Eleições

Mauricio Huertas: Deu “match” entre Geraldo Alckmin e o “centrão”

Confirmado o apoio dos partidos do chamado “centrão” à candidatura presidencial de Geraldo Alckmin, o jogo começa a ser jogado verdadeiramente, após meses de apostas, achismos e especulações.

Deu “match”, como nesses aplicativos de relacionamentos. O tucano se torna enfim um “player” competitivo – para usar o termo comum tanto aos fãs dos games quanto dos pretensos analistas das tendências eleitorais. Uma opção mais racional – e tradicional – contra as alternativas extremadas que polarizam as pesquisas até então, personificadas à esquerda e à direita nas figuras quase folclóricas de Lula e Bolsonaro.

Uma coligação com o reforço de siglas como DEM, PP, PR, PRB, Avante e Solidariedade, somadas ao desgastado mas ainda relevante PSDB (que já tinha atraído também PTB, PSD, PV e PPS), consolida a frente ampla e capilarizada tão desejada por aqueles que pregavam a construção de uma candidatura consensual deste campo que se convencionou denominar “centro democrático e reformista”. Democrático, sem dúvida. Afinal há uma salada mista de vozes e interesses ali reunidos. Reformista, um tanto inverossímil. Até mesmo pela profusão de exigências que cada partido fez para firmar apoio nesse leilão informal dos presidenciáveis.

Portanto, é inegável que a candidatura de Geraldo Alckmin parte com fôlego e entusiasmo renovados para a largada oficial da campanha eleitoral. Resta saber até que ponto o eleitorado será influenciável ou refratário a essas alianças partidárias formais, reunindo as mais diversas lideranças da política institucional, uma profusão de cabos eleitorais espalhados país adentro e o domínio massivo e absoluto da propaganda no rádio e na TV.

O primeiro desafio de Alckmin será o de crescer nas pesquisas e provar que ele estava certo quando afirmava que mostraria o seu favoritismo e começaria a ser percebido pelo eleitorado depois de passada a Copa do Mundo, com a formalização das coligações partidárias e iniciada a propaganda eleitoral nos meios de comunicação. Se era isso que faltava (e perdoe o clichê), ele está agora com a faca e o queijo na mão. Um teste de fogo para o seu poder de empolgar a sociedade. A conferir.

Por outro lado, candidaturas como as de Marina Silva (Rede), Álvaro Dias (Podemos) e Ciro Gomes (PDT), que tentavam igualmente se colocar como alternativas racionais à polarização entre petistas (as viúvas carpideiras de Lula) e anti-petistas (encarnados momentaneamente por Bolsonaro e seu exército de boçais), sofrem um grande baque com o apoio do “centrão” a Geraldo Alckmin. Terão de provar, em escassos dois meses, que as alianças da velha política e o tempo de propaganda na mídia tradicional já se tornaram desprezíveis na hora de o eleitor decidir seu voto. Improvável, mas não impossível.

O segundo – maior e mais extraordinário – desafio de Alckmin será, se e quando superado o primeiro, governar essa babel partidária, garantir maioria no Congresso, montar um governo moderno, eficiente, ético, reformista e transformador da realidade do brasileiro, diferente dos 13 anos petistas e dessa transição pós-impeachment de dois anos empacados na história do Brasil. Mas isso é um outro capítulo. Vamos por partes. Antes do “Viveram felizes para sempre” precisamos iniciar com o “Era uma vez, em um país nem tão distante…”. Que futuro construiremos a partir deste contexto que se apresenta?

*Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS/SP, diretor executivo da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do Blog do PPS e apresentador do #ProgramaDiferente


O Globo: Lula e o dilema do PT na eleição

Encarcerado há mais de 100 dias em Curitiba, petista continua sendo o único a dar as cartas no partido

Por Catarina Alencastro, de O Globo

BRASÍLIA - Que Luiz Inácio Lula da Silva dificilmente terá sua candidatura confirmada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), isso o PT já sabe. A questão agora é a hora de parar. O partido vai registrar o nome do ex-presidente na disputa ao Palácio do Planalto no dia 15 de agosto, e se prepara para dois cenários: acatar a provável rejeição da candidatura do petista pelo tribunal e desencadear imediatamente o plano B (Jaques Wagner ou Fernando Haddad) ou recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) e judicializar até o fim a questão.

Como sempre, o partido está dividido. Há quem defenda o lançamento do sucessor de Lula tão logo a derrota na esfera eleitoral aconteça, evitando maiores traumas institucionais para o país. Isso pode acontecer em qualquer momento entre meados de agosto e meados de setembro. Lula é o líder das pesquisas com 30% das intenções de voto, segundo pesquisa Datafolha do mês passado. Sem ele na disputa, 30% dizem que votam em alguém indicado por ele. Outros 17% cogitam fazê-lo. Se isso se confirmar, o candidato do PT está virtualmente no segundo turno, seja ele quem for.

Mas os que advogam por levar a candidatura de Lula até a última instância argumentam que foi o Judiciário que “cavou” essa situação, ao prender “injustamente” o pré-candidato mais bem quisto dos eleitores. Caso vença essa tese, Lula tentaria obter liminar na Justiça para figurar nas urnas. O risco seria ver todos os milhões de votos conquistados serem anulados por uma decisão judicial derrubando a liminar que o garantiu nas urnas.

- O PT vai agir com um olho na eleição e outro na história - prega um grão petista.

Nessa conta, os petistas terão que considerar o fator tempo de TV. Dono de pelo menos um minuto e meio por bloco, o PT terá o direito de apresentar Lula como candidato aos ouvintes e telespectadores até a decisão final sobre sua candidatura pelo TSE. Depois disso, ainda tem um prazo de dez dias para substituí-lo enquanto mantém seus programas no ar. Esgotado esse prazo, se não apontar um outro nome, perderá o valioso ativo, que seria então distribuído entre seus concorrentes.

Encarcerado há mais de 100 dias em Curitiba, Lula continua sendo o único a dar as cartas no PT. É quem vai bater o martelo de quem assumirá a candidatura presidencial no seu lugar - e quando isso ocorrerá. Até lá, o PT vai tocando a campanha. Com programa, mas sem candidato. O partido prevê gastar R$ 50 milhões - R$ 20 milhões a menos do que o teto definido em lei - para levar a cabo a campanha que mescla o grito de "Lula Livre" com propostas que conversam com os menos favorecidos, como, nas palavras de um dos coordenadores da campanha, "a necessidade de baixar o preço do gás, o alerta de que voltou o pesadelo da fome e que o SUS e as universidades públicas estão em situação de penúria".

 


Marco Aurélio Nogueira: Falando a sério sobre Alckmin

É sabido que o presidenciável Geraldo Alckmin, do PSDB, tem trunfos importantes para vencer a eleição: um partido, experiência política como gestor, estilo moderado, torcida do mercado e acesso à máquina pública paulista, que há 20 anos vem sendo por ele modelada.

Apesar disso, não decola nas pesquisas e é alvo de todo tipo de críticas e restrições. Sua defesa tem argumentado que a disputa só começará mesmo quando a propaganda for para o rádio e a TV, quando então a candidatura arrancará, já num contexto em haverá uma inevitável depuração dos candidatos menos competitivos. O candidato mostra confiança e determinação, procura comer pelas bordas, quase em silêncio, como bom político interiorano que é. Pode ser que tenha razão. Mas sua campanha flerta ininterruptamente com a crise.

Alckmin é visto como insípido, conservador nos costumes, excessivamente fiscalista e neoliberal em economia, desatento para a questão social. Suas seguidas gestões em São Paulo dividem opiniões: há quem aprecie e quem critique, mas a rigor não há ninguém que se derrame em elogios e amores. O ex-governador é um democrata, mas não é um político que desperte paixões. Há muita injustiça no modo como é visto.

Como candidato, vem tentando dissolver a imagem negativa que fazem dele. Gosta de ser comparado a um maratonista, que avança lentamente, poupando fôlego e energia, para dar um arranque final vitorioso. Confia que parte da massa de eleitores indecisos, que é enorme, migrará para ele às vésperas do pleito. Procura exibir indicadores de sucesso na administração paulista, números quase sempre questionados pela oposição e nem sempre devidamente compreendidos pela população. Vale-se, também, de uma conduta discreta e educada, que o faz ser tratado como um governante prudente, conciliador, flexível, que não carrega rancores nem ressentimentos, trabalha de forma colegiada e com equipes multipartidárias, integradas por diferentes correntes políticas.

Alckmin se apoia nesses dois blocos imagéticos, cada um dos quais contém boa dose de verdade. Seu entorno e mesmo diversos políticos e analistas acreditam que ele é o homem certo para o momento atual, graças à capacidade que teria de agregar pessoas e manter sob controle o timão do barco e a chave do cofre.

Mas Alckmin permanece estacionado nas pesquisas e parece destituído de poder de convencimento. Não conseguiu até o momento gerar entusiasmo entre os eleitores, nem obteve o apoio explícito dos partidos que poderiam tê-lo como opção. Algo que surpreende e merece reflexão.

Tem demonstrado enorme dificuldade para fixar uma posição nacional que o projete para a Presidência em nome de uma articulação democrática que dê sustentação a uma agenda reformadora que combine equilíbrio fiscal, crescimento econômico e igualdade social. Particularmente na dimensão da “questão social” e das “lutas identitárias”, ele não consegue ganhar impulso, como se estivesse travado pelo fiscalismo liberal. O empenho que teve em sanear as finanças públicas em São Paulo é interpretado como expressão de um garrote que sufocou as universidades públicas e as instituições técnicas da administração pública. Com isso, perde pontos preciosos entre a intelectualidade e os núcleos de ativistas.

Pode-se considerar, ainda, que a estratégia política por ele seguida em São Paulo não lhe favoreceu em nenhum momento. Primeiro porque foi o principal responsável pela ascensão de João Doria, que ajudou a eleger prefeito de São Paulo e agora, não só concorre ao governo do estado como faz uma espécie de sombra à candidatura de Alckmin. Obrigado a se equilibrar entre Dória, candidato do PSDB, e Márcio França, vice-governador (PSB) e seu aliado, Alckmin perdeu a exclusividade em São Paulo. Fomentou simultaneamente a reação dos que não gostam de Doria e a resistência do PSB. Foi um erro, a ser compartilhado com o partido e as correntes tucanas. De certo modo, Alckmin ficou emparedado em seu próprio estado, travando a indispensável projeção nacional.

Essa é uma das pedras que o mantém parado no mesmo lugar. Mas não é a única. Outras duas pedras também o atrapalham.

Uma é o desencanto da população com a política, fato que celebra o sacrifício de candidatos “excessivamente políticos”, que são vistos como corruptos e distantes dos problemas reais da vida cotidiana. Processo objetivo derivado da atual fase da globalização capitalista e da crise da democracia representativa, tal desencanto colou-se na pele de Geraldo e de praticamente todos os demais candidatos, dele escapando, a rigor, somente Marina Silva, e mesmo assim não por inteiro. Hoje parece cristalizada a tendência do eleitorado de torcer o nariz para candidatos identificados com o establishment político, em nome de uma vaga ideia de renovação. Fato que ajuda a explicar os indicadores das pesquisas que dão conta de um enorme contingente de eleitores sem candidatos, desinteressados e dispostos a anular o voto.

A segunda pedra é a crise do PSDB. Já faz tempo que o partido deixou de ser uma organização coesa. Suas alas se reproduzem com impressionante facilidade, ressentindo-se da falta de uma direção ativa e legitimada, de um corpo doutrinário atualizado e de um programa unificador. A ideia social-democrática, que serviu de inspiração para o surgimento do PSDB há trinta anos, já não é mais uma inspiração. O partido ainda tem bancadas expressivas, governa estados e cidades importantes, mas carece de vibração cívica e de ligações com a sociedade civil. Mesmo a intelectualidade que sempre emprestou apoio ao PSDB recuou, deixando o partido sem sustentação no plano do debate público. Sua longa temporada na oposição aos governos petistas não o fez mais forte, ao contrário, deixando no eleitorado a sensação de que o partido existe só para disputar o poder e não para oferecer uma perspectiva de Estado e sociedade para a população – problema idêntico ao que os tucanos identificavam no PT.

Em 2014, o PSDB perdeu a Presidência mas teve, paradoxalmente, sua maior oportunidade de reencontrar o eixo. A campanha de Aécio Neves ativou o sentimento antipetista e, no segundo turno, conseguiu articular uma ampla frente democrática de apoio. O candidato, porém, esteve sempre aquém dela, fez uma campanha pífia, sem vigor e identidade . Perdida a eleição, o partido nada fez para se reagrupar e ganhar energia. Pouco depois, as denúncias de corrupção contra Aécio não conseguiram ser processadas, retirando do partido a imagem ética e moral que sempre exibiu. Com o início do governo Temer, mais indefinições, num cenário em que se esperava que o PSDB funcionasse como o fator de estruturação do ministério e da atuação governamental.

Tudo isso empurrou o PSDB para a periferia do sistema. A postulação ética, cara ao partido, se dissolveu e ficou em suspenso. As seguidas denúncias de corrupção em obras no estado de São Paulo completaram o quadro, descarregando um caminhão de problemas na candidatura de Alckmin.

Com todas essas pedras bloqueando a estrada, não é de surpreender que Geraldo Alckmin permaneça estagnado. Faltando três meses para as urnas, muita coisa poderá mudar, mas a sensação é que aquilo que se cristalizou dificilmente será superado.

O candidato tucano tem a seu favor uma conhecida folha de serviços e boa estrutura de campanha (que poderá se traduzir em importante recurso governamental no caso de uma vitória), mas paga um alto preço pelos descaminhos e tropeços do PSDB. Enfrenta problemas de indefinição programática, não deixou claro que caráter terá seu eventual governo e, para complicar, não se reveste de uma fantasia cívica e democrática que mobilize a população.

Nessa marcha, corre o risco de chegar à fase decisiva das eleições sem conseguir sair do lugar.


Bernardo Mello Franco: Clima de idolatria marca lançamento de Bolsonaro ao Planalto

"Mito! Mito! Mito!". O grito de guerra animou os militantes que lotaram a convenção do PSL. O clima de idolatria dominou o encontro, que lançou a candidatura de Jair Bolsonaro à Presidência.

— Este homem, para mim, é um herói nacional — derramou-se o presidente do partido nanico, Gustavo Bebianno. — Ele não prega a correção, ele é o exemplo de correção. Posso dizer que sou, de forma hétero, apaixonado por Bolsonaro — disse.

Um a um, os oradores cultuavam a personalidade do presidenciável.

— Ele é sincero. Correto. Patriota — elogiou o conselheiro Paulo Guedes, antes de autorizar o candidato a “matar as aulas de economia para caçar voto”.

— O Brasil quer um homem que tenha sangue nos olhos para emparedar vagabundo. Você tem — emendou o senador Magno Malta (PR-ES), que rejeitou a vaga de vice, mas prometeu pedir votos para o capitão.

Na entrada do centro de convenções, um boneco inflável de Bolsonaro saudava os militantes. No auditório, sua imagem se multiplicava em faixas e camisetas. Um fã mais empolgado desfilava com uma tatuagem do deputado na perna direita.

No palanque, as loas ao candidato só rivalizavam com a pregação contra a esquerda. No retrato pintado pelos bolsonaristas, o Brasil parece ser um país a dois passos de se converter ao comunismo.

— Os ladrões esquerdopatas estão roubando o nosso Brasil — bradou o deputado Major Olímpio (PSL-SP), um dos líderes da bancada da bala na Câmara.

— Dominaram as escolas com militantes disfarçados para pregar a ideologia de gênero — emendou o deputado Delegado Francischini (PSL-PR).

O general Augusto Heleno, que também recusou a vice de Bolsonaro, atacou o passado de Dilma Rousseff na luta contra a ditadura militar. A plateia engrenou um coro de “terrorista” para a ex-presidente.

Depois de onze homens discursarem, a advogada Janaína Paschoal foi à tribuna como representante solitária das mulheres. Ela começou atacando o “totalitarismo petista”, mas surpreendeu ao criticar o “pensamento único” dos fãs do capitão.

— Reflitam se não estamos correndo o risco de fazer um PT ao contrário — pediu.

Ao contrário dos outros, foi mais aplaudida antes do que depois de falar.

Bolsonaro começou em tom humilde, rejeitando o rótulo de “salvador da pátria”. No fim do discurso, já se apresentava como um “escolhido” para subir a rampa do Planalto.

— Para quem jurou dar a vida pela pátria, o que é dar a vida pelo mandato? — perguntou, para delírio dos seguidores.


O Globo: Somados, Bolsonaro, Ciro e Marina já foram filiados a 15 partidos

Nos cenários sem Lula, os três candidatos aparecem nas primeiras colocações

Por Jussara Soares, de O Globo

SÃO PAULO — Eles já foram de direita, de esquerda, democratas cristãos, verdes, socialistas e algo mais. Ao contrário de eleições anteriores, lideradas na maior parte do tempo por políticos de PT e PSDB, neste ano os três candidatos que aparecem nas primeiras colocações nas pesquisas, nos cenários sem o ex-presidente Lula, têm um histórico de mudanças de partidos. Juntos, Jair Bolsonaro (PSL), Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT) passaram por 15 siglas diferentes.

Ciro esteve em sete legendas, em uma transição que acentua sua mudança de perfil ideológico: começou no PDS, identificado com a direita, e passou pelo PPS, antigo Partido Comunista Brasileiro. Foi do PMDB, ajudou a fundar o PSDB e esteve também no PSB e no nanico PROS.

— A partir do PPS são transições em busca de espaço para ele e seu grupo. É muito pragmático — observa o cientista político Cláudio Couto, da Fundação Getulio Vargas.

Embora sempre à direita, Bolsonaro foi outro que não parou quieto. Esteve em seis grupos diferentes. Neste ano, trocou o PSC pelo PSL para ser candidato.

Fundadora do PT, Marina Silva mudou menos: passou por PV e PSB antes de estruturar a Rede.

— No caso dela, fica claro que existe uma vontade de romper com o jeito tradicional de fazer política — diz Couto.


Folha de S. Paulo: Aposta de Alckmin é ir para 2º turno com o PT

Tucano acredita que o candidato apoiado por Lula desidratará Ciro, e que parte dos votos de Bolsonaro irá para ele

Marina Dias, da Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Três dias antes de o centrão chancelar o apoio a seu nome na disputa pelo Palácio do Planalto, Geraldo Alckmin (PSDB) fez o cálculo político mais importante de sua pré-campanha: como de costume, resolveu esperar.

Desistiu de um encontro que estava marcado para a segunda-feira (16) com Álvaro Dias (Podemos), que também concorre à sucessão de Michel Temer. Na conversa reservada, ofereceria ao ex-colega de partido a vaga de vice na sua chapa à Presidência.

Avaliou, porém, que o movimento –inicialmente programado para evitar um possível isolamento partidário– poderia romper de vez suas pontes com o chamado centrão.

Naquele momento, o grupo formado por DEM, PP, PRB, PR e Solidariedade ainda estava dividido entre avalizar Alckmin ou apoiar Ciro Gomes (PDT), em uma jogada que levaria o bloco a um campo pouco vivenciado por ele: a esquerda.

A habitual paciência do ex-governador de São Paulo, atrelada a conversas individuais que teve com dirigentes do grupo no início da semana, surtiram efeito. Na tarde de quinta-feira (19), o centrão decidiu fechar acordo com o tucano.

O acerto deu sobrevida à candidatura de Alckmin e força à sua principal tese: o candidato apoiado pelo ex-presidente Lula desidratará Ciro Gomes e a disputa deste ano será, mais uma vez, polarizada entre PT e PSDB.

Em sua segunda tentativa de chegar ao Planalto, Alckmin considera que precisa recuperar o espaço que perdeu para Jair Bolsonaro (PSL), principalmente no eleitorado jovem e rico, se quiser voltar à tradicional formatação das eleições presidenciais desde 1994 –e a aliança com o maior bloco de partidos entre os concorrentes pode ajudá-lo.

Com estrutura nos estados, prefeitos e parlamentares engajados na campanha, além dos cerca de 4 minutos e meio que terá na propaganda eleitoral na TV, Alckmin acredita que vai conseguir sair dos 7% que tem há meses nas pesquisas.

Na ponta dos levantamentos, pretende encontrar, no meio de setembro, o adversário petista lançado e apoiado por Lula, que, preso há três meses em Curitiba, lidera as pesquisas com 30%.

Os cotados como plano B do PT, Fernando Haddad e Jaques Wagner, têm apenas 1% quando Lula não aparece na disputa, mas o potencial de transferência de votos do ex-presidente é significativo.

Segundo o Datafolha, 30% das pessoas dizem votar em um candidato apoiado por ele, enquanto 17% afirmam que talvez votariam.

A aliados Alckmin admite que a estratégia do PT de levar a candidatura de Lula até o limite, a despeito do veto imposto pela Lei da Ficha Limpa, é "a melhor possível", porque preserva de ataques dos adversários o nome que será escalado para substituir o ex-presidente nas urnas.

Além disso, o tucano acredita que, quanto mais perto do primeiro turno, mais eficaz será o potencial de transferência de votos do petista.

A aposta de Alckmin é pragmática: em um eventual segundo turno contra o PT, ele receberia parte dos votos de Bolsonaro –que hoje lidera a corrida ao Planalto na ausência de Lula–, principalmente pelo discurso antipetista.

O tucano acredita que, em uma eleição tão fragmentada como esta, será muito difícil um nome alinhado à esquerda ficar fora do segundo turno.

Para duelar com esse personagem, no entanto, precisa de impulso para chegar ao primeiro pelotão das pesquisas.

A receita, dizem seus auxiliares, além do amplo tempo de TV, será atacar frontalmente Bolsonaro, apontando contradições e mostrando o que dizem ser "nítido despreparo" do capitão reformado.

Alckmin pediu que sua equipe fizesse uma espécie de inventário de fracassos da ditadura militar, exaltada por Bolsonaro como um período em que o país crescia com ordem social. O tucano quer um levantamento sobre o número de estatais daquela época, além dos índices de inflação, que dispararam na década de 1980, no fim da ditadura.

Com o material em mãos, pretende atacar sistematicamente o presidenciável do PSL e mostrar inconsistências em seu discurso, reforçando que ele não está preparado para governar o país.

Até agora, aliados e parte do mercado –antes simpática ao PSDB– estavam céticos quanto à viabilidade do ex-governador de São Paulo.

Além do centrão, o tucano deve ter o apoio de PSD, PTB, PPS e PV e, assim, somar os valiosos 4 minutos e meio na TV. O PT, por ora sozinho, tem perto de 1 minuto e 35 segundos.


Foto: Beto Barata\PR

Bernardo Mello Franco: Eleição será a mais difícil da história, diz presidente do Ibope

A total imprevisibilidade da corrida presidencial. Não se preocupe se você não tem ideia do que vai acontecer em outubro. Até quem vive de fazer previsões anda perdido com a corrida presidencial. “Será a eleição mais difícil da História do Brasil”, afirma o presidente do Ibope, Carlos Augusto Montenegro. No instituto desde 1971, ele se diz impressionado com o desinteresse pelo voto. “A população está enojada com a política. Nunca vi o eleitor tão frio e desmotivado.”

O Ibope começou a sondar os eleitores há um ano e dois meses. Segundo Montenegro, o quadro permaneceu imóvel “como água parada”. “Ninguém sobe nem desce, porque os candidatos não emocionam”, avalia. “Pode ser que 70 milhões de brasileiros não votem para presidente. A população está decretando por conta própria o fim do voto obrigatório.”

Apesar da indefinição, Montenegro arrisca alguns palpites. Ele aposta que o atual líder da disputa, Jair Bolsonaro, não se elegerá presidente. “Ele perde para qualquer um no segundo turno”, sentencia. “O voto do Bolsonaro não é ideológico de direita. É como o voto nulo, no Enéas ou no Tiririca.”

O mago das pesquisas duvida que Marina Silva chegue ao segundo turno. “O que ela tem hoje é recall das últimas eleições. Quando o horário eleitoral começar, isso se esfacela. Ela vai sumir”, afirma, referindo-se aos 8 segundos da Rede na TV. Ele diz que Ciro Gomes corre o mesmo risco, caso não consiga fechar alianças. “Mas o maior adversário do Ciro é ele mesmo”, ironiza, referindo-se à língua solta do pedetista.

Para o presidente do Ibope, o desempenho de Geraldo Alckmin ainda é um enigma. “Há um cansaço brutal com o PSDB. O caso do Aécio Neves foi quase um tiro de misericórdia”, afirma. “O Alckmin tem currículo. A dúvida é saber o que vai prevalecer: o desgaste da velha política ou o que ele fez em São Paulo.”

Montenegro aposta que o PT lançará Jaques Wagner, e não Fernando Haddad, mas duvida do potencial de transferência de votos do ex-presidente Lula. Em 2010, ele também declarou que o petista não elegeria um poste. Quebrou a cara com a vitória de Dilma Rousseff. “O PT pegou no meu pé, e com razão”, reconhece, oito anos depois. “Mas o Lula preso é diferente do Lula daquela época”, observa.


Vera Magalhães: Uma nova lógica

Força inédita do Centrão é chave para entender as chances do presidente eleito governar

O Centrão já teve várias encarnações e várias conformações, mas sua atual composição e a maneira como negociou o apoio a um candidato a presidente seguem uma nova lógica, que leva em conta, mais do que outros fatores que tradicionalmente pesam nessas escolhas, a nova regra de desempenho dos partidos que passa a vigorar a partir dessas eleições.

Só terá direito ao fundo partidário e ao tempo de propaganda a partir de 2019 o partido que receber 1,5% dos votos válidos nas eleições para a Câmara, distribuídos em ao menos nove Estados, com um mínimo de 1% em cada um deles. Outro critério válido é ter conseguido eleger ao menos 9 deputados federais, distribuídos em 9 unidades da federação.

A exigência vai aumentando gradualmente a cada quatro anos até 2030, quando a cláusula de desempenho passa a ser ter no mínimo 3% dos votos válidos e 9 Estados, com 2% dos votos válidos em cada um, ou eleger 15 deputados federais em 9 Estados.

Não é a primeira vez que se tenta criar uma barreira à existência de partidos nanicos e sua participação no bolo de recursos eleitorais. Mas desta vez as siglas pequenas e médias parecem estar se preparando para de fato cumprir a regra – e não tentar derrubá-la em nova reforma eleitoral ou por meio de recursos ao Judiciário.

Isso ajuda a explicar por que o bloco de partidos que se aglutinou na Câmara em torno da liderança de Rodrigo Maia (DEM) se transpôs também em um blocão para a negociação de apoio nas eleições. Juntos esses partidos imaginam que têm mais cacife para negociar espaços nas chapas estaduais que lhes permita cumprir as novas normas.

Mais: a união, neste caso, projeta a possibilidade de fusão futura das siglas que saírem vitaminadas das urnas com aquelas que, estando sob o mesmo guarda-chuva, não conseguirem cumprir os pré-requisitos para continuar existindo.

Isso ajuda a explicar algo que não se consegue entender levando-se em conta apenas questões ideológicas ou programáticas: por que partidos como DEM, PP, PR, SD e PRB poderiam, a depender da circunstância, estar numa coligação tanto com Geraldo Alckmin (PSDB) quanto com Ciro Gomes (PDT), cujas propostas para o País são na maior parte dos temas antagônicas.

Pesou um mix de fatores: estar fortes para cumprir a cláusula de barreira, garantir um bloco monolítico que assegure a esses partidos o comando do Legislativo a partir de 2019, arranjos estaduais satisfatórios e espaços de poder no futuro governo.

Ainda assim, esse último aspecto é menos relevante. Isso porque, estando unidos, os partidos do Centrão estarão em qualquer governo. Isso torna menos crucial, para eles, Alckmin vencer ou não.

Em coluna recente na Folha de S. Paulo, o economista Marcos Lisboa apontou como uma série de circunstâncias políticas levou a que o Brasil caminhasse para uma espécie de parlamentarismo na prática, em que o antes onipotente presidente perdeu poder, tanto pelo quórum constitucional exigido para aprovar reformas quanto pela regulamentação das medidas provisórias, antes usadas para driblar dificuldades de se obter maiorias.

É bem verdade que, chacoalhado por Lava Jato, impeachment, prisão de Eduardo Cunha, denúncias contra Michel Temer e recessão econômica, o atual Congresso pouco fez valer esse poder. Coube ao Judiciário, nos últimos anos, o protagonismo em questões-chave do País.

Mas os partidos perceberam que, para sobreviver e manter o acesso ao dinheiro que os sustenta precisam retomar peso relativo. Ao fazer Alckmin e Ciro se lançarem a um leilão em que topavam tudo que lhes fosse imposto, o Centrão mostrou força inédita. E ela vai ser importante para entender as chances de qualquer presidente eleito governar ou não a partir de janeiro.


Elio Gaspari: O PT e Ciro no golpe do plebiscito

Plebiscito logo após a eleição é golpe demagógico. Ciro Gomes e Rui Falcão, ex-presidente do PT, avisaram que em suas plataformas está a convocação de um plebiscito ou de um referendo para ratificar suas propostas caso vençam as eleições de outubro.

Ciro defendeu a convocação desse mecanismo para decidir o destino de um projeto de reforma da Previdência. Dias depois, Falcão falou em “reverter as reformas desastradas do Temer por plebiscito ou referendo”. (Num plebiscito os cidadãos escolhem uma entre várias alternativas. Num referendo, aprova-se ou rejeita-se uma proposta.)

Quando deputado, o petista José Dirceu apresentou um projeto propondo que os acordos para o pagamento da dívida externa fossem submetidos a um referendo popular. Diante da perspectiva de poder, o comissariado fez a “Carta aos Brasileiros” e mudou de assunto. Desde 2001 Ciro Gomes defende a realização de plebiscitos, inclusive para decidir a questão previdenciária. Ele chamava essa girafa de “terceiro turno”.

A ideia de uma consulta popular direta logo depois de uma eleição presidencial é um golpe demagógico. Seu objetivo é o emparedamento do Congresso. Esse truque fez o gosto de Hugo Chávez na Venezuela e deu no que deu. No Brasil de 2018 o pescoço da girafa cresce quando se vê que os candidatos estão costurando alianças com partidos devastados pela Lava-Jato.

Trata-se de um jogo de “perde-perde” para o regime democrático, pois ao seu final haverá um presidente imperial esmagando um Parlamento cuja “caciquia” Ciro Gomes cortejou em busca de tempo de televisão. Uma pessoa disposta a votar em Ciro pode achar a ideia boa. E se o poste de Lula ganhar a eleição?

Se um candidato tem o que oferecer, poderá fazê-lo durante a campanha que começa daqui a pouco. Se der, deu. Se não der, não deu.

As vivandeiras querem Bolsonaro
Um pedaço do andar de cima que desfila na tropa de Jair Bolsonaro não quer escolher um presidente da República. Quer um golpe parecido com o de 1964, aquele que colocou cinco generais na Presidência da República. Em 1984, quando a ditadura agonizava, quase todas as vivandeiras que aplaudiram as extravagâncias do poder militar aderiram à campanha de Tancredo Neves e varreram para os quartéis o entulho do regime.

A plateia que ouviu Bolsonaro na Confederação Nacional da Indústria durante uma hora viu que estava diante de um candidato compreensivelmente nervoso e incompreensivelmente desconexo. Vago ao expor sua plataforma econômica, o candidato citou o evangelista João — “conhecereis a verdade e ela vos guiará” — e, em seguida, guiou a audiência para a questão ambiental de Roraima. Adiante, informou: “Estamos entregando a mina de nióbio ao chinês.” Referia-se à mina da Anglo American de Catalão (GO). (Em fevereiro, em Hamamatsu, Bolsonaro prometeu trabalhar em parceria com japoneses para a exploração do nióbio brasileiro.)

Reforma trabalhista? “É remendo novo em calça velha”. Não se pode saber o que isso significa, mas a plateia não reagiu.

Num breve momento o candidato deu uma pista. Mencionando que ele temeu um eventual crescimento da esquerda, disse: “Aí acabou qualquer esperança de mudarmos o Brasil pelas vias democráticas, que tem que ser.”

Desde 1985 o Brasil está numa via democrática e Bolsonaro, com seus sete mandatos, é uma prova disso. O candidato de hoje não repete o deputado que há dez anos, diante de uma manifestação hostil, disse que o “grande erro” da ditadura “foi torturar e não matar”. O Brasil deve ao marechal Castelo Branco a exposição das “vivandeiras alvoroçadas” que, desde 1930, rondam quartéis. Elas ainda estão por aí.


Fernando Guarnieri: “Os partidos também estão de olho nos Estados. E Bolsonaro não tem nada a oferecer”

Pesquisador explica que a estrutura dos partidos nos Estados tem grande peso para a formação de alianças nacionais. Por isso, polarização entre PT e PSDB não deve diminuir

Por Felipe Betim, do El País

Para o cientista político Fernando Guarnieri, mestre e doutor pela Universidade de São Paulo (USP) e atualmente vinculado ao Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP-UERJ), o pré-candidato à presidência Jair Bolsonaro (PSL), que deve ser confirmado como candidato de seu partido na convenção deste domingo, não tem nada a oferecer para os demais partidos. Nem recursos de campanha, nem alianças locais. Isso explica, segundo o especialista no funcionamento dos partidos brasileiros, porque nem mesmo siglas pequenas como o PR ou PRP apostem no ultraconservador.

Nesta entrevista ao EL PAÍS, ele afirma que a tendência é que o pré-candidato Geraldo Alckmin (PSDB), ex-governador de São Paulo, reúna uma grande base de apoio, incluindo os partidos do chamadão centrão — que também estão flertando com o pré-candidato Ciro Gomes (PDT) —, e cresça nas pesquisas. Ele argumenta que a atuação em bloco desse centrão é uma das novidades da campanha, mas também opina que pouca coisa deve mudar: os dois grandes polos da política nacional continuarão ser o PSDB e o PT, que são os que mais têm estrutura pelo Brasil.

Pergunta. Desde 1994 temos dois polos principais, PT e PSDB. Esses dois polos se mantêm para essas eleições, ou 2018 marca o fim desta polarização?
Resposta. Essa é a pergunta que todo mundo está se fazendo [risos]. Mas eu acho que esses dois polos vão permanecer. Essa coisa muito fragmentada, com muitos candidatos, vai se reduzir muito nos próximos dias. O círculo vai se fechando, deixando gente de fora. O Flávio Rocha já saiu, os pequenos começam a sair agora, e depois deve ser a vez dos mais graúdos, depois de negociarem bem a sua saída. E quem vai ficar? Vai ficar quem tem mais estrutura e que pode garantir melhores termos de troca. Você tem desde recursos que os partidos conseguem levantar até alianças locais. Esses são os dois fatores que vão pesar a favor de quem vai receber o apoio dos que estão desistindo.

P. Isso explica o fato do centrão estar entre Ciro Gomes e Geraldo Alckmin?
R. Sim. Mas acho que estão usando o Ciro para valorizar o passe, para vender mais caro o apoio ao Alckmin. Não acredito muito na intenção verdadeira de se juntarem ao Ciro. Acho que nem ele acredita muito nisso. O Alckmin é uma aposta mais certa para o centrão, pelos recursos que ele consegue alavancar. Ele vai conseguir desenhar um arco de centro-direita, coisa que o Bolsonaro não conseguiria fazer. Ele tem mais a oferecer em termos regionais, algumas chapas em alguns Estados...

P. Mas o Alckmin está muito atrás nas pesquisas. Por que os partidos pequenos preferem ir com ele ao invés de apoiar, por exemplo, Jair Bolsonaro (PSL), que está em primeiro?
R. Os caras são macaco velho, conhecem pesquisa e sabem o que elas significam neste momento. Esses 17% do Bolsonaro é ilusório, não tende a ficar assim. Ele não vai ter tempo de televisão, apenas 8 segundos. Isso faz muita diferença, porque o eleitor começa a levar a sério a coisa, a ver quem está aí, quais são as propostas... E o tempo de TV, a exposição dos candidatos, vai contar muito nesse sentido. Todos esses políticos mais antigos estão olhando e sabem disso, e sabem quem vai ter mais recursos. Eles não estão só de olho na eleição para presidente, eles estão de olho nas eleições nos Estados. E Bolsonaro não tem nada a oferecer. O Ciro e o seu PDT também têm pouquíssimo a oferecer em termos de apoios regionais. Já o PSDB é um partido que tem um monte de cabo eleitoral que pode ajudar a alavancar os deputados dessas bancadas todas. O deputado está aí para se reeleger, não está nem aí se é Bolsonaro, Ciro ou Alckmin. E como ele garante a reeleição? Participando de uma chapa vitoriosa. E uma chapa vitoriosa é geralmente a chapa que vai ter uma coligação forte, que consiga romper o quociente eleitoral varias vezes. Então, na hora H, ele vai olhar para a estrutura partidária mesmo. Se um candidato tem 17% ou 9%, ele sabe que isso muda.

P. O PT tem muita estrutura para oferecer. Como ele entra nesse jogo?
R. Tem muita estrutura, principalmente no Nordeste, com candidatos a Governo muito fortes. Então lá existe potencial de transferência de voto e de fazer chapas muito grandes que vão conseguir eleger deputados. O PT não é carta fora do baralho. Não sei a capacidade de transferência de voto do Lula, mas em todo caso feio não vai fazer. Então é também um outro polo que vai começar a agregar parceiros interessados em se eleger localmente.

P. Então o PT também tem capacidade de atrair os partidos pequenos?
R. Sim, principalmente os concentrados no Nordeste. Por exemplo, o PSB, que não é um partido pequeno, mas também não é o que era, tem uma penetração muito forte nas cidades pequenas do interior nordestino. Acaba que, pela estrutura partidária e pelos recursos que esses grandes partidos conseguem agregar aos pequenos, esses pequenos tendem a se unir a PT e PSDB. E tem o MDB também, mas o MDB tem a figura do Michel Temer, que tira votos. É muito tóxica. Mas esses três grandes partidos vão dar o tom os próximos dias, principalmente o ex-presidente Lula. A decisão de abandonar a candidatura ou não, de apoiar alguém ou não...

P. Estão todos à espera de Lula?
R. Ele tem que se resolver, não adianta segurar e deixar acabar as convenções. A não ser que ele queira bagunçar a coisa toda, mas isso não é do interesse do PT, principalmente por causa dos candidatos a governador lá no Nordeste. Lula não pode levar essa coisa até muito mais longe. Assim que ele se decidir, o jogo está formado e o círculo vai se fechar de vez.

P. A impressão que se tem é a de que o centrão está dando as cartas, flertando com vários candidatos... A iniciativa de pactuação está com o centrão, ao invés de estar com os grandes partidos?
R. Desde o impeachment o centrão descobriu um mecanismo de coordenar sua ação e jogar unido. Essa é uma grande novidade. A partir do momento que um time desse tamanho começa a jogar junto, ele se converte em uma força muito grande capaz de influenciar muito o jogo. Agora, a probabilidade de manterem essa coisa forte e unida é baixa. Porque quem chegar primeiro pega a melhor fatia da futura coalizão de governo.

P. Esse aprendizado pode resultar no ano que vem em uma fusão de siglas, que resulte em um grande partido?
R. Na Câmara eles já são um bloco. Mas a ideia de uma fusão depende muito das regras eleitorais, de que haja uma cláusula de barreira. Cada líder de um partido é como se fosse um senhor feudal, com todo o domínio. Acho difícil que eles abram mão disso.

P. A partir do ano que vem teremos um novo pacto, um novo desenho, de governança?
R. Acho difícil que haja uma grande diferença nessa questão de realinhamento. A composição da Câmara não vai ficar muito diferente, os partidos grandes vão continuar sendo esses que estão aí. E o grande aprendizado é que as elites políticas não podem ficar descoordenadas, que isso dá um péssimo resultado. O centrão estar jogando junto é uma novidade por causa disso. Foi muito ruim toda a elite política mais à direita ter deixado tudo na mão do Eduardo Cunha. Aquilo foi desestruturando o sistema de uma maneira muito forte. A tendência é que essas elites retomem o controle da coisa, inclusive para evitar investidas da Justiça.


Folha de S. Paulo: Isolado, Bolsonaro oficializa candidatura neste domingo

Seus quase 30 anos na Câmara foram pautados por discurso radical, com ataques a gays, mulheres e defesa da ditadura

Talita Fernandes e Ranier Bragon, da Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Responsável na atual disputa pelo maior crescimento proporcional nas pesquisas, o capitão reformado do Exército Jair Bolsonaro, 63, oficializa neste domingo (22) no Rio de Janeiro sua candidatura à Presidência da República pelo nanico PSL.

Em menos de três anos, ele passou de 5% das intenções de voto (dezembro de 2015), para os 17% atuais, nos cenários em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aparece entre os candidatos.

Deputado federal por sete mandatos, Bolsonaro sempre foi um outsider no Legislativo: de mais de 170 projetos de sua autoria, apenas dois viraram lei. Seus quase 30 anos na Câmara foram pautados pela adoção de um discurso agressivo e radical, incluindo ataques a gays e mulheres, defesa da ditadura militar, de um novo golpe de Estado, assassinato de criminosos, entre outros pontos.

Com esse perfil, reuniu em seu entorno eleitorado em grande parte de extrema direita que lhe dá, hoje, a liderança nas pesquisas nos cenários sem o ex-presidente Lula.

Apesar de largar na frente, Bolsonaro enfrentará o desafio de conseguir, sem partidos aliados e com um minúsculo tempo de propaganda eleitoral na TV, furar a polarização entre PSDB e PT que vem desde 1995.

O presidenciável trocou, em março deste ano, o PSC pelo PSL, legenda que hoje conta, além dele, com apenas outros sete deputados federais, entre eles o seu filho, Eduardo Bolsonaro (SP).

Antes, passou por outras legendas, como PP, PDC, PFL e PTB.

Uma marca da campanha de Bolsonaro é o improviso. A legenda não contratará um marqueteiro e não há até o momento jingle ou slogan definidos.

O presidente nacional do PSL, Gustavo Bebianno, diz que isso se dá devido à pouca estrutura.

“Nosso trabalho é todo feito de forma espontânea, de acordo com o andar da carruagem. Não há um planejamento até porque os recursos são pequenos.”

Além da presidência da legenda, Bebianno, homem de confiança de Bolsonaro, acumulará a tesouraria e as coordenações de campanha e da parte jurídica.

Bolsonaro precisará driblar a fragilíssima estrutura política. Também tenta fazer uma revisão de seu passado, buscando se distanciar de várias das posições que adotou nesses 30 anos como deputado.

Um exemplo: hoje defende o voto direto e a democracia, mas sempre fez apologia da ditadura militar, e nos anos 1990 chegou a defender abertamente uma nova quartelada no país.

“Através do voto você não vai mudar nada nesse país, nada, absolutamente nada! Só vai mudar, infelizmente, no dia em que partir para uma guerra civil aqui dentro, e fazendo o trabalho que o regime militar não fez. Matando uns 30 mil, começando pelo FHC [então presidente da República], não deixar ele pra fora não, matando! Se vai morrer alguns inocentes, tudo bem, tudo quanto é guerra morre inocente”, disse o pré-candidato na ocasião.

Enquanto tenta desfazer sua imagem de misógino, Bolsonaro esbarra em fatos como as duas ações penais às quais responde no STF (Supremo Tribunal Federal) sob a acusação de incitação ao estupro e injúria contra a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS).

Ele disse no Salão Verde da Câmara dos Deputados que não estupraria a petista porque ela não merecia.

Ele nega ser homofóbico, mas diz com naturalidade que pais e mães preferem ver, ao chegar em casa, seus filhos com o braço quebrado por terem jogado futebol a vê-los brincando de boneca.

Bolsonaro se vende como um candidato que não hesita falar o que pensa.

Direciona ao PT e a políticos de esquerda as principais críticas, a quem culpa pela desmoralização da política e das famílias.

Em janeiro de 2018, a Folha revelou que ele e seus filhos parlamentares acumularam exclusivamente na política um patrimônio de pelo menos R$ 15 milhões.

Três dos seus cinco filhos estão no Legislativo —Carlos (vereador no Rio), Flávio (deputado estadual no Rio) e Eduardo (deputado federal).

Apesar de se declarar antipolítico, Bolsonaro tentou se aliar ao PR de Valdemar Costa Neto, condenado no escândalo do mensalão e investigado na Lava Jato.

Seus aliados dizem que o presidenciável é vítima de ataques da imprensa e que seu único interesse nas tratativas com o PR era o de ter como candidato a vice na chapa o senador Magno Malta (PR-ES).

Como a parceria naufragou, o deputado partiu para a tentativa de ter como vice o general reformado Augusto Heleno, que comandou as tropas de paz da ONU na missão internacional no Haiti, na década passada.

O partido do general, o PRP, não aprovou a aliança.

Com isso, o candidato tenta uma solução caseira. Estão cotados o presidente licenciado do PSL, Luciano Bivar, e Janaina Paschoal, autora do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

Caso não consiga alianças, Bolsonaro terá 7 segundos nos blocos de propaganda eleitoral na TV.

Para contornar a situação, aposta na propaganda de internet, onde conseguiu montar uma sólida e aguerrida rede de apoiadores.

Na economia, Bolsonaro reconhece não ter afinidade com o tema, mas tem se amparado nas ideias do economista Paulo Guedes, fundador do banco Pactual e pós-doutor pela Universidade de Chicago, um dos berços do pensamento liberal.

Guedes já foi anunciado como futuro ministro da Fazenda por Bolsonaro.

Atualmente ele é CEO da Bozano Investimentos, sediada no Rio de Janeiro.

O economista tem como uma de seus principais propostas a diminuição do tamanho do estado e do gasto público.

Em entrevista à Folha recentemente, defendeu a privatização de empresas como Petrobras e os Correios.

O programa de governo do candidato ainda não está pronto e ele pouco tem falado sobre propostas concretas.

A coordenação do documento deve ficar a cargo do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que não deve seguir a orientação de seu partido de apoiar Geraldo Alckmin (PSDB).

Um dos principais motes da campanha do capitão reformado é a questão da segurança pública e o discurso anticorrupção.

Bolsonaro prometeu nomear militares como ministros em vez de “corruptos e terroristas.”


Sérgio Dávila: Mark Zuckerberg não sabe o que fala

E 127 milhões de brasileiros podem ser influenciados por ele

Na mesma semana em que o Facebook divulgou ter atingido no Brasil a marca inédita de 127 milhões de usuários mensais ativos (ou MAUs, na sigla em inglês), o criador da rede social deu longa e reveladora entrevista em que deixa escapar sua convicção monopolista e seu desconhecimento da natureza da informação.

À jornalista americana Kara Swisher, do site Recode, em um dos primeiros encontros com a imprensa desde que explodiu o escândalo do uso indevido de dados de usuários, Mark Zuckerberg defendeu a manutenção do tamanho de sua empresa invocando o perigo amarelo.

Se decidirem cortar as asas de companhias como a nossa, disse ele, a alternativa serão os chineses. “E eles não compartilham dos mesmos valores que temos.” A ironia é que foi a Rússia que nadou de braçada nos valores e princípios do “Feice”, ao influenciar indevidamente usuários durante as eleições presidenciais de 2016, que colocaram Trump na Casa Branca.

Em outro trecho, revela que há 20 mil funcionários dedicados a “revisar o conteúdo” publicado nas páginas do Facebook. Como eles fazem isso, e quais os critérios adotados? Zuckerberg se atrapalha na resposta.

Se uma pessoa nega que o massacre de Sandy Hook, em que um atirador matou 26 pessoas numa escola dos EUA em 2012, entre as quais 20 crianças, tenha ocorrido, os “revisores” tiram a página do ar. Se outra pessoa nega que o Holocausto judeu que exterminou milhões na Segunda Guerra tenha acontecido, sua página continuará no ar.

Se uma informação for marcada por muitos usuários como potencialmente falsa, e se os checadores factuais da empresa chegarem à conclusão de que ela é provavelmente falsa, então o conteúdo perderá sua força de distribuição nas timelines das pessoas.

Entendeu a lógica? Nem Zuckerberg. Na mesma conversa, ele se diz preocupado com as eleições do Brasil. Os 127 milhões de brasileiros que usam a rede também deveriam estar.
* Sérgio Dávila é editor-executivo da Folha.