. Não permitiram a adoção de provas obtidas mediante intercepção de comunicação telefônica. Diminuíram o prazo prescricional, que é o tempo que o estado tem para punir, que era de 15 anos caiu para 7 anos e meio, com o que muitos crimes prescreveram.
Em 1988-99, novas leis ampliaram a possibilidade de colaboração, porque os processos estavam encerrando já nessa época. Alguns réus condenados não tinham feito acordo de colaboração, e a lei italiana não permitia que o acordo fosse fechado depois da condenação. Então para salvar estes que foram condenados, eles mudaram as leis. Eram leis de encomenda para ajustar as situações.
Em 2001, fizeram o reingresso, repatriação de dinheiro italiano escondido no exterior.
Em 2005, criaram uma lei para punir abusos de juízes e promotores, que persigam fins diversos daqueles de justiça. Era a lei italiana de abuso de autoridade.
Em 2005, diminuíram prazos prescricionais por uma lei que ficou conhecida como Salva Corrota, salva corruptos. A prescrição voltou a cair pela metade. Cem mil processos prescreveram então na Itália. E, no ano seguinte, 135 mil.
Em 2006, proibiram o ministério público de recorrer de decisões de absolvição. A lei era tão escancaradamente inconstitucional, que a corte italiana considerou inconstitucional.
Em 2007, foi a vez da lei da mordaça, proibição de noticiar intercepções de comunicação telefônica, reforma judiciaria que hierarquizou o ministério público e italiano, tirando da autonomia inclusive de alguns membros do ministério público italiano.
Em 2009, nova lei de repatriação de bens que suspende por 6 meses, renovável por mais 6 meses, ao sabor da vontade do réu – e Berlusconi, era primeiro-ministro à época e potencial réu - o tramite dos processos. O réu tem o poder de suspender o processo.
Em 2012, altera-se a lei anticorrupção que resulta em diminuição do prazo prescricional que beneficia várias autoridades.
Em 2014, despenaliza-se o crime de sonegação.
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“Sem negros, não há Brasil”, diz Ivan Alves Filho à nova edição da Política Democrática online
Historiador afirma, em artigo publicado na revista da FAP, que há exclusão social do negro no país
Cleomar Almeida, da Ascom/FAP
O historiador Ivan Alves Filho diz que o Brasil tem a segunda maior população negra do mundo. “Esse é um dado fundamental para se compreender a nossa realidade”, escreveu ele, em artigo publicado na nova edição da revista Política Democrática online. Todos os conteúdos da revista podem ser acessados, de graça, no site da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), que produz e edita a publicação.
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A FAP é sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. Autor de uma série de livros, entre os quais Presença Negra no Brasil e Memorial dos Palmares, Ivan lembra que o padre Antônio Vieira, certa vez, disse: “Sem Angola, não há Brasil”. Para o autor, é possível afirmar, ainda, que “sem o negro, não há Brasil”.
“O povo faz história pelo trabalho. E o povo negro vem carregando esse país nas costas há cinco séculos”, afirma o historiador, no artigo exclusivo produzido para a revista Política Democrática online. “Como falar da nossa literatura sem Machado de Assis? Da nossa música, sem Pixinguinha? Da nossa arquitetura, sem Aleijadinho? Do esporte brasileiro, sem Pelé? Das nossas rebeliões, sem Zumbi dos Palmares?”, questiona Ivan.
Na avaliação do autor, “há uma evidente exclusão social do negro entre nós”. “E isso mergulha suas raízes num passado não tão distante assim. Se, por um lado, o regime escravista integra o negro na economia; por outro, o exclui da cidadania”, afirma o historiador. “A própria abolição, ao libertar o escravo, esqueceu-se de libertar o negro, “acrescenta.
De acordo com Ivan, é preciso reconhecer que a questão negra é, acima de tudo, uma questão nacional. “Ou seja, uma luta de todos os brasileiros”, diz ele. “A batalha pelos direitos dos negros no Brasil é parte da luta e não uma luta à parte. Com essa ótica, acreditamos ser fundamental unir o particular ao geral, uma vez que as chamadas lutas setoriais não devem ter um tratamento setorial”, afirma, citando um trecho do livro Presença Negra no Brasil, editado pela Fundação Astrojildo Pereira.
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Por que a manifestação no Chile? Alberto Aggio responde à Política Democrática online
Em artigo exclusivo publicado na nova edição da revista da FAP, professor da Unesp diz que os chilenos colocaram a raiva para fora
Cleomar Almeida, da Ascom/FAP
Os chilenos colocaram para fora toda a raiva frente ao mal-estar resultante do “modelo econômico”, que ordena o país desde os tempos da ditadura do Pinochet, durante as manifestações de outubro. A análise é do historiador, professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e diretor da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), Alberto Aggio. Em artigo publicado na nova edição da revista Política Democrática online, ele afirma que “o Chile explodiu”.
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Todos os conteúdos da revista podem ser acessados, gratuitamente, no site da FAP, que produz e edita a publicação. A fundação é sediada em Brasília vinculada ao Cidadania. Em artigo de sua autoria, Aggio lembra que, por vários dias, milhares de pessoas saíram às ruas em marchas de protesto que invariavelmente se tornaram violentas. “Estavam no foco dos manifestantes o Metrô de Santiago, as empresas de energia, os bancos controladores das famosas AFPs, que ‘garantem’ a aposentadoria da maior parte dos trabalhadores chilenos, dentre outras”, afirma.
No artigo exclusivo produzido para a revista Política Democrática online, o professor da Unesp diz que, assim como no Brasil de 2013, a repressão fez com que os protestos se amplificassem até chegar à manifestação de 25 de outubro, que reuniu mais de 1,2 milhão de pessoas no centro de Santiago. “Foi um sinal eloquente de que a estratégia do governo havia naufragado. Piñera recuou, propôs algumas reformas paliativas, procedeu a mudanças parciais em seu gabinete e, por fim, suspendeu o ‘estado de emergência’”, acentua ele.
Na avaliação do diretor da FAP, a modernização do país é atestada em números. Segundo ele, é notável também a sofisticação e até o luxo das estações do Metrô de Santiago em bairros pobres integram o cenário de um país dividido. “Sinais materiais de modernização em contraposição às carências domesticas cotidianas, às expectativas de futuro dos jovens em situação de ameaça, com a recorrente elevação dos custos de educação, além do nível das pensões dos mais velhos frente ao que trabalharam e contribuíram durante toda a vida, tudo isso formou um ‘caldo de cultura’ de raiva diante da flagrante desigualdade e de medo da regressão ao status quo anterior, vivenciado nos anos de crise, quando se implantou o modelo”, analisa.
O Chile que explodiu, de acordo com o artigo publicado na revista Política Democrática online, nada mais expressa do que a reação a décadas de “estado de mal-estar social”. “Os termos em que se deu tal explosão, com sua violência costumeira, agora triplicada, confirma o paradoxo de uma democracia ainda sustentada numa ordem político-jurídica (a da Constituição de 1980) que carece de legitimidade”, avalia Aggio.
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