Eleições
Luiz Carlos Azedo: O tabuleiro eleitoral
Pesaram a favor de Alckmin o discurso moderado, a paciência para conversar e uma trajetória de político tradicional que respeita a palavra empenhada e compartilha o poder
O fato novo na campanha eleitoral é a ampla aliança formada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) com o propósito de catapultar sua candidatura ao segundo turno, garantindo-lhe para isso a vantagem estratégica do maior tempo de televisão entre os candidatos. Ao amarrar as alianças com o PTB, PSD e PPS, o tucano conseguiu atrair o bloco de centro formado pelo DEM, PP e PR. O Solidariedade ainda ameaça pular fora do barco. Muita água vai rolar até o registro das coligações, cujo prazo é 15 de agosto, mas os blocos eleitorais estão se consolidando e já se pode dizer que Alckmin entrou, finalmente, na disputa pela Presidência.
O ex-governador paulista foi beneficiado pela falta de identidade dos partidos do Centrão (que não tem nada a ver com o blocão ideologicamente conservador da Constituinte de 1987) com os demais candidatos, depois de a candidatura do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), à Presidência não vingar. O bloco é muito fisiológico e namorava o candidato do PDT, Ciro Gomes, mas as atitudes radicais do ex-governador cearense, outra vez, puseram tudo a perder. A carta enviada à Embraer e a Boeing contra a fusão das duas grandes empresas foi a gota d’água. Sinalizou para o DEM que Ciro não era um político confiável para os que defendem a não intervenção estatal na economia. As afirmações de que não abriria mal da “hegemonia moral” na relação com os aliados espantaram os demais.
Ciro negociava com o Centrão, mas miravam o PSB, que ainda não decidiu o que pretende fazer nas eleições. Uma ala da legenda defende a aliança com PT e outra, propõe o lançamento de uma candidatura própria. Nas pesquisas de intenção de voto, Ciro está em vantagem em relação a Alckmin; essa dianteira, porém, torna-se frágil diante do isolamento em que ficou. Do bloco que aderiu a Alckmin, somente o Solidariedade deve se manter ao lado de Ciro, por causa do alinhamento de sua base sindical com o candidato do PDT.
Pesaram a favor de Alckmin o discurso moderado, a paciência para conversar e uma trajetória de político tradicional que respeita a palavra empenhada e compartilha o poder com os aliados. É tudo o que os políticos do centrão desejam, pois estão mais focados na eleição de bancadas federais que garantam participação no futuro governo, qualquer governo. Não deixa de ser um ônus para Alckmin a aproximação dessas forças, em particular o PR, de Waldemar Costa Neto, figura carimbada desde o mensalão, que negociava com Jair Bolsonaro (PSL) e deixou o ex-capitão a ver navios.
Isolamento
Em primeiro lugar nas pesquisas de opinião sem Lula, Bolsonaro sentiu o golpe, pois contava com o tempo de televisão do PR e a deriva das forças do Centrão para chegar ao segundo turno. A defecção de Costa Neto levou-o ao isolamento, com pouquíssimo tempo de televisão para campanha. Com isso, a jurista Janaína Paschoal, coautora do pedido de impeachment de Dilma Rousseff — acompanhada dos juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Junior — pode vir a ser a vice na chapa de Bolsonaro. Também está isolada a candidata da Rede, Marina Silva, que é a segunda colocada nas pesquisas. Tentou atrair o PPS e o PV, que seriam alternativas de alianças, mas os dois partidos estão com Alckmin. Marina já provou sua resiliência nas duas campanhas anteriores, sua capacidade de resistir ao isolamento será posta à prova novamente.
A alternativa da ex-senadora é alavancar a candidatura nos chamados movimentos cívicos, fazendo um contraponto ao pragmatismo de Alckmin. A candidata da Rede paga o preço por ter se mantido acima dos partidos e à margem do jogo político tradicional. Vem daí a sua força e sua fraqueza. Até agora, diante da paridade de meios de campanha nas redes sociais, manteve-se numa posição mais robusta do que a de Alckmin. Vamos ver o que acontecerá quando a campanha começar no leito tradicional das coligações eleitorais e na tevê, o ponto fraco de sua candidatura.
Outro candidato isolado é o senador Álvaro Dias (Podemos), que também não conseguiu ampliar sua coligação. O político paranaense atrapalhou muito os planos de Alckmin até agora, pois conseguiu capturar uma fatia significativa dos potenciais eleitores do tucano no Sul do país, inclusive, numa franja da fronteira de São Paulo. Por essa razão, chegou a ser cogitado para vice do tucano, mas não quis nem conversa.
PT e PMDB ainda não se posicionaram claramente no tabuleiro eleitoral. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está preso em Curitiba, insiste com sua candidatura, mesmo inelegível. É uma estratégia de confrontação com o Judiciário que tem tudo para dar errado, mas os petistas acreditam que pode ser a salvação para seus candidatos nas eleições e, até mesmo, levá-los de volta ao comando do país. A lógica é simples: manter o nome de Lula até ele ser impugnado e, depois, substituí-lo por outro petista. O mais cotado é o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad. É impossível saber qual será a capacidade de transferência de votos de Lula na cadeia.
Finalmente, o grande enigma: o MDB, que lançou Henrique Meirelles. A tradição do partido, desde a campanha de Ulysses Guimarães, é cristianizar seus candidatos. Federação de caciques regionais, a candidatura do ex-ministro da Fazenda é sob medida para isso, pois tem baixa densidade eleitoral e praticamente nenhum laço orgânico com as bases da legenda. O partido opera em função das eleições estaduais, para eleger suas bancadas e, depois, aprisionar o novo presidente da República.
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-tabuleiro-eleitoral/
O Globo: Janaína Paschoal deve ser anunciada no domingo como vice de Bolsonaro
'Estamos namorando por telefone', diz presidenciável ao GLOBO
Por Marco Grillo, Maiá Menezes e Thiago Prado, do O Globo
RIO — A advogada Janaína Paschoal, professora de Direito da USP, está perto de ser anunciada como candidata a vice na chapa do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL). Os dois se falaram por telefone na quinta-feira, e Janaína deve vir ao Rio neste sábado para conversar pessoalmente com o pré-candidato — será a primeira vez em que Bolsonaro e a advogada vão se encontrar. Caso as negociações avancem, a parceria será anunciada oficialmente na manhã de domingo, na convenção nacional do PSL. O próprio pré-candidato antecipou as informações ao GLOBO na tarde desta sexta-feira.
Janaína se tornou conhecida por ser uma das autoras do parecer que embasou o pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
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Presidente do PDT, Carlos Lupi, discursa ao lado de Ciro Gomes na convenção do partido‘Não dá para ser mole’, diz Lupi em defesa do temperamento de Ciro
— O meu sentimento é que ela (Janaína) está com vontade de ajudar a transformar o Brasil. Estamos “namorando” por telefone. Ela deu sinal verde. Ela deve vir ao Rio amanhã (sábado) e, provavelmente, no domingo estará na convenção. Pode acontecer de anunciar (a chapa) lá. Vai ser a dupla Já-Já — disse Bolsonaro, na tarde desta sexta-feira.
Janaína se filiou ao PSL em abril, no limite do prazo que tornaria possível uma candidatura este ano. Ela foi convidada pelo deputado Major Olímpio (PSL-SP), presidente do partido em São Paulo, a concorrer ao governo do estado, mas recusou e estudava uma candidatura a deputada estadual. Na quinta-feira, o presidente nacional do PSL, Gustavo Bebianno, esteve em São Paulo e conversou com a advogada.
Antes de Janaína, Bolsonaro convidou o senador Magno Malta (PR-ES) para o posto de vice. Malta, no entanto, preferiu disputar a reeleição ao Senado. As negociações entre PSL e PR naufragaram depois, porque o PR exigia uma contrapartida de coligação na eleição para deputado no Rio e em São Paulo, o que o partido de Bolsonaro não considerou vantajoso. Depois, as tratativas se voltaram para o general Augusto Heleno (PRP), que chegou a aceitar o convite. Neste caso, no entanto, a aliança foi barrada pela direção nacional do PRP. Bolsonaro também descartou a possibilidade de o vice ser o general Hamilton Mourão, que se filiou este ano ao PRTB, partido do presidenciável Levy Fidélix.
Procurada, Janaína ainda não respondeu.
El País: Colecionador de polêmicas, Ciro ajusta o tom para agradar empresários e mulheres
Ex-ministro lança sua candidatura à presidência pelo PDT ainda à espera de definição do centrão para formar sua chapa
Por Afonso Benites, do El País
Ex-ministro e ex-governador do Ceará, Ciro Gomes foi oficializado nesta sexta-feira como candidato do PDT à Presidência da República, fazendo um aceno a seus dois principais pontos fracos: a rejeição que tem por parte das mulheres e sua relação acidentada com o empresariado. Em seus dois discursos feitos durante a convenção do partido, em Brasília, o polêmico político tentou ajustar suas falas e gestos. Tido como impulsivo, que oferece respostas às vezes atravessadas aos seus interlocutores, afirmou que não é um anjo e às vezes erra. “Não sou imune a erros. Minha ferramenta é a minha palavra”. Foi defendido pelo presidente do PDT, Carlos Lupi. “A maior crítica que fazem a ele é que ele é duro nas palavras. Como ser mole em um país com tanta desgraça, com um golpista no Palácio do Planalto?”, questionou Lupi, citando o presidente Michel Temer (MDB).
O candidato afirmou que, se eleito para a presidência, terá como objetivo defender o trabalhador, o povo e classe média, mas sem se esquecer de incentivar as indústrias do Brasil. “Não é só aos trabalhadores e aos pobres a quem devo primeiro a minha atenção. O colapso da economia brasileira atinge também de forma grave aqueles que estão na ponta de nossa indústria e de nosso comércio”. Foi o primeiro dos acenos a parceiros que ainda desconfiam dele. No início do mês, durante evento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ciro chegou a ser vaiado pela elite do empresariado por dizer que poderia rever a reforma trabalhista, lei que foi aprovada após intenso lobby dos industriais.
No evento desta sexta, no entanto, o pedetista também aproveitou para criticar os bancos que "lucram apenas com os pagamentos de juros" e se comprometeu a aumentar a competitividade no setor. Reclamou, por exemplo, que nos últimos anos o país pagou 380 bilhões de reais “a plutocratas do baronato financeiro”. E tentou desmistificar um discurso comum entre parte de representantes do mercado financeiro, de que ele poderia deixar de pagar parte da dívida internacional. “Não cabe aventura, ruptura, nem desrespeito aos contratos. Isso nunca resolveu problema de nação nenhuma”.
Em todo o momento, esteve também ao lado de mulheres sua esposa Gisele, a filha Lívia e a neta Maria Clara se revezavam e vestiam camisetas ou usavam adesivos com os dizeres: “todas com o Ciro”. Uma mensagem para tentar atrair o eleitorado feminino, onde tem alta rejeição. Entre os cinco primeiros colocados na disputa, o pedetista e Jair Bolsonaro (PSL) registram as maiores diferenças entre votos de homens e mulheres, de acordo com a pesquisa Datafolha de junho. A imagem de que Ciro seria machista deve ser explorada na campanha presidencial por seus adversários devido, especialmente, a uma polêmica de 2002, quando ele afirmou à imprensa que o papel de sua então companheira, a atriz Patrícia Pillar, seria o de "dormir com ele" na campanha. Para piorar, recentemente chamou de "filho da puta", sem saber que xingava uma mulher, uma promotora que pediu a abertura de uma investigação contra ele por injúria racial, em um caso em que chamou o vereador negro de direita, Fernando Holiday, de "capitão do mato".
Centrão distante
A convenção que oficializou a candidatura de Ciro ocorre um dia após a cúpula dos partidos do centrão sinalizar que vai aderir à coligação de Geraldo Alckmin (PSDB) à presidência. O PDT negociava o apoio deste grupo de legendas, formado por DEM, PR, PRB, PP e SD. Mas economistas dos dois lados não chegaram a um consenso sobre a política financeira a ser implantada em um eventual Governo do pedetista, por isso a debandada para o ninho tucano é dada como quase certa. Ainda que a campanha de Ciro não confirme. “Não houve nenhuma palavra oficial de nenhum presidente de partidos do centrão. Então preferimos aguardar”, disse Cid Gomes, irmão de Ciro e coordenador de sua campanha presidencial.
Neste momento, o PDT está próximo de anunciar um acordo com o PSB, mas também sonda o PCdoB, que lançou Manuela D’ávila como pré-candidata. No caso dos socialistas, se a aliança se formalizar, o empresário e ex-prefeito de Belo Horizonte Marcio Lacerda deverá ser o indicado para vice. O apoio das duas legendas, no entanto, também não é visto como certo, já que ambas ainda negociam paralelamente com o Partido dos Trabalhadores. Alegando uma viagem de campanha, Ciro deixou a convenção sem atender à imprensa. Preferiu, desta vez, se manifestar apenas por discursos.
Dora Kramer: Largados e pelados
Bem nas fotos das pesquisas, Ciro e Bolsonaro perdem para Alckmin no quesito confiança
A retomada da temporada eleitoral pós-Copa já acontece em ritmo de fatos relevantes. Dois, nesta semana: a adesão dos partidos do chamado centrão ao tucano Geraldo Alckmin e o isolamento de Jair Bolsonaro e Ciro Gomes no quesito alianças eleitorais. Certo de que conquistaria aliados à direita, Ciro flexibilizou posições, amenizou o discurso, mas não evitou levar uma rasteira de última hora. Por dois motivos: a mania de insultar a tudo e a todos e a ausência de firmeza ideológica, fatores que suscitam desconfiança.
Bolsonaro tem sofrido repetidas recusas de candidatos a vice na chapa de uma forma particularmente humilhante, pois as recusas ocorreram depois de anunciados os nomes pretendidos pelo deputado. Ciro e Bolsonaro reagiram na base do desprezo pelas uvas verdes, fazendo de conta que não se abalaram. Ambos menosprezaram o fator aliança. Da boca para fora.
Realmente, a adesão de partidos não garante eleitores, mas assegura tempo de televisão. Para quem dispõe, como os dois, de apenas parcos segundos cada um, a conquista de tempo no horário eleitoral não é algo de que possam abrir mão sem prejuízo.
Enquanto isso, Alckmin já contabiliza 38% do horário. Não garante votos, mas transmite confiança, dá notícia de que os partidos estão botando fé no crescimento da candidatura. Em quadro de indefinição total isso conta. E bastante.
Bolívar Lamounier: Profecias e premonições não são inofensivas
Não é isenta de riscos a discussão sobre os impactos que a democracia tem sofrido
Que o mundo inteiro está imerso em dificuldades é óbvio. E é também óbvio que, por toda parte, as democracias são impactadas de forma negativa por tal situação. Mas daí a dizer que os regimes democráticos estão com um pé na cova vai uma larga distância.
As principais publicações do Primeiro Mundo têm discutido tais impactos com bastante frequência. A discussão é importante, mas não é isenta de riscos. A maioria delas toma os cuidados necessários, mas algumas às vezes resvalam para aquilo que os americanos chamam de self-fulfilling prophecies (profecias que se autorrealizam). Ou, se preferem, para o risco de jogar fora o bebê com a água do banho. Pior ainda é quando, imaginando possíveis sucedâneos para democracias supostamente defuntas, os analistas contrapõem modelos baseados em “ativismos populares” supostamente calorosos e espontâneos à suposta frieza ou ao “mero formalismo” institucional da tradição democrática ocidental.
Dias atrás a newsletter da International IDEA, uma ONG séria, sediada em Estocolmo, adotou uma linha que em geral me causa certa urticária. Título: The vote is no longer enough (o voto já não é suficiente). Mas quem disse que o voto é ou algum dia foi “suficiente”? Neste artigo, com todo respeito à intenção sem dúvida louvável da referida organização, vou tentar pôr alguns pingos nos is.
É correto, corretíssimo, dizer que eleições são uma condição sine qua non da democracia. São uma condição absolutamente necessária. Mas não me consta que algum teórico sério desse regime tenha jamais afirmado que é uma condição também suficiente. E precisamos ir mais longe. Quando dizemos que eleições são uma condição suficiente, é essencial esclarecer em que sentido fazemos tal afirmação. Sim, o pilar fundamental da democracia são eleições periódicas, limpas e livres, nas quais a maioria da população adulta tenha o direito de participar. Eleições “limpas” significam que os pleitos não podem ser vulneráveis à fraude numa escala capaz de distorcer os resultados. Eleições “livres”, que nenhuma ameaça pese sobre os eleitores no momento em que comparecem às urnas, ou seja, que eles estejam livres da coação e da coerção em qualquer de suas formas. Essa condição coloca o regime venezuelano do sr. Maduro e o nicaraguense do sr. Ortega a anos-luz da democracia.
Dito de outro modo, o processo eleitoral da democracia pressupõe um extenso desenvolvimento da legislação e que esta seja aplicada por instituições neutras, fortes e idôneas. Este enunciado parece-me suficientemente claro, mas com certeza não é completo. Onde não exista uma imprensa livre e pluralista, é óbvio que ele soa incompleto. Em certos países, governos implantam programas sociais em tese salutares, que em tese nada têm de ilegal, mas podem fazê-lo de forma maliciosa, com vistas à auferir dividendos eleitorais num grau que se podia compreender cem anos atrás, mas não nos dias que correm. Outra condição sine qua non, associada ao processo eleitoral, é que os contendores reconheçam sua mútua legitimidade e reconheçam as eleições como a única via legítima de acesso ao poder.
E o que dizer do transcurso dos mandatos, quando os eleitos, devidamente empossados, começam a pôr em prática suas plataformas eleitorais? Neste aspecto, as questões cruciais são a dos “objetos de decisão” – quero dizer, sobre que matérias a opção eleitoral faz realmente alguma diferença – e a transparência, ou seja, quanto conhecimento o eleitor tem efetivamente a chance de se informar. Em qualquer democracia, na brasileira inclusive, a diferença entre o mundo atual e o de 50 ou cem anos atrás é imensa. Mas nosso atraso nesse aspecto pode ser medido pela dimensão amazônica das falcatruas cometidas na Petrobrás e pelo muito que continuamos a ignorar sobre a carteira de empréstimos do BNDES. O processo eleitoral avançou muito, mas o acesso à informação ficou para trás. A responsabilidade maior por tal atraso cabe ao Legislativo e aos partidos políticos, incrustados no casco do Estado, servindo mais à alta burocracia que à sociedade e virtualmente impotentes diante das corporações (organizações atreladas a interesses extremamente estreitos).
A terceira dimensão relevante é a da accountability – a possibilidade de efetivamente assegurar a probidade no trato da coisa pública, responsabilizando e punindo o servidor público que a infringe. Essa área tem registrado progressos palpáveis, graças principalmente ao combate à corrupção. Ainda que a Operação Lava Jato e a Polícia Federal tenham cometido alguns excessos, já podemos vislumbrar o dia em que o Brasil terá uma e não duas Justiças, como tem sido de nossa tradição. Nos últimos anos, vimos alguns grandes empresários e até um ex-presidente da República na prisão, algo até recentemente impensável e, a meu juízo, irreversível. O risco, evidentemente, é a Justiça se deixar arrastar pelo clima do “pega, mata, esfola”. Ser rico ou ter sido delatado não torna o poderoso automaticamente culpado de algo, mas a recíproca é verdadeira: esperar que criminosos de colarinho branco deixem confissões autenticadas em cartório ou abram mão da infinidade de recursos que a Constituição de 1988 ainda lhes assegurou é algo que não veremos nem na brilhante democracia norueguesa.
A pedra de toque, no caso, é o início do cumprimento da pena após a condenação em segunda instância, questão que tem contraposto o Supremo Tribunal Federal às duas primeiras instâncias de uma forma indesejável e institucionalmente perigosa. Para bem servir ao interesse maior da sociedade, é essencial que todo o sistema de justiça se empenhe em informar quantos “3pês” (pobres, pretos e putas) ainda se encontram amontoados nas masmorras nacionais sem terem chegado sequer à segunda instância.
* Bolívar Lamounier é cientista político, sócio diretor da Augurium Consultoria e autor de ‘Liberais e antiliberais: a luta ideológica de nosso tempo’ (Companhia das Letras, 2016)
Pablo Ortelado: Encantamento autoritário
Surpreende que discurso ingênuo e raivoso de Bolsonaro tenha seduzido a elite econômica
Um dos mais intrigantes enigmas desta eleição é o apoio que Jair Bolsonaro (PSL) está conseguindo amealhar entre as elites. Seu sucesso entre a população em geral se compreende por sua imagem de outsider, sua postura antissistêmica e seu discurso anticorrupção.
Mas não parece razoável que um candidato tão sem qualificações, que desconhece os princípios mais elementares de funcionamento da economia e do Estado e com posturas tão grosseiramente contrárias aos direitos humanos consiga atrair apoio entre as lideranças do setor econômico.
Em evento com os presidenciáveis na CNI (Confederação Nacional da Indústria), Bolsonaro foi o mais aplaudido.
O presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, disse que ele demonstra “firmeza e autoridade” e que o setor não tem receio de um eventual governo seu. Henrique Bredda, gestor do fundo Alaska, reuniu-se com o pré-candidato e disse que teve “excelentes impressões”.
Comparações com candidatos de extrema direita de outros países esclarecem pouco sobre essa adesão das elites. Neles, o eleitorado é composto por trabalhadores que se sentem ameaçados pela abertura comercial e pela imigração, o que não parece ser o caso do Brasil.
O eleitorado de Bolsonaro é escolarizado e rico. Segundo pesquisa Datafolha, enquanto sua intenção de votos entre os que ganham até 2 salários mínimos é de 13%, ela sobe para 34% entre os que ganham mais de 10 salários mínimos; enquanto sua intenção de votos é de 11% entre os eleitores com educação fundamental, ela sobe para 25% entre os que cursaram o ensino superior.
Além disso, nossa economia é muito fechada e, a despeito de uma crise localizada na fronteira com a Venezuela, não temos um problema de imigração relevante.
A melhor pista para entender essa adesão a Bolsonaro é o antipetismo, uma moléstia que contaminou nossa elite e que a deixou tão indignada com o PT que ela não consegue mais exercer o discernimento.
O antipetismo acredita que o maior e mais fundamental problema do país é a corrupção, que o ápice desta prática ocorreu nos governos petistas e que para enfrentar o problema precisamos de autoridade e de um Estado pequeno.
O que é surpreendente é que esse discurso ingênuo e raivoso tenha conseguido seduzir nossa elite econômica que deveria saber, por dever de ofício, que nossos problemas são maiores e mais complicados.
O encantamento foi tamanho que ela cogita entregar o país para um brucutu anticorrupção, que não entende nada de coisa nenhuma, que tem menos capacidade política do que Dilma Rousseff e que só se distingue por vociferar bordões autoritários para pessoas sem juízo.
* Pablo Ortellado é professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.
Luiz Weber: O candidato bombado
Geraldo Alckmin (PSDB) recorreu ao mercado de anabolizantes da política
Geraldo Alckmin tomou uma injeção de PMMA. De um dia para outro inflou. Ficou na aparência competitivo na disputa pelo Planalto (apesar dos 7% de preferência do eleitorado, segundo o Datafolha).
Projeta-se maior após receber doses cavalares de tempo de TV fornecidas pela aliança com DEM, PP, PR, PRB e SD. Uma sopa de letras tão letal quanto a sigla que identifica o silicone usado em cirurgias estéticas.
Magro nas pesquisas, Alckmin recorreu ao mercado de anabolizantes da política (só a base de muita metáfora para entender isso). Para tanto, procurou o líder do PR, o mensaleiro condenado Valdemar Costa Neto.
Valdemar é um Dr. Bumbum da política. Opera na semiclandestinidade, carrega seu estoque tóxico de fisiologismo para inocular nos aliados de ocasião. E está pronto para sair de cena tão logo algo dê errado na coligação siliconada.
Se o tucano —mesmo com um bom naco de TV— não crescer, o PR e alguns associados vão escapar do flagrante e atuar noutra frente.
Assim, flácido, Alckmin vai sofrer as dores de um crescimento artificial e malformado. Pode vir a claudicar em plena campanha. Pior, terá negligenciado a prática de exercícios obrigatórios que sempre fizeram parte do núcleo duro do PSDB e que garantiam a coesão e musculatura do partido mesmo na oposição. Responsabilidade fiscal, reforma do Estado, desaparelhamento, não são o forte desse grupo.
Não se faz política sem alianças ou cavalgando um moralismo extremado. Mas a falta de empuxo da candidatura de Alckmin nesta fase tornou-o presa dos interesses oportunistas dos novos aliados. Já se fala nos bastidores em divisão do butim se o tucano for eleito.
Eleição sem doping, isto é, sem réus da Lava Jato, sem caixa 2, sem fisiologismo, parece ser essa a demanda reprimida do eleitorado. Ao concorrer dopado pelo centrão, Alckmin pode até largar bem, mas, se vai chegar inteiro numa corrida de obstáculos como uma eleição presidencial, é outra história.
* Luiz Weber é secretário de Redação da Sucursal de Brasília, especialista em direito constitucional e mestre em ciência política.
Alberto Aggio: Os movimentos da política e a candidatura Alckmin
A política tem dimensões longas e curtas. De um ponto de vista longo, a política que defende transformações para o país pensa na chave analítica e propositiva de um Polo Democrático e Reformista que recentemente foi apresentado e estabelece suas balizas de maneira clara no rumo da defesa da democracia e da realização de uma ampla reforma do Estado. De um ponto de vista mais curto, estamos adentrando aos momentos decisivos da campanha eleitoral que em outubro decidirá quem vai ser o novo presidente e qual será a configuração do novo Congresso e das Assembleias estaduais.
Esse pequeno texto visa incidir, de forma breve, ao acontecimento que, encerrando a semana, orienta os movimentos da disputa presidencial dos principais candidatos que até agora se apresentam à disputa. Trata-se de considerar alguns pontos sobre o apoio do chamado Centrão ao candidato Geraldo Alckmin (PSDB).
1. Em primeiro lugar, me parece importante anotar que se trata de uma decisão defensiva desse grupo. Ele esperava ter candidato próprio, o que não vingou. Não aceitou ou não cedeu, nem mesmo ao candidato do governo por vê-lo sem nenhuma chance. Aos trancos e barrancos, como não poderia deixar de ser, tentou negociar com Ciro. Abriu-se uma série de dúvidas e predominou a confusão e a divisão. Por fim, decidiu por apoiar Alckmin porque vê nele a possibilidade de vencer as eleições e poder influenciar num futuro governo, mesmo sabendo de que isso não será fácil. No frigir dos ovos, o chamado Centrão fez uma opção defensiva, quase entrando na prorrogação do tempo normal da partida.
2. Esse Centrão não é igual àquele da Constituinte. Esse Centrão poderia aderir à extrema-direita e apoiar Bolsonaro, mas conhece as tradições da politica brasileira e vislumbrou o desastre que poderia ser uma posição como essa. Mas é preciso anotar também: esse Centrão é outra coisa: sabe fazer o jogo do poder, sabe se manter vivo e não perder espaço. É uma direita que emergiu com a democracia e na democracia. Sim, na democracia existem direitas políticas nos países mais avançados; faz parte da sua legitimidade. Portanto, esse Centrão não é a direita bolsonarista e vir para junto de Alckmin significa aprofundar o isolamento da extrema direita, o que é altamente positivo para a democracia. Uma operação como essa mostra que essa é uma direita que veio para ficar, mesmo que hoje se apresente de forma difusa, inclinada à corrupção (que o PT albergou de forma integral) e em busca de um discurso próprio que hoje se coloca mais entre os outsiders liberais.
3. Para as forças democráticas, que se encontram divididas e buscavam uma alternativa competitiva em termos quantitativos e estruturais, neutralizar parte da direita e trazê-la para o campo da democracia e das reformas, isolando-a especialmente da extrema direita, é um ganho eleitoral e político notável. Esse movimento não está completo e espero que isso se efetive nos próximos dias. Atuar estabelecendo seus princípios e horizontes, se fixar neles, sem ver o cenário, os outros atores e não influenciar nos seus movimentos é um erro crasso em política.
4. Geraldo Alckmin é pré-candidato do PSDB e já contava com o apoio de alguns partidos. Poderá ampliar esse apoio ainda mais com o Centrão. Alckmin sempre foi acusado de “jogar parado”, mas isso não é inteiramente certo. Seus movimentos nem sempre são detectados pelos radares mais atentos. O fato é que, ao que tudo indica, o Centrão é que foi a Alckmin e não o inverso, como dissemos acima. Por outro lado, Alckmin é um político tradicional no contexto da democratização brasileira. É um político de centro, um democrata-cristão ao velho estilo, como foi Franco Montoro (não estou dizendo que ambos têm políticas públicas idênticas, pois os tempos são outros). Alckmin tem experiência política e administrativa suficiente para montar um governo de grande coalizão, refazendo a frente que se formou e se conectou com as ruas no processo do impeachment de Dilma Rousseff. Tem tudo para retomar a ligação entre governo, democracia, esperança e mudança. Não tem nada a ceder ao Centrão que o próprio Centrão já não saiba e não tem nada a mudar no programa já alinhavado pela sua campanha. Em termos políticos, o Centrão optou por Alckmin, não o contrário.
5. A esquerda democrática ganhou algum protagonismo recentemente com o lançamento do Manifesto Por um Bloco Democrático e Reformista. Seus apoiadores, que vão além da esquerda democrática, devem, a meu juízo, dar sustentação a essa ampliação do apoio eleitoral à candidatura Alckmin e trabalhar como uma verdadeira vertente de centro-esquerda nessa grande coalizão. Devem estar atentos para o fato de que sem essa grande coalizão as possibilidades de vitória são remotas. Alckmin pode ser efetivamente um candidato desse Bloco, mas não será certamente o candidato apenas desse Bloco. Como todos sabemos, o campo democrático no Brasil, é bom que se diga, vai além da candidatura Alckmin, mas será um equívoco enorme imaginar que, inclusive com essa ampliação vinda do Centrão, a candidatura Alckmin perde a legitimidade de fazer parte do campo democrático. Penso justamente o contrário.
6. Por fim, caso essa grande coalizão vença, ela deverá fazer um governo democrático, dentro do que foi e do que será possível construir na atual conjuntura brasileira e mundial. Governos democráticos existem com diversos perfis de alianças políticas ao redor do mundo e nas grandes democracias. Alckmin tem de deixar claro isso no seu programa mínimo e ele sabe precisamente quem o está apoiando. Não há nenhuma razão para Alckmin entrar na velha política do toma-lá-dá-cá. A boa noticia é que o Centrão sabe quem é Alckmin e tanto ele quanto nós também sabemos porque o Centrão vacilou até agora em definir seu apoio. Mas essa história apenas começou.
El País: Convenções dos partidos ganham holofotes inéditos com dúvidas sobre alianças
PDT, de Ciro, dá início nesta sexta ao ciclo de encontros que oficializam presidenciáveis. Apoio de partidos de centro direita, decisivos para tempo de propaganda em TV, pendem para Alckmin
Por Afonso Benites, do El País
Faltam menos de três meses para que os brasileiros escolham seu próximo presidente, mas as imagens que aparecerão nas urnas no próximo dia 7 de outubro ainda são um mistério, assim como as alianças que sustentarão esses candidatos. A eleição mais enigmática das últimas décadas promoveu uma situação incomum no mundo da política: as geralmente protocolares convenções partidárias, onde tais escolhas são feitas, se tornaram, neste ano, algo a se acompanhar de perto. O PDT, de Ciro Gomes, inicia a maratona, nesta sexta-feira, em Brasília. Seu nome é um dos já considerados certos, o que explica que a legenda seja uma das primeiras a realizar sua discussão.
As convenções são um instrumento previsto na legislação que devem ocorrer, obrigatoriamente, entre 20 de julho e 5 de agosto do ano eleitoral. Elas reúnem os filiados dos partidos políticos para um processo de discussão do nome a ser lançado e das legendas que farão parte da chapa, as chamadas coligações. Nas eleições anteriores, as convenções eram apenas um momento para se bater o martelo sobre decisões já tomadas. E, se nem todos os acordos já haviam sido selados no momento em que os filiados se reuniam, a maioria deles já era praticamente certa.
Nas eleições deste ano, diversos fatores dificultam essa definição. Um deles é a decisão do PT em insistir na improvável candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pode ser impugnada após sua condenação em segunda instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Presa em Curitiba, a liderança petista continua dando as cartas sobre os rumos do partido e a ideia é que ele seja mantido como o nome da disputa até o último momento, para então tentar transferir votos para seu eventual substituto. Há ainda a dificuldade em se firmar acordos regionais. Às vezes, uma legenda condiciona o apoio nacional a alianças prévias em determinados Estados. Nem sempre esse acordo prospera, já que envolve dezenas de políticos que agem como verdadeiros coronéis em seus redutos eleitorais. O outro fator que ajuda a manter o cenário de indecisões é a incerteza sobre os rumos do centrão, o grupo de partidos de centro-direita que costuma se aliar de forma pragmática com as legendas que podem oferecer mais vantagens.
O conglomerado de siglas sem ideologia pré-definida lançou diversas candidaturas, mas, como não viu nenhuma delas decolar, agora parece um pêndulo, que balança para o lado de Ciro Gomes (PDT) e depois para o de Geraldo Alckmin (PSDB). O tucano ganhou mais força nesta semana, depois que o PR decidiu ingressar no grupo. Por fim, ainda não se sabe também o real tamanho de Jair Bolsonaro, que lidera as pesquisas na ausência de Lula, mas não consegue convencer um partido que indique a ele um vice. Há os que apostem que o militar reformado já teria atingido seu teto e, com tempo de TV inferior aos 10 segundos diários, a tendência é que comece a despencar nas pesquisas.
Para especialistas consultados pela reportagem, as convenções que se iniciam nesta semana possivelmente deixarão em aberto a questão das coligações. “Os convencionais de cada partido podem escolher o seu candidato à presidência e delegar os poderes às executivas nacionais para definirem o arco de alianças”, explicou o advogado Cristiano Vilela, especialista em direito eleitoral. Executiva nacional é o órgão de cada partido que reúne apenas os seus principais dirigentes, os caciques. “Essas convenções serão como um casamento em que cada um diz sim em um dia. Um deles fala no dia 20 de julho e o outro, no dia 5 de agosto.”
Por conta dessa série de dificuldades, os principais concorrentes ao Planalto deixaram suas convenções para o fim do prazo previsto na legislação. Apenas os que já têm certeza da candidatura farão os encontros no início. Entre eles estão além do PDT, de Ciro, o PSC, de Paulo Rabelo de Castro (ambos no dia 20), o PSOL, de Guilherme Boulos (no dia 21), e o PSL de Bolsonaro (no dia 22). No entanto, com exceção de Boulos, com Sonia Guajajara, nenhum dos outros três tem candidatos a vice. Muito menos coligações definidas.
Quem tem mais pressa e aparenta estar mais preocupado com a situação é Bolsonaro. Depois de ouvir dois nãos seguidos, ainda que extraoficiais, o deputado federal e militar da reserva tenta encontrar algum político que esteja disposto a aparecer ao seu lado nos santinhos e nos palanques eleitorais pelo país. Não basta apenas este político querer, é necessário que o seu partido também o queira. As dificuldades em fechar acordos com o PR, do senador Magno Malta, jogou o general da reserva Augusto Heleno (PRP) em seu colo como candidato. Mas, apesar de Heleno se apresentar para a batalha, foi a sua sigla que não quis se coligar com Bolsonaro. Já Ciro Gomes tem recebido sinalizações positivas de partidos como PCdoB e PSB. Nada efetivado, ainda.
Até meados desta semana, era dada como quase certa a coligação de Ciro com os partidos do centrão, PP, SD, DEM e PRB. Mas, depois que o PR desistiu de Bolsonaro e ingressou no grupo oferecendo o empresário Josué Gomes (PR-MG) como vice, ganhou força o apoio a Alckmin. O grupo entende que a o tucano teria mais condições de cumprir os acordos firmados na campanha do que Ciro. Além disso, entendem que o tucano é mais próximo a eles no quesito política econômica.
Outra legenda que, apesar de ser o maior partido do Brasil, ainda segue irrelevante em âmbito federal, já que seu candidato à presidência patina nas pesquisas, é o MDB. Rachado, como costuma ser, o partido do presidente Michel Temer carrega em si a impopularidade do mandatário. O presidente da sigla, o senador Romero Jucá, lançou o nome do ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, mas lideranças como os senadores Renan Calheiros (Alagoas) e Roberto Requião (Paraná) se negam a se juntarem a essa campanha. Tentam minar a candidatura Meirelles em prol de acordos regionais. Com eles, levam dezenas de lideranças. Se a candidatura própria não vingar, a tendência é que o MDB se omita de alianças nacionais. Para tentar aparar essas arestas nos próximos dez dias e ouvir suas bases, os medebistas jogaram a data de sua convenção para 2 de agosto. No mesmo dia, o PP e o DEM oficializarão seus apoios.
No dia 4 de agosto, véspera do prazo final ainda ocorrerão as convenções do Podemos, de Álvaro Dias, da REDE,de Marina Silva, do PSDB, de Geraldo Alckmin, e do NOVO, de João Amoêdo. A maioria das outras siglas ainda não definiram as datas das convenções.
Juan Arias: “Até pensava em votar em Bolsonaro, mas agora não”
São os sem privilégios os que melhor sabem como bate o coração do país. E são eles os que têm em suas mãos o maior número de votos a depositar nas urnas
Nós jornalistas deveríamos falar menos com os políticos e mais com as pessoas comuns, que são o verdadeiro Brasil. E mais nesses momentos de suspense às vésperas de uma das eleições mais confusas e imprevisíveis da democracia do país. Minha experiência me confirma que os que nunca aparecem nos jornais, os mudos, que são 99% da população, são os que melhor conhecem a vida real que precisam conquistar o tempo todo. São eles, os sem privilégios, os que melhor sabem como bate o coração do país. E são eles os que têm em suas mãos o maior número de votos a depositar nas urnas.
Digo isso porque nessa manhã, enquanto pensava no que escrever para minha nova coluna, encontrei um taxista jovem, negro, simpático. Fazia um calor de verão e me surpreendeu ao comentar, bem informado, sobre o drama dos problemas do meio ambiente. De repente, me perguntou em quem eu pensava em votar para presidente. Disse que não votava no Brasil e aproveitei para perguntá-lo em quem ele pensava em votar. “Está difícil. Até pensava em votar em Bolsonaro, mas agora não” e acrescentou: “O problema é que os que teriam de nos dar exemplos de vida são os que mais nos envergonham a cada dia”.
Fiquei sem saber em quem ele votaria, mas entendi uma coisa importante: não era do partido dos derrotistas que acham que todos são iguais. Eu o vi sofrendo para encontrar algum candidato que merecesse seu voto. São esses a verdadeira população, os que sofrem o mal exemplo dos governantes e ao mesmo tempo não renunciam a um Brasil em que eles tenham voz, porque são os que o constroem com seu trabalho.
Os políticos deveriam deixar seus carros blindados na garagem e caminhar a pé pelas ruas e subir nos ônibus. Deveriam escutar as pessoas como anônimos, sem escoltas, para saber o que pensam, porque essa massa que viaja nos transportes públicos poderia ser sua melhor assessora. Dessa forma, tanto a esquerda como a direita poderiam entender por que as pessoas não vão às ruas protestar quando elas querem e por que saem e se manifestam quando elas gostariam que ficassem trancadas em casa. As pessoas não são um robô que se move ao bel-prazer dos políticos. São pessoas que decidem motivadas pela urgência de uma vida com menos dificuldades econômicas e menos perigos para sobreviver.
Um amigo meu muito brincalhão me disse que teve um sonho curioso. De repente, a Brasília política havia desaparecido. Onde hoje estão o Governo e o Congresso era somente um grande parque de diversões para crianças. Os jornalistas, desesperados, tentavam saber onde estava a Brasília do poder. Eles a procuravam nas grandes avenidas de São Paulo e nos bairros ricos do Rio. Nada. Até que em uma rede social alguém contou que viu senadores, deputados e ministros caminhando nos becos de uma favela. Estavam a pé, entravam nos bares, nas escolas. Alguns corriam assustados quando as metralhadoras disparavam.
Contei o sonho de meu amigo ao jovem taxista e ele o levou a sério: “Não sei se Brasília deveria mudar a uma favela, mas os políticos deveriam ir às ruas e falar mais com a gente”, disse. Tentei saber o que ele perguntaria a um desses exilados de Brasília se subissem em seu táxi. E foi rápido na resposta: “Eu perguntaria por que precisam roubar tanto com o que já ganham”.
É essa sabedoria popular que os governantes deveriam escutar de sua própria boca. Eles não são contra a política e contra os partidos. O que faz com que tenham aversão aos governantes é saber que parecem entrar na política não para tentar melhorar o país e sim para enriquecer, eles e suas famílias. Por que cada vez mais os políticos de todos os partidos lutam agora para eleger seus filhos e parentes, começando pelos que estão na cadeia condenados por corrupção? São perguntas que as pessoas que viajam horas a pé nos ônibus também fazem. Alguém se atreve a escutá-las? Ou tem medo delas?
Ascênio Seleme: O medo do passado
São muitas as incógnitas que impedem qualquer tipo de antecipação de tendência econômica para os meses subsequentes à posse do futuro presidente
O mercado está inquieto. Assustado. Com enorme dificuldade de fazer previsões, as empresas gestoras de investimentos privados recomendam aos seus clientes cautela, paciência e atenção, muita atenção. A incerteza com o cenário eleitoral extrapola a questão política e estabelece marcos na economia. Se muitos partidos não sabem ainda como ou com quem irão na eleição presidencial, sabem menos ainda as empresas cuja tarefa é fazer projeções que ultrapassem o calendário eleitoral.
São muitas as incógnitas que impedem qualquer tipo de antecipação de tendência econômica para os meses subsequentes à posse do futuro presidente. A primeira e mais visível delas é Lula. Embora ele esteja legalmente impedido de registrar candidatura e concorrer a qualquer cargo eletivo, em razão da Lei da Ficha Limpa, neste país nunca se sabe o que pode ocorrer. Sobretudo porque quem dará a última palavra é a Justiça. No Judiciário brasileiro, parece que nunca há uma última palavra.
Pois se Lula for candidato, e se for eleito, que governo fará? Se depender das palavras do próprio, o pau vai comer. Além dos ataques seguidos à imprensa e suas promessas de criar um mecanismo de controle externo (leia-se censura) da mídia, ele já disse que voltará desencarnado do Lulinha Paz e Amor e com um programa ao avesso da famosa Carta aos Brasileiros com que se elegeu em 2002. Com o PT, embora o presidente do partido diga outra coisa, a economia corre seriíssimo risco de sofrer seguidas intervenções do Estado.
O que pode se esperar de Ciro presidente? Bomba! Se levarmos em conta apenas o que diz o candidato, teremos um país sob permanente tensão. Ciro já avisou que vai revogar o leilão de partilha do pré-sal e reestatizar empresas que julgar “imprescindíveis”. Também intervirá no Banco Central, pois anunciou que a taxa de juros praticada no Brasil impede o seu crescimento. Vai aumentar os impostos de lucros e dividendos e criar um teto para o pagamento das dívidas da União. Ciro também atacou a reforma da Previdência e prometeu rever a trabalhista. Na terça disse que vai vetar o acordo Embraer/Boeing. Um deus nos acuda.
Bolsonaro, que operaria uma catástrofe nas questões sociais e de comportamento, tampouco seria grandes coisas nos demais setores. Ele já disse que é contra a reforma da Previdência e avisou que prefere acordos bilaterais a acertos múltiplos, como o Mercosul. Disse que vai colocar um general no Ministério da Educação para dar às escolas do país o perfil dos colégios militares. Apesar disso, agrada ao mercado ao prometer manter o tripé macroeconômico com taxas de câmbio flutuantes e metas fiscais e de inflação. Mas Bolsonaro tem um grave problema de credibilidade.
Marina defende rever algumas privatizações dos governos Temer e Dilma, mas de um modo geral sua plataforma para a economia agrada ao mercado. Suas vulnerabilidades, do ponto de vista do capital e de quem protege o capital alheio, são os prováveis entraves que uma política ambiental poderia impor aos negócios e a sua aparente falta de vontade para tomar decisões duras. Geraldo Alckmin é o mais querido no ambiente empresarial, mas até agora não deu sinais de que vai muito longe.
O fato é que, num cenário confuso e incerto, o melhor é não fazer apostas de longo prazo. Os analistas acreditam que, qualquer que seja o resultado em outubro, a inflação vai ter crescimento acelerado em 2019. Ninguém espera hiperinflação, mas todos projetam aumento para lá da meta já para este ano. Por isso, investimento com renda pré-fixada é fria, avisam os corretores. A ideia é evitar que o cliente faça uma aplicação a um valor imaginado para a inflação, e ela venha maior e o dinheiro aplicado acabe menor ao final do período.
“Em síntese, uma situação doméstica de inflação em elevação, desemprego alto, crescimento baixo, crise fiscal e eleição incerta, aliada a uma conjuntura externa adversa aos países emergentes, nos dá a convicção de que estamos diante de um cenário extremamente desafiador para o Brasil. A cautela e a prudência, como em 1989, serão imperativas”, diz um grande consultor de investimentos em carta distribuída entre seus clientes.
O gestor cita o ano de 1989 em razão da primeira eleição presidencial direta depois do fim da ditadura, e que lembra a de hoje pela multiplicidade de candidatos e de ideias. Naquele ano, ganhou Collor, que confiscou a poupança e outros investimentos e congelou contas bancárias. O paper foi batizado “Os fantasmas do passado voltam a assombrar”. Ninguém, em sã consciência, pode imaginar que um novo presidente seja louco e corajoso o suficiente para confiscar outra vez a poupança. Mas, quem tem passado, tem medo.
* Ascânio Seleme é jornalista
El País: Deputados aproveitam brecha para divulgar seus mandatos no Facebook
44 parlamentares que concorrerão à reeleição já gastaram 122.000 reais de recursos públicos para se promoverem na rede social
Por Afonso Benites, do El País
As regras sobre o impulsionamento de publicações em redes sociais durante a campanha só começarão a valer de fato em agosto, mas ao menos 44 deputados federais já usam o dinheiro público para ampliar a divulgação das atividades de seus mandatos e, indiretamente, se apresentarem ao eleitorado em um ano em que a maioria deles disputará a reeleição. Um levantamento feito pelo EL PAÍS na área de transparência da Câmara constatou que, entre janeiro de 2016 e junho de 2018, esses parlamentares pagaram 122.265,50 reais para o Facebook, a principal rede em que as publicações são patrocinadas e difundidas aos seus usuários. Os gastos estão dentro da cota para o exercício da atividade parlamentar.
“Impulsionar as postagens é a melhor maneira que encontrei para chegar aos meus eleitores em locais onde jamais eu teria espaço na mídia tradicional”, afirmou o deputado Hiran Gonçalves (PP-RR). Algumas de suas postagens atingiram 20.000 internautas, é mais do que o dobro do número de votos que ele recebeu na eleição passada, 9.048. Gonçalves está entre os dez deputados que mais investiram diretamente no Facebook no último ano e meio. Ele gastou 7.400 reais, conforme os dados apresentados por ele para o setor de transparência da Câmara. No topo dos que mais gastaram com impulsionamentos de posts estão Evandro Roman (PSD-PR) e Adail Carneiro (PODE-CE). O primeiro investiu 12.891 reais de recursos públicos e, o segundo, 11.129 reais.
Estes dados, entretanto, não representam a realidade fiel dos gastos de deputados com o impulsionamento nas redes. Não estão inclusos no valor gasto com o Facebook aquilo que os parlamentares pagaram para que intermediários patrocinassem suas publicações. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por exemplo, investe mensalmente 20.000 reais em uma agência, que tem como atribuições coordenar toda a comunicação de seu mandato, incluindo o patrocínio de publicações.
Assim como Maia, há ao menos uma centena de deputados que usam do mesmo expediente, o que dificulta a fiscalização e a filtragem precisa do quanto é de fato gasto com o patrocínio de conteúdo nas redes sociais. Por ano, os 513 deputados brasileiros gastam em média 50 milhões de reais com a propaganda de suas atividades. São recursos que são destinados para agências de comunicação, assessorias de imprensa, gráficas, emissoras de rádio e TV, além de jornais e revistas.
Em dezembro do ano passado, o Tribunal Superior Eleitoral autorizou que todo conteúdo produzido por candidatos para as eleições de 2018 seja impulsionado nas redes sociais. Ou seja, os concorrentes aos cargos de presidente, governadores, senadores, deputados federais e estaduais poderão pagar para que as postagens feitas em redes como Facebook, Twitter e Instagram sejam direcionadas e exibidas a um grupo maior de internautas/eleitores. Essa foi uma das principais mudanças nas regras de propaganda eleitoral brasileira dos últimos anos.
Ao menos 54% dos lares brasileiros possuem acesso à Internet, de acordo com a pesquisa TIC Domicílios, e boa parte delas usa as informações absorvidas pelos meios digitais para tomar decisões de maneira geral. Ainda se debate a real influência que o acesso pode ter na hora do voto. Se a controvérsia ainda é grande a respeito dos efeitos nas últimas eleições pelo mundo, como na de Donald Trump nos Estados Unidos ou no Brexit, também há pesquisas internacionais que indicam que poucos usuários se lembram de terem visto anúncios nas redes sociais.
44 deputados federais gastaram 122.000 reais em patrocínios direto de posts no Facebook
Até as eleições de 2016, nenhuma postagem feita por candidatos ou partidos políticos podia ser patrocinada. Agora, poderão, desde que sejam identificadas como propaganda eleitoral, assim como já ocorre nos anúncios feitos em revistas ou jornais impressos. As publicações impulsionadas pelos candidatos ou partidos poderão ocorrer a partir de 16 de agosto. Antes, porém, detentores de mandatos eleitorais continuarão usando do artifício para ampliar a divulgação de seus trabalhos.
Representantes do Facebook e do Google participaram de debates públicos no TSE e de reuniões privadas com técnicos do órgão para discutir as regras. Em princípio, conforme o EL PAÍS apurou, as empresas informaram que a identificação das postagens como publicidade eleitoral seria inviável. Depois, quando notaram a quantia de dinheiro que abririam mão de receber, voltaram atrás e informaram que viabilizariam essa identificação. Como o impulsionamento jamais foi usado em campanhas no Brasil, ainda não há uma estimativa oficial de quanto deverá ser gasto com essa ferramenta.
A estratégia de investir apenas na Internet, contudo, não é vista como a mais adequada para quem quer tentar se eleger, mesmo em períodos em que as campanhas terão menos recursos em decorrência do veto a doações empresariais e à reforma política, que limitou o gasto de fundos públicos em campanhas. “Como os órgãos de controle estão em cima dos gastos há um esforço para direcionar os recursos para Internet. Mas é um erro investir só na Internet ou nas redes sociais. Quase a metade da população brasileira não tem acesso a elas. O rádio e a TV não podem ser ignorados nesse momento”, ponderou o pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital, Rodrigo Carreiro.
Doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas, Carreiro é um dos especialistas que se debruçam sobre a influência das redes sociais na política. Em sua visão, além da preocupação com o aumento das postagens patrocinadas, os eleitores e os órgãos de controle também terão de fiscalizar a disseminação das fake news.
“Teremos muitas fake news em 2018. O cuidado que o público deve ter é o de checagem da informação. Terão de ver em que veículo ou site ou perfil está saindo essa informação. Se foi dada por mais de um veículo ou se só saiu em um específico, sem credibilidade”, alertou Carreiro. Para ele, a polarização política na qual o país está afundado nos últimos anos deverá aumentar e, por isso mesmo, haverá impulso à divulgação de boatos. “Um público mais identificado com um candidato tende a acreditar mais nessas notícias falsas. Ele tateia no mercado de informação apenas o que lhe convém”, avaliou.