gastos militares

TCU pede explicações a Braga Netto e Guedes sobre dinheiro do SUS em gastos militares

Relatório enviado à CPI da Covid indicou uso de dinheiro da pandemia para despesas como material de cama, mesa e banho e manutenção de prédios da Defesa

Vinicius Valfré, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – O Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que os ministérios da Defesa e da Economia ofereçam explicações sobre o uso de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS), destacados para o combate à pandemia, para gastos corriqueiros de militares.

O despacho de segunda-feira, 2, de autoria do ministro Bruno Dantas, tem o propósito de apurar suspeitas de irregularidades na descentralização de recursos do Ministério da Saúde, em 2020, para execução de ações de saúde pelo Ministério da Defesa.

Os indícios de mau uso da verba vieram à tona em estudo da procuradora Élida Graziane, do Ministério Público de Contas de São Paulo, enviado à CPI da Covid.

Dos recursos extraordinários desembolsados em 2020 pela União para o combate à covid, a Defesa ficou com R$ 435,5 milhões. Do dinheiro que deveria ter ido ao SUS, a Defesa gastou R$ 58 mil com material odontológico, R$ 5,99 milhões com energia elétrica, água e esgoto, gás e serviços domésticos. Também há gastos com R$ 25,5 mil com material de coudelaria ou de uso zootécnico, R$ 1 milhão com uniformes e R$ 225,9 mil com material de cama, mesa e banho e R$ 6,2 milhões com a manutenção e a conservação de bens imóveis.

Outros R$ 100 milhões foram para despesas médico-hospitalares com materiais e serviços em hospitais militares, “sem que se tenha prova de que foram gastos em benefício da população em geral, ao invés de apenas atender aos hospitais militares, os quais se recusaram a ceder leitos para tratamento de pacientes civis com covid-19”.

A procuradora sustenta que usar dinheiro de um crédito extraordinário para cobrir gastos cotidianos seria uma burla ao teto dos gastos. No documento enviado à CPI, Graziane também salienta que, apesar de ter tido uma dotação autorizada de R$ 69,88 bilhões para enfrentamento da pandemia, dos quais R$ 63,74 bilhões foram destinados ao Ministério da Saúde, o SUS efetivamente só contou com R$ 41,75 bilhões “porque o governo federal deixou de executar praticamente o expressivo saldo de R$22 bilhões em relação aos créditos extraordinários abertos no Orçamento de Guerra (Emenda 106/2020) no ano passado.”

“É preciso que a CPI da Pandemia, o MPF (Ministério Público Federal), o TCU (Tribunal de Cotas da União) e o CNS (Conselho Nacional de Saúde) apurem, mais detidamente, a motivação e a finalidade de várias despesas oriundas de recursos do Fundo Nacional de Saúde realizadas por diversos órgãos militares”, afirma a procuradora, no relatório.

No despacho, Bruno Dantas deu 15 dias para que o Ministério da Defesa, chefiado pelo general Braga Netto, e o da Economia, de Paulo Guedes, apresentem uma série de explicações. Eles deverão informar os objetivos pormenorizados da descentralização e as orientações às unidades orçamentárias para a execução dos créditos da Saúde.

Sobre o relatório da procuradora, a Defesa informou ao Estadão, no mês passado, somente que “os assuntos pautados na Comissão Parlamentar de Inquérito da covid-19, no Senado Federal, serão tratados apenas naquele fórum”. Procurada novamente nesta terça, 3, a pasta não se manifestou. A Economia também não respondeu até a publicação desta reportagem.

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Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,tcu-pede-explicacoes-a-braga-netto-e-guedes-sobre-dinheiro-do-sus-usado-em-gastos-militares,70003799462


O Globo: Forças Armadas querem mais R$ 2,5 bilhões para caças, foguetes e submarinos

Pasta solicitou expansão para projetos das Forças Armadas, mas deve esbarrar em aval do Ministério da Economia

Vinicius Sassine, O Globo

BRASÍLIA — O Ministério da Defesa quer ampliar em 37% o seu orçamento para investimentos no próximo ano para bancar projetos considerados prioritários, como a compra de caças, lançadores de foguetes e submarinos de propulsão nuclear.

A proposta, em fase de elaboração, amplia a previsão de investimentos de R$ 6,7 bilhões, aprovada para 2020, para R$ 9,2 bilhões. Dos recursos previstos para este ano, R$ 3 bilhões já foram pagos, segundo o portal de orçamento do Senado. Integrantes da pasta, porém, admitem que será difícil conseguir o aval do Ministério da Economia para a ampliação desejada.

Esta é a verba que banca projetos como a compra de caças do projeto FX-2, que envolvem os Gripen suecos, pela Aeronáutica; de lançadores múltiplos de foguetes, pelo Exército; e de submarinos de propulsão nuclear, pela Marinha. Desde o começo do mandato de Jair Bolsonaro, as Forças Armadas vêm buscando — e conseguindo — ampliar seu orçamento.

Na ofensiva mais recente, o Ministério da Defesa incluiu na Política Nacional de Defesa (PND) e na Estratégia Nacional de Defesa (END) a intenção de que o orçamento do setor chegue a 2% do PIB. Os textos foram enviados ao Congresso Nacional.

Nos documentos, o governo passou a prever uma “rivalidade entre Estados” na esfera regional e relacionou essa “rivalidade” a uma necessidade de ampliação dos gastos militares. O governo Bolsonaro já expôs suas divergências com o regime de Nicolás Maduro na Venezuela — não reconhecido pelo Brasil — e manifestou sua insatisfação com a eleição de Alberto Fernández para a presidência da Argentina. Não há citação específica aos países nos documentos.

Caso a regra desejada de se alcançar os 2% do PIB já estivesse em vigor, os gastos totais com as Forças teriam alcançado R$ 146 bilhões no ano passado, R$ 49,1 bilhões a mais do que foi efetivamente desembolsado. O Ministério da Defesa, sob Bolsonaro, já teve um aumento de gastos superior ao crescimento registrado em ministérios como Educação, Saúde, Agricultura e Relações Exteriores. O grosso dos gastos das Forças é com a folha de pagamento do pessoal da ativa e da reserva.

O projeto do Orçamento da União para 2021 deve ser encaminhado neste mês ao Congresso. Apesar do pedido de mais recursos para investimentos, não há previsão de novos projetos, e os valores a mais seriam destinados aos que já estão em andamento. A pasta sustenta que o valor pedido seria condizente com uma média histórica. O orçamento de investimentos da pasta chegou a R$ 9,9 bilhões em 2017 e caiu nos dois anos posteriores, chegando a R$ 6,5 bilhões no ano passado.

Além do pedido por mais recursos, os materiais enviados ao Congresso citam formalmente a meritocracia como critério para capacitação de quadros militares e novas contratações. E uma estratégia para as Forças Armadas, também na área de formação educacional, prevê o desenvolvimento de programas que despertem um “sentimento de patriotismo”.

“Patriotismo”

A lei determina que PND e END — e o chamado Livro Branco, uma espécie de inventário da estrutura das Forças — sejam atualizados a cada quatro anos. Os textos são protocolares e genéricos, tidos como documentos de Estado, independentes do governo de ocasião.

O GLOBO comparou o conteúdo atualizado em 2020 com os documentos atualizados em 2012 e em 2016, nas gestões de Dilma Rousseff e Michel Temer, respectivamente.

Na Estratégia Nacional de Defesa, no capítulo que trata de capacitação e dotação de recursos humanos, uma nova estratégia integra as diretrizes da defesa nacional: “Valorizar a meritocracia e a formação continuada”. O termo "meritocracia" não aparece nos documentos atualizados em 2012 e 2016.

A atualização das diretrizes feita no governo Bolsonaro também deixou explícito o desejo de promoção do “sentimento de patriotismo”. O termo aparece três vezes na END de 2020, enquanto é citado uma única vez no documento de 2016 e nenhuma no de 2012.

Uma nova estratégia surgiu no documento: “Fortalecer o sentimento coletivo, o patriotismo e a adesão da sociedade brasileira aos esforços de defesa do país.” Uma segunda foi adaptada. Antes, tratava-se de “contribuir para a ampliação de programas educacionais que visem à promoção da cidadania”. Agora, “contribuir para a ampliação de programas educacionais e desportivos, que visem à promoção da cidadania e do sentimento de patriotismo.”

Antes do envio dos documentos ao Congresso, duas inovações já haviam se tornado públicas: a intenção de elevar o orçamento da área a 2% do PIB e a previsão de “tensões e crises” nas áreas vizinhas ao Brasil. Os militares levam em conta como próximas uma região chamada de “entorno estratégico”, que inclui a América do Sul e a extensão do Atlântico até a costa da África Ocidental.