Folha de S. Paulo

Demétrio Magnoli: Haddad, o educador

O que é um Bolsonaro desarmado perto de um Ortega armado?

Calculadamente, Fernando Haddad posiciona-se para assumir a condição de avatar de Lula na campanha presidencial. Na entrevista concedida à Folha (23/7), celebra o líder onipresente (“as pessoas sentem Lula”) e fala da economia como se nada de especialmente relevante tivesse acontecido no governo Dilma.

Mas, sobretudo, critica Alckmin por ter o aval do centrão (“o que tem de mais fisiológico no país, um atraso”), exibe o PT como farol da “modernidade” e afirma que os empresários “precisam ser educados para a democracia”. Arrogância é pouco. O potencial avatar envereda pelo caminho do autoritarismo, vestindo-o com uma fantasia iluminista.

O centrão, certamente fisiológico e atrasado, ofereceu sustentação aos dois mandatos de Lula e, até as vésperas do impeachment, ao governo Dilma.

Lula e seu candidato a prefeito paulistano, um certo Haddad, peregrinaram à Canossa de Maluf, trocando a humilhante foto do abraço pelo apoio eleitoral. Antes de “educar” os empresários, Haddad precisa educar-nos a todos na arte de apagar a história recente.

“Modernidade” versus “atraso”. A polaridade inspirou a primeira sociologia brasileira, até que se compreendessem os mecanismos pelos quais o atraso se moderniza e, por essa via, se reitera. A história do PT ilustra, melhor que tudo, o processo.

De um Lula a outro, no trajeto de São Bernardo ao Planalto, o Brasil aprendeu com quantos mensalões se faz uma maioria parlamentar e com quantos petrolões se assina um pacto com as empreiteiras. Haddad precisa reeducar-se a si mesmo fora do pensamento dualista.

O apoio de parcela do empresariado a Bolsonaro provoca a santa indignação de Haddad. Mas qual é a surpresa na informação de que não poucos empresários transitam de um amor louco pelo lulismo para uma arrebatadora paixão pelo bolsonarismo?

O mesmo empresário que escolhia vendar seus próprios olhos para capturar as rendas fáceis presenteadas pelo BNDES de Mantega está disposto a conservar sua cegueira política voluntária para coletar as 30 moedas que a farra ultraliberal de Paulo Guedes promete distribuir.

Não sei qual seria o método pedagógico de Haddad para “educar” os empresários, mas nenhum é mais eficaz do que o utilizado pelo governo Lula, “o mais responsável de todos os governos da história”, com figuras como Marcelo Odebrecht e Eike Batista.

De fato, o “Estado mínimo” de Bolsonaro e seu guru econômico não combinam com a democracia. Os eleitores bolsonaristas, empresários ou outros, talvez não compreendam isso —ou, talvez, simplesmente não gostem da democracia.

Mas a ambição de um partido de “educar” a sociedade expõe sua alma autoritária. Mussolini queria educar os italianos. Fidel Castro almejava educar os cubanos. Pol Pot resolveu educar os cambojanos. Já os partidos democráticos nutrem esperanças mais modestas: como admitem que não são portadores da verdade histórica, e que podem estar errados, desejam apenas persuadir os eleitores.

“Devem ser educados para a democracia.” Haddad usa a palavra “democracia” para expressar sua repulsa a Bolsonaro. Nisso, tem razão. Mas o que é um Bolsonaro desarmado diante de um Ortega armado?

Nosso “clown” da extrema direita mata imaginariamente seus adversários, sonhando restaurar a ditadura que perdeu os dentes quando ele não passava de um mero cadete. Já Ortega, a quem o PT oferece o mesmo apoio incondicional que presta a Maduro, mata realmente, dia sim e dia também, sustentando seu poder à base de selvagem repressão.

A jornalista Catia Seabra esqueceu-se de confrontar Haddad com perguntas sobre a Nicarágua ou a Venezuela. Deixou-me curioso. Por que o partido que representa a “modernidade” e fala em nome da “democracia” defende fanaticamente os governos Ortega e Maduro? Por que Haddad não se ocupa, antes de tudo, em educar o próprio PT? Quem educa o educador?

* Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.


Mariliz Pereira Jorge: #voltaquerida

Desculpe. Sim, a Constituição não permite um terceiro mandato, como sugeri na coluna de hoje. Ainda que uma fonte tenha garantido que o PT poderia brigar pela candidatura à presidência de um político que perdeu e não terminou o mandato, é responsabilidade minha, como profissional, ouvir outros especialistas.

Muitas lições para aprender com esse erro. Por exemplo, que a Constituição está lá para ser respeitada e não interpretada da forma que beneficie esse ou aquele interesse. Infelizmente não será dessa vez. Ainda que o PT quisesse muito, Dilma Rousseff não poderá se candidatar à Presidência em 2018.

Mas quatro anos passam rápido e 2022 está aí. Com sorte, todo o arsenal jurídico do PT terá funcionado e Lula será eleito, apesar de uma lei (chamada Ficha Limpa) tentar impedi-lo, e isso abrirá caminho para um #voltaquerida2022. Porque, afinal, leis estão aí para serem contestadas, mas a Constituição, que impede que Dilma tente voltar ao Planalto em 2018, precisa ser defendida, ainda que essa mesma Constituição tenha sido rasgada na hora de manter uma presidente impichada elegível.

Leia a coluna original abaixo.

 

Por que o PT não lança Dilma Rousseff à Presidência?

Perguntar não ofende. Por que não Dilma? Por que o PT não a lança à Presidência? O partido teria a chance de provar que, como a militância defende, era uma “presidenta” escolhida pelo povo, honesta, competente, guerreira, vítima de um golpe de Estado. Meio golpe.

O Senado rasgou a Constituição ao fatiar o impeachment, com a chancela do ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal). Dilma deveria ter perdido o direito de exercer cargos públicos por oito anos. Mas está aí, faceira, denunciando a pernada que levou do seu vice, a prisão política de Lula —em países tão democráticos quanto Cuba—, prestes a concorrer ao Senado.

Ainda que digam que não há plano B, que o candidato é Lula, fala-se em Fernando Haddad e Jaques Wagner, se o ex-presidente tiver as negativas do TSE e do STF. Ora, Haddad perdeu no primeiro turno uma eleição municipal, Jaques Wagner não parece disposto a abrir mão do favoritismo ao Senado pela Bahia.

Por que o PT não avalia o nome de Dilma, a “presidenta” tão amada, proba, que teve 52% dos votos? Por que a #voltaquerida passou a ser ignorada pela militância, que grita em uníssono apenas #lulalivre? Seria um retorno triunfal.

Talvez porque o PT tenha pavor de Dilma. Talvez porque, para o partido, ela seja o que Haddad disse sobre Alckmin: o atraso na disputa do Planalto. O petista ainda se referiu ao tucano como a continuidade do governo Temer. Como se o PT não tivesse nada a ver com o atual presidente.

Como se Dilma não tivesse seguido o programa do PSDB depois de ter levado uma eleição apertadíssima contra o finado (politicamente) Aécio. Como se Lula não tivesse mantido o plano econômico de FHC, que a militância tanto detesta.

É preciso estar muito distraído para não perceber quando a velha política desdenha da velha política. E quando os partidos e correligionários desdenham de seus próprios representantes.

*Mariliz Pereira Jorge é jornalista e roteirista de TV.

 

Erramos: o texto foi alterado
26.jul.2018 às 15h53
Diferentemente do informado na coluna “#voltaquerida”, de Mariliz Pereira Jorge, Dilma Rousseff não pode concorrer à Presidência em 2018. Sua candidatura é impedida pela Constituição, que veda um terceiro mandato consecutivo no mesmo cargo do Executivo.


Marcos Troyjo: Por que os Brics não formam uma área de livre-comércio?

Dado o protecionismo, é de supor que aliança pudesse oferecer iniciativa à altura dos desafios

Numa hipótese derivada de famosa frase de John Foster Dulles, secretário de Estado dos EUA nos primórdios da Guerra Fria, estipula-se que países não têm amigos, apenas interesses.

Quando os chefes de Estado dos Brics reunirem-se nesta décima cúpula que começa nesta quarta-feira (25) na África do Sul, a primazia dos interesses se fará sentir.

Dada a presente conjuntura de escalada protecionista e iminente guerra comercial, é de supor que a aliança entre as grandes economias emergentes pudesse oferecer uma iniciativa à altura dos presentes desafios.

Na medida em que os EUA se direcionam a uma via isolacionista, questionam tradicionais aliados econômicos ou geopolíticos como União Europeia (UE) e Otan (Organizado do Tratado do Atlântico Norte) e pouco se prestam à defesa da globalização liberal, caberia aos Brics precipitar um movimento em contrário.

Sua resposta mais contundente seria, sem dúvida, anunciar o lançamento de um acordo de livre-comércio que viesse a combater a atual tendência protecionista.

Do ponto de vista retórico, não há dúvida, os Brics, por meio de pronunciamentos individuais ou em declaração conjunta, buscarão mostrar seu apoio a um sistema multilateral de comércio baseado em regras. Membros como China, Brasil e Índia já o fizeram em diferentes ocasiões.

Nas últimas edições do Fórum Econômico Mundial de Davos, o presidente chinês, Xi Jinping, converteu-se no principal arauto da globalização econômica.

Seu colega brasileiro, Michel Temer, disse nesta terça-feira (24) durante encontro entre líderes do Mercosul e da Aliança do Pacífico que a aproximação desses dois blocos é uma “resposta a recaídas isolacionistas”.

E o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, aponta que seu país não pode ser prejudicado como vítima colateral de um conflito de comércio e investimento entre as duas maiores economias do mundo.

A realidade é que nesta conflagração geoeconômica não pode haver maniqueísmos. A constatação de que os EUA de Trump se equivocam gravemente em diagnóstico e posologia quanto aos males comerciais do mundo não permite a países como os dos Brics arvorar-se qualquer bom-mocismo.

Caso quisessem remeter sua boa-fé comercial à prova, os Brics já poderiam ter levantando nalgum momento desses últimos dez anos —período em que deixaram de simbolizar uma classe de ativos financeiros e passaram a se enxergar como aliança estratégica— um projeto de acordo de livre-comércio.

A bem de verdade, no segundo semestre de 2015 os chineses muito informalmente circularam uma tal ideia, com o que foram pesadamente rechaçados por seus associados nos Brics.

Países de considerável atividade industrial na agremiação —como Brasil, Rússia e Índia— estimam corretamente que um tal tratado comercial favorecia primordialmente a hipercompetitividade chinesa.

Dessa ótica, Brasil e Rússia seriam ainda mais relegados à função de economias exportadoras de commodities agrícolas e minerais. A Índia se resumiria a serviços de outsourcing, call center e a alguma atividade no campo do software e das demais tecnologias da informação.

Ademais, os chineses —e apesar de toda sua retórica atual em defesa da globalização econômica—, continuam a exercer proteção de mercado em diferentes formatos. São enormes as restrições para empresas estrangeiras como Google ou Facebook competirem no setor de tecnologia. Em muitos casos, o investimento estrangeiro direto para poder frutificar na China tem de acomodar um sócio local.

E, claro, são inúmeros —e muitas vezes em contrário a disposições de entidades multilaterais como OMC (Organização Mundial do Comércio) ou OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual)— os exemplos em que o governo chinês suplanta artificialmente suas empresas estatais ou estas desrespeitam direitos internacionais de patentes.

A Índia configura-se como uma dos mercados agrícolas mais protegidos do mundo. A Rússia é um gigante da imposição de medidas não tarifárias e barreiras fitossanitárias. O Brasil é comercialmente um dos países mais fechados. Ostenta o mais baixo percentual de comércio exterior (soma de exportações e importações) na composição de seu PIB dentre as quinze maiores economias do planeta.

Nesta Cúpula da África do Sul, os Brics entoarão recados diretos ou indiretos aos EUA com críticas ao crescente protecionismo. Será um típico caso do roto falando do rasgado.

Ao indisporem-se —mesmo entre si— ao estabelecimento de modalidades de livre comércio, os Brics demonstram as limitações do espaço de manobras do grupo.

Seus interesses específicos ainda falam mais alto do que a suposta camaradagem na construção de uma nova ordem econômica internacional.

Marcos Troyjo é diplomata, economista e cientista social, é diretor do BRICLab da Universidade Columbia


Alexandre Schwartsman: Talvez 3 gerações bastem para vir algo inteligente no projeto econômico petista

“Não aprenderam nada e não esqueceram nada” foi a primeira coisa que me passou pela cabeça ao ler a entrevista de Fernando Haddad ao Pravda, perdão, Valor Econômico no início da semana.

Não vou me aprofundar nas barbaridades proferidas acerca da “radicalidade liberal”, nada mais que o velho “controle social da mídia” (sob novo nome) nas pegadas do sinistro Franklin Martins, nem acerca da curiosa afirmação sobre a inconstitucionalidade da prisão em segunda instância com base em decisão que Fernando imagina que o STF (Supremo Tribunal Federal) tomará em algum momento. Eu me atendo aqui aos aspectos econômicos da proposta.

A começar por atrocidade frequente, que, diga-se de passagem, não é monopólio do Fernando, mas que encontra mais eco do que deveria: o uso de fração das reservas para financiar “joint ventures, investimentos privados, PPPs em infraestrutura”.

Trata-se, na melhor das hipóteses, de ressuscitar o papel do BNDES nos anos dourados de Dilma, Mantega & Associados, qual seja, bancar, a leite de pato (e põe pato nisso!), projetos que iluminados do governo de plantão acreditem ser de interesse nacional, em nome de “aumentar a remuneração das nossas reservas”, notando que “interesse nacional” em tal contexto costuma significar “interesse bastante particular do meu grupo político, quase sempre inconfessável e ainda assim vendido ao distinto público como algo que supostamente deveria beneficiá-lo”.

Na pior das hipóteses, trata-se de vender reservas para obter reais e gastá-los, deixando em seu lugar apenas a dívida (e péssimos projetos!).

Já as propostas para reduzir o spread bancário parecem cuidadosamente pensadas de forma a evitar qualquer proximidade com os estudos sérios do problema mapeados por economistas do calibre de Marcio Nakane e João Manoel Pinho de Mello.

Nenhuma palavra sobre aumento de concorrência no setor, seja por meio da abertura do mercado, seja pela redução da assimetria de informações (no caso, cadastro positivo), ou menção à privatização de bancos públicos (para novos entrantes, bem entendido), ou ainda pelo estímulo às fintechs.

Há novidades, como a utilização de bancos públicos para forçar a redução do spread, algo jamais tentado nos últimos 24 meses, bem como a brilhante ideia de induzir bancos a reduzir o spread por meio de incentivos tributários, ou seja, o contribuinte bancaria os lucros das instituições financeiras que generosamente aceitassem cobrar menos de seus clientes em troca de impostos mais baixos.

Nada semelhante, como se vê, às renúncias tributárias oferecidas a vários setores no primeiro mandato de Dilma, em troca da preservação do emprego e do aumento do investimento, que fracassaram de modo retumbante, fiasco que desta vez não irá se repetir porque… Pois é, por quê?

Por fim o entendimento da questão previdenciária é parco, expresso na afirmação: “O problema está no regime próprio daqueles que não foram afetados pelas reformas de Lula e Dilma”. Sim, há um sério problema associado às aposentadorias e pensões do funcionalismo, o que não permite concluir pela inexistência de um problema ainda mais sério no INSS, devidamente ignorado na discussão.

Enfim, se alguém esperava algo de novo e inteligente no projeto econômico petista, minha sugestão é que espere um pouco mais (com sorte, duas ou três gerações devem bastar).

Não era (ainda bem!) o meu caso e, veja só, essa previsão eu acertei na mosca…

*Alexandre Schwartsman é consultor, ex-diretor do Banco Central (2003-2006). É doutor pela Universidade da Califórnia em Berkeley.


Folha de S. Paulo: Presidenciáveis preveem gastar 45% do declarado por Dilma há quatro anos

Sem doação empresarial, 8 principais candidatos estimam, juntos, R$ 200 mi para campanhas

Por Gustavo Uribe e Marina Dias, da Folha de S. Paulo

Com a proibição de receberem doações de empresas nas eleições deste ano, os candidatos à sucessão de Michel Temer estimam despesas mais modestas na disputa.

A previsão inicial das principais campanhas é de gastarem, juntas, cerca de R$ 200 milhões. O valor, que costuma ser ajustado ao longo do processo eleitoral, é 45% do que foi desembolsado somente para reeleger Dilma Rousseff (PT) em 2014, em valores atualizados pela inflação.

A petista diz ter gasto R$ 351 milhões há quatro anos (R$ 438 milhões em valores de hoje). Na eleição passada, os três primeiros colocados —Dilma, Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB)— gastaram juntos em torno de R$ 800 milhões, em valores corrigidos pela inflação do período, segundo dados informados pelas candidaturas à Justiça Eleitoral.

Sem recursos de empresas, as formas de custeio permitidas neste ano são por repasses do fundo eleitoral, doações de pessoas físicas e autofinanciamento.

A redução da estimativa também se deve à aprovação pelo Congresso de um teto de gastos por candidatura. Para o posto de presidente, por exemplo, foi determinado um valor máximo de R$ 70 milhões para o primeiro turno. No segundo turno, o limite passa para R$ 35 milhões.

No ano passado, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, afirmou que, com o valor de R$ 70 milhões, o candidato "não compra nem picolé" para ter criança em seu comício.

Para este ano, a previsão do PT é gastar, no mínimo, R$ 50 milhões com a campanha presidencial. O valor é a fatia do fundo eleitoral à qual a sigla vai ter acesso. Segundo dirigentes, porém, a cifra pode aumentar com a arrecadação e compartilhamento de recursos de campanhas estaduais, possibilitando que o valor chegue ao teto permitido pela Justiça Eleitoral.

Para tentar eleger Geraldo Alckmin, o PSDB estima um valor total de R$ 43 milhões. Em 2014, a campanha de Aécio desembolsou R$ 223,4 milhões (R$ 279 milhões em valores atualizados), de acordo com informações repassadas ao TSE.

Segundo o tesoureiro nacional do partido, Sílvio Torres, a previsão é gastar o valor nos dois turnos, mas a projeção pode ser alterada. "Se conseguirmos arrecadar recursos, podemos direcionar também para outras candidaturas, como para governadores que irão ao segundo turno", disse.

Com o acordo de abrir mão do fundo eleitoral, Henrique Meirelles, do MDB, está disposto a gastar pelo menos R$ 35 milhões do próprio bolso para financiar sua campanha. Segundo aliados, os gastos com a pré-campanha até agora chegam a cerca de R$ 250 mil por mês.

A campanha de Ciro Gomes, do PDT, estima uma quantia de R$ 40 milhões para tentar elegê-lo. "O PDT deverá destinar um terço do fundo, que se somará a recursos de doações de pessoas físicas", informou o coordenador da campanha, Cid Gomes, ex-governador do Ceará e irmão do candidato.

 

Já a candidatura de Marina, que na última eleição declarou ter desembolsado R$ 61 milhões (R$ 76 milhões em valores atualizados), estima uma despesa mínima neste ano de R$ 15 milhões, podendo chegar ao teto de gastos no final do processo eleitoral.

Contra a utilização do fundo eleitoral, João Amoêdo, do Partido Novo, estima uma campanha presidencial de R$ 8 milhões, montante que, segundo a legenda, não será arrecadado com recursos públicos.

Para a primeira campanha presidencial da vida de Guilherme Boulos, o presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, reservou R$ 6,2 milhões do fundo eleitoral. "Além desse valor, teremos ainda recursos oriundos da campanha de arrecadação por meio da internet", disse.

Procurada pela Folha, a assessoria de imprensa de Jair Bolsonaro, do PSL, não respondeu à reportagem. Durante a pré-campanha, ele informou que pretende gastar cerca de R$ 1 milhão.

O PC do B ainda não tem uma estimativa para a campanha de Manuela D'Ávila. "O partido ainda não definiu a divisão do fundo, mas a campanha será modesta", explicou a coordenadora da candidatura, Nádia Campeão, segundo a qual, na pré-campanha, foi gasto cerca de R$ 1 milhão.


Elio Gaspari: Geraldo Alckmin, o besouro voador

Ele parece ter saído de uma galeria da República Velha, mas poderá ir para o segundo turno, contra o PT

Besouro não deveria voar, mas voa. Geraldo Alckmin também. Aquele ex-deputado eleito vice-governador em 1994 na chapa de Mário Covas era um tucano inexpressivo. Ademais, Covas era um touro. Tão decorativo era o cargo de vice-governador que Alckmin decidiu se licenciar e disputou a prefeitura de São Paulo. Perdeu, mas o touro teve um câncer, e ele assumiu. Tornou-se o cidadão que por mais tempo governou São Paulo desde os tempos coloniais, mas evita tocar nesse assunto. Disputou a Presidência da República em 2006 e conseguiu ter menos votos no segundo turno do que no primeiro.

Geraldo Alckmin é candidato de novo. Sua posição nas pesquisas é pífia. Já sua capacidade de agregação no mundo político-partidário marcha para a aliança com uma poderosa coligação de caciques em cuja ponta final está Michel Temer.

É possível que Alckmin vá ao segundo turno, beneficiado por previsíveis autocombustões de Ciro Gomes e Jair Bolsonaro. Uma disputa final entre ele e o candidato de Lula espanta a banca que passou os últimos meses achando que a campanha eleitoral aconteceria num cenário de debates parecido com o dos seminários de universidades americanas. O susto da banca não vem de eventuais defeitos de Alckmin, mas da possibilidade de vitória do candidato de Lula, o temível “Poste”.

Geraldo Alckmin dispõe de um razoável patrimônio administrativo. Basta contrapor as administrações tucanas de São Paulo desde 2001, quando ele se sentou na cadeira de governador, com as do Rio de Janeiro. Naquele tempo estava lá o governador Anthony Garotinho, sucedido por um ano pela petista Benedita da Silva, e em seguida por Rosinha Garotinho (mulher de Anthony), Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão. De um lado, cinco pragas, do outro, o picolé de chuchu tentando ser sorvete italiano.

Pelo estilo pessoal, Alckmin parece-se com um personagem da galeria de governadores da República Velha que adornam paredes do Palácio dos Bandeirantes. Pelo estilo político, também. Estacionado nas pesquisas, tornou-se uma potência televisiva costurando alianças por cima sem enunciar uma só ideia.

Num cenário de sonho ele teria ao seu lado as multidões que foram para a rua pedindo a deposição de Dilma Rousseff. Já no cenário do pesadelo ele encarna a maioria político-partidária que colocou Temer no Planalto. Trocou-se uma presidente impopular pelo campeão de impopularidade.

O andar de cima já flertou com a candidatura do apresentador Luciano Huck, e sua banda golpista sonhou com a alternativa apocalíptica de Jair Bolsonaro. Restaram-lhe Alckmin e o medo do “Poste”.

Lula na carceragem de Curitiba vem se transformando num Getúlio Vargas recluso em sua fazenda de São Borja. Consegue isso muito mais pela soberba e inépcia de seus adversários do que por suas qualidades. Noutra comparação, Lula encarna no Brasil o fantasma argentino de Juan Perón. Por mais de duas décadas, los hermanos cantaram: “Se siente, se siente, Perón está presente”.

Com o “centrão” aninhado na candidatura de Alckmin, resta-lhe a necessidade de fazer uma campanha capaz de ser ouvida no andar de baixo. Até agora, nada.


Josué Gomes da Silva: Nas eleições deste ano, não se pode errar

Aplaudo os partidos que decidiram apoiar Alckmin.

As eleições de 2018, que coincidem com o aniversário de 30 anos da Constituição de 1988, são das mais importantes desde a redemocratização. O voto será decisivo para definir o país que podemos e queremos ter. Não podemos errar, sob pena de condenarmos toda uma geração ao quadro de desemprego, fechamento de empresas, falta de moradias e precarização da saúde e do ensino.

Numa conjuntura marcada por agudos problemas, não há espaço para apostas e testes. Em todos os cargos eletivos —deputados estaduais e federais, senadores, governadores e presidente da República—, precisamos de pessoas competentes, patrióticas e éticas, que desejem o bem do Brasil, dediquem-se à defesa dos interesses de toda a população e saibam como fazer para retomarmos os rumos da prosperidade.

É crucial que Executivo, Legislativo e Judiciário, em todas as instâncias, trabalhem harmoniosamente, de modo que tenhamos estabilidade política e crescimento econômico sustentável.

Caberá ao presidente da República liderar não apenas o governo federal, mas todo o movimento de reorganização do Estado e reequilíbrio orçamentário da União e das unidades federativas, bem como a realização das sempre adiadas reformas previdenciária, política, tributária e na melhoria do ambiente de negócios, de maneira a assegurar ao setor privado condições para que ele possa gerar emprego e riquezas para os brasileiros.

As demandas que temos pela frente delineiam com clareza o perfil do presidente da República que precisamos. Pelo que já fez e demonstrou em termos de liderança, sobriedade, capacidade de dialogar e de gerenciar bem em plena crise, Geraldo Alckmin reúne todos os requisitos para cumprir a complexa missão que se coloca.

Ele agrega concreta, reconhecida e positiva experiência política e administrativa. Médico, teve elogiado desempenho em todos os cargos que ocupou em sua carreira, como vereador e prefeito em Pindamonhangaba (SP), deputado estadual e federal, vice-governador e chefe do Executivo do estado de São Paulo.

Sua capacidade está expressa na gestão do mais populoso estado do Brasil, no qual as contas estão equilibradas e os salários, em dia. A responsabilidade fiscal é marca forte de seu modelo administrativo, o que garante, mesmo em meio à crise nacional, um fôlego para os investimentos públicos.

Alckmin também realizou ajuste na Previdência, fundamental para o equilíbrio orçamentário. Tem demonstrado autoridade, bom senso e capacidade de interlocução com o universo político, os setores produtivos e a sociedade.

A população do estado reconhece tudo isso e o reelegeu governador em 2014, já no primeiro turno. Ele venceu em 644 dos 645 municípios paulistas.

Além de todos esses aspectos positivos do político, tive a oportunidade de conhecer, nos últimos dias, o homem Geraldo Alckmin, um cidadão de bem, ser humano apegado e dedicado à família.

Ele se emociona ao se referir aos seus pais, às passagens com seus filhos e à bonita história dos 39 anos de matrimônio com a esposa, senhora Lu Alckmin. Ainda que não tenha conhecido seu saudoso pai, pude constatar os elevados valores que foram por ele transmitidos ao filho.

O perfil de Geraldo Alckmin não deixa dúvidas. Aplaudo os partidos que tomaram a acertada decisão de apoiar sua candidatura. Definitivamente, não é hora de apostar em aventuras e "salvadores da pátria".

Nosso país precisa de propostas e ações concretas para retomar o rumo do desenvolvimento. Por isso, não podemos errar em outubro! As consequências seriam danosas para todos os brasileiros, principalmente para aqueles mais necessitados e desprotegidos.

* Josué Christiano Gomes da Silva (Josué Alencar) é presidente da Coteminas (filiado ao PR-MG), membro do conselho do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) e mestre em administração de negócios pela Vanderbilt University (EUA)


Folha de S. Paulo: Aposta de Alckmin é ir para 2º turno com o PT

Tucano acredita que o candidato apoiado por Lula desidratará Ciro, e que parte dos votos de Bolsonaro irá para ele

Marina Dias, da Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Três dias antes de o centrão chancelar o apoio a seu nome na disputa pelo Palácio do Planalto, Geraldo Alckmin (PSDB) fez o cálculo político mais importante de sua pré-campanha: como de costume, resolveu esperar.

Desistiu de um encontro que estava marcado para a segunda-feira (16) com Álvaro Dias (Podemos), que também concorre à sucessão de Michel Temer. Na conversa reservada, ofereceria ao ex-colega de partido a vaga de vice na sua chapa à Presidência.

Avaliou, porém, que o movimento –inicialmente programado para evitar um possível isolamento partidário– poderia romper de vez suas pontes com o chamado centrão.

Naquele momento, o grupo formado por DEM, PP, PRB, PR e Solidariedade ainda estava dividido entre avalizar Alckmin ou apoiar Ciro Gomes (PDT), em uma jogada que levaria o bloco a um campo pouco vivenciado por ele: a esquerda.

A habitual paciência do ex-governador de São Paulo, atrelada a conversas individuais que teve com dirigentes do grupo no início da semana, surtiram efeito. Na tarde de quinta-feira (19), o centrão decidiu fechar acordo com o tucano.

O acerto deu sobrevida à candidatura de Alckmin e força à sua principal tese: o candidato apoiado pelo ex-presidente Lula desidratará Ciro Gomes e a disputa deste ano será, mais uma vez, polarizada entre PT e PSDB.

Em sua segunda tentativa de chegar ao Planalto, Alckmin considera que precisa recuperar o espaço que perdeu para Jair Bolsonaro (PSL), principalmente no eleitorado jovem e rico, se quiser voltar à tradicional formatação das eleições presidenciais desde 1994 –e a aliança com o maior bloco de partidos entre os concorrentes pode ajudá-lo.

Com estrutura nos estados, prefeitos e parlamentares engajados na campanha, além dos cerca de 4 minutos e meio que terá na propaganda eleitoral na TV, Alckmin acredita que vai conseguir sair dos 7% que tem há meses nas pesquisas.

Na ponta dos levantamentos, pretende encontrar, no meio de setembro, o adversário petista lançado e apoiado por Lula, que, preso há três meses em Curitiba, lidera as pesquisas com 30%.

Os cotados como plano B do PT, Fernando Haddad e Jaques Wagner, têm apenas 1% quando Lula não aparece na disputa, mas o potencial de transferência de votos do ex-presidente é significativo.

Segundo o Datafolha, 30% das pessoas dizem votar em um candidato apoiado por ele, enquanto 17% afirmam que talvez votariam.

A aliados Alckmin admite que a estratégia do PT de levar a candidatura de Lula até o limite, a despeito do veto imposto pela Lei da Ficha Limpa, é "a melhor possível", porque preserva de ataques dos adversários o nome que será escalado para substituir o ex-presidente nas urnas.

Além disso, o tucano acredita que, quanto mais perto do primeiro turno, mais eficaz será o potencial de transferência de votos do petista.

A aposta de Alckmin é pragmática: em um eventual segundo turno contra o PT, ele receberia parte dos votos de Bolsonaro –que hoje lidera a corrida ao Planalto na ausência de Lula–, principalmente pelo discurso antipetista.

O tucano acredita que, em uma eleição tão fragmentada como esta, será muito difícil um nome alinhado à esquerda ficar fora do segundo turno.

Para duelar com esse personagem, no entanto, precisa de impulso para chegar ao primeiro pelotão das pesquisas.

A receita, dizem seus auxiliares, além do amplo tempo de TV, será atacar frontalmente Bolsonaro, apontando contradições e mostrando o que dizem ser "nítido despreparo" do capitão reformado.

Alckmin pediu que sua equipe fizesse uma espécie de inventário de fracassos da ditadura militar, exaltada por Bolsonaro como um período em que o país crescia com ordem social. O tucano quer um levantamento sobre o número de estatais daquela época, além dos índices de inflação, que dispararam na década de 1980, no fim da ditadura.

Com o material em mãos, pretende atacar sistematicamente o presidenciável do PSL e mostrar inconsistências em seu discurso, reforçando que ele não está preparado para governar o país.

Até agora, aliados e parte do mercado –antes simpática ao PSDB– estavam céticos quanto à viabilidade do ex-governador de São Paulo.

Além do centrão, o tucano deve ter o apoio de PSD, PTB, PPS e PV e, assim, somar os valiosos 4 minutos e meio na TV. O PT, por ora sozinho, tem perto de 1 minuto e 35 segundos.


Folha de S. Paulo: Isolado, Bolsonaro oficializa candidatura neste domingo

Seus quase 30 anos na Câmara foram pautados por discurso radical, com ataques a gays, mulheres e defesa da ditadura

Talita Fernandes e Ranier Bragon, da Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Responsável na atual disputa pelo maior crescimento proporcional nas pesquisas, o capitão reformado do Exército Jair Bolsonaro, 63, oficializa neste domingo (22) no Rio de Janeiro sua candidatura à Presidência da República pelo nanico PSL.

Em menos de três anos, ele passou de 5% das intenções de voto (dezembro de 2015), para os 17% atuais, nos cenários em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aparece entre os candidatos.

Deputado federal por sete mandatos, Bolsonaro sempre foi um outsider no Legislativo: de mais de 170 projetos de sua autoria, apenas dois viraram lei. Seus quase 30 anos na Câmara foram pautados pela adoção de um discurso agressivo e radical, incluindo ataques a gays e mulheres, defesa da ditadura militar, de um novo golpe de Estado, assassinato de criminosos, entre outros pontos.

Com esse perfil, reuniu em seu entorno eleitorado em grande parte de extrema direita que lhe dá, hoje, a liderança nas pesquisas nos cenários sem o ex-presidente Lula.

Apesar de largar na frente, Bolsonaro enfrentará o desafio de conseguir, sem partidos aliados e com um minúsculo tempo de propaganda eleitoral na TV, furar a polarização entre PSDB e PT que vem desde 1995.

O presidenciável trocou, em março deste ano, o PSC pelo PSL, legenda que hoje conta, além dele, com apenas outros sete deputados federais, entre eles o seu filho, Eduardo Bolsonaro (SP).

Antes, passou por outras legendas, como PP, PDC, PFL e PTB.

Uma marca da campanha de Bolsonaro é o improviso. A legenda não contratará um marqueteiro e não há até o momento jingle ou slogan definidos.

O presidente nacional do PSL, Gustavo Bebianno, diz que isso se dá devido à pouca estrutura.

“Nosso trabalho é todo feito de forma espontânea, de acordo com o andar da carruagem. Não há um planejamento até porque os recursos são pequenos.”

Além da presidência da legenda, Bebianno, homem de confiança de Bolsonaro, acumulará a tesouraria e as coordenações de campanha e da parte jurídica.

Bolsonaro precisará driblar a fragilíssima estrutura política. Também tenta fazer uma revisão de seu passado, buscando se distanciar de várias das posições que adotou nesses 30 anos como deputado.

Um exemplo: hoje defende o voto direto e a democracia, mas sempre fez apologia da ditadura militar, e nos anos 1990 chegou a defender abertamente uma nova quartelada no país.

“Através do voto você não vai mudar nada nesse país, nada, absolutamente nada! Só vai mudar, infelizmente, no dia em que partir para uma guerra civil aqui dentro, e fazendo o trabalho que o regime militar não fez. Matando uns 30 mil, começando pelo FHC [então presidente da República], não deixar ele pra fora não, matando! Se vai morrer alguns inocentes, tudo bem, tudo quanto é guerra morre inocente”, disse o pré-candidato na ocasião.

Enquanto tenta desfazer sua imagem de misógino, Bolsonaro esbarra em fatos como as duas ações penais às quais responde no STF (Supremo Tribunal Federal) sob a acusação de incitação ao estupro e injúria contra a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS).

Ele disse no Salão Verde da Câmara dos Deputados que não estupraria a petista porque ela não merecia.

Ele nega ser homofóbico, mas diz com naturalidade que pais e mães preferem ver, ao chegar em casa, seus filhos com o braço quebrado por terem jogado futebol a vê-los brincando de boneca.

Bolsonaro se vende como um candidato que não hesita falar o que pensa.

Direciona ao PT e a políticos de esquerda as principais críticas, a quem culpa pela desmoralização da política e das famílias.

Em janeiro de 2018, a Folha revelou que ele e seus filhos parlamentares acumularam exclusivamente na política um patrimônio de pelo menos R$ 15 milhões.

Três dos seus cinco filhos estão no Legislativo —Carlos (vereador no Rio), Flávio (deputado estadual no Rio) e Eduardo (deputado federal).

Apesar de se declarar antipolítico, Bolsonaro tentou se aliar ao PR de Valdemar Costa Neto, condenado no escândalo do mensalão e investigado na Lava Jato.

Seus aliados dizem que o presidenciável é vítima de ataques da imprensa e que seu único interesse nas tratativas com o PR era o de ter como candidato a vice na chapa o senador Magno Malta (PR-ES).

Como a parceria naufragou, o deputado partiu para a tentativa de ter como vice o general reformado Augusto Heleno, que comandou as tropas de paz da ONU na missão internacional no Haiti, na década passada.

O partido do general, o PRP, não aprovou a aliança.

Com isso, o candidato tenta uma solução caseira. Estão cotados o presidente licenciado do PSL, Luciano Bivar, e Janaina Paschoal, autora do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

Caso não consiga alianças, Bolsonaro terá 7 segundos nos blocos de propaganda eleitoral na TV.

Para contornar a situação, aposta na propaganda de internet, onde conseguiu montar uma sólida e aguerrida rede de apoiadores.

Na economia, Bolsonaro reconhece não ter afinidade com o tema, mas tem se amparado nas ideias do economista Paulo Guedes, fundador do banco Pactual e pós-doutor pela Universidade de Chicago, um dos berços do pensamento liberal.

Guedes já foi anunciado como futuro ministro da Fazenda por Bolsonaro.

Atualmente ele é CEO da Bozano Investimentos, sediada no Rio de Janeiro.

O economista tem como uma de seus principais propostas a diminuição do tamanho do estado e do gasto público.

Em entrevista à Folha recentemente, defendeu a privatização de empresas como Petrobras e os Correios.

O programa de governo do candidato ainda não está pronto e ele pouco tem falado sobre propostas concretas.

A coordenação do documento deve ficar a cargo do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que não deve seguir a orientação de seu partido de apoiar Geraldo Alckmin (PSDB).

Um dos principais motes da campanha do capitão reformado é a questão da segurança pública e o discurso anticorrupção.

Bolsonaro prometeu nomear militares como ministros em vez de “corruptos e terroristas.”


Sérgio Dávila: Mark Zuckerberg não sabe o que fala

E 127 milhões de brasileiros podem ser influenciados por ele

Na mesma semana em que o Facebook divulgou ter atingido no Brasil a marca inédita de 127 milhões de usuários mensais ativos (ou MAUs, na sigla em inglês), o criador da rede social deu longa e reveladora entrevista em que deixa escapar sua convicção monopolista e seu desconhecimento da natureza da informação.

À jornalista americana Kara Swisher, do site Recode, em um dos primeiros encontros com a imprensa desde que explodiu o escândalo do uso indevido de dados de usuários, Mark Zuckerberg defendeu a manutenção do tamanho de sua empresa invocando o perigo amarelo.

Se decidirem cortar as asas de companhias como a nossa, disse ele, a alternativa serão os chineses. “E eles não compartilham dos mesmos valores que temos.” A ironia é que foi a Rússia que nadou de braçada nos valores e princípios do “Feice”, ao influenciar indevidamente usuários durante as eleições presidenciais de 2016, que colocaram Trump na Casa Branca.

Em outro trecho, revela que há 20 mil funcionários dedicados a “revisar o conteúdo” publicado nas páginas do Facebook. Como eles fazem isso, e quais os critérios adotados? Zuckerberg se atrapalha na resposta.

Se uma pessoa nega que o massacre de Sandy Hook, em que um atirador matou 26 pessoas numa escola dos EUA em 2012, entre as quais 20 crianças, tenha ocorrido, os “revisores” tiram a página do ar. Se outra pessoa nega que o Holocausto judeu que exterminou milhões na Segunda Guerra tenha acontecido, sua página continuará no ar.

Se uma informação for marcada por muitos usuários como potencialmente falsa, e se os checadores factuais da empresa chegarem à conclusão de que ela é provavelmente falsa, então o conteúdo perderá sua força de distribuição nas timelines das pessoas.

Entendeu a lógica? Nem Zuckerberg. Na mesma conversa, ele se diz preocupado com as eleições do Brasil. Os 127 milhões de brasileiros que usam a rede também deveriam estar.
* Sérgio Dávila é editor-executivo da Folha.


Demétrio Magnoli: No fundo, a esquerda diz o mesmo que a direita, mas o faz com um sorriso no rosto

A charge do cartunista jordaniano Mahmoud Rifai correu mundo, difundida por sites e blogs de esquerda. Intitulada "Quem conquistou a Copa pela França", exibe um barco de refugiados africanos do qual emerge um punho negro segurando a taça da Fifa —e, acima dele, a bandeira francesa da qual salta uma mão que se apropria do troféu.

Superficialmente, trata-se de uma crítica da xenofobia e do racismo, tão comuns na Europa de hoje. De fato, é outra coisa, repetida sob formas similares em incontáveis textos e imagens.

A direita sempre diz que os terroristas são estrangeiros —mesmo quando se sabe que, em quase todos os casos, são cidadãos nacionais. Agora, a esquerda resolveu dizer que os jogadores da seleção francesa campeã mundial são estrangeiros –mesmo quando se sabe que todos são, obviamente, cidadãos franceses.

Entre os campeões, apenas dois nasceram fora da França: o goleiro Mandanda, na República Democrática do Congo, e Umtiti, em Camarões. Na sua maioria, os demais são filhos de imigrantes —e nenhum deles pertence a famílias de refugiados.
Sugerir que são estrangeiros equivale a identificar a nação à “raça”, à cor da pele.

A mania nada tem de novo. Jean-Marie Le Pen, fundador da Frente Nacional e pai da atual líder do partido ultranacionalista, acusou os vice-campeões mundiais de 2006 de não representarem a “França verdadeira”.

Na ocasião, o zagueiro Thuram deu-lhe a resposta precisa: “Le Pen deveria saber que, assim como existem negros franceses, existem loiros e morenos, e não são convocados para a seleção por sua cor, mas por serem franceses”.

E concluiu reivindicando a “França verdadeira” da Revolução de 1789, em contraponto à “França eterna” da direita xenófoba. Agora, sua lição de história (e de política) deve ser ensinada à esquerda.

No fundo, a esquerda diz o mesmo que a direita, mas o faz com um sorriso no rosto. Para a direita, o “diferente” é o veneno que contamina a nação; para a esquerda, é o eterno estrangeiro, africano ou árabe, discriminado pela maléfica potência europeia.

A seleção campeã de Mbappé e Pogba não serve para apagar as discriminações reais sofridas pelos imigrantes na França, nem absolve o governo francês de sua resistência a partilhar com a Alemanha a responsabilidade de dar abrigo ao fluxo de refugiados que cruzaram o Mediterrâneo. Mas também não deveria servir para, sob a cobertura do discurso anti-imperialista, reforçar a mitologia do sangue e da raça.

A França, ao contrário dos EUA, não coleta informações censitárias sobre a origem étnica de seus cidadãos. A "cegueira estatal" deita raízes na tradição de 1789: a cidadania é um contrato político, não um privilégio derivado da "raça" ou da religião.

Mesmo se não funciona como varinha mágica capaz de abolir o racismo ou a exclusão social, tal afirmação radical da igualdade política e jurídica é uma valiosa fronteira simbólica.

O comediante sul-africano Trevor Noah, que comanda o americano Daily Show, deu publicidade à charge de Rifai e qualificou os jogadores campeões como africanos. Numa carta aguda, o embaixador francês nos EUA retrucou que “isto legitima a ideologia que reclama a branquitude como definição exclusiva da identidade francesa”.

A seleção brasileira campeã sul-americana de 1919 tinha ao menos cinco titulares oriundos de famílias de imigrantes, entre os quais o craque Arthur Friedenreich, neto de um alemão e filho de uma professora
primária negra.

Na época, a esquerda era universalista e não lhe ocorriam as ideias racialistas de qualificar o atacante como “alemão” ou “africano”.

A esquerda mudou, para pior. Hoje, integra o coral da “nação do sangue”, compartilhando com a direita uma esquina suja que leva os nomes alternativos de “anti-imperialismo” ou “antiglobalismo”.

Le Pen pode descansar. Três Copas depois, a esquerda fala por ele.

*Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.


Pablo Ortelado: Encantamento autoritário

Surpreende que discurso ingênuo e raivoso de Bolsonaro tenha seduzido a elite econômica

Um dos mais intrigantes enigmas desta eleição é o apoio que Jair Bolsonaro (PSL) está conseguindo amealhar entre as elites. Seu sucesso entre a população em geral se compreende por sua imagem de outsider, sua postura antissistêmica e seu discurso anticorrupção.

Mas não parece razoável que um candidato tão sem qualificações, que desconhece os princípios mais elementares de funcionamento da economia e do Estado e com posturas tão grosseiramente contrárias aos direitos humanos consiga atrair apoio entre as lideranças do setor econômico.

Em evento com os presidenciáveis na CNI (Confederação Nacional da Indústria), Bolsonaro foi o mais aplaudido.

O presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, disse que ele demonstra “firmeza e autoridade” e que o setor não tem receio de um eventual governo seu. Henrique Bredda, gestor do fundo Alaska, reuniu-se com o pré-candidato e disse que teve “excelentes impressões”.

Comparações com candidatos de extrema direita de outros países esclarecem pouco sobre essa adesão das elites. Neles, o eleitorado é composto por trabalhadores que se sentem ameaçados pela abertura comercial e pela imigração, o que não parece ser o caso do Brasil.

O eleitorado de Bolsonaro é escolarizado e rico. Segundo pesquisa Datafolha, enquanto sua intenção de votos entre os que ganham até 2 salários mínimos é de 13%, ela sobe para 34% entre os que ganham mais de 10 salários mínimos; enquanto sua intenção de votos é de 11% entre os eleitores com educação fundamental, ela sobe para 25% entre os que cursaram o ensino superior.

Além disso, nossa economia é muito fechada e, a despeito de uma crise localizada na fronteira com a Venezuela, não temos um problema de imigração relevante.

A melhor pista para entender essa adesão a Bolsonaro é o antipetismo, uma moléstia que contaminou nossa elite e que a deixou tão indignada com o PT que ela não consegue mais exercer o discernimento.

O antipetismo acredita que o maior e mais fundamental problema do país é a corrupção, que o ápice desta prática ocorreu nos governos petistas e que para enfrentar o problema precisamos de autoridade e de um Estado pequeno.

O que é surpreendente é que esse discurso ingênuo e raivoso tenha conseguido seduzir nossa elite econômica que deveria saber, por dever de ofício, que nossos problemas são maiores e mais complicados.

O encantamento foi tamanho que ela cogita entregar o país para um brucutu anticorrupção, que não entende nada de coisa nenhuma, que tem menos capacidade política do que Dilma Rousseff e que só se distingue por vociferar bordões autoritários para pessoas sem juízo.

* Pablo Ortellado é professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.