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Fernando Gabeira: Uma banana para o PIB
O que o governo busca com suas palhaçadas é tapar a visão do futuro. Ninguém sonha com as roubalheiras pretéritas
Na semana em que foi divulgado o PIB do primeiro ano de governo Bolsonaro as reações foram estranhas. Bolsonaro não quis responder sobre o tema. Passou a tarefa para um humorista oficial, que distribuía bananas para os repórteres.
Brasília se parece cada vez mais com cenários de realismo mágico, como a cidade de Macondo na obra de Gabriel García Márquez.
Se ouvi bem, Bolsonaro e o humorista perguntavam o que é PIB. Na verdade, houve e sempre haverá um debate sobre a precisão do PIB como instrumento de medida do crescimento do país.
Mas a forma de peguntar, com a banana na mão, indica que tanto Bolsonaro como o humorista chapa-branca não têm a mínima ideia do assunto.
Perguntem ao Posto Ipiranga. Paulo Guedes, que responde pela fantasia do Posto Ipiranga do governo, afirmou que o crescimento do PIB não era preocupante: o Brasil estava no rumo certo e iria crescer mais em 2020.
Mas e o coronavírus, a China? — alguém perguntou. Guedes minimizou os efeitos da epidemia: os chineses não vão deixar de comer, logo continuarão comprando.
As coisas não são bem assim. Quando apertam, não se deixa de comer, apenas come-se com moderação. E os efeitos do coronavírus na economia transcendem a um impacto na venda de alimentos: significam uma desaceleração global. Compreendo que é preciso combater o pânico e não dramatizar o impacto econômico do vírus. Mas é necessário reconhecê-lo, trabalhar com as evidências.
Se um ministro não reconhece isto, algumas pessoas podem entrar em pânico. Não sei se esta frase tem algum sentido num país em que Bolsonaro se apresenta ao lado de um humorista vestido com a faixa presidencial, distribuindo bananas.
Nos trópicos, a própria ideia do pânico precisa ser reavaliada. São necessários muitos acontecimentos bizarros para as pessoas acharem que algo está diferente. Um deles são as manifestações de governo e oposição marcadas para o fim de semana. O vírus apenas começou a se propagar no Brasil, ao que tudo indica. Ainda assim, convocar grandes manifestações é algo que parece absurdo aos países europeus que precisamente tentam evitar grandes concentrações humanas.
Bolsonaro tem sua história ligada à banana. Cresceu no Vale do Ribeira, onde se produz muita banana. Fazia solitários discursos contra a importação e parecia se importar muito com a causa dos bananeiros nacionais.
Num determinado momento, ele esqueceu a banana real e adotou a simbólica, acenando-a para jornalistas. Agora, decidiu unir a banana real à simbólica e terceirizar a tarefa de debochar dos repórteres. O sonho de Bolsonaro é ser presidente numa república de bananas. Ele se comporta como se quisesse conduzir o Brasil nesta direção. Na verdade, uma república de bananas não é só pitoresca, mas essencialmente autoritária.
Muitos apoiadores dizem: Bolsonaro faz tudo isso, mas não se rouba como antigamente. Dificilmente se roubará como antes, depois da Lava-Jato. Isto não é mérito dele.
Outros dizem: apesar de tudo, o país está crescendo. Mas esta semana vimos que, a julgar pelo PIB, que não é um modelo de exatidão, o Brasil não cresce como propagam os defensores do governo.
Tudo o que resta, no momento, é nos assombrar com o passado. O passado é cheio de fantasmas, mas não há evidências de que queremos voltar a ele.
O que o governo está buscando com suas palhaçadas é tapar a visão do futuro. Ninguém sonha com as roubalheiras pretéritas, poucos acreditam em implantar um socialismo no Brasil.
As aspirações são apenas de um governo decente, que cumpra suas tarefas e tenha uma relação séria com a imprensa ao comunicar suas ideias ou pretensões. É ilusório o esforço de nos convencer de que as alternativas são a roubalheira do governo anterior ou a incompetência e o deboche do atual.
As circunstâncias da globalização e a própria decadência dos estados nacionais não nos permitem sonhar com um governo que realize tudo o que promete. Ele simplesmente não tem poder para isso. No entanto, a habilidade de usar os poucos recursos que existem para atenuar problemas, resolver outros menores — tudo isso está ao alcance de um governo nacional.
As bananas na porta do Palácio são apenas um ato de desespero de quem não está entendendo nada e supõe equacionar a realidade com piadas de mau gosto.
Alon Feuerwerker: A noiva embelezou-se, mas o noivo está demorando a entrar pela porta
A política econômica de Jair Bolsonaro não mostra resultados brilhantes e suas premissas estão sendo questionadas. A saída de recursos externos da Bolsa bate recordes e o investimento privado continua muito abaixo do necessário para impulsionar a atividade, e portanto o emprego. E este é uma variável que pode fazer andar ou desandar o humor da galera. Diante do problema, o governo foge para adiante. Chama a rua.
Na teoria as reformas já realizadas e a queda dos juros da dívida pública deveriam atrair investimentos e estimular o consumo. Na prática ou não está acontecendo ou vai indo muito devagar.
Responsabilizar o Congresso pela pasmaceira econômica é moleza, no país em que o senso comum foi envenenado pela mistificação de que tudo é culpa “dos políticos”. Será? Desde o impeachment de Dilma Rousseff o Legislativo entregou aos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro os três pilares mais pedidos: o teto de gastos, a mudança nas leis trabalhistas e, principalmente, a reforma da previdência com o exigido 1 trilhão de economia em dez anos.
Aparentemente a noiva (o governo) embelezou-se para o casamento mas o noivo (o capital) está demorando para aparecer na porta. E o público começa a desconfiar. A orquestra e os cantores precisam caprichar para não deixar a peteca cair. Claro que se for dado tempo suficiente é provável que a noiva chegue. Mas na política o tempo é uma variável fora do controle dos economistas, está mais na alçada dos políticos.
E há o imprevisível, sempre muito difícil de prever. O novo coronavírus não parece ser ainda uma gripe espanhola, mas tampouco é um surtozinho de gripe comum. E traz com ele a desaceleração dos negócios pelo mundo. A China pelo jeito conseguiu estancar a expansão interna do contágio, mas o vírus e junto o breque nos negócios vão firmes para cobrir o planeta. Fingir que não é grave ajuda no discurso, mas os fatos, sempre eles, são teimosos.
O horizonte econômico não parece bom. E o governo dá sinais de enveredar para justificativas exóticas, como o “PIB privado”, e o apelo à mobilização da base. É sempre uma saída, mas talvez a correlação de forças atual não ajude. O dia 15 será puramente bolsonarista, e mesmo se mostrar alguma força exibirá junto algum isolamento. E já foi notado semana passada: uma vez desencadeada a dinâmica de rua é bobagem achar que tudo estará 100% sob controle.
O governo Jair Bolsonaro nunca teve obstáculos políticos reais. Como previsto, eles começam a aparecer na economia. Em vez de tentar resolver o governo cria problemas também na política. Se der certo será o caso de reescrever todos os manuais.
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A pouca paciência para a negociação política tem seu charme, mas também tem custo. O rompimento do presidente da República com o PSL está se mostrando algo assim não tão brilhante.
A Aliança pelo Brasil vai num ritmo muito abaixo do que previam seus inspiradores, articuladores e operadores. A eleição de 2020 já era. Talvez seja algo precipitado dizer, mas na velocidade que vai é bom o pessoal acender a luz amarela para 2022.
Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação
Luiz Carlos Azedo: Apelo às massas
“Com o PIB de 1,1%, Bolsonaro tenta se vacinar e responsabilizar o Congresso pelo eventual fracasso. Não é o primeiro a apelar às massas quando o governo vai mal das pernas”
Com o restabelecimento do presidencialismo em janeiro de 1963 e a ampliação dos poderes do presidente João Goulart — que havia assumido o cargo após a renúncia de Jânio Quadros, não sem antes ter que derrotar uma tentativa de golpe militar para impedir sua posse —, a implementação das chamadas reformas de base passou a ser o eixo da disputa política nacional. Goulart apresentou às lideranças políticas um anteprojeto de reforma agrária que previa a desapropriação de terras com título da dívida pública, o que forçosamente obrigava a alteração constitucional. Uma segunda iniciativa para agilizar a agenda das reformas foi o encaminhamento de uma emenda constitucional, que propunha o pagamento da indenização de imóveis urbanos desapropriados por interesse social, com títulos da dívida pública.
Essas propostas, porém, não foram aprovadas pelo Congresso Nacional, o que provocou forte reação por parte dos grupos de esquerda, inclusive nas Forças Armadas. Em setembro de 1963, a Revolta dos Sargentos — movimento que reivindicava o direito de que os chamados graduados das Forças Armadas (sargentos, suboficiais e cabos) exercessem mandato parlamentar em nível municipal, estadual ou federal, o que contrariava a Constituição de 1946 — acirrou a polarização ainda mais. Entretanto, isso aumentou o isolamento de Jango, já agravado pelo rompimento com o Partido Social Democrático (PSD) e Juscelino Kubitschek, que era candidato a presidente nas eleições previstas para 1965.
Diante dessa situação, Jango pediu a Raul Ryff, seu secretário de Imprensa, que era membro do Partido Comunista Brasileiro (PCB), que agendasse um encontro com o líder comunista Luiz Carlos Prestes. O encontro foi organizado por Antônio Ribeiro Granja, membro do secretariado do PCB, num apartamento em Copacabana. À época, Prestes já articulava a reeleição de João Goulart, o que era inconstitucional, à falta de melhor opção para enfrentar as candidaturas de Juscelino e de Carlos Lacerda (UDN), pois o ex-governador gaúcho Leonel Brizola, cunhado do presidente da República, era inelegível. O conselho de Prestes foi Jango apelar às massas e fazer as reformas de base por decreto. Para isso, os comunistas organizariam comícios populares em todos os estados do país, ao qual Jango compareceria.
A mobilização foi iniciada no dia 13 de março de 1964, com o comício realizado na estação da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, também denominado Comício das Reformas, ao qual compareceram cerca de 150 mil pessoas. Na ocasião, Goulart proclamou a necessidade de mudar a Constituição e anunciou a adoção de importantes medidas, como a encampação das refinarias de petróleo particulares e a possibilidade de desapropriação das propriedades privadas valorizadas por investimentos públicos, situadas às margens de estradas e açudes.
Era o começo de uma escalada fatal para democracia, pois, em resposta ao comício, várias manifestações e “marchas” foram convocadas por setores do clero e por entidades femininas. A primeira, A Marcha da Família com Deus pela Liberdade, ocorreu em São Paulo, a 19 de março, no dia de São José, padroeiro da família. Contou com a participação de cerca de 300 mil pessoas, entre as quais Auro de Moura Andrade, presidente do Senado, e Carlos Lacerda, governador do Estado da Guanabara. A última, no dia 2 de abril, após a derrubada de Jango, levou às ruas cerca de um milhão de pessoas e legitimou o golpe militar de 1964, revelando uma correlação de forças favorável à implantação do regime autoritário.
Novo cenário
Ontem, com sinal trocado, durante uma escala em Roraima, a caminho do encontro com o presidente Donald Trump, em Washington, recepcionado por 400 apoiadores, o presidente Jair Bolsonaro resolveu convocar seus partidários para a manifestação do dia 15 de março, com objetivo de pressionar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). “É um movimento espontâneo e o político que tem medo da rua não serve para ser político”, disse Bolsonaro. Na semana passada, havia negado que estava convocando o protesto nas suas redes de WhatsApp, apesar das evidências. Na verdade, o movimento não tem nada de espontâneo: está sendo organizado por grupos de extrema-direita que apoiam Bolsonaro, que também se utiliza de um exército de robôs comandado pelo vereador carioca Carlos Bolsonaro, o 02, seu filho, nas redes sociais.
Há duas motivações aparentes para Bolsonaro convocar a manifestação: manter a pressão sobre o Congresso, que votará os projetos regulamentando a execução das emendas parlamentares ao Orçamento da União; e reforçar os protestos, que estavam sendo esvaziados pelo acordo feito pelo Palácio do Planalto para resolver o impasse em relação ao Orçamento de 2020. Uma terceira motivação, porém, é subjacente: o fracasso do governo na economia começa a lhe subir à cabeça, depois do PIB de 1,1% do ano passado. Além disso, o cenário na economia mundial sinaliza tempos difíceis pela frente, ainda mais com a chegada da epidemia de coronavírus ao Brasil. Bolsonaro tenta se vacinar e responsabilizar o Congresso pelo eventual fracasso.
Como vimos, em que pese as diferenças polares, não é o primeiro presidente a apelar às massas quando o governo vai mal das pernas e enfrenta dificuldades com o Congresso.
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-apelo-as-massas/
El País: Mulheres testam as ruas em protestos por direitos, pelo fim da cultura do feminicídio e contra Bolsonaro
Atos estão marcados em 70 cidades contra retrocessos na pauta feminista, que avança em países vizinhos. Legislação de proteção à mulher avançou no país mas assassinatos subiram
Heloísa Mendonça, do El País
As mulheres no Brasil ainda não conseguiram encher as ruas na mesma proporção que suas pares na Argentina, no Chile, ou nos Estados Unidos e Espanha, quando o assunto é luta por direitos femininos – ou feministas. Mas neste domingo, 8 de março, atos convocados em mais de 70 cidades do país pretendem marcar a posição das brasileiras identificadas com a pauta feminista que se veem ameaçadas pelo retrocesso do atual Governo. As críticas às políticas do presidente Jair Bolsonaro serão um dos motes de vários atos convocados por movimentos, como Mulheres contra Bolsonaro, Marcha Mundial das Mulheres e o coletivo Juntas. O protesto marca também um grito contra o aumento do feminicídio do Brasil, o quinto país que mais mata mulheres no mundo. Apesar da taxa total de homicídios estar em queda, a violência contra as mulheres cresceu no último ano. Dados compilados pela Folha de S. Paulo apontam que o feminicídio avançou 7,2% em 2019. No total, foram 1.310 vítimas de violência doméstica ou por sua condição de gênero. Em 2018, o feminicídio já tinha aumentado 4% , segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A cada hora, quatro meninas de até 13 anos são estupradas no país.
Em São Paulo, o ato acontece às 14h na Avenida Paulista. O ataque ostensivo do presidente Bolsonaro a jornalistas mulheres, como Patricia Campos Mello e Vera Magalhães, também entrou na pauta, assim como demandas específicas das mulheres negras, que sofrem de uma situação ainda mais vulnerável no âmbito sócio-econômico. “Não há como negar que há pautas específicas das negras já que no Brasil existe uma desigualdade entre as próprias mulheres. São as negras que mais morrem, as que são mais encarceradas, as com menos acesso à saúde e as que ganham menos”, explica Juliana Gonçalves, uma das organizadoras da marcha das mulheres negras de São Paulo. As mulheres pretas ou pardas continuam na base da desigualdade de renda no país. Em 2018, elas receberam, em média, menos da metade dos salários dos homens brancos (44,4%), que ocupam o topo da escala de remuneração.
Falar das especificidades das mulheres negras foi, por muito tempo, visto como algo que não agregava à luta ou dividia o movimento feminista, segundo Gonçalves. “Mas quando a gente não fala, tornamos invisível as condições mais precárias e de vulnerabilidade que estão mais intensas na vida de uma mulher negra”, afirma. Ela explica, no entanto, que nos últimos anos, esse diálogo vem melhorando. “As mulheres brancas tem aumentado muito a escuta. É um avanço, em 2018, as mulheres indígenas negras vieram para frente do ato”, diz.
A representante do movimento das mulheres negras pondera, entretanto, que ainda há um longo caminho a ser percorrido, já que muitas mulheres brancas que se autodenominam feministas, reproduzem um discurso machista. “No próprio Big Brother está acontecendo uma situação racista contra o Babu. Não há como ser feminista e não ser antiracista”.
Em um momento, que segundo Gonçalves, o líder de uma nação legitima o discurso homofóbico, racista, que sempre esteve na sociedade isso, é hora de ir às ruas. “Participar do 8 de março é uma forma de gritar é o nosso combate. É uma forma de reafirmar os valores democráticos que estão em risco. Nós também marcharemos no dia 25 de julho, dia internacional da mulher negra latina-americana, e no dia 14 de março quando o crime bárbaro de Marielle Franco completa dois anos sem ter sido solucionado”, diz.
Feminicídio
Desde 2015, quando a lei do feminicídio foi criada, o número de assassinato de mulheres apresenta uma trajetória ascendente. Para alguns especialistas, os feminicídios aumentaram de fato, enquanto outros defendem que apenas o número de registros subiram. Para Gabriela Mansur, promotora de justiça e especialista em direito das mulheres, apesar da violência contra a mulher estar aumentado, a alta dos registros de feminicídios acontece porque a polícia está mais familiarizada com a lei e tratando os casos corretamente.
“Mas não podemos fechar os olhos para essa situação. Quanto mais voz e poder as mulheres estão adquirindo, mais violência elas estão sofrendo também. Precisamos transformar toda a sociedade. É necessário mais investimento em educação e investimentos em políticas públicas voltadas para a igualdade”, afirma Mansur, que alerta que o tema deve ser uma pauta prioritária no país e não apenas levantado no dia internacional das mulheres ou quando um caso grave acontece”, diz ela. O assassinato de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, por exemplo, é uma das bandeiras que estão puxando protesto – há outro marcado para o dia 16, quando a execução da vereadora da Maré e de Gomes completam três anos.Mansur avalia que o país tem hoje uma legislação avançada de proteção à mulher, com a criminalização do assédio, a criação do feminicídio, lei Maria da Penha (contra a violência doméstica) e uma nova lei que obriga profissionais da saúde a comunicar à polícia, em 24 horas, indícios de violência contra mulheres. “Felizmente, hoje vemos um engajamento maior da sociedade no tema. Em São Paulo, temos o exemplo do programa Tem Saída, que conta com o apoio de empresas privadas que viabilizam vagas para mulheres em situação de violência doméstica para gerar autonomia financeira. Estamos cada vez mais unidas ocupando nossos espaços”, explica.
Luiza Eluf, advogada criminal e autora de livros jurídicos sobre crimes sexuais e passionais, concorda que o país progrediu muito nos últimos anos na proteção das mulheres, mas as lei precisam ser mais respeitadas. “Temos noções muito claras e legislações muito precisas que impõem os direitos das mulheres. Falta obedecer”, diz a procuradora de justiça aposentada. Luiza lamenta que o padrão do comportamento do Governo de Jair Bolsonaro seja de desrespeito à mulher e que ataques, como os promovidos a jornalistas mulheres (Partícia Campos Mello e Vera Magalhães) sejam tão constantes. “O presidente utiliza as mulheres como objeto de uso e não se preocupa em ofendê-las em sua sexualidade”, diz. A advogada vê como um forte retrocesso o tratamento de subordinação atribuído às mulheres pelos integrantes do Governo. “A senhora [ministra da Mulher, da Igualdade e dos Direitos Humanos] Damares Alves, que cuida das políticas públicas das mulheres, ainda não percebeu a necessidade de considerar a mulher um ser humano completo e com direito a sua autodeterminação. Ela tem uma visão da mulher subalterna ao marido ou ao homem que esteja ao seu lado”, diz. Damares tem sido questionada sobre os ataques de Bolsonaro a mulheres, como a jornalista Patricia Campos Mello, mas a ministra acaba sempre justificando o que o presidente faz.
Apesar do esforço em aumentar a presença nas ruas, o movimento feminista no Brasil hoje está mais identificado com pautas abraçadas pela esquerda no país, o que tem afastado mulheres que confundem o protesto por direitos reprodutivos, garantias trabalhistas ou pela mesma democracia como atos de política partidária. Um desafio para as feministas brasileiras, que veem nos movimentos de países vizinhos um modelo. Chilenas e argentinas se tornam cada vez mais protagonistas dos movimentos de rua. Nos últimos meses, protestos multitudinários pelos direitos das mulheres avançaram em vários países da região, focados na igualdade de direito e contra a violência de gênero. No Chile, a performance “Un violador en tu camino”, do coletivo LasTesis, rompeu barreiras e deu a volta ao mundo. No Brasil, a luta feminista também pulsa forte com mudanças por dentro do sistema legal, mas ainda não ganhou uma expressão de porte nas ruas como no exterior. Este domingo será um novo teste.
Marcus Pestana: O Papel de cada um
Ou “cada um no seu quadrado”. Ou “cada macaco no seu galho”
Montesquieu, em seu “O Espírito das Leis”, previu como elemento central para o funcionamento das sociedades democráticas a separação dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que deveriam ser independentes e harmônicos entre si. Essa dinâmica é fundamental para que o sistema de freios e contrapesos aja contra qualquer tentativa de exercício absoluto do Poder. A Constituição Brasileira adotou esta configuração. Mas do papel para a realidade, o que vemos hoje no país é que os conflitos institucionais entre os diversos poderes e instituições têm sido um perigoso elemento de instabilidade política. E a retomada do desenvolvimento depende visceralmente da estabilidade institucional.
Muitas vezes, o Judiciário interfere em relações contratuais estabelecidas e na órbita do Legislativo, quando ameaça legislar. O Congresso Nacional, por vezes, tenta engessar o Executivo e limitar as ações do Judiciário. O presidencialismo brasileiro sempre foi forte, e o Executivo era o grande protagonista comandando a agenda legislativa e exercendo fortes pressões sobre o Judiciário. A opção do atual governo de abandonar o “presidencialismo de coalizão” abriu a brecha para que o Legislativo crescesse em suas prerrogativas e desenvolvesse um inédito protagonismo. Tensões institucionais periféricas são naturais e parte do processo democrático, mas sempre dentro de determinados limites.
A temperatura subiu além do razoável, nas últimas semanas, com a convocação de uma manifestação contra o Congresso e o Supremo, com estímulos visíveis de importantes figuras do governo. E o conflito entre governo e Congresso se materializou na discussão sobre o orçamento impositivo.
A democracia moderna nasceu na Inglaterra para limitar o poder absoluto do Rei. Duas leis são centrais na institucionalização da democracia: a Constituição e o orçamento. A Constituição é a bússola maior. Ela é o porto seguro da democracia e a vacina contra qualquer aventura totalitária. Em relação ao orçamento, que ordena as despesas públicas a partir das receitas de impostos recolhidos junto à sociedade, cabe sim às casas parlamentares discutir e votar e ao Executivo executar.
No parlamentarismo, a formação de um governo pressupõe a formação de uma maioria parlamentar e a aprovação de um programa de governo, que encontra expressão nas peças orçamentárias a cada ano. Mesmo no presidencialismo americano, onde se inspirou o Brasil, o Congresso é que constrói a Lei orçamentária. Vejam a luta de Trump para construir seu tão sonhado muro na fronteira com o México. O Congresso americano não priorizou este investimento.
A polêmica instalada na última semana está muito mal discutida e obtendo grande repercussão na opinião pública e nas redes sociais, nem sempre com um enfoque correto e consistente. O orçamento por muito tempo no Brasil foi obra de ficção e o Executivo reinava absoluto. E a execução de emendas parlamentares era discricionária. Fui parlamentar de oposição e sei que tinha muito menos recursos de emendas executados do que os “amigos do Rei”. Era um mecanismo de chantagem e pressão sobre o Congresso, como admitiu o próprio presidente Bolsonaro em entrevista em 2016.
Voltarei ao tema na próxima semana!
Míriam Leitão: O perigo da ambiguidade
É espantoso que um governo com tantos generais tenha sido leniente com a atuação delinquente de servidores públicos armados
Entre as anomalias deste tempo está a ambiguidade com que o governo Bolsonaro tratou o motim da Polícia Militar no Ceará. O presidente, seus filhos e seus ministros, inclusive os generais — com raras exceções — não condenaram a ação criminosa dos policiais e usaram o evento para os seus objetivos políticos. O governador Camilo Santana (PT) se comportou de maneira firme e mesmo depois de tudo resolvido evitou as polêmicas, para focar no principal: este tipo de movimento é crime e passar mensagens dúbias em relação a ele é pôr em risco a ordem pública.
É espantoso que um governo que tem tantos oficiais generais tenha sido leniente com o comportamento delinquente de servidores públicos armados. Se há um valor que as Forças Armadas costumavam prezar é a hierarquia. Os amotinados a quebraram. Eles usaram as armas compradas com o dinheiro dos nossos impostos contra os cidadãos. Com balaclava no rosto, à moda de bandidos, ameaçaram comerciantes e aterrorizaram cidadãos.
O episódio em que ficou mais claro o apoio implícito do governo federal aos amotinados foi o discurso do coronel Aginaldo Oliveira, comandante da Força Nacional, num palanque, elogiando os amotinados. Eles seriam “gigantes” e “corajosos”. “Os senhores se agigantaram de uma forma que não tem tamanho”, disse ele. “Demonstraram isso ao longo de 10,11,12 dias que estão aqui dentro desse quartel, em busca de melhoria da classe, e vão conseguir. Os covardes nunca tentam, os fracos ficam pelo meio do caminho, só os fortes conseguem atingir seus objetivos”. Era um sinal para policiais de outros estados para fazer o mesmo em busca dos seus “objetivos”.
O mais impressionante não foi o que o coronel disse, mas o silêncio dos seus superiores. Um eloquente silêncio como o do ministro da Justiça, Sérgio Moro. Semanas antes, Moro fora padrinho no casamento do coronel com a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) e, no discurso da cerimônia, usou para definir a noiva uma palavra considerada elogiosa: “caveira.” No caso do Ceará, Moro escondeu-se no silêncio. Em outros momentos foi loquaz.
No Twitter ele politizou o caso afirmando que “a crise no Ceará só foi resolvida pela ação do governo federal, Forças Armadas e Força Nacional que protegeram a população e garantiram a segurança”. É falso. O governador Camilo Santana foi bem mais equilibrado. Ele reconheceu, em entrevista à Central Globonews, o papel do governo federal, mas afirmou que o governo estadual foi fundamental para debelar a crise e criar os parâmetros para além das fronteiras do Ceará. Santana mandou uma Proposta de Emenda à Constituição do estado proibindo a concessão de anistia a policiais amotinados. Ela já foi aprovada com um adendo feito pelos parlamentares: a própria assembleia fica proibida de analisar aumentos de salários por seis meses após um motim. Se o governador cedesse, o problema se espalharia por outros estados. A tibieza do governo federal tem um motivo conhecido: Bolsonaro fez sua carreira política apoiando motins de policiais. Ele próprio saiu do Exército num caso de insubordinação.
O senador Cid Gomes (PDT-CE) tentou entrar com uma retroescavadeira em um quartel de amotinados. O governo aproveitou esse ataque de insensatez para fazer política. O governador Camilo Santana, por sua vez, não quis criticar o senador porque ele é seu aliado. Disse que ele estava demonstrando indignação. Há muitas formas de demonstrar esse sentimento. Essa não é uma delas. Mas o fato é que hoje Cid Gomes carrega duas balas no corpo. O deputado Eduardo Bolsonaro protocolou denúncia na Procuradoria-Geral da República contra Cid Gomes por “tentativa de homicídio” e “dano ao patrimônio público”. Não houve a mesma preocupação de criticar os amotinados ou quem atirou contra o senador, nem por parte do deputado, nem por parte de integrantes da cúpula do governo.
Moro conseguiu a proeza de dar um nó num princípio jurídico. Afirmou que a “paralisação” era ilegal, mas os policiais não podiam ser tratados como criminosos. Para o ex-juiz, descumprir a lei deixou de ser crime. Aliás, é a lei maior, a própria Constituição, que proíbe greve de militares. Por isso, a definição correta não é a palavra “paralisação” que o ministro usou, mas motim.
Merval Pereira: ‘Isso aí acabou’
Deputados procuraram o presidente da Câmara com uma apreensão: acreditavam que estavam sendo gravados
Foi assim que o ministro Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da presidência da República, tranquilizou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em relação ao temor de alguns deputados de que estariam sendo monitorados pelo governo.
No início do governo Bolsonaro, quando a relação com o Congresso estava em momento crítico, deputados procuraram o presidente da Câmara com uma apreensão: acreditavam que estavam sendo gravados.
Os relatos não foram conjuntos, mas individuais, em diversas circunstâncias, uns consideravam que seus telefonemas estavam sendo grampeados, outros “sentiam” que estavam sendo gravados em suas conversas no Palácio do Planalto.
Eram mais percepções e temores do que fatos concretos que motivassem uma reclamação formal do presidente da Câmara. Até que um deputado com patente militar, ligado à comunidade de tecnologia de segurança de informação, disse a Maia que tinha certeza de que fora grampeado, e deu detalhes técnicos sobre o que poderia ter acontecido ao seu celular Android.
Segundo relatos de deputados, o presidente da Câmara aproveitou uma conversa com o General Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) para abordar o tema delicado. Revelou a preocupação de diversos deputados, e recebeu a resposta tranquilizadora, que foi repassada aos deputados queixosos. O assunto morreu.
A revelação do ex-ministro Gustavo Bebianno de que o filho 02 Carlos Bolsonaro pensara em montar um esquema não oficial paralelo de monitoramento de políticos e jornalistas trouxe o assunto de volta ao noticiário e gerou desdobramentos.
Ontem, a revista Crusoé publicou em sua capa um amplo material sobre o tema, detalhando como o esquema teria sido montado. Não há dúvida de que o atual diretor da Agência Brasileira de Informações (ABIN), delegado Alexandre Ramagem foi quem incialmente discutiu com Carlos e mais três agentes da Polícia Federal a estruturação de uma equipe que seria responsável por essa atividade. Mas não é possível afirmar, (apenas intuir), que ele sabia que o trabalho seria clandestino, embora patrocinado pelo novo grupo que ocupava o Palácio do Planalto.
Há o antecedente histórico do ex-presidente dos Estados Unidos Richard Nixon, político paranóico que procurou se proteger gravando clandestinamente as conversas no Salão Oval e grampeando seus “inimigos”.
Também objetivava impedir que vazamentos de documentos oficiais voltassem a acontecer como no caso dos Pentagon Papers, que revelou atuação ilegal do Departamento de Estado na Guerra do Vietnã. Essa equipe clandestina era conhecida como “plumbers” (bombeiros), e foi descoberta a partir da prisão de um grupo que invadiu a sede do Partido Democrata no prédio Watergate em Washington. A descoberta dos esquemas clandestinos levou à renúncia de Nixon ante a possibilidade de sofrer um impeachment.
O que é certo é que o General Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro, conversou com o General Heleno sobre o assunto, e também Gustavo Bebianno, o primeiro a revelar formalmente essa tentativa do filho do presidente de montar um serviço de segurança paralelo ao já disponível pela presidência da República.
Houve o aconselhamento ao presidente da República, por parte dos dois ex-ministros, de que seria uma temeridade acobertar tal tipo de atividade, que poderia motivar um impeachment.
O ministro Augusto Heleno mais uma vez ontem negou a veracidade da tentativa de criar-se uma “ABIN paralela”. Mas não se referiu em nenhum momento ao filho do presidente, talvez indiretamente citado na definição de “devaneio de amadores”, como classificou a informação.
De fato, é tecnicamente equivocado chamar-se de “ABIN paralela” uma equipe clandestina de rastreamento de pessoas em posições “sensíveis”, embora seja jornalisticamente oportuno.
Mas as indicações são claras de que esse movimento foi feito. Se o esquema chegou a ser implementado a ponto de os deputados “sentirem” sua presença nas conversas políticas, é um tema para ser investigado mais a fundo.
Pode ser até mesmo que não tenha nem sido instalado, diante das advertências aos “amadores”. Ou, o que seria uma tragédia institucional, pode ser que tal esquema continue em plena vigência. Só uma investigação independente poderá esclarecer a situação.
Adriana Fernandes: Espiral negativa na economia
Bolsonaro só joga lenha nessa fogueira; nega-se a assumir protagonismo na agenda
O governo deveria deixar de lado urgentemente o debate sobre a separação da composição do PIB privado x PIB público, que ganhou força pelas redes sociais após a divulgação do resultado de 1,1% de alta do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019.
Alimentar e estender a polarização também na área econômica, com propaganda política disparada pelo Palácio do Planalto, é irritante e tira o foco do que é principal neste momento: estancar a espiral negativa que abala a economia brasileira nos últimos dias. É uma distração desnecessária.
A espiral, sim, é assustadora. O dólar em alta e a saída rápida de dinheiro do País dão o tom do momento. O ambiente doméstico ruim se soma ao cenário desafiador provocado pelo impacto negativo na economia mundial do alastramento da epidemia do novo coronavírus.
Num piscar de olhos, a economia pode afundar e perder até mesmo o pouco crescimento que temos para hoje e que é justamente alvo das críticas. É isso que se quer?
São muitos os problemas a serem encaminhados nas próximas 15 semanas (até que o Congresso pare de vez por conta das eleições). O ministro da Economia, Paulo Guedes, está perdendo a cada dia nacos grandes de confiança que o setor privado lhe conferiu desde o início do governo.
O presidente Jair Bolsonaro só joga lenha nessa fogueira. Nega-se a assumir protagonismo na agenda e ao mesmo tempo pressiona por resultados rápidos na economia para se reeleger. Faz sentido?
É com estupefação que assistimos Bolsonaro, mais uma vez, criticar o trabalho da Receita Federal, minando o órgão que é responsável por colocar dinheiro no caixa. O que pode acontecer a um país onde os contribuintes não confiam na capacidade do Fisco de arrecadar? Aumento da sonegação e cofres mais vazios.
É, portanto, de natureza menor a polêmica encabeçada pela Secretaria de Política Econômica (SPE) sobre a composição do PIB usada nas propagandas.
Estamos naquele momento difícil em que a pergunta que mais se faz em Brasília é a seguinte: Paulo Guedes vai abandonar o barco? No momento, o ministro não dá sinais de que fará isso. Mas a sua equipe dá sinais, sim, de ter perdido a direção. Ou Guedes toma as rédeas do seu plano, ou acabou o ano para a equipe econômica, sem nem mesmo ter começado. Sinalização ruim e ainda não explicada foi o presidente ter retirado competências dadas a Guedes na gestão do Orçamento.
Que motivo teríamos para ter um crescimento mais robusto? Os canais monetários, via redução de juros, estão enferrujados. Os canais fiscais (recursos orçamentários para investimentos), atrofiados. Os canais extrafiscais (como o dinheiro do FGTS) estão se exaurindo. Produtividade estagnada e demanda fraca.
É difícil ter reforma sem apoio do governo. A União é a única que pode negociar e compensar perdas na arrecadação com o Congresso. O que vai gerar crescimento são projetos que valorizem os ativos no presente.
As reformas continuam sendo importantes, por mais que os opositores da política econômica atual insistam em retirar a importância delas neste momento. Não há política econômica que vá resolver o problema do PIB baixo em um ano, dois anos.
Reformas não são só aquelas estruturantes, como a tributária e a administrativa, defendidas pelo Ministério da Economia. O Congresso deveria ir a fundo numa ampla reforma regulatória para limpar o caminho para o investimento. Isso não é ladainha. As reformas são fundamentais. São pré-requisito.
O presidente Jair Bolsonaro piora o clima com sua postura irresponsável.
Por outro lado, a dinâmica negativa pode ser revertida. Ela pode fazer o Congresso acordar e abrir uma oportunidade para trazer as coisas a um nível de razoabilidade maior, permitir avanços em pautas boas, como por exemplo, o projeto do saneamento, a reforma tributária. A agenda econômica não pode perder fôlego. Procura-se o bombeiro.
Miguel Reale Júnior: Nacional-populismo
Bolsonaro pulou fora da dignidade e dos limites constitucionais impostos pelo cargo
A eleição de Bolsonaro insere-se no fenômeno do surgimento da direita nacional-populista que levou ao poder Trump nos Estados Unidos, Viktor Orbán na Hungria, Salvini e Beppe Grillo na Itália, ao Brexit e a Johnson na Inglaterra.
Líderes vencem não pela consistência de suas convicções, mas porque, orientados por especialistas em opinião pública, lançam mão de técnicas e algoritmos na internet. Conhecem, então, a receita do bolo a ser servido a cada tribo de consumidores/eleitores, por via do estudo científico dos medos, aspirações, alegrias e ódios desvelados no uso das redes sociais, das quais surge perfeita tomografia de corpo e alma dos usuários. As frustrações e a raiva que produzem são fonte de energia e formam o cardápio político. Conforme Moura e Corbellini (A Eleição Disruptiva – por que Bolsonaro venceu, Record, 2019),“a vitória de Bolsonaro foi a manifestação da ira contra tudo o que está aí, foi a eleição dos indignados”.
Os magos por trás da máquina de controle daqueles que se pensam, enganadamente, fautores do próprio destino por integrarem as redes sociais são os técnicos como Gianroberto Casaleggio, na Itália, Dominic Cummings, que conduziu a campanha em favor do Brexit, o ex-chefe de campanha de Trump e próximo de Olavo de Carvalho, Steve Bannon, o articulador de Orbán, Arthur Finkelstein e o controvertido jornalista Milo Yiannopoulos.
É Giuliano Da Empoli, no livro Os Engenheiros do Caos (Vestígio, 2019, tradução de Arnaldo Bloch), que revela a nova política tecnicamente administrada, gerida sem nenhum limite ético.
As manobras antes utilizadas em face do consumidor passaram a ser aplicadas ao eleitor, objeto de cooptação para levar ao poder ambiciosos sem pudor, falsos moralistas que prometem expulsar os maus do “templo” valendo-se do ressentimento e da raiva fáceis de ser explorados, sempre sob a ótica conspiratória contra bodes expiatórios denunciados com fake news nas redes sociais.
Adotam esses chefes autoritários posições diversas a cada passo. Dizem um dia o necessário para contentar parcela Y da sociedade, para no seguinte, sem preocupação com a coerência, aderirem ao inverso, se preciso, para satisfazer a parcela X.
No caso brasileiro, o desencanto com a corrupção após a ditadura, a desesperança de dias melhores após a nova Constituição, bem como a crise de segurança pública facilitaram um discurso raso de direita e a indicação dos culpados: a classe política, acusada de só ver o próprio interesse, as elites traidoras, o aparelhamento do Estado.
A eventual frustração de cada qual nos planos profissional, econômico, sexual, familiar se soma à indignação dos eleitores contra o PT, a corrupção, o Congresso, o STF, muitos sem perceber que ir contra os dois últimos lesa direitos fundamentais e instaura o arbítrio.
A tática é sempre a mesma: populistas, ao se nutrirem do ódio dos outros, fazem da humilhação dos poderosos a sua promessa, como diz Da Empoli. Ser vulgar e grosseiro, mormente com a imprensa, e afrontar o politicamente correto passa por exprimir autenticidade, atendendo ao gosto popular, ao contrário dos hábitos das elites e da velha política.
Buscam-se os cantos, e não o centro, ou um denominador comum. Não há união, mas adjunção. Somam-se desconhecidos, cada qual carregando sua revolta em direção aos extremos e a ser explorada pelos líderes populistas manobrados pelos técnicos em algoritmos e internet.
Da Empoli ressalta: “No mundo de Trump, Johnson e Bolsonaro cada novo dia nasce com uma gafe, uma polêmica, a eclosão de um escândalo e, mal se está comentando um evento, esse já é eclipsado por outro, numa espiral infinita que catalisa a atenção e satura a cena midiática”.
No carnaval houve reiterada conduta agressiva de Bolsonaro: ofendeu a jornalista da Folha; divulgou conversa do general Heleno chamando congressistas de chantagistas e sugerindo ida às ruas; postou no WhatsApp dois vídeos convocando para ato em 15 de março: num conclama patriotas a resgatar o Brasil e defender o presidente cristão e incorruptível; no outro põe os nomes Gen. Heleno/Cap. Bolsonaro e se faz de mártir ante os inimigos do Brasil; na quinta-feira 27/2 acusou mendazmente a jornalista Vera Magalhães de mentir.
Se Bolsonaro nunca teve apreço pela democracia representativa e pelos partidos políticos, sabe, todavia, o valor de um gabinete do ódio no terceiro andar do palácio a calibrar a relação direta entre o “líder” e o povo a ser emocionalmente explorado. Basta assistir ao vídeo compartilhado no qual sem pudor é endeusado: “Foi chamado a lutar por nós”, “quase morreu por nós”, “única esperança de dias cada vez melhores”, “presidente trabalhador, patriota”, “precisa de nosso apoio nas ruas”. Apoio por quê? Ora, apenas em favor da ambição do poder populista, sem intermediação.
O que parece desatino em muito é planejado. Na convocação para o dia 15 Bolsonaro exagerou e pulou no carnaval fora da dignidade e dos limites constitucionais impostos pelo cargo. O mesmo na triste comédia do PIB.
*Advogado, professor titular sênior da Faculdade de Direito da USP, membro da Academia Paulista de Letras, foi ministro da Justiça
José Álvaro Moisés: Em defesa da democracia representativa
Democratas têm de dizer sem subterfúgios que não concordam com as iniciativas bolsonaristas
Eleito com grande maioria de votos, o presidente Jair Bolsonaro tem a responsabilidade de pacificar a Nação, apesar de seus arroubos autoritários, pois, desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, o Brasil está completamente dividido e polarizado política e ideologicamente, o que afeta as relações do governo com a sociedade. A legitimidade eleitoral conquistada nas eleições, porém, não o autoriza a abandonar a obrigação de governar para todos os brasileiros, e não apenas para os seus apoiadores. O próprio presidente assegurou ao País que faria isso ao jurar respeito à Constituição da República.
Em seu primeiro ano de mandato, no entanto, Bolsonaro alimentou muitas dúvidas sobre a racionalidade de suas ações e o compromisso de cumprir a Constituição. Recusando-se a formar uma maioria governativa no Congresso Nacional, como requerido pelo sistema político, não assumiu a liderança do partido que o elegeu nem coordenou as forças que o apoiam. Diante de novo protagonismo do Congresso, optou pela ausência de diálogo com as forças políticas e envolveu-se em seguidos conflitos com o Poder Legislativo, que, não obstante, tem aprovado suas propostas, a exemplo da reforma da Previdência e, agora, o seu veto no caso do orçamento impositivo. Quanto às questões tributária e administrativa, o governo hesita e não define os seus projetos.
Durante 2019, o presidente sustentou uma retórica de confronto com seus críticos e adversários, grosseira em muitos episódios, e ofensiva ao decoro do cargo pelo grau de desrespeito a importantes segmentos da sociedade, como as mulheres, os negros e os indígenas, cujos direitos ameaçou ou tentou retirar em alguns casos. Quis ainda controlar a liberdade de ação da sociedade civil e, adotando uma política ambientalista desastrosa, voltada para desconstruir o que havia sido feito em governos anteriores, atritou-se com chefes de Estado estrangeiros focados na preservação da Amazônia, esvaziando o papel do Brasil nessa área.
A estratégia do presidente se choca com a estabilidade institucional requerida pela doutrina da separação de Poderes e busca o tempo todo desviar a atenção da estagnação econômica, que permanece, apesar de uns poucos sinais de recuperação, e de suas supostas ligações com milicianos. Ademais, hostilizou governadores de oposição com acusações descabidas e desafiou a maioria deles a diminuir impostos sem, contudo, dialogar ou apresentar propostas consistentes a esse respeito. Nem a gravíssima crise de segurança do Ceará fez o presidente desautorizar o desrespeito às leis por policiais militares revoltosos.
Mas mais grave é o seu indisfarçável apoio à manifestação convocada por bolsonaristas contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). Agredindo jornalistas como Vera Magalhães pelo desmentido disso, como tinha feito com Patrícia Campos Mello, Jair Bolsonaro tenta se livrar da responsabilidade por ações que juristas e políticos consideram que tipificam crime de responsabilidade, mas sabe perfeitamente que manifestações pedindo o fechamento do Parlamento e da Corte Suprema atentam contra a democracia - e, como cumpridor da Constituição, Bolsonaro deveria desautorizá-las.
Trata-se de uma sinalização perigosa de descompromisso com a democracia, que precisa ter resposta firme da sociedade brasileira. A situação abre uma extraordinária janela de oportunidade para que os defensores da democracia representativa mobilizem as suas bases, por meio de seus partidos, associações, sindicatos e grupos religiosos, para reafirmar os valores fundamentais da democracia - a liberdade, a igualdade política e o império da lei -, mas também para debater as distorções das instituições de representação, que causam desconfiança e rejeição popular, especialmente os partidos e o Parlamento.
Nesse sentido, a inconsistência programática dos partidos, a sua falta de democracia interna, o abuso no uso de recursos para campanhas eleitorais, a desconexão entre representados e representantes e, principalmente, o sentimentos de muitos eleitores de não serem relevantes para instituições como o Congresso precisam ser enfrentados, não podem ser deixados apenas como argumentos dos inimigos da democracia.
O desafio é claro. Empresários, formadores de opinião, dirigentes partidários, chefes religiosos, sindicalistas, intelectuais - e, especialmente, os que querem assumir o papel de líderes da Nação - têm de dizer sem subterfúgios que não concordam com as iniciativas dos bolsonaristas, apoiadas pelo governo, contra a democracia representativa e a liberdade. A melhor defesa do regime é enfrentar suas crises para aperfeiçoá-lo, mobilizar a população e pôr as propostas necessárias de reforma em debate. Os democratas precisam fazer isso antes que seja tarde demais.
*Professor sênior do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), é autor do livro ‘Crises da Democracia - o papel do Congresso, dos Deputados e dos Partidos’ (2019)
Helio Schwartsman: Os planos maquiavélicos de Bolsonaro
Mesmo sem força para mudanças profundas, suas ações já pioraram a democracia
A estratégia protogolpista do presidente Jair Bolsonaro é perfeita, exceto pela falta de um ingrediente essencial, que são os índices elevados de popularidade. Para que a tática de jogar o povo contra os outros Poderes funcione, é preciso que o Executivo conte com o apoio decidido da maioria dos cidadãos —e isso Bolsonaro não tem.
Com efeito, líderes populistas que lograram enfraquecer as instituições incumbidas de controlá-los, como Vladimir Putin, Viktor Orbán, Recep Tayyp Erdogan e Hugo Chávez, tiveram força política para enquadrar outros Poderes e até reescrever as constituições de seus países graças a bons resultados econômicos que, durante algum tempo, entregaram a seus eleitores.
Bolsonaro não chegou nem perto disso. As pesquisas de popularidade lhe dão algo em torno dos 30% de avaliações positivas, contra 36% de negativas. E é remota a chance de ele vir a surfar numa onda de pujança econômica. Se, no final de 2019, economistas ainda viam a possibilidade de o Brasil crescer uns 2% em 2020, as perspectivas pioraram no último par de meses. Agora, com o coronavírus, já há quem fale em recessão global, um cenário que seria mais compatível com rejeição nas urnas e impeachment do que com reeleição e remodelamento constitucional.
Daí não decorre, obviamente, que não precisemos nos preocupar com o estado de nossa democracia nem resistir às investidas autoritárias do presidente. No mundo contemporâneo, as ameaças à democracia já não vêm tanto na forma de tanques, mas de perda de higidez. Ficam cada vez mais raras as rupturas formais e se tornam mais presentes arranjos híbridos, em que figuras sombrias instaladas no Executivo desequilibram o balanço institucional para abocanhar mais poder. Mesmo que Bolsonaro não tenha força para introduzir mudanças profundas no sistema, muitas de suas ações mais ordinárias já pioraram a qualidade de nossa democracia.
El País: Bolsonaro e o Congresso, reinvenção ou morte do presidencialismo de coalizão?
Rodrigo Maia não parece vocacionado a articular um golpe parlamentar. Mas, como diz o chavão, na política não há vazio de poder
LEONARDO MARTINS BARBOSA, JOÃO FERES JÚNIOR e FERNANDO MEIRELES
O ano de 2020 se inicia como terminou 2019: marcado por episódios de conflito entre o presidente Jair Bolsonaro e o Congresso. Desta vez, a razão da disputa gira em torno do controle de fatia bilionária do orçamento. A regulação do orçamento positivo, tal como aprovada pelos parlamentares na Lei de Diretrizes Orçamentárias e vetada por Bolsonaro, reservava ao relator do projeto o controle sobre 30 bilhões do orçamento do Governo federal. Em reação, Bolsonaro chegou ao ponto de convocar suas bases para uma manifestação que, dentre outras pautas, promete hostilizar abertamente o Congresso. O episódio é mais um exemplo da relação descompassada entre os dois poderes, para dizer o mínimo.
Bolsonaro de fato se negou a compor uma coalizão parlamentar de apoio ao seu Governo e, ironicamente para quem acusava o presidencialismo de coalizão de troca-troca imoral de favores, conduz as relações com o Parlamento da maneira mais obscura possível. Não é necessário doutorado em teoria da ação coletiva para saber que a agregação de preferências diminui o custo transacional, ou, em outras palavras, sem partidos fortes e aglutinados, a negociação com o parlamento fica muito mais complexa e cara. Mas Bolsonaro e sua turma não são conhecidos por dar importância à ciência, ainda mais à ciência da política —atividade que o “olavismo” associa ao comunismo.
Nesse contexto, é à primeira vista surpreendente o estudo elaborado pelo Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB), que identifica como característica marcante desse primeiro ano de mandato uma alta taxa de governismo no Congresso. Aplicando um método consolidado na ciência política para analisar clivagens parlamentares, a equipe do OLB não apenas averiguou que o apoio ou oposição ao governo foi o motivo central de conflito entre os congressistas, como também que uma maioria substantiva havia apoiado consistentemente as propostas legislativas do Planalto em 2019. Em uma escala de 0 a 10, em que 10 representa o máximo de apoio ao governo e 0 oposição total cerrada, nada menos do que 74,4% dos deputados e deputadas apresentaram notas maiores que 7. No Senado, praticamente 50% dos titulares registraram notas 9 ou 10.
Como explicar essa aparente contradição entre a alta taxa de governismo parlamentar e um cenário de hostilidade entre os dois poderes?
O estudo contém pista importante para a resposta. Verificamos também que os deputados se distribuem em três grandes grupos na Câmara (que se diferencia assim do Senado, onde apenas dois grandes grupos foram encontrados). O primeiro é formado por representantes que demonstraram apoio sólido ao governo, principalmente aqueles filiados ao Novo e ao PSL (a análise ainda não mediu os efeitos da tardia cisão no PSL). O segundo grupo é o de oposição, em que se encontram parlamentares do PT, PSOL, REDE, PCdoB e, em menor medida, PSB e PDT. O terceiro e maior grupo é constituído pela massa de partidos de centro-direita, tais como PSDB, PMDB, PP, DEM e tantos outros do denominado “centrão”. O grupo, em razão de seu tamanho, foi o principal responsável pelo relativo êxito legislativo alcançado até aqui das propostas do executivo. Contudo, embora governista, ele não apresenta uma taxa tão alta quanto à do primeiro grupo, demonstrando, assim, autonomia no trato com o Planalto.
Os dois projetos que até agora foram os mais simbólicos da agenda do novo governo, a reforma da previdência e o pacote anticrime, servem de exemplo para avaliarmos o comportamento desse terceiro grupo. Os projetos são oriundos dos dois mais poderosos ministros do Planalto, Paulo Guedes, a frente do Ministério da Economia, e Sergio Moro, Ministro da Justiça e Segurança Pública. Na reforma da previdência, houve certa convergência entre as principais lideranças do Congresso e o governo. De fato, a aprovação de reforma dessa envergadura deveu-se em grande parte ao protagonismo exercido pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que articulou maioria sólida a seu favor. A atuação de Maia, entretanto, modificou o projeto em pontos importantes, limitando, por exemplo, as mudanças na previdência rural e reduzindo o tempo mínimo de contribuição originalmente proposto no projeto.
No pacote anticrime patrocinado por Moro, a interferência parlamentar foi ainda maior. Não foram aceitas, por exemplo, alterações nas regras do denominado excludente de ilicitude, a prisão após condenação em segunda instância e a criação do modelo de “plea bargain”.
Um terceiro exemplo de relativa autonomia parlamentar é o decreto de regulamentação do porte de armas editado pelo presidente Bolsonaro no começo de seu mandato. Ele foi revogado pelo próprio executivo, após o Congresso ameaçar fazê-lo por meio de decreto legislativo (aqui vale a leitura da análise da política dos decretos, também do OLB).
Desde o impeachment o Congresso tem se mostrado disposto a alterar a balança de poder do sistema político, movimento que se repetiu na disputa em torno à regulação do orçamento impositivo. O poder de iniciativa e autonomia sobre a execução do orçamento constituíram nas últimas décadas peça chave de um modelo centrado no executivo, que agora é questionado por lideranças parlamentares. Se em 2019 foi conveniente Maia e o Centrão que ele comanda uma atitude governista, nada garante que este ano e nos dois anos que resta a esse governo tal tendência vá se repetir.
Enquanto isso, Bolsonaro insiste em governar sem coalizão e praticamente sem partido. Junte-se a isso o fracasso das promessas de crescimento econômico e o torvelinho de absurdidades produzido diariamente pelo presidente e sua entourage, sempre dispostos a ofender gregos e troianos. A revolta do General Heleno e de Bolsonaro, e a chamada para a passeata do dia 15 de março, parecem sinais de um executivo que se enfraquece diariamente, frente a um Congresso que consegue se manter coeso e partidariamente disciplinado, a despeito de sua péssima reputação popular.
Rodrigo Maia não parece vocacionado a articular um golpe parlamentar. Mas, como diz o chavão, na política não há vazio de poder, e o comportamento do presidente está empurrando o Congresso e vários atores políticos a sonharem com o parlamentarismo como solução para uma crise profunda de governabilidade que criou. É bastante irônico ver um entusiasta do autoritarismo causar, por falta de virtude política, tamanha corrosão no poder do líder máximo da nação, o Presidente da República —cargo que acidentalmente ocupa.
Leonardo Martins Barbosa é pesquisador do Observartório do Legislativo Brasileiro, doutor em Ciência Política pelo IESP-UERJ e pesquisador sênior do NECON. Estuda partidos políticos e o sistema partidário brasileiro, com ênfase na inserção do PT no sistema político nacional. Tem graduação e mestrado em História.
João Feres Júnior é coordenador do Observartório do Legislativo Brasileiro e professor associado de Ciência Politica do IESP-UERJ e coordenador do Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP).
Fernando Meireles é doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Pós-Doutorando no IESP-UERJ. É pesquisador do Centro de Estudos Legislativos (CEL/UFMG) e foi pesquisador visitante no Departamento de Ciência Política da University of Essex