Fundo Partidário
Confira os principais pontos do novo Código Eleitoral aprovado na Câmara
Com quase 900 artigos e mais de 370 páginas, a proposta reformula amplamente a legislação partidária e eleitoral
DW Brasil
A Câmara dos Deputados aprovou ontem (9/9) o texto-base do projeto de lei que estabelece um novo Código Eleitoral no país. Foram 378 votos a favor e 80 contra.
Os deputados ainda analisam os destaques à proposta, ou seja, sugestões apresentadas para alterar trechos do texto. Em seguida, o projeto segue para análise do Senado.
Para valer já para as eleições do ano que vem, a legislação precisa ser aprovada tanto pela Câmara como pelo Senado e sancionada pela Presidência da República pelo menos um ano antes do primeiro turno, ou seja, antes de 2 de outubro.
Com quase 900 artigos e mais de 370 páginas, a proposta reformula amplamente a legislação partidária e eleitoral, revogando as leis vigentes e reunindo as regras em um único código. O texto é criticado por enfraquecer a Lei da Ficha Limpa, diminuir a transparência e flexibilizar a prestação de contas e o uso do fundo partidário pelos partidos, entre outras medidas.
Por outro lado, os deputados decidiram derrubar um dos poucos pontos bem-recebidos por analistas: a exigência de uma quarentena de cinco anos para que juízes, membros do Ministério Público, militares e policiais disputem eleições. Esse item impediria, por exemplo, que ex-juízes como Sergio Moro se candidatem a um cargo eletivo logo após deixar a magistratura.
Os únicos partidos que se manifestaram contra o texto foram o Novo, a Rede e o Psol. Confiram os principais pontos da proposta:
Sondagens eleitorais
O projeto de lei proíbe a divulgação de pesquisas eleitorais na véspera e no dia do pleito. No dia da eleição, só poderá haver divulgação de sondagens após o encerramento da votação em todo o país, no caso da disputa pela Presidência, ou a partir das 17h, nos demais casos. Especialistas afirmam que o veto a institutos confiáveis pode levar à divulgação de números falsos na véspera e no dia da votação e confundir eleitores.
Além disso, o texto obriga os institutos de pesquisa a informarem o percentual de acerto nas sondagens feitas nas últimas cinco eleições. Esse item é criticado pelos institutos, que argumentam que pesquisas servem para dar o retrato de um momento, e não prever o resultado.
Ficha Limpa
Um dos pontos mais polêmicos da nova proposta, segundo especialistas, é que o texto afrouxa pontos da Lei da Ficha Limpa. Em vigor desde 2010, a norma, criada a partir de iniciativa popular, serve para impedir a eleição a cargos políticos de candidatos condenados por órgãos colegiados.
O texto aprovado na Câmara altera o prazo de inelegibilidade estabelecido pela Ficha Limpa. O período continua a ser de oito anos, mas agora começa a contar a partir da condenação, e não apenas a partir do fim do cumprimento da pena. Já para o político condenado a perda de mandato, os oito anos de inelegibilidade contarão a partir da decisão, e não mais a partir do término do mandato, como é atualmente.
Havia risco de os deputados acabarem com uma regra importante da Ficha Limpa, que torna inelegível por oito anos os políticos que renunciam ao mandato para fugir de processos de cassação. No final, porém, os deputados retiraram esse item do texto.
Fundo partidário
A proposta enumera uma série de itens que podem ser financiados com recursos públicos do fundo partidário. A legenda poderá ainda usar a verba para "gasto de interesse partidário, conforme deliberação da executiva do partido", sem precisar especificar o fim do gasto. Atualmente, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) expõe esses dados com organização e transparência.
Prestação de contas e multas
Além disso, a proposta estabelece que a prestação de contas dos partidos será feita por meio do sistema da Receita Federal, e não mais pelo sistema personalizado usado atualmente pela Justiça Eleitoral.
As legendas poderão ainda contratar, com verba do fundo partidário, empresas privadas para auditar a prestação de contas, o que analistas veem como uma terceirização do trabalho da Justiça Eleitoral.
O texto ainda reduz de cinco para três anos o prazo para a Justiça Eleitoral julgar as prestações de contas, que passam a ser processos administrativos. Já a multa por irregularidades em prestações passa a ter um teto de R$ 30 mil, e não mais 20% do valor irregular, como é atualmente, podendo chegar a milhões de reais.
Fake news
A proposta estabelece punição para quem compartilhar informações falsas com objetivo de influenciar as eleições. A pena varia de um a quatro anos de reclusão, mais multa.
Se a prática visa "atingir a integridade dos processos de votação, apuração e totalização de votos, com a finalidade de promover a desordem ou estimular a recusa social dos resultados eleitorais", a punição pode ser acrescida de metade a dois terços.
Outro dispositivo prevê mecanismos contra a divulgação de fake news nas eleições ao autorizar a Justiça Eleitoral a suspender perfis identificados como robôs nas redes sociais durante o pleito.
Inclusão
O projeto de lei determina que os votos em mulheres, indígenas e negros valerão por dois para efeitos da distribuição dos recursos do fundo eleitoral. A medida tem o objetivo de aumentar a participação desses segmentos da sociedade no processo eleitoral.
Caixa 2
O novo Código Eleitoral também prevê o crime de caixa 2, descrito como "doar, receber, ter em depósito ou utilizar, de qualquer modo, nas campanhas eleitorais ou para fins de campanha eleitoral, recursos financeiros fora das hipóteses da legislação eleitoral". Contudo, se a irregularidade for de baixo valor, a Justiça poderá deixar de aplicar a pena.
Candidaturas coletivas
O texto prevê a autorização de candidaturas coletivas em cargos de deputado e vereador. Esse tipo de candidatura é caracterizado pela tomada de decisão coletiva nas votações e encaminhamentos legislativos.
O partido deverá autorizar e regulamentar essa candidatura em seu estatuto, mas a candidatura coletiva será representada formalmente por apenas uma pessoa. O texto permite, no entanto, que o nome do coletivo seja registrado na Justiça Eleitoral junto com o nome do candidato, assim como nas propagandas, isso se não criar dúvidas quanto à identidade do candidato registrado.
O partido definirá regras para o uso desse tipo de candidatura, especificando como ocorrerá seu financiamento e a participação da coletividade na tomada de decisão sobre os rumos e estratégias políticas da candidatura.
Transporte de eleitores e comícios
A proposta prevê ainda a descriminalização do transporte ilegal de eleitores, que passa a ser punido na esfera cível com multa de R$ 5 mil a R$ 10 mil.
Os crimes do dia da eleição, como comícios, carreatas, boca de urna e uso de alto-falantes, também se tornam infração cível, com pena de multa de R$ 5 mil a R$ 30 mil.
Fidelidade partidária
O projeto altera também as regras de fidelidade partidária, estendendo para governadores, prefeitos e presidente a obrigação de permanecer na legenda após a eleição. Atualmente, apenas parlamentares devem cumprir fidelidade partidária. Um dos destaques já aprovados pelos parlamentares limitou a mudança de legenda apenas ao final do mandato, antes da eleição seguinte.
Fonte: DW Brasil / Agência Brasil / Agência Câmara
https://www.dw.com/pt-br/os-principais-pontos-do-novo-c%C3%B3digo-eleitoral-aprovado-na-c%C3%A2mara/a-59142585
Bolsonaro é aconselhado a deixar para 2022 definição do partido para reeleição
Popularidade em baixa é usada por Ciro Nogueira para adiamento. Interlocutores avaliam que ministro quer ganhar tempo no PP
Jussara Soares / O Globo
BRASÍLIA — O presidente Jair Bolsonaro tem sido aconselhado a deixar para o início do ano que vem a definição do partido pelo qual vai disputar a reeleição. O principal defensor do adiamento é o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, que chegou ao cargo há um mês com as missões de melhorar a articulação política em meio à crise institucional e organizar as bases para o projeto de um novo mandato.
O principal argumento é a popularidade em baixa do presidente: no início de julho, o Datafolha apontou que 51% dos brasileiros reprovavam a gestão, um recorde, e levantamentos internos recentes apontam um desgaste acentuado também fruto do discurso inflamado contra o Judiciário e a respeito de outros temas — na sexta, ele defendeu que todos os cidadãos comprassem um fuzil.
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A interlocutores, Nogueira também afirmou que o desempenho de Bolsonaro nas pesquisas de intenção de voto será crucial para a definição da chapa. Em um cenário de recuperação, ficará livre para escolher um nome de confiança; caso contrário, será obrigado a fazer uma composição em que o partido do vice terá um peso muito relevante.
Bolsonaro, que está sem legenda desde que deixou o PSL, em outubro de 2019, havia estabelecido março como limite para a definição. O presidente dizia não querer repetir o que ocorreu em 2018, quando ingressou no PSL a sete meses da eleição. O projeto de controlar o Patriota, no entanto, esbarrou em desavenças internas na sigla, que hoje tem o senador Flávio Bolsonaro (RJ) em seus quadros. Também há conversas com PL, PTB e PMB.
Estratégia para aliviar pressão
Para políticos que acompanham as movimentações partidárias para 2022, Nogueira age também para diminuir a pressão para que o PP, partido do qual é presidente licenciado, receba Bolsonaro e seu grupo. Embora a legenda esteja no comando da Casa Civil, internamente há resistências ao presidente em razão dos atritos que ele provoca e por questões políticas locais, casos de estados como Bahia Maranhão, Pernambuco e Bahia. Na viagem que fez pelo Nordeste, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com nomes do partido, casos do deputado federal Dudu da Fonte (PE) e o vice-governador da Bahia, João Leão.
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— A ida do presidente para o PP vai depender da retomada da economia e da recuperação dele nas pesquisas. O ministro Ciro Nogueira e boa parte do partido estão empenhados nisso, mas se não acontecer (a melhora econômica e a reviravolta nas pesquisas), o Ciro vai consultar os diretórios estaduais, e será decidido pela maioria — resume o deputado federal Fausto Pinato (PP-SP).
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/bolsonaro-aconselhado-deixar-para-2022-definicao-do-partido-para-disputar-reeleicao-25177903
Congresso se articula para dobrar valor do fundo eleitoral para, no mínimo, R$ 4 bi
Alternativa é derrubar decisão de Bolsonaro, que vetou teto de R$ 5,7 bi, ou negociar a ampliação do valor na Lei Orçamentária
Bruno Góes e Jussara Soares / O Globo
Após o presidente Jair Bolsonaro vetar trecho da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que destinava cerca de R$ 5,7 bilhões ao Fundo Eleitoral, o Congresso Nacional se mobiliza para garantir ao menos R$ 4 bilhões para as campanhas de 2022. A interlocutores, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sinalizou que os parlamentares não trabalham com valor menor.
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O montante é mais que o dobro do custo das eleições gerais de 2018, quando as legendas tiveram R$ 1,7 bilhão à sua disposição. Até que o veto de Bolsonaro seja analisado pelo Congresso, porém, ainda há incertezas sobre qual alternativa legal seria usada pelos parlamentares para fazer valer a vontade do Legislativo.
A disposição de Lira é negociar com o Palácio do Planalto uma despesa para o processo eleitoral na ordem de R$ 4 bilhões ou R$ 4,5 bilhões. Bolsonaro, por sua vez, vem sendo fortemente pressionado pela militância, e teria sinalizado à área técnica do governo que fixaria, por meio da Lei Orçamentária Anual (LOA), o valor de R$ 2 bilhões da eleição de 2020, corrigidos pela inflação, o que resultaria em aproximadamente R$ 2,2 bilhões.
“É lógico que (Bolsonaro) vai enviar um valor menor. Nós não esperávamos um valor que achamos que é suficiente, valor de R$ 4 bilhões a R$ 4,5 bilhões”
PAULINHO DA FORÇA / Solidariedade (SP)
Lideranças partidárias, porém, consideram o valor insuficiente para a realização das campanhas de 2022. O argumento é o de que as eleições para prefeito e vereador teriam custos menores que os registrados nas eleições gerais, quando são escolhidos deputados federais, estaduais, distritais, senadores, governadores e o presidente da República.
— A eleição é para deputado estadual, federal, senador, governador e presidente da República. Portanto, não são suficientes os R$ 2 bilhões corrigidos pela inflação. Vamos discutir com os partidos e verificar um valor suficiente para as eleições e vamos aprovar no Congresso. Temos que aumentar esse fundo que ele mandar — disse o presidente do Solidariedade, o deputado federal Paulinho da Força (SP).
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O deputado afirmou ainda que a expectativa é, mesmo, que Bolsonaro envie uma proposta com valor bem inferior aos R$ 5,7 bilhões por meio da LOA.
— É lógico que ele (presidente Bolsonaro) vai enviar um valor menor. Nós não esperávamos que ele enviasse um valor que achamos que é suficiente, valor de R$ 4 bilhões a R$ 4,5 bilhões — afirmou o parlamentar.
Busca da solução jurídica
Bolsonaro tem até o dia 31 de agosto para enviar ao Congresso a LOA de 2022. A votação, porém, deve acontecer apenas em dezembro deste ano. Enquanto a LDO fixa as balizas para o Orçamento, a LOA determina os valores exatos para cada ação governamental.
Na LDO, a projeção de R$ 5,7 bilhões foi feita a partir do parâmetro que havia sido redigido pelo Congresso. Nele, havia a determinação de que parte da verba do fundo seria equivalente a 25% do orçamento de dois exercícios (2021 e 2022) da Justiça Eleitoral.
Esse valor do fundo também obedecia a outro critério: a origem do recurso seria o remanejamento de emendas de bancada impositivas.
“O valor da eleição municipal com correção não é o ideal. Vamos começar as discussões sobre esta semana”
ISNALDO BULHÕES(MDB-AL)
Ao indicar o veto, a área técnica do governo avaliou que não há necessidade de correção da LDO. Isso porque a Lei das Eleições, que criou o Fundo Eleitoral, trata das fontes de recursos que devem ser usadas para bancar as campanhas. Assim, bastaria ao governo indicar um valor menor na Lei Orçamentária.
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No Congresso, parlamentares do Centrão ouvidos reservadamente avaliam que a decisão de Bolsonaro pode forçar a construção de um acordo para a derrubada do veto. Há dúvidas sobre a legalidade do repasse ao chamado Fundão sem uma baliza fixada pela LDO. Neste caso, se o veto for derrubado, a negociação prevê que valor intermediário passaria por um corte do orçamento da Justiça Eleitoral ou o envio de um novo projeto para estipular um novo critério.
— Só tem duas alternativas: modificar a lei, buscando um outro texto para essa previsão, ou derrubar o veto e a previsão ficar mantida, e, depois, discutirmos o valor na Lei Orçamentária — disse o líder do MDB na Câmara, o deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL).
O parlamentar também concorda que o valor de R$ 2 bilhões é insuficiente e que o Congresso buscará aumentar o montante.
— Vai ter que discutir esse valor. Acredito que o valor da eleição municipal com correção não é o ideal. Vamos começar as discussões sobre esta semana — disse Bulhões.
Outros congressistas avaliam que é preciso sentar à mesa para tratar do assunto com clareza. Presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), a senadora Rose de Freitas (MDB-ES) diz que não é necessário derrotar o governo em plenário.
— Esse não é o caminho (derrubar o veto). Há uma controvérsia muito grande. Vamos ter que sentar à mesa e dialogar dentro da realidade que existe. Há uma pressão da sociedade sobre esse assunto. Mobilizar o Congresso para alocar R$ 5 bilhões numa eleição... é muito dinheiro para um país que está com tantas dificuldades, como desemprego e fome — diz a senadora.
Congresso manobra para liberar R$ 7 bilhões de verba pública a partidos
Após aumento do fundo eleitoral para R$ 5,7 bi, parlamentares tentam ampliar para R$ 1,3 bi valor destinado ao custeio de partidos; recursos podem abastecer campanhas
Daniel Weterman, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Além de aumentar o fundo eleitoral para R$ 5,7 bilhões em 2022, o Congresso se movimenta para adotar duas medidas que têm influência nas eleições do ano que vem: turbinar o Fundo Partidário, aquele pago todos os anos às legendas, e retomar a propaganda das legendas no rádio e na TV fora do período eleitoral. As mudanças devem ampliar o montante de recursos públicos para as campanhas e pressionar o teto de gastos, que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior.
Em 2021, o Orçamento prevê R$ 979,4 milhões para o Fundo Partidário. Para 2022, a estimativa é de que o fundo tenha R$ 1,061 bilhão, caso não haja mudança na lei. Um projeto aprovado no Senado em julho, porém, traz a volta da propaganda das siglas e aumenta os recursos do Fundo Partidário para financiar as inserções no rádio e na TV.
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Se a proposta receber o aval da Câmara e for sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, o valor vai aumentar para R$ 1,3 bilhão no ano que vem, conforme análise da Consultoria de Orçamento do Senado repassada ao Estadão/Broadcast. Somados os dois fundos (eleitoral e partidário), o gasto público com as eleições de 2022 pode chegar a R$ 7 bilhões, um patamar inédito.
Diferentemente do fundo eleitoral, pago apenas no período das disputas, o Fundo Partidário é transferido todos os anos para as legendas com registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). É um recurso para bancar o funcionamento dos diretórios e as atividades diárias das siglas. Em ano eleitoral, porém, o dinheiro pode ser usado para irrigar as campanhas. A única exigência é gastar 5% do total com a promoção da participação de mulheres na política, regra que o Congresso tenta flexibilizar.
A articulação para ampliar os valores ganhou força após o Supremo Tribunal Federal (STF) proibir o financiamento empresarial de campanhas. A retomada dessa proposta chegou a ser ensaiada no Legislativo neste ano, mas não andou. O presidente Jair Bolsonaro já prometeu vetar o aumento do fundo eleitoral, mas admitiu negociar uma reserva de R$ 4 bilhões, patamar exigido pelo Centrão.
Propaganda. No dia 14 de julho, o Senado aprovou um projeto para recriar a propaganda partidária, extinta em 2017. A proposta foi apresentada pelos senadores Jorginho Mello (PL-SC) e Wellington Fagundes (PL-MT) e é relatada por Carlos Portinho (PL-RJ), todos aliados de Bolsonaro. O PL é um dos principais partidos do Centrão. A proposta estabelece que o Fundo Partidário seja reforçado em ano eleitoral com os valores da compensação fiscal que as emissoras de rádio e TV receberam em 2016, por causa da propaganda. Em ano não eleitoral, a referência será 2017.
Se os valores forem aplicados, o Fundo Partidário terá R$ 1,291 bilhões em 2022 e R$ 1,658 bilhão em 2023, sempre aumentando nos anos seguintes, de acordo com a análise da consultoria. Os senadores aprovaram o aumento sob a justificativa de bancar o retorno da propaganda, que gera renúncia fiscal para a União. A Consultoria do Senado afirma, porém, que a compensação não é suficiente, em razão do teto de gastos, que limita o crescimento das despesas independentemente da arrecadação.
Nos últimos anos, o Fundo Partidário tem sido reajustado pela inflação por causa do teto. É o que estabelece o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) aprovado no Congresso. O texto precisa ser sancionado ou vetado pelo presidente Jair Bolsonaro até o próximo dia 20.
A intenção de retomar a propaganda partidária é tão efetiva no Congresso que os parlamentares aprovaram um dispositivo na LDO de 2022 para obrigar o governo a prever despesas com o ressarcimento das emissoras de rádio e TV pelas inserções. No parecer do projeto do Senado, o relator Carlos Portinho argumentou “que há necessidade do fortalecimento do Fundo Partidário” para arcar com o novo gasto previsto”.
“A propaganda nunca foi gratuita. (O eleitor) não tinha ideia dos volumes de compensação. E a gente está falando de dinheiro público e de tributo”, disse o senador ao defender no plenário do Senado o aumento do Fundo Partidário para financiar o retorno da propaganda das legendas no rádio e na TV.
Impacto. Da forma como foi aprovado pelo Congresso, o fundo eleitoral vai tirar R$ 4,93 bilhões de obras e serviços de interesse dos próprios parlamentares no ano que vem, como mostrou o Estadão. O valor corresponde aos recursos que sairão das emendas de bancada estadual, calculadas em R$ 7,06 bilhões no próximo ano.
O aumento do Fundo Partidário, por outro lado, vai acabar pressionando outras ações da Justiça Eleitoral, como a manutenção dos tribunais e os investimentos em tecnologia. Motivo: os recursos saem justamente do orçamento da Justiça Eleitoral e do total arrecadado com multas no Judiciário.
Os dois fundos são despesas obrigatórias e garantidas em lei. Precisam estar na previsão de gastos da União e são blindadas de cortes. Na prática, de acordo com técnicos ouvidos pela reportagem, o aumento retira dinheiro de outras áreas, como saúde e educação. No ano que vem, por exemplo, se o Executivo verificar a necessidade de bloquear gastos federais para cumprir a meta de resultado primário – a conta que precisa fechar no fim do ano entre receitas e despesas –, o corte em outras áreas pode se tornar obrigatório, já que os fundos partidário e eleitoral estão protegidos.
No mês passado, um grupo de parlamentares entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) para anular a votação da LDO e proibir o aumento do fundo eleitoral. A Corte ainda não se pronunciou sobre a ação, mas pediu esclarecimentos à Câmara e ao Senado. A cúpula do Congresso defende a votação do projeto e nega descumprimento de normas do Legislativo, como alegam os críticos da proposta.
Para entender: fontes de financiamento
O Fundo Partidário é destinado aos partidos políticos para o custeamento de despesas diárias, como contas de luz, água, aluguel, etc. Ele é constituído por uma mistura de verba pública e doações privadas, em que entram dotações orçamentárias da União, multas, penalidades e outros recursos atribuídos pela Lei 9.096/1995. O Congresso aprovou que esse dinheiro também fosse destinado ao impulsionamento de conteúdo na internet, compra de passagens aéreas para não filiados e contratação de advogados e contadores.
Já o fundo eleitoral é um valor retirado inteiramente da verba pública (Tesouro Nacional) e destinado aos partidos em anos eleitorais para bancar as campanhas de seus candidatos, como viagens, cabos eleitorais e material de divulgação. Para ter acesso aos recursos, diretórios nacionais dos partidos precisam aprovar em votação os critérios para distribuição do dinheiro. Em seguida, as siglas enviam um ofício ao TSE com as informações sobre os critérios fixados.
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* Título original do texto foi alterado para publicação no portal da FAP
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São seis frentes que tramitam separadamente e tratam de temas como pesquisas eleitorais, voto impresso, cotas e distritão
Ranier Bragon e Danielle Brant / Folha de S. Paulo
Com a volta esta semana dos trabalhos no Congresso, a Câmara dos Deputados pretende votar propostas que visam alterar praticamente toda a legislação eleitoral e política do país, em uma reforma que, se entrar em vigor, será a maior da história desde a Constituição de 1988.
O Senado já aprovou antes do recesso um minipacote que, agora, aguarda análise dos deputados.
Entenda os principais pontos de cada uma das seis frentes de debate no Congresso, o estágio da tramitação de cada uma delas e o que pode mudar em relação ao que vigora hoje em dia.
1 - REVOGAÇÃO DE TODA A LEGISLAÇÃO ELEITORAL ORDINÁRIA E CONSOLIDAÇÃO DAS REGRAS EM UM ÚNICO CÓDIGO
O que é: projeto de lei complementar debatido por um grupo de parlamentares e relatado pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), uma das principais aliadas de Lira
Estágio de tramitação: texto está pronto para ser votado no plenário da Câmara
Próximos passos: caso seja aprovado, segue para votação no Senado. Para valer nas eleições de 2022, tem que estar aprovado e sancionado pelo presidente da República até o início de outubro, a um ano da disputa
Alguns dos principais pontos:
2 - ALTERAÇÕES NAS REGRAS ELEITORAIS ESTABELECIDAS NA CONSTITUIÇÃO
O que é: proposta de emenda à Constituição relatada pela deputada Renata Abreu (Podemos-SP)
Estágio de tramitação: texto está pronto para ser votado na comissão especial da Câmara
Próximos passos: caso seja aprovado, segue para votação no plenário, onde precisa do apoio de ao menos 308 dos 513 deputados. Para valer nas eleições de 2022, tem que passar ainda pelo Senado e ser ser promulgado até o início de outubro, a um ano da disputa
Alguns dos principais pontos:
3 - VOTO IMPRESSO
O que é: proposta de emenda à Constituição relatada pelo deputado Filipe Barros (PSL-PR)
Estágio de tramitação: texto está pronto para ser votado na comissão especial da Câmara
Próximos passos: caso seja aprovado, segue para votação no plenário, onde precisa do apoio de ao menos 308 dos 513 deputados. Para valer nas eleições de 2022, tem que passar ainda pelo Senado e ser ser promulgado até o início de outubro, a um ano da disputa
Principal ponto:
Estabelece a impressão do voto dado pelo eleitor na urna eletrônica. O projeto obriga a expedição de cédulas físicas conferíveis pelo eleitor, que seriam depositadas em uma urna, de forma automática e sem contato manual
4 - MINIRREFORMA ELEITORAL DO SENADO
O que é: projetos sobre temas eleitorais, já aprovados pelo Senado
Estágio de tramitação: Aguardam votação pela Câmara
Próximos passos: caso sejam aprovados pelos deputados sem alteração, vão à sanção presidencial. Caso sejam alterados, voltam para análise do Senado. Para valer nas eleições de 2022, têm que estar sancionados até o início de outubro, a um ano da disputa
Alguns dos principais pontos:
5 - FUNDO ELEITORAL
O que é: previsão de gasto de dinheiro público na campanha de 2022, inserida na Lei de Diretrizes Orçamentárias
Estágio de tramitação: Aguarda sanção ou veto do presidente Jair Bolsonaro
Próximos passos: independentemente da decisão de Bolsonaro agora, valor final só será definido na discussão pelo Congresso do Orçamento-2022, a partir de setembro.
Principal ponto:
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Deputados e senadores aprovaram a LDO com dispositivo que quase triplica o valor do Fundo Eleitoral para as eleições de 2022, indo para R$ 5,7 bilhões. O fundo é a principal fonte de financiamento dos candidatos. Há tentativa de acordo para que o valor fique em torno de R$ 4 bilhões
6 - SEMIPRESIDENCIALISMO
O que é: texto ainda indefinido
Estágio de tramitação: nova proposta de emenda à Constituição pode ser apresentada ou pode ser usado texto já protocolado no ano passado pelo deputado Samuel Moreira (PSDB-SP).
Próximos passos: medida precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado em dois turnos de votação em cada Casa, com o apoio de ao menos 60% dos parlamentares.
Principal ponto:
Espécie de parlamentarismo, mas com a manutenção de mais poder na mão do presidente. O presidente da República, eleito pelo voto direto, é o chefe de Estado, comandante Supremo das Forças Armadas e tem o poder de dissolver o Congresso Nacional em casos extremos, convocando novas eleições, entre outras funções. Ele é responsável por indicar o primeiro-ministro, que é quem governará, de fato, juntamente com o Conselho de Ministros. O gabinete cai e é substituído caso perca apoio no Congresso.
O modelo é defendido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes e pelo ex-presidente Michel Temer (MDB). O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), manifestou inclinação favorável à medida, para valer a partir de 2026. Oposição no Congresso é contra.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/congresso-quer-alterar-todo-o-sistema-politico-e-eleitoral-do-pais-entenda-principais-pontos.shtml
Luiz Carlos Azedo: A caixa preta dos partidos
“A criação de um fundo eleitoral com recursos públicos, além do fundo partidário, ao exigir maior controle da Justiça Eleitoral e transparência, acirrou as contradições internas nos partidos”
Casa de eleitos pelo voto majoritário, o Senado adotou uma estratégia de redução de danos em razão da polêmica sobre as regras de prestação de contas dos partidos nas campanhas eleitorais. Como se sabe, a Câmara mudou essas regras para reduzir o controle do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), abrandar as medidas punitivas e proteger os dirigentes partidários envolvidos em irregularidades, o que provocou forte reação da opinião pública e de organizações não governamentais que atuam no campo da transparência em relação ao uso de recursos públicos. O Senado rejeitou as mudanças.
Relator do projeto, o senador Weverton Rocha (PDT-MA) chegou a fazer três alterações no texto com o objetivo de tentar aprovar a proposta a tempo de as mudanças valerem para as eleições de 2020. Mesmo assim, o Senado rejeitou, na íntegra, o projeto de lei que propõe a flexibilização das regras eleitorais e partidárias. O próprio presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), havia incluído a mudança como o primeiro item da pauta de votação de plenário, ontem, mas enfrentou forte reação de um grupo de parlamentares e de entidades da sociedade civil, que pressionaram os senadores pelas redes sociais e visitaram seus gabinetes.
Alcolumbre convocou uma sessão extraordinária da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para definir o fundo eleitoral, o chamado “fundão”, usado pelos partidos em ano de eleições, mas sem mudança de regras. “O valor do financiamento de campanha será mantido e as demais regras serão rejeitadas”, havia garantido o presidente do Senado. O financiamento dos partidos e das suas campanhas eleitorais é um assunto mal-resolvido pelos políticos, porque a decisão de proibir o financiamento por parte de empresas e exercer maior controle sobre as doações eleitorais foi do Supremo Tribunal Federal (STF) e não do Congresso.
Até então, havia duas fontes diferentes de financiamento da política: o fundo partidário, com recursos públicos, que era gerenciado pelas direções dos partidos, e as doações eleitorais, que eram destinadas aos candidatos individualmente, por pessoas físicas e jurídicas, via campanhas eleitorais. Esse sistema não eliminou a antiga prática de caixa dois eleitoral, na qual empresas e empresários doavam recursos para as campanhas sem declará-los à Justiça Eleitoral. Esse tipo de prática provocou duas grandes crises políticas: em 1992, a CPI do PC Farias, alusão ao tesoureiro da campanha de Fernando Collor de Mello à Presidência da República, que resultou no seu impeachment; e, em 2005, a crise do mensalão, que quase derrubou o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e provocou a prisão de toda cúpula do PT, que foi condenada pelo Supremo, em decorrência da CPI dos Correios.
Caixa dois
Ao contrário de fazer uma reforma eleitoral que mudasse radicalmente esse sistema de financiamento, os grandes partidos resolveram sofisticar ainda mais o esquema de caixa dois, utilizando as doações eleitorais para lavar o dinheiro desviado de obras e serviços públicos por grandes empreiteiras e outras empresas. O colapso do sistema ocorreu após o escândalo da Petrobras, que passou a ser investigado pela força-tarefa da Lava-Jato, principalmente depois da delação premiada da Odebrecht, que entregou quase toda a documentação relativa ao seu caixa dois destinado à propina, denominado de “departamento de operações estruturadas”. A investigação resultou na prisão de centenas de executivos, servidores públicos e políticos, entre os quais o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De certa forma, o sistema de financiamento favoreceu a proliferação dos partidos, porque a distribuição do fundo partidário é proporcional ao número de deputados eleitos por cada legenda. Criou-se no Congresso, principalmente na Câmara, uma espécie de “mercado” no qual o troca-troca de partidos esteve fortemente associado à partilha dos recursos do fundo partidário entre os “donos” das legendas e suas bancadas. Em tese, os partidos passaram a funcionar como uma espécie de franquia, na qual sempre haveria lugar para um deputado federal em cada estado, que levaria o tempo de televisão e seu quinhão do fundo partidário.
Havia um pacto perverso entre a cúpula da maioria dos partidos e os candidatos. Os dirigentes gerenciavam o fundo partidário de acordo com seus interesses e prioridades; os candidatos corriam atrás de seus financiadores de campanha, muitas vezes, em troca de favorecimento na contratação de obras e serviços ou na aprovação de projetos de leis nas casas legislativas. Funcionava a Lei de Murici: cada um tratava de si. Com o fim das doações de empresas, porém, esse pacto se tornou mais complexo, porque aumentou o poder dos caciques partidários, em especial dos “donos” de partido, sobre os candidatos.
A criação de um fundo eleitoral com recursos públicos, além do fundo partidário, ao exigir maior controle da Justiça Eleitoral e transparência, acirrou as contradições internas nos partidos, por causa da caixa-preta na gestão financeira e na distribuição dos recursos entre os candidatos, ainda mais porque a falta de critérios objetivos na distribuição dos recursos sempre acaba revelada nas prestações de contas. Por isso, o que antes era uma maneira de manter um rígido controle sobre a estrutura partidária está se tornando um fator desestabilizador para os “donos” de partido.
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-a-caixa-preta-dos-partidos/
O Estado de S. Paulo: Verba pública a partidos aumentou quase 500% em 20 anos
Criado na década de 1990, Fundo Partidário prevê repasse de R$ 927,7 milhões às siglas em 2019
Caio Sartori, de O Estado de S. Paulo
O dinheiro público destinado aos partidos políticos cresceu quase 500% desde 1996. O Fundo Partidário, que atingirá montante próximo a R$ 1 bilhão no próximo ano, foi engordado nas últimas décadas ao mesmo tempo em que o número de siglas no País se multiplicava. Em 2019, 30 partidos ganharam nas urnas o direito de terem representação na Câmara dos Deputados, batendo mais um recorde. Há 23 anos eram 19 legendas com assento no Congresso.
Previsto em R$ 927,7 milhões para o próximo ano, o fundo foi criado em meados dos anos 1990 para financiar os custos administrativos das legendas. É abastecido com dotações orçamentárias – aprovadas pelos próprios deputados e senadores – e multas eleitorais aplicadas aos mesmos partidos.
Câmara dos Deputados
Reforma política aprovada em 2017 pelo Congresso mudou regras de acesso ao fundo partidário Foto: Daniel Teixeira/Estadão
O acesso a recursos públicos do Fundo Partidário é um dos elementos que impulsionou a criação de novas siglas no Brasil nos últimos anos. A fiscalização dos gastos pelo Tribunal Superior Eleitoral ocorre com bastante atraso e a análise das prestações de contas já mostrou que a reserva financia despesas que vão de viagens de jatinho até contas pessoais de dirigentes dos partidos.
Após o Congresso aprovar em 2017 a criação de um fundo eleitoral bilionário (R$ 1,7 bilhão), as siglas foram autorizadas este ano a utilizar recursos do Fundo Partidário nas eleições. Na prática, os fundos de dinheiro público compensaram a ausência dos recursos empresariais nas campanhas – proibidos em decisão do Supremo Tribunal Federal em dezembro de 2015.
No ano que vem, as siglas que não superaram a chamada cláusula de barreira nas últimas eleições não terão direito a receber o dinheiro – o que pode significar a extinção destas legendas. Foi por isso que algumas já anunciaram que vão se fundir. É o caso do Patriota com o PRP, do PCdoB com o PPL e do Podemos, que superou a cláusula, com o PHS.
Em valores corrigidos, o ápice do gasto público com financiamento partidário ocorreu em 2015, no início do segundo mandato da petista Dilma Rousseff, quando passou por um aumento grande em relação ao ano anterior e atingiu o equivalente a R$ 1 bilhão nos dias de hoje. O mesmo fenômeno de crescimento considerável ocorreu em 2011, outro ano que sucedeu eleições gerais.
De 1996 para cá, o aumento tem sido constante ano a ano, com a exceção de poucos períodos — que normalmente vêm depois de anos com grandes acréscimos financeiros, como 2015. O valor caiu, por exemplo, em 2016 e 2017, até voltar a crescer neste ano e no próximo. No acumulado, cresceu cerca de 470%.
Esse acréscimo, porém, foi acompanhado por uma desconcentração dos recursos em razão da fragmentação partidária cada vez maior da Câmara. Em 1996, os cinco partidos com maior porcentual do fundo representavam 82,7% do montante. Hoje, equivalem à metade: 41%.
Em 2019, a distribuição dos recursos vai marcar a saída do MDB da lista de legendas mais beneficiadas pelo fundo. Está na sexta colocação da lista, com R$ 52,8 milhões. Resultado diferente do PT e do PSDB, que, mesmo com resultados decepcionantes em comparação com o histórico que vinham registrando, se mantiveram nas três primeiras colocações.
“Ajustamos nossas despesas à nova realidade e enxugamos a estrutura. Temos um projeto de autofinanciamento para não dependermos exclusivamente do fundo”, disse o presidente do MDB, Romero Jucá. O projeto, segundo ele, será aplicado ano que vem nas esferas nacional, estaduais e municipais.
Entre as principais legendas do País, o Novo é o único que não utiliza o Fundo Partidário. Registrado em agosto de 2015, o Novo diz que arrecada cerca de R$ 800 mil mensais de aproximadamente 30 mil filiados. Num ano cheio, isso equivale R$ 9,6 milhões, valor inferior aos R$ 27,6 milhões a que a legenda teria direito a partir do ano que vem.
“As eleições mostraram que, mesmo sem o fundo, temos condições de participar do jogo. A ideia é manter essa estratégia e provocar uma mudança de cultura”, afirmou Moisés Jardim, presidente do Novo, descartando a possibilidade de o partido passar a aceitar o dinheiro público do fundo.
O PSL do presidente eleito, Jair Bolsonaro, será o maior beneficiário a partir de janeiro, com cerca de R$ 110 milhões ao longo do ano. Os partidos recebem valores calculados a partir da votação que obtiveram para a Câmara dos Deputados, incluindo votos nominais e em legenda, que compõem 95% do total distribuído. Os outros 5% são divididos igualmente entre as siglas que superaram cláusula de barreira nas eleições.
Apesar de ter feito a maior bancada para a próxima legislatura, com 56 eleitos, o PT perdeu para o PSL em número de votos para a Câmara, já que a eleição proporcional segue critérios mais complexos. Nesse contexto, o PSL receberá a maior fatia por ter vários ‘campeões’ de votos, como Eduardo Bolsonaro e Joice Hasselmann, os dois candidatos mais votados do País, ambos por São Paulo. O PT terá, ao longo do ano, R$ 96,6 milhões, quase R$ 15 milhões a menos que o partido de Bolsonaro.
Para o professor da FGV Marco Antônio Teixeira, o fundo é mal visto pela sociedade num contexto de crise de representação dos partidos e crise econômica. “Essa visão obviamente advém sobretudo do fato de a sociedade não ver um retorno dos partidos em prol do interesse público.”
Fragmentação diminui concentração de recursos
A distribuição do dinheiro do fundo passou a ser mais pulverizada ao longo dos anos, acompanhando a própria fragmentação partidária no Legislativo brasileiro. Em 1996, quando 19 partidos tinham cadeiras na Casa, os cinco com maior porcentual do fundo representavam 82,7% do montante, número hoje reduzido pela metade.
O MDB, por exemplo, recebia naquele ano mais de 22% do dinheiro, quase um quarto do total. Em 2019, a fatia não chegará a 6%, fruto da baixa votação que obteve para a Câmara. Para além da crise dos partidos tradicionais, a diminuição se explica pela mudança na correlação de forças no parlamento brasileiro. Mais fragmentado a cada eleição, o Congresso da nova legislatura diminuiu ainda mais o abismo antes existente entre os grandes e os pequenos.
Isso não se deu por meio de um mero fortalecimento de legendas menores que já existiam, e sim a partir do surgimento de novas siglas, especialmente na década de 2010. Partidos como o PSD, dissidência do DEM, o PROS e o Solidariedade já surgiram com bancadas robustas ao herdar parlamentares que aproveitaram uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que, na teoria, apenas regulamentava condições para migração partidária. Na prática, porém, ela incentivou a criação de novas legendas, já que os parlamentares não seriam punidos se aderissem a novas siglas.
“Se esses 41% (de concentração nos cinco mais ricos) significassem que o sistema se democratizou mais, com partidos mais competitivos e mais debates de ideias, estaria tranquilo. Mas o que aconteceu foi que tivemos uma multiplicação de partidos”, disse Marco Antônio Teixeira, da FGV.
O grande fenômeno surgido com as eleições de 2018, porém, é a ascensão do PSL ao status de partido grande. Antes nanico e pouco conhecido do eleitorado, a legenda à qual Jair Bolsonaro se filiou para concorrer à Presidência terá dinheiro para se estruturar. A sigla foi, por anos, uma das que se enquadram na categoria de ‘partido negócio’, sem muitos holofotes. A partir de 2019, roubará o espaço – o dinheiro – que já foi de PT e MDB.
Roberto Freire: Distritão derrotado e a reforma possível
A derrota do distritão, que não obteve os 308 votos mínimos necessários para uma emenda à Constituição, foi muito importante porque impediu um enorme retrocesso no processo democrático brasileiro
Alguns dos principais itens discutidos e aprovados na Câmara dos Deputados indicam que a reforma política possível de ser alcançada já para as eleições de 2018, se não é aquela de que o Brasil necessitava, ao menos representa um avanço em relação ao que tínhamos e um evidente aprimoramento do nosso modelo político-eleitoral. Há que se destacar a rejeição do sistema conhecido como “distritão”, uma contrafação da democracia representativa e que praticamente acabaria com os partidos e tornaria impossível a governabilidade.
A derrota do distritão, que não obteve os 308 votos mínimos necessários para uma emenda à Constituição, foi muito importante porque impediu um enorme retrocesso no processo democrático brasileiro. Caso aprovado, tal sistema resultaria em uma preocupante distorção da representação política no Parlamento.
Seriam eleitos os candidatos mais votados a deputado, independentemente das coligações que integrassem ou dos partidos aos quais pertencessem, que se transformariam em meros cartórios para o registro de candidaturas. A Câmara seria formada por nada menos que 513 entidades autônomas, cada uma valendo por si, o que faria com que os governos tivessem de se articular sem qualquer mediação partidária com cada um desses “deputados de si mesmos”, inviabilizando totalmente a indispensável interlocução entre Executivo e Legislativo. Em nosso regime presidencialista, não teríamos condições mínimas para promover uma articulação de governo. Não haveria como viabilizar qualquer tipo de coalizão da base.
Para que se tenha dimensão do absurdo da proposta – que esteve em vias de ser aprovada após uma estarrecedora articulação entre PMDB, PSDB e PT –, o distritão que se queria implementar no Brasil vigora atualmente apenas no Afeganistão, na Jordânia e em pequenos países insulares. Tal sistema já foi utilizado pelo Japão em uma única eleição, no pós-guerra, e imediatamente revogado diante de tamanho fracasso.
Outro aspecto significativo aprovado pela Câmara foi um destaque proposto pelo PPS extinguindo as coligações nas eleições proporcionais a partir de 2020 – elas serão permitidas apenas para as disputas majoritárias. Essa era uma reivindicação benfazeja que já vinha de muito tempo e pôde, enfim, ser votada e aprovada a partir de um consenso com as demais forças políticas da Casa.
Além disso, a instituição de uma cláusula de desempenho progressiva, a ser iniciada em 2018, será um passo importante para impedir o acesso indiscriminado das legendas aos recursos do Fundo Partidário. As agremiações teriam de alcançar 1,5% dos votos válidos nacionais a deputado federal já em 2018, distribuídos em ao menos um terço dos estados – em 2030, esse percentual mínimo seria de 3%. Somente os partidos que chegarem a esse índice poderão ser contemplados com os recursos do Fundo e o tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão.
Pessoalmente, não compartilho da tese de que as anomalias do modelo eleitoral brasileiro tenham relação com a possibilidade de criação de novas agremiações. Partido político é direito de cidadania e não pode ser tutelado ou regulamentado pelo Estado. O grande imbróglio é justamente o acesso irrestrito ao Fundo Partidário e ao tempo de TV. Criou-se no Brasil um amplo mercado de negociações espúrias e tentativas de enriquecimento fácil à custa do dinheiro público, com uma profusão de pedidos de registro de novos partidos. É algo semelhante ao que ocorre no sindicalismo, cada vez mais dependente dos valores provenientes do imposto sindical, felizmente abolido.
Outra ideia absurda que deve ser derrotada é a criação de um fundo de R$ 3 bilhões para financiar campanhas eleitorais, o malfadado “fundão”. Temos de caminhar justamente em sentido contrário, buscando o barateamento das campanhas. É evidente que a sociedade não aceita o uso de dinheiro público para custear as eleições, especialmente neste momento difícil que o Brasil vive, ainda se recuperando da mais grave recessão econômica de sua história e em meio ao impacto dos inúmeros escândalos de corrupção envolvendo políticos, partidos e empreiteiras. Seria um deboche.
Ainda há alguns pontos a serem analisados, mas estou confiante de que impediremos mais retrocessos. Assim como derrotamos o distritão, derrubaremos o indecente fundão. Diante do que foi votado e vetado pela Câmara, é possível dizer que avançamos na construção de uma reforma política tão necessária quanto urgente para o Brasil. Não é a reforma ideal, longe disso, tampouco a “contrarreforma” que se delineava no início do processo. Há imperfeições e aspectos que não foram modificados simplesmente porque não houve consenso em torno de propostas melhores. Mas um primeiro passo foi dado, o que não é pouco, e nos aproximamos de um sistema político-eleitoral mais justo, democrático e funcional. (Diário do Poder – 22/09/2017)
*Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS
Carlos Alberto Di Franco: Políticos “se lixam” para a sociedade
“Enquanto o Brasil precisa desesperadamente de reformas, ajustes, cortes, o Congresso se autopremia com um fundo eleitoral de R$ 3,6 bilhões, além dos mais de R$ 800 milhões do Fundo Partidário”
O escândalo da Petrobrás, pequena amostragem do que ainda pode aparecer, é a ponta do iceberg de algo mais profundo: o sistema eleitoral brasileiro está bichado e só será reformado se a sociedade pressionar para valer.
Hoje, teoricamente, as eleições são livres, embora o resultado seja bastante previsível. Não se elegem os melhores, mas os que têm mais dinheiro para financiar campanhas sofisticadas e milionárias. Empresas investem nos candidatos sem nenhum idealismo. É negócio. Espera-se retorno do investimento.
A máquina de fazer dinheiro para perpetuar o poder tem engrenagens bem conhecidas no mundo político: emendas parlamentares, convênios fajutos e licitações com cartas marcadas.
É isso que precisa mudar. Mas o Congresso, por óbvio, não quer. Ao contrário.
Como disse Eliane Cantanhêde com sua habitual lucidez, “enquanto o Brasil precisa desesperadamente de reformas, ajustes, cortes, o Congresso se autopremia com um fundo eleitoral de R$ 3,6 bilhões, além dos mais de R$ 800 milhões do Fundo Partidário.”
Diante da imensa repercussão negativa, o plenário da Câmara dos Deputados decidiu retirar a previsão de que o fundo eleitoral com recursos públicos receba o aporte bilionário
Políticos, à esquerda e à direita, não estão dispostos a soltar o osso.
O infortúnio do cárcere e a perspectiva do ostracismo uniu adversários históricos para combater o inimigo comum: a Lava Jato e o aparato da Justiça. Mas o Judiciário também oferece seus temperos para o preparo da pizza da impunidade.
O STF, ao que tudo indica, vai revogar a saneadora decisão de que o cumprimento da pena deve ter início após condenação em segunda instância. A conhecida morosidade da Justiça vai provocar uma cascata de crimes prescritos. Resumo da ópera: os ladrões do dinheiro público vão sair por cima. Os políticos se lixam para a sociedade.
A Operação Lava Jato estará cada vez mais no olho do furacão. Não obstante excessos pontuais da Força Tarefa, a Lava Jato é o resultado direto da solidez institucional da nossa jovem democracia. É o lado bom da história.
Enquanto isso, Lula percorre o Brasil vestindo a máscara de perseguido político. E trata de puxar todos para o pântano da política anticidadã. “Se Jesus Cristo viesse para cá e Judas tivesse a votação num partido qualquer, Jesus teria de chamar Judas para fazer coalização." Eis uma pérola do pragmatismo lulista. O ex-presidente não fez nada para mudar esse quadro. Ao contrário, aprofundou e radicalizou.
O Brasil depende - e muito- da qualidade da sua imprensa e da coerência ética de todos nós. Podemos virar o jogo. Acreditemos no Brasil e na democracia.
*Carlos Alberto Di Franca é jornalista
Roberto Freire: Por um Brasil parlamentarista
Com a recente instalação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados, a reforma política voltou à pauta do Congresso Nacional. Após o desfecho do grave impasse político enfrentado pelo país, com o processo democrático e constitucional do impeachment que levou ao fim do governo de Dilma Rousseff, este é um bom momento para que os parlamentares se debrucem sobre mudanças necessárias que tornem o sistema político-eleitoral brasileiro mais avançado e dinâmico. A principal delas é justamente aquela que permite a superação de crises agudas sem traumas institucionais: o parlamentarismo.
No ano passado, participei de algumas sessões e audiências públicas em uma outra comissão especial da Câmara que analisava propostas para a reforma política. Lamentavelmente, na ocasião, houve pouquíssimos avanços e quase nenhuma alteração substancial – apenas algumas modificações pontuais ou propostas descabidas que configuravam uma verdadeira “contrarreforma”.
Em minhas intervenções, defendi que fosse enviada ao plenário a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 20/1995, de autoria do então deputado Eduardo Jorge, que institui o parlamentarismo no Brasil. O texto está pronto para ser votado desde 2001 e, caso aprovado, poderia entrar em vigor talvez já para 2018, após o encerramento do mandato do presidente Michel Temer. No regime parlamentarista, quanto maior a crise, mais radical é a solução.
Mesmo no processo deflagrado contra a ex-presidente da República, o impedimento votado pela maioria acachapante dos deputados e senadores ganhou contornos do “voto de confiança” característico do parlamentarismo. Só que, neste sistema, a queda do gabinete se dá sem que haja turbulência política ou institucional. Quando não é possível formar uma nova maioria, o Congresso é dissolvido e novas eleições são convocadas, o que proporciona uma participação maior da cidadania.
Outro ponto fundamental que a comissão deveria tratar é o acesso das legendas aos recursos do Fundo Partidário e ao tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão. O maior problema da democracia brasileira não é a quantidade de partidos em funcionamento. Partido político é direito da cidadania e não deve ser tutelado, regulamentado ou restringido pelo Estado. Impedir a criação de novas agremiações, além de antidemocrático e inconstitucional, não passa de uma solução fácil e equivocada para um problema complexo.
O que se deve fazer para corrigir graves distorções é limitar o acesso indiscriminado aos recursos do Fundo e ao tempo de TV. Diante da enorme facilidade para que os partidos tenham acesso a esse montante, forma-se um amplo mercado de negociações espúrias à custa do dinheiro do contribuinte. De certa forma, é algo semelhante ao que ocorre no sindicalismo, dependente dos recursos provenientes das contribuições sindicais compulsórias, e também com as igrejas e templos religiosos, que muitas vezes se transformam em um negócio promíscuo em função da imunidade tributária garantida pela legislação.
Ao invés de restringir a criação de novos partidos, nossa proposta é de que apenas as legendas que alcançarem uma representação mínima na Câmara dos Deputados tenham acesso aos recursos do Fundo e à TV. Seria criada, então, uma espécie de cláusula de barreira, mas não aos mandatos. Os partidos que não obtivessem o índice mínimo funcionariam normalmente, assim como o parlamentar eleito exerceria o seu mandato, mas essas legendas ficariam sem a verba partidária e o tempo de propaganda televisiva.
A reforma política de que o Brasil precisa não será feita a partir de propostas paliativas ou remendos inócuos que nada resolvem. A essência do atual modelo precisa ser modificada, e a principal mudança será a instituição de um regime mais dinâmico, flexível e democrático, com partidos fortes, não tutelados, e uma sociedade mais atuante e participativa. O parlamentarismo é o primeiro passo, e também o mais importante, de uma longa caminhada. (Diário do Poder – 17/11/2016)
Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS
Fonte: pps.org.br
Luiz Carlos Azedo: Operação champanhe
A famosa Operação Mãos Limpas, na Itália, foi deflagrada após a prisão, em 1992, de Mario Chiesa, ligado ao PSI, que ocupava a diretoria de uma instituição filantrópica e era acusado de receber propina de uma empresa de limpeza. O PSI tentou isolar Chiesa, mas o político resolveu falar e incriminar colegas. Como aqui no Brasil, empresários pagavam propinas aos políticos para vencer licitações de construção de ferrovias, autoestradas, prédios públicos, estádios e na construção civil em geral. Delações do ex-espião da KGB Vladimir Bukovsky e do ex-mafioso Tommaso Buscetta também revelaram licitações irregulares e o uso do poder público em benefício particular e de partidos políticos.
Sob apoio e pressão da opinião pública, as investigações levaram à prisão industriais, políticos, advogados e magistrados, 12 pessoas se suicidaram e alguns dos envolvidos fugiram da Itália. No curso das investigações, a máfia siciliana matou os juízes Paolo Borsellino e Giovanni Falcone, que obteve a delação de Buscetta. Foram 2.993 mandados de prisão; 6.059 pessoas investigadas, sendo 872 empresários, 1.978 administradores locais e 438 parlamentares, entre os quais quatro ex-primeiros-ministros.
A partir de Milão, a capital mundial da moda, descobriu-se que a Itália havia submergido na corrupção, com o pagamento generalizado de propinas para obtenção de contratos com o governo. Os grandes partidos no governo em 1992, a Democracia Cristã, o Partido Socialista Italiano, o Partido Social-Democrata Italiano desapareceram completamente; o antigo Partido Comunista, então denominado partido democrático de esquerda, e o Movimento Social Italiano mudaram de nome. Somente o antigo Partido Republicano sobreviveu.
Um dos envolvidos na Operação Mãos Limpas era o empresário e então primeiro-ministro da Itália, Sílvio Berlusconi, considerado o maior beneficiado pela corrupção e principal acusado em processos de fraudes, como nos casos All Iberian, SIR (empresa petroquímica privada), IMI (Instituto Mobiliare Italiano) e Lodo Mondadori.Em 2009, porém, senadores governistas aprovaram uma reforma do Judiciário, que beneficiou Berlusconi com a extinção de dois processos, nos quais era acusado de fraude contábil na compra de direitos de TV para seu império de comunicação Mediaset e de ter subornado um advogado britânico para prestar falso testemunho, em 1997.
Anistia
Aqui no Brasil, está em curso no Congresso uma operação semelhante, que foi abortada na segunda-feira, mas ainda não morreu. Trata-se da criminalização do caixa dois de campanha, que é considerado uma infração eleitoral. Numa manobra abortada pelos deputados fluminenses Miro Teixeira e Alexandre Molon, da Rede, parlamentares de diversos partidos tentaram aprovar uma emenda ao projeto anticorrupção do Ministério Público, em discussão na Câmara, para livrar de responsabilidade penal quem praticou caixa dois antes da aprovação da lei, sem embargo da punição por crimes conexos, tipo lavagem de dinheiro, enriquecimento ilícito, desvio de recursos públicos, etc.
A sessão foi presidida pelo primeiro-secretário, Beto Mansur (PRB-SP), porque o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), exercia interinamente a Presidência da República, em razão da viagem de Michel Temer aos Estados Unidos. A nova lei anticorrupção estava sendo negociada com o Ministério Público, por Maia e alguns líderes da Casa, mas entrou na pauta sem prévia comunicação e de forma muito confusa, com uma emenda que anistiava todos os políticos acusados de receber dinheiro de caixa dois, ou seja, não declarado à Justiça Eleitoral. Muitos já tinham até mandado gelar a champanhe para as comemorações.
A razão de tanta pressa é a iminente delação premiada de Marcelo Odebrecht e outros executivos da empresa que leva o nome da família, que está sendo negociada com o Ministério Público Federal. Cerca de 100 senadores e deputados estariam citados na delação, além de ex-presidentes, governadores e prefeitos, tanto pelo recebimento de contribuições legais provenientes de dinheiro público desviado pela empreiteira, quanto de propina e doações não contabilizadas. A cúpula do Congresso e pelo menos oito ministros do governo Temer estariam citados na delação, além dos ex-ministros petistas.
Há duas questões em jogo na operação frustrada. A primeira é o avanço irreversível das investigações da Operação Lava-Jato em direção à elite política do país, em razão das delações premiadas; a segunda, a crise de financiamento das campanhas eleitorais, com o fim das doações de pessoas jurídicas, que coloca em xeque o atual sistema eleitoral. A resposta urdida no Congresso é conter a Lava-Jato, zerando as investigações do caixa dois, e blindar os grandes partidos, com a cláusula de barreira e o monopólio do fundo partidário e do tempo de rádio e televisão. (Correio Braziliense – 22/09/2016)
Fonte: pps.org.br
Roberto Freire – Fundo Partidário e TV: é hora de mudar
As discussões em torno das necessárias mudanças que devem ser feitas no sistema político-partidário nacional esbarram, em muitos momentos, no senso comum de que o grande problema da democracia brasileira seria a quantidade excessiva de partidos em funcionamento no país. Não são raras as propostas que estabelecem mecanismos de controle ou restrição à criação de novas legendas, mas todas elas não passam de soluções fáceis e equivocadas para um problema complexo.
Ao contrário do que muitos imaginam, as graves distorções do modelo eleitoral brasileiro não decorrem da possibilidade de serem criadas novas agremiações. Partido político, afinal, é direito de cidadania e não deve ser tutelado, regulamentado ou restringido pelo Estado ou por qualquer legislação. Basta observarmos o que acontece nas democracias mais avançadas do mundo, onde não há nenhuma lei que coíba o surgimento de novas legendas. Um exemplo ilustrativo vem dos Estados Unidos, país no qual funcionam plenamente mais de 100 partidos (embora se pense que sejam apenas dois, o Democrata e o Republicano). Há, inclusive, a possibilidade de candidaturas avulsas – sem ligação com qualquer partido político – para os diversos níveis de disputa no sistema eleitoral norte-americano.
Por outro lado, é evidente que as graves falhas do modelo brasileiro precisam ser corrigidas o mais rápido possível. A maior de todas as distorções talvez seja o acesso indiscriminado e irrestrito dos partidos políticos aos recursos do Fundo Partidário e ao tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão. Com as facilidades para que todas as legendas recebam o dinheiro do Fundo, criou-se no Brasil um amplo mercado de negociações espúrias e tentativas de enriquecimento fácil à custa do dinheiro público, com uma profusão de pedidos de registro de novos partidos interessados exclusivamente em receber tal financiamento.
Guardadas as devidas proporções, é algo semelhante ao que ocorre com parte do sindicalismo, cada vez mais dependente dos valores provenientes do chamado imposto sindical. O que se vê é uma proliferação de sindicatos e o esfacelamento do movimento sindical brasileiro, já tão cooptado, o que faz com que algumas centrais passem a existir quase unicamente em função do dinheiro que recebem por meio das contribuições sindicais compulsórias. Há, ainda, uma terceira vertente dessa grave distorção: as igrejas e templos religiosos que, por força de uma imunidade tributária assegurada por lei, muitas vezes proliferam como mero negócio.
De volta à reforma política, o grande debate que deve ser levado adiante para racionalizar o sistema eleitoral brasileiro não envolve nenhuma restrição à possibilidade de serem criadas novas legendas, mas ao acesso das agremiações ao Fundo Partidário e ao tempo de TV. Nossa proposta é de que apenas os partidos que atingirem, pelo voto, uma representação mínima na Câmara dos Deputados tenham direito a esses recursos. Seria uma espécie de cláusula de barreira, mas não aos mandatos. Os partidos que não alcançarem um índice mínimo poderiam funcionar normalmente, bem como o parlamentar eleito por essas legendas assumiria e exerceria o mandato conferido pela população, mas essas agremiações ficariam sem a verba partidária e o tempo na TV.
Outra vantagem da proposta é a maior facilidade de sua tramitação no Congresso Nacional. A alteração poderia ser feita por meio de uma simples lei ordinária, ao contrário do que seria necessário para a aprovação de uma cláusula de barreira restritiva aos mandatos e partidos. O Supremo Tribunal Federal, que já se debruçou sobre a matéria e declarou a inconstitucionalidade da medida, entende que qualquer mudança só poderia valer a partir de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) – que precisa ser aprovada por maioria qualificada de três quintos dos parlamentares em dois turnos de votação na Câmara e no Senado.
Não é tutelando os partidos ou cerceando a liberdade da cidadania de criar novas legendas que o Brasil avançará nas discussões sobre a reforma política. A necessidade de organizar nosso sistema eleitoral não pode resultar na aprovação de medidas que façam o país regredir. É possível eliminar distorções e corrigir rumos sem afrontar a democracia ou controlar o que deve ser livre. (Diário do Poder – 10/08/2016)
Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS
Fonte: pps.org.br