Folha de S. Paulo
Bruno Boghossian: CPMF não era único motivo de irritação de Bolsonaro com a Receita
Antes de demitir secretário, presidente reclamou de devassa na vida de parentes
O presidente fez um baita alarde ao anunciar que havia demitido o chefe da Receita para impedir a volta da CPMF. Se a criação do tributo fosse mesmo uma ideia inadmissível, Jair Bolsonaro também deveria mandar embora o ministro Paulo Guedes. Poderia pensar até em renunciar ao cargo.
Bolsonaro sempre atacou a CPMF, mas admitiu à Folha, na semana passada, a possibilidade de apoiá-la desde que houvesse "uma compensação para as pessoas". Em outra entrevista, publicada há dois dias pelo jornal Valor Econômico, Guedes celebrou o tributo e disse que poderia arrecadar R$ 150 bilhões com ele.
A contribuição sobre movimentações financeiras era uma pílula amarga para o presidente, mas Marcos Cintra não era seu único simpatizante. A defesa que ele fazia do tributo pode ter justificado a demissão, mas foi apenas a gota d'água.
O secretário da Receita estava há tempos à beira do precipício. Cintra sofria pressões do Palácio do Planalto pela substituição de servidores em postos do comando no Rio, e Bolsonaro reclamava abertamente de uma "devassa" que era feita pelo órgão sobre as vidas de seus parentes.
A Receita virou motivo de problema para o presidente. A dor de cabeça aumentou quando Cintra passou a dar contornos mais nítidos à nova CPMF, expondo o presidente a ataques de sua própria base política.
O plano de cobrar um tributo sobre cada pagamento feito pelos cidadãos incomodou tanto o Congresso (que deu bola preta para a ideia) quanto os apoiadores fiéis do governo nas redes sociais. Bolsonaro agiu como de praxe e fritou o auxiliar.
A mudança dá ao presidente a oportunidade de retomar as rédeas da reforma tributária, que quase se perdeu na confusão. Resta saber se o governo vai aproveitar para saciar a vontade de interferir nas atividades de investigação do órgão.
Na semana passada, o presidente mandou recado ao secretário. "O Cintra às vezes levanta a cabeça, mas eu vou lá e dou uma nele", disse. Chegou a hora da pancada definitiva.
Bruno Boghossian: O que o tuíte de Carlos revela sobre o populismo de Bolsonaro
Presidente e aliados seguem linha que apresenta democracia como entrave a mudanças
“Sem dúvidas, nem o Parlamento, nem o Poder Judiciário são hoje agentes de mudança, mas freios à transformação e ao progresso.” A frase está no texto em que Alberto Fujimori justificava o autogolpe que fechou o Congresso e desfigurou os tribunais do Peru, em 1992. Poderia ter saído também da caneta de qualquer político populista de 2019.
O tuíte em que Carlos Bolsonaro lamenta a demora no avanço do país “por vias democráticas” carrega a substância daquela mensagem. O vereador não anunciou a implantação de um regime autoritário, é verdade, mas reproduziu bem a doutrina bolsonarista contra as instituições.
Governantes incomodados com os contrapesos do poder costumam culpar as limitações impostas pela democracia. O argumento seguinte é o de que a vontade do povo só será cumprida se os líderes puderem remover todos os obstáculos.
Essa é a linha clássica do populismo. Não por acaso, Jair Bolsonaro e seus aliados têm o hábito de apresentar as instituições como entraves às tentativas de mudar o país e de implementar seu programa.
Quando declarou que, numa democracia, as transformações podem demorar, o filho do presidente parecia pedir calma a eleitores impacientes, mas também reforçou mais uma vez aquele desconforto.
Meses atrás, o pai já havia feito uma propaganda explícita desse incômodo com os freios da política. “Que poder, de fato, tem o presidente do Brasil? Até o momento, como todas as suas ações foram ou serão questionadas no Congresso e na Justiça, apostaria que o presidente não serve para nada”, dizia um texto divulgado por Bolsonaro, em maio.
Jogar a culpa no “sistema” pode ser só uma estratégia para ganhar tempo, mas também contribui para nutrir uma insatisfação generalizada com as instituições democráticas. Líderes que tentam restringir a atuação de outros órgãos gostam de apelar para esse sentimento. Há 27 anos, o desprestígio do parlamento peruano levou mais de 80% da população a apoiar o golpe de Fujimori.
Elio Gaspari: Celso de Mello - ‘ !!!!!!!!!!!!!!! ’
A mensagem do ministro Celso de Mello para a repórter Mônica Bergamo tinha 15 pontos de exclamação. Diante da presepada do prefeito Marcelo Crivella na Bienal do Livro, o decano do Supremo Tribunal Federal fez um curto e indignado protesto contra as “trevas que dominam o poder do Estado”, a “intolerância”, a “repressão ao pensamento” e a “interdição ostensiva ao pluralismo de ideias”. Não deu nome aos bois, mas qualificou a manada: as “mentes retrógradas e cultoras do obscurantismo (que) erigem-se, por ilegítima autoproclamação, à inaceitável condição de sumos sacerdotes da ética e padrões morais e culturais que pretendem impor, com o apoio de seus acólitos, aos cidadãos da República !!!! ”.
Celso de Mello não é só o decano do Supremo Tribunal Federal, pois esse título mostra apenas que é o ministro que está lá há mais tempo, desde 1989. Ele é uma espécie de fiel da balança nas divergências e idiossincrasias de seus pares. Ele havia sinalizado seu desconforto em agosto passado, quando Jair Bolsonaro republicou uma medida provisória que havia sido rejeitada pelo Congresso: “Ninguém, absolutamente ninguém, está acima da autoridade suprema da Constituição da República”.
Habitualmente oceânico em seus votos, o ministro foi breve em sua mensagem a Mônica Bergamo. Com 173 palavras, falou do tempo “novo e sombrio” que se anuncia. Seus 15 pontos de exclamação mostram que está zangado. É a zanga de um homem da lei. Acaba de sair nos Estados Unidos uma boa biografia de Oliver Wendell Holmes, o grande juiz da Suprema Corte, onde sentou-se de 1902 a 1932. Flor do orquidário de Mello, Holmes foi o autor do grande voto em defesa da liberdade de expressão que ficou em minoria na época mas hoje é um marco na jurisprudência americana. Certo dia, aos 90 anos, o juiz pediu a uma secretária que lhe lesse “O amante de Lady Chatterley”, de D. H. Lawrence. A certa altura, mandou que parasse: “Filha, não vamos acabar este livro, sua chatice não é aliviada por sua pornografia”. Hoje “O Amante de Lady Chatterley” é apenas um romance chato. Quando a moça lia para Holmes, ele estava proibido nos Estados Unidos. (A licenciosidade de Lawrence é light se for comparada com a retórica de Bolsonaro.)
Celso de Mello mostrou que vai à luta contra “as trevas que dominam o poder do Estado”. Nessa briga Marcelo Crivella é um cisco no olho. O desconforto do ministro com as plataformas móveis de Jair Bolsonaro é grande e antigo. Antes mesmo da eleição, ele cogitava antecipar sua aposentadoria para não entregar sua vaga depois de uma eventual vitória do capitão. Mudou de ideia e pode ter se arrependido, pois em nove meses viu seus temores confirmados. No início do mandato de Bolsonaro, o ministro foi colocado na situação de esquentador de cadeira para Sergio Moro. Do Moro de janeiro resta apenas uma pálida sombra, disciplinado pela calistenia do Planalto, onde ensina-se que lá não se admite a figura de ministro com agenda própria. Quem samba fica, quem não samba pode ir embora. E Moro decidiu ficar.
Celso de Mello chegará à aposentadoria compulsória no seu 75º aniversário, em novembro do ano que vem. Até lá, escreverá boas páginas na defesa das “vias democráticas”, na luta da luz contra a treva.
Folha de S. Paulo: 'Não há como aceitar uma família de ditadores', diz presidente da OAB sobre fala de Carlos
Felipe Santa Cruz afirma ainda que 'é hora de os democratas darem um basta'
Thais Arbex | Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - O presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, reagiu às declarações do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) e afirmou que "não há como aceitar uma família de ditadores".
"É hora dos democratas do Brasil darem um basta. Chega", disse Santa Cruz à Folha na noite desta segunda-feira (9).
Filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL), Carlos escreveu em seu perfil no Twitter que, por "vias democráticas", não haverá as mudanças rápidas desejadas no país.
"Por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos... e se isso acontecer. Só vejo todo dia a roda girando em torno do próprio eixo e os que sempre nos dominaram continuam nos dominando de jeitos diferentes!", escreveu o vereador.
Antes de escrever que não haverá transformações rápidas no país por vias democráticas, Carlos afirmou que o atual governo tenta colocar o Brasil "nos eixos", mas que os "avanços são ignorados, e os malfeitores esquecidos".
A postagem de Carlos repercutiu rapidamente entre seus seguidores. Parte dos internautas encarou a manifestação como uma defesa à ditadura e chamou o vereador de "golpista". A família Bolsonaro é conhecida pela exaltação ao período da ditadura militar, que vigorou no Brasil de 1964 a 1985.
No fim de junho, Jair Bolsonaro disse que poderia explicar como o pai de Santa Cruz desapareceu durante a ditadura militar (1964-1985).
O presidente da OAB disse à época que chefe do Executivo demonstrava "crueldade e falta de empatia".
"O mandatário da República deixa patente seu desconhecimento sobre a diferença entre público e privado, demonstrando mais uma vez traços de caráter graves em um governante: a crueldade e a falta de empatia", escreveu Santa Cruz em nota.
Folha de S. Paulo: Filho do presidente é alvo de críticas após declarações em rede social
O vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL), escreveu na noite desta segunda-feira (9) em rede social que, por vias democráticas, não haverá as mudanças rápidas desejadas no país
Rodrigo Borges Delfim / Thais Arbex | Folha de S. Paulo
A postagem do filho do presidente foi alvo de críticas de políticos e da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que viram nela uma ofensa ao sistema democrático brasileiro.
"Por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos... e se isso acontecer. Só vejo todo dia a roda girando em torno do próprio eixo e os que sempre nos dominaram continuam nos dominando de jeitos diferentes!", disse Carlos.
A família Bolsonaro tem um histórico de declarações de exaltação ao período da ditadura militar, que vigorou no Brasil de 1964 a 1985.
"Não há como aceitar uma família de ditadores", reagiu Felipe Santa Cruz, presidente nacional da OAB, que chegou a ser atacado recentemente pelo presidente Jair Bolsonaro, que fez referências à morte do pai dele na ditadura. "É hora dos democratas do Brasil darem um basta. Chega", disse à Folha.
Além de afirmar que não haverá transformações rápidas no país por vias democráticas, Carlos escreveu que o atual governo tenta colocar o Brasil "nos eixos", mas que os "avanços são ignorados, e os malfeitores esquecidos". Após ser criticado, escreveu mais tarde: "Agora virei ditador? Pqp! Boa noite a todos!"
Apontado como responsável pela estratégia do presidente nas redes sociais, Carlos provocou turbulências no primeiro semestre após ataques a integrantes do governo do pai, mas vinha evitando polêmicas nos últimos meses.
As postagens desta segunda foram feitas enquanto seu pai, Jair Bolsonaro, está internado em um hospital de São Paulo após passar por cirurgia no domingo (8), a quarta decorrente da facada que levou há um ano durante ato de campanha em Juiz de Fora (MG).
O vice-presidente, general Hamilton Mourão, alvo recorrente de ataques de Carlos, ficará no comando da Presidência da República até quinta-feira (12).
O PSDB se manifestou em repúdio às declarações do filho do presidente e afirmou que "a democracia é a única opção possível."
Na campanha de 2018, uma declaração de outro filho do atual presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), sobre fechar o STF (Supremo Tribunal Federal) foi repudiada no meio jurídico e político.
Em vídeo gravado em julho e disponível na internet, mas que veio à tona a uma semana do segundo turno, ele respondia a pergunta sobre uma hipotética possibilidade de ação do Exército em caso de o STF impedir que Bolsonaro assuma a Presidência.
"Cara, se quiser fechar o STF, sabe o que você faz? Você não manda nem um jipe. Manda um soldado e um cabo. Não é querer desmerecer o soldado e o cabo, não", disse.
Nesta segunda, Eduardo Bolsonaro também provocou polêmica ao tirar uma foto ao lado do pai no hospital. Na imagem, ele exibe uma arma na cintura. O presidente prometeu indicar Eduardo para ser embaixador do Brasil em Washington.
Segundo pesquisa Datafolha feita no mês passado, 70% da população diz acreditar que os filhos de Jair Bolsonaro mais atrapalham do que ajudam seu governo.
Outro filho político do presidente, senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), virou alvo de investigação após movimentações atípicas de seu ex-assessor Fabrício Queiroz.
Em resposta às postagens de Carlos, alguns internautas aproveitaram para cobrar uma ação de Flávio a favor da CPI da Lava Toga, cujo propósito é investigar ministros de cortes superiores.
No primeiro semestre, a influência de Carlos no governo Bolsonaro foi motivo de críticas de políticos e de militares ligados à administração federal.
Em um dos episódios mais ruidosos, em meio à crise das candidatas laranjas do PSL reveladas pela Folha, Carlos divulgou em seu perfil no Twitter uma gravação de seu pai indicando que o presidente não havia conversado com o então ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, diferentemente do que este havia dito.
Chamado de mentiroso por Carlos e depois pelo próprio presidente, Bebianno acabou demitido.
Ligado ideologicamente ao escritor Olavo de Carvalho, Carlos também centrou ataques a Mourão e ao general Santos Cruz, ministro da Secretaria de Governo que foi demitido em junho.
Jair Bolsonaro chegou a defender seu filho em março, afirmando que há pessoas que querem afastá-los, mas “não conseguirão”.
Junto com a mensagem, na ocasião, publicou uma foto em que é amparado por Carlos no corredor de hospital.
“Algumas pessoas foram muito importantes em minha campanha. Porém, uma se destacou à frente das mídias sociais, com sugestões e conteúdos: Carlos Bolsonaro, meu filho. Não por acaso muitos, que nada ou nunca fizeram para o Brasil, querem afastá-lo de mim”, escreveu Bolsonaro.
“Não conseguirão: estando ou não em Brasília continuarei ouvindo suas sugestões, não por ser um filho que criei, mas por ser também alguém que aprendi a admirar e respeitar pelo seu trabalho e dedicação”, concluiu.
Dizendo-se desgostoso com a política, Carlos tem dito a aliados que desistiu de concorrer à reeleição à Câmara do Rio —está em seu quinto mandato seguido— e lançou a própria mãe, Rogéria, para a disputa.
OUTRAS POLÊMICAS DE CARLOS BOLSONARO NO TWITTER
Demissão de Bebianno
Em fevereiro, Gustavo Bebianno foi demitido da Secretaria-Geral da Presidência após uma crise desencadeada por uma postagem de Carlos. O filho do presidente postou no Twitter que o então ministro havia mentido ao jornal O Globo ao dizer que conversara com Bolsonaro três vezes na véspera, negando a turbulência política causada pelas denúncias das candidaturas laranjas no PSL. O post foi reproduzido na página de Bolsonaro.
Críticas a Mourão
Nas redes sociais, Carlos já fez diversas críticas ao vice-presidente, o general Hamilton Mourão. Em abril, quando o vice foi convidado a dar uma palestra nos EUA e foi anunciado como “uma voz de razão e moderação, capaz de orientar a direção em assuntos nacionais e internacionais”, Carlos escreveu um comentário recheado de ironias e disse que o jogo de Mourão estava muito claro.
Ele também disse que o general tinha um estranho alinhamento com políticos que detestam o presidente, em referência a um comentário de Mourão lamentando a decisão de Jean Wyllys de deixar o Brasil e não tomar posse como deputado federal.
Em outro episódio, desta vez em junho, quando Bolsonaro estava em visita oficial na Argentina Carlos escreveu que tinha saudades do presidente de verdade “pró-armamento da população e contra o aborto”.
Demissão de Santos Cruz
Carlos foi acusado pelo general Carlos Alberto Santos Cruz, então chefe da Secretaria de Governo, de ter promovido um ataque virtual ao ministro. O caso aconteceu em maio, e a hashtag #ForaSantosCruz ficou entre as mais populares do Twitter. A disputa teria sido motivada pelo descontentamento de Carlos com a estratégia de comunicação da Presidência, a cargo do general. Em junho, Santos Cruz foi demitido.
Leandro Colon: A última tacada de Moro
Asfixiado por Bolsonaro, Moro aposta em plano de segurança para sobreviver
Jair Bolsonaro disse à Folha que Sergio Moro é um “ingênuo” na política, mas nem o ministro da Justiça deve ter acreditado nas boas intenções do chefe com o tapinha nas costas e a mão no ombro que recebeu no passeio pela Esplanada no desfile da Independência.
Não precisa de muita malícia para entender o jogo de Bolsonaro. Se dependesse dele, o ex-juiz da Lava Jato já estaria bem longe do seu governo.
O que era para ser um símbolo virou um estorvo para o presidente. Moro foi convidado para assumir a Justiça nas horas seguintes à eleição do ano passado como um gesto de Bolsonaro para tentar ganhar a plateia assustada com o que viria por aí.
Até deu certo. Para grande parte da população, Moro chegou a Brasília como símbolo número 1 da maior investigação de combate à corrupção. O super-herói de toga que botou os políticos ladrões na cadeia.
Não levou tempo para Moro, um “ingênuo” nas palavras do presidente, perceber que Brasília não é Curitiba. Não é o ministro poderoso e autônomo que imaginou que seria.
O Congresso não o bajula, a imprensa séria, idem. Fracassou no movimento para fazer do Coaf um braço de seu ministério e, ao que tudo indica, terá de engolir a saída de um homem de sua confiança da diretoria-geral da Polícia Federal (sem liberdade para escolher o substituto).
Por que Bolsonaro não se livra de Moro? Por mais que isso incomode o presidente, seu ministro da Justiça é hoje muito mais popular do que ele —como mostrou o Datafolha, 54% dos brasileiros aprovam sua gestão na pasta, uma força nas ruas amparada ainda na fama da Lava Jato.
A popularidade do ex-juiz, potencial nome para 2022, causa ciumeira em Bolsonaro, mas é o escudo do ministro para não ser jogado fora.
Asfixiado politicamente pelo presidente, Moro busca refúgio em um ambicioso plano de segurança pública, em parceria com estados e municípios. Há quem diga em Brasília que será a última tacada dele no governo. Se não der certo, Moro pedirá o boné. E Bolsonaro vai agradecer.
Demétrio Magnoli: O Povo contra o Parlamento
Solução da corrente radical do brexit é esvaziar a democracia de sua substância
O referendo do brexit, em 2016, meses antes do triunfo de Donald Trump, marcou o início da ofensiva da direita nacionalista no Ocidente. Hoje, no mesmo Reino Unido, o ciclo atinge um clímax.
O populismo devastou o sistema político-partidário britânico e lançou o berço da democracia parlamentar numa crise constitucional. A solução oferecida pela corrente radical do brexit é esvaziar a democracia de sua substância. O Povo contra o Parlamento —eis o estandarte do governo nacionalista de Boris Johnson.
No Reino Unido, a soberania popular reside, exclusivamente, no Parlamento. O referendo sobre a União Europeia (UE), um crasso erro de cálculo do primeiro-ministro David Cameron, inoculou o veneno plebiscitário na circulação sanguínea do parlamentarismo.
Cameron imaginava que obteria maioria pela permanência, pacificando um Partido Conservador cindido entre europeístas e eurocéticos. A derrota inesperada destruiu sua carreira, partiu o país ao meio e minou o poder do Parlamento.
O referendo foi um gesto de transferência pontual de soberania do Parlamento para os eleitores. Mas seu resultado colocou nas mãos das correntes eurocéticas um aríete que passou a ser utilizado em ofensivas populistas cada vez mais ousadas.
O acordo negociado entre a conservadora Theresa May e a UE foi derrubado com o auxílio dos eurocéticos do próprio Partido Conservador, que querem uma ruptura completa. No fim, a corrente radical substituiu May por Boris Johnson na chefia do governo.
Johnson, um oportunista incorrigível, oscilou muitas vezes entre o europeísmo e o antieuropeísmo. Mas, desde 2016, calculou que a adesão extremada à corrente eurocética o catapultaria ao cargo de primeiro-ministro.
Agora, diante da resistência parlamentar a uma saída da UE sem acordo, ele tenta reunir a direita nacionalista em torno de sua liderança. Nesse processo, converte o Partido Conservador numa seita de fanáticos do brexit e aposta todas as fichas no confronto com o Parlamento.
O povo não votou, três anos atrás, numa ruptura sem acordo —e as pesquisas de opinião indicam que a maioria dos eleitores não admite tal hipótese. Mas os eurocéticos invocam a “soberania popular” para forçar esse desenlace.
O impasse serve à estratégia dos populistas: na falta de um acordo negociado entre o governo britânico e a UE, o Reino Unido estará automaticamente excluído do bloco europeu no encerramento do prazo legal, em 31 de outubro.
Quando o acordo entre May e a UE foi derrubado pelo Parlamento britânico, a solução disponível era convocar um segundo referendo, para os eleitores decidirem sobre a saída sem acordo ou a desistência da ruptura com o bloco europeu. O caminho lógico dependia, porém, de uma forte iniciativa política do Partido Trabalhista, núcleo da oposição.
Sob a liderança de Jeremy Corbyn, um populista de esquerda e antigo eurocético, os trabalhistas preferiram a ambiguidade, jogando no desgaste dos conservadores. Assim, a esquerda antieuropeia montou o cenário para a ascensão da direita antieuropeia.
Johnson rejeitou a decisão da maioria parlamentar de proibir a saída sem acordo e, numa manobra que testa os limites da democracia britânica, suspendeu as atividades do Parlamento.
Sua solução para a crise constitucional é uma eleição geral em 15 de outubro, duas semanas antes do prazo fatal. Nesse caso, o primeiro-ministro lideraria a direita nacionalista numa campanha concebida como levante plebiscitário do Povo contra o Parlamento —ou seja, na linguagem do populismo de direita, como uma revolta da “nação de sangue” contra o “globalismo”.
O chefe do governo britânico prepara-se para o “assalto ao Céu”. Nisso, terá a torcida entusiasmada do cortejo de nacionalistas que se estende do americano Trump ao russo Putin, passando pelo húngaro Orbán e pelo brasileiro Jair Bolsonaro.
*Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.
Bruno Boghossian: Vexame internacional gratuito
Bolsonaro não perde uma oportunidade para enaltecer a tortura e os assassinatos políticos
Jair Bolsonaro não perde uma oportunidade de enaltecer a tortura e os assassinatos políticos. O presidente levou o país a mais um episódio gratuito de vergonha internacional ao defender o regime militar do Chile, que deixou 3.000 mortos e desaparecidos, e ao ofender a ex-líder Michelle Bachelet.
Para rebater um relatório que apontava ataques a defensores dos direitos humanos e um aumento das mortes provocadas pela polícia brasileira, Bolsonaro apelou para a crueldade pura. Atacou Bachelet, que produziu o texto pela ONU, e celebrou a morte do pai da ex-presidente na ditadura de Augusto Pinochet.
“Se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 1973, entre eles o teu pai, hoje o Chile seria uma Cuba”, disse. Alberto Bachelet se opôs ao golpe militar. Foi preso, torturado e morto em 1974.
Nem a direita chilena tolerou a barbaridade. O presidente Sebastián Piñera disse não concordar com as declarações sobre Bachelet, “especialmente num tema tão doloroso”.
O brasileiro já havia sido criticado por Piñera uma vez. Em março, o chileno disse que frases de Bolsonaro em defesa de ditaduras eram “tremendamente infelizes”.
Bolsonaro não aprendeu que o Chile é rigoroso com a selvageria dos regimes autoritários. No ano passado, o Exército do país destituiu um coronel que liberou uma homenagem a um brigadeiro punido por crimes praticados no período de Pinochet.
Por aqui, o elogio a ditadores se tornou política de governo. Há dois dias, Bolsonaro disse que o regime militar pode ter sido “difícil em alguma coisa”, mas foi “nota dez” na economia e no “amor ao próximo”.
Bachelet também produziu levantamentos sobre a violação de direitos humanos na Venezuela. Nicolás Maduro reagiu com críticas pesadas —mas sem ofensas à família.
Depois de hostilizar Alemanha, França, Noruega e um possível presidente argentino, Bolsonaro mancha um pouco mais a imagem do Brasil. O país pode ficar isolado, pendurado no paletó de Donald Trump.
Vinicius Torres Freire: Mudança nos impostos terá CPMF, menos IR e chifre em cabeça de cavalo
Plano do governo é controverso e não conversa com projetos que andam no Congresso
Quem procurar saber o que é a reforma tributária vai encontrar chifre na cabeça de um cavalo que na verdade é um centauro com rabo de sereia.
Duas propostas tramitam no Congresso, mais ou menos da mesma espécie. No laboratório do governo, rascunha-se um plano que faz parte de outro reino da natureza tributária. Não há como casá-las sem produzir uma aberração, se é que a tentativa não vai produzir um divórcio político paralisante.
Mais do que uma reforma tributária, o governo pretende que a mudança nos impostos seja parte dos seus planos de revolução social. No fim das contas, essa reforma da natureza embutiria uma reforma trabalhista terminal e uma reforma da Previdência radical.
Os economistas de Jair Bolsonaro de fato querem criar uma CPMF, que daria dinheiro bastante, acreditam, para dar cabo da contribuição patronal para a Previdência, para o INSS. A intenção transparece em palavras e números.
Depois de um tempo de transição, a alíquota da Nova CPMF chegaria a 1% (o governo chama o imposto de CST: Contribuição Social sobre Transações). Nos tempos em que se cobrava 0,38% (2002 a 2007, por exemplo), a receita equivalia regularmente a 1,35% do PIB, por ano. Fazendo uma conta no guardanapo, a nova alíquota daria uma receita de uns 3,5% do PIB. É um pouco mais do que a contribuição total das empresas para o INSS, o imposto sobre a folha de salários.
Essa conta de guardanapo não presta, claro, embora sugestiva. Para começar, o que sobrou da economia brasileira mudou muito, depois de uma década. Além do mais, uma alíquota tão alta vai assustar a caça, a base tributária. Quem paga imposto vai inventar estratagemas para fugir da paulada, que deve de resto incentivar reestruturações ineficazes de negócios (como verticalização), o que pode prejudicar ainda mais a receita, entre outras distorções.
Paulada? Sim. Atualmente, a taxa de juro real básica anda pela casa de 1,8% ao ano, por exemplo. A alíquota de 0,38% em tempos de juros de mais de 10% já causava distorções e malabarismos.
No começo, a alíquota seria menor, perto de 0,4%. Compensaria parte da receita perdida pelas empresas que deixariam de contribuir, se contratarem empregados com a “carteira verde e amarela” (emprego lipoaspirado de direitos trabalhistas), parte de um projeto de criar um sistema de capitalização para a Previdência.
O dinheiro talvez sirva também para cobrir as perdas com a arrecadação do Imposto de Renda da pessoa física, projeto querido de Jair Bolsonaro. Para ricos ou para pobres, a alíquota máxima seria de 25% (hoje 27,5%), e a renda tributável seria menor.
Gente do governo diz que a perda de receita seria compensada com a redução das deduções com despesas de saúde e, talvez, educação, de fato socialmente injustas (pobre não paga escola privada e plano de saúde). Mas não vimos as contas, de resto sempre aproximadas e incertas, ainda mais em tributação.
Mais interessante, diz o governo que vai cobrar imposto sobre o lucro de acionistas de empresas. Já sabido, quer unificar três impostos federais (Cofins, IPI e IOF). Ok, mas deixa de fora o ICMS (estadual) e o ISS (municipal), que seriam unificados no projeto que tramita na Câmara.
Como essas propostas vão conversar, técnica e politicamente (fora as emendas e lobbies que virão)? Que bicho vai dar em uma reforma que mantém a demência do ICMS, mumunhas do ISS e uma CPMF (CST) com a extravagante alíquota de 1%?
Elio Gaspari: Weintraub e a 'suspenção' das bolsas
Brasil tem que conviver com ministro que assina documento sem ler e suspende auxílio à pesquisa
Num governo que fez a opção preferencial pelo folclore radical, Abraham Weintraub é um personagem inesquecível. É legítimo herdeiro do general Aurélio de Lyra Tavares, que há exatos 50 anos governava o Brasil na junta militar que empalmou o poder diante da incapacidade do presidente Costa e Silva. O doutor Weintraub pediu dinheiro ao ministro Paulo Guedes referindo-se à “suspenção” de pagamentos. Dias depois, explicou-se dizendo que assinou a carta de oito páginas sem lê-la.
Em março de 1964, o general Lyra Tavares escreveu ao seu chefe, Humberto Castello Branco, falando em “acessoramento”, numa carta em que meteu também um “encorage”. Como o general acabou seus dias num fardão da Academia Brasileira de Letras o ministro da Educassão tem pouco a temer (quando a ditadura vivia seu período de abrandamento, era comum que panfletos e documentos militares criticassem a “distenção”).
Com Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), Weintraub compõe o triunvirato folclórico do governo Bolsonaro. Uma cedilha a mais ou a menos não deve ser motivo para condenar uma pessoa. Grave mesmo é que, no dia em que se noticia a suspensão do pagamento de 5.613 bolsas de mestrado e doutorado, o ministro vá para vitrine escrevendo que “tem gente que acredita em Saci Pererê, em Boi Tatá e em Mula sem Cabeça; e tem gente que acredita no Datafolha”. Seu chefe manifestou o mesmo ceticismo em relação a uma pesquisa que mostrou a corrosão de sua popularidade, lembrando que tem gente que acredita em Papai Noel. Tudo bem porque qualquer fantasia é admissível para quem se vê mal numa pesquisa, inclusive a de acreditar no bom velhinho.
Ministro da Educação é outra história, sobretudo num país que precisa de pesquisadores. O Brasil que já conviveu com um ministro do Exército que escreveu “acessoramento” pode conviver com outro, na Educação, que assina sem ler um documento mencionando uma “supenção” de pagamentos. Mais difícil será conviver com um administrador que suspende todas (repetindo, todas) as novas bolsas de mestrado e doutorado do país.
Weintraub poderia abrir o debate do financiamento dessas bolsas, de sua qualidade e dos critérios que as orientam. Também poderia reconhecer a gravidade da suspenção, organizando-se para minorar seus efeitos. Nessa discussão haverá espaço para vida inteligente. É sempre bom lembrar que nos seus 21 anos de duração, a ditadura demitiu, prendeu e exilou cientistas, mas também montou uma sólida base de estímulo à pesquisa. Poucos professores foram tão patrulhados pela esquerda em 1964 quanto o reitor Zeferino Vaz, da Universidade de Brasília. A partir de 1966 ele comandou a organização da Unicamp, que está hoje entre as melhores do país. O campus da universidade leva seu nome. Deve-se a Sérgio Buarque de Holanda a distinção, na política brasileira, entre conservadorismo e atraso. Talvez Zeferino fosse conservador, mas atrasado não era. Weintraub é atrasado, só.
Ele acha que existe um boi chamado Tatá. O Boitatá é uma enorme serpente de fogo que protege as matas. Ricardo Salles e Bolsonaro, por exemplo, sentiram o bafo do Boitatá.
Bruno Boghossian: Bolsonaro ocupa terreno e puxa o jogo político para a direita
Presidente perde popularidade, mas mantém base fiel em grupos cobiçados por rivais
Além do aumento do índice de reprovação de Jair Bolsonaro, a pesquisa Datafolha mostrou que a versão radical de sua plataforma tem sustentação numa fatia considerável do eleitorado. O presidente parece ocupar terreno firme o suficiente para puxar parte do jogo político para a direita nos próximos anos.
Mesmo sob retórica agressiva, sem concessões à moderação, Bolsonaro construiu apoio relativamente estável em grupos-chave. Um terço dos brasileiros de renda média e quase 40% daqueles com renda mais alta dizem que o governo é ótimo ou bom.
No Sul e no Sudeste, embora índices negativos tenham subido, a avaliação positiva ficou praticamente estável desde abril, acima dos 30%.
Os números não são vistosos, mas indicam que Bolsonaro conta com a fidelidade de parte desses segmentos até quando chega ao ponto de defender torturadores e de desdenhar da preservação do meio ambiente.
O presidente decidiu montar guarda nesse extremo da régua ideológica. Acreditando ter dominado o território, ele tenta expurgar potenciais adversários para o campo oposto.
Bolsonaro trabalha para jogar para a esquerda rivais que podem disputar espaço naqueles nichos, como João Doria. A declaração de que o tucano "mamou" em governos do PT ao comprar um jato é um empurrão inicial. O movimento segue a doutrina bolsonarista que infla uma polarização exagerada com a esquerda para espremer posições de centro.
Nas últimas décadas, quem ocupava parte das faixas de renda e das áreas do país capturadas por Bolsonaro era o PSDB, em disputa com os petistas. Candidatos desse campo político não terão abertura para reconquistar espaço pela esquerda, então tendem a reagir pela direita.
Doria testou as águas ao anunciar, nesta terça (3), o banimento de um material que ensinava alunos de 14 anos a usar preservativos. De quebra, atacou a "ideologia de gênero", que nada significa e nada tem a ver com saúde pública, mas é um emblema da extrema direita. O concurso de obscurantismo começou.
Mauro Paulino e Alessandro Janoni: Núcleo duro de Bolsonaro corresponde a 12%
Presidente é repudiado por 30%, que não votaram nele, reprovam atual governo e não confiam em suas declarações
Com o objetivo de melhor compreender o grau de afinidade e rejeição dos brasileiros ao presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o impacto das características de seu discurso junto a diferentes estratos sociais, o Datafolha elaborou uma análise de segmentação da última pesquisa nacional.
Por meio da combinação de três variáveis, chega-se a seis grupos distintos numa escala de intensidade que varia do grupo de apoiadores mais fiéis ao de detratores mais críticos do pesselista.
Foram utilizadas na análise o voto declarado no segundo turno da eleição do ano passado, a avaliação que o eleitor faz da atual administração e o grau de confiança nas palavras do presidente.
O núcleo duro de entusiastas de Bolsonaro, isto é, que votou nele no último pleito, classifica sua gestão como ótima ou boa e diz confiar muito nas suas declarações, corresponde a 12% da população brasileira. São bolsonaristas "heavy" (nomenclatura utilizada em pesquisas de opinião para enfatizar a intensidade de um fenômeno).
É o único segmento onde a maioria diz que Bolsonaro se comporta como presidente da República em todas as situações e que seus filhos mais ajudam do que atrapalham o governo.
É o grupo que mais vê melhorias na economia e se mostra otimista quanto ao futuro. Aprovam bem acima da média o desempenho do governo em todas as 18 áreas contempladas pelo estudo, especialmente o setor de comunicações, a política para o meio ambiente, a economia e o combate à corrupção, que na visão do estrato é um dos principais problemas do país.
Como prova da fidelidade a Bolsonaro, a maioria dos que compõem esse subconjunto, ao contrário de todos os outros, concorda majoritariamente com as frases de conteúdo pejorativo proferidas pelo presidente nos últimos meses. A única que não consegue aderência tão expressiva é a que sugere o “cocô dia sim, dia não”para combater a poluição ambiental.
Também relativizam mais a questão do desmatamento da Amazônia e constituem o único estrato onde a maioria não vê prejuízos de investimento em função da crise internacional gerada pelas queimadas. Dão apoio massivo a Bolsonaro no embate contra o presidente da França, Emmanuel Macron.
São na maioria homens, com participação masculina superior em seis pontos percentuais à média de eleitores bolsonaristas. São mais velhos do que o total da população —metade tem mais de 35 anos e quase um terço possui 60 anos ou mais.
Têm participação de brancos e aposentados muito acima da média e metade tem renda superior a três salários mínimos. Quanto à escolaridade, aproximadamente um terço possui nível superior.
No extremo oposto, são classificados como críticos "heavy" do atual presidente 30% dos brasileiros. São entrevistados que não votaram nele, reprovam sua gestão e nunca confiam no seu discurso.
Avaliam negativamente todas as áreas do governo Bolsonaro. A reprovação chega a 92% no combate ao desemprego, a 87% nas políticas contra a miséria, a 83% na área da saúde, 79% no meio ambiente e 77% na educação.
Percentuais parecidos são verificados no grupo ao rejeitarem as frases polêmicas do presidente, na percepção negativa sobre a crise internacional gerada pelas queimadas da Amazônia e ao apontarem os prejuízos que a participação dos filhos de Bolsonaro provoca no governo.
A maioria do estrato acha que tanto a inflação quanto o desemprego e a corrupção vão aumentar no país nos próximos meses.
Quanto ao perfil, o conjunto é composto majoritariamente por mulheres (59% contra 52% na população), além de moradores do Nordeste e negros acima da média da população. A grande maioria tem renda de até três salários mínimos.
Entre os dois extremos, completam o espectro segmentos de graus médio e “light” tanto entre bolsonaristas quanto entre detratores.
Os entusiastas médios correspondem a 22% dos brasileiros. Votaram em Bolsonaro, mas não alcançam grau máximo nas duas outras escalas —não o aprovam ou, se o fazem, não confiam plenamente nas palavras do presidente.
São evangélicos acima da média e, mais do que a população, se mostram otimistas quanto à economia e tendem a avaliar como regular o desempenho do governo nas diferentes áreas.
A maioria condena, no entanto, as frases polêmicas do pesselista e 1 em cada 4 mudaria o voto caso o segundo turno de 2018 fosse hoje.
O segmento bolsonarista “light” totaliza 4% da população. A maior parte tem baixa escolaridade e renda de até dois salários mínimos. Votaram no candidato do PSL, mas o reprovam e nunca confiam no que ele diz.
Na avaliação por área e sobre as frases polêmicas, as opiniões desse subconjunto são mais próximas do segmento de detratores do que de entusiastas —são até mais enfáticos nas críticas às políticas de combate à miséria e ao desemprego, por exemplo. Caso a eleição fosse agora, apenas 22% manteriam a opção por Bolsonaro.
No segmento dos que não votaram no presidente, o grau "light" é determinado pela avaliação no mínimo regular da atual gestão. É um segmento mais jovem que aprova o desempenho em algumas áreas do governo, especialmente esporte e combate à corrupção.
A maioria discorda das frases polêmicas de Bolsonaro e acha que sua agressividade pode atrapalhar investimentos estrangeiros no país. Correspondem a 18% do eleitorado, entre os quais a maioria manteria a rejeição ao candidato caso as eleições fossem agora.
O segmento dos críticos médios, que são 14% dos brasileiros, não votaram em Bolsonaro, mas demonstram algum grau de confiança no presidente.
De todos os estratos é o conjunto menos escolarizado e de menor renda. Reprovam acima da média o desempenho do governo, especialmente no combate ao desemprego. Repudiam de maneira enfática as polêmicas provocadas pelo presidente.
Como se vê, a estratégia de comunicação bolsonarista tende a encontrar aderência em pouco mais de 10% dos brasileiros, que demonstram alto grau de fidelidade ao presidente que escolheram.
Configura, no entanto, causa perdida junto a cerca de 30% dos eleitores e leva risco de ruído ao restante dos segmentos pendulares, onde políticas públicas adequadas se mostram mais urgentes do que qualquer tipo de discurso.
*Mauro Paulino
Diretor-geral do Datafolha
*Alessandro Janoni
Diretor de Pesquisas do Datafolha