fora do ar

CNPq não consegue resolver falha e Lattes completa 10 dias fora do ar

Órgão que fomenta a pesquisa havia prometido restabelecer sistemas nesta segunda (2)

Paulo Saldaña, da Folha de S. Paulo

As principais plataformas da ciência brasileira, Lattes e Carlos Chagas, completaram dez dias de inoperância. O governo Jair Bolsonaro prometeu que os sistemas seriam restabelecidos nesta segunda-feira (2), mas os problemas da área de tecnologia que causaram a queda dos sistemas ainda não foram resolvidos.

As plataformas estão fora do ar desde o dia 23 do mês passado. Os dois sistemas são de responsabilidade do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), responsável pelo fomento à pesquisa no país. O órgão é ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações.

O CNPq afirmou na última semana que não houve perda de informações e que o equipamento danificado já estaria sendo restaurado. Apesar da previsão de restabelecimento do acesso para esta segunda, o órgão publicou nota informando que "continua em andamento a verificação completa".

O informe do CNPq não traz uma data com previsão para que os sistemas voltem ao ar. "Essa verificação envolve uma série de testes, que foram realizados ao longo de todo final de semana, com pontuais instabilidades que estão sendo ajustadas para restabelecer a capacidade completa do storage".

O apagão dos sistemas foi provocado pela queima de um dispositivo em um equipamento que tem a função de controlar os servidores onde as plataformas ficam hospedadas. Isso teria ocorrido durante a migração dos dados para um novo servidor. O presidente do CNPq, Evaldo Vilela, descartou a ação de um hacker.

Em e-mail obtido pela reportagem, um funcionário do CNPq relatou, no último dia 26, que o principal servidor do conselho fora atingido e que o equipamento estaria fora da garantia e sem contrato de manutenção. Isso impediria um reparo imediato e traria a necessidade de contratação de empresa externa, como de fato ocorreu.

Questionado pela Folha, o CNPq e o Ministério da Ciência não responderam sobre a operação estar sem garantia e manutenção.

O Lattes é um banco de dados com todos os currículos de pesquisadores, e ações como a aprovação de bolsas dependem da consulta à plataforma. Já pela Carlos Chagas é que se operacionalizam chamadas públicas e editais de fomento à pesquisa, gestão e pagamento de bolsas.

Cerca de 84 mil pesquisadores são financiados com recursos do CNPq. Mas outros órgãos de pesquisa também realizam operações ancoradas no Lattes.

Os prazos para ações como a submissão de propostas, prestação de contas e de vigência das bolsas estão suspensos e serão prorrogados. Novas datas serão divulgadas assim que os sistemas forem restabelecidos, diz o CNPq, que garante o pagamento de bolsas sem atrasos.

Segundo o CNPq informou na última semana, já havia sido concluída a transferência do backup dos dados da plataforma Lattes para um novo servidor. Mas o órgão diz agora que preferiu estender testes nos equipamentos.

"Para garantir a segurança, a estabilidade e o bom funcionamento do equipamento, optamos por estender os testes até ser possível oferecer esse cenário seguro para disponibilização dos sistemas", diz nota desta segunda.

Funcionários apontam a falha como reflexo da queda de orçamento pela qual vive o CNPq. Isso foi rechaçado pelo presidente do CNPq.

O órgão tem em 2021 o menor orçamento ao menos desde 2012, mesmo em valores nominais. A dotação atualizada do órgão para o ano é de R$ 1,2 bilhão –entre 2013 e 2015, por exemplo, o orçamento executado superou os R$ 2 bilhões.


Fonte:
Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/ciencia/2021/08/cnpq-nao-consegue-resolver-falha-e-lattes-completa-10-dias-fora-do-ar.shtml


Pedro Doria: O dia em que o Google quase parou a Terra

Para alguns, o Google estar fora do ar é pior do que mero inconveniente

Durou por volta de uma hora a queda completa de serviços do Google — Gmail, Calendário, Drive, Docs, Meet, Cloud, Photos, YouTube. O Google estar down, fora do ar, é daquelas coisas que todo mundo percebe na hora. Os e-mails cessam de chegar, o vídeo não carrega, o compromisso na agenda se torna inacessível. Para alguns, é pior do que mero inconveniente.

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Aqui no Brasil estamos ainda engatinhando nas casas inteligentes, mas, nos EUA, elas são mais e mais comuns. Termostatos da Nest, a marca para estes acessórios do Google, também se tornaram inacessíveis. O mesmo vale para fechaduras e câmeras de segurança. Assim como para as caixas de som inteligentes.

Sempre tivemos situações do tipo — ficar sem água, sem luz, sem gás. Mas quando as utilidades públicas são oferta de uma empresa global o impacto é, igualmente, global. Conforme entramos numa década que será marcada pelo domínio do 5G e da internet das coisas, na qual cada instância de nossas vidas será automatizada, esta concentração dos serviços em poucas empresas deve ser motivo de preocupação.

Se a concentração se mantém, uma interrupção de serviço destas, em dez anos, não afetará só YouTube, as aulas das crianças no Meet e a agenda. Vai fazer o automóvel parar pois não saberá para onde ir — depende dos mapas. Poderá trancar pessoas fora de casa. Não reconhecerá o rosto doutros tantos para atividades essenciais.

Não se trata de criticar o Google — poucas empresas de tecnologia oferecem soluções tão complexas e incrivelmente estáveis como essa turma de Mountain View. São ousados. Quando outros no Vale do Silício perderam a criatividade e se burocratizaram, eles continuam forçando os limites da tecnologia. Da inteligência artificial. Constroem mesmo o futuro.

Assim como constituem um monopólio e quando acontece de seu serviço cair, bilhões de pessoas são atingidas. Quando os criadores da internet a desenharam inicialmente como uma rede descentralizada, não o fizeram à toa. Queriam algo confiável. Se um pedaço da rede cai, o resto continua de pé. Um dos responsáveis pelo protocolo que deu este design elegante à rede é, hoje, alto funcionário do Google. Vint Cerf.

Cerf e os outros pioneiros estavam certos em sua visão. Os serviços digitais precisam ser descentralizados como a internet foi imaginada originalmente. Os monopólios forçam sua centralização. Aí, quando cai — e qualquer serviço cai, por melhor que seja — quase todo mundo é afetado. Da próxima vez poderá ser muito mais grave.