frente democrática
Cláudio Couto: Frente ampla democrática é incompatível com iliberalismo
Vitória de Joe Biden sobre Donald Trump animou gente de amplo espectro ideológico a defender no Brasil uma aliança da direita à esquerda contra o bolsonarismo
A vitória de Joe Biden, batendo o populista de direita, Donald Trump, animou gente de amplo espectro ideológico, da direita à esquerda. O que uniu pessoas de posições políticas tão distintas na celebração da derrota trumpista foi a vitória da democracia (com todos seus requisitos) sobre o autoritarismo, inerente a quaisquer populismos, que tal desfecho representou.
Por isso, rapidamente se começou a defender no Brasil uma aliança ampla, da direita à esquerda, contra o bolsonarismo e sua vocação autoritária. Nesse contexto se dão conversas entre políticos e aspirantes a políticos de distintas posições, na tentativa de construir pontes. Faz sentido.
Estrela ascendente na esquerda, o governador do Maranhão, Flávio Dino, conversa com muita gente, inclusive o centro-direitista Luciano Huck – que tem como mentor o centrista e bem-sucedido ex-governador do Espírito Santo, Paulo Hartung. Na Bahia, a centro-esquerda pedetista se uniu à direita carlista na disputa pela Prefeitura de Salvador. O PT segue ausente, com algumas exceções, como Fernando Haddad.
Agora, Huck conversa com Sérgio Moro e se noticia possível chapa entre ambos em 2022. Mas aí a ideia de frente democrática esboroa. O jacobinismo judicial lavajatista é tão iliberal – e, portanto, antidemocrático – quanto o bolsonarismo. Embora o combate inclemente à corrupção tenha seduzido certos liberais, trata-se de uma contradição: frente tão ampla a ponto de incluir até quem se guia pelo autoritarismo que tal aliança pretende combater.
- Professor de Ciência Política na FGV EAESP e produtor do canal 'Fora da Política Não há Salvação'
Alon Feuerwerker: Um desfecho pouco glorioso
Outro dia num bate-papo informal e algo provocativo propus uma solução meio piadista e meio séria para a polêmica que divide a oposição: se a aliança contra Jair Bolsonaro deve ser uma frente ampla democrática ou uma frente de esquerda. “Façam como no Uruguai: criem uma frente de esquerda e chamem de Frente Ampla.”
Claro que não solucionaria o cisma, hoje distante de solução, mas seria um truque do tipo que Tancredo Neves e Magalhães Pinto operaram na passagem dos anos 1970 para os 80. Criaram um partido de centro-direita e chamaram do nome que na época era cogitado para rotular uma eventual frente de esquerda: Partido Popular. Roubaram a marca. Acontece.
A história conta que depois o presidente João Figueiredo e seu PDS, sucessor da Arena, impuseram o voto vinculado, e na urna de 1982 o eleitor seria obrigado a votar de vereador a governador em candidatos do mesmo partido. Aí os liberais sentiram-se traídos e a maioria deles reagruparam-se no PMDB, que sucedera o MDB do bipartidarismo.
Essas histórias hoje já antigas ajudam a compreender que o dito centro tem esse nome exatamente porque pendula conforme a circunstância, mas sem nunca perder a identidade, que aponta mais para a direita que para a esquerda. Aliás esse locus político tem como vocação principal não exatamente apoiar outros, mas recolher apoio.
A frente ampla até vinha razoavelmente bem, daí Bolsonaro resolveu jogar mais o jogo da política. Como se pode notar a partir dos fatos, esses teimosos, as defecções nela agora têm sido mais frequentes. Vão desde os que caíram fora da live do “Direitos Já” até quem de repente mudou de ideia e passou a defender que não, não é hora de pensar em impeachment.
Mas a prova de fogo vai ser mesmo nas eleições. O que vai prevalecer, em especial onde terá segundo turno? A frente contra a esquerda ou a frente contra a direita? Ou não vai ter uma regra, uma tendência? Ou vai predominar, dentro de cada campo, a guerra fratricida de olho na necessidade de atrapalhar o fortalecimento excessivo de algum “aliado”?
Na real, não existe frente sem programa político. Frentes “de resistência” são frágeis, também porque são óbvias. Uma ampla frente político-social opõe-se, por exemplo, aos movimentos que pedem o fechamento do Congresso Nacional e do STF. E do mesmo modo que facilmente se agrupa, desmancha-se quando o “que fazer?” é colocado na mesa.
O MDB e depois o PMDB dos idos do regime militar tinham objetivos programáticos claros. O principal era, no caso do primeiro, a revogação da legislação excepcional. Do segundo, a volta das eleições diretas em todos os níveis. Ambos foram vitoriosos, o AI-5 acabou em 1978 e as diretas voltaram em duas etapas: 1982 e 1989.
Depois o PMDB teve um momento brilhante, no Plano Cruzado que lhe deu safra gorda na eleição de 1986. Daí produziu uma Constituição, que hoje agoniza, e entrou em declínio.
No momento, seus diversos spin-offs misturam-se aos derivados da velha Arena para formar a constelação que a imprensa chama de centrão, quando não aceita que negociem com o governo de turno. E que chama de “partidos de centro” quando um governo que ela apoia precisa negociar para obter apoio no Congresso.
Não chega a ser um desfecho glorioso.
*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação
Sérgio Abranches: É possível uma frente democrática?
Há sinais de que vários setores do campo democrático, em um amplo espectro ideológico, têm conversado sobre a formação de uma frente plural contra o avanço autoritário de Bolsonaro. São iniciativas importantes. Há muita incompreensão e ressentimento fechando possibilidades de uma frente que inclua todos os setores. Em geral, são pessoas e lideranças que se consideram democráticas, desde que não tenham que exercer um mínimo de tolerância em relação à posição de lideranças e grupos de campos ideológicos distintos. É um equívoco e uma demonstração de autoritarismo.
O equívoco está em imaginar que frentes, como a Frente Ampla de 1966, ou a frente pelas Diretas Já, no Brasil, o Pacto de Moncloa que democratizou a Espanha, ou a Concertación que restaurou a democracia chilena, se formam por cooptação. Não. Elas se formam por escolha de cada parceiro em passar por cima de diferenças e desavenças e começar a conversar com os adversários tradicionais. Se fosse por cooptação — convite ou convocação — não seriam frentes, nem plurais, nem democráticas.
O primeiro movimento é aceitar os outros como parceiros, com todas as restrições do passado. O segundo, é conversar com todos os setores democráticos sobre os objetivos específicos da frente e sobre uma agenda mínima, que todos possam apoiar. Significa reservar as ideologias e as questões específicas de cada campo, para o momento posterior, quando a frente tenha alcançado seus objetivos. Toda frente é limitada no tempo e na agenda e envolve parceiros autolimitados para se enquadrar no limite do acordo contra a ameaça comum. O terceiro passo é o diálogo interno a cada campo, para ampliar a convicção dos companheiros e obter o comprometimento geral com a iniciativa. Liderança é testada, exatamente, quando tem que sacrificar provisoriamente determinadas convicções e ressentimentos de embates passados, diante de uma ameaça existencial, e atravessar pontes entre campos hostis.
Tenho visto reações apequenadas à possibilidade de uma frente. Seja porque só admitem uma frente de esquerda, seja porque não admitem aceitar como interlocutores antigos adversários. Uma reunião de setores da esquerda não é frente, é aliança de grupos ou facções de um mesmo campo ideológico ou de campos adjacentes. Frente é com os outros campos. Ela se baseia no reconhecimento das especificidades da conjuntura e na identificação da contradição principal que está a mover o processo político. Há várias versões da contradição principal, que conduzem à possibilidade de uma frente.
Para mim, parece evidente que a espinha dorsal da conjuntura de crise atual é a oposição civilização versus barbárie, ou neofascismo versus democracia republicana. As causas das rupturas no processo político-democrático podem variar drasticamente, dependendo de cada ponto de vista. O que fazer, uma vez vencida a ameaça autoritária, também dependerá da competição abertas em disputas eleitorais justas entre as várias propostas. Logo, o passado e o futuro do futuro não podem entrar em cogitação nas negociações de uma frente, porque dividem. É bom que dividam e é importante que continuem a dividir. O que se discute na formação de uma frente é a identificação do inimigo principal e comum. O que fazer no presente e no futuro imediato, que coincidirá com o restabelecimento das plenas condições de convívio democrático e competitivo.
Há uma dose de grandeza de todas as partes na negociação de uma frente. Todas têm que superar feridas abertas nos embates que tiveram entre si no passado recente. Alguns bastante duros e que deixaram feridas profundas. Todas têm que abrir mão de suas visões e demandas, para desenhar uma agenda comum de transição entre uma conjuntura que nos ameaça e outra que reabre a possibilidade de que possamos divergir em liberdade. Uma agenda que responda aos problemas imediatos, sem cujo atendimento não seria possível transitar para uma situação de normalidade democrática, nem para o novo normal pós-pandemia. Mas, é nos momentos de autolimitação e de busca de comunalidades entre os desavindos que as lideranças mostram sua capacidade. Políticos que se afogam em mesquinharias, como Bolsonaro, nunca serão líderes. Podem, no máximo ser déspotas. No caso, sem qualquer ilustração.
Como é que se imagina ter sido possível a aliança entre Estados Unidos, União Soviética e Reino Unido contra o nazismo? Churchill e Roosevelt trocaram cartas amargas durante o período de formação da frente antinazista, revelando sérias divergências geopolíticas, fundamentais para o após-guerra. Churchill dedicava aristocrático desprezo por Roosevelt que, por sua vez, opunha-se fortemente ao império britânico. Ambos detestavam o que Stalin representava e reconheciam a ameaça representada pela União Soviética aos interesses de seus respectivos projetos nacionais de poder. Quando a URSS invadiu a Polônia, Roosevelt descreveu o governo de Stalin como a ditadura mais absoluta do que qualquer ditadura no mundo. Stalin, por sua vez, dedicava a ambos desdenhosa ironia. Ele tinha profunda desconfiança de ambos. Mas, havia Hitler, o nazismo, a ameaça de derrota do Reino Unido e a invasão da União Soviética. E houve Pearl Harbor. Uma vitória do nazismo representaria uma grande ameaça aos interesses geopolíticos da potência americana emergente. Depois da guerra, vencida a partir da aliança dos três líderes, eles passaram à mais ferrenha disputa. Com a decadência do Império Britânico, passou a dominar o antagonismo polarizado entre EUA e URSS, que alimentou a Guerra Fria e a détente nuclear, nada cordial.
Quem viveu as agruras do regime militar sabe que não é exagero dizer que um avanço autoritário no Brasil de hoje representa uma ameaça existencial para todos os que prezam a democracia. Põe em risco as condições essenciais para continuarmos competindo por projetos que buscam, por caminhos diversos, manter o Brasil no campo democrático e buscar soluções estruturais para as necessidades da maioria. A extrema direita no poder, com um projeto que se assemelha ao fascismo, racista, excludente, reacionário e hierárquico, associado aos interesses econômicos mais predatórios do país é uma ameaça existencial a todo democrata verdadeiro.
Eu, particularmente, considero que uma saída democrática do impasse em que nos encontramos e a superação rápida e efetiva da necropolítica que vem sendo aplicada com patológica frieza pelo governo pressupõe um amplo entendimento entre as forças políticas nacionais. Vivemos o pior momento da história da Terceira República, inaugurada com a Constituição de 1988. É inédita a superposição de crises pandêmica, de governança, econômica e política, gerando enorme estresse institucional. Só não houve retrocessos muito perigosos, como a sonegação de informações sobre o avanço da pandemia pelo ministério da Saúde, ou a flexibilidade precipitada e sem respaldo médico do isolamento social, porque a Justiça bloqueou essas decisões com liminares.
São muitas as decisões insensatas interrompidas por decisões judiciais ou por decretos legislativos. Isto mostra que as instituições de freios e contrapesos estão funcionando. Contudo, não é normal que funções regulares de governo, decisões de políticas e escolhas de governantes tenham que ser recorrentemente corrigidas ou obstadas por intervenções do Legislativo e, principalmente, do Judiciário. Não existe a possibilidade de um governo funcionar à base de liminares delimitando seu campo de ação. Mas, este bloqueio legislativo e judiciário se faz indispensável diante dos danos que as escolhas de Bolsonaro podem produzir, sobretudo no campo da segurança coletiva frente à pandemia.
Para que possamos superar com rapidez e eficácia a ameaça autoritária que já se desenhou, não é possível confiar em um acordo com Bolsonaro, como parece fazer o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Tóffolli. Bolsonaro não faz acordos. Quer a aceitação de suas escolhas pelos outros Poderes. A única alternativa é a união de todos os setores democráticos da sociedade em uma frente plural para barrar o avanço autoritário.
Volto a meu ponto central. Uma frente se constrói com diálogo e pela entrada voluntária de lideranças e forças políticas na conversação. Não há espaço para cooptação ou indução de adesões. Ela requer um movimento espontâneo. Há lideranças que têm a capacidade e o descortino para atuar como viabilizadores cívicos, propiciando oportunidades para o encontro de forças atritadas em torno de uma agenda mínima comum pró-democracia. É o papel inverso ao dos viabilizadores da tirania que apoiam o avanço autoritário, mesmo não tendo confiança, nem particular apreço pelo governante no poder, imaginando que para eles sairá tudo bem. No caso de uma frente democrática, os viabilizadores têm a noção cívica de que construir pontes entre forças até agora adversárias é uma ação necessária para a preservação e o aprofundamento da democracia. É este o caminho que tornaria possível a tão necessária frente democrática.
*Sérgio Abranches é cientista político
Conselho Curador da FAP aprova prestação de contas e defende frente democrática
Frente democrática é alternativa à tensão e polarização políticas no país, conclui Colegiado da FAP durante reunião online
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
O Conselho Curador da FAP (Fundação Astrojildo Pereira) aprovou, neste sábado (25), a prestação de contas da entidade relativas ao ano de 2019, por unanimidade, e discutiu a conjuntura política do Brasil com sugestões para o fortalecimento da democracia. Pela primeira vez, o colegiado realizou reunião online, por meio de uma sala virtual com acesso exclusivo aos conselheiros, por causa da orientação da OMS (Organização Mundial da Saúde) de manter o isolamento social em meio à pandemia do coronavírus.
O presidente do Conselho Curador da FAP, Cristovam Buarque, parabenizou a iniciativa da diretoria da fundação de realizar a reunião virtual e manter o compromisso com a prestação de contas. Ele lembrou que, enquanto atuou como senador, apresentou a proposta no Parlamento para que possibilitasse a participação virtual de senadores em discussões e votações, mesmo que estivessem em outros compromissos nos seus respectivos Estados.
O diretor-geral da FAP, Luiz Carlos Azedo, destacou as ações da fundação em defesa dos valores democráticos e republicanos. Segundo ele, a instituição tem se empenhado cada vez mais para atuar da melhor forma possível e levar resultado de qualidade à sociedade, por meio dos eventos, publicações e do curso de formação política Jornada da Cidadania.
» Confira como foi a Reunião do Conselho Curador da FAP no vídeo abaixo ou clique aqui.
https://youtu.be/65dJ8PhTLwQ
Investimentos
Em sua apresentação, o diretor financeiro Ciro Gondim Leichsenring detalhou todos os investimentos da fundação no ano passado, na ordem de R$ 584,1 mil, para a realização do IV Encontro de Jovens, dos Seminários Desafios da Democracia e Cidades Inteligentes, além de outros eventos. Todas as iniciativas tiveram a participação de importantes pesquisadores, professores de universidades e grandes nomes do mercado.
Leichsenring também destacou a grande importância das publicações da FAP, como as revistas Política Democrática online e impressa, as quais, segundo ele, colaboram muito para o pensamento crítico da sociedade. “São publicações importantes porque levam conteúdos de muita qualidade para o público”, disse.
No total, em 2019, R$ 636,4 mil foram investidos em publicações, edições e lançamentos de livros, produção de teatro e filme, em ações de comunicação digital e no planejamento da Jornada da Cidadania. O curso de formação política é realizado pela FAP, por meio de uma plataforma online, interativa e com acesso gratuito aos alunos matriculados.
Frente democrática
Durante a reunião, os conselheiros demonstraram preocupação com o atual momento político do país. Eles apresentaram propostas, como a necessidade de se fazer uma ampla frente democrática em defesa da democracia, da Constituição e da independência entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
A discussão partiu de um texto produzido pelo conselheiro Paulo Fábio Dantas Neto, escrito inicialmente para analisar os principais fatos políticos das últimas semanas, como a exoneração do então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, mesmo durante a epidemia do coronavírus. Durante a reunião, o autor atualizou o texto, incluindo no debate o caso do ex-juiz Sérgio Moro, que, nesta sexta-feira (24), pediu exoneração do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
» Paulo Fábio Dantas Neto: Notas sobre a conjuntura e o depois – abril 2020
Conforme lembra o sociólogo e diretor executivo da FAP Caetano Araújo, o colegiado também considerou a questão da pandemia, que, conforme discutido, trouxe à tona a necessidade de solidariedade e a importância de implementá-la, principalmente, na saúde pública. “Isso era algo que já existia na sociedade, mas que a pandemia escancarou ainda mais”, afirmou ele.
Além disso, o conselho curador também sugeriu a necessidade de pôr fim à lógica da polarização, substituindo-a pela cooperação. “Isso não é esquecer divergências, mas trabalhar consensos e deixar claros os pontos que são dissenso, outra linguagem da política, diferente da que tem predominado no Brasil, nos últimos cinco ano, que é a da polarização”, disse Caetano.
‘O Cidadania quer se transformar em importante referência de centro-esquerda’, diz Roberto Freire
Presidente do partido ressalta que sigla quer contribuir de forma positiva para a democracia e o desenvolvimento
O Cidadania quer ser protagonista de uma nova jornada, com um horizonte para se transformar em importante referência de centro-esquerda e contribuir de forma positiva para a democracia brasileira e o desenvolvimento do país. A afirmação é do presidente do partido, Roberto Freire, em artigo de sua autoria publicado na 12ª edição da revista Política Democrática online. A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), que disponibiliza, gratuitamente, todo o conteúdo em seu site.
» Acesse aqui a 12 edição da revista Política Democrática online
De acordo com o presidente do Cidadania, o mundo vem experimentando fortes transformações em seu modo de produzir e nas suas relações sociais, o que, conforme acrescenta, é fruto de uma revolução científica e das inovações, que impactam muito fortemente também nos campos da política e das ideias.
“Os padrões aceitos como universais e pouco mutáveis, todos eles herdados do iluminismo, da revolução industrial e da criação dos estados nacionais ainda no século XIX, começaram a se dissolver e passaram a não mais corresponder às realidades dos povos e aos formatos políticos de intervenção social”, afirma ele. “Ficaram velhos e foram perdendo apelo junto à opinião pública”, acrescenta.
Na avaliação de Freire, o neoliberalismo, uma tentativa de contornar o keynesiasnismo que salvara o capitalismo, conseguiu alguns resultados econômicos positivos na Inglaterra e Estados Unidos, porém faliu em sua pauta conservadora e não conseguiu fazer frente aos movimentos de conteúdo mais extremado de direita. “Trump, dentro do Partido Republicano nos Estados Unidos e Johnson, no Partido Conservador inglês, são exemplos dessa falência”, escreve ele.
Outros ideólogos, segundo o presidente do Cidadania, surgiram para dar sentido político ao mundo em desalinho e esbarraram contra uma muralha invisível que ia se formando, pelo advento das novas tecnologias, o intercâmbio das informações e as novas relações sociais e de consciência, estas nascidas nos desvãos ideológicos e à sombra do poder velho.
No Cidadania, com certeza não estarão todos os liberais nem todos os socialistas e socialdemocratas. “As clivagens e as diferenças internas nesses dois campos são inúmeras”, afirma. “Acreditamos, porém, que o Cidadania tem horizonte para se transformar em importante referência de centro-esquerda e contribuir de forma positiva para a nossa democracia e o nosso desenvolvimento”, destaca.
Além das dimensões políticas e programáticas, segundo Freire, o Cidadania tem por vocação a criação de uma nova formação política, longe dos modelos centralizados e verticalizados, totalizantes. “Um dos seus dilemas é permitir ao máximo possível o plasmar das diferenças de ideias e concepções, ser mais movimento e transparência, sem, no entanto, perder a credibilidade e capacidade diretiva. Se não resolver esse dilema, qualquer partido que se pretenda novo já nasce em conflito e em processo de decadência”, destaca.
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