Folha de S. Paulo

Elio Gaspari: De Pio.Correa@edu para Bolsonaro@gov

Orgulho-me de estar à sua direita, mas como servi à diplomacia digo-lhe que o senhor, estando certo, faz errado

Excelentíssimo presidente,

Eu deixei a diplomacia em 1969, depois de 32 anos de serviços. O senhor era um garoto. Fui secretário-geral do Itamaraty e era chamado de "Abominável Homem das Nove". Orgulho-me ao dizer que estou à sua direita. Se o senhor duvida, repito-lhe o que disse a um colega assombrado com meu discurso ao assumir o cargo:

--Não gosto de diplomatas pederastas, não gosto de diplomatas vagabundos, não gosto de diplomatas bêbados.

Talvez vosmicê tenha simpatia pela memória do presidente John Kennedy. Era um bestalhão e sua morte deixou-me indiferente. Vivi no Rio de Janeiro antes que Copacabana fosse invadida pela horda pululante e chinfrim de suburbanos transmigrados e pela lepra das favelas.

Deixei um livro de memórias e se um diplomata fosse flagrado lendo-o durante a desgraçada ruína dos petistas, estaria frito. ("O Mundo em que Vivi", 1.098 páginas, pesando um quilo.) Minha lembrança foi banida da Casa a que servi, lutando contra o comunismo e os cabeludos esquerdosos.

Esse currículo é minha credencial para dizer-lhe que o senhor está fazendo o certo, da maneira errada. Nunca alimentei encrencas públicas com países com quem temos fronteiras secas. (Nossos limites com a Venezuela estendem-se por 2.200 km de mata.) Vá lá que seu governo queira brigar com Cuba, nosso saudoso marechal Castello Branco rompeu relações diplomáticas com o castrismo, mas não tinha créditos a receber.

Os problemas da vida internacional não admitem improvisações fáceis (desconvidar convidados) nem atitudes emocionais (acicatar a China). Exigem definições fundadas no conhecimento perfeito dos fatos e em sua segura interpretação à luz do interesse nacional. E digo mais, exigem estilo.

Fui embaixador no Uruguai ao tempo em que lá vivia asilado o senhor João Goulart. Visitei sua filha quando ela foi atropelada e só me referia a ele em conversas com as autoridades locais como "el señor presidente". Vivi as delicadas negociações com a Argentina e o Paraguai que resolveram uma questão de limites e permitiram a construção da hidrelétrica de Itaipu. Jamais acompanhei a retórica antibrasileira dos nossos vizinhos. Podia-se detestar o Pio Correa, mas eu não podia estimular preconceitos contra nossa Pátria.

Mesmo quando deixei a carreira, tornando-me presidente da Siemens, empenhei minha palavra de honra em várias ocasiões e patrocinei uma visita de 50 jornalistas europeus ao Brasil, repelindo as denúncias de torturas sistemáticas a presos políticos. Ainda durante o governo do general Medici dei-me conta de que havia sido ludibriado. Mais tarde, muito esquerdistas proclamaram-se campeões da verdade. Ao meu estilo, em 1971, escrevi o seguinte ao chefe do Estado-Maior do Exército, general Alfredo Malan:

"Menti, sem saber, a quantos me ouviam. Estou hoje convencido, por boas e suficientes razões, de que a tortura, as torturas mais cruéis, são desgraçadamente aplicadas em nosso país de forma rotineira e sistemática a prisioneiros políticos. Iludido estava eu e iludido estará você, como iludido está o honrado e digno presidente da República que, como eu, afirmou publicamente o contrário."

Nunca divulguei essa carta porque, como na minha atividade diplomática, sempre segui o ensinamento do Barão do Rio Branco, tão violentado pela chusma esquerdista:

"Nada mais ridículo e inconveniente do que andar um diplomata a apregoar vitórias".

De seu fiel admirador,

Pio Correa

A 1ª LEI DE DELFIM
Nesta semana começa o governo de Jair Bolsonaro e não custa repetir a primeira lei do professor Delfim Netto:

"Na quarta-feira o presidente terá que abrir a quitanda às 9h da manhã com berinjelas para vender a preço razoável e troco na caixa para atender a freguesia.

Pelos próximos quatro anos a rotina essencial será a mesma: abrir a quitanda, com berinjelas e troco.

Todos os desastres da economia brasileira deram-se quando deixou-se de prestar atenção na economia da loja."

RISCOS SABIDOS
Em sua "Agenda de Governo", Bolsonaro mostrou que reunirá seu ministério às terças-feiras e fará "reuniões de alinhamento" semanais com grupos de ministros.

A nova administração entrará em campo sabendo dos "principais riscos" embutidos em suas iniciativas.

Assim, o principal risco do "Plano de Governo" é o de que ele saia do forno "sem conhecimento adequado de todos aspectos que podem influenciar o planejamento."

Já o risco da governança é "não ter um modelo adequado aos objetivos da organização e alinhado às linhas gerais das políticas governamentais".

MADAME NATASHA
Madame Natasha, como Eremildo, votou em Bolsonaro, mas digitou 13. Ela leu que vão chamar as reuniões do ministério de "Conselho de Governo" e que os encontros ocorrerão na "Sala Suprema" do Palácio do Planalto. Além disso, listam uma categoria de servidores denominados como "dirigentes máximos".

A boa senhora acha que a burocracia republicana iria melhor se restabelecesse os títulos de nobreza do Império. As reuniões aconteceriam na Sala do Trono, com marqueses, viscondes e barões.

INDULTO
Por trás do vaivém da concessão do indulto de fim de ano por Temer, esteve a decisão de deixar um legado para Bolsonaro.

Concedido, o indulto preservaria o delicado equilíbrio existente nos presídios do país. Negado, colocaria gasolina nos corredores controlados por facções criminosas que esperam faíscas capazes de estimular rebeliões.

Nas últimas semanas Bolsonaro e seu ministro Sergio Moro repetiram formulações genéricas que fazem sentido para quem está solto e são promessas de marcianos para quem está preso.

Por exemplo: negar a progressão da pena para quem pertence a uma facção dentro de um presídio. Tudo bem, desde que se faça de conta que em alguns lugares é possível viver numa cela sem aderir à facção. Quem vai distinguir o preso primário que aderiu para proteger sua vida e a de sua família do bandido que chefia o grupo?

MUSEUS
Passando pelo Rio, o arqueólogo egípcio Zawi Hawass voltou a reivindicar a volta do busto da rainha Nefertiti ao seu país. É uma rica discussão, mas não tem mocinho nem bandido.

A deslumbrante Nefertiti está exposta em Berlim, para onde foi levada em 1912. A peça foi liberada pelos egípcios e sobreviveu à Segunda Guerra. Já o museu do Cairo foi saqueado em 2011 e sumiram pelo menos 17 peças.

No Brasil dos anos 30 o antropólogo francês Claude Levi Strauss reuniu um acervo de milhares de peças indígenas. A lei mandava que ele só levasse a metade. O lote francês (1.200 objetos) está devidamente catalogado no museu do Quai Brandy, em Paris.

O lote brasileiro foi dividido pela burocracia e depois agrupado na Universidade de São Paulo. Só uma parte foi catalogada e muitas peças estragaram-se.

* Elio Gaspari, jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".


Bruno Boghossian: Por um ano baseado em fatos reais

Encerramos um 2018 encharcado de invencionices e informações distorcidas

A mentira sempre foi um combustível barato para eleições e máquinas de propaganda política. O ano que termina agora ficou encharcado de invencionices e informações distorcidas. É bom elencar alguns fatos para que possamos permanecer no mundo real em 2019.

1) Embora muitos produtores façam sua parte pela preservação ambiental, o agronegócio, mineradoras e madeireiras têm responsabilidade especial sobre o desmatamento. Tratar isso como lenda, como fazem alguns ruralistas, é autorizar a emissão de carteirinhas de devastação.

2) O impacto da ação humana sobre as mudanças climáticas, aliás, já foi objeto de pesquisas científicas com critérios rigorosos. Integrantes do próximo governo preferem considerar a questão uma fantasia ideológica da esquerda. Pode-se discordar das políticas implantadas para enfrentar o problema, mas negá-lo não levará a lugar algum.

3) Impor rédeas à atuação de professores não vai melhorar a educação. Há várias razões pelas quais nossos alunos mal sabem fazer contas. Nenhum deles gastou seu tempo em rodas de leitura de Marx.

4) O novo governo pode alcançar bons acordos ao buscar novos caminhos para sua agenda comercial. Se decidir bater de frente com a China em um teatro de alinhamento com os EUA, o Brasil pode perder muito.

5) Não é “matando idosos” que se resolverá o buraco nas contas da Previdência. Governantes e parlamentares precisam, de uma vez, ter coragem para enfrentar grupos privilegiados e tornar o sistema mais justo para evitar que o país quebre.

6) A revisão do financiamento do Sistema S não fará mal se mantiver os serviços prestados aos trabalhadores, acabando com seu uso político e com a perpetuação de dirigentes.

7) Reescrever o passado à força não muda a realidade. Dias depois da eleição, Jair Bolsonaro disse que a população estava começando a entender que “não houve ditadura” no Brasil entre 1964 e 1985.

Vamos torcer para que 2019 seja um ano baseado em fatos reais.


Demétrio Magnoli: Inventando Fergus Falls

Relotius escreveu, com maestria, o que seu público queria ler

Claas Relotius, 33, caiu do céu ao inferno. O jornalista alemão, jovem estrela da prestigiada revista Der Spiegel, premiado na Europa e nos EUA por reportagens pungentes, foi desmascarado por um colegacomo um sistemático fraudador.

Numa série de artigos demolidores, a publicação expôs meticulosamente suas inúmeras invenções e prometeu investigar os textos sobre os quais ainda pairam dúvidas.

O anjo caído criou personagens, cenários e citações, preenchendo realidades áridas ou banais com o material vibrante da ficção. Mas —e isso a revista não entendeu e não disse— o sucesso do trapaceiro derivou do recurso implacável à caricatura: Relotius escreveu, com maestria, o que seu público queria ler.

A típica fabricação de Relotius emerge numa reportagem sobre Fergus Falls, Minnesota, publicada em março de 2017.

A ideia era investigar uma comunidade do Meio Oeste dos EUA que votou, por ampla maioria, em Donald Trump. O jornalista alugou um apartamento na pequena cidade e saiu em busca da história.

No início, nada encontrou de especial, como atestam suas desoladas mensagens a editores. Mas, no fim, encontrou o caminho habitual —e retornou triunfante com mais um texto perfeito. A Fergus Falls estampada na Der Spiegel é a imagem exata que um europeu (ou americano, ou brasileiro) superficialmente culto, com inclinações de esquerda, faria do “país de Trump”.

A falsificação começa pelas estatísticas. Segundo o repórter, a cidade deu 70,4% dos votos a Trump, depois de escolher candidatos democratas ao longo de quatro décadas.

De fato, Fergus Falls elegeu o republicano Mitt Romney em 2012 e, sem surpresa, deu 62,6% dos votos a Trump. A ficção corre solta. No limite do perímetro urbano, ao lado da placa oficial de boas-vindas, numa segunda placa “com metade da altura”, feita de “madeira espessa cravada no solo congelado”, estariam gravadas as palavras “Mexicanos, fiquem fora”.

A Fergus Falls imaginada por Relotius situa-se em meio a uma floresta escura e, das janelas de um bar na área central, avistam-se as “seis chaminés” da termelétrica a carvão.

Na cidade inventada, o único cinema continuava a exibir “Sniper Americano” dois anos após o lançamento, e o prefeito, que jamais teve uma namorada, sempre porta uma pistola Beretta de 9 mm.

A escola local seria protegida por três portas de vidro blindado e um scanner de armas. Numa tarefa sobre a identidade americana, uma classe desenhou retratos de Obama, duas preferiram John Rockefeller e todas as outras, Trump.

“Eles não fizeram um único retrato de uma mulher”. Nenhuma dessas informações é verídica, mas cada uma delas ajuda a traçar os contornos verossímeis de uma distopia.

Na política, a caricatura nasce da crença essencialista de que as pessoas expressam, pelo voto, convicções ideológicas arraigadas. Os militantes políticos tendem a adotá-la, pois reflete suas próprias motivações e, além disso, propicia descrições dicotômicas, primitivas, sobre batalhas santas do bem contra o mal.

Graças à incansável atividade dos militantes virtuais, as caricaturas ganharam tração excepcional no mundo das redes sociais. Mas, na vida real, a imensa maioria das pessoas faz escolhas puramente situacionais, optando segundo percepções mutáveis dos seus interesses e desejos.

A Fergus Falls sombria de Relotius não existe, assim como inexistem a célebre “classe média fascista, ignorante e violenta” de Marilena Chaui ou a “São Paulo conservadora” invocada ritualmente pelo PT nas horas de derrotas eleitorais.

A massa de eleitores de Trump é constituída por cidadãos normais arrastados pela correnteza de uma longa recessão. O mesmo vale para a massa de eleitores de Bolsonaro, que não devem ser confundidos com seus arautos extremistas. Deseje um feliz Ano Novo para o seu familiar, amigo ou vizinho. Ele não é uma caricatura.

* Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.


Vinicius Torres Freire: Bolsonaro vai encolher bancos?

PT estatizou crédito; mesmo com Temer, maioria dos empréstimos ainda é estatal

Jamais ficou claro para o cidadão comum que os governos petistas estatizaram a maioria do crédito no Brasil, o que aconteceu no restinho de Lula 2 e sob Dilma Rousseff.

Michel Temer começou a reprivatizar o sistema, mas 51,7% do total do dinheiro emprestado por bancos ainda é crédito de bancos públicos. Dificilmente Jair Bolsonaro conseguirá reverter toda a obra petista, até porque o desmanche não depende apenas dele.

Na prática, é como se Lula e Dilma tivessem criado um banco maior que um Itaú ou um Bradesco (em termos de carteira de crédito). Em novembro de 2008, cerca de 35% do estoque de crédito, do total de dinheiro emprestado, estava nos bancos públicos. No auge, em julho de 2016, a participação dos públicos foi a quase 57%.

Essa estatização começou na virada decisiva da política econômica lulista, depois de crise financeira mundial que explodiu de vez em meados de 2008. O crédito internacional secou, a atividade econômica entrou em colapso, inclusive no Brasil. Houve uma retração violenta no crédito dos bancos privados. O fim do mundo parecia próximo.

Parecia razoável expandir o gasto público e o crédito estatal (embora alguns economistas advogassem que uma alternativa melhor seria o Banco Central baixar rápido a taxa de juros). No entanto, os efeitos agudos da crise logo passaram no Brasil. O estímulo de crédito, não.

Nos anos Lula, o crescimento relativo mais acelerado foi do BNDES. Sob Dilma, dos demais bancos públicos. Depois de uma reanimada de meados de 2010 a 2012, os bancos privados voltaram a jogar na retranca.

Os bancões privados alegavam que não poderiam acompanhar o ritmo estatal: tinham limites de capital e de risco. Os bancos públicos em tese poderiam se aventurar mais (com a retaguarda do governo) e, grosso modo, eram capitalizados à larga com dinheiro público.

Seja qual for o peso desses motivos, o descompasso resultou na estatização. Temer procurou desmontar esse sistema (na verdade um projeto iniciado por Joaquim Levy, ministro da Fazenda no primeiro ano de Dilma 2). O governo pediu de volta dinheiro emprestado ao BNDES e começou a dar cabo do crédito subsidiado do banco.

Depois de mais de três anos em baixa, o estoque de crédito bancário no país voltou a crescer em novembro passado (em termos reais, na comparação anual). Mas o grosso do encolhimento se devia na maior parte ao BNDES (sem o bancão de desenvolvimento, o crédito estaria no azul desde março).

O BNDES oferece em geral empréstimos de longo prazo, muito raros e caros na praça bancária. Fez falta? No balanço geral, parece que não. Empresas levantaram dinheiro no mercado de capitais (debêntures, ações etc.) em volume várias vezes superior ao do decréscimo do crédito do BNDES, mesmo nestes anos conturbados.

O crédito do BNDES vai fazer falta?

1. Uma dúvida: não se sabe o que pode acontecer quando as taxas básicas de juros subirem.

2. Pode ser que não: mesmo menos com menos dinheiro, o banco pode mudar sua forma de atuação, dando impulso a operações maiores, em vez de emprestar tudo diretamente.

3. Pode ser que sim: empresas pequenas ainda têm grande dificuldade de se financiar.

O que vai ser dos demais bancos públicos sob Bolsonaro ainda é mistério. O presidente eleito não quer privatizá-los (aceita vender apenas braços do BB e da CEF). Mas vai diminuir a velocidade do crescimento do crédito estatal, a fim de reprivatizar o sistema?


Hélio Schwartsman: Ditadura não, pô!

Poder estatal precisa ater-se ao princípio da impessoalidade da administração

Depois da Venezuela e de Cuba, o futuro chanceler do Brasil, Ernesto Araújo, desconvidou a Nicarágua para a posse de Jair Bolsonaro. Fê-lo em nome da liberdade. “A posse do PR [presidente] Bolsonaro marcará o início de um governo com postura firme e clara na defesa da liberdade”, declarou Araújo.

No que configura um grande avanço em relação a manifestações pregressas, Bolsonaro parece concordar com seu chanceler. Por ocasião do desconvite a Nicolás Maduro, ele disse: “Ditadura, pô, não podemos admitir. O povo lá não tem liberdade”.

Eu não poderia concordar mais. Por também prezar a liberdade, jamais convidaria os ditadores desses países para minha festa de aniversário. Existem, contudo, diferenças entre uma pessoa e um Estado.

Enquanto eu, você e qualquer cidadão que não esteja desempenhando funções públicas podemos manifestar preferências, exercitar caprichos e praticar todo tipo de discriminação não vedada por lei, inclusive o amor, o poder estatal precisa ater-se ao princípio da impessoalidade da administração.

Isso significa que, se o Brasil quisesse excluir da posse ditadores, precisaria fazê-lo de forma sistemática, aplicando o mesmo princípio a todas as nações e não apenas àquelas com que a pessoa física de Jair Bolsonaro tem uma rusga pessoal.

Numa análise perfunctória, teriam de ser desconvidados não só Venezuela, Cuba e Nicarágua, mas também China, Rússia, Turquia, Arábia Saudita, Egito, Paquistão, Costa do Marfim, Nigéria e Togo, para citar apenas algumas das autocracias mais escancaradas.

Isso não implica que valores não devam fazer parte das relações do Brasil com outras nações. Mas, de novo, é preciso que os princípios sejam aplicados de forma impessoal, não ao sabor das idiossincrasias de quem esteja no governo.

Quanto antes Bolsonaro entender que será o presidente do Brasil e não mais o ídolo de um grupo de WhatsApp, melhor.


Bruno Boghossian: Para Bolsonaros, explicação vazia de Queiroz é pior do que silêncio

Sem explicar depósitos de funcionários, ex-assessor dá pistas do que quer esconder

Para um amigo da família, Fabrício Queiroz já causou problemas demais para os Bolsonaros.

A entrevista em que o PM se recusou a explicar a movimentação de sua conta bancária é pior do que o silêncio que guardou por quase três semanas. Suas evasivas dão pistas do que ele quer esconder.

O ex-assessor de Flávio pretendia afastar o antigo chefe das suspeitas levantadas pelo relatório do Coaf que registrou transações de R$ 1,2 milhão em um único ano. “Eu sou o problema, não eles”, disse ao SBT.

Queiroz não fez muito mais do que isso. O PM decidiu manter segredo sobre os depósitos que recebeu dos servidores do gabinete de Flávio nos mesmos dias em que rodava a folha de pagamento da Assembleia Legislativa do Rio. Disse que só falaria do assunto ao Ministério Público —embora tenha se esquivado de quatro intimações para depor.

Agora, o ex-assessor teria dois caminhos claros para encerrar o caso. O primeiro seria explicar os repasses que recebeu dos colegas: se eram parcelas de carros vendidos, pode listar os negócios e pedir que os funcionários confirmem a compra com os documentos dos veículos.

A outra opção é mais complicada. Caso Queiroz realmente tenha operado uma coleta de caixinha entre os assessores do deputado, a saída seria admitir a cobrança do mensalinho e responder se o parlamentar sabia ou não sabia do esquema.

O amigo dos Bolsonaros está longe dos pontos de partida dessas trilhas. Queiroz se vangloriou de suas atividades (“eu faço dinheiro”), mas não explicou por que, então, teve que pedir R$ 40 mil a Jair. Ele disse que deu dez cheques à mulher do presidente eleito para devolver o empréstimo.

Ao falar dos graves problemas de saúde que o impediram de prestar depoimento, contou ter sido atendido por um famoso doutor Vladimir, mas não soube dizer o sobrenome do médico. Tampouco quis revelar em que hospital ficou internado. Não era memória fraca: Queiroz conseguiu lembrar que a oficial de Justiça que o intimou se chamava Rita.


Vinicius Torres Freire: O Brasil e o resfriado americano

Em caso de crise maior nos EUA, Brasil não tem o que fazer a não ser mais do mesmo

Dólar caro e, por vezes, tumultos grandes na economia americana causam um ligeiro aumento do interesse brasileiro por assuntos internacionais. Ligeiro feito uma brisa e apenas entre certa e mui diminuta elite.

Como a taxa de câmbio anda relativamente estável, ainda é raro ouvir conversa sobre o risco e os possíveis efeitos de uma crise americana.

No entanto, seja como for nos Estados Unidos, a discussão no Brasil em tese não teria como mudar.

Dado o tamanho da nossa desgraça econômica, não temos como reagir ou fazer algo diferente do programa que será inevitável pela próxima meia dúzia de anos, faça chuva ou sol lá fora. Isto é, evitar a explosão da dívida pública e uma inflação descontrolada.

A dúvida é como administrar a divisão de custos do ajuste e lidar politicamente com as insatisfações, maiores caso o caldo da economia internacional entorne.

Não é lá muito difícil que o Brasil cresça 2,5% no ano que vem (neste ano, o crescimento não deve passar de 1,4%).

As condições são aquelas que todo mundo está enfadado de ouvir:

1. Reforma da Previdência, alguma outra contenção de despesa que cresça de modo vegetativo e uma arrumadinha em impostos;

2. Economia dos EUA desacelera sem colapso;

3. Donald Trump não intensifica sua guerra com a China e não provoca outras;

4. O crescimento chinês não baixa de seu novo patamar de 6%.

Crescer 2,5% é nada no Brasil. Ainda ficaríamos longe de recuperar o nível de produção e/ou renda perdida na recessão. Nesse ritmo, o desemprego cairia dos cerca de 12% de agora para 11% apenas em 2020 (sim, daqui a dois anos). Ainda assim, seria um alívio, depois de um par de anos de recessão seguidos de um biênio de quase estagnação, refresco em especial para a metade mais remediada da população.

Sem choques externos, com um programa ponderado e bem sequenciado de reformas, com maiorias no Congresso e sem conflitos sociopolíticos derivados de bizarrices ignaras e extremistas, o país pode crescer até mais.

Caso sobrevenha algum problema maior, será obviamente mais difícil chegar aos 2,5%.

Um tumulto no mercado financeiro americano ou um ataque comercial pesado de Trump contra a China pode dar um peteleco forte no dólar, derrubar preços de commodities e causar desânimos e receios vários nas empresas, além de dar uma piorada nas expectativas de inflação.

O que fazer, então? Não haveria o que fazer, a não ser mais do mesmo em um país meio quebrado: o tal ajuste para conter a explosão da dívida etc. Exceto na opinião de parte da esquerda, o país não tem instrumentos para compensar a nova paulada (aliás, se tivesse, poderia recorrer desde já a algum estímulo).

O governo não tem como gastar mais sem que os juros deem um salto.

No caso terrível de crise financeira mundial com disparada séria do dólar e subsequente risco de alta da inflação e de juros por aqui, haveria um estrago sinistro no tamanho da nossa dívida imensa. É bom nem pensar nisso.

Reformas impopulares podem ficar menos intragáveis com alguma recuperação do crescimento econômico. Mas não parece razoável acreditar que se aceite sem mais protestos um outro ano de recessão/estagnação. Seria um ambiente propício para ideias de vez destrambelhadas, políticas em particular.

Alternativas econômicas razoáveis só vamos ter no próximo mandato, se der tudo certo.

Em suma, em parte dependemos da sensatez de Donald Trump e de Jair Bolsonaro.


Janio de Freitas: A Folha de Bolsonaro

Está claro que o presidente eleito ignora o indispensável sobre solução técnica

Jair Bolsonaro não se conforma em ver na Folha textos que não lhe convêm. Tamanha é a sua consideração pelo jornal que reage com insultos, trata mal gente da casa, adverte que prejudicará a empresa, quando dos seus desagrados. Vê-se que é uma distinção exclusiva, e dessas que não se tem como agradecer nem corresponder. Mas é ainda mais rica a sua reação à importante e bem realizada reportagem de Thais Bilenky, baseada na observação de que, "pela primeira vez na história da República", um presidente se empossará "sem nenhum representante" do Nordeste e do Norte "no primeiro escalão" do novo governo.

Primeiro, o Bolsonaro convencional: "A Folha de S.Paulo continua a fazer um jornalismo sujo e baixo nível". E assim segue, esperando convencer de que fez "escolhas técnicas". O que, mesmo se verdadeiro, não impediria a escolha de técnicos capazes e representativos das regiões que compõem cerca de metade do país.

Desta vez apareceu o segundo Bolsonaro, já sacando uma pretensa resposta técnica do seu governo: "Ainda em janeiro" o governo vai "construir instalação piloto para retirar água salobra do poço, dessalinizar, armazenar e distribuir" no Nordeste. Tudo a jato, porque será no mesmo janeiro a ida do ministro da Ciência e Tecnologia a Israel, ainda para procurar parcerias e a tecnologia necessária.

Está claro que Bolsonaro ignora o indispensável sobre a sua solução técnica. O interesse pela dessalinização vem de longe também no Brasil. A tecnologia não é problema. Suas modalidades são conhecidas aqui, já foram testadas, técnicos para aplicá-las não faltariam. Caso alguma dessas modalidades se mostrasse suportável financeiramente. Nem são as instalações, que custam uma só vez. O custo operacional é muito alto e permanente, em descompasso com as condições socioeconômicas da região.

Outras soluções para as dificuldades prementes dos nordestinos são consideradas preferíveis. Prova disso, e sem excluir a continuidade dos estudos de dessalinização, é o feito da ministra Thereza Campello no governo Dilma, já citado aqui mais de uma vez: em torno de um milhão —sim, um milhão— de cisternas familiares instaladas, eficiência rara em qualquer setor brasileiro em qualquer tempo. E, de pasmar, sem nem sequer um arremedo de escândalo.

Israel vale-se da dessalinização, sim. Mas conta com um suporte financeiro sem igual no mundo. Tem a contribuição segura, regular e fartamente generosa de judeus em numerosos países, além da colaboração múltipla dos Estados Unidos, por sua aliança. O Brasil, sem enganações convenientes aos da riqueza especulativa e não produtiva, está destroçado, desacreditado e sem dinheiro até para alimentar os sinais de vida.

Bolsonaro diz, por escrito, que os repórteres da Folha "vão quebrar a cara!" Se ele não quebrar a sua e o Brasil, com seus propósitos desatinados, não faz mal.


Bruno Boghossian: As barreiras políticas aos planos de Moro e Guedes

Parlamentares resistem a mudanças na lei e cortes propostos pelos novos ministros

O instinto de sobrevivência dos políticos será um obstáculo para os planos das principais estrelas do próximo governo. As propostas de Sergio Moro (Justiça) e Paulo Guedes (Economia) para endurecer as leiscontra o crime de colarinho branco e cortar gastos públicos não costumam fazer sucesso em Brasília.

Não foram poucos os casos em que deputados e senadores tentaram articular a aprovação de uma anistia ao caixa dois, por exemplo. Em novembro, depois da eleição de Jair Bolsonaro, caciques partidários se reuniram para uma última investida, mas o esforço fez água mais uma vez.

É improvável que o novo Congresso se atreva a insistir na ideia, mas também não se deve esperar adesão automática dos parlamentares à agenda de Moro. Movidos pelo espírito de corpo ou por orientações partidárias, os políticos apresentam resistência a medidas que possam colocar o establishment em risco.

Mesmo congressistas alinhados ao governo Bolsonaro manifestam relutância. Alguns deles querem atrelar os planos do novo ministro a propostas que punem juízes e procuradores por abuso de autoridade, além de regras mais rígidas para o cumprimento do teto salarial no Judiciário.

A missão de Paulo Guedes também não é fácil. Deputados e senadores são especialistas em ampliar despesas para direcionar obras e dinheiro para suas bases eleitorais, mas o chefe da equipe econômica passou os últimos meses afiando a faca.

Guedes já deu passos importantes para desobstruir seu caminho. Nomeou um deputado para sua equipe e abriu canais com dois personagens da elite parlamentar: Rodrigo Maia e Renan Calheiros. A dupla, candidata a presidir a Câmara e o Senado a partir de 2019, retribuiu os acenos.

A lei da sobrevivência política ainda pode impor aos congressistas uma mudança de cálculos. Moro é um personagem popular e a economia precisa de medidas duras para voltar aos trilhos. Se o país não crescer e os políticos continuarem barrando medidas anticorrupção, poucos vão se reeleger em 2022.


Antonio Delfim Netto: Temer, missão cumprida

Presidente será classificado como um inovador e reformista

Quando os tempos se acalmarem, pesquisadores honestos concentrarão suas teses de doutoramento nos incríveis quase 14 anos de governo do PT.

Sob Lula, registrou-se o único surto de crescimento dos últimos 20 anos. Ajudado por uma extraordinária melhoria das “relações de troca”, soube aproveitá-la para melhorar a distribuição de renda.

Tudo foi destruído pela ação voluntarista de Dilma, que produziu uma dramática recessão. Entre 2012 e 2016, o PIB per capita caiu 7%, a produção industrial voltou ao nível de 2003 e os PACs deixaram mais de 7.000 obras inacabadas. A tragédia fiscal foi escondida pela destruição dos registros contábeis que levaram ao impeachment.

Essa foi a herança de Temer. Ele soube organizar uma espécie de “parlamentarismo de ocasião” e cercar-se do que há de mais competente na administração pública do país.

Não tenho a menor dúvida. Quando Temer sofrer o mesmo julgamento, ele será classificado como um presidente inovador e reformista: a densidade de medidas corretivas dos desvios da boa administração econômica por unidade de tempo foi a maior desde a Constituição de 1988!

É tempo de registrar com tristeza que a reforma da Previdência, sem a qual não há a menor esperança de voltarmos a um equilíbrio fiscal, foi frustrada por uma armação de Janot, acompanhada por um “principismo” do STF, que poderia ter agido postergando o início do processo para 2 de janeiro de 2019.

Ninguém propunha ignorar os fatos, mas apurá-los com honestidade de propósito e ampla liberdade de defesa, depois que o mandato se esgotasse. O que se sugeria era, apenas, manter funcionando o “parlamentarismo de ocasião” que, praticamente, já havia assegurado a aprovação daquela reforma.

O governo de Temer sai consagrado pela qualidade dos técnicos que escolheu. Paulo Guedes, inteligentemente, aproveitou o “crème de la crème” do funcionalismo competente e honesto com o qual ele governou. Novos governos estaduais disputaram a colaboração de vários de seus ministros e dos que saíram. Outros sofrem intenso namoro do setor privado.

Temer sempre recusou remover um auxiliar por ter servido, como bom profissional, aos governos do PT. A intriga (os palácios são ninhos de jararacas) nunca o levou a julgar um auxiliar competente “porque era petista de carteirinha”.

Hoje as insídias transcendem o palácio. O mais competente profissional é sujeito, na mídia social irresponsável, ao ataque dos que pretendem a sua posição sem ter a mesma qualificação. Esse é um aviso para o governo Bolsonaro.

Presidente Temer, V. Excelência cumpriu sua nobre missão: “Perfer et obdura”. Vá em paz!

*Antonio Delfim Netto é economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”.


Luiz Felipe Pondé: Sentimento oceânico da política

As mídias sociais podem pôr em risco a estrutura política de representação

“Sentimento oceânico” é uma conhecida expressão que Freud tomava emprestada para se referir a uma sensação religiosa ou mística que muitos sentiam, mas ele, não. Esse sentimento descrevia um pertencimento a um todo maior (o mundo, o universo, a natureza) carregado de prazer. Para Freud, não passava de um resto da célula narcísica.

Fiquemos por aqui na crítica psicanalítica à religião. Seria, talvez, necessário ir adiante e aplicar a mesma suspeita à adesão de muitos à ideia de povo e suas manifestações sociais e políticas.

Temo que o mesmo tipo de crítica seria possível. As pessoas que ficam à busca de um grande sentido histórico quando o povo sai às ruas estão afogadas em restos narcísicos infantis. Não é à toa que essas pessoas falam de movimentos sociais e políticos populares com os olhos cheios de emoção. O gozo narcísico é evidente.

Nesse sentido, esperar alguma redenção do mundo a partir dos movimentos populares é uma expectativa imatura e narcísica. Como ler os sinais em busca do apocalipse. A diferença é que quem faz essas leituras é gente ignorante e crente e quem analisa movimentos sociais e políticos é gente culta e especializada.

Entretanto, a infantilidade é a mesma.

Mas o que fazer quando grandes gurus dessa expectativa, como o próprio Marx, alimentavam os mesmos sentimentos? Nada a fazer, a não ser perceber que o próprio Marx seria regredido em matéria psicológica.

Daí a política regredida que alimenta a nossa época.

Não acho que podemos ir tão rápido assim, mas a hipótese vale uma maior reflexão. Por hoje, fiquemos na mera aplicação do sentimento oceânico às expectativas redentoras que muitos identificam nos últimos movimentos populares no mundo e no Brasil.

Alguns acham que existe um fundo histórico hegeliano em movimentos como a Primavera Árabe (termo que ilumina o ridículo de grande parte dos intelectuais e da mídia), as jornadas de junho ou os coletes amarelos franceses de agora.

Buscar um fundo histórico hegeliano é buscar um sentido histórico de evolução (esse sentido histórico também pode ser marxista). Esse “fundo” nada mais seria do que a presença do sentimento oceânico aplicado à história, à política e à sociedade. É projetar seu gozo narcísico primitivo nas ações humanas no “tempo”. Incrível como psicanalistas e afins pensam “dentro” dessa projeção.

Alguns entram em êxtase com islandeses fazendo escolhas política via Facebook! A Islândia é um país de uma natureza impressionantemente linda e impactante. Mas seu clima é hostil, sua população vai um pouco além de 300 mil habitantes e seu isolamento é profilático para com as misérias do mundo (por isso, lá tudo é “lindo”, sua primeira ministra anda pela rua, não tem exército e a polícia é ociosa), mas ainda assim tem gente que acha que a Islândia pode ser um “modelo” a ser seguido pelo Brasil... Risadas?

Afinal, o que reúne movimentos “semelhantes” como a Primavera Árabe, o Occupy Wall Street, as jornadas de junho, a greve dos caminhoneiros ou os coletes amarelos? Nada!

A não ser as mídias sociais e seu poder de impacto que se move na velocidade da luz, seu caráter disperso e, finalmente, sua capacidade de agenciar ressentimentos e demandas justificadas e/ou delirantes. Logo, o denominador comum é uma ferramenta e não um conteúdo.

A presença, no passado, de líderes organizadores dos movimentos sociais e políticos encobria o que hoje está descoberto: o “povo” não é uma entidade única, a não ser por suas queixas, fantasias e disposição para a violência.

Hoje, as inteligências celebram a inexistência de líderes e o caráter descentralizado desses movimentos.

Arriscaria dizer que se trata da mesma projeção narcísica que alguém pode fazer acerca da divindade de uma erupção vulcânica (aliás, vulcão é o que não falta no paraíso social e político que é a Islândia).

As mídias sociais podem pôr em risco a estrutura política de representação por conta de sua capacidade de agenciar pessoas banais “liderando” processos de geração de violência.

Uma conclusão primeira e, para alguns, assustadora, é a existência de um componente narcísico primitivo em operação na idealização da democracia, que seria o regime por meio do qual o povo faz sua história. O “povo histórico” aqui é exatamente o objeto do sentimento oceânico.

O povo não faz história nenhuma, apenas corre atrás, para lá e para cá, e em círculos, de seu bolso, de suas taras e de seus ressentimentos.

*Luiz Felipe Pondé é escritor e ensaísta, autor de “Dez Mandamentos” e “Marketing Existencial”. É doutor em filosofia pela USP.


Leandro Colon: Um governo a ser esquecido

Temer deixa Jaburu com três denúncias no currículo e fracasso em cumprir promessas

Mais uma semana pela frente e o governo de Michel Temer chegará ao fim. Um período presidencial que começou de maneira interina no dia 12 de maio de 2016 após o Senado aprovar o afastamento temporário de Dilma Rousseff.

Naquela quinta-feira, Temer afirmou ser necessário um "governo de salvação nacional". "É urgente pacificar a nação e unificar o Brasil", disse.

"A moral pública será permanentemente buscada por meio dos instrumentos de controle e apuração de desvios", declarou, rodeado no Palácio do Planalto por novos ministros.

Entre eles estavam Romero Jucá, do Planejamento, e Geddel Vieira Lima, da Secretaria de Governo. O primeiro caiu logo em seguida com a revelação pela Folha do áudio em que defendia "estancar a sangria" da Lava Jato. E Geddel passará mais um Natal na penitenciária da Papuda.

Temer deixa o Palácio do Jaburu carregando no currículo três denúncias da Procuradoria-Geral da República. São acusações de corrupção, de chefiar organização criminosa, de obstruir a Justiça e de lavagem de dinheiro. A última das denúncias foi apresentada semana passada pela chefe da PGR, Raquel Dodge, indicada por Temer para substituir Rodrigo Janot, algoz do presidente.

São acusações que devem seguir para a primeira instância a partir de janeiro e atormentar a vida do emedebista, que passará a conviver com o fantasma da condenação e o pesadelo de uma consequente prisão.

Juntam-se a isso novas frentes de investigação. Dodge descreveu na terceira denúncia, por exemplo, mais cinco crimes que precisariam ser apurados em relação ao presidente.

O período Temer só não foi um completo desastre porque o país saiu da recessão, a inflação foi controlada, e o teto de gastos, aprovado.

Por outro lado, sua gestão fracassou no avanço da reforma da Previdência e no combate ao desemprego.

Não há como ser positivo o balanço de um governo em que seu presidente atingiu o pior índice de popularidade da história e não cumpriu a promessa de unificar o Brasil.

*Leandro Colon é diretor da Sucursal de Brasília, foi correspondente em Londres. Vencedor de dois prêmios Esso.