Fake News

Paulo Fábio Dantas Neto: Hora de colocar o guizo no bozo

Desmoralização de Bolsonaro é muito funda e cada palavra sua vale hoje ainda menos do que o pouco que já valia

Quem torcer para Bolsonaro desdizer o que assinou não vai ter muita emoção. Esse é o tipo de torcida desnecessária, porque é certo que o fará. Ele fará qualquer coisa para reduzir os danos na sua base, que esse recuo causará. Mas podemos pedir a estraga-prazeres de plantão que nos deixem celebrar esse momento de alívio, depois de tanta tensão.

E há motivos para celebrar, não importa o que Bolsonaro diga. A desmoralização é muito funda e cada palavra sua vale hoje ainda menos do que o pouco que já valia.  A diferença agora é que não mais somente os seus recuos serão fake - como já eram, aos olhos céticos de todos nós, que lhe somos avessos.  Seus ímpetos de avanço tenderão, doravante, a também ser considerados assim, pelo quarto do eleitorado que até agora o vem apoiando. O ex-presidente da República Michel Temer viajou a Brasília, reencarnou no papel e amarrou no pescoço da fera esse guizo, que deve fazer barulho nas próximas rodadas de pesquisas. 

Em 2015, um ano antes do impeachment de Dilma, escrevi um artigo cujo título foi "O fator Temer". O destino infausto que evasivas e malabarismos demagógicos de políticos pequenos deram à pinguela que ele tentou levantar não me deixava a expectativa, que tenho hoje, de daqui a pouco poder escrever outro artigo com o mesmo título, remetido ao contexto atual.

Sim, dizem que vingança é prato que se come frio. Acrescento que se come sem dizer que está gostoso, não apenas para não tripudiar de quem chacoalha. Não precisa fazer isso para que outros políticos bem centrados possam cooperar entre si para concluírem a missão. Também não se deve ostentar o sabor para não atiçar demais a inveja de pigmeus políticos que também estão no palco, ou na plateia.  Esses seguirão xingando Bolsonaro em lives, entrevistas, tribunas, ou bastidores. Mas, em vez de pautá-lo, como ocorreu quando ele foi levado a se retratar no dia 9/09 do que havia dito no dia 7, continuarão a ser pautados por ele.

Política é como unha. Ainda bem.*Cientista Político e professor da UFBa.

Fonte: Democracia Política e novo Reformismo
https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/09/paulo-fabio-dantas-neto-guizo-no-bozo.html


Luiz Carlos Azedo: Onde perdemos o rumo?

Um governo bonapartista em choque com a Constituição de 1988 tornou-se uma ameaçam ao Estado democrático. Estamos vivendo uma espécie de “apagão liberal”

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense

Desde a redemocratização, com a eleição de Tancredo Neves no colégio eleitoral, em 1985, o Brasil avançou com políticas democráticas e progressistas, de governos que implementaram a agenda da redemocratização. Houve, nesse processo, dois traumas: os impeachments de Collor de Mello e de Dilma Rousseff. Mesmo desastrosos, não podemos dizer que os dois governos passaram batidos, também deixaram seus legados. Mesmo aos trancos e barrancos, o Brasil avançou.

Um resumo brevíssimo: José Sarney legou-nos a Constituição de 1988; Collor de Mello, a abertura da economia; Itamar Franco, a estabilização econômica; Fernando Henrique Cardoso, a consolidação do Real e as privatizações; Luiz Inácio Lula da Silva, transferência de renda e combate à pobreza; Dilma Rousseff, os programas de infraestrutura e energia; Michel Temer, a blindagem das empresas públicas e a reforma trabalhista; Jair Bolsonaro, a reforma da Previdência, mas perdeu o rumo e namora o caos. Agora, estamos num impasse.

O progressismo mudou de endereço, nosso desenvolvimentismo não dá respostas para os novos problemas da economia e da sociedade. Herdeiro de educadores do naipe de Anísio Teixeira, Paulo Freire e Darcy Ribeiro, para o ex-senador Cristovam Buarque, por exemplo, o eixo do desenvolvimento do país deve ser a educação de qualidade para todos. Entretanto, não existe a menor possibilidade de revolucionar a educação no Brasil sem crescimento econômico e redistribuição de renda. Muito menos, sem democracia, a ameaça que agora nos ronda.

Alguns problemas são mais importantes do que outros. Assim como a inflação inercial precisava ser superada para a retomada do crescimento, é evidente que a crise fiscal é o atual gargalo da economia. Ou seja, o Estado não tem como financiar suas atividades. Até para o sucesso de uma reforma tributária, precisa modernizar a máquina pública. Sair dessa sinuca fiscal é o desafio para a atual geração de economistas.

Outro problema é a concentração de renda absurda que existe no Brasil. A erradicação da miséria e a redução da pobreza são prioridades, mas como resolver? Esse é o velho conflito distributivo da renda nacional, porém, não encontramos o caminho do crescimento sustentável, que pressupõe reverter a perda de complexidade industrial e apostar na economia de baixo carbono. A chave não está no velho nacional-desenvolvimentismo nem no agrarismo reacionário.

Exceção e inimigo

E a crise ética? Sua origem era o velho modelo de financiamento da política, o caixa dois eleitoral. O que distinguia o político honesto do desonesto era a formação de patrimônio. Esse modelo estava esgotado desde a Constituição de 1988, mas permaneceu sendo praticado, até implodir com a Operação Lava-Jato, que desmoralizou todo o sistema político. O fim do financiamento dos partidos por empresas, porém, não acabou com o estigma da corrupção na política, que continua forte no imaginário popular.

A guerra fria acabou, mas não as influências da política mundial. Após os atentados terroristas às Torres Gêmeas, em 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, o ultraconservadorismo norte-americano resgatou as ideias do jurista e filósofo alemão Carl Schmitt (1888-1985), que se disseminaram pelo mundo novamente. Crítico do liberalismo e teórico do “Estado de exceção” (Ernstfail), fundamento jurídico tanto do Estado nazista quanto do nosso regime militar, segundo Schmitt, o Estado liberal foi concebido para lidar com situações normais, não com as mudanças inesperadas na História. Nas crises, um presidente serviria melhor para guardar a Constituição de um país do que a sua Suprema Corte. É dele a tese de que, nas excepcionalidades, o presidente se torna um soberano acima das leis, apto a legislar e mobilizar a população contra o “inimigo”. Tiremos nossas conclusões.

São ideias alimentadas pelo presidente Jair Bolsonaro, que deixam o país à beira da ruptura institucional, como aconteceu no Sete de Setembro. A existência de um governo bonapartista em choque com a Constituição de 1988 tornou-se uma ameaça ao Estado democrático. Boa parte do fracasso do governo Bolsonaro decorre do corporativismo, do desmonte de políticas públicas e, sobretudo, de ideias prisioneiras de um passado imaginário. Não da oposição, nem das instituições. Estamos vivendo uma espécie de “apagão liberal”, como aconteceu após a Revolução de 1930 e o golpe de Estado de 1964, com a diferença de que isso até agora não se consumou num regime autoritário, como no Estado Novo e após o AI-5, respectivamente.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-onde-perdemos-o-rumo

Barroso reafirma segurança de urnas eletrônicas durante testes no RJ

Ministro frisou que TSE nunca identificou indícios de fraudes

Vladimir Platonow / Agência Brasil

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, garantiu a segurança da votação através de urnas eletrônicas. Ele acompanhou, neste domingo (12), a auditoria da votação eletrônica dos pleitos suplementares no estado do Rio de Janeiro, nos municípios de Silva Jardim e Santa Maria Madalena.

“O sistema é absolutamente seguro. Ele está em aplicação desde 1996 e jamais se documentou qualquer tipo de fraude. De modo que nós não temos preocupação nessa matéria. Porém, é fato que criou-se, na minha visão artificialmente, numa pequena minoria da população, algum grau de desconfiança. E, portanto, as instituições públicas devem ser responsivas às demandas da sociedade. Portanto, nós aumentamos a interlocução com a sociedade para demonstrar a transparência, segurança e auditabilidade do sistema”, disse o presidente do TSE.

Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Barroso foi perguntado pelos jornalistas, durante coletiva de imprensa, sobre os últimos acontecimentos na área política, envolvendo o presidente Jair Bolsonaro, mas evitou entrar em detalhes: “Eu só respondo as questões institucionais. As pessoais, eu trato com absoluta indiferença. O resto é política, não me interessa”, concluiu o ministro.

Fonte: Agência Brasil


Alon Feuerwerker: O encapsulamento, o armistício e o cessar-fogo

As melhores pesquisas, as que costumam errar menos, mostram o mesmo fenômeno

lon Feuerwerker / Blog do Noblat / Metrópoles

Um certo encapsulamento de Jair Bolsonaro, uma convergência de seu piso e teto eleitorais, girando em torno de 25% a 30%. O presidente mantém a fatia de mercado que o alavancou ao segundo turno em 2018, mas mostra dificuldade de fechar a fatura, se a eleição fosse hoje.

Outro dado relevante é que cerca de 20% do eleitorado, nos cruzamentos, dizem preferir um candidato que não seja nem Bolsonaro e nem Luiz Inácio Lula da Silva. Quando são apresentadas as alternativas, naturalmente esse número cai, pois todo nome carrega com ele alguma rejeição. E nenhum da “terceira via” passa muito dos 10%.

Mas é razoável supor que se houvesse um único nome relevante “terceirista” (como em 2010 e 2014) ele teria boa probabilidade de abrir a corrida, daqui a pouco menos de um ano, com uns 15%. O que o colocaria, mantidos grosso modo os números de hoje, no espelho retrovisor do capitão.

E aí criar-se-ia uma condição já vista em eleições. Se Bolsonaro se mostrasse consistentemente debilitado no mano a mano com Lula, um pedaço do mercado eleitoral do presidente poderia achar mais importante derrotar o petista do que reeleger o capitão.

E Bolsonaro poderia ser objeto de um ataque especulativo que transferisse alguns pontinhos vitais dele para o nome “de centro”, que seria alavancado ao segundo turno com a missão de derrotar o PT.

Há alguma especulação, claro, nisso tudo, mas o cenário e as possibilidades numéricas explicam em boa medida os movimentos dos protagonistas. Especialmente no embate mais selvagem do momento: para definir quem carregará a espada do antilulismo em 2022.

Nada disso chega a ser novidade, mas é nesse contexto que precisam ser olhados os movimentos da agitada semana que fecha.

A muito expressiva, mas não decisiva, mobilização do Sete de Setembro não deu a Bolsonaro o impulso para o xeque. Mas criou um equilíbrio de forças propício ao que se seguiu: um cessar-fogo, um armistício.

(Sobre o Dia da Independência, vale ler o depoimento de um sociólogo do Cebrap (esquerda) que foi ver de perto do que se tratava.)

Para projetar a duração do armistício, a correlação de forças tem mais importância do que as convicções. Sobre estas, aliás, é saudável partir da premissa de que cada jogador, se puder, prefere ganhar o jogo por W.O. Expurgar os adversários da disputa.

A estabilidade do atual cessar-fogo depende, em última instância, da confiança que dois dos três jogadores principais, o bolsonarismo e o centrismo, depositam na própria força eleitoral. O primeiro tem a liderança, ainda que baqueada, da máquina estatal. O segundo tem a hegemonia absoluta nos mecanismos de formação e controle da opinião pública (que não se confunde com a opinião popular).

Sobre Jair Bolsonaro, ele estará mais aderente ao armistício quanto mais estiver confiante de que tem boas chances de virar o jogo e buscar a reeleição. E isso nunca deve ser subestimado, pois desde que a reeleição foi permitida todos os presidentes se reelegeram.

P.S: A respeito das frentes, e o tema vale um texto à parte, é sempre prudente buscar fortalecer-se no processo frentista, porque pode acontecer mais cedo ou mais tarde que o amigo de hoje vire o inimigo de amanhã. E é bom estar preparado.

(Sobre o “day-after” da aliança que derrotou o nazismo na Segunda Guerra Mundial, sempre apontada como paradigma, vai aqui um texto interessante.)

Alon Feuerwerker – jornalista e analista político/FSB Comunicação

Fonte: Blog do Noblat / Metrópoles
https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/artigos/o-encapsulamento-o-armisticio-e-o-cessar-fogo-por-alon-feuerwerker


Baixa adesão e pluralidade política marcam protestos contra Bolsonaro

Manifestantes foram às ruas em diversas capitais neste domingo (12/09), em defesa da democracia e pelo impeachment do presidente da República

Fernanda Fernandes / Correio Braziliense

As manifestações contra o governo e pelo impeachment do presidente da República, Jair Bolsonaro, marcaram o dia de hoje (12/09) em pelo menos 15 capitais do país. Os atos convocados pelo Movimento Brasil Livre (MBL) e pelo Vem Pra Rua (VPR), contaram com apoio de partidos de diferentes espectros políticos. O protesto que a princípio pedia “Nem Bolsonaro, nem Lula”, foi modificado para “Fora, Bolsonaro”, após os discursos antidemocráticos do presidente no último 7 de setembro.

No Rio de Janeiro e em Belo Horizonte os protestos começaram pela manhã e se estenderam até as 13h. Paralelamente, em Brasília, ainda ocorriam manifestações pró-Bolsonaro, com baixa adesão. À tarde, manifestantes da oposição se reuniram na Esplanada dos Ministérios, na capital federal, e na Avenida Paulista, em São Paulo. Com número de participantes bastante inferior ao visto em 7 de setembro, a diversidade ideológica entre os participantes, que protestaram pacificamente, chamou a atenção.

Mauro Vinícius da Silva, membro do Comitê Regional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e secretário geral da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), afirmou ao Correio que a unificação das bandeiras contra o atual governo é uma pauta antiga do PCdoB. “Há bastante tempo a gente defende que apenas uma frente ampla, que una não só a esquerda mas todos os democratas e patriotas, é capaz de derrotar o Bolsonaro e o fascismo”, afirmou o bancário e sociólogo, durante o ato em Brasília.

A unificação pode ser confirmada nos atos deste domingo (12/09), onde a pluralidade política foi constatada nas bandeiras e faixas de protestos. As cores do Brasil e o vermelho se misturaram entre os cartazes e camisetas com frases em defesa da democracia e contra Bolsonaro. Muitos optaram pelas vestimentas brancas, como forma de mostrar imparcialidade.

Uma dessas pessoas foi Rodrigo Galletti, servidor público, de 45 anos, que participou dos protestos de forma apartidária. “Estou focado no Fora, Bolsonaro”, disse. “O país de Bolsonaro é um país armado, misógino e preconceituoso, baseado em um cristianismo distorcido. Não é o país que quero para mim, nem no presente, nem no futuro”. Sobre a escolha da cor branca, completou: “Tomaram posse da nossa bandeira e das nossas cores”.

Segundo Silva, o partido tem esperanças de ver um movimento muito maior no dia 2 de outubro. “Não houve da parte do PT, Psol ou do Fora Bolsonaro nenhum ataque. A gente quer que todos estejam juntos no dia 2 de outubro, não para fazer campanha eleitoral, mas para garantir que as eleições de 2022 aconteçam e sejam válidas”, disse o militante do PCdoB.

O protesto de outubro citado por ele foi convocado pelo PT que, ao contrário do PDT, o PCdoB e PSB, se recusou a participar das mobilizações deste domingo, atitude também tomada pelo PsoL. Vale destacar que os dois grupos organizadores dos eventos de hoje, encabeçaram os protestos que levaram à derrubada da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) do poder, em 2016.

Para o presidente regional do Cidadania/DF, Chico Andrade, o movimento unificado contra o presidente Bolsonaro ainda ganhará força nas ruas e no Congresso. Andrade lamentou a ausência dos dois grandes partidos de esquerda. “Foi uma pena terem se negado, a gente teria botado muito mais gente na rua. (...) (A manifestação) representa o sentimento de 70% da população. Ou todo mundo se une ou briga por mais dois anos, e ele vai tentar golpe mais uma vez”, alerta o representante do Cidadania.

São Paulo

Na avenida paulista, segundo informações do jornal Valor Econômico, os manifestantes não chegaram a ocupar metade de um quarteirão. O governador de São Paulo, João Doria, esteve presente. Ao relembrar o movimento “Diretas Já”, Dória inflamou os participantes afirmando que, hoje, existem muito mais recursos para uma mobilização nesta esfera. “Não tínhamos em 1984 as redes sociais, não tínhamos a internet, mas tínhamos coração. É isso que vai nos mover”, disse.

Rio de Janeiro

Terra Natal de Bolsonaro, a diversidade também tomou conta das ruas do Rio de Janeiro, na Orla de Copacabana. O ato foi puxado por grupos que fizeram campanha para o presidente em 2018 e, decepcionados com sua gestão, hoje buscam pelo impeachment. Também no Rio, as bandeiras do MBL e do VPR se misturaram às das centrais sindicais, partidos e grupos de esquerda como o PDT, UNE (União Nacional dos Estudantes) e a CTB.

Até o momento, nenhuma Polícia Militar dos estados ou organizadores divulgaram a estimativa de público.

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/09/4949096-baixa-adesao-e-pluralidade-politica-marcam-protestos-contra-bolsonaro.html


Cristovam Buarque: À espera de uma oposição

Hora de pensar a renúncia de todos os candidatos em benefício daquele com maior chance de barrar a Pessoa Jurídica do Autoritarismo

Cristovam Buarque / Blog do Noblat / Metrópoles

Enquanto seis democratas disputam qual deles irá para o segundo turno, Bolsonaro já está no terceiro. Percebendo a possibilidade de derrota, se prepara para negar o resultado da eleição com um golpe cujo esquema está pronto, salvo um detalhe.

Já levantou a suspeita de fraude nas urnas eletrônicas; já explicitou a suspeição do Presidente do TSE, que será Alexandre de Moraes; já liberou a compra de armas que seus apoiadores utilizarão; já mobilizou suas milícias, polícias, motoqueiros, caminhoneiros, além de parcelas do Exército, Marinha e Aeronáutica. Só descuidou do elemento surpresa, importante para o êxito de qualquer golpe, mas conta que a falta de surpresa não vai atrapalhar, porque os democratas continuarão divididos, disputando entre eles, deixando a defesa da democracia nas mãos do STF, sem urnas, nem armas. Mais uma vez, o autoritarismo se beneficia do corporativismo dos democratas que continuam achando que a disputa é entre cada um deles, ou entre esquerda e direita e não entre democracia e autoritarismo. Se tivessem bom senso, sentimento democrático e espírito público, os seis pré-candidatos a presidente deveriam entender o caráter da disputa.

A Pessoa Física Bolsonaro foi eleita pelo discurso antipolítica, pela facada, pela rejeição à velha esquerda, o enfrentamento do fantasma do comunismo já morto e pela bandeira da anticorrupção. Agora, a vitória será da Pessoa Jurídica do Bolsonaro: negacionismo, recusa à ciência, controle do STF e do Congresso, aceitação de corrupção da turma no poder, abandono da escola pública, das universidades, do desenvolvimento científico e tecnológico, sequestro dos símbolos nacionais, abandono dos direitos das minorias, queima das florestas, genocídio. A eleição será um plebiscito entre a Pessoa Jurídica do atraso desmiolado e a Pessoa Jurídica Democrática em busca do salto para o futuro.

Para construir esta Pessoa Jurídica Democrática, o primeiro passo é a unidade na defesa da democracia: renúncia de todos os candidatos em benefício daquele que apresente maior chance de barrar a Pessoa Jurídica do Autoritarismo. A democracia contaria com a unidade necessária para barrar qualquer tentativa de golpe. No lugar do nem-nem”, consolidaria um NÃO contra a tragédia da decadência nacional representada por um novo mandato de Bolsonaro, promoveria o diálogo com a população assumindo erros do passado e compromissos com o futuro, formularia as linhas básicas do governo seguinte: apenas um mandato, retomada do prestígio do Brasil no exterior, recuperação do tempo perdido na área social, enfrentamento do problema do desemprego e da recessão, proteção da riqueza natural, especialmente a Amazônia, início de estratégia para superar o atraso e a desigualdade na educação.

Difícil construir esta Pessoa Jurídica Democrática, por causa da arrogância que vem do tamanho do Partido dos Trabalhadores e seu candidato em relação a todos os outros e por causa dos preconceitos de todos os outros em relação ao PT, por causa dos erros cometidos nos governos deste partido. A arrogância e o preconceito, a falta de percepção do risco do golpe para dar posse à Pessoa Jurídica do Autoritarismo, parecem levar o Brasil na marcha que todos dizem querer evitar, mas cada um faz o que é preciso para que aconteça: o golpe anunciado do terceiro turno.

Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador

Fonte: Blog do Noblat / Metrópoles
https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/artigos/a-espera-de-uma-oposicao-por-cristovam-buarque


Pedro Dória: Lições para aprender após a tentativa de golpe de Estado

Nada do que estamos vivendo ocorreria se aprendêssemos algo com o passado

Pedro Dória / O Estado de S. Paulo

Esta coluna tem tema — o impacto das transformações digitais no mundo. Mas esta não é uma semana qualquer. Na terça-feira, logo um 7 de Setembro, o presidente Jair Bolsonaro juntou uma pequena multidão na avenida Paulista e ameaçou violar o artigo 85 da Constituição. É aquele que obriga alguém em seu cargo a cumprir decisões judiciais sob a pena de impeachment. Durante aquele dia, a PM do Distrito Federal resistiu a sete ofensivas contra o Palácio do Supremo. Foi uma tentativa de golpe de Estado, que se frustraria, o que não faz disso menos grave. Dois dias depois, na quinta, perante um impeachment posto no radar, Bolsonaro se acovardou. Tenta recuar do desastre com uma carta escrita pelo ex-presidente Michel Temer. Peço licença, pois, aos leitores habituais da coluna para vestir só nesta semana meu outro chapéu profissional — o do jornalista que escreve sobre história. Porque nada do que estamos vivendo ocorreria se aprendêssemos algo com o passado.

A primeira lição: existe um germe militar autoritário na cultura política brasileira. Sempre que o País se desorganiza, um grupo grande o suficiente de brasileiros bate à porta dos quartéis. Por algum motivo, acreditamos que os militares representam ordem, disciplina e competência. Foi assim em 1889, quando Deodoro pôs abaixo o Império. Também foi assim em 1937, quando Getúlio se apoiou em dois marechais para cercar o Congresso e encerrar o período da melhor Constituição que tivemos até 1988. A eleição de Eurico Gaspar Dutra foi isso. Ia sendo assim em 1954, quando o mesmo Getúlio — agora na outra ponta — meteu um tiro no peito evitando um golpe. Em 1964. E, em 2018, perante o caos deixado pela instabilidade da década de 10, com a eleição de Bolsonaro.

Nunca dá certo. Os governos militares foram uniformemente incompetentes, ineptos, desordeiros, corruptos e desorganizados. A única promessa que militares cumprem no poder é que, ora, autoritários eles são mesmo. Por que não aprendemos que é um desastre? É um mistério. Mas o resultado é sempre o mesmo.

A segunda lição é uma que a centro-esquerda não consegue aprender. É incapaz de pactuar com o Centro democrático. Para a Esquerda brasileira, é como se o Centro não existisse. Tudo para além é a ‘Direita’. Com a Direita fisiológica tem conversa — Getúlio fez muito disso. A Centro-Esquerda então transforma sua vertente radical em massa de manobra. Jango fez muito disso. Pactuar com o Centro? Nunca. Sequer reconhecer a existência de tal coisa. É assim que Fernando Henrique Cardoso passou sua presidência sendo chamado de fascista.

Se tivesse havido um diálogo cordial e democrático em cima da extensa interseção de objetivos de Centro-Esquerda e Centro, a história da Nova República teria sido outra.

Mas este Centro, do qual fazem parte os Liberais, também tem culpa no cartório. Mesmo alguns de nossos melhores Liberais, dentro os mais convictos democratas como Ruy Barbosa e Afonso Arinos, sempre existe esta ilusão do atalho autoritário. Uma ditadura curta vai promover reformas tão difíceis de realizar na Democracia. Um autoritário de pulso firme fará o que é preciso para o Brasil entrar nos trilhos.

Como pode um Liberal apoiar um autoritário? Está entre nossas jabuticabas brasileiras. Sempre dá errado.

A mais cruel das lições é outra. Assim como a Frente Ampla que juntou Carlos Lacerda, João Goulart e Juscelino Kubitschek demorou três anos de ditadura para enfim sair, os democratas são incapazes de caminhar juntos perante uma ameaça à democracia. A gente não aprende.

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://link.estadao.com.br/noticias/geral,licoes-para-aprender-apos-a-tentativa-de-golpe-de-estado,70003835960


Vera Magalhães: Nota de recuo vale por uma de R$ 3

A pretexto de fazer um favor ao país, Temer presta um desserviço histórico

Vera Magalhães / O Globo

Vale tanto quanto uma cédula de R$ 3 a nota em que Jair Bolsonaro usa o marqueteiro de Michel Temer como ghost-writer para ajoelhar no milho diante do Supremo Tribunal Federal e fingir um arrependimento que não tem das ameaças de golpe que sinceramente proferiu no 7 de Setembro.

Quem fingir que acredita no propósito de se moderar, de obedecer aos desígnios do Judiciário e de zelar pela independência e harmonia dos Poderes feito por Temer é cínico, burro ou ingênuo. Ou um mix dos três.

Cínico será o alívio do mercado, dos ministros e dos deputados da base aliada.

O primeiro grupo tratará de tentar recuperar os prejuízos dos últimos dias.

Os integrantes do primeiro escalão buscarão para o espelho, para o travesseiro e para os filhos uma justificativa plausível para continuar servindo a um governo que busca uma ruptura institucional.

E os nobres parlamentares da base aliada encontrarão a desculpa necessária para continuar mamando nas tetas do Orçamento até exauri-las, sem precisar fingir que estão pensando a sério em abrir um processo de impeachment.

Ingênuo será o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM), se, com base nessa encenação tosca, deixar de devolver a Medida Provisória que susta parte do Marco Civil da Internet ou se receber os caminhoneiros que fazem chantagem com o país com uma paralisação que foi convocada e insuflada por Bolsonaro em pessoa.

Também figura no rol dos ingênuos, desta vez com uma dose de vaidade por ser lembrado e chamado em casa, Michel Temer, ao associar sua já questionada passagem pela Presidência (que deixou com recordes de rejeição) à indefensável e incorrigível gestão de seu sucessor.

Ademais, a pretexto de fazer um favor ao país, Temer presta um desserviço histórico. Porque ajuda a escamotear o real propósito de Bolsonaro de solapar a democracia e dinamitar as instituições aos poucos todos os dias.

Hoje, o presidente se finge de cordeiro, pede desculpas e faz um ato de contrição. E o faz porque é, além de golpista e inepto para o cargo, atavicamente covarde e se pela de medo da deposição e da prisão — dele e dos filhos. Só por isso. O país que se exploda. É nesse avião que Temer aceitou embarcar.

O último grupo a acreditar na nota de R$ 3 de Bolsotemer é o dos burros, integrado pela ala mais bovina dos bolsominions. Os comentaristas a soldo, pseudojornalistas, blogueiros golpistas arrancaram os poucos cabelos que têm e arreganharam as gengivas inflamadas para xingar o mito de todos os nomes feios que conhecem.

Já lançam Tarcísio Gomes de Freitas, o ex-técnico transformado em minion pelo chefe, para lhe suceder na eleição de 2022!

De tão desarvorados, se esquecem de relaxar e lembrar que amanhã mesmo Bolsonaro já estará de volta ao script de protoditador de anteontem, mandando às favas a máxima temerista de que verba volant, scripta manent (calma, Centrão, a verba que voa é a palavra, a do orçamento secreto fica).

Que os que estavam vigilantes e preocupados no dia 8 sigam assim e não desviem de seu papel constitucional de conter um presidente disposto a lhes sentar o relho e empastelar as eleições.

Os inquéritos de Alexandre de Moraes têm de seguir, a MP do Marco Civil tem de voltar para o Planalto com selo de endereço não encontrado, as investigações do TSE sobre as mentiras de Bolsonaro quanto ao pleito não podem parar, a CPI tem de concluir seu relatório com imputação dos inúmeros e hediondos crimes cometidos pelo presidente e pelo sumido general Pazuello, e a indicação de André Mendonça ao STF tem de ser rejeitada, porque quem o indicou quer fechar o Supremo.

Essa é a pauta de resistência possível e viável, uma vez que o impeachment, conforme escrevi aqui, não sairá.

Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/vera-magalhaes/post/nota-de-recuo-de-bolsonaro-vale-tanto-quanto-uma-de-r-3.html


IBGE: um em cada dez estudantes já foi ofendido nas redes sociais

Dado é da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar

Mariana Tokarnia / Agência Brasil 

Aproximadamente um em cada dez adolescentes (13,2%) já se sentiu ameaçado, ofendido e humilhado em redes sociais ou aplicativos. Consideradas apenas as meninas, esse percentual é ainda maior, 16,2%. Entre os meninos é 10,2%. Os dados fazem parte da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) 2019, divulgada hoje (10) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

Ao todo, foram entrevistados quase 188 mil estudantes, com idade entre 13 e 17 anos, em 4.361 escolas de 1.288 municípios de todo o país. O grupo representa 11,8 milhões de estudantes brasileiros. A coleta dos dados foi feita antes da pandemia, entre abril e setembro de 2019. A partir de 2020, com a suspensão das aulas presenciais, o uso das redes sociais, até mesmo como ferramenta de estudos, foi intensificado. 

As agressões existem também fora da internet, nas escolas, onde 23% dos estudantes afirmaram ter sido vítimas de bullying, ou seja, sentiram-se humilhados por provocações feitas por colegas nos 30 dias anteriores à pesquisa. Quando perguntados sobre o motivo de sofrerem bullying, os três maiores percentuais foram para aparência do corpo (16,5%), aparência do rosto (11,6%) e cor ou raça (4,6%). 

Em relação à saúde mental dos estudantes, metade (50,6%) disse se sentir muito preocupado com as coisas comuns do dia a dia. Um em cada cinco estudantes (21,4%) afirmou que a vida não valia a pena ser vivida. Entre as meninas, esse percentual é 29,6% e, entre os meninos, 13%. 

Os resultados mostram ainda insatisfação com o próprio corpo. Menos da metade (49,8%) achava o corpo normal, 28,9% se achavam magros ou muito magros e 20,6%, gordos ou muito gordos.

Violências 

Em 2019, de acordo com a PeNSE, cerca 14,6% dos adolescentes, alguma vez na vida e contra a sua vontade, foram tocados, manipulados, beijados ou passaram por situações de exposição de partes do corpo. No caso das meninas, o percentual (20,1%) é mais que o dobro do observado entre os meninos (9%). Além disso, 6,3% dos estudantes informaram que foram obrigados a manter relação sexual contra a vontade alguma vez na vida, sendo 3,6% dos meninos e 8,8% das meninas.

A pesquisa mostra também que quase um em cada dez adolescentes (10,6%) envolveu-se em lutas físicas e 2,9%, em briga com arma de fogo. Dentro de casa, também há relatos de violência - 21% afirmaram ter sido agredidos pelo pai, mãe ou responsável alguma vez nos 12 meses anteriores ao estudo. 

Esse cenário pode, de acordo com a PeNSE, ter se intensificado na pandemia. “A pandemia trouxe grandes dificuldades para os adolescentes do mundo todo. A falta de acesso à escola, além da significativa perda de aprendizagem, pode significar também a perda de proteção contra perigos como violência doméstica e abuso infantil ou até a perda da única refeição balanceada que tinham. Tornou-se mais difícil para os adolescentes manter práticas de exercícios, intensificando os quadros de desânimo, tristeza, ansiedade e ausência de amigos”, diz o estudo. 

Infraestrutura

A PeNSE traz também dados sobre a infraestrutura disponível para os estudantes, tanto nas escolas quanto em casa. Os resultados mostram que menos da metade (49,7%) dos alunos das escolas públicas tem computador em casa, enquanto entre os alunos das escolas privadas esse percentual é de 89,6%. Quase a totalidade (95,7%) dos alunos de escolas privadas tem aparelhos celulares. Entre os alunos de escolas públicas, esse percentual é 82,2%. Entre os estudantes de escolas particulares, 98,6% têm internet em casa. Entre os alunos de escolas públicas, 84,9%. 

A PeNSE mostra ainda que 61,5% dos estudantes de 13 a 17 anos estudam em escolas com pia ou lavatório em condições de uso e que oferecem sabão para lavagem das mãos. Nas escolas privadas esse percentual chega a 97,5% e, nas públicas, a 55,4%. 

A pesquisa ressalta que a lavagem das mãos é reconhecida como importante medida de saúde pública, por sua eficácia em reduzir a incidência de doenças infectocontagiosas. Nas escolas, a importância da disponibilização da estrutura necessária à lavagem é dupla: por ser um ambiente de aprendizagem de hábitos saudáveis e pela própria prevenção de transmissão de doenças entre os alunos.

Fonte: Agência Brasil
https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2021-09/ibge-um-em-cada-dez-estudantes-ja-foi-ofendido-nas-redes-sociais


Confira os principais pontos do novo Código Eleitoral aprovado na Câmara

Com quase 900 artigos e mais de 370 páginas, a proposta reformula amplamente a legislação partidária e eleitoral

DW Brasil

A Câmara dos Deputados aprovou ontem (9/9) o texto-base do projeto de lei que estabelece um novo Código Eleitoral no país. Foram 378 votos a favor e 80 contra.

Os deputados ainda analisam os destaques à proposta, ou seja, sugestões apresentadas para alterar trechos do texto. Em seguida, o projeto segue para análise do Senado.

Para valer já para as eleições do ano que vem, a legislação precisa ser aprovada tanto pela Câmara como pelo Senado e sancionada pela Presidência da República pelo menos um ano antes do primeiro turno, ou seja, antes de 2 de outubro.

Com quase 900 artigos e mais de 370 páginas, a proposta reformula amplamente a legislação partidária e eleitoral, revogando as leis vigentes e reunindo as regras em um único código. O texto é criticado por enfraquecer a Lei da Ficha Limpa, diminuir a transparência e flexibilizar a prestação de contas e o uso do fundo partidário pelos partidos, entre outras medidas.

Por outro lado, os deputados decidiram derrubar um dos poucos pontos bem-recebidos por analistas: a exigência de uma quarentena de cinco anos para que juízes, membros do Ministério Público, militares e policiais disputem eleições. Esse item impediria, por exemplo, que ex-juízes como Sergio Moro se candidatem a um cargo eletivo logo após deixar a magistratura.

Os únicos partidos que se manifestaram contra o texto foram o Novo, a Rede e o Psol. Confiram os principais pontos da proposta:

Sondagens eleitorais

O projeto de lei proíbe a divulgação de pesquisas eleitorais na véspera e no dia do pleito. No dia da eleição, só poderá haver divulgação de sondagens após o encerramento da votação em todo o país, no caso da disputa pela Presidência, ou a partir das 17h, nos demais casos. Especialistas afirmam que o veto a institutos confiáveis pode levar à divulgação de números falsos na véspera e no dia da votação e confundir eleitores.

Além disso, o texto obriga os institutos de pesquisa a informarem o percentual de acerto nas sondagens feitas nas últimas cinco eleições. Esse item é criticado pelos institutos, que argumentam que pesquisas servem para dar o retrato de um momento, e não prever o resultado.

Ficha Limpa

Um dos pontos mais polêmicos da nova proposta, segundo especialistas, é que o texto afrouxa pontos da Lei da Ficha Limpa. Em vigor desde 2010, a norma, criada a partir de iniciativa popular, serve para impedir a eleição a cargos políticos de candidatos condenados por órgãos colegiados.

O texto aprovado na Câmara altera o prazo de inelegibilidade estabelecido pela Ficha Limpa. O período continua a ser de oito anos, mas agora começa a contar a partir da condenação, e não apenas a partir do fim do cumprimento da pena. Já para o político condenado a perda de mandato, os oito anos de inelegibilidade contarão a partir da decisão, e não mais a partir do término do mandato, como é atualmente.

Havia risco de os deputados acabarem com uma regra importante da Ficha Limpa, que torna inelegível por oito anos os políticos que renunciam ao mandato para fugir de processos de cassação. No final, porém, os deputados retiraram esse item do texto.

Fundo partidário

A proposta enumera uma série de itens que podem ser financiados com recursos públicos do fundo partidário. A legenda poderá ainda usar a verba para "gasto de interesse partidário, conforme deliberação da executiva do partido", sem precisar especificar o fim do gasto. Atualmente, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) expõe esses dados com organização e transparência.

Prestação de contas e multas

Além disso, a proposta estabelece que a prestação de contas dos partidos será feita por meio do sistema da Receita Federal, e não mais pelo sistema personalizado usado atualmente pela Justiça Eleitoral.

As legendas poderão ainda contratar, com verba do fundo partidário, empresas privadas para auditar a prestação de contas, o que analistas veem como uma terceirização do trabalho da Justiça Eleitoral.

O texto ainda reduz de cinco para três anos o prazo para a Justiça Eleitoral julgar as prestações de contas, que passam a ser processos administrativos. Já a multa por irregularidades em prestações passa a ter um teto de R$ 30 mil, e não mais 20% do valor irregular, como é atualmente, podendo chegar a milhões de reais.

Fake news

A proposta estabelece punição para quem compartilhar informações falsas com objetivo de influenciar as eleições. A pena varia de um a quatro anos de reclusão, mais multa.

Se a prática visa "atingir a integridade dos processos de votação, apuração e totalização de votos, com a finalidade de promover a desordem ou estimular a recusa social dos resultados eleitorais", a punição pode ser acrescida de metade a dois terços.

Outro dispositivo prevê mecanismos contra a divulgação de fake news nas eleições ao autorizar a Justiça Eleitoral a suspender perfis identificados como robôs nas redes sociais durante o pleito.

Inclusão

O projeto de lei determina que os votos em mulheres, indígenas e negros valerão por dois para efeitos da distribuição dos recursos do fundo eleitoral. A medida tem o objetivo de aumentar a participação desses segmentos da sociedade no processo eleitoral.

Caixa 2

O novo Código Eleitoral também prevê o crime de caixa 2, descrito como "doar, receber, ter em depósito ou utilizar, de qualquer modo, nas campanhas eleitorais ou para fins de campanha eleitoral, recursos financeiros fora das hipóteses da legislação eleitoral". Contudo, se a irregularidade for de baixo valor, a Justiça poderá deixar de aplicar a pena.

Candidaturas coletivas

O texto prevê a autorização de candidaturas coletivas em cargos de deputado e vereador. Esse tipo de candidatura é caracterizado pela tomada de decisão coletiva nas votações e encaminhamentos legislativos.

O partido deverá autorizar e regulamentar essa candidatura em seu estatuto, mas a candidatura coletiva será representada formalmente por apenas uma pessoa. O texto permite, no entanto, que o nome do coletivo seja registrado na Justiça Eleitoral junto com o nome do candidato, assim como nas propagandas, isso se não criar dúvidas quanto à identidade do candidato registrado.

O partido definirá regras para o uso desse tipo de candidatura, especificando como ocorrerá seu financiamento e a participação da coletividade na tomada de decisão sobre os rumos e estratégias políticas da candidatura.

Transporte de eleitores e comícios

A proposta prevê ainda a descriminalização do transporte ilegal de eleitores, que passa a ser punido na esfera cível com multa de R$ 5 mil a R$ 10 mil.

Os crimes do dia da eleição, como comícios, carreatas, boca de urna e uso de alto-falantes, também se tornam infração cível, com pena de multa de R$ 5 mil a R$ 30 mil.

Fidelidade partidária

O projeto altera também as regras de fidelidade partidária, estendendo para governadores, prefeitos e presidente a obrigação de permanecer na legenda após a eleição. Atualmente, apenas parlamentares devem cumprir fidelidade partidária. Um dos destaques já aprovados pelos parlamentares limitou a mudança de legenda apenas ao final do mandato, antes da eleição seguinte.

Fonte: DW Brasil / Agência Brasil / Agência Câmara
https://www.dw.com/pt-br/os-principais-pontos-do-novo-c%C3%B3digo-eleitoral-aprovado-na-c%C3%A2mara/a-59142585


Luiz Carlos Azedo: As nuvens do Planalto

O que Bolsonaro fala não se escreve. Agora, com a sua Mensagem à Nação, na qual se compromete a respeitar a Constituição de 1988, veremos se cumpre o que escreve

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense

Ex-banqueiro, ex-deputado, ex-governador de Minas Gerais e então ministro das Relações Exteriores na época da publicação do Ato Institucional no 5, em 13 de dezembro de 1968, Magalhães Pinto eram um político conservador, que apoiou o golpe de 1964, como a maioria dos caciques da antiga União Democrática Nacional (UDN). Para ele, a política era como uma nuvem: “Você olha e ela está de um jeito; olha de novo e ela já mudou”.

Signatário do histórico Manifesto dos Mineiros, lançado por setores liberais contra o Estado Novo (1937-1945), em outubro de 1943, mesmo assim Magalhães Pinto subscreveu o AI-5 na “esperança” de que o decreto tivesse vigência de seis ou oito meses, diria em entrevista, 16 anos depois. O regime militar só acabou em 1985, com a eleição de Tancredo Neves, seu adversário histórico do antigo PSD. O tempo fora suficiente para volatilizar seu projeto de chegar à Presidência da República, frustração que também ocorreu com outros políticos golpistas, como o ex-governador carioca Carlos Lacerda, que teve o mandato cassado pelos militares.

As nuvens da política no Planalto são caprichosas e traiçoeiras. Nessa época do ano, em que a seca castiga o Distrito Federal, elas aparecem e desaparecem ao sabor do vento. As chuvas, com raios e trovões, são uma raridade, mas eventualmente ocorrem. Na terça-feira, Dia da Independência, Brasília amanheceu sob um ameaçador cumulonimbus, uma formação semelhante àquelas “Nuvens Negras” que intitularam o editorial do antigo Correio da Manhã, a senha para a marcha das tropas do general Mourão Filho, de Juiz de Fora para o Rio de janeiro, em 31 de março de 1964, o estopim da destituição do presidente João Goulart.

Existem nuvens em camadas e nuvens convectivas. Nuvens em camadas aparecem altas no céu, são as mais comuns nessa época do ano em Brasília. As nuvens convectivas estão mais próximas da superfície da Terra. Em 1802, o inglês Luke Howard criou quatro categorias de nuvens usadas até hoje: cumulus, stratus, nimbus e cirrus. O nome cumulus vem do latim e significa “pilha” ou “montão. Nimbus é a palavra para “nuvem” em latim. Nuvens nimbus são produtoras de precipitação. A categoria nimbus é frequentemente combinada com outras categorias para indicar condições de tempestade.

Na gíria dos morros e subúrbios cariocas, “CB” significa “sangue bom”. Na meteorologia, porém, a sigla significa cumuloninbus, um terror para pilotos e navegantes. São nuvens que podem ocorrer a qualquer momento, durante todo o ano. Na aviação, limitam o espaço aéreo, pois o voo dentro delas é de extremo risco — também afetam pousos e decolagem. No mar, nos rios e nos lagos, podem causar naufrágios. Provocam turbulência, granizo, formação de gelo, saraiva (granizos lançados para fora da nuvem, em ar claro), relâmpagos e, por vezes, tornados. Há registros de ventos de 100 milhas/hora e tempestades de 8 mil toneladas de água por minuto, que duram não muito mais do que meia-hora. Seus raios podem chegar a 100 milhões de volts.

Dissipação

Terça e quarta-feira, parecia que um CB levaria a Constituição de 1988 ao naufrágio e calcinaria os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Mas era uma daquelas nuvens da nossa política. No auge da tensão entre os manifestantes que ocupam a Esplanada e os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), as tropas do Comando Militar do Planalto, chefiadas pelo general de divisão Rui Yutaka Matsuda, estavam de prontidão, para garantia da lei e da ordem, se assim fosse necessário. Não estavam aquarteladas para dar um golpe de Estado, mas, sim, proteger o STF, se fossem requisitadas pelo presidente da Corte, Luiz Fux. Por muito pouco, o presidente Jair Bolsonaro não cometeu um grave crime de sedição ao incitar os caminhoneiros contra o Supremo, o contrário do que deveria fazer como. “comandante supremo” das Forças Armadas.

Enquanto as multidões que mobilizara urravam, Bolsonaro se isolava politicamente. Na quar- ta-feira, as reações do presidente do STF, Luiz Fux, e dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), refletiram essa situação. Ontem, os bloqueios de rodovias pelos caminhoneiros que apoiam Bolsonaro e querem fechar o Supremo, e as reações do mercado financeiro, com ações em queda e dólar em alta, reve- lavam que o presidente ainda estava dentro cumulonimbus, enquanto os políticos e a magistratura o contornavam.

O antológico e duro discurso do ministro do STF Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), durante a sessão da Corte, deixou muito claro que os ministros do Supremo não se acovardariam. Coube ao ex-presidente Michel Temer, como se fosse um velho controlador de voo, convencer o presidente a mudar de rota, enquanto as nuvens se dissipavam. O que Bolsonaro fala não se escreve. Agora, com a sua Mensagem à Nação, na qual se compromete a respeitar os demais Poderes e a Constituição de 1988, veremos se cumpre o que escreve.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-as-nuvens-do-planalto

Jurista vê crime de responsabilidade em ameaças de Bolsonaro no 7/9

As ameaças, ainda que não efetivas, podem ser enquadradas pela lei, conforme especialista

O jurista Marco Marrafon, ouvido pelo Olhar Direto ontem (8), afirmou que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) cometeu crime de responsabilidade ao afrontar princípios constitucionais como ao dizer que não vai cumprir decisões do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. Em sua fala, Bolsonaro também atacou o sistema eleitoral brasileiro, outros integrantes do STF e governadores e prefeitos que tomaram medidas de combate ao coronavírus.

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“O discurso em si já foi muito grave. Ela aponta para um caminho que atenta contra a democracia e contra as instituições, em especial o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal federal (STF)”, salientou Marrafon.

Alexandre de Moraes é responsável pelo inquérito que investiga o financiamento e organização de atos contra as instituições e a democracia e pelo qual já determinou prisões de aliados do presidente e de militantes. Bolsonaro é alvo de cinco inquéritos no Supremo e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Moraes vai ser presidente do TSE no próximo ano.

As ameaças, ainda que não efetivas, podem ser enquadradas pela lei, conforme especialista. “Isso em si já configura crime de responsabilidade previsto no artigo sexto, número seis, da lei de crime de responsabilidade, que diz o seguinte. ‘São crimes de responsabilidade contra o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário e dos Poderes Constitucionais dos Estados: usar de violência ou ameaça, para constranger juiz, ou jurado, a proferir ou deixar de proferir despacho, sentença ou voto, ou a fazer ou deixar de fazer ato do seu ofício’”, salientou Marrafon.

Conforme o jurista, se Bolsonaro deixar o campo das ameaças e cumprir sua promessa de não acatar decisões, o crime de responsabilidade será ainda mais evidente. “Se houver ainda mais o efetivo descumprimento de qualquer decisão judicial, aí a situação se torna mais grave, se torna então bastante caracterizado o crime de responsabilidade. Também está previsto na lei que não cumprir decisões judiciais é crime de responsabilidade do presidente da República”, finalizou.

*Marco Marrafon é advogado constitucionalista, doutor em Direito do Estado  e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 

Fonte: Olhar Jurídico
https://olharjuridico.com.br/noticias/exibir.asp?id=47164&noticia=jurista-ve-crime-de-responsabilidade-em-ameacas-feitas-por-bolsonaro-no-7-de-setembro