Eleições

Paulo César Nascimento: O que está por trás do “Polo Democrático e Reformista”?

Algumas lideranças políticas têm martelado na tecla da união das correntes políticas, da centro-direita à centro-esquerda, para enfrentar as próximas eleições de 2018. Faz parte deste esforço o manifesto “Por um Polo Democrático e Reformista”, assinado inicialmente por três líderes do PSDB e um do PPS, no início de junho deste ano, e na sequência apoiado por diversos políticos do DEM, PV, PSD, MDB e PTB, além de vários intelectuais e acadêmicos.

Contudo, existem alguns aspectos nebulosos nessa ideia de unir as forças de centro. A primeira delas é que o manifesto cita correntes ideológicas – liberais, democratas, socialdemocratas, democratas cristãos, socialistas democratas, etc. – como forças que deveriam unir-se nas eleições deste ano. Mas estas correntes ideológicas se apresentam de forma difusa no cenário político nacional, não se encarnando adequadamente nem nos partidos que carregam seus nomes. O que, por exemplo, tem de republicano o Partido da República (PR), ou de progressista o Partido Progressista (PP)? Onde o Solidariedade, de Paulinho da Força Sindical, se encaixaria nessa constelação de ideologias políticas?

O centro só se torna mais claro quando seus apoiadores declaram que dele podem participar todas as forças que pensam o Brasil fora do campo populista autoritário de direita e de esquerda. Ou seja, aqueles que rejeitam a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL), de Ciro Gomes (PDT) e do candidato do PT, seja ele quem for. Estas candidaturas, segundo a ótica dos formuladores do “Polo Democrático e Reformista”, carregariam um potencial de provocar a ruptura da ordem democrática, devido o seu populismo autoritário e atrasado. Daí a necessidade, muito na forma da Frente Ampla propugnada pelo PCB na luta contra o regime militar, de todas as forças democráticas e reformistas se unirem para preservar a democracia e avançar nas reformas que o país necessita.

O problema com essa visão política é que nada indica que a democracia no Brasil esteja correndo perigo, e basta acompanhar a movimentação tanto de Bolsonaro como de Ciro Gomes para certificar-se disso. O primeiro abandonou o discurso do passado, quando chegou a pregar o fechamento do Congresso, entre outras pérolas autoritárias, – para adotar uma postura muito mais amena e conciliadora, chegando ao ponto de escolher um economista ultraliberal para ser seu Ministro da Fazenda, de forma a acalmar o mercado e se livrar da imagem pró-estatizante que construiu ao longo de sua carreira política.

Já Ciro Gomes, ao contrário, tem se utilizado de uma retórica radical para atrair os votos do lulopetismo, mas ao mesmo tempo e contraditoriamente, tenta ampliar suas alianças para o centro e a centro-direita, chegando a disputar e perder para Alckmin o apoio dos partidos fisiológicos do chamado “centrão”. Persiste, porém na busca de uma aliança com o PSB, partido que nada tem de radical. E o PDT, partido que o lançou candidato, tem muito de fisiológico e populista, mas nada de radical. Ou seja, retórica à parte, seu comportamento não é o de um político que esteja colocando em risco a ordem democrática.

Não há nada de surpreendente na atitude destes políticos. Há muito tempo se tornou um truísmo na ciência política que nas democracias contemporâneas, os candidatos tendem a moderar seu discurso de forma a capturar o medium voter – aquele eleitor mediano avesso a radicalismos que representa a maioria do eleitorado. É claro que candidatos extremistas sempre existirão, mas isto faz parte do cenário político de toda e qualquer democracia.

Alguns apoiadores do “Polo Democrático e Reformista” alegam ainda que as candidaturas populistas antes referidas podem levar o país à “ingovernabilidade”, insinuando assim que, mesmo que elas não estejam diretamente empenhadas em derrubar a democracia brasileira, a solapam com suas políticas de irresponsabilidade fiscal e de confronto com o Judiciário e o Legislativo.

“Ingovernabilidade”, contudo, não leva necessariamente ao caos e ao fim da democracia. As sociedades democráticas têm mecanismos institucionais para lidar com situações em que o Chefe do Governo ou do Estado perde a capacidade de dirigir o país, seja por uma política econômica catastrófica, falta de diálogo com o Legislativo ou mesmo incapacidade física e mental, como ocorreu com o presidente Abdalá Bucaram, no Equador, em 1997. Para casos assim, existem diversos mecanismos institucionais, como o impeachment e o recall de novas eleições.

A democracia brasileira, por ter passado por diversas crises, incluindo dois impeachments, já está com suas instituições democráticas bastante consolidadas. Tanto que elas puderam resistir aos 13 anos da longa “guerra de posições” que o PT deslanchou para submeter a sociedade e os três poderes a seu plano de perpetuar-se no poder. Como todos sabem, essas tentativas fracassaram, e o Judiciário do país condenou Lula e vários outros líderes petistas à prisão pelo fantástico esquema de corrupção montado por aquele partido e sua base aliada.

Se a democracia brasileira não está sob qualquer risco, por que então as aves de mau-agouro do “Polo Democrático e Reformista” insistem em levantar o espantalho do perigo de ruptura democrática? O que está por trás disso? A resposta é óbvia: para apoiarem com mais legitimidade a candidatura de Geraldo Alckmin à Presidência da República. Torna-se muito mais palatável, para a esquerda democrática, defender o desgastado PSDB e seu candidato se este é apresentado como a última boia na qual a democracia brasileira pode agarrar-se para não afundar. Muito mais difícil é defender Alckmin pela trajetória de seu partido ou pelo seu próprio perfil.

Já faz algum tempo que o PSDB se afastou do ethos renovador e modernizante que inspirou os “autênticos” a abandonar o antigo MDB quando este mergulhou de cabeça no fisiologismo. Atualmente, o PSDB nada tem de renovador e muito menos de “socialdemocrata”. Uma prova disso é que sua estrela ascendente, e talvez futuro candidato à Presidência, o ex-prefeito de São Paulo João Dória, é um neoliberal de carteirinha. Igual que o MDB, o PSDB “regionalizou-se”, sendo dirigido atualmente por lideranças políticas dos mais diversos perfis ideológicos.

Nos anos em que comandou o país, o PSDB não realizou uma só reforma política, com exceção da aprovação do instituto da reeleição, de forma a garantir mais um mandato para o então presidente Fernando Henrique Cardoso. Desgastou-se com os múltiplos casos de corrupção e caixa 2 em que algumas de suas principais lideranças se envolveram, e cujas investigações ameaçam chegar até ao próprio Alckmin.

Fernando Henrique Cardoso costuma dizer que a questão que se coloca para um governo renovador no Brasil é se ele vai comandar o atraso ou se é o atraso que vai comandá-lo. É a questão que também estará colocada no caso de Geraldo Alckmin ser eleito para presidente. Sua aliança com o centrão lhe garante um tempo extraordinário de propaganda eleitoral na tevê, mas pode comprometer a realização de qualquer tipo de reforma política, social ou econômica.

Incomodados com a imagem negativa que a aliança com o centrão pode trazer para o “Polo Democrático e Reformista”, ativistas da esquerda democrática reagiram com veemência, tratando de dourar a pílula. “O centrão atual é diferente do centrão da Constituinte”, gritam em coro. Ora, embora isso seja verdade, não faz o atual centrão melhor que seu antecessor. Ao contrário, é até pior, já que sua versatilidade e falta de compromisso ideológico permitem que costure qualquer tipo de aliança com forças as mais díspares, como fizeram nos governos do PT, de Temer e agora com a candidatura Alckmin, desde que tenham seus interesses particulares contemplados. É um tipo de fisiologismo arraigado na cultura política brasileira, que tem tradicionalmente impedido reformas estruturais na política, na economia e no combate às desigualdades sociais, além de ser foco constante de corrupção e patrimonialismo.

Argumenta-se ainda que a coalizão que sustenta a candidatura Alckmin não se esgota no centrão, já que abarca outras correntes mais comprometidas com as reformas, como a própria esquerda democrática que integra o “Polo Democrático e Reformista”. Mas com 164 deputados e 32 senadores, o centrão certamente terá uma influência muito maior que a minguada bancada da esquerda democrática, provavelmente indicando os presidentes da Câmara e do Senado, e tendo voz hegemônica nos rumos da campanha presidencial do PSDB.

Muitos tucanos, por outro lado, vivem ressaltando as qualidades de Alckmin como político moderado, gestor experiente e grande articulador político. Ele teria, dessa forma, todas as condições para exercer uma exitosa presidência. Infelizmente para o candidato, não é assim que o eleitorado, até agora pelo menos, tem percebido o político Alckmin, daí o candidato do PSDB estar, já faz um bom tempo, patinando nas pesquisas eleitorais, sem alcançar os dois dígitos, apesar de ser um nome nacionalmente conhecido, ter governado São Paulo e dispor de uma enorme estrutura nacional para sua campanha.

Falta a Alckmin – e é impossível não perceber–, a estatura de um estadista e líder nacional capaz de empolgar o eleitorado, tirar o país do buraco onde o lulopetismo o enfiou, e liderar um projeto de reformas. Até porque, para a elaboração de um plano de reformas estruturais, é necessário um corpo de ideias - a última coisa no mundo que o provinciano médico de Pindamonhangaba é capaz de produzir. Em 2006, quando disputou a eleição com Lula, não teve nem a coragem de defender o programa de seu partido, escondendo-se atrás de uma fotografia em que aparecia ostentando adesivos de estatais brasileiras, para afastar a imagem de “privatista”. Como resultado, acabou tendo menos votos no segundo turno do que obteve no primeiro.

Se Alckmin não tem perfil de reformador, sua aliança eleitoral tampouco ajuda no desenvolvimento da democracia brasileira. Apesar de seus apoiadores falarem interminavelmente sobre democracia, parecem esquecer um aspecto desta forma de governo que a frente que montaram agride frontalmente: o pluralismo.

É difícil encontrar qualquer estudo sério sobre democracia que não a ligue com o pluralismo. Este nada tem a ver com individualismo, como sugeria a vulgata marxista soviética. O pluralismo se baseia no fato muito simples de que o espaço público é habitado por pessoas, e não por uma só pessoa. É por isso que todo sistema coletivista, não pluralista, em que um líder máximo substitui o povo, tende para o autoritarismo. É o caso de sistemas de partido único, democracias plebiscitárias ou regimes populistas, da China de Xi Ji Ping à Venezuela de Maduro, onde o eleitor não é apresentado a propostas alternativas e a pluralidade política é limitada ou mesmo suprimida.

Nas democracias contemporâneas, ao contrário, a pluralidade é muito valorizada. Juntamente com as liberdades civis e políticas, o regime eleitoral de dois turnos compõe, em muitas dessas democracias, o instrumento mais adequado para combinar pluralismo com estabilidade, pois incentiva os partidos políticos a lançarem seus candidatos e apresentarem suas propostas no primeiro turno, ao mesmo tempo em que garante ao vencedor do segundo turno a legitimidade adquirida com a conquista da maioria dos votos.

Isto posto, é natural que, sob um regime autoritário, diversas correntes políticas se unam para lutar pela democracia, como o PCB propôs acertadamente à época da ditadura militar. Ou mesmo que, em um primeiro turno, alguns partidos com forte familiaridade política se coliguem. Mas este não é o caso do frentão que apoia a candidatura Alckmin. Apesar de composto por diversas forças políticas, não tem nada de plural. Os grupos que integram este frankenstein político se limitam a disputar espaços de poder em seu seio, perseguindo suas sinecuras em lutas de bastidores, sem desenvolver perfil próprio além de uma vaga carta de intenções. A identidade política dos candidatos e dos partidos se dissolve em meio a siglas de nomes confusos e contraditórios.

Os políticos que integram o “Polo Democrático e Reformista”, assim como a frente de apoio a Alckmin, parecem apostar que o longo tempo de tevê que o candidato do PSDB dispõe, mais sua capacidade de formar palanques estaduais fortes, vai fazê-lo subir nas pesquisas assim que a campanha eleitoral começar. É possível que isso aconteça, mas falta ainda combinar com o eleitor. O fato é que mesmo que Alckmin não seja eleito presidente, os partidos menores que o apoiam esperam que a aliança com o PSDB os ajude a eleger deputados e senadores em número suficiente para escapar da guilhotina da cláusula de barreira e garantir o fundo partidário.

É perfeitamente normal e justo que os partidos brasileiros busquem os recursos necessários e cumpram as exigências institucionais para se manterem em atividade e garantir sua sobrevivência. Mas poderiam explorar melhor as possibilidades de alianças no contexto de outras alternativas políticas. O presidente do PPS, Roberto Freire, por exemplo, foi contra a candidatura de Cristovam Buarque, alegando que o senador não tem voto. Mas descartou rapidamente o convite que lhe foi feito para ser vice na chapa de Marina Silva, que tem muito mais intenções de voto que Alckmin, inclusive em São Paulo. Poderia ter sido uma opção para a futura criação de um partido democrático de esquerda, sonho do PPS há décadas. A proposta nem foi levada para discussão no partido, já que há um temor em apostar as fichas em uma candidata sem tempo de tevê e sem fortes alianças estaduais, que pode desidratar quando começar a propaganda eleitoral. Mas quem garante que isso vai mesmo acontecer? E se Alckmin tiver o mesmo destino que Ulyssses Guimarães em 1989, que tinha muito tempo de tevê mas acabou bem atrás de outros candidatos com menos tempo e estrutura partidária menor? E isso em uma época sem redes sociais, hoje um elemento que pelo menos relativiza o poder da mídia tradicional.

Seja como for, a ideia que Alckmin seria o candidato das reformas e o salvador da democracia brasileira não passa de uma quimera. Seu histórico político de alianças fisiológicas, a visão liberal da economia e o cristianismo conservador que o candidato do PSDB professa indicam que ele será o candidato do big business: das grandes corporações empresariais, do capital financeiro e do agronegócio. Tanto que o mercado vibrou quando Alckmin selou aliança com o centrão. Imediatamente as ações na Bolsa subiram e o dólar caiu!

Estes fatos nos permitem antever que caso Alckmin seja eleito, diferentemente do que imagina o “Polo Democrático e Reformista”, seu governo vai significar um retrocesso em termos de política ambiental, direitos sociais e econômicos dos trabalhadores, legislação das agências reguladoras e políticas para a área cultural. Quem viver verá.

*Professor do Instituto de Ciência Política, da UnB


Marco Aurélio Nogueira: A metamorfose e a unidade difícil

É da ideia unitária que algum oxigênio poderá ser extraído e injetado na vida política do País

A unidade dos democratas avança com dificuldades.

As principais articulações em curso são eleitorais, haja vista as que envolvem o chamado “centrão”, cortejado por todos e agora associado a Geraldo Alckmin. Coligações são concebidas com os olhos no tempo de propaganda e na “repartição do poder”. São pragmáticas, tentando ser realistas. Diz-se que na mesa estão não somente cargos, mas também uma preocupação com a “governabilidade” do futuro presidente. O quanto será assim não se sabe.

O fundamental não é tratado com seriedade.

Refiro-me à necessidade de instituir um campo democrático que leve em conta as eleições mas vá além delas, comprometendo-se a qualificar a vida política, a ser um vetor programático de reorganização e governo da sociedade.

A renovação política é indispensável. O País não aguenta mais conviver com um sistema político - com seus partidos, sua cultura e suas práticas - que não acompanhou as mudanças que afetaram a estrutura da economia, a sociedade, o modo de vida. As mudanças trouxeram problemas novos sem que os antigos tenham sido resolvidos, formando, assim, um compósito desafiador.

Ainda não se compreendeu bem o quanto há de novidade no mundo atual. Como escreveu Ulrich Beck em seu livro póstumo, não se trata de um mundo forjado pelas mudanças típicas da modernidade capitalista, mas de um mundo que nasceu sob o signo da metamorfose: uma alteração na natureza da existência humana, no modo de estar no mundo, de imaginar e fazer política, de viver a vida.

Evidentemente, nem tudo está se metamorfoseando. Muitas mudanças são, na verdade, reprodução da ordem existente. Mas o importante é compreender o que foge da mera reposição, aquilo que transfigura e cria formas, práticas e expectativas. As lógicas se entretecem, ampliando os problemas e os desafios, mas também abrindo outras perspectivas.

Há um turbilhão pela frente. Precisamos resolver os problemas crônicos de nossa formação e administrar a metamorfose que desponta numa sociedade em que parece faltar a instância decisiva, a política. Sem melhor articulação, mais democracia e coesão, educação e inovação, o futuro ficará travado. Precisamos descomprimir a sociedade, reduzir as polarizações artificiais, ir além da reiteração discursiva esquerda versus direita. Não podemos nos entregar aos reptos “identitários”. Se continuarmos insistindo na lógica “nós” contra “eles”, correremos o risco de retroceder.

Se isso é minimamente razoável, como então pensar em avançar sem ajustes e adaptações, sem reformas nas estruturas e nas instituições, do mercado ao Estado? Necessitamos de uma reeducação geral, para aprendermos a lidar com o que é incerto e ainda não decodificamos.

O ritmo da mudança não é uniforme: muda-se mais depressa nas bases do que nas cúpulas, mais rápido na vida social do que na vida política.

Homens e mulheres têm sua vida sendo alterada, mas não sabem disso e não conseguem extrair disso todos os desdobramentos e exigências. A visão do mundo conserva muitos de seus pedaços presos a imagens tradicionais, que se dissolvem lentamente. O modo de produção transforma-se com rapidez, em silêncio, mas sempre com dor e sofrimento, impulsionado pela revolução técnico-científica e pela globalização do capitalismo. Arrasta consigo as relações sociais e o trabalho, e por essa via invade e reorganiza a vida familiar, os valores e as atitudes, o modo de agir, pensar e sentir.

O plano estatal, porém, resiste, entre outras coisas porque nele estão encastelados os interesses mais bem organizados, que se protegem e tentam bloquear as mudanças que lhes roubam o chão. São interesses que se enraízam em tradições provenientes de um passado que se repõe, embora esteja questionado pela vida. Um passado que identifica, fornece uma linguagem, legitima práticas e condutas. O sistema político é parte disso, e sua resistência à mudança pode impressionar, mas é compreensível.

A sociedade que se metamorfoseia esbarra, assim, numa estrutura de interesses que controla o Estado e dificulta o acesso à política pela população mais sintonizada com a contemporaneidade. O novo é forçado a negociar as regras do jogo com o velho, numa pendência que pode se estender por longo tempo.

É por isso que os candidatos que se querem avançados são levados a se aliar aos setores atrasados. O grito de “renovação” ecoa, mas não se traduz politicamente. O Congresso - visto com desconfiança pela população - não mudará sua composição nas próximas eleições. Os candidatos presidenciais, por sua vez, flertam com o passado, com o mundo que se dissolve e fornece votos, uns vociferando autoritarismo contra a democracia e se oferecendo como salvadores da Pátria, outros tentando abrir uma brecha na muralha.

A “velha” política mostra que é uma das faces ativas da política realmente existente. Não sairá de cena de um dia para outro.

Um campo democrático generoso e renovador é uma construção complexa. O fato de privilegiar mais o futuro que o imediato não o torna sedutor para fins eleitorais. A disposição de agir como uma força - uma ideia, uma causa, uma época - que atraia os democratas que estão espalhados, articulando-os e os unificando, colide com as conveniências e as vaidades dos que, em princípio, deveriam ser seus maiores animadores. O campo democrático precisa questionar os partidos e os procedimentos políticos, mas não tem como se dissociar deles.

Além do mais, sua mensagem não chega aos jovens, que são o dínamo da vida, e não chega porque sua música toca num tom para o qual os ouvidos jovens ainda não foram treinados.

A ideia unitária, em suma, precisa de tempo para frutificar, e o mundo metamorfoseado está marcado pela urgência. Ainda assim, é dela que algum oxigênio poderá ser extraído e injetado na vida política nacional. Talvez não vença no curto prazo, mas tem todo o futuro a seu dispor.


InfoMoney: Alckmin cresce no Sudeste e chega a 10% pela primeira vez, mostra XP/Ipespe

Segundo pesquisa, tucano oscila positivamente em todos os cenários de primeiro turno testados. Interesse nas eleições cresce e "não voto" começa a ceder timidamente

SÃO PAULO - Na semana em que formalizou uma aliança com os partidos do chamado "blocão" (DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade) para sua candidatura à presidência da República, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) atingiu seu maior patamar já registrado em intenções de voto em mais de dois meses. É o que mostra pesquisa feita pelo Ipespe (Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas) entre 23 e 25 de julho, a décima por encomenda da XP Investimentos. O estudo está registrado no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) pelo código BR-07756/2018 e tem margem máxima de erro de 3,2 pontos percentuais, para cima ou para baixo.

Leia também: Por que Alckmin cresceu na pesquisa XP/Ipespe?

Segundo o levantamento, o tucano chega a marcar 10% em dois dos quatro cenários de primeiro turno testados e não aparece mais numericamente atrás do ex-governador do Ceará Ciro Gomes, nome recém-confirmado pelo PDT para a disputa. É a primeira vez que isso ocorre nas pesquisas XP/Ipespe, realizadas semanalmente desde 15 de maio. Excluindo a simulação que considera a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (tida como improvável), Alckmin ocupa a segunda posição no primeiro turno em todos os demais cenários, tecnicamente empatado com outros candidatos, mas numericamente atrás da ex-senadora Marina Silva (Rede).

Contribuiu para a melhora do desempenho do tucano, dentro da margem de erro, em todos os cenários avaliados, um apoio maior entre eleitores do Sudeste, com maior nível de escolaridade e no grupo com idade entre 35 e 54 anos. Para exemplificar, na simulação que considera o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) candidato, as intenções de voto de Alckmin no Sudeste foram de 12% uma semana atrás para 15%. Entre eleitores com Ensino Superior, o tucano foi de 8% para 13%, ao passo que no grupo com Ensino Médio completo, seu desempenho foi de 6% para 8%. Veja os detalhes dos votos de cada candidato clicando aqui.

O deputado federal Jair Bolsonaro (PSL) continua na liderança da disputa nos cenários que desconsideram a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado em segunda instância a 12 anos e 1 mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Segundo o levantamento, o parlamentar tem entre 20% e 23% das intenções de voto, mantendo o patamar registrado uma semana atrás em três dos quatro cenários testados. Bolsonaro conta com vantagem de pelo menos 10 pontos percentuais em relação ao adversário que aparece logo atrás nas simulações.

Leia também: PT x PSDB é o cenário mais provável para o segundo turno na eleição, diz cientista político

A ex-senadora Marina Silva (Rede) pontua entre 13% e 8%, ao passo que o desempenho do ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT) varia de 8% a 10%. Alckmin, por sua vez, agora apresenta pontuação de 9% ou 10% das intenções de voto. Ontem, o tucano formalizou aliança com lideranças do chamado "blocão", grupo composto por DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade, o que amplia seu espaço na televisão e rádio, além de dar maior capilaridade à candidatura nos estados.

Outro destaque do levantamento foi uma oscilação para baixo no percentual do grupo dos "não voto" nos quatro cenários de primeiro turno testados. Agora, brancos, nulos e indecisos somam entre 17% (com Lula) e 34% (sem candidato do PT) nos cenários estimulados e 59% no espontâneo, quando nomes de candidatos não são apresentados aos eleitores. Uma semana atrás, os respectivos percentuais eram de até 36% e 61%. A quase dois meses da corrida às urnas, o patamar atual ainda é considerado elevado, o que reforça o clima de indefinição da disputa.

A pesquisa também mostrou que cresceu o nível de atenção dos entrevistados sobre as eleições. Segundo o levantamento, 29% responderam estar muito interessados no que vai ocorrer no pleito de outubro. O resultado corresponde a um crescimento de 5 pontos percentuais em comparação com uma semana atrás. Outros 22% disseram estar mais ou menos interessados, uma oscilação negativa de dois pontos no mesmo comparativo. Já o percentual de desinteressados foi de 34% para 31%.

Leia também: Defesa de Lula vai usar números para pressionar TSE

Com os resultados dos cenários estimulados, se a eleição fosse hoje, não seria possível cravar quem seria o adversário de Bolsonaro em eventual disputa de segundo turno (apesar do bom desempenho, o militar da reserva está longe de ser presença garantida da disputa final). No cenário mais indefinido e que possivelmente melhor projeta a largada da corrida presidencial, quatro candidatos aparecem tecnicamente empatados: Marina Silva, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin e Fernando Haddad, mediante apoio de Lula. O ex-prefeito de São Paulo salta do patamar de 2% das intenções de voto para 12% com a simples inclusão da informação de que seria o nome apoiado por Lula, em um exercício que testa o poder de transferência de votos do ex-presidente.

Confira os cenários de primeiro turno testados pela pesquisa:

Pesquisa espontânea: sem apresentação de nome dos candidatos

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Cenário 1: sem candidato do PT

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Cenário 2: com Fernando Haddad candidato pelo PT

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Cenário 3: com Lula candidato

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Cenário 4: com Fernando Haddad, "apoiado por Lula"

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Para ter acesso à estratificação dos votos dos candidatos mais votados em cada um dos cenários de primeiro turno testados, clique aqui.

Confira a série histórica das pesquisas XP/Ipespe.

Segundo turno

Assim como na última semana, foram testadas sete situações de segundo turno. Em eventual disputa entre Alckmin e Haddad, o tucano venceria por 36% a 22%, com 43% de brancos, nulos e indecisos. A diferença chegou a ser de 16 pontos percentuais a favor do candidato do PSDB na terceira semana de maio.

Em uma simulação de disputa entre Lula e Bolsonaro, o petista aparece à frente, com 40% das intenções de voto contra 34% do parlamentar, acima do limite máximo de margem de erro de ambos, e com 26% de brancos, nulos e indecisos. Três semanas atrás, a vantagem era de 6 pontos, o que configurava empate técnico. No início da série histórica, o deputado aparecia 2 pontos à frente, também em situação de empate técnico, já que, pela margem de erro (3,2 p.p.), o petista poderia até superá-lo.

Caso Bolsonaro e Alckmin se enfrentassem, a situação seria de empate técnico, com o deputado numericamente à frente por placar de 35% a 34%. É o maior patamar registrado pelo tucano nesta simulação e a menor diferença entre ambos. Brancos, nulos e indecisos somam 32%. A diferença entre os candidatos chegou a ser de 7 pontos percentuais na quarta semana de maio. Em nenhum momento até aqui o tucano liderou a disputa.

Em eventual disputa entre Marina Silva e Bolsonaro, o cenário também é de empate técnico, com a ex-senadora numericamente à frente por 36% a 34%. Brancos, nulos e indecisos somam 30%. O deputado esteve numericamente à frente nos dois primeiros levantamentos da série, realizados na terceira e quarta semanas de maio, quando a diferença chegou a ser de 6 pontos percentuais a seu favor, também dentro do limite da soma das margens de erro de ambos os candidatos.

Empate técnico também é observado na simulação de disputa entre Alckmin e Ciro, com o tucano numericamente à frente por 34% a 29%. A diferença nunca foi tão grande a favor do tucano neste cenário. Brancos, nulos e indecisos somam 37%. Na última semana de junho, os dois apareciam com 32% das intenções de voto cada. Já na primeira semana daquele mês, o pedetista esteve numericamente à frente por diferença de 3 pontos percentuais.

Se Bolsonaro e Ciro se enfrentassem em uma disputa de segundo turno, o cenário também seria de empate técnico (como nas últimas sete semanas), com o parlamentar numericamente à frente, com 34% das intenções de voto contra 32% do pedetista. Brancos, nulos e indecisos somam 34%. Nos dois primeiros levantamentos, o deputado vencia a disputa com diferença superior à soma das margens de erro dos candidatos.

Assim como no levantamento anterior, a pesquisa desta semana incluiu a simulação de segundo turno entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad. Neste cenário, o parlamentar venceria por 38% a 27% das intenções de voto. O grupo dos "não voto" soma 36%.

Rejeição aos candidatos

A pesquisa também perguntou aos entrevistados sobre os candidatos em que não votariam sob nenhuma hipótese. O líder em rejeição continua sendo Lula, com taxa de 60%, tecnicamente empatado com cinco outros possíveis candidatos: Ciro Gomes (58%), Geraldo Alckmin (58%), Marina Silva (59%) e Fernando Haddad (59%). A trajetória dos principais nomes nas últimas sete pesquisas está na tabela abaixo:

CANDIDATODE 11 A 13/06DE 18 A 20/06DE 25 A 27/06DE 02 A 04/07DE 9 A 11/07DE 16 A 18/07DE 23 A 25/07
Lula60%60%61%62%61%60%60%
Jair Bolsonaro52%53%52%52%54%53%55%
Marina Silva57%60%57%58%58%57%59%
Ciro Gomes56%60%59%59%60%59%58%
Geraldo Alckmin60%60%59%59%59%58%58%
Álvaro Dias41%45%48%48%47%47%48%
Fernando Haddad57%58%58%57%57%56%59%

Fonte: XP/Ipespe

Para acessar a íntegra desta e de todas as outras pesquisas, clique aqui.

Metodologia

A pesquisa XP/Ipespe foi feita por telefone, entre os dias 23 e 25 de julho, e ouviu 1.000 entrevistados em todas as regiões do país. Os questionários foram aplicados "ao vivo" por entrevistadores (com aleatoriedade na leitura dos nomes dos candidatos nas perguntas estimuladas) e submetidos a fiscalização posterior em 20% dos casos para verificação das respostas. A amostra representa a totalidade dos eleitores brasileiros com acesso à rede telefônica fixa (na residência ou trabalho) e a telefone celular, sob critérios de estratificação por sexo, idade, nível de escolaridade, renda familiar etc.

O intervalo de confiança é de 95,45%, o que significa que, se o questionário fosse aplicado mais de uma vez no mesmo período e sob mesmas condições, esta seria a chance de o resultado se repetir dentro da margem de erro máxima, estabelecida em 3,2 pontos percentuais. O levantamento está registrado no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) pelo código BR-07756/2018 e teve custo de R$ 30.000,00.

O Ipespe realiza pesquisas telefônicas desde 1993 e foi o primeiro instituto no Brasil a realizar tracking telefônico em campanhas eleitorais, a partir de 1998. O instituto tem como presidente do conselho científico o sociólogo Antonio Lavareda e na diretoria executiva, Marcela Montenegro.


Fernando Gabeira: Sísifo e o Centrão

Eleitores podem colocar a pedra lá em cima para vê-la, de novo, rolar montanha abaixo

Algumas coisas que deveriam estar juntas correm em dimensões ainda diferentes no Brasil, realidades paralelas: o aumento do índice de mortalidade infantil, como sintoma de decadência, e a campanha eleitoral no Brasil. O desencontro da vida real com a política se deve também ao momento em que campanha significa muito arranjo entre partidos, composições, definições de tempo de TV, escolha de vices. É como se o jogo ainda estivesse sendo discutido no vestiário, antes que saia para o campo aberto, diante da plateia.

Mas as notícias que vêm pelo túnel já nos dão matéria para pensar. O famoso bloco parlamentar chamado Centrão é uma das referências do quebra-cabeças. Esta semana, o Centrão decidiu apoiar Geraldo Alckmin. E o mercado reagiu positivamente à notícia.

Uma aliança com o Centrão significa a continuidade do que está aí: ocupação política dos cargos, troca de votos por verbas, enfim, um roteiro que não é necessário relembrar.

O mercado, que aparentemente almejava mudanças, acabou se conformando com a continuidade. Seria isso a manifestação de um senso comum? Não sei bem o que seria um senso comum. Aliás, Leonardo da Vinci tem um belo desenho de crânio em que apontou uma pequena cavidade onde seria o senso comum, o espaço para onde convergem todas as sensações.

Transplantado da fantasia física de Da Vinci para o campo social, o senso comum também poderia estar em outra manifestação: a das pessoas que dão as costas para a política porque rejeitam seus sórdidos métodos. Estas querem mudança, certamente, mas provocam a continuidade. O oposto do que desejam.

A rigor, continuidade dificilmente haverá. Se o mesmo esquema for mantido, as coisas vão piorar. O Congresso já armou uma bomba fiscal que certamente tornará um novo presidente mais vulnerável.

A experiência recente do Congresso foi a de tratar com dois presidentes fracos que precisavam dele para sobreviver no cargo. Dilma caiu, mesmo tentando negociar. Temer teve êxito na negociação para escapar. A correlação de forças entre presidente e Congresso foi alterada por essas experiências recentes. E isso, é claro, vai repercutir no ano que vem. Não importa o presidente vitorioso, de qualquer forma, ele terá de atravessar essa barreira de troca de votos por cargos e verbas.

O mundo real continuará em perigosa decadência. Até gripe se tornou mais letal, num país onde o sarampo reaparece.

Os custos de serviços públicos ineficazes foram sentidos em 2013 e expressos no desejo de ver o dinheiro dos impostos ser mais bem empregado. O impacto da corrupção foi sentido a partir de 2015, com os primeiros lances da Operação Lava Jato. Existe o perigo de que todo este processo de tomada de consciência se sinta frustrado com o desenrolar de uma eleição que pode prolongar a crise.

Impossível prever muitos lances à frente, no entanto torna-se mais claro que, embora o foco se ache na eleição presidencial, é no Congresso que se armam algumas bombas, inclusive a tentativa de acabar com a Lava Jato.

Não vejo saídas brilhantes num cenário em que os partidos, cheios da grana, vão permanecer no poder. Exceto uma atenção maior na eleição para o Congresso e a tentativa de criar uma minoria que defenda a sociedade deste mecanismo vampiresco.

Ainda assim, num tipo de luta como este, a minoria tende a ser isolada e as vitórias se contam em desastres evitados, picaretagens abortadas. O rumo, mesmo, é difícil de mudar.

Nem tudo é sombrio. Graças à Lava Jato, aumentou o risco nos processos de corrupção. Nas composições políticas de agora dificilmente vai entrar dinheiro vivo. É um avanço relativo, porque o rateio dos cargos públicos pode se tornar uma máquina de fazer dinheiro.

Nesse raciocínio, algo que talvez pode ser útil é enfatizar no debate a importância da relação presidente-Congresso e tentar liberá-la, ainda que parcialmente, de seu caráter fisiológico.

Não é uma solução do tipo “seus problemas acabaram”, mas cairia bem no Brasil o sistema francês: eleições parlamentares na semana seguinte à eleição presidencial. O calendário fortalece uma aproximação programática, a tendência dos eleitores é a de garantir maioria para seu presidente eleito.

Isso nem sequer foi pensado numa reforma política, cujo principal objetivo foi o de perpetuar as forças existentes com seus mecanismos de poder. Duas tímidas exceções foram a adoção de uma cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais.

O quadro descrito aqui não é um destino inexorável. Mas o fato de que o Centrão negocia em bloco antes mesmo das eleições e está preparado para exercer uma influência decisiva nos anos que seguem é preocupante. Desde já, aparece como um dos nós a serem desatados.

Como o jogo está sendo discutido no vestiário, não veio ainda a campo aberto e o grande público não se manifestou, ainda existe esta variável da reação popular em aberto.

Mas algumas das regras foram escritas pelos próprios jogadores: até mesmo a latitude dessa variável foi reduzida.

Restam apenas a crise e sua dolorosa pedagogia, sobretudo quando se torna mais aguda. De um modo geral, atinge os mais vulneráveis, e o sistema político, por meio de aumento de impostos e outros sacrifícios sociais, tenta se manter incólume.

Caminhamos para o futuro com um modo de governar chamado governo de coalizão que contém todos os vícios do passado. Como Sísifo, a maioria dos eleitores brasileiros pode colocar a pedra lá em cima para vê-la, de novo, rolar montanha abaixo.

Os filósofos discutem uma saída para essa maldição entre suicídio e revolta. Em termos políticos, certamente haverá muitas nuances, mas algum tipo de revolta é inevitável no horizonte.

A Venezuela está se derretendo e terá inflação de um milhão por cento. Parece ficção, mas já aconteceu na Alemanha em 1923 e na Rodésia no princípio do século.

Dominados por predadores, da esquerda ou da direita, os países se tornam quase inviáveis.


Pedro Doria: O Facebook interferiu nos debates da eleição brasileira

Como a empresa não informou quem estava entre as páginas que decidiu banir, não temos como saber se tem razão e agiu corretamente

Na terça-feira, o Facebook reuniu em seu escritório paulistano um grupo de jornalistas para que a diretora global de política, Katie Harbath, explicasse os planos da rede para as eleições brasileiras. Nada foi comentado a respeito da bomba que a empresa soltaria no dia seguinte: a remoção de 196 páginas e 87 perfis que, de acordo com o comunicado oficial, “faziam parte de uma rede coordenada que se ocultava com contas falsas”. Ao longo das horas seguintes, o Movimento Brasil Livre anunciou que muitas das páginas eram suas.

De acordo com o Facebook, oficialmente, o expurgo não tem nada a ver com notícias falsas. O grupo de páginas e perfis violavam as regras de autenticidade que estão no contrato do site. Ou seja, usavam contas falsas para ajudar na viralização de certas mensagens. Uma pessoa não pode ter mais de uma conta no Facebook, permitir que outros usem a sua, ou agir em conjunto para promover aquilo que foi criado por contas falsas. Segundo o MBL, suas páginas excluídas tinham meio milhão de seguidores. Para o Facebook, era uma máquina que “escondia das pessoas a natureza e a origem de seu conteúdo com o propósito de gerar divisão e espalhar desinformação”.

Ou seja: a empresa afirma que o grupo se reuniu para fraudar o debate público. Parecer mais representativo do que de fato era.

Nenhum jornalista tem como confirmar se é verdade. Em março, quando baniu a página do grupo neofascista Britain First e o perfil de dois de seus líderes, ambos por violarem as regras sobre discurso de ódio, a rede deixou claro quem estava sendo cortado. Assim como, para qualquer pessoa razoável, perceber o discurso de ódio era trivial. Desta vez, ela não informou quem foi banido. E não temos como verificar se as razões procedem.

Só nos resta confiar na palavra do Facebook.

O Facebook é uma empresa privada, e o contrato de uso tem regras claras. Se as violaram, expuseram-se a uma punição. O problema é que o Facebook é também a praça pública. É o ambiente — no Brasil e em boa parte do mundo — onde mais pessoas se reúnem para debater política. Por isto, muitos atores trabalham a plataforma para manipulá-la e intervir de forma fraudulenta no processo eleitoral. Só que o banimento de um grupo político organizado também exclui um conjunto de ideias do ambiente onde o debate se dá. E isso às vésperas de uma eleição.

A missão que cabe ao Facebook é ingrata. Seu sistema já foi usado — não se sabe com que grau de eficiência — para manipular o voto no Reino Unido e nos Estados Unidos. É um problema real, que tem de ser encarado. E o Facebook está agindo. Esta decisão de expurgo de uma rede que tem por trás perfis falsos faz parte da ação.

Mas talvez o problema seja insolúvel. Porque a praça pública não pode ser privada. As regras da praça pública exigem plena transparência. Não pode, nela, haver julgamentos sumários. Não numa democracia.

E esta é uma discussão que estamos apenas começando a ter. Se um grupo pequeno de empresas — não apenas o Facebook, mas também Twitter e Google — serve de abrigo ou caminho para um bom naco das conversas sobre política, sobre os rumos de nações, temos perante nós um problema novo na história das democracias.

É razoável partir do princípio que o Facebook tem as melhores intenções, que pôs gente muito inteligente e tecnicamente capaz debruçada sobre a decisão. Não resolve o dilema entre público e privado. Esta semana, uma empresa privada interferiu no debate eleitoral brasileiro. E não temos como saber se ela tem razão.

*Pedro Dória é jornalista.


Luiz Carlos Azedo: A frente ampla

O instinto de sobrevivência das elites políticas leva ao caminho do meio, no caso o tucano Geraldo Alckmin, testado e aprovado pelo establishment como governador de São Paulo

Durante o regime militar, nunca houve consenso entre as elites do país. Sempre houve uma resistência política organizada, institucional, nos espaços legais, o que, no decorrer do processo, se demonstrou mais eficiente e produtiva — e capaz de conquistar adesão popular —, do que a agitação pura e simples ou a desastrada luta armada. Antes da consolidação do antigo MDB como frente eleitoral das oposições, o que somente se deu após as eleições de 1974, essa elite dissidente foi representada pela chamada Frente Ampla, formada em 1966. Reunia a oposição trabalhista liderada por João Goulart e dois políticos que haviam apoiado o golpe, o ex-presidente Juscelino Kubitschek, do antigo PSD, e, para espanto de muitos, o ex-governador carioca Carlos Lacerda, líder inconteste da UDN, além do líder comunista Luiz Carlos Prestes (PCB), na clandestinidade.

O programa da Frente Ampla era essencialmente democrático: retorno às eleições diretas, anistia, pluripartidarismo e direito de greve. A aliança de Lacerda com Jango, JK e Prestes foi uma decorrência óbvia da suspensão das eleições diretas à Presidência da República, que estavam marcadas para 1965, na qual o udenista seria candidato. A edição do AI-1 anulou as esperanças de Lacerda, que passou à oposição, embora fosse um dos líderes civis do golpe. Com um manifesto no jornal Tribuna de Imprensa, do qual era fundador e diretor, o ex-governador exigia eleições diretas, desenvolvimento econômico, reforma partidária e uma política externa soberana.

Com comícios e mobilizações, a Frente Ampla conquistou adesão popular e promoveu grandes manifestações no ABC Paulista, em Londrina e em Maringá, assustando o presidente Costa e Silva, o general que havia substituído o marechal Castelo Branco no Palácio do Planalto. Ainda mais após a morte do estudante Edson Luiz, em 28 de março daquele ano, que provocou grandes manifestações estudantis e levou o alto clero católico à oposição. Em abril, a Frente Ampla foi cassada; na sequência, motivado também pelas ações armadas da esquerda radical, que optou pelas guerrilhas urbana e rural, Costa e Silva editou o AI-5, em 13 de dezembro daquele ano. Lacerda teve os direitos políticos cassados e acabou preso, porém, após uma semana de greve de fome, foi libertado.

Os líderes da Frente Ampla mantiveram certa influência política, mas foram impedidos de participar de eleições. Morreram antes da anistia: Juscelino em 22 de agosto de 1976, em um acidente de carro na Via Dutra; João Goulart, no exílio, em 6 de dezembro de 1976, em Mercedes, na Argentina, de um ataque cardíaco; Lacerda, em 21 de maio de 1977, após ter sido internado por desidratação, devido a uma infecção no coração. Suspeitas de que essas mortes tão próximas umas das outras estejam relacionadas à Operação Condor, montada em 1975 entre militares do Chile, Argentina, Brasil e Paraguai para combater seus opositores, nunca foram comprovadas.

Alckmin

Ontem, líderes do “Centrão” anunciaram o apoio à pré-candidatura do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência da República, reeditando uma frente ampla que reúne o establishment político do país. O grupo é formado por DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade, que agora se juntam ao PSDB, ao PSD, ao PTB e ao PPS. O deputado federal Paulo Pereira da Silva (SD-SP) resumiu o significado do apoio: “Estamos convencidos de que para tirar o Brasil desse buraco que estamos só com um conjunto de forças como esse, que se junta em torno dessa candidatura”. O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), afirmou que o tucano poderá contar com a “militância aguerrida” do partido. Ambos eram aliados de Lula, derivaram para a oposição à Dilma Rousseff, namoraram a candidatura de Ciro Gomes e acabaram junto ao tucano paulista. Formou-se uma frente que terá quase 50% dos meios de campanha destinado a todos os partidos, principalmente o tempo de televisão: 14 minutos e 47 segundos a mais de tempo de TV, contando os programas eleitorais diários e as inserções na programação.

Ao contrário da Frente Ampla da década de 1960, essas forças não estão na oposição, apenas mantêm distância regulamentar do MDB, que deve confirmar a candidatura do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles. Nos bastidores, houve um empurrãozinho do presidente do Michel Temer para que a aliança não sofresse obstrução do governo. O que motiva essas forças? É a aposta nas estruturas partidárias existentes e seus mecanismos de reprodução de poder. O instinto de sobrevivência das elites políticas leva ao caminho do meio, no caso o tucano Geraldo Alckmin, testado e aprovado pelo establishment como governador de São Paulo por quatro mandatos.

No fundo, a reação dos políticos do “Centrão” às candidaturas de Jair Bolsonaro (PSL) e de Ciro Gomes (PDT) tem o seu DNA na crise de 1964 e na reação dos políticos daquela época ao que aconteceu, principalmente os que apoiaram o golpe militar e se arrependeram. Representa também o convencimento de que o projeto do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que mantém uma candidatura inelegível a qualquer preço, não tem a menor viabilidade.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-frente-ampla/


El País: “A ideia de uma chapa com Ciro não morreu na praia. Está na ilha ainda”, diz Fernando Haddad

Atual coordenador do programa de Governo do PT, Haddad fala da simpatia pelo pedetista. Promete política de redução de spread para baixar juros de bancos e taxação de heranças e
faz críticas à mídia que teme censura com regulação, mas tem atitude de “censor”

Por Carla Jimenez, do El País

O ex-prefeito Fernando Haddad saiu do Paraíso. O bairro em que viveu enquanto foi prefeito de São Paulo, e onde era frequentemente visto passeando com seu cachorro Stick, agora faz parte do passado. Mudou-se para o Planalto Paulista, também na zona sul da cidade, e se instalou com a família na casa de arquitetura modernista onde cresceu com os pais. “Minha mãe me disse que, se eu não viesse para cá, ela ia vender o imóvel”, comenta Haddad, atual coordenador do programa de Governo do PT e da campanha de Lula à presidência da República. Nos últimos dias, a casa modernista viveu um entra e sai de jornalistas após o partido publicar as linhas gerais do programa aprovado pelo ex-presidente petista para ser adotado em um eventual Governo do seu partido.

O PT espera que seja o próprio Lula a governar o Brasil, se o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral permitirem que ele seja candidato, e a sua enorme intenção de voto se transforme em realidade. Mas é Haddad quem está dando a cara, neste momento, ao anseio do partido de voltar ao poder. O ex-prefeito está treinado para negar as especulações sobre o seu nome. “Só existe plano A [com Lula candidato na cédula]”, repete ele sistematicamente, numa frase pouco crível para quem tem como mentor um animal político como Lula. Pelo sim pelo não, a realidade vai se impor no próximo dia 17 de setembro, data limite para o TSE dar o veredito para o futuro de Lula e do PT nesta eleição. Faltarão, então, só 20 dias para o primeiro turno da eleição, quando ou ele ou outro nome do partido deverão se apresentar no lugar do ex-presidente. Ou, como alternativa, apoiar outro candidato.

Pergunta -  Você, como coordenador da campanha do PT à presidência, e diante da possibilidade de que o PT tenha de escolher um nome para suceder Lula, é naturalmente associado ao papel de sucessor a candidato do ex-presidente caso ele seja impedido de concorrer.
Resposta. Essa conversa não existe dentro do PT.

P. Por enquanto.
R. Nem existirá. O PT vai registrar o Lula dia 15 [de agosto] e vai lutar, tanto no TSE, como no Supremo, para viabilizar a candidatura dele. Esse é o plano A e único.

P. [O ex-secretário de Cultura e ex-vereador] Nabil Bonduki escreveu um artigo na Folha nesta terça, cobrando do partido que seja coerente com a própria tese do golpe de que o Lula será impedido de concorrer, sugerindo que outro nome seja apresentando, pois faltam 75 dias para a eleição. Não faz sentido?
R. Mas o que sabemos... A jurisprudência do TSE consolidada até aqui garante o registro pelo artigo da lei eleitoral. Por que daríamos como certo que essa jurisprudência irá mudar? Essa é a pergunta que o Lula se faz e eu me faço. Por que vamos dar como certa a mudança da jurisprudência até aqui?

P. Porque a Justiça não tem sido...
R. Imparcial?

P. Garantista, como foi até pouco tempo atrás.
R. Sim, mas se o que você está dizendo é verdade, menos ainda podemos convalidar uma mudança completa de postura em relação aos processos.

P. Se esse processo demorar, e estiver muito em cima, não sei até que ponto o TSE pode estender a resposta a esse processo. Corre o risco do PT ficar fora de uma eleição? Com tão pouco tempo de troca?
R. Não posso antecipar movimentos do Judiciário. Quem poderia esperar que o TRF-4 agisse como agiu, em relação ao Lula, aos prazos, à tipificação do crime de lavagem de dinheiro que, para dizer o mínimo, foi absolutamente inovador? (Haverá) taxação progressiva sobre bancos. (...) Os bancos serão induzidos a reduzir as taxas de juros

P. Se Lula for candidato, como se vislumbra uma campanha? Ele é um nome conhecido, mas você, a Gleisi Hoffmann, seriam o rosto durante este período, tendo em vista que ele não vai poder gravar programa?
R. Em algum momento alguém vai ter que dar uma resposta para a questão democrática, pois no fundo é isso que está em jogo. A própria imprensa tem provocado o Judiciário no sentido de garantir o direito a livre manifestação, de liberdade de expressão. Transbordou a para esfera dos próprios fundamentos da democracia. Outro aspecto a ser considerado.

Ciro e coligações
P. Falamos sobre Lula liderando pesquisa, mas existe um percentual alto de eleitores que não querem votar em ninguém. Como o PT pretende abordar este eleitor?
R. Estamos vivendo uma crise institucional pós-golpe. E isso trouxe feridas, afetou a vida das pessoas. Precisamos fazer uma refundação democrática. Eu creio que a campanha, se for bem traduzida programaticamente, desperta esperança nas pessoas, e elas comparecem. Mas nesse momento não sei avaliar o quanto uma campanha de 30 dias vai afetar o humor das pessoas.

P. E as coligações, quais as possibilidades?
R. Eu não estou acompanhando pessoalmente as conversas, mas sempre defendi desde o ano passado que os canais com PDT, PC do B, PSB, PROS, estejam sempre desobstruídos, porque pode acontecer na etapa final uma confluência, que eu espero que aconteça.

P. Ciro chegou a falar que uma chapa junto com você seria um dream team. Essa ideia morreu na praia?
R. Não sei se se aplica o termo morreu na praia. Não saiu nadando, está na ilha ainda [risos]. Eu fui contemporâneo do Ciro na Esplanada dos Ministérios, mantenho com ele até hoje excelentes relações, e me aproximei muito do Cid quando ele foi governador. Então tenho muito respeito e admiração pelos Ferreira Gomes. São pessoas de valor, e essa afinidade acaba gerando este tipo de desejo, o que é natural. Nós incrementamos o mercado de massa, fizemos também bons trabalhos, mas não fizemos tudo. Por isso queremos voltar a governar

P. Você diz que não existe no PT uma conversa sobre os potenciais nomes para substituir o Lula. E existe um debate sobre se unir ao PDT na reta final?
R. Eu vejo declarações de simpatia mútua. Sempre estivemos juntos, desde os tempos do Brizola [Leonel Brizola, ex-governador do Rio].

P. Então não é algo improvável essa união...
R. Uma coisa que é importante para nós é a candidatura do Lula, que lidera as pesquisas e que seria eleito talvez no primeiro turno.

P. Mas esse é o plano A...
R. O problema é que se os partidos não estiverem coligados até o dia 5 de agosto, data final para as convenções, não poderão mais estar coligados dia 17 de setembro. Esse é o problema. É um problema legal.

P. E se no dia 17 de setembro o TSE diz que Lula não pode ser candidato, o que o partido fará? Abrirá mão da candidatura ou apoiará outro candidato?
R. Sem coligação pode [apoiar outro]. Como exercício jurídico pode.

P. Mas como exercício político... O PT como protesto abrir mão de sua candidatura caso Lula não possa disputar.
R. Como exercício de futurologia...

P. É uma realidade que vai se impor, não é futurologia.
R. Não sei te responder.

P. Você diz que não se fala em plano B no partido. Mas se fala muito no nome do Jaques Wagner e no seu. O partido vai aguardar até os 45 minutos do segundo tempo pra elaborar o plano B?
R. Eu desconheço. Não tenho conhecimento disso.

Fórmula para retomar a economia
P. Falando dos planos do partido. O país vive uma necessidade urgente de retomar a economia. O que vocês enxergam como caminho par retomar o investimento?
Eu consegui grau de investimento na cidade de São Paulo. Não foi a direita. A direita quebrou a cidade. Tem muito investimento travado por incompetência do governo. Você pode reativar muitas parcerias público privadas, muitas joint ventures de empresas estatais, concessões, sem dificuldade. Dou um exemplo. Queremos trocar toda a iluminação publicado do país por LED. Isso se faz sem custo. Com a economia de energia elétrica você paga o investimento privado.

P. A expansão de crédito está contemplada no programa do PT de que forma?
R. Há um projeto de indução de redução de spread (diferença entre os juros que os bancos pagam para captar recursos e o que cobram de seus clientes na hora de emprestar), por meio de taxação progressiva sobre bancos. Instrumento pelo qual obrigaremos o sistema a reduzir o spread, gradativamente. Os bancos serão induzidos a reduzir as taxas de juros praticadas em todas as linhas de crédito: cartão de crédito, cheque especial e capital de giro. Tem muita gente com boas ideias mas não tem o crédito para implementá-lo. A economia moderna é baseada em crédito. Nosso sistema de crédito é um paradoxo. Temos um sistema mais robusto em termos tecnológicos do mundo e não conseguimos oferecer crédito barato para as pessoas. Não estamos dialogando só com o consumo de massas para ter acesso ao crédito. É com o empresariado que não tem acesso também. Quem movimenta economia no Brasil é a pequena e a média empresa, que tem dificuldade de ir ao BNDES, que é quem gera emprego. Ela tem de ter um sistema bancário acessível. A agência vizinha à loja, padaria, ela tem de estar disponível com crédito barato. Não temos crédito barato para empreendedor. Precisamos retomar a expansão do mercado de capitais. Tivemos recorde de IPOs com o Lula porque havia pujança.

P. Essa mesma pujança, e um excesso de confiança, gerou efeitos colaterais, como a própria inflação que estourou. O partido chegou a ser criticado, inclusive, por ter estimulado mais a formação de consumidores e não de cidadãos.
R. Discordo com parte desse diagnóstico. Quando você faz Mais Médicos estamos falando de cidadania. Quando sai de 3 para 8 milhões de universitários isso é cidadania. Quando faz Pronatec, manda jovens para o exterior, não é consumo, é cidadania. O programa Luz para Todos não é consumo, é cidadania. Nós incrementamos o mercado de massa, mas nós fizemos bons trabalhos, mas não fizemos tudo. Por isso queremos voltar a governar. Precisamos de uma reforma tributária para tornar nosso sistema menos regressivo do que ele é.

P. Como iria funcionar?
R. Tem toda uma estratégia de transição do modelo, com mecanismos bastante sofisticados de transição que não vi em nenhum modelo até agora. Acho que nós encontramos esse caminho de transição. Por duas travas. Uma trava da carga tributária liquida, e uma da receita real dos entes federados. Criando essas duas travas, criando um imposto de valor agregado, que vai durante a transição nos garantir esses dois pressupostos para migrar de uma situação para outra. Dando garantias ao Congresso de que nosso objetivo é a mudança de composição da carga, fazendo com que quem não pode pague menos, e quem pode, pague mais, um critério universal de um regime tributário.

P. E a taxação das grandes fortunas? A cena de Bolsonaro sendo aplaudido na CNI... Alguém deve ter visto aquilo e falado: “Até onde nós vamos com essa aventura?” Acendeu o sinal amarelo, vermelho ou roxo.
R. Nós colocamos isso porque está na Constituição. Mas a nossa perspectiva de curto prazo é a progressividade de imposto sobre heranças, que é uma prática internacional bastante estabelecida. Na Europa, EUA, até os liberais defendem taxação progressiva sobre grandes heranças, pois sendo um regime pretensamente meritocrático, nada mais meritocrático contribuírem com um fundo público de acordo com suas possibilidades. Isso está mais no nosso horizonte do que outra coisa. Agora, diminuir Imposto de Renda sobre trabalhador para reintroduzir IR sobre lucro dividendos está no nosso horizonte. No sentido de calibrar a composição do fundo, sem pretender aumentar a carga líquida neste momento. Essa transição vai viabilizar uma mudança importante. Com uma mudança importante, que vamos iniciar nos primeiros meses. A isenção de IR até cinco salários mínimos implementamos no primeiro ano, mais acesso ao crédito: são duas alavancas. É acesso do empreendedor para quem quer gerar emprego.

P. Vocês têm propostas que fortalecem o trabalhador e a pequena e média empresa. Mas temos uma elite empresarial...
R. Essa já está contemplada. Aliás, a crítica que se faz é que só eles têm acesso ao Estado. Comecei falando do PPP, grandes empreendimentos. Não vamos descuidar de nada.

P. Mas como setor bancário deve reagir ao mecanismo de indução de redução de spread?
R. Acredito que eles não podem ser contra ter um sistema moderno de crédito no país. Obviamente nós vamos ouvi-los. Exemplo: execução de garantia no Brasil é algo demorado. Então eles têm o pleito de melhorar sistema judiciário em geral para executar garantias. Muitas vezes tem garantia formal, mas na prática não tem. Isso nós vamos cuidar.

P. Estamos com uma dívida pública altíssima, que se descolou, inclusive, de outros países emergentes, como Chile e Colômbia. Como lidar com essa questão, uma vez que a expansão de parte desta dívida pública é atribuída aos Governos do PT?
R. Primeiro, corrigindo esse erro. Se você olhar o que nós pegamos de dívida dos Governos do Fernando Henrique Cardoso você vai ver que ao longo dos anos a dívida pública bruta e líquida, sobretudo a líquida, caiu barbaramente. A bruta só não caiu mais porque nós compramos 370 bilhões de dólares em reservas cambiais. Você pode até criticar a compra dessas reservas, mas não dá para dizer que não caiu a dívida. Se vendêssemos todas as reservas hoje, a dívida voltaria ao patamar de 50 e poucos por cento, menor que a herdada de Fernando Henrique.

P. E como seria a correção destes erros?
R. Primeiro, temos que reativar a economia. Tem uma coisa que os conservadores falam, “ah, tem que checar a efetividade de programas, cortar programas que não têm impacto”. Isso é óbvio, não pode ser nem bandeira de campanha, qualquer um que entra lá tem que fazer as contas. Mas as pessoas têm que dizer como vão reativar a economia. Nós estamos dizendo como vamos fazer. Retomada do investimento público, concessões, PPP, joint ventures, melhoria da renda das famílias mais pobres...

P. Mas, dependendo do investimento, você bate de novo no aumento de dívida pública. Como fazer essa engenharia?
R. Depende. As estatais têm um outro regime, com investimentos que não implicam aumento de custeio. É preciso fazer uma análise caso a caso para ver quais vão ser as obras que vão impactar a produtividade da economia. Você tem estratégias para enfrentar esta questão que são tradicionais: parcerias com o setor privado precisam ser retomadas. Muita coisa por fazer que está parada. E também mudar a composição do fundo para favorecer as pessoas de renda mais baixa que tem maior propensão ao consumo, além de melhorar o sistema de crédito. Sem crédito a economia não pode retomar. São medidas de curto prazo que já implicam uma retomada da economia. E obviamente abrir o orçamento e ver qual gasto público precisa ser revisto. Isso é rotina. Eu consegui grau de investimento na cidade de São Paulo fazendo isso. Cortando custeio, renegociando dívida com a União, voltando a pagar precatórios. Não foi a direita que conseguiu o grau de investimento. A direita quebrou a cidade.

(Os donos das concessões de TV) concentram propriedade, propriedade cruzada no Brasil é prática. Combinação entre poder político e comunicação é regra. Isso é arcaico

P. E como pacificar a relação com o setor produtivo que hostilizou Dilma durante o impeachment?
R. O setor produtivo estará diante da realidade que vai se colocar a partir de 1º de janeiro de 2019... Entendo que o projeto Temer será derrotado nas urnas, seja lá quem for seu representante, provavelmente Alckmin.

Alckmin, Temer e o Centrão
P. Você acha que Alckmin representa a continuidade do projeto Temer?
R. Eu não acho, não é uma questão de achar... O ministro da Fazenda do Temer foi secretário da Fazenda do Alckmin. O ministro das Relações Exteriores é do PSDB. O ministro das Cidades era do PSDB. Então o PSDB está no Governo inteiro. E quem deu sustentação à aventura Eduardo Cunha e do impeachment foi o PSDB.

P. Esse bloco parlamentar chamado de Centrão, que hoje está fechado com o Alckmin, é um grupo que se fortaleceu muito durante os Governos do PT...
R. Não acho que se fortaleceu, ele ficou do tamanho que era. Mas ele tem uma presença muito forte. Acho que ele está mais articulado do que antes, até pela vulnerabilidade do PSDB, muito dependente de acordos. O PSDB sempre teve uma maior facilidade em compor maiorias, pela inércia das coisas. E hoje está com mais dificuldade em virtude da fragilidade da candidatura Alckmin.

P. Como você vê o embarque provável do Centrão na campanha do Alckmin? Fica aliviado pelo fato deles não darem musculatura para Bolsonaro?
R. Eu nunca acreditei que eles fossem fechar com o Bolsonaro. Deve ter havido uma ordem de comando também. Estava demais, né? Acho que a cena na Confederação Nacional das Indústrias, com o presidente entidade de braço dado com o Bolsonaro, sendo aplaudido cinco ou seis vezes, alguém deve ter visto aquilo e falado: “Até onde nós vamos com essa aventura?” Entendo que isso acendeu o sinal amarelo, vermelho ou roxo.

P. A Dilma experimentou de maneira amarga o que é lidar com um Congresso que era considerado o mais conservador já eleito, com crescimento de bancadas como a da bala. Como alcançar governabilidade, como trabalhar isso?
R. Desde a campanha é preciso angariar apoio para suas propostas. Não dar de barato de que ganhando você vai ter o mando do jogo. É preciso que haja um diálogo com a população muito precoce e permanente. Mesmo você tendo dito durante a campanha tudo o que vai fazer no Governo, você precisa manter a democracia ativada, participativa. As nossas medidas são boas para a maioria do povo. Reduzir a carga tributária do pobre que paga muito e aumentar sobre o rico, que paga pouco, é razoável. Você aumenta a renda disponível dos pobres e reativa o consumo. Isso reativa a economia. Você pode achar que está perdendo, mas de forma intertemporal você está ganhando, o próprio empresário. Ganha produzindo.

Mídia regulada
P. Algumas das propostas, como a regulação da mídia, tem potencial para indispor um futuro Governo petista com o Congresso, já que parte dos parlamentares são donos, direta ou indiretamente, de retransmissoras de TV e estação de rádio. Isso não pode acirrar a animosidade com o Governo?
R. Isso é ilegal: político ser dono de concessão é ilegal. Não podemos fechar os olhos para uma inconstitucionalidade. Isso distorce a democracia. A imprensa deveria ajudar a sanear esse problema. Me causa perplexidade que a imprensa dita liberal compactue com essas práticas oligopólicas e de confusão entre o público e o privado. Não é compreensível que essas forças que a todo momento evocam o liberalismo sejam refratárias à modernização das relações. Estamos falando de aplicar Constituição.

P. Lula quando teve todo apoio popular não o fez. Aí, agora, quando a grande mídia é alvo do PT após o impeachment, não soa como revanche?
R. Até vocês, e isso eu não gostaria que fosse suprimido da minha entrevista, são alvos da grande imprensa. Tem a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) para tirar o EL PAÍS do ar [no Brasil] no STF. Na verdade, temos uma oligarquia censora no Brasil. Eles estão impedindo a livre circulação de ideias. Já pensou se o PT entrasse com ação do ar invocando lei? Eu fico perplexo. Não se toca no assunto. The Intecept, BBC, EL PAÍS podem sair do ar, se a ADIN for aceita. Quem são eles para falar de censura, se eles são censores que querem tirar sites alternativos do ar, organizações internacionais? Eles têm uma prática muito diferente do discurso. Eles concentram propriedade, do ponto de vista vertical como horizontal, propriedade cruzada no Brasil é prática. Combinação entre poder político e comunicação é regra. Isso é arcaico e patrimonialista, atrasado.

P. Como mostrar isso sem parecer que o PT simplesmente está querendo se opor...
R. Se você publicar o que estou falando, que existe uma ADIN contra vocês, as pessoas talvez comecem a entender, mas se você esconder do teu leitor o processo do qual você é vítima você não contribui com a democracia. Eu já dei entrevista em que foram suprimidas minhas palavras sobre essa questão. Quem está censurando quem?

P. Mas por que agora?
R. Isso está nos programas do PT desde sempre. Cumprir a Constituição.

P. Isso consta, mas não quer dizer que será votado, não será o primeiro ato, é isso?
R. A inspiração do que vamos levar ao Congresso é tradição americana e britânica. Que na nossa opinião é a mais avançada de concessões públicas. Não estamos falando de jornal. Estamos falando de concessão. Todas são reguladas. Menos essa.

P. A regulação da mídia não é um assunto distante para parte da população que tem necessidades mais urgentes, como alimentação e saúde?
R. Tudo tem seu tempo. Mas acho que todo mundo entende que um político não pode ser dono de concessão de rádio e TV. Isso é antidemocrático. Por isso a Constituição estabelece parâmetros para que isso não aconteça. E é um aperfeiçoamento democrático liberal, não é nada bolivariano. Sempre me chamou a atenção como cientista político o quanto nós abraçamos aqui o liberalismo de fachada. Não existem forças liberais francas no Brasil. Veja o Movimento Brasil Livre. Essa meninada chegou a chamar a atenção de alguns ricos. Foram os primeiros a pedir para fechar exposição de museu. Esse é nosso liberalismo. De araque. Não é verdade.

MPL X MBL
P. Quem lhe deu mais trabalho, o MBL ou o Movimento Passe Livre, que realizou vários protestos pela revogação do aumento da passagem dos ônibus durante seu mandato na prefeitura?
R. A agenda do MPL, transporte como direito social, é uma agenda com a qual eu simpatizo. A minha crítica é pela forma, não pelo conteúdo.

P. E a campanha do MBL contra a corrupção, não é algo que você acha interessante?
R. Se fosse verdadeira seria ótima, né? Mas você vê que eles tiraram foto com o Eduardo Cunha... Não é bem isso né.

P. Mas você apertou a mão do Paulo Maluf na campanha de 2012 para conseguir o apoio do PP.
R. Não, mas não foi nesse sentido que eu estava lá. Eu estava lá em uma agenda... Eu apertei a mão do Paulo Maluf em um dia e repatriei o dinheiro das Ilhas Seychelles [que teriam sido desviados por Maluf] no dia seguinte, né? Vamos falar a verdade para seu leitor. Apertei a mão dele e repatriei 150 milhões de reais. Não deixei cumprir minha obrigação. Eu não vejo da parte do MBL uma agenda franca anticorrupção. Acho que agiram assim quando era interessante, depois mudaram a pauta.

Grandes obras
P. Os Governos do PT foram alvos de críticas pela maneira como conduziram grandes obras, como Belo Monte e a transposição do rio São Francisco, num desenvolvimento a qualquer preço. Como o partido lida com isso?
R. Nós temos um capítulo no programa sobre transição ecológica. Resolvemos enfrentar esse desafio, da produção com conservação, adotar essa agenda. E explicitar essas diretrizes. Grandes obras como transposição do São Francisco, hidrelétrica de Belo Monte, exploração do pré-sal, sempre vão ser polêmicas. E nós temos que considerar as críticas para aperfeiçoar o modelo. Não tenho dúvida. Eu acredito que Belo Monte é uma usina muito melhor do que todas as outras que foram construídas no passado. Mas talvez não tenha chegado numa situação em que possa ser considerada um caso exemplar. Reconheço. A transposição, que antes era muito criticada, hoje sofre menos críticas.

Apertei a mão de Maluf e repatriei 150 milhões de reais. Não deixei cumprir minha obrigação

P. Com relação a Belo Monte, o que você apontaria como fator para que ela não seja um caso exemplar? Existem casos bem documentados de pessoas que foram expulsas, casas queimadas...
R. Esse assunto foi objeto de uma conversa recente minha com o Lula, a última. O Lula falou uma frase, disse: “Olha, nós temos que encontrar uma maneira de transformar a população do entorno em sócio do empreendimento. Elas não podem ser objeto da intervenção, tem que ser sujeito da intervenção”. É preciso mudar o paradigma de diálogo com essas populações e efetivamente transformá-los em sujeitos ativos de uma perspectiva transformadora. Ele usou a expressão “temos que transformar esse pessoal em sócio do empreendimento. Eles não podem ser afetados”. O Lula está muito ciente dos problemas do empreendimento. Talvez nós possamos repensar o modelo de governança dessas grandes obras.

P. O programa Minha Casa Minha Vida também teria correções? Ele é constantemente criticado por urbanistas.
R. Eles criticam, mas o programa também é muito elogiado. Eu mesmo sou partidário dessa visão de que se construiu muito onde não havia tanta infraestrutura. Aqui em São Paulo nós procuramos mudar isso. Criamos várias ZEIS [Zonas especiais de interesse social] no centro de São Paulo que estão ensejando empreendimentos, incorporações. Muitos lançamentos no centro de São Paulo que são mais acessíveis. Hoje com 200.000 reais você compra um apartamento em São Paulo. O que para uma metrópole cara como São Paulo, é significativo. Não é o ideal, mas avançamos bem.

P. Falando da Petrobras. Para além de toda a corrupção que ali se instalou, a empresa, do ponto de vista de negócio, assumiu uma dívida estratosférica numa matemática impossível de fechar. Até hoje vende ativos. Qual é a visão do partido em relação a esse assunto?
R. No caso da Petrobras, e concordando que houve uma alavancagem discutível, o fato é que todas as petroleiras foram pegas no contrapé com a crise de 2008. Você tem uma barriga no preço do petróleo, e nenhuma petroleira estava preparada para sair de 120 dólares por barril para 30. Efetivamente todos os balanços foram afetados por isso. Entendo que agora a situação específica deste setor oferece uma oportunidade de recuperação, e que devemos atuar no campo das refinarias, ao menos terminar os projetos que estão iniciados, como o Comperj e Abreu e Lima.

Plano B para Lula e Palocci
P. Levando em conta o pior cenário para o PT: Lula tem o registro indeferido e o partido vai escolher alguém dos seus quadros para disputar. Quem seria um bom nome? Você estaria confortável para ocupar essa vaga?
R. Olha, nós estamos nos valendo da jurisprudência do TSE para levar a candidatura do Lula a registro. Ele vai escolher o seu vice. E nós aguardamos duas decisões importantes: do TSE com relação ao registro, e em caso de negativa uma liminar no Supremo para garantir esse registro. Antes disso o debate está... Esse debate sobre substituição não é feito. Não há reunião sobre isso dentro do PT.

P. O Lula não ventila essa hipótese de o partido ter outro candidato?
R. Ele não discute o assunto, pelo contrário. Ele reafirma sua inocência, sua vontade de ser candidato, seu desejo de presidir o país.

P. Com relação à delação do ex-ministro petista Antonio Palocci, há um temor dentro do partido?
R. Vamos ver [o que ele traz]. A quantidade de delações que são feitas e vão caindo são expressivas. Recentemente a do Delcídio do Amaral, do Ricardo Pessoa... E as delações vem caindo por que? Porque a pessoa no desespero de estar encarcerada ela vai juntando fatos... Eu acho desprezível alguém fazer isso, mas compreendo o desespero da situação. Acho injusto que essas pessoas estejam conseguindo em troca da delação uma redução de 70% da pena e mantendo o patrimônio intacto. Considero que o corruptor não deveria ter estes benefícios todos. Não acho que o corruptor é melhor do que o corrupto, como em geral tenta se vender. Às vezes o corruptor tenta se passar por vítima: é a quintessência da hipocrisia. Nós sabemos que o corruptor é quem leva a parte do leão

Judiciário
P. Uma das propostas de vocês é alterar a forma de nomeação de integrantes do Supremo. Em um momento no qual o PT é um dos grandes alvos da Justiça isso não pode ser visto como revanchismo?
R. O STF vai manter essa composição atual por muito tempo, não há nenhuma preocupação a curto prazo com isso. Estamos falando dos novos indicados. Só forçando um pouco a interpretação para achar isso [que se trata de revanchismo].

P. Isso nunca foi uma bandeira do PT enquanto estava no poder. Agora, acuado pelo Judiciário, isso vem à tona?
R. Não é um momento de crise institucional? Porque não se inspirar em modelos avançados para entender isso. A questão do controle externo à corporação, isso vale para todas as instituições, é um traço de modernidade. Os atuais membros do STF ficarão lá até os 75 anos. Essa medida, de colocar um prazo para o mandato do ministro da Corte, tira poder do presidente, não é algo que dá poder para ele. Porque o indicado por ele terá 15 anos de mandato, ou 12. Não será vitalício.

P. Mas dá a entender que o partido está desgostoso pela maneira como a Justiça está atuando. Qual o mérito da proposta?
R. O mérito é uma pessoa que é indicada com 40 anos ficar até os 55 e não até os 75. Parece razoável não?

P. Você acha que a Corte não se renova?
R. É muito poder. Uma pessoa ficar 35 anos no STF. Eu sou cientista político e me soa bem a tese de que ninguém deve ter tanto poder por tanto tempo.

Aborto e drogas
P. O programa de Governo do PT não tem menção à questão do aborto. Por que esse ponto ficou de fora?
R. O PT historicamente trata a questão do aborto e das drogas como uma questão de saúde pública. O poder Executivo tem um compromisso em abordar esses temas sob essa ótica. Acontece que agora, neste momento, a questão foi judicializada. Os dois temas estão na pauta do STF. E muito mais forte do que uma lei ordinária do Executivo sobre o tema é o disciplinamento disso por uma jurisprudência com base em cláusula pétrea da Constituição, que não pode ser alterada por lei ordinária. Todos os indicadores internacionais dão conta de que uma mudança de postura do Estado com relação a isso faz diminuir o número de abortos. É preciso analisar a questão com uma visão mais científica, mais pragmática e menos fundamentalista, buscando objetivos concretos, como melhorar a saúde da população.

P. E com relação às drogas?
R. Se você analisar os estudos sobre prisão versus apreensão, você vai ver que prendemos um contingente enorme de pessoas com nenhuma efetividade de apreensão. Ou seja, estamos iludindo as pessoas de que estamos combatendo algo. Não estamos combatendo nada, estamos perdendo a guerra. Inclusive porque essa guerra não se ganha, a não ser pela promoção da saúde e pela prevenção da educação...

P. Mas o STF já está analisando a questão do aborto e da descriminalização das drogas há meses, os processos não andam...
R. Mas está pautado.

P. Mas com relação às drogas você deixaria apenas a cargo do STF? No México o Executivo está promovendo o debate sobre reformas nesse assunto.
R. É uma discussão sobre direitos fundamentais, dá mais robustez para a decisão quando se tem esse caminho do STF. Não é “deixar na mão do STF”. Temos três Poderes, né? Vamos puxar pela memória o que aconteceu com a comunidade LGBT em torno da questão da união estável homoafetiva. Se o Executivo tivesse mandado para o Congresso um projeto de lei, talvez estivéssemos até hoje em um impasse. Mas quando é um direito protegido pela Constituição, no STF houve um outro desfecho [com a aprovação]. Quando há uma visão distinta entre Legislativo e Executivo em torno de direito fundamentais, que são direitos ditos de minoria, muitas vezes o Judiciário harmoniza. Isso é entender o funcionamento da república moderna. Existem países mais avançados, mais abertos e menos fundamentalistas, que conseguem dirimir essas questões por meio de leis. Depende muito da correlação de forças internas... A sociedade vai encontrando caminhos para escapar dessa tradição mais obscurantista por vários mecanismos. Está ganhando expressão social uma vertente de discussão séria sobre garantias individuais.

 


Luiz Carlos Azedo: Ainda não foi desta vez

Foram sepultadas as expectativas petistas de que o ministro Dias Toffoli pudesse, na interinidade, libertar Lula, o que deixaria o quadro político de pernas para o ar

O vice-presidente do STF, ministro Dias Toffoli, rejeitou ontem um novo habeas corpus em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O pedido não foi feito pela defesa do petista, mas por um advogado simpatizante de sua causa. O presidente interino do Supremo (a ministra Cármen Lúcia substitui Michel Temer na Presidência) entendeu que o pedido de liberdade não tem urgência para ser apreciado durante o plantão de recesso da Corte.

Toffoli encaminhou o pedido ao ministro Edson Fachin, relator dos processos da Operação Lava-Jato no tribunal, para ser examinado no momento devido. Em reação, um grupo de militantes pichou o prédio do STF, na Praça dos Três Poderes, um monumento considerado patrimônio da humanidade pela Unesco, como todo o conjunto arquitetônico da Esplanada.

Para Toffoli, o pedido não se enquadra no Regimento Interno do Supremo: “É inadmissível o habeas corpus que se volta contra decisão monocrática do relator da causa no Superior Tribunal de Justiça não submetida ao crivo do colegiado por intermédio do agravo interno, por falta de exaurimento da instância antecedente”, despachou.

Assim, foram sepultadas as expectativas petistas de que Toffoli pudesse, na interinidade, libertar Lula, o que deixaria o quadro político de pernas para o ar. Condenado a 12 anos e um mês de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no caso do triplex em Guarujá (SP), Lula está preso na superintendência da PF, em Curitiba. Entretanto, mantém a candidatura a presidente da República e pressiona de todas as formas os tribunais, o que aprofunda as divergências entre os integrantes de sua equipe de defesa.

A narrativa petista de que Lula é um preso político, vítima de perseguição do Judiciário, somente complica a sua defesa. Os ataques petistas contra magistrados, liderados pela presidente da legenda, senadora Gleisi Hoffman (PR), corroboram as críticas de que esses protestos têm caráter autoritário. Ontem, a Secretaria de Segurança do Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou que está adotando providências para apurar os atos contra o edifício-sede da Corte. Imagens e informações dos envolvidos, bem como números de placas de veículos foram coletados pela segurança do tribunal e contribuirão para as investigações.

Atos de repercussão protagonizados pela defesa de Lula têm funcionado como instrumentos de campanha eleitoral, na medida em que mantêm o ex-presidente da República em evidência na mídia e corroboram a narrativa de vitimização. Eleitoralmente, porém, há sinais de que a estratégia está se esgotando, levando a legenda ao isolamento. Os sintomas vêm de todo o espectro político.

Descolamento

Por exemplo, Manuela D´Ávila (PCdoB) e Guilherme Boulos (PSOL), que endossam esse discurso, mantêm suas respectivas candidaturas a presidente da República. Miram o espólio eleitoral de Lula. Ainda é possível que venham a se coligar com o candidato petista indicado para substituí-lo, mas dependerá de sua densidade eleitoral na largada. PCdoB e PSoL apostam na candidatura própria para alcançarem o quociente eleitoral exigido pela nova legislação partidária.

Outro sintoma desse isolamento é a indefinição do PSB, cuja liderança principal, o governador de Pernambuco, Paulo Câmara, negociava um acordo eleitoral com o PT. Como Lula é inelegível e permanece preso, essa possibilidade está cada vez mais remota, e o partido tende a apoiar Ciro Gomes, candidato do PDT. Mesmo assim, dividido, porque outros setores do PSB defendem a candidatura própria.

Não foi à toa também que os partidos do chamado centrão (DEM, PTB, PR e Solidariedade) se aproximaram de Geraldo Alckmin, candidato do PSDB. Ontem, Paulinho da Força, líder do Solidariedade, lançou o ex-ministro Aldo Rebelo, aliado de Lula desde as eleições de 1989, à vaga de vice na chapa do tucano, diante das vacilações de outro aliado histórico de Lula que se descolou do PT, o empresário Josué Gomes, filho do falecido vice-presidente José Alencar, filiado ao PR de Valdemar Costa Neto.

É um paradoxo, Lula se mantém líder nas pesquisas de intenção de voto quando nome aparece na cartela, mas seus possíveis substitutos não têm o mesmo peso eleitoral. A estratégia petista é levar a candidatura até o dia de sua impugnação pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o que significa homologá-la em convenção nacional até o próximo dia 5 de agosto. A chave é a indicação do vice, que seria catapultado ao substituir Lula.

Como toda estratégia tem fricção, ou seja, nunca acontece como foi planejada, a grande indagação é saber se os eleitores vão engolir gato por lebre na eleição. É aí que outras candidaturas passam a ser uma ameaça aos petistas. A maior delas é a de Marina Silva (Rede), em terceiro lugar nas pesquisas, que hoje é a principal herdeira dos votos de Lula, mesmo defendendo propostas que estão a léguas de distância do discurso petista. Até mesmo o candidato Jair Bolsonaro (PSL), que está na extrema-direita do universo eleitoral, abocanha votos que seriam de Lula, caso o líder petista fosse realmente candidato.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-ainda-nao-foi-desta-vez/


William Waack: Soco na boca

A potência das ‘armas’ na disputa eleitoral será testada no confronto direto que se inicia

Supõe-se que o campo das disputas políticas, especificamente eleições, seja o das decisões frias. Não é à toa que boa parte do vocabulário venha da linguagem militar e do pensamento clássico sobre estratégia, pois trata-se de ganhar uma batalha. Nesse sentido, a expressão mais consagrada é a de um general prussiano do século 19, Helmuth von Moltke (“O Velho”): nenhum plano resiste ao primeiro contato com o adversário.

Antes de mais nada, um recado: vou me concentrar aqui nos personagens políticos que estão pontuando melhor nas pesquisas. Não importa a simpatia e admiração que se possa ter por movimentos autênticos de renovação de métodos e ideias, e o essencial exemplo de engajamento político de milhares em torno de propostas modernas – e o que isso aponte de positivo para a futura política brasileira – o peso desses movimentos nas próximas eleições estará ainda bem aquém das elogiáveis ambições de seus participantes.

Vamos tentar limpar a “verborragia” típica de candidatos, exacerbada com a revolução digital (que incentiva a produção de “soundbites” de 10 segundos para viralização em redes sociais) e focar no que são planos nítidos de combate. O balé do Centrão é, em primeiro lugar, com a quase infinita possibilidade de alianças e parcerias, o espelho fiel da maçaroca ideológica brasileira, impossível de ser corretamente definida pelos termos “direita” e “esquerda”.

Em segundo lugar, essa movimentação é a evidência de que todos calculam friamente que elementos do sistema (tempo de TV, acesso a fundos com dinheiro público e controle de pedaços da máquina governamental) trazem vantagens na disputa eleitoral. E, eventualmente, na capacidade de governar em 2019. É o plano óbvio de Geraldo Alckmin, mas também de Ciro Gomes (que sai em desvantagem), assim como é bastante óbvio o plano de candidatos que se apresentam como “de fora” (não importa se de fato o são, o que importa é a percepção) – Marina Silva e Jair Bolsonaro. É a aposta na capacidade de mobilização através de tecnologias digitais, e o uso do que identificam como qualidade própria de atender à “demanda” do eleitorado por limpeza “do que está aí”.

A potência dessas “armas” será testada no confronto direto que se inicia agora, e meu palpite é o de que miséria, pobreza e infraestrutura precária ainda dão bastante peso ao dinheiro para campanhas e ao tempo de TV, fatores ligados, porém, às qualidades de cada personagem (Chuchu conquistará paladares?) e subordinado ao que todos os generais inteligentes já admitiam desde que batalhas existem, ou seja, que a guerra é o terreno da sorte, do acaso e do imponderável (como a Lava Jato, por exemplo).

E como é que fica com os planos do PT, uma força que não se pode negligenciar? Por enquanto parece-me o cálculo menos “frio” de todos, pois emana do fígado de Lula, o chefe da seita. A dificuldade com o atual “plano” fixado em Lula é o problema que os estrategistas chamam de confusão entre meios e fins: o plano é usar Lula como arma de transferência de votos (que, sem dúvida, ele é) ou só o de livrar Lula da cadeia? Até agora, serviu para isolar a agremiação política e dar conforto a seus adversários.

Diante do quadro ainda indefinido das eleições, saborosas frases antigas sobre como ganhar batalhas continuam tendo ressonância hoje. “A gente se engaja (no combate) e depois vê o que faz”, disse Napoleão, quando perguntaram qual era seu princípio estratégico. Prefiro uma definição de estratégia bem mais recente, e proferida pelo boxeador campeão mundial dos peso pesados, Mike Tyson: “Todo mundo tem um plano até levar um soco na boca”.


Paulo Fábio Dantas Neto: Rotas eleitorais para uma democracia em trânsito 

Desde maio de 2017, quando houve a primeira tentativa de derrubar o governo Temer, o país entrou num ponto morto, apesar da pulsão de confronto que acomete aquelas facções da elite política onde estão vencedores ou vencidos que ainda não viraram a página do impeachment de 2016. O enredo da trama reiterativa do trauma beneficiou-se da instabilidade provocada pelas investidas da Lava Jato e de parte influente dos meios de comunicação contra o grupo político do Presidente e de fato conseguiu eclipsar o enredo da recuperação e da travessia, que durante seu primeiro ano o governo engatara com certo êxito. Mas a coalizão de veto não logrou substituir, no cotidiano dos brasileiros, a partitura da travessia pelas do dilúvio e do apocalipse. A marcha-a-ré também travou e aqui estamos, numa situação que avaliza a metáfora do ponto morto mas já no limiar do engate de uma marcha lenta para nova partida, com a chegada da fase decisiva dos acordos e desacordos eleitorais.

Institutos de pesquisa têm providenciado o argumento que ainda faz render a novela da “faxina” e do “golpe”. As performances de Lula e Bolsonaro são filhas da insistência de se submeter ao público do pré-jogo cenários de polarização e fragmentação radicais que já não correspondem aos movimentos reais que, fora dos dois nichos, se dirigem à contenção dos discursos e à busca de alianças eleitorais. Com a convergência que ora se consolida em torno do candidato do PSDB os institutos indutores serão induzidos a trocar o disco para sintonizarem a nova música. Assim, outubro vai se firmando no horizonte político como encontro esperado, que vale ponto, mesmo cheio de ressalvas e sobressaltos.

A pinguela balança mas não cai e a caravana vai passando. Não chega a ser um samba popular de partido alto nem a pista é avenida larga, mas o eleitor terá como cantar seu chorinho por ruas e ladeiras cujos paralelepípedos seguem inteiros e no lugar. Alguns serão retirados se - e somente se - o eleitor quiser e do modo que pregava Joaquim Nabuco: a nível e compasso, um a um, como foram colocados. A transição a algo novo, um novo cujos traços ainda são em boa parte ignorados, segue na marcha do método conservador, por isso irá além de outubro, mas não parece que será evitada.

Houve danos, há sequelas. O que poderia ser construção tornou-se resistência, devido a revezes impostos pela Lava-Jato ao sistema político e também à pouca virtù da elite política. Disparando fogo amigo e inimigo contra o governo ela agiu na contramão do entendimento e da moderação, virtudes da nossa tradição política que o governo procurava praticar. Por outro lado a elite política insistiu no cultivo do lado não virtuoso, patrimonialista, da mesma tradição, sem nesse caso se poder excetuar a facção governante, muito pelo contrário, a julgar pelo rol de novos residentes de Curitiba.

Os fogos amigos e inimigos partiram de atiradores situados muito além do previsível e proverbial populismo de Jair Bolsonaro. A oposição de esquerda alvejou, por exemplo, a Petrobras que seus ícones políticos já haviam alvejado quando eram governo e pediu, sem recato ou cerimônia, a volta da política antiga. O Presidente da Câmara, na greve dos caminhões, violou a matemática e, como em outros momentos, também a ética da responsabilidade, como se a desmoralização do governo pudesse servir de trampolim para um salto pessoal que poderia ser mortal para a instituição que preside. E o partido dos tucanos, de um modo geral, não se conduziu à altura do compromisso público que assumiu ao emprestar o peso da sua influência à viabilização do impeachment.

Tomo esses exemplos como representativos da atitude mais visível na elite política quanto ao destino do pacto que levou Temer ao governo. O conjunto revela padrão deficiente de interação política. Se escapamos de ardis dos amantes de esquinas e teremos eleições, elas decerto avaliarão esse padrão.

Talvez pela consciência desse fato tem havido correções de rota à medida em que se aproximam datas decisivas do calendário pré-eleitoral. Isso ocorre tanto no profissionalíssimo ambiente do chamado Centrão como no da articulação, ao mesmo tempo periférica e crucial, do chamado Polo democrático e reformista. Dois blocos de forças, ao tempo em que se unem e tornam competitivo o candidato tucano, iniciam uma competição interna à aliança. De um lado, quatro ou cinco partidos do Centrão ou a ele ligados (DEM, PP, PR, PRB e talvez SD) e do outro cinco do Polo (PSDB, PSD, PPS,

PV, PTB). A hipótese de que alguns desses partidos transitem entre um bloco e outro faz parte do jogo. O árbitro central, desde a preliminar, será o candidato, mas o juiz de vídeo já será o eleitor. Em caso de vitória eleitoral, o campeonato seguirá até a montagem e exercício do governo. Aí o árbitro central recrutará mais auxiliares dentre aqueles que passarem pelo crivo eleitoral preliminar do árbitro de vídeo. Em caso de derrota, os juízes serão outros e não se sabe se o jogo também será.

Há ainda a considerar que antes do eleitor entrar em cena três outros jogadores, de variáveis relevos, ainda podem entrar nesse time dos sonhos do sistema político: o MDB, o PSB e o Podemos. Aqui não incluo a Rede, face ao seu perfil de estilingue e por mais motivos que serão comentados adiante.

O MDB poderá dar agora aos antigos aliados o apoio que lhe foi negado por eles a partir de 2017. Aliás, se o partido mantém um pré-candidato à parte, o governo não lava as mãos e já atuou para tirar o Centrão de Ciro e jogá-lo para Alkmin. Cedendo aos fatos o MDB poderá fazer o entendimento abrindo mão da primazia e reconhecendo a provisória posição de maior força do outro parceiro grande, no caso o PSDB. Esse último, fiel ao seu estilo, não cortejará o MDB em público para além das formalidades. Nem o PSDB nem o Centrão fazem, por ora, questão de passar recibo do apoio de um MDB com alta expertise em ser decisivo, sendo fiel da balança. Mas o tucanos sabem que sem aquela geni não consolidarão a posição predominante. O MDB, ainda virtual aliado, já é relevante sócio oculto e, a essa altura, ansioso para sair da posição de primeira vidraça.

Quanto ao PSB, as duas canoas em que pôs seus pés desde 2015 (a do impeachment e a do lulismo) parecem agora ser embarcações impróprias para levar o partido a um porto seguro. Se voltasse à primeira canoa, apoiando Alkmin, prestaria louvável serviço ao polo democrático e reformista que tenta levar o candidato a posição centrista, sem adernar à direita. Mas se arriscaria a perder suas posições eleitorais no nordeste, preço alto demais. Se ficar na segunda canoa pode prestar um serviço aos moderados do PT mas se arriscará, junto com eles, a ser tragado pelo abraço de afogado de Lula, que tentar interceptar a recepção dos socialistas a Ciro Gomes. Mas como o casco grosso dessa óbvia terceira canoa também parece ter furos, o partido pode até optar por não optar. O liberou geral já vigora e ninguém segura mais, haja ou não uma votação na cúpula ou até um candidato próprio.

A questão do Podemos é menos complexa. Entre a sua busca de vencer a cláusula de barreira por uma articulação nacional e o voo solo de Álvaro Dias a primeira tende a prevalecer, formalmente ou não. Sinal de que, em meio aos seus pesares, o sistema político produz regras que, no intuito de conservar a competividade de atores tradicionais, acabam reforçando a institucionalização do sistema partidário contra scripts personalistas. Um bem público colateral, derivado de vícios privados gerais.

Se o time de Alkmin ganhar esses jogadores - mesmo pontual e oficiosamente, graças a liberou geral para dissonâncias estaduais no MDB e no PSB -, o arco político que viabilizou o impeachment.estará politicamente recomposto, por mal traçadas linhas e ao preço de uma crise que se arrastou mais do que precisaria. O novo seria a troca de pilotos, saindo o MDB, entrando uma sociedade entre PSDB e Centrão. Possível implicação dessa troca é a criação, em 2019, caso Alkmin vença, de situação análoga à que em 2003 levou Lula, em busca de base parlamentar, a rejeitar o PMDB como aliado preferencial para montar o balcão varejista mais tarde conhecido como Mensalão. No Brasil pós-Lava Jato, se o PSDB não tiver repertório alternativo a esse varejo – repertório político, não bom mocismo udenista ou tecnocrático – poderá ter mais dificuldades do que teve o PT àquela época.

O êxito da aliança de Alkmin em fazer acordos pragmáticos com alguma convergência programática prevalecer sobre projetos eleitorais isolados depende do apetite prévio dos eleitores corresponder à intenção dos cozinheiros. A campanha terá que ser contundente na polêmica e eficaz nos bastidores para retirar clientes e fornecedores da mal assombrada cozinha que Bolsonaro abriu à sua direita.

Luta interna também já se dá na cozinha da esquerda, onde labutam difusores dos fantasmas de 64. Ali enfrentam-se os que prestam atenção nas nuvens para também rever as suas rotas e os que navegam naquelas, tentando que a realidade desista de si mesma em favor da narrativa catastrófica.

Exorcizando fantasmas

Se é para olhar pelo retrovisor, ponhamos colírio na memória. Com o golpe de 64 instalou-se, como se sabe, um regime autocrático que depôs, além do presidente, governadores e prefeitos; cassou mandatos parlamentares e, em certo momento, até fechou o Congresso; dissolveu partidos e cancelou eleições marcadas; censurou a imprensa, cerceou a liberdade de reunião e manifestação; reprimiu e interveio em sindicatos, entidades estudantis e outras organizações da sociedade civil; usou violência física para excluir ativistas da cena política. Um núcleo militar, com apoio político e empresarial, ditou atos institucionais que feriam a Constituição, em seguida a revogou, fabricou uma nova e incluiu, na carta fabricada, o conteúdo do mais extremo dos atos institucionais, o AI-5.

O que há de semelhante ao que se dá em nossos dias? Os contrastes prevalecem na comparação. Mas é preciso admitir que, como em 1964, a política está sendo bloqueada. Isso não costuma sair grátis.

Afasto qualquer determinismo que queira fazer da história uma ciência exata da repetição. Friso é que métodos e qualidade da ação política fazem diferença para levar a desfechos diversos situações semelhantes de alta polarização no sistema político. Em 64, apesar da polarização política contaminar parte da sociedade civil, o cidadão comum, quando pesquisado, queria moderação. Já em 84, a polarização radical se desfez quando elite política e sociedade civil entenderam-se em torno de uma solução democrática, em sintonia com o eleitorado. A diferença é que em 64 a elite política e parte da sociedade civil não souberam, ou não quiseram, ler o recado do seu eleitorado. Visitas ao passado são úteis, não para buscar fantasmas, mas para fazer cada qual, antes de somar sua voz aos impropérios do dia, ver se é diverso o recado dos cidadãos e cidadãs de hoje, ou se facções políticas e corporações em confronto estão querendo arrastá-los a uma contenda que não é sua, atormentando, oprimindo e mediocrizando seus cérebros com a exumação de uma metodologia política morta.

Assim como desfechos de situações de polarização extrema podem variar conforme a lucidez e a direção da ação política, a polarização extrema, ao se prolongar sem desfecho, pode tornar-se padrão de relacionamento político capaz não só de produzir uma crise política, como de levá-la a desfecho semelhante ao que tiveram, em outros tempos, processos críticos diversos e até opostos ao atual.

A polarização hoje não chegou a ganhar a sociedade civil, mas já a afetou o bastante para ligarmos a luz amarela. Convergência entre sociedade civil e eleitorado tende a democratizar o estado, mas há sinais de coisa diversa: setores da sociedade civil mobilizados para conflitos em curso na sociedade política; conflitos entre corporações do Estado e o governo; entre as próprias corporações; entre algumas delas e os partidos; entre partidos, é claro; e entre facções internas aos partidos.

Se o extremismo se tornasse padrão para lidar com esses conflitos, pouco serviria a análise concluir que há mais diferenças que semelhanças entre a crise de hoje (que opõe a democratização da democracia à sua tutela por corporações ou personalidades messiânicas) e a de 64, que pôs o Brasil numa esquina entre democracia e ditadura. Ganhando asas, o extremismo, em vez de ser contido pela fortuna da tradição moderadora, removeria a tradição do caminho pondo a roda da fortuna a seu favor. Se democratas sinceros – todos, e em especial os que se situam na esquerda – indagarem-se a favor de quem haverá mudanças por força de extremismos, remeterão o cabo de guerra a um museu.

A convergência no método do desentendimento permitiria, a grupos políticos e sociais que prevalecessem no cabo de guerra, impor uma fórmula política antes que o eleitorado indicasse a sua. Por isso, embora tratar de eleições possa até parecer prosaico aos olhos de quem se liga em fantasmas ou tramas de terror, é de eleições que tratarei agora.

Quatro opções de rota política e seis cenários de segundo turno

Propus a ideia do ponto morto para negar que estamos numa esquina entre democracia e ditadura. Agora proponho a de uma rotatória na avenida, indicando 4 distintas rotas, a partir das eleições. Elas não resultam da genética política de pré-candidaturas. Para enxergá-las é preciso sair do fulanismo. A rotatória é onde agora estão as candidaturas e o eleitorado. Antes e durante o primeiro turno as candidaturas trafegarão, em vaivém, pela rotatória. Só quando o eleitorado escolher as que irão ao segundo turno saberemos que rotas ainda se poderá seguir e quais as que estarão descartadas.

Rota A: retomada do script institucional da Carta de 88 que foi, em geral, seguido de 1993 a 2013: amplo pluralismo político, significativa participação eleitoral, competição e alternância partidárias; crescente controle social de políticas públicas; balizamento institucional de atores políticos; controle mútuo e equilibrado entre os poderes da república; ampla liberdade de expressão. Nesse ambiente institucional cabem inflexões de política econômica em sentidos mais ou menos liberal, com maior ou menor contenção do estado; afirma-se o caráter laico do estado no trato com a cultura e direitos individuais; induz e promove uma mentalidade cosmopolita, tolerante e democrática na sociedade.

Rota B: derivação liberal conservadora à direita, do script de 88, na linha de restringir, em nome da ordem, da segurança e/ou conservação de certas tradições, o espaço para inovações ampliadoras da participação política; de dar mais poder a instituições de controle, a molde do que Dahl chamou de “quase guardiania”; de restringir a capacidade de resposta do sistema a questões como defesa do ambiente, da diversidade cultural e sexual, da equidade entre gêneros e etnias; de arrefecer o combate institucional a discriminações e o reconhecimento de novos direitos sociais.

Rota C: derivação iliberal à esquerda, do script de 88, no sentido de acentuar linhas de reformismo social pela via estatal, desenvolvimentismo, redução de desigualdades, afirmação de direitos sociais e identitários. Apelo a formas de democracia direta para reduzir a centralidade da representação política, ou a vias plebiscitárias que concentrem, no Executivo, poderes derivados da representação.

Rota D: Retorno a um ponto inicial, mais estreito, da avenida da democracia, onde o trânsito pode ficar truncado por uma polarização extremada entre populismos/nacionalismos de diversos matizes e um liberalismo de forte viés elitista, termos característicos do contencioso ideológico do pré-64 e do seu imediato pós até 68, quando, em vez de se debater qualidade da democracia e da república, como se faz hoje, pregava-se ordem ou movimento; conservação ou reformas sociais, revolução ou reação.

A depender do sentido do voto no primeiro turno, as quatro rotas podem se combinar em seis cenários de segundo turno. Deles, o que vejo como, digamos, o mais virtuoso dentre os possíveis, é um segundo turno em que as duas candidaturas apontem à rota A. Nosso retrovisor se posicionaria em 2013, quando o país parou na rótula, para retomar a direção em geral seguida desde o pós-Collor.

Esse cenário benigno não é imediatamente visível, dado o clima de radicalização. Um Alkmin reciclado ao centro contra um Ciro lacônico ou um PT paz e amor não é no momento o mais provável por dois motivos: primeiro a presumida força do Centrão, que empurra Alkmin para a rota B. Se por essa rota poderá se celebrar o esvaziamento de Bolsonaro, é preciso ver o preço a ser pago por isso. O Centrão afastou-se do capitão por ter afinidade com outra pauta econômica e por afinidade do candidato com o discurso faxineiro. Mas leva a Alkmin a agenda social e cultural regressiva que compartilha com o capitão. Segundo complicador é Lula, que oscila entre ser o grande eleitor ou o anticandidato. Se prevalecerem o humor do preso e o pathos da fera acuada, a solução da ambiguidade dependerá, em parte, do desempenho de Alkmin. Se o tucano continuar patinando ou crescer pouco, o grande eleitor de Curitiba se animará com as chances de vitória do seu indicado. Se Alkmin decolar o anticandidato rifará qualquer indicado e se manterá na cena tentando melar o jogo.

Pelo que se supõe ser a cabeça de quem se fez e se crê mito, o pessimismo da razão manda contar com um PT em guerra até o fim do seu próprio mundo. Mas como em política há lugar também para o otimismo da vontade, não descartemos de todo que o político por vocação se imponha ao messias e em vez de celebrar o sermão da montanha ou evocar Canudos, Lula reze pela cartilha da responsabilidade política e libere seu PT para ir às urnas, seja para encorpar a candidatura de Ciro, hoje eleitoralmente mais viável do que a de qualquer petista, seja para ter candidato próprio, com menos ressentimento e rancor. Nessa eventualidade, somada à da centro direita esvaziar o capitão populista sem herdar seu discurso e agenda, há a chance do segundo turno ocorrer dentro da Rota A.

Porém, possibilidade maior é a rota A disputar o segundo turno contra alguma das outras opções de rota (derivações do script da Carta de 88, à direita, ou à esquerda e o retorno ao marco zero). Dependendo de quem seja o outro contendor saberemos qual a outra rota possível de, nesse segundo cenário, ser votada no segundo turno. Esse cenário admite variações: poderemos ter A de Alkmin x C de Ciro (que também pode piscar para D); ou A de Alkmin x D de Bolsonaro (que também pode se deter na B); e a configuração de um petista ou um Ciro centristas em A contra um Bolsonaro em D.

O realismo manda ainda considerar como possível a Rota A ficar fora do segundo turno. Nesse caso poderão abrir-se outros cenários, todos mais complicados. Num deles - segundo turno entre as rotas B (derivação à direita) e C (derivação à esquerda) - estaríamos, depois de outubro, a meio caminho entre a continuidade e a ruptura do fio da democracia da Carta de 1988. Pensar em quem nesse caso apontaria à rota B leva-nos de novo a um Alkmin, agora em linha com o figurino da centro direita conservadora, capaz de esvaziar a candidatura mais radical de Bolsonaro. Já para ser a candidatura propositora da rota C ninguém se apresenta hoje melhor posicionado do que, outra vez, Ciro Gomes, desde que esteja acertado com o PT e também à vontade com o eleitorado lulista dos grotões.

Um quarto e um quinto cenários de rotas em disputa no segundo turno trariam potencial um pouco maior de ruptura do fio. Uma disputa entre as rotas B e D poderia se dar entre um Alkmin mais conservador contra um Ciro mais ousado no apelo populista, exumando a memória do primeiro Brizola, como já ensaiou fazer em discurso logo após a frustração de sua corte ao DEM e ao Centrão. Seria bastante arriscado para o script da Carta de 88, porém risco ainda maior traria o quinto cenário, de um confronto entre C e D, com Ciro sendo a opção menos radical e Bolsonaro um pós Lacerda.

Por fim, um sexto cenário supera todos os demais no potencial de esgarçar o fio da democracia de 88 e fazê-la regredir aos marcos de uma democracia populista. Seria, como anunciam profetas do apocalipse, um segundo turno entre dois contendores que proponham o retorno a esse marco zero (rota D), uma confrontação direta entre dois populismos, envernizados por retóricas de esquerda e de direita. Essa é a praia lacerdista de Bolsonaro: bater-se com o lulopetismo na versão gramatical de Gleisi Hoffman. Duelo que Lula talvez aceite para tentar fugir de um naufrágio no seco, em Curitiba.

Dois fatores contribuem para que esse sexto cenário, embora improvável, esteja entre os possíveis: o desgaste do governo Temer, que deixa de ser eixo principal da aglutinação centrista e o isolamento da oposição de esquerda, sem discurso positivo e engessada pela miragem da candidatura de Lula. Daí que Gleisis e Bolsonaros não deixarão de ligar o pisca-pisca à rota D, semeando o sexto cenário.

Aquém e além das rotas

Para falar também em Marina Silva, penso que se ela mantiver a candidatura, como até aqui parece que fará, tende a parar na rotatória durante o primeiro turno, esperando que um helicóptero surja para iça-la e pousá-la numa avenida por onde possa fluir alguma democracia “nova”. Como a maioria dos eleitores não gosta de andar nas nuvens, ela pode repetir votações expressivas que já teve, mas tende, no segundo turno, a ser eleitora de peso, não mais concorrente. Não foi incluída na simulação das rotas e dos cenários - na qual vários incluídos estão abaixo de si nas pesquisas - porque segue sendo outsider e, por isso, imprevisível. Se chegar ao segundo turno será porque o primeiro turno já terá tirado a política brasileira da rotatória em que se encontra. A rotatória foi a premissa da simulação, que só naquela tem sentido. Fora dela o futuro do fio desencapado da República de 88 dependerá de “o que ocorrer”, nas urnas e na interação posterior dos atores que definirão as novas regras do jogo.

No mundo imaginado dessa democracia nova, reiteradamente pregada em tempos de Lava-Jato, Marina Silva encontraria, a lhe fazer contraponto, alguém menos votado, mas politicamente situado, como Guilherme Boulos. Ele representa o que de mais emblemático há da esquerda iliberal no Brasil. Talvez represente seu futuro, mais que o PT, ente hoje distópico de quem o PSOL herdou o passado. Inspirado no marco zero da atual democracia – marco ao qual retornaríamos se fosse escolhida a rota D - esse partido adotou (ao que se diz por sugestão de Lula) um candidato capaz de ser crítico de Ciro Gomes, se o eleitorado puser Ciro no segundo turno como o condutor na rota C; ou superego do PT moderado, na hipótese desse partido moderar o uso do retrovisor e tentar refazer seu pacto de convivência tensa com a rota A. Boulos só não tem conexão com a rota B. Essa curiosa flexibilidade num radical pode ser sinal de virtude política, ou só de irrelevância eleitoral. A conferir.

Importante frisar ainda que, mesmo pela rota D, a mais regressiva e perigosa das quatro, o cenário não seria ainda uma esquina que levaria à supressão da democracia política. Seria exagero confundi-lo com aquela ruptura pela direita, ocorrida em 64. Ruptura que, aliás, também foi alimentada por visões golpistas à esquerda, avessas à democracia “burguesa”, como as que depois animaram a luta armada contra a ditadura. Arriscando-se com fogo, fechavam os olhos ao fato de que cordas tão esticadas tendem a quebrar do lado mais fraco. O fio partido em 1964 levou décadas até se recompor, noutro patamar, em 1988. Com olhos abertos deixemos os mortos em paz e acionemos o pensamento para o desafio que se põe hoje aos democratas vivos, à esquerda, à direita e ao centro: o de relaxar o cabo de guerra e voltar a tecer o fio que nos permite caminhar, diferentes, divergentes, porém juntos, como sociedade civil e como povo civilizado, ancorado num estado democrático de direito.


Folha de S. Paulo: Presidenciáveis preveem gastar 45% do declarado por Dilma há quatro anos

Sem doação empresarial, 8 principais candidatos estimam, juntos, R$ 200 mi para campanhas

Por Gustavo Uribe e Marina Dias, da Folha de S. Paulo

Com a proibição de receberem doações de empresas nas eleições deste ano, os candidatos à sucessão de Michel Temer estimam despesas mais modestas na disputa.

A previsão inicial das principais campanhas é de gastarem, juntas, cerca de R$ 200 milhões. O valor, que costuma ser ajustado ao longo do processo eleitoral, é 45% do que foi desembolsado somente para reeleger Dilma Rousseff (PT) em 2014, em valores atualizados pela inflação.

A petista diz ter gasto R$ 351 milhões há quatro anos (R$ 438 milhões em valores de hoje). Na eleição passada, os três primeiros colocados —Dilma, Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB)— gastaram juntos em torno de R$ 800 milhões, em valores corrigidos pela inflação do período, segundo dados informados pelas candidaturas à Justiça Eleitoral.

Sem recursos de empresas, as formas de custeio permitidas neste ano são por repasses do fundo eleitoral, doações de pessoas físicas e autofinanciamento.

A redução da estimativa também se deve à aprovação pelo Congresso de um teto de gastos por candidatura. Para o posto de presidente, por exemplo, foi determinado um valor máximo de R$ 70 milhões para o primeiro turno. No segundo turno, o limite passa para R$ 35 milhões.

No ano passado, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, afirmou que, com o valor de R$ 70 milhões, o candidato "não compra nem picolé" para ter criança em seu comício.

Para este ano, a previsão do PT é gastar, no mínimo, R$ 50 milhões com a campanha presidencial. O valor é a fatia do fundo eleitoral à qual a sigla vai ter acesso. Segundo dirigentes, porém, a cifra pode aumentar com a arrecadação e compartilhamento de recursos de campanhas estaduais, possibilitando que o valor chegue ao teto permitido pela Justiça Eleitoral.

Para tentar eleger Geraldo Alckmin, o PSDB estima um valor total de R$ 43 milhões. Em 2014, a campanha de Aécio desembolsou R$ 223,4 milhões (R$ 279 milhões em valores atualizados), de acordo com informações repassadas ao TSE.

Segundo o tesoureiro nacional do partido, Sílvio Torres, a previsão é gastar o valor nos dois turnos, mas a projeção pode ser alterada. "Se conseguirmos arrecadar recursos, podemos direcionar também para outras candidaturas, como para governadores que irão ao segundo turno", disse.

Com o acordo de abrir mão do fundo eleitoral, Henrique Meirelles, do MDB, está disposto a gastar pelo menos R$ 35 milhões do próprio bolso para financiar sua campanha. Segundo aliados, os gastos com a pré-campanha até agora chegam a cerca de R$ 250 mil por mês.

A campanha de Ciro Gomes, do PDT, estima uma quantia de R$ 40 milhões para tentar elegê-lo. "O PDT deverá destinar um terço do fundo, que se somará a recursos de doações de pessoas físicas", informou o coordenador da campanha, Cid Gomes, ex-governador do Ceará e irmão do candidato.

 

Já a candidatura de Marina, que na última eleição declarou ter desembolsado R$ 61 milhões (R$ 76 milhões em valores atualizados), estima uma despesa mínima neste ano de R$ 15 milhões, podendo chegar ao teto de gastos no final do processo eleitoral.

Contra a utilização do fundo eleitoral, João Amoêdo, do Partido Novo, estima uma campanha presidencial de R$ 8 milhões, montante que, segundo a legenda, não será arrecadado com recursos públicos.

Para a primeira campanha presidencial da vida de Guilherme Boulos, o presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, reservou R$ 6,2 milhões do fundo eleitoral. "Além desse valor, teremos ainda recursos oriundos da campanha de arrecadação por meio da internet", disse.

Procurada pela Folha, a assessoria de imprensa de Jair Bolsonaro, do PSL, não respondeu à reportagem. Durante a pré-campanha, ele informou que pretende gastar cerca de R$ 1 milhão.

O PC do B ainda não tem uma estimativa para a campanha de Manuela D'Ávila. "O partido ainda não definiu a divisão do fundo, mas a campanha será modesta", explicou a coordenadora da candidatura, Nádia Campeão, segundo a qual, na pré-campanha, foi gasto cerca de R$ 1 milhão.


Josué Gomes da Silva: Nas eleições deste ano, não se pode errar

Aplaudo os partidos que decidiram apoiar Alckmin.

As eleições de 2018, que coincidem com o aniversário de 30 anos da Constituição de 1988, são das mais importantes desde a redemocratização. O voto será decisivo para definir o país que podemos e queremos ter. Não podemos errar, sob pena de condenarmos toda uma geração ao quadro de desemprego, fechamento de empresas, falta de moradias e precarização da saúde e do ensino.

Numa conjuntura marcada por agudos problemas, não há espaço para apostas e testes. Em todos os cargos eletivos —deputados estaduais e federais, senadores, governadores e presidente da República—, precisamos de pessoas competentes, patrióticas e éticas, que desejem o bem do Brasil, dediquem-se à defesa dos interesses de toda a população e saibam como fazer para retomarmos os rumos da prosperidade.

É crucial que Executivo, Legislativo e Judiciário, em todas as instâncias, trabalhem harmoniosamente, de modo que tenhamos estabilidade política e crescimento econômico sustentável.

Caberá ao presidente da República liderar não apenas o governo federal, mas todo o movimento de reorganização do Estado e reequilíbrio orçamentário da União e das unidades federativas, bem como a realização das sempre adiadas reformas previdenciária, política, tributária e na melhoria do ambiente de negócios, de maneira a assegurar ao setor privado condições para que ele possa gerar emprego e riquezas para os brasileiros.

As demandas que temos pela frente delineiam com clareza o perfil do presidente da República que precisamos. Pelo que já fez e demonstrou em termos de liderança, sobriedade, capacidade de dialogar e de gerenciar bem em plena crise, Geraldo Alckmin reúne todos os requisitos para cumprir a complexa missão que se coloca.

Ele agrega concreta, reconhecida e positiva experiência política e administrativa. Médico, teve elogiado desempenho em todos os cargos que ocupou em sua carreira, como vereador e prefeito em Pindamonhangaba (SP), deputado estadual e federal, vice-governador e chefe do Executivo do estado de São Paulo.

Sua capacidade está expressa na gestão do mais populoso estado do Brasil, no qual as contas estão equilibradas e os salários, em dia. A responsabilidade fiscal é marca forte de seu modelo administrativo, o que garante, mesmo em meio à crise nacional, um fôlego para os investimentos públicos.

Alckmin também realizou ajuste na Previdência, fundamental para o equilíbrio orçamentário. Tem demonstrado autoridade, bom senso e capacidade de interlocução com o universo político, os setores produtivos e a sociedade.

A população do estado reconhece tudo isso e o reelegeu governador em 2014, já no primeiro turno. Ele venceu em 644 dos 645 municípios paulistas.

Além de todos esses aspectos positivos do político, tive a oportunidade de conhecer, nos últimos dias, o homem Geraldo Alckmin, um cidadão de bem, ser humano apegado e dedicado à família.

Ele se emociona ao se referir aos seus pais, às passagens com seus filhos e à bonita história dos 39 anos de matrimônio com a esposa, senhora Lu Alckmin. Ainda que não tenha conhecido seu saudoso pai, pude constatar os elevados valores que foram por ele transmitidos ao filho.

O perfil de Geraldo Alckmin não deixa dúvidas. Aplaudo os partidos que tomaram a acertada decisão de apoiar sua candidatura. Definitivamente, não é hora de apostar em aventuras e "salvadores da pátria".

Nosso país precisa de propostas e ações concretas para retomar o rumo do desenvolvimento. Por isso, não podemos errar em outubro! As consequências seriam danosas para todos os brasileiros, principalmente para aqueles mais necessitados e desprotegidos.

* Josué Christiano Gomes da Silva (Josué Alencar) é presidente da Coteminas (filiado ao PR-MG), membro do conselho do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) e mestre em administração de negócios pela Vanderbilt University (EUA)