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Bernardo Mello Franco: A viagem do chanceler

Ernesto Araújo está irritado com as críticas. Em vez de moderar o tom, o futuro ministro reforçou a pregação contra o ‘alarmismo climático’ e as ‘pautas anticristãs’

O novo chanceler está irritado. Ernesto Araújo não gostou das críticas à sua escolha para o Itamaraty. Nessa ele tem razão. Em geral, as reações foram de preocupação e espanto. Fora da bolha bolsonarista, ninguém esperava ver um militante da alt-right no comando da política externa brasileira.

As críticas deveriam ter convencido o futuro ministro a moderar o tom. Ele escolheu o caminho oposto. Em artigo na “Gazeta do Povo”, voltou a se apresentar como um cruzado contra “pautas abortistas e anticristãs”. Também atacou o “alarmismo climático”, como se os estudos sobre o aquecimento global fossem meros boatos de WhatsApp.

Araújo se aproximou do mundo real ao comentar a repercussão da sua escolha. “Alguns jornalistas estão escandalizados, alguns colegas diplomatas estão revoltados”, constatou. Depois voltou a orbitar o seu mundo particular, onde o “marxismo cultural” estaria por trás de uma trama “para que as pessoas não nasçam”.

Dirigindo-se a um interlocutor imaginário, o novo chanceler julgou necessário informar que não precisa de uma camisa de força. “Quando me posiciono, por exemplo, contra a ideologia de gênero, contra o materialismo, contra o cerceamento da liberdade de pensar e falar, você me chama de maluco”, queixou-se.

Depois ele retomou a pregação contra as Nações Unidas, que o Brasil ajudou a fundar depois da tragédia da Segunda Guerra. “No idioma da ONU, é impossível traduzir palavras como amor, fé e patriotismo”, escreveu.

Enquanto Araújo defende ideias exóticas e bajula o novo chefe, prometendo se guiar por sua “mão firme e confiante”, cresce a sensação de o Itamaraty pode ter papel decorativo em sua gestão.

Ontem o deputado Eduardo Bolsonaro assumiu funções de chanceler e anunciou um regime de metas comerciais para os embaixadores. Os que “não trouxerem resultado”, disse, serão removidos de seus postos.

Em visita a Washington, o filho do presidente desfilou com um boné onde se lia a inscrição “Trump 2020”. A turma ainda não subiu a rampa do Planalto e já quer decidir o próximo ocupante da Casa Branca.