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Clóvis Rossi: E se Guaidó fracassar no sábado?

A receita Mourão é correta; falta cozinhá-la

O general Hamilton Mourão, vice-presidente do Brasil, tem toda a razão ao dizer, sobre a Venezuela, que “a única solução é o regime do Maduro entender que acabou, promover novas eleições, se eleja quem tem que ser e partir daí terá de ter haver plano Marshall na Venezuela".

De acordo, general. Pena que eu não tenha conseguido contato contigo para perguntar se a tentativa de fazer entrar ajuda humanitária na Venezuela neste sábado (23) vai de fato contribuir para chegar à solução proposta.

Tomara que sim, mas temo que não. Examinemos as possibilidades mais lógicas a respeito do 23F:

1 - A ajuda não entra, pela truculenta resistência da ditadura. Analisa, desde já, o Miami Herald, geralmente bem informado sobre Venezuela, até pela vizinhança geográfica: “Tantos apoiadores como críticos da decisão de reconhecer Guaidó [Juan Guaidó, como presidente interino] estão preocupados em perder o ímpeto para eleições se o sábado chega e passa sem uma mudança no status quo".

Essa suposição sobre a perda de ímpeto é recorrente na mídia internacional, para o caso de fracassar a iniciativa de Guaidó.

A oposição terá conseguido apenas expor a um público bastante amplo e à mídia internacional, ao vivo e em cores, a brutalidade da ditadura.

Minha dúvida é saber se as caravanas convocadas por Guaidó se conterão ao chegar às fronteiras ou se se atirarão contra as tropas que as estão bloqueando. Abre-se a perspectiva de um banho de sangue cujas consequências não dá nem para imaginar.

2 - A ditadura, além da truculência tradicional, recorre a um trambique, outra de suas especialidades: deixa a ajuda entrar, mas, à medida que os caminhões vão se afastando das fronteiras e, por extensão, da vista do público e da mídia externa, se apropriam dos carregamentos.

Faz, em seguida, ela própria, a distribuição de alimentos e medicamentos, para o que até já dispõe de um mecanismo (militarizado), os CLAPs (Comitês Locais de Abastecimento e Preços). É o meio para exercer controle social sobre a população.

É capaz até de ganhar pontos porque a penúria dos venezuelanos é tão tremenda que qualquer alívio é bem recebido, venha de quem vier.

3 - Os militares permitem a entrada da ajuda. Seria o “game over” para Maduro, porque significaria ter perdido o respaldo do único setor com que conta para manter-se no poder.

Ainda assim, seria preciso ver se Maduro “entende que acabou", como gostaria o general Mourão, ou se será preciso uma negociação (com quem?) para estabelecer as regras para a transição até as eleições.

Qualquer que seja o desfecho deste sábado, gostaria que o general Mourão explicasse o que vai propor, na segunda-feira (25), quando se reunir na Colômbia o Grupo de Lima, o conglomerado dos principais países das Américas que tenta tirar a Venezuela do buraco.

Se eu fosse o general, proporia, para começar, tirar protagonismo dos Estados Unidos, hoje o país que mais atiça as chamas e, por extensão, o que mais estimula Maduro a reagir com fogo. Talvez a liderança de países e/ou instituições menos hidrófobas (Canadá, União Europeia, por exemplo) crie melhores condições para criar o percurso (correto) do general Mourão.

Intervenções americanas anteriores criaram, no mais das vezes, ditaduras cruéis —e ditaduras é tudo o que Venezuela dispensa depois da tragédia a que foi conduzida.


Ricardo Noblat: Ajuda de mentirinha à Venezuela

Ameaçada a entrega de alimentos

A não ser que mude o que estava planejado até ontem, não passará de mentirinha a ajuda do governo brasileiro aos venezuelanos famintos e vítimas da ditadura instalada naquele país.

Havia 200 toneladas de alimentos a serem despachadas para um lugar na fronteira entre os dois países. E lá, apenas um caminhão para transportá-la.

A decisão do governo brasileiro era de esperar que venezuelanos fossem buscá-la. Se não forem ficará por isso mesmo. O governo de Nicolás Maduro fechou a fronteira do país com o Brasil.

Será difícil que algum caminhão consiga passar de um lado para o outro. De resto, o governo brasileiro não quer se meter numa encrenca que só renderia dividendos políticos ao governo de Donald Trump.

PT de ouvidos moucos

Algemado a Lula em Curitiba
Vez por outra, algum petista de alto coturno cobra do partido que admita os erros que cometeu, liberte-se de sua dependência doentia e infantil de Lula, e que se reinvente.

Foi o que fez ontem, por exemplo, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), reeleito no ano passado com quase 80% dos votos.

“Lula sofre uma grande injustiça, deu uma grande contribuição ao país, mas precisam vir novas pessoas, novos quadros”, defendeu Santana, aliado também de Ciro Gomes (PDT-CE).

A corrente majoritária dentro do PT não quer mudanças, a não ser cosméticas. Lula já indicou que se depender dele, a deputada Gleisy Hoffman continuará no comando do partido. É de sua confiança.

Mesmo líderes do PT favoráveis a um passo à frente do partido temem que ele se fragmente durante esse processo. A aparente unidade só se mantém por causa da força de Lula.

Dará em nada a sugestão de Santana. O PT jaz algemado ao seu mentor em um cárcere de Curitiba. Faz o papel de uma pálida e triste figura. Apostará no fracasso do governo Bolsonaro. E é só.