Eleições

Folha de S. Paulo: 'O problema do Bolsonaro não é econômico, é civilizatório', diz ex-presidente da Fiesp

Horácio Lafer Piva afirma também que se espanta com o fato do centrão comandar a cena política

Por Josette Goulart, da Folha de S. Paulo

Líder nas pesquisas, aplaudido por industriais, ovacionado como mito em aeroportos.

A combinação destes fatores tem dado a sensação no mercado financeiro e entre grandes empresários de que Jair Bolsonaro, mesmo afeito a declarações polêmicas, parece não representar uma ameaça à economia do país.

O empresário Horácio Lafer Piva, 61, é um dos que atesta que o problema de Bolsonaro não é o da condução da economia. Mas ele completa sua sentença: “O problema do Bolsonaro é civilizatório. O Brasil retrocederia neste ponto e voltaria a discutir temas como gênero, segurança… O Brasil não precisa disso”.

Piva é o comandante de uma das principais indústrias de papel do país, a Klabin, e foi presidente da Fiesp. Em entrevista à Folha, o empresário disse que se espanta com o fato de o “centrão” comandar a cena política.

Os partidos que compõem esse grupo —DEM, PP, PRB e Solidariedade— estão sendo hoje paparicados pelas candidaturas de Ciro Gomes (PDT) e de Geraldo Alckmin (PSDB), pela força que podem trazer às suas campanhas, principalmente em tempo de televisão. O MDB, para ele, também é outro grande centro de interesses.

“Acreditar demais neste momento nos candidatos é perda de tempo”, diz Piva. “Quais são as demandas do centrão? Só vamos saber mais adiante. Proponho-me a acreditar no que os candidatos estão dizendo só depois de já terem negociado.”

O centrão tem tido força para barrar votações consideradas importantes pelos empresários, como aconteceu com a reforma da Previdência. E também para apoiar outras reformas consideradas ruins pelo empresariado, como a política.

“Maior golpe que teve no Brasil foi o da reforma política, que manterá a política nas mãos dos mesmos”, diz Piva, referindo-se às mudanças nas regras que, na prática, inviabilizam o potencial de novas candidaturas para o Legislativo.

Historicamente o empresário é ligado ao tucanato, mas ele não declara voto ou mesmo não-voto neste momento a qualquer candidato.

Na sua avaliação, apenas quatro têm chances reais de se eleger: Alckmin, Bolsonaro, Ciro e Marina. De antemão, coloca dúvidas sobre uma chance real de transferência de votos de Lula a um candidato do PT, que ele acredita que será Fernando Haddad.

Marina, segundo Piva, tem grande potencial de se mostrar como uma alternativa ao eleitor desalentado, desde que consiga se destacar na campanha. A candidata terá apenas 10 segundos de tempo de TV.
Alckmin depende das coligações para decolar e Ciro tem se colocado como uma opção de centro, mesmo que de esquerda. “Mas é muito cheio de certezas e com viés muito estatizante”.

No cenário traçado nas conversas entre empresários e representantes de mercado financeiro, só há uma certeza: a de que ninguém tem certeza. “Mesmo aqueles que tentam apontar as certezas não estão tão certos quando pressionamos um pouco”, diz Piva.


El País: Recusa de dois ‘vices’ coloca em xeque o poder político de Bolsonaro

Em 24 horas, o líder nas pesquisas de opinião assistiu ao cobiçado PR e ao nanico PRP fecharem as portas para uma aliança eleitoral

Por Rocardo Della Coletta, do El País

Jair Bolsonaro (PSL) aparece como líder em todas as pesquisas de intenção de voto para presidente da República na ausência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso há três meses em Curitiba. Mas o entusiasmo de seus eleitores não tem se materializado nas parcerias políticas necessárias. Nas últimas 24 horas, o capitão reformado do Exército levou dois nãos de potenciais candidatos a vice-presidente, o que pode colocá-lo na corrida eleitoral em condições muito desfavoráveis em relação a outros candidatos.

As negociações com o PR (que é dono de 45 segundos do horário eleitoral) naufragaram nesta terça-feira, o que jogou por terra a única esperança que os aliados do militar nutriam para ter um tempo significativo na propaganda de rádio e televisão — o nanico PSL dá a Bolsonaro míseros oito segundos. No mesmo dia, o pré-candidato ofereceu a vaga de vice na sua chapa ao general Augusto Heleno, mas a cúpula do PRP, partido ao qual o ex-comandante das forças brasileiras no Haiti está filiado, vetou o acordo. “A consequência imediata [do fracasso das alianças partidárias] é a perda do tempo de TV. As dificuldades [para Bolsonaro] com isso serão gigantes”, avalia o cientista político Vitor Marchetti, da Universidade Federal do ABC.

O PR era visto como a aliança mais importante pela pré-campanha de Bolsonaro. Além de ter estrutura e tempo de rádio e TV, o senador pelo Espírito Santo Magno Malta, nome cogitado para vice, seria importante para angariar votos entre o eleitorado evangélico. De acordo com fontes do PR, as exigências de Bolsonaro para selar o casamento eram inviáveis. “O Bolsonaro queria que nós não nos coligássemos com ele no Rio de Janeiro e que deixássemos de apoiar o PT na Bahia e em Minas Gerais”, diz um político que acompanhou as tratativas.

Prevaleceu o pragmatismo. Em um cenário eleitoral em que estão proibidas as doações de empresa, o objetivo número um do PR é ampliar a sua bancada na Câmara Federal e garantir, dessa forma, a maior fatia possível do fundo partidário e do tempo de rádio e televisão. Um bom desempenho em Minas e na Bahia são estratégicos para isso e, por isso, o PT era importante para a sigla nestes Estados. Além do mais, estender a aliança com Bolsonaro para o Rio de Janeiro era necessário justamente para se beneficiar dos votos de legenda que o militar deve receber no Estado.

A prevalência do cálculo político sobre a ideologia ficou ainda mais evidente com o veto dado pelo nanico PRP à indicação do general Augusto Heleno para vice de Bolsonaro. Segundo o presidente da sigla, Ovasco Resende, o convite foi feito na noite desta terça-feira, mas aceitá-lo colocaria em xeque uma série de acordos já construídos nos Estados. “O nosso objetivo é alcançar a cláusula de barreira [número mínimo de votos a partir do qual uma legenda pode ter acesso aos recursos do fundo partidário e do tempo de rádio e TV]”, afirma Resende. “Fomos surpreendidos quando nos disseram que o general Heleno tinha sido convidado e não tínhamos tempo para consultar todos os diretórios”, complementa.

Apesar do pouco tempo no horário eleitoral, o fato de Bolsonaro ser um nome muito conhecido pela população e reunir o apoio de um grupo fiel às suas ideias podem ser um atenuante na situação do pré-candidato, destaca o professor Carlos Melo, do Insper. “Mesmo sem tempo de TV, o Bolsonaro tem condições de chegar ao segundo turno. Ele é orgânico dentro do seu eleitorado, marca sempre entre 15% e 20% [nas intenções de voto]. E isso é voto suficiente para colocá-lo no segundo turno”, diz o cientista político.

Melo ressalta, no entanto, que surgirão mais obstáculos para Bolsonaro quando ele precisar ampliar o nicho dos seus votos, caso chegue à etapa final da eleição. Uma dificuldade que, ao que parece, está sendo percebida pelas legendas tradicionais e que ajuda a entender o isolamento vivido pelo pré-candidato do PSL ás vésperas do início da campanha. “Os partidos se perguntam: a gente vai com um candidato marcado para morrer no segundo turno?”, questiona Melo.


Luiz Carlos Azedo: candidato dos violentos

É cultura política arraigada, fingir que a violência não é um problema do presidente da República, é agenda de governador. Era, não é mais

De onde vem a resiliência do deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ), que lidera as pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República com Lula fora da disputa? Com toda certeza, vem da violência presente no cotidiano da população, que tem raízes profundas na sociedade brasileira, por causa do nosso passado escravocrata, mas ganhou contornos de guerra civil não declarada em razão do tráfico de drogas e da explosiva situação dos presídios brasileiros.

Há outras causas para o enraizamento popular de sua candidatura, como o desemprego escandaloso, que atinge 13 milhões de trabalhadores, e a desestruturação da família unicelular patriarcal em decorrência da revolução dos costumes, mas são temas em disputa eleitoral que não foram monopolizados por Bolsonaro. O tema da violência, não, é dele e ninguém tasca, porque Bolsonaro tem uma proposta de tratamento de choque para o problema: a pena de morte. Ou seja, tratar os criminosos com intensidade igual ou superior à natureza de suas ações, em todos os casos. Música para os violentos.

Ironicamente, o maior legado que o presidente Michel Temer deixará para os seus sucessores é a organização do Sistema Unificado de Segurança Pública (SUSP), recentemente criado, cuja implantação está a cargo do ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann. Pela primeira vez na história, o governo federal assumirá responsabilidade em relação ao problema em caráter nacional e permanente. Desde a Constituição de 1924, era assunto dos estados, fazia parte da política de conciliação do poder central com as oligarquias regionais.

O combate à violência era uma das bandeiras de Temer para tentar a reeleição, mas o presidente da República foi engolido pelas duas denúncias do ex-procurador-geral Rodrigo Janot e por investigações em curso da Operação Lava-Jato, sob orientação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Barroso. A economia não cresceu como se esperava e a intervenção federal no Rio de Janeiro, ato de grande repercussão, não deu os resultados que o governo esperava.

A mudança que Temer promoveu foi estrutural e terá resultados a longo prazo, com a criação de um fundo de financiamento do sistema, uma escola de segurança e inteligência e um sistema integrado de dados. Como a abertura comercial feita pelo ex-presidente Collor de Mello, que renunciou ao mandato para evitar o impeachment, somente com o tempo a mudança será sentida pela população. Mas estarão dadas condições efetivas para que o futuro governo lidere o combate à violência e ao crime organizado, que se tornou um problema de segurança nacional.

Acontece que nenhum candidato, com exceção de Bolsonaro, pretende tratar desse assunto como prioridade. É cultura política arraigada, fingir que a violência não é um problema do presidente da República, é agenda de governador. Era, não é mais. Vejam o caso do governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB). Em 2010, deixou o governo com uma crise nos presídios que arranhou sua imagem de político comprometido com os direitos humanos e a questão social. Agora, encerra o terceiro mandato sem condições de disputar a reeleição, desgastado em razão da crise do sistema de segurança pública capixaba, cujo ápice foi a greve dos policiais militares.

Classes perigosas

Um dos intérpretes do Brasil, o alagoano Alberto Passos Guimarães (1908-1993), autor de Quatro séculos de latifúndio, foi um dos primeiros a estudar o fenômeno da criminalidade (ou da criminalização, como preferem estudiosos do tema) e da violência nos grandes centros urbanos brasileiros, no rastro dos seus estudos sobre a questão agrária e a urbanização do país.

Na obra As classes perigosas — banditismo urbano e rural (Editora UERJ), publicada em 1982, fez um diagnóstico preciso do problema: “À violência dos criminosos se junta à violência das próprias vítimas e, a essas duas, uma terceira se vem juntar: a violência dos órgãos policiais, que, pouco fazendo para prevenir o crime, querem compensar sua ineficácia tentando inútil e injustificadamente eliminar o crime aumentando o grau de ferocidade da repressão”.

A “via prussiana” de modernização do país, durante o regime militar, gerou um contingente populacional “excedente”, que fora expulso do campo pela mecanização da agricultura, e despreparado para ser absorvido nos marcos da urbanização. Houve desestruturação de grande número de famílias, cuja pauperização, pela concentração da propriedade da terra e pelo desemprego, foi o caldo de cultura para o banditismo tal como conhecemos hoje.

O Brasil entrou num novo ciclo de ampliação das desigualdades na crise do governo de Dilma Rousseff. Apesar da retórica petista e dos programas de transferência de renda do governo, a recessão ampliou os desequilíbrios demográficos e sociais. Além disso, a crise ética mudou o comportamento social das camadas urbanas, que utilizam códigos ou símbolos morais diferentes para entender e resolver seus problemas. O entendimento do direito à propriedade já não é o mesmo. Os que têm o maior interesse em resguardá-lo não o fazem. E o respeito sagrado inoculado na consciência das classes pobres foi profundamente desgastado, como já advertia Guimarães.

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Luiz Carlos Azedo: Quando o sol nasce quadrado

O próximo lance de Lula será antecipar a convenção do PT e lançar sua candidatura, para criar um fato consumado e tentar concorrer à Presidência sub judice

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva completou ontem 100 dias numa cela improvisada da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. Condenado a 12 anos e um mês de prisão em regime fechado, mantém sua candidatura a presidente da República, apesar de considerado inelegível. A Lei da Ficha Limpa proíbe condenados em segunda instância de concorrerem às eleições. Com essa estratégia, porém, o nome do petista permanece nas pesquisas de intenção de votos e na mídia.

Os advogados de Lula fazem uma guerrilha no Judiciário para tentar livrar o ex-presidente da cadeia. O lance mais audacioso de Lula para manter seu protagonismo foi o pedido de habeas corpus feito por deputados petistas e aceito pelo desembargador Rogério Favreto, plantonista no Tribunal Regional Federal da Região (TRF-4), que tentou soltá-lo, mas foi impedido por determinação do presidente da Corte, desembargador Thompson Flores. Os juízes naturais do caso do tríplex de Guarujá, no qual o petista foi condenado, são o juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal, de Curitiba, responsável pela execução da pena, e o desembargador João Pedro Gebran Neto, relator do caso no TRF-4. A decisão de Favreto foi considerada “teratológica” pela presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministra Laurita Vaz.

O próximo lance de Lula será antecipar a convenção do PT e lançar sua candidatura, para criar um fato consumado e tentar concorrer à Presidência sub judice. É um lance ousado, porque afronta ainda mais o Judiciário, mas que leva em conta o rito do processo eleitoral. Nesse caso, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad seria indicado como vice, para vincular seu nome a Lula e substituí-lo como candidato no caso de impugnação do registro da candidatura. Lula tem a seu favor o fato de liderar as pesquisas de opinião, apesar da alta taxa de rejeição. Com isso, reforça o discurso de que está sendo vítima de uma perseguição para impedir no tapetão a sua volta ao poder.

Apesar de condenado por crime comum (receber vantagens indevidas durante o exercício do cargo), Lula se considera um prisioneiro político e organiza uma campanha internacional de solidariedade. O Brasil vive em regime de ampla liberdade, tem um governo constituído legalmente (Michel Temer era vice eleito de Dilma Rousseff) e um calendário eleitoral “imexível”. Como a narrativa do “golpe”, a versão “Lula, preso político” também é falsa.

Hoje, devido às viagens de Michel Temer, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira, a ministra Cármen Lúcia assumirá a Presidência da República pela terceira vez. Temer participará de uma cúpula da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa em Cabo Verde e deve retornar ao Brasil amanhã. O ministro decano, Celso de Mello, assumirá a Corte. Ainda não será dessa vez que o vice-presidente do STF, Dias Toffoli, que está no exterior, assumirá a comando do Supremo. Há muita expectativa de que soltará Lula na primeira oportunidade em uma decisão monocrática. Como se sabe, Toffoli concedeu de ofício o habeas corpus que livrou da prisão o ex-ministro José Dirceu.

Enquanto o sol nasce quadrado para Lula, o horizonte político continua encoberto pelo nevoeiro de uma disputa eleitoral que se avizinha. As incertezas começam a repercutir no ambiente econômico, que ainda sente os efeitos da greve dos caminhoneiros e precifica a irresponsabilidade fiscal do Congresso, bem como a falta de popularidade do governo. Após a Copa do Mundo, as articulações para formação das coligações eleitorais foram intensificadas, e o PT opera para manter sob sua influência os velhos aliados, mas não há garantia de que os votos de Lula serão transferidos para Haddad.

Saúde

A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, suspendeu as novas regras dos planos de saúde, que poderiam levar o consumidor a pagar até 40% do valor de consultas e exames, na forma de coparticipação. O reajuste é considerado “abusivo” em relação à média atual de 30% cobrada pelos planos de saúde. A ministra acolheu pedido de liminar da OAB contra a Agência Nacional de Saúde (Anvisa). “Saúde não é mercadoria. Vida não é negócio. Dignidade não é lucro. Direitos conquistados não podem ser retrocedidos sequer instabilizados”, escreveu na decisão.

Para Cármen Lúcia, a “tutela do direito fundamental à saúde do cidadão é urgente”, assim como “a segurança e a previsão dos usuários de planos de saúde”. Segundo a ministra, como o direito à saúde está previsto em lei, alterações em sua prestação devem ser objeto de ampla discussão na sociedade. Da forma como foi aprovada, a resolução poderia trazer instabilidade jurídica e incremento na judicialização no setor.

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Roberto Feith: Judiciário sob ameaça

A proposta de Bolsonaro de mudar a legislação para nomear dez novos ministro ao Supremo suscita o espectro de uma versão tupiniquim de populistas como Orbán e Erdogan

Um Judiciário independente, apartidário e comprometido com a aplicação impessoal da lei é alicerce da democracia. Este fundamento da sociedade pluralista está sob ataque em diversos pontos do planeta.

Na Europa do Leste, partidos populistas, que ascenderam ao poder através de eleições livres, vêm usando este poder para aprovar leis que limitam a atuação da imprensa, circunscrevem a produção acadêmica e transformam o Judiciário em instrumento de luta política. Na Hungria, o primeiro ministro Viktor Orbán, defensor do que ele chama, com alguma ironia, de “democracia iliberal”, promulgou ampla reforma constitucional com restrições à autonomia do Judiciário.

Na Polônia, Jaroslaw Kaczynski, líder do Partido da Lei e da Justiça, aprovou legislação que permite ao governo substituir juízes da mais alta corte do país. Em seguida, nomeou magistrados selecionados em função da lealdade ao seu partido. A medida provocou protestos no Parlamento Europeu e uma investigação da Comunidade Europeia. Kaczynksi tem ignorado solenemente os protestos de Bruxelas.

As tentativas de controlar o Judiciário não se limitam à Europa. O mesmo ocorre no Egito, nas Filipinas e na Turquia, onde o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan executou um expurgo do aparato de Estado, extensivo ao Judiciário, afastando todos que não estivessem alinhados com ele.

Michael Posner, diretor do Centro para Negócios e Direitos Humanos da New York University, aponta que “no passado, a supressão de liberdades democráticas e do Judiciário independente implicava no risco de sanções dos Estados Unidos. Hoje, temos um presidente americano que não apenas não critica estas restrições, mas parece endossar o comportamento antidemocrático.”

Este presidente acaba de nomear Brett Kavanaugh para substituir Anthony Kennedy, que vinha exercendo a função de fiel na balança na Suprema Corte americana. A mudança permitirá a Trump consolidar uma maioria conservadora na Corte.

Até pouco tempo, as qualificações do candidato eram o fator preponderante na aprovação de nomeações para a Suprema Corte pelo Congresso americano. Mas, em 2016, rompendo esta tradição, o Partido Republicano bloqueou a aprovação de Merrick Garland, nomeado por Barack Obama, apesar das suas eminentes qualificações. Hoje, o Partido Democrata está empenhado em bloquear o nomeado de Trump. Se consolida a perspectiva de uma Suprema Corte cindida, espelhando a crescente polarização da sociedade americana.

Polônia, Hungria, Turquia e, em menor grau, os Estados Unidos, têm em comum a extensão ao Judiciário da luta partidária sem quartel, que extrapola normas e tradições democráticas.

A politização do Judiciário além das nossas fronteiras inevitavelmente provoca a reflexão sobre a situação no Brasil. Algumas decisões dos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski no Supremo e a recente bizarra atuação do desembargador Rogerio Favreto no Paraná parecem introjetar elementos da disputa partidária no Judiciário. A proposta do candidato à Presidência Jair Bolsonaro de mudar a legislação para nomear dez novos ministro ao Supremo, por sua vez, suscita o espectro de uma versão tupiniquim de populistas como Orbán e Erdogan e suas tentativas de dominar o sistema legal.

A Justiça brasileira ainda não é um campo tomado pela disputa entre partidos. Ela tem sido, na maioria das vezes, garantidora da impessoalidade da lei. Mas o exemplo de outros países nos quais o Judiciário foi instrumentalizado para a ação política merece atenção. O momento que atravessamos demanda uma Justiça que não se submeta à pressão de lideranças políticas por uma interpretação da lei conforme as suas conveniências. Caso contrário, tal como acontece em outros países, a Justiça deixará de ser garantidora, para se tornar ameaça à democracia.

* Roberto Feith é jornalista

 


Carlos Alberto di Franco: Cobertura eleitoral sem tabus

Vivemos tempos de radicalização amplificados por uma das maiores crises da nossa História

A Copa do Mundo acabou. Desceu a cortina. O sonho do hexa ficou para 2022. Agora voltamos ao País real. Estamos num ano eleitoral dramaticamente importante. Não será uma cobertura da eleição fácil. Vivemos tempos de radicalização amplificados por uma das maiores crises da nossa História.

Ataques aos adversários, promessas irrealizáveis e imagens produzidas farão parte, mais uma vez, do discurso dos candidatos. Assistiremos diariamente a um show de efeitos especiais capazes de seduzir o grande público, mas, no fundo, vazio de conteúdo e carente de seriedade. O marketing, ferramenta importante para a transmissão da verdade, pode, infelizmente, ser transformado em instrumento de mistificação. Estamos assistindo à morte da política e ao advento da era da inconsistência.

Os programas eleitorais vendem uma bela embalagem, mas, de fato, são paupérrimos na discussão das ideias. Nós, jornalistas, somos (ou deveríamos ser) o contraponto a essa tendência. Cabe-nos a missão de rasgar a embalagem e desnudar os candidatos. Só nós, estou certo, podemos minorar os efeitos perniciosos de um espetáculo audiovisual que certamente não contribui para o fortalecimento de uma democracia verdadeira e amadurecida.

Por isso uma cobertura de qualidade será, antes de mais nada, uma questão de foco. É preciso declarar guerra ao jornalismo declaratório e assumir, efetivamente, a agenda do cidadão. Não basta um painel dos candidatos, é preciso cobrir a fundo as questões que influenciam o dia a dia das pessoas. É importante fixar a atenção não nos marqueteiros e em suas estratégias de imagem, mas na consistência dos programas de governo. É necessário resgatar o inventário das promessas e cobrar coerência. O drama das cidades – segurança, educação, saúde, saneamento básico, iluminação, qualidade da pavimentação das ruas, transporte público de qualidade e responsabilidade fiscal, entre outros – não pode ficar refém de slogans populistas e de receitas irrealizáveis. Os candidatos deverão mostrar capacidade de gestão, experiência, ousadia e criatividade.

Não se pode permitir que as assessorias de comunicação dos políticos definam o que deve ou não ser coberto. O centro do debate tem de ser o cidadão, as políticas públicas, não mais o político, tampouco a própria imprensa. O jornalismo de registro, pobre e simplificador, repercute a Nação oficial, mas oculta a verdadeira dimensão do País real. Precisamos fugir do espetáculo e fazer a opção pela informação.

O jornalista Eugênio Bucci afirma, com razão, que “os jornalistas e os órgãos de imprensa não têm o direito de não ser livres, não têm o direito de não demarcar a sua independência a cada pergunta que fazem, a cada passo que dão, a cada palavra que escrevem. (...) Os jornalistas devem recusar qualquer vínculo, direto ou indireto, com instituições, causas ou interesses comerciais que possam acarretar – ou dar a impressão de que venha a acarretar – a captura do modo como veem, relatam e se relacionam com os fatos e as ideias que estão encarregados de cobrir”.

A independência é, de fato, a regra de ouro da nossa atividade. Para cumprir a nossa missão de levar informação de qualidade à sociedade precisamos fiscalizar o poder. A imprensa não tem jamais o papel de apoiar o poder. A relação entre mídia e governos, embora pautada por um clima respeitoso e civilizado, deve ser marcada por estrita independência.

Um país não se pode apresentar como democrático e livre se pedir à imprensa que não reverbere os problemas da sociedade. Não apenas os que aparecem na superfície, mas também aqueles que vão corroendo os pilares da cidadania. A intolerância é, de longe, um dos mais nefastos filhotes do sectarismo. A radicalização ideológica não tem a cara do brasileiro.

Procuram dividir o Brasil ao meio. Jogar pobres contra ricos, negros contra brancos, homos contra héteros. Querem substituir o Brasil da tolerância pelo país do ódio e da divisão. Tentam arrancar com o fórceps da luta de classes o espírito aberto dos brasileiros. Querem extirpar o DNA, a alma de um povo bom e multicolorido. Não querem o Brasil café com leite. A miscigenação, riqueza maior da nossa cultura, evapora nos rarefeitos laboratórios arianos do radicalismo ideológico.

Está surgindo, de forma acelerada, uma nova “democracia”, totalitária e ditatorial, que pretende espoliar milhões de cidadãos do direito fundamental de opinar, elemento essencial da democracia. Se a ditadura ideológica constrange a cidadania, não pode, por óbvio, acuar jornalistas e redações. O primeiro mandamento do jornalismo de qualidade é, como já disse, a independência. Não podemos sucumbir às pressões dos lobbies direitistas, esquerdistas, homossexuais ou raciais.

O Brasil eliminou a censura. E há somente um desvio pior que o controle governamental da informação: a autocensura. Para o jornalismo, em ano eleitoral e em qualquer tempo, não pode haver vetos, tabus e proibições. Informar é um dever ético.

O leitor espera uma imprensa combativa, disposta a exercer o seu intransferível dever de denúncia. Quer um quadro claro, talvez um bom infográfico, que lhe permita formar um perfil dos candidatos: seus antecedentes, sua história de vida, seu desempenho em cargos atuais e anteriores.

Os políticos, pródigos em soluções de palanque, não costumam perder o sono com o rotineiro descumprimento da palavra empenhada. Afinal, para muitos, infelizmente, a política é a arte do engodo. Além disso, contam com a amnésia coletiva. O jornalismo de qualidade deve assumir o papel de memória da cidadania. Precisamos falar dos planos e do futuro. Porém devemos também falar do passado, das coerências e das ambiguidades.

Deixemos de lado a pirotecnia do marketing. Nosso papel, único e intransferível, é ir mais fundo. A pergunta inteligente faz a diferença. E é o que o leitor espera de nós.

* Carlos Albreto di Franco é jornalista


O Estado de S. Paulo: Preso há 100 dias, Lula mantém PT imobilizado

Ex-presidente dita rumo da sigla a um mês do prazo final para o registro da candidatura

Por Ricardo Brandt e  Katna Baran, de O Estado de S. Paulo.

Condenado na Operação Lava Jato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva completa amanhã 100 dias preso na sede da Polícia Federal, em Curitiba. Mais magro do que estava quando chegou de helicóptero, na noite de 7 de abril, o petista ainda dita as estratégias e os passos do partido e de seus principais aliados na campanha presidencial. E mantém o PT imobilizado na definição de uma alternativa eleitoral.

As vésperas da convenção partidária e a um mês do prazo final para o registro das candidaturas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – o prazo é 15 de agosto –, o mais importante preso da Lava Jato transformou sua “cela” em comitê político e eleitoral, numa espécie de campanha via porta-vozes.

Desde que foram autorizadas as visitas especiais de amigos, o ex-presidente já esteve com 16 pessoas em 11 datas distintas. A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, é quem mais visitou o ex-presidente. É ela a responsável por avisar o partido, governadores e líderes políticos sobre as decisões de Lula – que, segundo a sigla, tem a palavra final.

Anteontem, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad esteve com o ex-presidente pela primeira vez como advogado com procuração para atuar no processo da execução penal. Coordenador do programa de governo do PT e apontado como possível “plano B” do partido, Haddad havia estado com Lula em sua cela duas vezes, desde que foram liberadas pela Justiça visitas de amigos nas quintas-feiras, pelo período de uma hora. Como advogado, o petista pode agora ver o ex-presidente em qualquer dia da semana.

A intenção do grupo diretamente ligado a Lula é arrastar até o momento final a definição da candidatura e tentar reverter a situação em benefício eleitoral para o nome que for escolhido como candidato do partido, já que Lula está potencialmente impedido de concorrer com base na Lei da Ficha Limpa.

O PT avalia que o bom desempenho do ex-presidente nas pesquisas, mesmo depois de preso, é um trunfo eleitoral importante para as composições estaduais. E assim, busca manter Lula candidato durante o máximo de tempo possível e fazer a troca só depois que a Justiça decidir se aceita o registro da candidatura.

Lula acompanha o cenário eleitoral e político do País pelos canais da TV aberta – que assiste boa parte dos dias – e pelos relatos de amigos, familiares e advogados.

Reveses. No inicio de junho, o PT pediu à Justiça o direito de Lula participar de “atos de pré-campanha e, posteriormente, de campanha”, de comparecer ou participar

por vídeo da Convenção Partidária Nacional do PT marcada para o dia 28. Além disso, o partido pleiteava que Lula pudesse participar de debates e sabatinas realizadas pela imprensa.

Na última semana, porém, a juíza federal Carolina Lebbos, responsável pelo processo da execução provisória da pena de Lula, negou o pedido. Para a Justiça, o status do ex-presidente atualmente é de inelegível, em decorrência da condenação em segunda instância – a 8.ª Turma do TRF-4 confirmou sentença de Moro em janeiro e elevou a pena.

A decisão de negar direitos especiais a Lula saiu dois dias depois de o desembargador de plantão do TRF-4, Rogério Favreto – que tem histórico de ligações com o PT – conceder liberdade ao ex-presidente no último dia 8. A ação foi revertida no mesmo dia pelo relator da Lava Jato, desembargador João Pedro Gebran Neto, e pelo presidente da Corte, Carlos Eduardo Thompson Flores.

O ex-presidente foi condenado a 12 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá. O partido e a defesa do ex-presidente sustentam que ele é inocente e vítima de uma perseguição política-judicial.

Nos primeiros 57 dias de prisão Lula leu 21 livros, uma média de 52 páginas por dia: desde os mais densos como Homo Deus, de Yuval Noah Harari; Quem Manda no Mundo , de Noam Chomsky; a clássicos como O Amor nos Tempos do Colera, de Gabriel García Márquez; Ressurreição, de Liev Tosltoi; e a biografia Belchior – Apenas um rapaz latino-americano, do jornalista Jotabê Medeiros.

Nesses 100 dias, Lula passou a receber semanalmente visitas de religiosos, todas as segundas-feiras. Ele já foi visitado, por exemplo, pelos amigos Frei Beto e Leonardo Boff. Um pastor evangélico, um monge e um pai de santo também estiveram com o ex-presidente em sua cela neste período.


Luís Francisco Carvalho Filho: Lula, estado mental e crise

Cenário de crise é inevitável e a legitimidade do futuro governo corre risco

O sistema eleitoral, contaminado pelo ranço autoritário e pelo cinismo, aproxima-se do esgotamento.

Até 16 de agosto é o país do faz de conta. Propaganda antecipada não pode. O candidato que desrespeitar é punido se tiver conhecimento prévio: como os candidatos não sabem de nada, nem se são candidatos, nada acontece.

Propaganda só em língua nacional. Ato grave de insubordinação, punido com até seis meses de prisão, é criminoso o slogan em idioma estrangeiro. Para intérpretes rigorosos, língua nacional é o português (idioma oficial da República), o que inviabilizaria publicidade eleitoral em caiapó ou em bororo.

Pré-candidatos não pedem voto. Fazem "menção à pretensa candidatura", exaltam suas "qualidades pessoais", prometem a salvação do país, mas o "vote em mim" é proibidíssimo. Admite-se até o "impulsionamento" patrocinado de mensagens em redes sociais, mas não podem pedir voto explicitamente. Só implicitamente. Dizem que o sistema é liberal porque autoriza a divulgação do posicionamento de pré-candidatos sobre questões políticas: era o que faltava proibir.

A liberdade de expressão é "passível de limitação" por formidáveis juízes em todo o Brasil. O TSE promete a "menor interferência possível no debate democrático" e sugere "remoção de conteúdo".

Pesquisa eleitoral é tratada com desconfiança por candidatos, legisladores e magistrados, como se fosse ato de propaganda, para iludir o eleitor, e não fonte de informação.

Mentir pode, mas fake news tem status de perigoso inimigo.

É proibido ridicularizar partidos e candidatos mesmo quando partidos e candidatos são ridículos. A propaganda não deve atentar contra os "bons costumes". Desenho animado é abuso de poder. Artistas estão impedidos de "animar comícios". É proibido confeccionar ou distribuir camiseta, chaveiro e boné. No dia da eleição só se admite "manifestação individual e silenciosa".

É como se o ano eleitoral fosse um intervalo de obscurantismo. O desejo de tutelar a cabeça do eleitor —protegendo-o de influências perniciosas— é antigo, mas o jogo da influência é da natureza democrática.

Um princípio curioso da lei brasileira vem do regime militar e tenta impedir meios publicitários destinados a "criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais".

Difícil imaginar qual seria o estado não mental que o TSE pretende estabelecer no eleitorado, mas, em 2018, Lula é candidato a ser fio condutor de algum "estado mental". Resta saber se é artificial.

Quer se eleger, mas não pode ser eleito. Quer se pronunciar e ser sabatinado, mas está preso e, segundo a Justiça, preso não fala. Emudecido e atrás das grades, lidera as intenções de voto. Seus seguidores não enxergam lisura na eleição sem Lula, vítima de conspiração judicial. Seus oponentes não enxergam lisura na eleição com Lula, condenado por corrupção em duas instâncias de julgamento.

Até o registro de seu nome pelo PT, depois da convenção, a candidatura de Lula não existe. Ou existe? A partir de 16 de agosto, solto ou preso, se o PT quiser, Lula estará habilitado a fazer propaganda oficial: o julgamento da impugnação do registro acontece até 17 de setembro (20 dias antes do primeiro turno).

Cassada a candidatura, uma liminar do Supremo (Brasil, terra das liminares) esticaria sua permanência na disputa eleitoral. E se Lula vencer? Vai ser cassado? Antes ou depois de assumir? A Lei da Ficha Limpa deixaria de existir para todos ou ela só não existirá para Lula?

O cenário de crise é inevitável e a legitimidade do futuro governo corre risco. Independentemente do resultado.

* Luís Francisco Carvalho Filho é advogado criminal, presidiu a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (2001-2004).


Folha de S. Paulo: Flávio Rocha, da Riachuelo, desiste de ser candidato à Presidência da República

O empresário Flávio Rocha (PRB), dono da Riachuelo, desistiu de ser candidato à Presidência. O anúncio de sua saída da corrida eleitoral deve ser formalizado nesta sexta (13), informa Thais Arbex.

O movimento abre espaço para que o seu partido, o PRB, declare apoio a outro candidato na corrida ao Planalto.

A sigla faz parte do grupo que discute se sela uma aliança com Ciro Gomes (PDT) ou com Geraldo Alckmin (PSDB), mas o PRB pende para um apoio ao presidenciável tucano.

Aliados de Rocha dizem que a retirada será justificada como um gesto a favor do país e contra “o flerte com os extremos”. O PRB deve fazer um apelo pela união das forças de centro em torno de um único projeto.

Ao abandonar a candidatura, Flávio Rocha dirá que abre espaço para o diálogo sobre a construção de uma proposta “mais equilibrada para o Brasil”.

A expectativa é a de que a desistência de Rocha seja formalizada em nota. O empresário também vai divulgar um vídeo nas redes sociais para explicar sua decisão.

Neste sábado (14), os presidentes dos quatro partidos do centrão –PRB, DEM, PP e Solidariedade– se reúnem em São Paulo para definir o caminho do bloco.


Folha de S. Paulo: Moro foi 'imparcial durante toda a marcha processual', diz PGR em pedido de Lula contra juiz

Defesa queria afastar magistrado da condução do processo do ex-presidente

Por Nathan Lopes, da Folha de S. Paulo

A Procuradoria-Geral da República (PGR) posicionou-se contra o pedido da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para considerar o juiz Sergio Moro suspeito e afastá-lo do processo do sítio de Atibaia (SP) em que o petista é réu na Justiça Federal no Paraná. Para os advogados de Lula, Moro é parcial.

Em parecer apresentado ao ministro Félix Fischer, do STJ (Superior Tribunal de Justiça) —instância em que a petição tramita agora, depois de ter sido negada tanto por Moro quanto pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região)—, o subprocurador-geral da República Nívio de Freitas Silva Filho disse que "Moro se manteve imparcial durante toda a marcha processual".

O subprocurador apresentou o parecer na última segunda-feira (9), um dia após o embate jurídico dentro do TRF-4 em torno de um pedido para a libertação de Lula, que está preso na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba desde abril cumprindo pena relativa ao processo do tríplex.

Para Silva Filho, há uma "insistência infundada" da defesa do ex-presidente com pedidos para afastar Moro de processos de Lula. "Segundo bem assinalado pelas instâncias ordinárias, já foram julgadas improcedentes inúmeras exceções de suspeição".

No início do mês, o jornal "O Estado de S. Paulo" levantou que, no processo do tríplex, a defesa de Lula apresentou 78 recursos questionando ações e condutas.

Na ocasião, a advogada Valeska Teixeira Martins avaliou que a imprensa estaria tentando intimidar a defesa de Lula a não apelar.

A reportagem procurou a defesa de Lula para comentar a decisão, mas ainda não obteve resposta.

REDISCUSSÃO
O subprocurador avalia que o "inconformismo" tem como objetivo "rediscutir indefinidamente os termos da condenação proferida de forma escorreita após ampla ponderação do contexto fático", referindo-se ao caso do tríplex.

Todos os pontos de parcialidade de Moro apontados pela defesa foram refutados pelas instâncias inferiores, salientou Silva Filho. Entre eles, estão comentários sobre a Lava Jato e de que já haveria um pré-julgamento em relação a Lula.

"[As instâncias] concluíram que a defesa não demonstrou a quebra de imparcialidade do magistrado natural da causa. Assim, inviável a declaração de nulidade de todos os atos praticados no curso da ação penal", pontuou o subprocurador.

No documento, o subprocurador ainda comentou que um processo penal estabelece "procedimentos que possibilitem o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa". "A imparcialidade e a transparência são, de fato, pilares do direito processual penal, e o magistrado deve imediatamente declarar-se suspeito de analisar e julgar o feito quando houver motivo que comprometa sua isenção, o que, na hipótese, não ocorre".

O caso ainda deverá ser analisado pelo ministro Fischer. Não há prazo para que a decisão seja proferida.


Folha de S. Paulo: Atrás de aliança com DEM, Alckmin diz que pesquisas virarão de ponta cabeça

Ex-governador defende investigações sobre caixa dois em São Paulo e afirma ser 'vida limpa'

Por Fernando Canzian e Fábio Zanini, da Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Geraldo Alckmin, 65, pré-candidato do PSDB à Presidência, diz estar "trabalhando" para compor uma aliança com DEM, partido que tem flertado com a candidatura de Ciro Gomes (PDT).

"Se depender de mim, estaremos juntos", disse o ex-governador paulista à TV Folha.

Com 7% das intenções de voto no último Datafolha e atrás de seus principais adversários, Alckmin diz que as pesquisas vão "virar de ponta cabeça".

Sobre suspeitas envolvendo a Dersa e caixa dois para campanhas tucanas, diz que tudo deve ser investigado. "Sou vida limpa", afirma.

PESQUISAS
Nunca houve uma campanha com tanta fragmentação de pré-candidatos. Há também uma desesperança com a política. Hoje, mais de 60% dos eleitores não têm candidato definido. O que é bom. Mostra que o eleitor estará mais amadurecido.

A dez dias da eleição no Tocantins, quem estava em primeiro era o ex-prefeito da capital e, em segundo, uma senadora. Nenhum dos dois foi sequer para o segundo turno.

Essa pesquisa vai virar de ponta cabeça. A campanha só vai começar mesmo com o rádio e a televisão, que é 31 de agosto. Vai ser uma campanha curta, de um mês.

ALIANÇA COM O DEM
Se depender de mim, estaremos juntos. E já estamos em muito estados. Estamos apoiando os democratas na Bahia, no Pará, no Amapá.

É normal que os partidos tenham como objetivo chegar ao poder e ter candidato a cargo executivo. À medida que eles tinham candidato à Presidência, nós não insistimos. A partir do momento que eles disseram que vão escolher outro candidato, estamos trabalhando e queremos estar juntos.

Hoje já temos cinco partidos encaminhados para uma aliança, o que nos dará cerca de 20% do tempo no rádio e na TV. Temos um diferencial que é o que fizemos, pois entre o falar e o fazer na política existe um abismo. Como ex-governador (de São Paulo), dá para mostrar o que foi feito.

DESAFIOS
Não vai ser fácil para quem assumir a Presidência. É o sexto ano de déficit primário, com a dívida pública do governo passando os R$ 5 trilhões, chegando a mais de 75% do PIB.

Não é um quadro simples. Mas quem for eleito vai ter mais de 50 milhões de votos e a legitimidade disso é muito grande para poder implementar rapidamente as reformas.

Faremos a reforma política, com voto distrital ou distrital misto, com cláusula de desempenho mais forte. Também a reforma tributária, para simplificar o modelo, a reforma da Previdência e a reforma do Estado. Vamos enxugar, reduzir.

AJUSTE FISCAL
Nós sabemos fazer ajuste fiscal e vamos fazer isso rapidamente para a economia voltar a crescer. Não vai ter crescimento sem investimento e não vai ter investimento sem confiança de que estamos no rumo certo e que o país não vai quebrar.

E com isso podemos ter política monetária de juros baixos, câmbio competitivo e o Brasil volta a crescer. Faremos também uma grande inserção internacional. Eu pretendo abrir a economia.

CAIXA 2, CCR E DERSA
A Folha publicou na Primeira Página matéria que repercutiu em todas as televisões, rádios e sites e que era mentirosa. Ela dizia que dentro do inquérito havia sido dito que teria recursos da CCR para a minha campanha em 2010.

Ficamos sabendo e nosso advogado leu de A a Z. Não tem nem menção. Fazer uma matéria de ouvir dizer é muita irresponsabilidade. Não se pode brincar com o caráter das pessoas.

[Em maio, a Folha publicou reportagem mostrando que a CCR, maior concessionária de estradas do país, repassou R$ 5 milhões para o caixa dois da campanha de Alckmin, segundo relatos de representantes da empresa ao Ministério Público. O dinheiro teria sido entregue ao cunhado do tucano, o empresário Adhemar Ribeiro, segundo a narrativa feita à Promotoria, que ainda investiga o caso].

Agora, se surgiu uma denúncia, investigue-se. Sou vida limpa. Tenho 40 anos de vida pública e meu patrimônio não dá para comprar aquela máquina ali [diz, apontado para uma câmera].

Precisa respeitar as pessoas. Essa forma de jogar todo mundo, dizer que ninguém presta, é um grande desserviço para a sociedade, porque você destrói a política.

Com o Paulo Vieira [de Souza, ex-diretor da Dersa investigado por desvios] eu não tenho nenhum relacionamento. Com o Laurence Casagrande [outro ex-diretor da Dersa investigado] eu não tenho nenhuma intimidade.


Ascânio Seleme: Maquiagem antivergonha

Para os partidos, mudar de nome só serve como última alternativa para refrescar sua imagem e sanitizar seu legado. O caso mais emblemático e histórico é o da Arena
O tsunami de corrupção que atravessa o país de maneira sistemática ao longo de décadas, e de modo crescente desde o mensalão, tem feito partidos políticos e empresas pensarem em alternativas para sobreviver ao mar de lama. Criativos e engenhosos, partidos e empresas envolvidos em escândalos estão, vejam só, mudando de nome. Algumas empresas mudaram suas cores, outras alteraram suas marcas, quase todas trocaram o nome. Em todos os casos, trata-se de simples maquiagem para esconder seus vínculos com esquemas de corrupção ou associações esquisitas.

Um estudo sobre este processo de maquiagem foi feito pelas advogadas Maria Pia Bastos-Tigre Buchheim e Stella Mouzinho, sócias em um escritório de advocacia. Elas veem uma tendência que deve ser repetida nos próximos meses por empresas que queiram se descolar de episódios negativos. Mesmo empresas que não se envolveram diretamente em falcatruas, mas têm sócios ou parcerias encrencadas, estão fazendo ou vão fazer este movimento. Com novo nome, o passado assombroso não desaparece, mas fica menos visível.

Vejam o caso de quatro empresas subsidiárias da Odebrecht, a principal empreiteira do escândalo PT/Petrobras. A Braskem, braço petroquímica da empresa, mudou sua identidade visual e trocou a cor predominante do vermelho para o azul. A Odebrecht Óleo e Gás mudou o nome para Ocyan. A Odebrecht Realizações Imobiliárias virou OR, e a Odebrecht Agroindustrial atende agora pelo nome de Atvos. É assim que caminha o processo de descontaminação da marca mãe, que pretende alcançar todo o grupo.

Outro nome bem conhecido dos brasileiros pelo seu envolvimento na Lava-Jato, a empreiteira Camargo Corrêa, mudou seu nome para Mover, tentando sepultar a velha fama e seguir adiante. Em seu site o grupo diz que mudou de nome com um “forte desejo de fazer diferente”. O Grupo Schahin, também investigado pela força tarefa de Sergio Moro, deixou um rombo de R$ 6 bilhões na praça, mas tenta seguir suas atividades agora sob o nome de Base Engenharia e Serviços de Petróleo e Gás.

Ainda no ramo do petróleo, a norueguesa Statoil está mudando seu nome para Equinor. Alega que se adapta a novos tempos, em que exploração de energia vai além do combustível fóssil, e que o nome Equinor significa igualdade (Equal) norueguesa (Nor). Pode ser, mas é fato também que a Statoil tem lama até o pescoço. Envolvida em casos de corrupção em Angola e outros países africanos, no Brasil se associou à manjada empreiteira Queiroz Galvão.

Duas outras empresas na lista das advogadas são a HRT Petróleo, que virou PetroRio, e a menos criativa de todas, a Engevix, que foi rebatizada de Nova Engevix. Pode ser que a palavra Nova empreste alguma sobriedade à empresa, mas o fato é que a velha Engevix foi apanhada no esquema de corrupção da Petrobras, e seu vice-presidente Gerson Almada acabou preso no mesmo processo que encarcerou o ex-ministro José Dirceu.

As antigas empresas de Eike Batista, que tinham sempre a letra X em sua nomenclatura, mudaram de donos e de nomes. A outrora famosa OGX virou Dommo Energia. A MPX mudou seu nome para Eneva. A LLX, empresa que opera o mega Porto de Açu, passou se chamar Prumo Logística. Todas elas fizeram a mudança para sair da sombra de Eike e da sua ruína.

Para os partidos políticos, mudar de nome só serve mesmo como última alternativa para refrescar sua imagem e sanitizar seu legado. O caso mais emblemático e histórico é o da Arena, partido que apoiou a ditadura e que com a redemocratização do país mudou seu nome para PFL, depois para DEM e hoje se chama Democratas. O partido de oposição ao regime militar, o MDB, passou a ser PMDB para se adaptar a uma mudança imposta pela lei eleitoral manipulada que obrigou partidos a ter um P em seu nome.

Hoje, décadas depois, o PMDB voltou a se chamar MDB, mas em nada se parece com o partido de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves. O PTN, Partido Trabalhista Nacional, fundado para absorver a migração do velho trabalhismo getulista e brizolista, virou Podemos. Continua com os mesmos donos. O PEN, fundado como Partido Ecológico Nacional, hoje é o Patriota. O presidente do partido, evangélico da Assembleia de Deus e autodeclarado conservador, andou atrás de Bolsonaro, que o esnobou. O PTdoB, outro dissidente do trabalhismo, virou Avante.

E assim seguimos.

* Ascânio Seleme é jornalista