Eliane Catanhêde

Eliane Cantanhêde: Guerra entre petismo e antipetismo

O segundo turno está sendo antecipado e por uma disputa voto a voto entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad

Apesar dos xingamentos pelas últimas colunas, elas estavam corretas: o segundo turno está sendo antecipado e por uma disputa voto a voto entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad, o que caracteriza ou a chegada da extrema direita ou a volta do PT ao poder. O eleitorado de Bolsonaro e de Haddad é bastante diferente. Enquanto o capitão atinge 41% com renda familiar mensal acima de cinco salários mínimos, o petista dispara de 10% para 27% entre os que têm renda de até um mínimo. A curva dos dois também se cruza quando se fala em escolaridade. Enquanto Bolsonaro sobe de 29% para 36% entre os mais escolarizados, Haddad pula de 6% para 24% entre os menos escolarizados. Grosso modo, um é preferencialmente candidato dos “ricos com diploma” e o outro, dos “pobres e mais ignorantes”.

A pergunta é se Bolsonaro e Haddad bateram ou não no teto. Se é para apostar, a resposta é não, pois o candidato do PSL sobe de pesquisa em pesquisa e, com 28%, logo bate 30%. E Haddad, que deu salto de 11 pontos, ainda está com 19%, bem longe do porcentual de Lula com sua candidatura fake. O resultado prático do Ibope é que o PT já despacha emissários para os partidos adversários, especialmente PDT de Ciro, PSDB de Alckmin e MDB de Meirelles, em busca de compromissos e apoios no segundo turno. E, obviamente, no governo.

O segundo turno é uma segunda eleição, com tempo de TV igual, busca de alianças e embate cara a cara entre os candidatos. Isso tudo fará diferença, até porque, pelo Ibope, o segundo turno está ainda mais indefinido do que o primeiro foi durante todos esses meses, com empate entre Bolsonaro e Haddad. Mas uma coisa é certa: vai ser uma guerra entre petismo e antipetismo.


Eliane Cantanhêde: Amor e ódio na eleição

Erros nas campanhas no 1.º turno e guerra de rejeições no 2.º: quem você odeia mais?

Jair Bolsonaro (PSL) é campeão de intenções de votos, mas também de rejeição. Fernando Haddad (PT) é quem mais cresce nas pesquisas, mas isso tem preço: quanto mais é conhecido e mais cresce, mais sua rejeição aumenta, praticamente na mesma rapidez e proporção.

Assim como encanta eleitores homens e de alta escolaridade, Bolsonaro é rechaçado por jovens, metade das mulheres e boa parte do eleitorado de baixa renda. E Haddad, assim como colhe os votos do ex-presidente Lula, herda a rejeição ao PT, que é muito forte, consolidada.

É nesse clima de “amor e ódio” aos dois líderes das pesquisas que o primeiro turno vai chegando ao fim, com os candidatos nervosos, suas equipes batendo cabeça e todos cometendo erros gritantes. A ansiedade bate à porta de uns e o desespero, à porta dos demais. O risco é o vale-tudo.

No hospital, Bolsonaro se livra de debates e sabatinas em que exibia todo o seu desconhecimento de economia, crise fiscal, investimentos, educação... Ao se preservar, porém, também sai do foco e deixa de fazer campanha numa hora decisiva e abre o flanco para o seu vice, general Hamilton Mourão, que está botando as asinhas de fora e acaba de produzir uma das pérolas da eleição: segundo ele, casa só com mãe e avó é “fábrica de desajustados” para o tráfico. O que é isso, minha gente?

Ao gravar um vídeo no leito hospitalar, Bolsonaro demonstrou duas fragilidades: a física e o medo do crescimento de Fernando Haddad. Acusou o golpe e saiu falando em “fraude” nas urnas, o que soa assim: “As urnas só são legítimas se eu vencer. Se eu perder, é fraude”. Bem democrático...

Haddad, que tem a campanha mais calculada e estratégica, ficou entre a cruz e a espada e optou. Para atrair os fiéis seguidores de Lula, ele se assume como pau-mandado do padrinho, diz que, se eleito, vai sempre pedir a bênção a ele na cela de Curitiba e deixa no ar a intenção de, no Planalto, conceder indulto para tirá-lo da cadeia. Mas, se isso aumenta a intenção de votos de Haddad, igualmente infla a rejeição a ele. Atiça o antipetismo, que não se esquece de que Lula, Dirceu, Palocci e todos os tesoureiros petistas foram presos pelo desmanche da Petrobrás.

Ciro Gomes continua sendo Ciro Gomes, expondo enfaticamente suas virtudes, mas incapaz de dissimular seus defeitos. E não é que o cabra macho cearense foi xingar, ameaçar e pedir a prisão de um repórter em Roraima?! Por uma pergunta mais do que legítima?! Mas o pior erro da campanha de Ciro é a estratégia errática.

Ele tentou Lula, que bateu com a porta na cara dele. Tentou o PT e as esquerdas, que lhe surrupiaram o PSB. Concentrou baterias contra Geraldo Alckmin e jogou todas as culpas das mazelas do País no PSDB, defendendo Lula contra a prisão e Dilma contra o “golpe”. Só que seu “inimigo” não era Alckmin, eram o PT e Haddad, como fica claríssimo agora.

Já a campanha de Alckmin é bombardeada inclusive por tucanos, mas também por aliados, adversários, à direita e à esquerda. Um bom conselho seria o PSDB fazer fila, à frente Fernando Henrique Cardoso e Tasso Jereissati, para aprender todos um pouco de política com... o economista Persio Arida.

Enquanto o PSDB, o PP, o MDB, etc. só abrem a boca para puxar Alckmin para baixo, Arida deu ao Estado a entrevista mais política, contundente e eficaz da campanha tucana, dizendo que Bolsonaro é um “engodo liberal”, como Hugo Chávez foi na Venezuela, e lembrando a esquizofrenia da campanha do capitão: o candidato é “estatizante e corporativo”, já o seu “Posto Ipiranga”, o economista liberal Paulo Guedes, é “mitômano” e não vai mandar nada.

E Marina Silva? O problema da campanha dela não é estratégia errada, mas a total falta de estratégia.


Eliane Cantanhêde: Ventos pró-PT

Depois de passar Alckmin e Marina, Haddad tende a ultrapassar Ciro

A cada dia sua agonia e a cada uma das campanhas seu desafio, faltando apenas três semanas para as eleições mais tensas, agressivas e incertas desde a redemocratização de 1985. A consolidação de Jair Bolsonaro e o avanço de Fernando Haddad projetam a chegada da extrema direita ou a volta do PT ao poder e isso mexe com a alma e os escrúpulos dos demais candidatos, principalmente dos que estão embolados na disputa por uma vaga no segundo turno.

Bolsonaro (PSL) está confortável nas pesquisas, mas tem o desafio de fazer campanha depois de esfaqueado e de duas grandes cirurgias. Não pode se atirar nos “braços do povo” como faz há tempos em aeroportos e centros de cidades, não pode nem ao menos gravar vídeos para a propaganda eleitoral e não tem prazo para voltar à atividade política. Pior: sem o comandante, a tropa bate cabeça e seu vice, general Hamilton Mourão, já quer assumir o controle.

No lado oposto, Haddad (PT) vira o novo fenômeno de 2018 e enfrenta dois problemas. Um é ter de falar no ex-presidente Lula de manhã, de tarde, de noite e de madrugada, aumentando a percepção de que seria uma marionete de Lula, uma escada para a volta do próprio Lula à Presidência. O outro problema é que todos os candidatos batiam em Geraldo Alckmin (PSDB), mas agora desviam suas baterias para Haddad. E a artilharia mais pesada é justamente a forte rejeição ao PT em boa parte da sociedade.

Atropelado por Haddad, Ciro Gomes (PDT) deve recuar para o terceiro lugar já na próxima rodada. Seu desafio é bater em Haddad – para manter sua posição, sobretudo no Nordeste –, sem atingir Lula, de quem pretende herdar votos de esquerda em todas as regiões. Ou seja, tem de bater em Haddad, mas endeusando Lula. O segundo problema de Ciro é... ele mesmo. Como pretende negociar reformas, programas e o bem do País com Congresso, opinião pública, empresários, trabalhadores e mídia, com seu temperamento explosivo? Numa hora, simpatia; na outra, destempero.

Alckmin precisa reverter a postura autodestrutiva dos tucanos, que persegue sua candidatura dia a dia, mês a mês, há mais de um ano, e acaba de gerar a entrevista do ex-presidente do PSDB Tasso Jereissati, criticando o passado, o presente e o futuro do PSDB. Numa hora dessas? Com aliados assim, e com um MP que manda prender e devassar governadores tucanos no auge da eleição, Alckmin não precisa de adversários. Mas ele conta com um efeito que ocorre em todas as eleições: a definição de voto de na reta final, nos últimos dias, até nas últimas horas. Esse movimento tende a ser pragmático, movido pela rejeição aos extremos e a favor do centro.

Marina Silva (Rede) reclama que, quando estava em segundo lugar, ninguém considerava um feito, mas bastou cair para o terceiro para já darem a sua candidatura como perdida, o que só intensifica a queda. O fato, porém, é que Marina tem um discurso poderoso, mas tem uma articulação política e partidária frágil e passa a sensação de que seria uma presidente fraca. Candidata forte, presidente fraca. Isso, que pesou decisivamente contra ela em 2010 (pelo PV) e 2014 (PSB), se repete em 2018. Com uma curiosidade (ou injustiça): ela tem a segunda maior rejeição. Por quê?

Há aflição e angústia também nas campanhas de Meirelles (MDB), Alvaro Dias (Podemos) e João Amoedo (Novo), que têm juntos 9% e, sem condições de virar o jogo e de vencer, cumprem o papel de derrotar um nome de centro e ajudar a polarização entre a extrema direita e a volta do PT. O mais prejudicado foi Alckmin, mas uma desistência dos três agora tenderia a favorecer Jair Bolsonaro, que, por ironia, é a melhor garantia de vitória de Haddad no segundo turno. Os ventos, portanto, sopram a favor do PT. Quem diria?


Eliane Cantanhêde: Toffoli cá, Haddad lá

Campanha ganha novo ingrediente: o movimento para soltar Lula em 2019

Nenhum candidato diz isso claramente, mas a posse do ministro Antonio Dias Toffoli na presidência do Supremo Tribunal Federal reforça um discurso crescente na campanha eleitoral: o de que a eleição do petista Fernando Haddad seria a porta aberta para a volta ao poder de Luiz Inácio Lula da Silva.

Os dois movimentos, Toffoli no STF e o crescimento de Haddad nas pesquisas (8% pelo Ibope), convergem na mesma direção: a desconfiança de que Lula será solto de alguma forma em 2019.

A intenção de Toffoli é pôr em pauta no plenário, logo no início do ano, a prisão após condenação em segunda instância. A antecessora Cármen Lúcia encerrou seu mandato cumprindo a promessa de não fazê-lo. Toffoli o fará. Como a última decisão sobre a questão foi por um único voto, não é impossível mudar.

E Haddad presidente seria não apenas Lula dando as cartas, como a possibilidade real de soltar Lula por indulto. Aliás, ele ou Ciro Gomes (PDT), que já admitiu publicamente a hipótese durante a campanha.

Há, porém, outros aspectos a serem considerados nos dois casos. Um deles é que, não raro, as pessoas se superam ao assumir imensos desafios e prezam, antes de seus compromissos políticos ou partidários, o seu próprio nome e a sua imagem para a história.

Toffoli, 50 anos, é o mais novo presidente da história do Supremo. Sua nomeação por Lula como ministro da Corte causou surpresa, perplexidade e crítica, não só pela idade, mas porque ele fora reprovado em duas provas para juiz, não era um nome brilhante no meio jurídico e tinha como credenciais ter sido advogado do PT, assessor da Casa Civil de José Dirceu e advogado-geral da União de Lula.

Toffoli, porém, de bobo não tem nada. Ao assumir a cadeira, informou-se, aproximou-se dos colegas, ganhou passe livre no gabinete de Gilmar Mendes, nomeado por FHC, identificado com o PSDB e considerado, goste-se ou não dele, um dos mais preparados e técnicos ministros do Supremo.

Foi assim também, na busca de reconhecimento e de negociação com os extremos, que Toffoli saiu do seu gabinete no STF, cruzou o Eixo Monumental e foi até o Quartel General do Exército conversar com o comandante, general Eduardo Villas Bôas.

Saiu dali com o nome do respeitado general Fernando de Azevedo e Silva para sua assessoria especial na presidência.

Gesto inteligente, sobretudo num momento em que o comandante do Exército alerta para a legitimidade do próximo presidente da República, o candidato líder nas pesquisas é um capitão reformado e seu vice é um general de quatro-estrelas que acaba de deixar a ativa. Sem maldade, apenas como constatação, Toffoli atraiu o “inimigo” para bem perto dele. E tem um canal direto com as Forças Armadas.

Quanto a Haddad: ele assumiu simultaneamente a candidatura pelo PT e uma vaga no “segundo pelotão”, aquele que disputa chegar ao segundo turno contra Jair Bolsonaro (PSL). E, assim, passa a ser alvo natural de todos os demais concorrentes, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Marina Silva.

A diferença é que Ciro disputa o espaço de esquerda diretamente com Haddad e não pode bater em Lula, para não afugentar votos principalmente do Nordeste, onde já lidera com 18%. Marina bate na polaridade PT x PSDB e Alckmin não tem restrições, está livre para bater. No seu discurso, Bolsonaro é “passaporte para a volta do PT” e Haddad, para a volta de Lula.

Logo, os três procuram uma brecha ao centro para furar o embate Bolsonaro-Haddad, que caracteriza a chegada da direita radical ou a volta do PT, Lula e Dilma. Em suma, Ciro, Alckmin e Marina são os candidatos do mesmo partido, o “voto útil”.


Eliane Cantanhêde: Dia de festa para Bolsonaro no hospital

O Ibope deu uma grande notícia para Jair Bolsonaro (PSL), que cresceu seis pontos, de 20% para 26%, entre agosto e setembro, reduziu sua ainda altíssima rejeição de 44% para 41% e, em vez de perder, agora está em empate técnico com os adversários no segundo turno.

O campo da pesquisa foi sábado, domingo e segunda-feira, capitando toda a perplexidade e a solidariedade do eleitorado depois da facada contra Bolsonaro, na quinta-feira, dia 6. E, assim, ele vai cristalizando seus votos e se consolidando na dianteira da eleição.

Na outra ponta, Fernando Haddad finalmente assumiu a candidatura pelo PT, tendo Manuela d'Ávila, do PCdoB, na vice. Quanto mais ele cresce – dobrou de 4% para 8% de um mês para o outro -, mais Marina Silva (Rede) cai.

Ela recuou de 12% para 9% e perdeu o segundo lugar para Ciro Gomes (PDT), que oscilou de 9% para 12% e depois para 11%. Se Marina cai e Haddad sobe, Ciro e Geraldo Alckmin (PSDB) estão estáveis. O tucano em 9%.

Bolsonaro está isolado no primeiro lugar e todos os demais têm chances de disputar o segundo turno contra ele: Ciro, Marina, Alckmin e Haddad. Mas a novidade da campanha e a trajetória mais animadora, por ora, é a do petista, que entra no vácuo da popularidade do ex-presidente Lula.

Enquanto Alckmin perde votos para Bolsonaro, Amoêdo (Novo), Meirelles (MDB) e Alvaro Dias (Podemos), Haddad perde para Ciro. O petista tem mais tempo na TV, seguidores nas redes sociais e estrutura partidária, além de Lula. Em desvantagem técnica, Ciro vai ter que disputar a esquerda no “gogó”, que, aliás, é o seu forte.


Eliane Cantanhêde: Todos por um

Se Lula pode fazer campanha da prisão, por que Bolsonaro não poderia fazer do hospital?

A foto que circula por toda parte de Jair Bolsonaro na sala de cirurgia, de peito nu, anestesiado e ligado a aparelhos, é a confirmação contundente de que sua campanha continua, e continua ainda mais forte. Se Lula faz campanha da prisão, por que ele não pode fazer do hospital? Todos os demais candidatos estão imobilizados, Bolsonaro é o único que está realmente em campanha.

Na base de “todos por um”, Marina Silva, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, Guilherme Boulos, todos enfim capricharam no discurso pela democracia e na emocionada solidariedade ao adversário. E estão sem estratégia, de mãos atadas. Têm de confrontar o líder nas pesquisas, mas não podem confrontar a vítima de um ataque feroz.

Que estratégia política haveria diante de uma facada para valer, com graves consequências, exigindo duas cirurgias? Qualquer coisa soando como estratégia seria, além de profundo mau gosto, um tiro pela culatra. A opinião pública, que adora tragédias e mártires, ficaria imediatamente indignada, talvez enojada.

O PSDB, aliás, deu azar. Não teve tempo de mudar suas peças publicitárias da sexta e do sábado e elas são carregadas de críticas a Bolsonaro. Contra o candidato do PSL seria legítimo, talvez até necessário, mas à vítima de um ataque brutal e covarde, no meio da multidão, gravado e espalhado aos quatro ventos?

Bolsonaro passa por momentos dolorosos, com risco de morte, cirurgias, ambulâncias, transferência para São Paulo, mas andam cuidando diligentemente de fazer uso político máximo do crime e de suas dores. Ao lado de fotos da intimidade do, afinal, paciente, seus seguidores tentam massificar a versão de que ele, “o mártir”, foi esfaqueado “por contrariar interesses inconfessáveis de ricos, poderosos e corruptos”.

Até prova em contrário, nada confirma que tenha sido isso e tudo indica que o ataque não foi obra de “poderosos”, mas de tresloucados, “por questões pessoais”, “a mando de Deus”. De doentes inconsequentes, um deles com passagem pelo PSOL e pela polícia. Transformar uma ação insana num atentado político de grandes proporções é perigoso.

Assim, o Brasil vai vivendo de solavanco em solavanco. As denúncias de Rodrigo Janot contra o presidente da República interromperam as reformas e o reaquecimento da economia, a greve dos caminheiros jogou todos os indicadores ladeira abaixo, arrastando mais uma arrancada da economia e recuperação de empregos. E, por perversidade e descaso, as labaredas do Museu Nacional acabam por incinerar o resto de amor próprio brasileiro.

E pode piorar. A eleita em 2014 foi um desastre e caiu, o segundo lugar pode parar na cadeia, o líder nas pesquisas de 2018 já está entre as grades, seu substituto na liderança foi esfaqueado e os demais estão embolados, disputando quem será a “onda” da vez para tentar o segundo turno.

A queda do avião de Eduardo Campos, antes do início do horário eleitoral, teve importante impacto sobre as eleições passadas, mas jamais saberemos como teria sido se ele não tivesse morrido. O ataque a Jair Bolsonaro, com a propaganda no ar e os indecisos começando a se definir entre praticamente todos os candidatos, tem, obviamente, impacto na eleição deste ano. Logo saberemos exatamente qual é, e em que dimensão, mas ficaremos eternamente nos perguntando: e se Bolsonaro não tivesse sido esfaqueado?

PSOL. Criado a partir de uma costela à esquerda do PT, o PSOL não anda nos seus melhores dias. Cabo Daciolo ter sido do partido (depois, expulso) é só engraçado. O esfaqueador de Bolsonaro ter sido filiado é muito mais grave, não tem graça nenhuma. Para piorar, a UFRJ, responsável pelo Museu Nacional, está nas mãos de quem mesmo?


Eliane Cantanhêde: Campanha catatônica

A facada em Bolsonaro atinge uma pessoa, o líder nas pesquisas e a própria eleição

O ataque contra Jair Bolsonaro é de extrema gravidade porque atinge uma pessoa, um deputado, o líder nas pesquisas presidenciais. E mais: afeta diretamente as eleições e joga a pobre democracia brasileira no perigoso terreno das fake news, do oportunismo político e do jogo das acusações levianas, recheadas de interesses os mais diversos e danosos.

O mais importante, neste primeiro momento, é a solidariedade humana com Bolsonaro. Goste-se ou não das suas ideias e do que projeta caso seja eleito presidente, ele é a vítima. Jamais podemos transformar vítimas em réus, como muitas vezes ocorre com mulheres estupradas, espancadas e até mortas. Vítimas são sempre e, simplesmente, vítimas.

Mas, a menos de um mês da eleição, e tratando-se de quem se trata, é fundamental também investigar eventuais motivações políticas, evitar a contaminação mortal das eleições e, principalmente, uma metralhadora giratória contra “culpados” que só têm “culpa” nas irresponsáveis ou manipuladas redes sociais. Se já estão fora do controle normalmente, imagine-se onde podem parar depois dessa tragédia...

O fato, em si, é lamentável e condenável sob todos os aspectos e une os candidatos dos diferentes partidos e tendências na indignação. Mas é preciso, a bem do processo, a bem da democracia, que fique restrito ao que é, não ao que querem que seja.

O criminoso atribuiu sua ação a “questões pessoais”, mas toda a sua vida e todas as suas ligações ou preferências políticas estão sendo levantadas, para que não pairem dúvidas nem fantasmas que às vezes duram anos ou décadas, aqui e lá fora. Vide os assassinatos de John Kennedy, na maior democracia do planeta, e de Celso Daniel e de PC Farias, nas nossas barbas.

No caso de Bolsonaro, nenhuma versão política está autorizada, não apenas pelo mero bom senso como pela gravidade que tudo isso assumiu. Não se invente que os bolsonaristas tentaram criar um “mártir”, nem que as esquerdas tentaram eliminar à faca um candidato que cresce à custa de armas, nem que sei lá quem tenta incriminar o partido tal ou qual para demonizá-lo no eleitorado, na opinião pública.

Até este momento, tudo isso não é apenas elucubração, é o mais torpe uso político de um ataque que poderia ter custado a vida de alguém, e alguém que lidera as pesquisas – e a rejeição – na corrida à Presidência da República.

O atentado ocorre justamente no dia seguinte à divulgação da pesquisa Ibope que mostra o crescimento de dois pontos nas intenções de votos de Bolsonaro, de 20% para 22%, confirmando a consolidação de sua liderança. Quem esperava que ele “esfarelaria” com a campanha enganou-se.

Mas, se é campeão de intenções de votos, ele é também campeão de rejeição. E, neste caso, a subida não foi apenas de dois pontos, mas de sete pontos: de 37% para 44%. Dizem os experts em pesquisas que uma rejeição acima de 40% costuma ser fatal para candidatos e o próprio Ibope ilustra com clareza essa constatação.

Se é o favorito no primeiro turno, Bolsonaro perde no segundo, de nove a onze pontos, para Marina Silva, Ciro Gomes e Geraldo Alckmin. E empata em 37% a 36% com o petista Fernando Haddad, que só assumirá oficialmente a candidatura no dia 11, terça-feira.

De toda forma, Jair Bolsonaro já conquistou o título de grande fenômeno destas eleições e a facada que o atingiu ontem atinge também todo o processo eleitoral, que está em suspenso. Ciro Gomes, Marina e Alckmin já tinham cancelado seus compromissos de campanha desde ontem e, se a eleição já era imprevisível, agora está catatônica.

Tudo parou, tudo congelou e o País inteiro só fala numa coisa: Bolsonaro. Inclusive, ou principalmente, os próprios adversários dele.


Eliane Cantanhêde: Sem Lula lá

Fachin ficou isolado no TSE ao forçar a elegibilidade de um inelegível

É de uma ironia incômoda que tenha sido justamente do relator da Lava Jato no Supremo, Edson Fachin, o único voto no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a favor da candidatura à Presidência da República de alguém condenado e preso pela própria Lava Jato. Fachin perdeu de 6 a 1 no julgamento que impediu o ex-presidente Lula de continuar brincando com a Justiça e o eleitor.

O voto de Fachin surpreende, e de certa forma choca, por partir de quem partiu e pela incongruência. O ministro reconheceu que Lula, como ficha suja, é flagrantemente inelegível. Mas considerou que uma recomendação de um comitê quase diletante da ONU se sobrepõe às leis brasileiras. Advogado, professor de Direito, relator da Lava Jato, ministro do Supremo e agora também do TSE, Fachin não sabe que:
1 – O Comitê de Direitos Humanos da ONU não representa Estados, apenas reúne peritos independentes, e não pode determinar nada, obrigar nada, só fazer relatórios?

2 – Dos 18 integrantes do comitê, apenas dois (dois!), segundo o relator do registro de Lula no TSE, Luiz Roberto Barroso, subscreveram o texto do comitê que pretendia manter Lula candidato fazendo campanha a partir da cela da PF de Curitiba?

3 – Ao produzir uma recomendação de tamanha ousadia, os dois peritos estrangeiros nem sequer se deram ao trabalho de ouvir o contraditório, de pedir informações ao Estado brasileiro sobre o que se passava internamente?

4 – A delegação permanente do Brasil em Genebra se manifestou oficialmente contra qualquer consequência prática da recomendação do comitê sobre as eleições no Brasil?

5 – O comitê, segundo Barroso, não tem nenhum papel jurisdicional e suas recomendações não têm efeito vinculante, não se sobrepõem às leis brasileiras, não são obrigatórias e, portanto, nem preveem alguma sanção caso ignoradas?

6 – O comitê é uma coisa, o Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU é outra coisa? Esse, sim, representado por Estados?

No seu voto, Barroso lembrou que a definição dos candidatos é indispensável para a segurança jurídica da eleição. Logo, ao esticar ao máximo todas as etapas para manter a candidatura fake de Lula, o PT estava criando insegurança jurídica. Em bom português, tumultuando propositalmente o processo.

Todos os demais ministros, exceto Fachin, acataram o voto do relator, que barra a candidatura Lula, seus atos de campanha, sua propaganda na TV e seu nome na urna eletrônica, dando ao PT dez dias para trocar o candidato, ou seja, para assumir finalmente Fernando Haddad.

Muito respeitado no Paraná, Fachin ficou conhecido fora dele ao discursar em evento eleitoral de Dilma Rousseff. No STF, tem altos e baixos desde que acatou, de um dia para o outro, a denúncia de Rodrigo Janot contra o presidente da República, Michel Temer, baseada numa fita que não fora sequer submetida a perícia e cuja degravação da PGR não correspondia exatamente ao áudio.

Depois, o ministro passou a brilhar na opinião pública, por ser voto vencido, uma espécie de vítima, na segunda turma do Supremo, enfrentando Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, que “soltam todo mundo” e até garantiram elegibilidade para o inelegível Demóstenes Torres.

Agora, Fachin ficou em posição inversa, pois foi ele quem tentou garantir elegibilidade para o inelegível Lula e ficou isolado no plenário do TSE. Assim, volta a alimentar uma dúvida: afinal, quem é Edson Fachin?

Apesar de eventuais recursos, a eleição enfim ganha sua forma definitiva, com todos os candidatos assumidos e em condições de luta por uma vaga no segundo turno. Lula continua com imensa relevância no processo e, da cela, jogará todo o seu peso para eleger Haddad. Essa não é uma questão jurídica, é política e eleitoral. Ele é bom nisso.


Eliane Cantanhêde: Metralhadora giratória

Os candidatos atiram uns nos outros, para sobreviver e enfrentar PT e Bolsonaro

Com o início da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV, hoje dos candidatos aos governos, amanhã dos presidenciáveis, a eleição muda totalmente de figura. Vão-se os senhores e senhoras elegantes e propositivos e entram no ar verdadeiros digladiadores. Sem defender propostas objetivas até aqui, agora partem para o ataque.

Jair Bolsonaro já descartou vestir a fantasia de “Jairzinho Paz e Amor”, numa referência ao “Lulinha Paz e Amor” da eleição de 2002. E é ele, Bolsonaro, quem tem uma verdadeira metralhadora giratória contra PT, Marina, Alckmin, Ciro... Por quê? Porque é campeão simultaneamente de votos e de rejeição nos cenários sem Lula. Assim, ele tem fortes chances de chegar ao segundo turno e iguais chances de ser derrotado então por qualquer um dos demais. Assim, atira para todo lado.

Se chegar ao segundo turno contra Lula/Haddad, ele pode reunir todos contra ele e se tornar grande instrumento da vitória do PT. Seus eleitores atiram no que veem – Bolsonaro – e acertam no que não veem – o PT. Arriscam-se a conseguir o oposto do que pretendem: a volta do PT ao poder, na tentativa justamente de evitá-la.

Pelas pesquisas, Bolsonaro ainda bate Haddad, até porque ele nem candidato é ainda, mas perde de Alckmin, Marina, Ciro. Logo, mira Alckmin, Marina, Ciro, que, aliás, acusou o adversário de “Hitlerzinho tropical”, com uma diferença: Hitler, segundo ele, tinha mais recursos intelectuais.

Se apanham do líder das pesquisas sem Lula, os demais se engalfinham entre eles, disputando quem consegue derrotar tanto Bolsonaro quanto o PT no segundo turno. Nos bastidores, entre um cafezinho e outro, todos têm um alvo prioritário. Enquanto Bolsonaro vai de vento em popa e Haddad tem enorme potencial, os demais, aí incluídos João Amoedo, Alvaro Dias e Henrique Meirelles, parecem preocupados mesmo é com Alckmin.

Patinando nas pesquisas de primeiro turno, tirando o sono dos aliados, perdendo votos para Bolsonaro e Dias, por que se preocupar e gastar tempo, saliva e munição com o tucano? Pela percepção de que, com a coisa caminhando para um segundo turno entre Bolsonaro e PT, o tucano pode virar o principal beneficiário do voto útil contra os extremos.

A campanha de Alckmin, que não combina com tiro e guerra, parece cheia de dúvidas sobre como usar o imenso tempo de TV (40% do total). Contra o capitão, entrincheirado nas redes sociais? Ou contra o PT? Na estreia, partiu para cima de Bolsonaro e sua obsessão por armas. E ele reagiu.

Hoje, Marina Silva é quem se destaca no pelotão anti-PT e anti-Bolsonaro, mas ela, Ciro, Alckmin, Dias, Meirelles e Amoedo não parecem tirar votos dos dois, mas deles mesmos, estimulando uma corrida em círculo dos quase 40% de eleitores e eleitoras indefinidos, que pulam de um em um, sem saber em qual deles se fixar.

Marina e Ciro, com um risco adicional. Ambos lideram no Nordeste e dobram seus votos, ela para 16%, ele para 10%, quando Lula não está nas pesquisas. Mas, assim que o eleitor perceber que Haddad é Lula, eles tendem a perder esse diferencial e recuar, em vez de avançar.

Tudo somando, a eleição tem Bolsonaro consolidado de um lado, Haddad ameaçando de outro e o resto embolado e errando o alvo. Sem contar que Bolsonaro tem a turma da bala, do grito, da agressão, enquanto o PT não tem o menor prurido em acionar “aloprados” e já foi pego pagando mercenários para atirar mentiras nas redes contra adversários, jornalistas, analistas e eleitores anti-Lula/Haddad.

A propaganda eleitoral, portanto, começa em clima de guerra e sem limites. Salve-se quem puder! E salve-se a democracia!


Eliane Cantanhêde: Arrastão do Bolsonaro

O candidato do PSL à Presidência avança sobre agronegócio, evangélicos e malufistas, eleitorados que pareciam ter 'dono', ou 'dona'

Nas pesquisas sem o ex-presidente Lula, Jair Bolsonaro (PSL) lidera em todas as regiões, menos no Nordeste, e avança sobre votos que seriam naturalmente de seus adversários em três segmentos ao menos: agronegócio, evangélicos e, como mostrou o Estado, até os velhos malufistas de São Paulo. Mas, se tem 20% a seu favor, ele precisa amansar os 37% que não votam nele de jeito nenhum e disputar os incríveis 38% ainda sem voto.

Na opinião de Marina Silva (Rede), a segunda colocada, a transferência de votos para um neófito em disputas presidenciais como Bolsonaro, inclusive ou principalmente de setores evangélicos, se deve a um “populismo de extrema direita”. Ela reforça o perigo do populismo, tanto à direita quanto à esquerda, mas o difícil é o eleitor e a eleitora se darem conta disso.

Não fosse a solidez da agricultura, a recessão dilmista teria ido ainda mais fundo, teria sido mais danosa, e o agronegócio brasileiro não é apenas um dos mais competitivos do mundo como tem líderes, máquinas e logística modernos e sofisticados, mas continua sendo fortemente conservador em termos de costumes. Nada como um candidato que fale em ordem, tradição, família, Deus e... armas.

Pelo Ibope, Bolsonaro lidera no Centro-Oeste, no Norte e no Sul, tirando votos que escaparam do PSDB. Há poucos dias, enquanto o tucano Geraldo Alckmin prometia tratores para a agricultura, ele acenava com liberação das armas, num discurso que anima mais a plateia, além de render mais reportagens e manchetes. Tratores eles já têm, mas a questão das armas ainda é polêmica e enfrenta muita resistência no Brasil. Ainda bem.

É com esse discurso também, de ordem, família..., que o capitão da reserva foi se infiltrando no eleitorado evangélico, fatiado em diferentes designações, espalhado por todo o País e mais engajado nas eleições do que qualquer outro grupo religioso. Apesar de ser a única candidata evangélica, Marina está sendo vítima direta desse ataque especulativo.

Em 2014, Marina teve 43% de votos evangélicos, mas hoje está com 12%, enquanto Bolsonaro abocanha 26% difusamente, ou seja, nos diferentes Estados e regiões. Com um detalhe: os evangélicos não são apenas fortes, eles continuam em ascensão. E, assim como há a Frente Parlamentar da Agricultura, há no Congresso uma forte bancada evangélica que tende a aumentar a partir de 2019 e ser uma mão na roda para qualquer presidente, em especial um que seja de um pequeno partido e não tenha feito coligações consistentes na eleição.

Pela reportagem do Estado, também os velhos e resilientes malufistas de São Paulo estão sendo fisgados pelo discurso de extrema direita de Bolsonaro. Com o declínio político do indescritível Paulo Maluf, eles vinham nas últimas eleições se bandeando para os candidatos do PSDB, que mandam e desmandam no Estado há décadas. Mas, enfim, parecem ter encontrado um substituto à altura para seu ídolo, agora em prisão domiciliar, com tornozeleira e tudo.

Curiosidade: uma das bandeiras de Bolsonaro é o combate à corrupção, mas vamos convir que Maluf não se encaixa aí. Nenhum Sérgio Cabral, nenhum Eduardo Cunha, ninguém tira o troféu de Maluf nessa área, porque “quem já foi rei nunca perde a majestade”. Assim, os votos malufistas vão para Bolsonaro pela a identidade de direita, a tradição, as armas, nada a ver com anticorrupção.

Além de 30% no Norte-Centro Oeste e dos 23% no Sul, Bolsonaro tem 21% no Sudeste, onde se concentram 43% dos eleitores, e só no Nordeste, com 13%, ele perde para Marina (17%) e Ciro Gomes (14%). Mas não se esqueçam: quanto mais Bolsonaro cresce nesses setores, mais ele aumenta sua rejeição em vários outros. No segundo turno, rejeição pode ser fatal.


Eliane Cantanhêde: PT: mídia, internet e TV

Lula, Bolsonaro e Alckmin têm artilharia; mas Lula tem, além da própria, a dos adversários

Lula é imbatível ao usar (e abusar) da mídia e estar sempre nos jornais, rádios, TVs e revistas. Bolsonaro viu antes de todos o poder multiplicador das redes sociais. Alckmin dispõe de um latifúndio da propaganda eleitoral no rádio e na TV. Marina e Ciro vão ter de enfrentar essa artilharia no gogó.

Lula foi condenado e preso, o PT afundou até vencer numa única capital – a pequena Rio Branco, no Acre – e, apesar de tudo isso, o ex-presidente foi se recuperando e hoje é o campeão nas pesquisas de primeiro e segundo turnos. Como explicar?

Fácil. Ele e o PT são mestres no marketing, na propaganda, sabem criar notícia, garantir visibilidade e usar a patrulha para acuar os críticos. Lembram do “Fome Zero”? Um plano vazio, mas de efeito midiático acachapante. No final, virou um selinho escondido nos programas sociais da era PT, na verdade uma fusão dos herdados de FHC.

Aliás, que tal a “herança maldita”? Como diz Marina Silva, Fernando Henrique escancarou o seu governo para Lula, na mais civilizada transição pós-redemocratização, mas a primeira coisa que Lula fez ao assumir foi escrachar a “herança maldita”. Colou, apesar do Plano Real, da blindagem do sistema financeiro, das agências reguladoras e dos planos sociais, como o Bolsa Família. Tudo que Lula “vende” cola.

E, aí, temos Lula campeão de votos, mesmo preso, mas Jair Bolsonaro não é bobo. Político medíocre, do “baixo clero” da Câmara, ele foi esperto e viu antes o poder multiplicador da internet. Enquanto os adversários trabalhavam ou se viam às voltas com a Justiça, como Lula, ele amealhava multidões na nuvem e mergulhava nelas viajando pelo País afora.

O resultado é que ninguém dava bola para Bolsonaro e ele hoje não é apenas o número um no cenário sem Lula como tem 5,5 milhões de seguidores só no Facebook. Lula, que lá atrás, há muitos anos, foi o primeiro a usar as redes para reagir a notícias negativas e detratar críticos e jornalistas, tem 3,7 milhões. Geraldo Alckmin, na lanterna, 913 mil. Perdeu essa guerra. Por teimosia e por uma visão antiquada das campanhas – ou do mundo? –, o candidato tucano dava de ombros para esse negócio de Facebook, Twitter, WhatsApp... “Quem ganha eleição é a televisão”, dizia. Além da rima pobre, há controvérsias...

Alckmin tem 5 minutos e 434 inserções de TV para usar como palanque: falar o que bem entende, sem ser contestado. Bolsonaro tem 8 segundos e onze inserções. O que dizer em 8 segundos? “Meu nome é Jair”? Ele deveria controlar o pavor de controvérsia e ir a debates e entrevistas, inclusive à do Estadão-Faap, nesta semana, para não sumir. Marina vai muito bem nessa fase e é a segunda colocada no cenário sem Lula. O risco é perder fôlego na fase decisiva, como em 2014, mesmo sem o PT jogando sujo com a versão de que ela “tiraria a comida do prato do povo”.

E Ciro, depois de jogado fora pelo PT e recusado pelo DEM, não se destaca nem na mídia, nem nas redes, nem na propaganda gratuita: tem 38 segundinhos e 51 inserções. Talvez por isso, ele está mais leve, mais simpático. O pânico de vencer passou? Como me disse a psicanalista Marta Suplicy: “Ciro, claramente, não quer ganhar”.

Assim, Lula, Bolsonaro e Alckmin têm artilharia, mas Lula tem mais. Abusa de ações, questionamentos e habeas corpus para efeito jornalístico e vai bem nas searas de Bolsonaro e Alckmin. Líder no uso da mídia, é o segundo na internet (3,7 milhões no Facebook) e na TV (2 minutos e 189 inserções). Tudo somado, Fernando Haddad já entra na guerra armado até os dentes. Nem pode reclamar da real “herança maldita”.

‘Bravura’. Não bastasse o atual número de mortos, Bolsonaro propõe condecorar quem reagir a assaltantes. Haja medalha para tanto defunto!


Eliane Cantanhêde: Sul, o queridinho da vez

Nem do Nordeste nem de Minas Gerais, os vices miram os 52% de votos femininos e os 14,5% do Sul

As novidades da eleição de 2018 vêm sendo todas derrubadas, mas eis que surge uma de onde menos se esperava: os vices não saíram nem do Nordeste nem de Minas Gerais. A turma deixou de dar murro em ponta de faca para arrancar votos nordestinos do PT, e o PSDB avalia que os votos mineiros estão em boas mãos com o tucano Antonio Anastasia disputando o governo.

Se há algum vice nordestino no primeiro pelotão é Eduardo Jorge (PV), na chapa de Marina Silva (Rede), mas ele só nasceu na Bahia e fez toda sua vida política em São Paulo, que tem 33 milhões de eleitores.

Prevaleceu a corrida pelo forte e desconfiado voto feminino, que soma 52% do eleitorado e a tentativa de evitar a dispersão dos 21,4 milhões de votos do Sul entre os presidenciáveis. Nada menos que quatro candidatos a vice são do Rio Grande do Sul: Ana Amélia (PP), de Alckmin; Manuela d’Ávila (PCdoB), de Fernando Haddad, ops!, de Lula; Germano Rigotto, de Meirelles; Hamilton Mourão, de Bolsonaro.

A lógica da escolha da senadora Ana Amélia é clara, porque ela tem o objetivo de segurar as traições do PP, recuperar os 4% de intenções votos de Alvaro Dias (Podemos) no Sul para o PSDB e evitar que a tropa sulista marche para Bolsonaro. Três dos ex-presidentes do regime militar eram gaúchos: Costa e Silva, Emílio Médici e Ernesto Geisel.

Aliás, Bolsonaro teve de tudo para vice, de príncipe a astronauta, de pastor a general, de socialite rica à advogada Janaína Paschoal, mas ele acabou chovendo no molhado. O que o general Mourão acrescenta à chapa do capitão Bolsonaro? E quem bate continência para quem? A chapa miliar “puro-sangue” pode até segurar as intenções de votos recolhidas até aqui, mas dificilmente amplia o seu horizonte.

Do outro lado do espectro político, o PCdoB jurou que iria com candidata própria para a Presidência pela primeira vez, depois de ficar sempre a reboque do PT, e chegou até a fazer convenção em Brasília para lançar Manuela Dávila. Acreditou quem quis.

Mais esta “novidade” foi por água abaixo quando o PCdoB desistiu da gaúcha para continuar sendo satélite do PT. Criou, assim, uma figura interessante: a vice do vice. Como assim? Manuela deixou de ser candidata a presidente para ser vice do ex-presidente Lula, que, como todos sabemos, está tecnicamente impedido de disputar. Então, Manuela é vice de Haddad, que é “vice de Lula”. O teatro continua.

Ciro Gomes, jogado às traças por Lula, pelo PT, pelo PSB e pelo DEM, teve de se contentar com uma chapa puro-sangue, mas só em se tratando de partido, não exatamente de ideologia. Ciro é do PDT, sua vice Kátia Abreu também. Mas Ciro jura que é de esquerda e tudo que Kátia Abreu não é, e nunca foi, é de esquerda. Trata-se de uma líder ruralista competente e determinada, que se elegeu para o Senado e já presidiu a Confederação Nacional da Agricultura (CNA).

Sua única e fugaz incursão pela “esquerda” foi o voto passional contra o impeachment da amiga Dilma Rousseff, o que jogou Kátia num limbo ideológico: perdeu toda a força política que realmente tinha na CNA e no mundo do agronegócio e nem por isso ganhou apoio, simpatia e cumplicidade nas esquerdas, nem mesmo no PT.

É assim que, depois de tanto se falar em Joaquim Barbosa, João Doria, Luciano Huck, Flávio Rocha e Paulo Rabello de Castro, a eleição afunila para políticos experientes e tradicionais. E não me venham dizer que Bolsonaro não é político, depois de um quarto de século na Câmara dos Deputados e com três filhos na política.

Com esse fim das “novidades”, já não é mais impossível o velho e conhecido Fla-Flu entre PT e PSDB. Ainda tem muito jogo, mas parece até cada vez mais provável.