Eleições

João Domingos: Parto de antagonistas

Haddad e Lula omitem os dois últimos anos, quatro meses e 12 dias do governo Dilma

Em um encontro com artistas na quarta-feira, o candidato Fernando Haddad (PT) sugeriu que Jair Bolsonaro (PSL) seja encarado como “um parto necessário para o desenvolvimento”. Haddad disse que outras nações, hoje tão respeitadas, “tiveram seus momentos dramáticos”, o que para ele é algo semelhante ao que o Brasil está passando agora.

O voto conservador não é uma novidade nem no Brasil nem em lugar nenhum do mundo. Por aqui faltava-lhe, no entanto, um guia. Guia que se construiu à sombra do governo de 14 anos, quatro meses e 12 dias de um movimento político que ficou conhecido como lulopetismo, o petismo com o culto à personalidade de Lula.

Assim como militantes de vários partidos clandestinos de esquerda, parte da intelectualidade e da academia, do clero progressista e do movimento sindical apostou no final da década de 1970 e início da década de 1980 no surgimento de um líder forte, capaz de unir forças dispersas pela ditadura militar, e esse líder foi Lula, os conservadores fizeram movimento semelhante assim que o PT chegou ao poder, em 2003. A diferença é que Lula e os que o apoiaram fundaram um partido para se tornar força hegemônica na esquerda. Os conservadores preferiram se aglutinar em torno de um deputado que, por suas posições polêmicas, machistas, homofóbicas, xenófobas, contrárias à esquerda e em defesa da ditadura militar, passou a encarnar o anti-PT e o anti-Lula. Se Lula serviu de instrumento para a ascensão de uma força política à esquerda, Bolsonaro fez o mesmo papel, à direita.

Ao longo do tempo, Lula engoliu todos os que o instrumentalizaram, afastou José Dirceu e Antonio Palocci de seu caminho, e impôs as candidaturas de Dilma Rousseff à Presidência da República e de Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo e, agora, à Presidência. Bolsonaro ainda terá de provar se tem força para fazer o mesmo.

O PT soube tirar proveito político das grandes manifestações ocorridas durante a ditadura, como a marcha pelas Diretas-Já. Vai tentar fazer o mesmo com o protesto de mulheres programado para hoje, intitulado #EleNão. Bolsonaro, da mesma forma, tirou proveito dos protestos de milhões durante as jornadas de junho de 2013, inicialmente contrárias ao aumento do preço das passagens de ônibus, depois contra a realização da Copa das Confederações e da Copa do Mundo. Posteriormente, já em 2015, ele surfou na onda do desastre do governo de Dilma Rousseff, o que acabou por levar novamente milhões de pessoas às ruas, agora em apoio à Operação Lava Jato, contra a corrupção e pelo impeachment da presidente petista.

Durante tempos muitos tentaram entender o que foi que levou tanta gente às ruas em 2013. Hoje talvez seja possível entender um pouco o que aconteceu. O jeito petista de governar, com o forte aparelhamento da máquina pública que teve por objetivo pôr o Estado a serviço de um partido, fez com que surgisse uma força de reação na sociedade, uma força que não sabia direito o que queria. Só sabia que estava de saco cheio de alguma coisa, do discurso do nós contra eles adotado pelo PT e que não levava a lugar nenhum. Eleitores de centro, acostumados a votar no PSDB na longa polarização com o PT, pularam para o lado direito e foram engrossar as tropas de Bolsonaro. De forma que, quando o mundo político percebeu, o capitão reformado já estava léguas à frente.

Veja-se que na propaganda partidária tanto Haddad quanto Lula dizem que durante 12 anos o Brasil viveu seus melhores momentos. Eles omitem os últimos dois anos, quatro meses e 12 dias do governo de Dilma, a marca de um desastre que ajudou a consolidar Bolsonaro politicamente.


Demétrio Magnoli: O Trump deles e o nosso

Bolsonaro provoca amores fulgurantes e ódios incontidos em núcleos minoritários

Jair Bolsonaro imita Donald Trump. Bolsonaro sonha ser Trump. Não poucos creem que Bolsonaro é, realmente, o “nosso” Trump —e profetizam ou temem uma surpresa eleitoral semelhante à dos EUA. Contudo, ao menos do ponto de vista eleitoral, o nosso Trump ocupa lugar bem diferente do que ocupou o Trump deles.

Num nível bem simples, a distinção crucial é que o Trump original candidatou-se pelo Partido Republicano, cuja influência estende-se a quase metade do eleitorado, enquanto o Trump tropical representa uma sigla marginal. Num nível mais profundo, a diferença é que eles apelam a eleitorados opostos. O magnata emergiu como representante do “homem sem rosto”, dos órfãos da globalização —os “deploráveis”, no desastroso, preconceituoso termo cunhado por Hillary Clinton. No Brasil, os “deploráveis” rejeitam Bolsonaro e votam em Lula (ôoops, em Haddad).

Uma lenda urbana diz que o Trump original venceu graças às suas declarações machistas, homofóbicas e xenófobas. De fato, elas serviram para aquecer o núcleo minoritário de seus seguidores incondicionais. Mas o triunfo eleitoral deu-se apesar delas. O segredo da vitória trumpiana encontra-se na plataforma do nacionalismo econômico, desdobrada nas vertentes do protecionismo comercial (China) e da proteção do emprego americano (imigrantes hispânicos). O discurso antiglobalização (America First) ofereceu uma falsa resposta a dilemas verdadeiros, seduzindo os eleitores de classe média-baixa concentrados em estados decisivos do Meio-Oeste. Os brancos pobres votaram no Trump deles.

O Trump deles prometeu parar o declínio econômico por meio de uma restauração nacionalista. O nosso Trump promete parar o declínio moral por meio de um governo autoritário, ancorado no conservadorismo de costumes, ignorando as angústias materiais dos “deploráveis”, que ficam com o lulismo. Segundo as pesquisas, Lula (ôoops, Haddad) bate Bolsonaro por 57% a 22% entre eleitores na faixa de até um salário mínimo.

A seita ultraliberal brasileira que aderiu ao nosso Trump evidencia abismal ignorância histórica quando tenta mimetizar o “liberalismo” de seu ídolo americano. O Trump original combina ultraliberalismo “para dentro” (desregulamentação, corte radical de impostos) com nacionalismo econômico “para fora” (protecionismo, restrição à imigração). No Brasil, não há como replicar a duplicidade trumpiana, pois a China e os imigrantes, espantalhos do Trump deles, nada significam para a nossa massa de pobres.

Por aqui, os “deploráveis” anseiam pelo amparo estatal direto, nas formas de salário mínimo, aposentadorias e bolsas. O Estado paternalista desenhado pelo lulismo responde a tais expectativas. Já o Estado mínimo esboçado pelas sandices de Paulo Guedes interessa apenas a especuladores agnósticos e crentes fanáticos da religião secular do Deus-mercado.

O Trump original passou a campanha falando essencialmente sobre economia e emprego, enquanto Hillary desfiava o interminável novelo do multiculturalismo. O Trump tropical fala sobre homossexuais, mulheres, moral e cívica, Deus e armas, relegando o discurso econômico a um “embaixador para o mercado”.

De certo modo, o nosso Trump é Hillary, mas com sinal invertido. Precisamente por isso, provoca amores fulgurantes e ódios incontidos em núcleos minoritários de eleitores imersos numa crônica “guerra cultural”, mas apenas um circunstancial engajamento antipetista ou o solene desprezo entre os demais. Sua chance de alcançar o segundo turno deriva, exclusivamente, da extensiva rejeição ao PT e da monumental falência do PSDB.

O nosso Trump é o sonho de consumo de Haddad. No turno final, o avatar de Lula teria o duplo privilégio de falar como representante dos pobres, contra os ricos, e como campeão das liberdades e da democracia, contra o autoritarismo. É vitória certa.

*Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.


O Globo: Ao TSE, Bolsonaro omitiu bens de R$ 2,6 milhões

Imóveis estão em declaração de patrimônio anexada pela ex-mulher de candidato em ação de partilha. Ana Cristina Valle afirma que fez acusações movidas por mágoa, e presidenciável diz que ‘cotoveladas’ são comuns em separação

Por Hudson Corrêa, de O Globo

O presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) omitiu das declarações de bens entregues à Justiça Eleitoral, nas disputas de 2006 e 2010, ao menos duas casas avaliadas em R$ 2,6 milhões. Em ambas as campanhas, ele concorria à Câmara dos Deputados. Os imóveis constam da lista de bens apresentada pela ex-mulher de Bolsonaro Ana Cristina Siqueira Valle em processo de partilha, movido após a separação do casal em 2007.

O processo foi publicado pela revista “Veja” na edição de ontem. A ação judicial trata de detalhes da separação entre o deputado federal e Ana Cristina. E revela que Bolsonaro e a ex-mulher detinham, em 2009, um patrimônio que somava R$ 4 milhões.

Na listagem apresentada à Justiça estão os dois imóveis registrados em cartório no Rio de Janeiro. Procurados, Bolsonaro e Ana Cristina não responderam ao GLOBO. Para a “Veja”, a ex-mulher do presidenciável sustentou que foi movida pelo sentimento de mágoa ao fazer acusações contra o ex-marido no processo judicial, onde também afirmou que Bolsonaro teria furtado um cofre de sua propriedade e que tinha comportamento agressivo. Ela disse que, “brava”, fala “besteira”. Informou também que chegou a um acordo com o ex-marido para dar fim ao litígio.

Em entrevista ao apresentador José Luiz Datena, da Band, Bolsonaro afirmou que a própria Ana Cristina desmentiu as acusações. Na entrevista, o candidato afirmou que, em processos de separação, “é comum ter problemas” e “as cotoveladas acontecem de ambas as partes”.

LISTA DE BENS
Na lista de 17 itens que aparecem na declaração de bens anexada ao processo judicial, o de maior valor é uma casa avaliada em R$ 1,66 milhão, localizada na rua Maurice Assuf, na Barra da Tijuca. Bolsonaro comprou a casa em 22 de novembro de 2002. O imóvel foi vendido em 2009, porém não aparece na declaração de patrimônio entregue à Justiça Eleitoral em 2006, três anos antes. O levantamento do GLOBO mostra que a casa foi adquirida por R$ 500 mil. O preço da compra, registrado em cartório, difere do valor de mercado, utilizado para o cálculo para a cobrança do Imposto sobre Transmissões de Bens Imóveis (ITBI), que apontava na época que o imóvel era avaliado em R$ 1,66 milhão. Na campanha de 2006, Bolsonaro listou apenas uma sala comercial, três veículos, duas aplicações no banco e um lote, que somavam R$ 433,9 mil.

Em 21 de janeiro de 2009, Bolsonaro comprou outra casa, em um condomínio de frente para o mar, também na Barra da Tijuca. A residência, no entanto, não foi declarada à Justiça Eleitoral nas eleições de 2010. Bolsonaro registrou no cartório a transação por R$ 400 mil. A guia de pagamento de ITBI da época revela, no entanto, que o preço de mercado era de R$ 1,05 milhão. O presidenciável só declarou este imóvel nas eleições de 2014. Além dos dois imóveis, o processo judicial traz outros bens que entraram na partilha, como um apartamento na Barra da Tijuca, uma sala comercial no Centro do Rio, uma casa e uma sala em Resende, além de cinco lotes no mesmo município do sul fluminense.

ROUBO DE COFRE
Também constam uma variedade de veículos: a caminhonete Land Rover, ano 2007; um veículo tipo reboque, ano 2006; uma Pajero 2006, além de um Jet Ski Yamaha, ano 2006. Como o presidenciável pode ter comprado os bens após a eleição de 2006 e parte deles está somente em nome de Ana Cristina, não é possível afirmar que o deputado também omitiu este patrimônio da Justiça Eleitoral, sem a confirmação por meio de certidões de compra e venda.

A reportagem da “Veja” também traz os relatos que Ana Cristina fez à Justiça sobre a situação financeira do deputado. Ela afirmou que o casal vivia com renda mensal de R$ 100 mil, acima dos ganhos do parlamentar e dos vencimentos do capitão da reserva. “Outros proventos" garantiriam a vida de conforto, mas Ana Cristina não explicou quais seriam estas fontes de renda. Segundo a reportagem, Ana Cristina acusou o ex-marido de ter roubado o cofre dela numa agência do Banco do Brasil, no Centro do Rio, onde estariam guardados US$ 30 mil, R$ 200 mil e joias avaliadas em R$ 600 mil. Ela chegou a prestar queixa na delegacia.

À “Veja”, Ana Cristina disse que não levou a queixa sobre o roubo do cofre adiante porque “não se sentia à vontade”. “Iria dar um escândalo para ele e para mim”. “Nós dois tínhamos um acordo de abrir mão de qualquer apuração porque não seria bom”. O motivo da separação seria o “comportamento explosivo” e “desmedida agressividade” do ex-marido.

Nas eleições deste ano, Bolsonaro declarou patrimônio de R$ 2,28 milhões. Entre seus principais bens, estão a casa de R$ 400 mil, adquirida em 2009, e outra comprada no mesmo condomínio, em dezembro de 2012, por R$ 500 mil, segundo registro no cartório. O imóvel comprado há seis anos tem valor de mercado de R$ 2,2 milhões, conforme guia do ITBI. Ontem, o candidato também se manifestou nas redes sociais. Disse que responde “qualquer acusação sem problema nenhum, no momento oportuno. Estamos na reta final de uma campanha”. “A revista fez uma matéria (sobre fato) ocorrido há mais de 10 anos, que correu em segredo de Justiça. O objetivo? Tentar me desconstruir”. (Colaborou Stéfano Salles)


El País: “Não aceito resultado diferente da minha eleição”, desafia Bolsonaro na TV aberta

O desafio explícito à autoridade eleitoral brasileira não tem precedentes desde a redemocratização. Declaração foi feita a José Luis Datena, da Band. 'Veja' revela processo no qual ex-mulher acusa candidato de furto e de ocultação de patrimônio

Por Flávia Marreiro, do El País

"Pelo que vejo nas ruas, não aceito resultado diferente da minha eleição", disse Jair Bolsonaro, candidato de extrema direita do PSL, em entrevista ao programa policial de José Luis Datena, na TV Bandeirantes, nesta sexta-feira. O desafio explícito à autoridade eleitoral brasileira não tem precedentes desde a redemocratização. Nunca, desde a volta às eleições diretas, um competidor com chances de vitória fez ameaça antecipada e explícita de que não reconhecerá os resultados. "O PT só ganha na fraude", disse o deputado federal, sem apresentar qualquer prova. Não há registro de fraudes de monta no sistema eletrônico de votação em 22 anos de instalação no país. As pesquisas eleitorais, no momento, indicam que o candidato, que lidera no primeiro turno, mas é rejeitado 46% da população, perde em todos os cenários de segundo turno.

O apresentador perguntou a Bolsonaro, capitão reformado do Exército e cujo vice é um general, se os militares reagiriam no caso de uma vitória eleitoral do petista Fernando Haddad. Bolsonaro respondeu: “Sobre as instituições militares aceitarem o resultado, eu não posso falar pelos comandantes militares. Eu, pelo que eu vejo nas ruas, eu não aceito resultado das eleições diferente da minha eleição. Isso é um ponto de visto fechado”, disse ele no Hospital Israelita Albert Einstein, onde segue internado após um atentado a faca em 6 de setembro. Datena, então, pergunta se a declaração não é antidemocrática e Bolsonaro responde dizendo que não aceita um sistema apenas eletrônico, sem ao menos parte do voto em papel. O candidato conseguiu passar uma lei no Congresso para impor uma cota de votos impressos, mas a exigência acabou barrada pelo Supremo Tribunal Federal em junho.

Não fica claro, na entrevista, em que consistiria, por parte de Bolsonaro, o não reconhecimento dos resultados eleitorais. A estratégia repete a usada por Donald Trump nos EUA –o republicano passou toda a campanha reclamando de fraude, até que venceu e não tocou mais no assunto. Apoiado por cerca de 28% do eleitorado, o candidato tem insuflado a descrença no sistema eleitoral há meses. Grupos que o apoiam pelo WhatsApp fazem circular pesquisas falsas mostrando a vitória do deputado no primeiro turno.

Adversários de Bolsonaro reagiram. "Bolsonaro diz que não vai aceitar a derrota. Mostra mais uma vez que não está preparado para a democracia, quer manter o país dividido. Respeite a decisão popular, candidato", disse, pelo Twitter, o tucano Geraldo Alckmin.

Em outro momento da entrevista, Bolsonaro disse ainda que, em caso de um eventual Governo Haddad, as Forças Armadas poderiam atuar "na primeira falta" que o petista ou seu partido cometessem. "Poderia acontecer com o PT errando, sim. Nós, das Formas Armadas, somos avalistas da Constituição." Não existe na Constituição brasileira, feita depois que o país deixou para trás 20 anos de ditadura, nenhum dispositivo que preveja a atuação das Forças Armadas em caso de "erros" do Executivo. Os militares devem obediência hierárquica ao poder civil.

Acusações da ex-mulher, reveladas pela 'Veja'

A entrevista no programa popular de TV é um encerramento com potencial positivo de exposição em uma semana ruim para a campanha de Bolsonaro. Além do Datena, ele falou ainda na Rede TV, no tour pela TV aberta pouco usual, já que a lei eleitoral brasileira fala em não tratamento privilegiado a nenhum candidato em mídia de concessão pública.

A série de reveses dos últimos dias teve um dos pontos altos na quinta-feira, quando a revista Veja revelou que a ex-mulher de Bolsonaro, Ana Cristina Siqueira Valle, o havia acusado de ocultação de patrimônio, recebimento de pagamentos não declarados e do furto de um cofre – além de ter dito que o candidato tem um comportamento “agressivo” – durante o processo de separação do casal.

Segundo a Veja, as acusações constam em um processo judicial que foi aberto por Valle em 2008 na 1ª Vara de Família do Rio de Janeiro. À época ela e Bolsonaro estavam em meio a uma separação litigiosa. A ex-mulher do candidato à presidência afirmou nos autos que ele recebia “remuneração de militar da reserva, de deputado federal e outros proventos que ultrapassam mais de 100.000 reais mensais”, valor incompatível com a renda do casal. Valle não explica o que seriam estes “outros proventos”, responsáveis por triplicar a renda do parlamentar – cujos vencimentos oficiais somariam 35.300 reais.

Bolsonaro também não explicou. Ele usou sua conta no twitter para reagir à matéria. “Estamos na reta final para as eleições. Mais uma vez parte da mídia de sempre lança seus últimos ataques na vã tentativa de me desconstruir. O sistema agoniza, vamos vencê-lo”, escreveu, sem comentar nenhuma das acusações. “Há anos tentam nos parar com rótulos criminosos falsos e com meias verdades distorcidas”, concluiu. Ao Datena, ele disse: "A minha própria ex-mulher diz que ali mente muita coisa." Ana Cristina Siqueira Valle, que agora usa o sobrenome Bolsonaro e é candidata a deputada, minimizou as acusações que fez em conversa com a revista.

Ainda segundo informações do documento obtido pela Veja, Bolsonaro declarou à Justiça Eleitoral em 2006, quando disputou vaga na Câmara federal, um patrimônio de 433.934 reais – apenas 10% do valor dos bens informados por Valle no processo com base na declaração do imposto de renda do militar. Ele teria deixado de fora três casas, cinco lotes, uma sala comercial e um apartamento. O professor de direito Eleitoral do Instituto Brasiliense de Direito Público Daniel Falcão afirmou que a prática não constitui crime. “Alguns afirmam que o que o Bolsonaro fez poderia ser enquadrado como falsidade ideológica eleitoral, mas o Tribunal Superior Eleitoral não tem uma jurisprudência consolidada neste sentido”, diz. Na prática, não há uma exigência de que a declaração de bens à Justiça Eleitoral seja condizente com a do imposto de renda.

E a última estocada da ex-mulher no capitão veio na forma de uma acusação de furto: ele teria se apropriado do conteúdo de um cofre onde ela guardava joias e dinheiro em espécie em uma agência do Banco do Brasil, que somava 1,6 milhão de reais em valores atualizados. Valle, que disputa uma vaga de deputada federal pelo Podemos – e usa o nome do ex em seu material de campanha - relativizou as acusações, que segundo ela seriam fruto de “excessos retóricos”. O caso do furto foi arquivado pela polícia no ano passado, uma vez que Valle foi convocada a depor duas vezes, mas não compareceu.

Nas redes sociais os defensores de Bolsonaro se voltaram contra a Veja. Um vídeo gravado pela jornalista e candidata a deputada federal pelo PSL Joice Hasselmann no qual ela fala que um veículo da imprensa teria recebido 600 milhões de reais para prejudicar o capitão na reta final da campanha viralizou. A hashtag Veja600Milhões entrou no trending topics do twitter. Em tempo, Hasselmann não apresentou prova alguma de suas acusações, tampouco falou que a Veja seria a beneficiária.

Ameaças de morte e fogo amigo de Mourão

Mas a reportagem da Veja foi apenas mais um capítulo em uma semana recheada de más notícias para a campanha de Bolsonaro. Dias atrás a ex-mulher do capitão já havia municiado uma matéria da Folha de S.Paulo, publicada na terça-feira, segundo a qual ela teria sido ameaçada de morte pelo ex-marido, e por isso se mudou para a Noruega. O relato da ameaça ficou registrado em um telegrama diplomático de 2011. Posteriormente ela negou os fatos, mas outra matéria do jornal ouviu brasileiros que conviveram com ela em Oslo e confirmaram que ela relatava ameaças.

As notícias ruins que atingiram a campanha esta semana também vieram do círculo íntimo bolsonarista. O capitão novamente se viu alvo de fogo amigo por parte de seu incômodo candidato a vice, o general Hamilton Mourão, que chamou na quinta-feira o 13º salário de uma “jabuticaba brasileira”. Do leito do hospital Albert Einstein veio a resposta do cabeça da chapa: “O 13° salário do trabalhador está previsto no art. 7° da Constituição (...) Criticá-lo, além de uma ofensa à quem trabalha, confessa desconhecer a Constituição”. Esta não foi a primeira vez que Mourão precisou ser enquadrado ao dar declarações desastrosas. Ele já havia dito que casas só com “mãe e avó” são “fábricas de desajustados” para o tráfico de drogas, em um momento no qual a campanha lutava para reverter sua enorme rejeição ante as eleitoras.

Até na evolução de seu quadro de saúde, as notícias não foram boas para o capitão da reserva. Inicialmente havia a previsão de que Bolsonaro recebesse alta na sexta-feira, mas a detecção de uma infecção bacteriana frustrou os planos do capitão. Ele está internado desde o dia 7 de setembro, após levar uma facada em Juiz de Fora durante ato de campanha, e deve deixar até o próximo domingo.


César Felício: O choque cultural

Haddad no polo oposto a Bolsonaro explica o #Elenão

Talvez seja a primeira vez em uma campanha eleitoral que manifestações de grande porte são convocadas contra um candidato, e não a favor. A campanha #Elenão, claro está, é a primeira ação em bloco com sentido eleitoral que o feminismo faz no Brasil. São 13 concentrações neste sábado em São Paulo, 7 no Rio Grande do Sul, 5 no Rio de Janeiro, 4 em Minas Gerais. Um dos atos está convocado para a Praça Halfeld, em Juiz de Fora (MG), a dois quarteirões do local do atentado contra o líder das pesquisas de intenção de voto para a Presidência.

O "gap" na questão de gênero era um desafio para Jair Bolsonaro desde o início da sua campanha. O candidato do PSL é uma espécie de arquétipo do macho-alfa, quase uma caricatura do homem opressor. No momento mais decisivo de sua carreira política, Bolsonaro optou por não fazer concessões e forjar sua candidatura sob a consigna de um só povo, uma só vontade, um só líder: dar espaço para mulheres, negros, gays, nordestinos etc seria dividir o que deve estar unido.

Negar a diversidade social e política, portanto, está no espírito da candidatura de Bolsonaro. Ela só faz sentido se não apresentar nenhuma transigência neste tema. Dos candidatos com alguma relevância, ninguém foi tão longe quanto ele. É certo que o tempo hoje não é de conciliação, mas das chapas que concorrem à presidência a encabeçada pelo deputado do PSL é a única que não conta com mulher como candidato a presidente ou a vice.

O embate gerado pelo #Elenão, contudo, vai além da questão da gênero. Ele ganha outro alcance quando a perspectiva de polarização anti-Bolsonaro está pendendo mais para Fernando Haddad do que para Ciro Gomes.

Ciro é um político convencional de centro-esquerda, dentro da tradição de alianças que marca a prática partidária do Nordeste nos últimos anos. Transita em vários nichos.

Haddad personifica uma esquerda muito centrada na questão de valores, que é ortodoxa na economia e arrojada em temas identitários.

A relativização cultural, tanto no Brasil como afora, não se dá sem fricções. Condutas que faziam parte dos usos e costumes estão à beira da criminalização e o reacionarismo vive um despertar. Bolsonaro se tornou relevante quando viveu sua epifania nos idos de 2010, ao se deparar com um seminário LGBT nas dependências do Congresso.

O combate ao mítico "kit gay", não por acaso uma polêmica que transcorreu na gestão de Fernando Haddad no Ministério da Educação, o projetou. Recapitulando a polêmica: em 12 de abril de 2010, Haddad assinara um despacho em que criou uma comissão coordenada pelo então secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade André Lázaro, para a elaboração de um material anti-homofobia a ser distribuído na rede escolar. Meses depois, a tal comissão promoveu a fatídica reunião no Congresso.

Circulou material ainda em estudo no grupo, integrado por militantes LGBT e Bolsonaro acusou o ministério de preparar uma ação de doutrinação anti-hétero para crianças. A ação foi suspensa. Em entrevista ao "Cadernos Cenpec" em 2012, Lázaro reclamou que o governo não quis partir para o embate e que o movimento social tentou dar uma volta no MEC.

A confusão sobre o "kit gay" aconteceu poucos meses depois de outra grande polêmica do governo Dilma, a divulgação do Plano Nacional de Direitos Humanos, em que o governo enfureceu militares, ruralistas, religiosos e um vasto et cetera e onde também se voltou atrás.

Na Prefeitura de São Paulo, com poucos recursos, emparedado pelo junho de 2013, Haddad apostou na nova vertente da esquerda para se firmar. É ela um de seus pilares no momento, quando muitos desconfiam do grau de autonomia que terá em relação a Lula e da sombra do caixa dois que paira sobre suas contas na eleição passada. É notável o contraste entre a vice do petista, descolada mas com codinome na planilha da Odebrecht, e o vice do candidato do PSL.

Manuela e Haddad combinam perfeitamente. Já Bolsonaro e Mourão simbolizam a mesma coisa, mas é evidente a existência de um problema entre eles.

Mourão
O general Hamilton Mourão é um candidato a vice como jamais houve no Brasil. O assombro deu-se antes mesmo do 6 de setembro, ao criticar publicamente propostas de Bolsonaro para educação.

O espanto aumentou quando o vice se candidatou a substituir o titular acamado em debates, sem combinar com ninguém do bolsonarismo. Voltou a causar constrangimento quando demonstrou em entrevista simpatia pela tese de um autogolpe a la Fujimori. Em seguida desenvolveu a teoria do desajuste natural das famílias comandadas por pais e avós.

A crítica ao 13º salário divulgada ontem foi mais do que um tiro no pé da campanha, foi um soco no abdômen ferido do candidato, tão forte que provocou reação imediata no Twitter.

Bolsonaro afirmou que o artigo 7º, que trata dos direitos sociais, é cláusula pétrea na Constituição. Na realidade o tema é controverso, há dúvidas sobre o alcance do parágrafo 4º, artigo 60 da Constituição, que disciplina as cláusulas pétreas, mas a avaliação mais corrente é a de que o deputado está certo.

Em caso de vitória da dupla, é um governo que já nasce cindido entre presidente e vice, rompidos de antemão. A situação mais semelhante a essa na história brasileira foi a de Jânio Quadros e João Goulart, mas naquele caso presidente e vice eram eleitos de maneira separada.

Roriz
Joaquim Roriz jamais perdeu uma eleição no Distrito Federal da qual tenha diretamente participado. Sua vitória em 1998 foi marcante. Então ex-governador, concorria contra Cristovam Buarque, petista que disputava a reeleição.

O pleito ganhou uma narrativa de luta da "civilização" (Cristovam) contra as "trevas" (Roriz). O então petista havia lançados políticas pioneiras, como o programa Bolsa Escola e uma eficaz campanha de educação do trânsito em favor do pedestre. Roriz se notabilizara pelo português ruim e pela acusação de distribuir lotes em troca de votos. Mais votado no primeiro turno, Cristovam humilhou o rival no debate dias antes do segundo turno. Quando as urnas se abriram, a arrogância da centro-esquerda recebeu uma lição. As "trevas" venceram.

*César Felício é editor de Política.


Bruno Boghossian: Crítica ao 13º ajuda PT a surfar na divisão entre ricos e pobres

Declaração de vice de Bolsonaro deve cimentar divisão de classes no 2º turno

Com pouco espaço na propaganda eleitoral, a campanha de Jair Bolsonaro começou a exportar matéria-prima para marqueteiros rivais. Uma sucessão de declarações desastradas sobre economia deixa o candidato do PSL vulnerável a ataques dos adversários e pode cimentar a tradicional divisão de classes que favoreceu o PT em disputas recentes.

Ideias defendidas por aliados de Bolsonaro nos últimos dias passam a impressão de que o deputado prepara um pacote de maldades. Mal explicadas, a proposta de criar um tributo nos moldes da CPMF para substituir outros impostos e a pancada de seu vice no 13º salárioassustam a classe média, a população mais pobre e os trabalhadores em geral.

O risco de contaminação é grande e ameaça aprofundar a oposição entre Bolsonaro e seu provável adversário no segundo turno, Fernando Haddad. O PT se beneficiou por anos de um discurso voltado ao eleitorado de baixa renda e dá sinais de que pretende investir novamente nesse segmento para vencer a disputa.

O ataque de Hamilton Mourão ao 13º ajuda os petistas a surfarem na fratura entre ricos e pobres. Os empresários brasileiros podem até aplaudir alguma mudança no pagamento, mas o vice de Bolsonaro aproxima Haddad dos 46% que recebem o valor extra: assalariados, funcionários públicos e aposentados.

A polêmica parece feita sob medida para o PT. O partido, afinal, usa como linha mestra o discurso de que o governo Michel Temer retirou direitos dos trabalhadores.

O assunto provocou a mais intensa reação pública do candidato do PSL a um aliado até agora. Político profissional, Bolsonaro calculou o tamanho do perigo, disse que a crítica ao 13º é “uma ofensa a quem trabalha” e proibiu o vice de participar de eventos públicos até a eleição.

Adversários ignoraram o esforço. “Campanha de Bolsonaro é contra o 13º salário”, disparou a propaganda de Geraldo Alckmin na TV. O tucano se antecipa aos petistas e tenta tirar uma casquinha do caso para derrubar o rival do segundo turno.


Folha de S. Paulo: Lewandowski, do STF, autoriza Folha a entrevistar Lula na prisão

Jornal argumentou que decisão da 12ª Vara Federal em Curitiba que negou a permissão impôs censura à atividade jornalística

Por Reynaldo Turollo Jr.

BRASÍLIA
O ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), autorizou a colunista Mônica Bergamo, da Folha, a entrevistar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na prisão.

Lula está preso em Curitiba desde 7 de abril após ser condenado em segundo grau na Lava Jato por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O despacho é desta sexta-feira (28) em uma reclamação feita pelo jornal, que argumentou ao STF que uma decisão da 12ª Vara Federal em Curitiba que negou a permissão para a entrevista impôs censura à atividade jornalística e mitigou a liberdade de expressão, em afronta a decisão anterior do Supremo.

“Não há como se chegar a outra conclusão, senão a de que a decisão reclamada [da Justiça em Curitiba], ao censurar a imprensa e negar ao preso o direito de contato com o mundo exterior, sob o fundamento de que 'não há previsão constitucional ou legal que embase direito do preso à concessão de entrevistas ou similares', viola frontalmente o que foi decidido na ADPF 130/DF”, escreveu o ministro.

No julgamento da citada ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental), o Supremo garantiu “a 'plena' liberdade de imprensa como categoria jurídica proibitiva de qualquer tipo de censura prévia”.

“O STF, em inúmeros precedentes, mesmo antes do julgamento da ADPF 130, já garantiu o direito de pessoas custodiadas pelo Estado, nacionais e estrangeiros, de concederem entrevistas a veículos de imprensa, sendo considerado tal ato como uma das formas do exercício da autodefesa”, afirmou Lewandowski.

“Ressalto, ainda, que não raro, diversos meios de comunicação entrevistam presos por todo o país, sem que isso acarrete problemas maiores ao sistema carcerário [...] Portanto, permitir o acesso de determinada publicação e impedir o de outros veículos de imprensa configura nítida quebra no tratamento isonômico entre eles, de modo a merecer a devida correção de rumos por esta Suprema Corte”, concluiu.

O ministro determinou que a Justiça em Curitiba seja comunicada da decisão e que agende, em acordo com a Folha, a data da entrevista.


Nelson Motta: Agora é que são elas

Talvez a maioria das mulheres ainda não saiba em quem votar, mas as que já sabem quem não querem ganham força

Nem a esquerda nem a direita, nem os velhos ou os jovens, nem os pobres e nem os ricos, nem os brancos ou os pretos vão decidir esta eleição. Pela primeira vez, tudo indica que as mulheres é que vão fazer a diferença: mais da metade delas ainda não escolheu seu candidato.

É natural, elas levam mais tempo para decidir, tanto o que vestir ou aonde ir, como em quem votar, o que, no caso, é uma grande vantagem. Com mais tempo para pensar, conversar, saber bem quem são os candidatos, suas histórias, seus aliados, aumenta a chance de acertar na escolha.

Já entre os homens, em todo o espectro social, só 29% não são eleitores precoces, que já escolheram e querem virar para o lado e dormir. A maioria não quer ouvir argumentos nem discutir nada, só tem certezas inabaláveis.

As mulheres mudam mais de opinião, estão mais atentas aos sinais, têm mais sensibilidade para perceber o ambiente e o momento. E escolher.

No lançamento, o movimento #EleNão teve cinco vezes mais apoio do que o #EleSim entre as mulheres nas redes sociais.

Anitta quebrou a internet com seu apoio ao #EleNão, foi xingada e esculachada, milhares de fãs deixaram de segui-la, mas outros milhares se tornaram seus seguidores.

A primeira eleição em que as redes sociais são mais influentes do que a televisão também pode ser a primeira decidida pelas mulheres. Mais empoderamento é impossível. Mas mulher é mulher, tenho três filhas.

Para complicar o jogo, a boa aparência dos candidatos também tem influência no voto feminino, como é natural. Foi decisiva para eleger o galã de araque Collor. Agora Haddad, Bolsonaro e Ciro são considerados bonitões, seja pela sensualidade árabe, pelos olhos verdes ou pelo charme viril nordestino, e isso conta muito para as mulheres, e para os homens também. As aparências não enganam, ensinava Oscar Wilde.

Talvez a maioria das mulheres ainda não saiba quem quer, mas as que já sabem quem não querem ganham força, unidade e velocidade suprapartidárias na reta final da eleição.


O Globo: Saiba quem é o eleitor que ainda pode mudar voto para presidente a 10 dias da eleição

Convicção é menor entre mulheres, mais pobres e mais jovens, diz Ibope/CNI

Por Júlia Cople, de O Globo

RIO — A dez dias do primeiro turno da eleição, mais da metade dos eleitores (53%) admite que ainda pode mudar seu voto à Presidência no primeiro turno: cerca de 78 milhões de pessoas. Segundo a pesquisa Ibope/CNI divulgada nesta quarta-feira, a certeza do voto aumenta conforme sobem a renda e a idade. A possibilidade de mudança de voto é maior entre as mulheres e os mais jovens. São também os votantes de escolaridade da 5ª à 8ª série do Ensino Fundamental e do Ensino Médio os mais propensos a alterar a decisão. As escolhas menos convictas estão na região Norte/Centro-Oeste, na faixa dos eleitores que ganham mais de um até dois salários-mínimos e na periferia. No Sudeste, permanecem em disputa 52% dos votos - mais de 33 milhões de pessoas a convencer.

Os atuais apoiadores de Marina Silva (Rede) e de Geraldo Alckmin (PSDB) são os mais propensos a mudar de ideia. Segundo a pesquisa, do total de eleitores, 18% têm decisão firme de candidato, mas podem reavaliá-la conforme o decorrer da campanha. Outros 18% consideram que a opção declarada é apenas "escolha do momento" e 17% dizem ser mera "preferência inicial". Os presidenciáveis que sonham em reverter o cenário de segundo turno — previsto, no momento, entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) — têm o desafio de converter os não-convictos dos rivais e fidelizar os seus próprios.

O Ibope/CNI estima que 55% do eleitorado feminino não tem candidato absolutamente definido. Uma em cada cinco delas revela ter apenas "escolha do momento" (20%) e 18% possuem mera "preferência inicial". Entre os homens, o percentual de não-convictos é de 49% - 19% têm decisão firme, mas sujeita a mudanças. O número de eleitores sem escolha convicta pode ser ainda maior se considerados os entrevistados que não sabem ou não responderam sobre a certeza de sua tendência de voto (5%).

De acordo com o levantamento, 65% dos eleitores de 16 a 24 anos admitem que pode mudar de voto. Neste segmento, 23% partem de uma decisão firme e 42% guardam ainda uma "escolha de momento" ou "preferência inicial". O percentual de convicção aumenta conforme a faixa etária sobe. Metade dos votantes de 35 a 44 anos não escolheram candidato de vez. Já os de 55 anos ou mais são os mais decididos: apenas 42% dizem estar suscetíveis a mudanças de opinião na campanha.

Quanto à escolaridade, a volatilidade do voto é maior nos eleitores letrados de 5ª a 8ª série e no Ensino Médio - nos dois segmentos, 54% revelam possível mudança de apoio eleitoral. Nos votantes que estudaram até a 4ª série, os mais convictos, 48% admitem que ainda podem alterar seu candidato. Pouco mais da metade dos com Ensino Superior diz o mesmo (51%).

SUDESTE TEM 52% DOS VOTOS EM DISPUTA
A região Sul abriga o maior percentual de eleitores que não mudarão "de jeito nenhum" seu voto. Lá, 49% ainda podem ser convertidos - 15% têm "decisão firme" e 19% declaram uma "escolha de momento", diz o Ibope/CNI. No Sudeste - onde ficam os três maiores colégios eleitores do país, São Paulo, Minas Gerais e Rio (juntos, 41,5% do eleitorado brasileiro, fora o Espírito Santo) - a proporção de não-convictos corresponde a 52%. Nesta região, 19% revelam decisão firme, mas 17% dizem ter apenas "preferência inicial".

No Nordeste, são 53% os eleitores sem voto definitivo. A maior parte desses não-convictos destaca que, até agora, seu candidato é "escolha do momento" (19%). Proporcionalmente, a região de pesquisa do Ibope/CNI que abriga mais eleitores suscetíveis a mudança é a Norte/Centro-Oeste. Lá, 56% ainda podem mudar a escolha - neste estrato, 38% citaram ter "escolha do momento" e "preferência inicial".

A convicção também sobe conforme a renda aumenta, revela o levantamento. Metade dos eleitores que ganham mais de cinco salários-mínimos diz que pode mudar de ideia, assim como 53% dos que recebem de dois a cinco salários. Um a cada cinco dos votantes que vivem com até um salário-mínimo tem apenas "escolha do momento" - ao total, são 54% não-convictos neste estrato. Os eleitores com opção de momento e "preferência inicial" representam 38% dos brasileiros que ganham de um a dois salários. Nesta faixa, proporcionalmente a de voto mais volátil, 55% admitem que podem mudar de candidato.

Nas capitais, 20% dos eleitores têm decisão firme, mas ainda podem se converter em favor de outro postulante à Presidência. Há 53% de não-convictos nestas cidades. Já na periferia, o percentual oscila para 54%. Nestas áreas, 22% têm "escolha do momento". No interior, por sua vez, a volatilidade do voto corresponde a 52% do eleitorado.

MARINA E ALCKMIN TÊM ELEITOR MAIS VOLÁTIL
Além de tentar convencer o atual eleitor do adversário a desistir da primeira escolha e engrossar sua votação no primeiro turno, os candidatos têm o desafio de fidelizar os seus apoiadores do momento. Marina Silva (Rede) é a concorrente ao Executivo federal que tem mais volatilidade entre os seus - 76% dos que hoje declaram apoio à ex-senadora admitem que ainda podem mudar de ideia. Dos votantes, 23% têm decisão firme, porém alterável. Ela é a "preferência inicial" de 30% de seus apoiadores.

Detentor do maior tempo de televisão e rádio e da maior coligação da campanha presidencial, Geraldo Alckmin (PSDB) corre "risco" semelhante. Sete em cada dez eleitores que declaram apoio ao tucano no momento dizem que podem trocar de candidato - destes, dois dizem ter "decisão firme", mas contornável. Para 28%, o ex-governador de São Paulo é "escolha do momento" e para 22%, "preferência inicial".

O terceiro colocado nas pesquisas de intenção de voto, Ciro Gomes (PDT) precisa trabalhar para manter 62% de seu apoio - percentual que ainda admite reavaliar a opção. O pedetista é a "escolha do momento" para 23% de seu eleitorado e "preferência inicial" de 19%. Um a cada cinco apoiadores do ex-governador do Ceará revela ter firmeza e não convicção no voto.

Líder das pesquisas, o candidato do PSL Jair Bolsonaro goza do maior percentual de eleitores convictos entre os presidenciáveis (55% de seus apoiadores). Ainda assim, 42% dos que declaram voto no deputado federal ainda podem ser convencidos por um adversário. Dos atuais votantes no capitão, 17% têm decisão firme e 13% o veem como "escolha do momento".

Com 49% de seu eleitorado convicto, Fernando Haddad (PT) precisa fidelizar ainda 48% de seus apoiadores. Segundo o Ibope, o petista é "escolha do momento" para 15% dos que declaram voto nele e "preferência inicial" de 16%. Outros 17% revelam ter firmeza - mas ainda não certeza - na escolha do ex-prefeito de São Paulo.

A pesquisa ouviu 2 mil pessoas nos dias 22, 23 e 24 de setembro, em126 municípios. Na última segunda-feira, o mesmo instituto divulgou uma outra pesquisa, contratada pela TV Globo, em que 2.506 pessoas foram ouvidas entre os dias 22 e 23 de setembro.

O levantamento foi registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com o número BR-04669/2018. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos, e o índice de confiança é de 95%.


Luiz Carlos Azedo: Haddad repete Dilma

“O cardápio de medidas populistas e o discurso fácil do petista pode fazer o crédito simplesmente desaparecer e provocar uma crise de financiamento dos negócios, como na Venezuela”

Uma piada de mineiro sobre as diferenças de comportamento entre cariocas, paulistas e gaúchos ilustra o que pensa o candidato do PT, Fernando Haddad, em termos de condução da economia. O carioca costuma valorizar a isonomia nos negócios: “Quanto é que nós vamos ganhar?” O paulista, sua participação nos lucros: “Quanto é que eu vou ganhar?” O gaúcho, porém, estaria mais preocupado com os rendimentos do sócio: “Quanto tu vais ganhar?” A piada fez muito sucesso nos bastidores do governo de Dilma Rousseff, porque a então presidente da República estava mais interessada em arbitrar o lucro das empresas do que com o equilíbrio das contas públicas e os ganhos de produtividade do país. Com perdão da injustiça com os gaúchos, principalmente meus amigos queridos, o candidato do PT repete o comportamento em campanha.

Recentemente, em entrevista na tevê, disse que os bancos ganham muito e que vai reduzir os spreads bancários, que vêm a ser a diferença entre a remuneração que o banco paga ao aplicador para captar um recurso e quanto esse banco cobra para emprestar o mesmo dinheiro. O cliente que deposita dinheiro em conta-corrente, poupança ou outra aplicação faz um empréstimo ao banco, que remunera esses depósitos com juros chamados de taxa de captação; entretanto, quando o banco empresta dinheiro a alguém, cobra uma taxa pelo empréstimo superior à taxa de captação. Haddad quer reduzir os juros a fórceps, como fez Dilma Rousseff, baixando na marra os spreads bancários, cujo valor os bancos atribuem à alta inadimplência e ao depósito compulsório.

A proposta é sedutora, faz parte de um cardápio de medidas populistas e do discurso fácil de campanha, mas pode fazer o crédito simplesmente desaparecer e provocar uma crise de financiamento dos negócios, como a da Venezuela. A reação dos bancos para reduzir a inadimplência será arrochar o crédito de risco, a não ser que o governo reduza os compulsórios e os impostos, que acabam repassados aos clientes, mas isso não faz parte do programa de governo de Haddad, que é expansionista e intervencionista. Ontem, na Serra Gaúcha, por exemplo, anunciou que pretende usar o poder de compra da máquina federal para estimular a indústria nacional. Disse que vai reativar o polo naval gaúcho, localizado em Rio Grande, que na gestão do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou mais de 20 mil postos de trabalho, o que somente será possível com uma nova farra com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Esqueceu-se de dizer que essa foi a gênese do escândalo da Petrobras, que deu origem à Operação Lava-Jato.

Corrupção e desperdício
A menina dos olhos da política de estímulo à indústria nacional dos governos Lula e Dilma foi a empresa Sete de Abril, criada com recursos públicos para fabricação de sondas para a Petrobras. Seu presidente, Pedro Barusco, deu início à série de delações premiadas de executivos e diretores da Petrobras ligados ao escândalo. Espontaneamente, devolveu US$ 100 milhões que havia arrecado de propina, para espanto até dos investigadores. Segundo a Lava-Jato, aproximadamente US$ 70 milhões em propina foram arrecadados pelo PT, agentes públicos da Petrobras e executivos da Sete Brasil em contratos bilionários com os estaleiros Jurong (Aracruz, ES), Brasfels (Angra dos Reis, RJ), Enseada do Paraguaçu (Maragogipe, BA), Ecovix (Rio Grande, RS) e Atlântico Sul (Fortaleza), a maioria hoje em recuperação judicial. O cálculo teve por base 1% de desvios nos contratos dos 21 navios-sondas encomendados pela Sete Brasil a serem fornecidos à Petrobras.

Só a Jurong, que tinha US$ 2,1 bilhões em contratos com a Sete Brasil, pagou US$ 18,8 milhões em propinas. Um dos réus confessou ter recebido pelos menos US$ 3,8 milhões em uma conta no exterior: o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, que disse ao juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara de Curitiba, que dois terços do total arrecadado foram para o grupo político do PT, em uma divisão que teria beneficiado o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-ministro José Dirceu e a legenda. Vaccari seria o arrecadador, e Antônio Palocci, ex-ministro da Fazenda de Lula e da Casa Civil de Dilma Rousseff, o responsável pelo gerenciamento. Vaccari, também réu, ao prestar depoimento, preferiu ficar calado sobre o assunto. Lula e Dirceu negam o fato; Palocci negocia sua delação premiada.

O candidato do PT também se jactou de ter comprado 35 mil ônibus escolares em sua gestão à frente do Ministério da Educação e disse que dará atenção especial ao transporte público, repassando a receita arrecadada pela cobrança da Cide — contribuição que incide sobre o preço da gasolina — para os municípios. Ou seja, pretende resgatar o velho pacto automotivo, que deixou em segundo plano o transporte de massas — metrô, trens, volts — para favorecer a produção de veículos automotores no ABC, berço histórico do PT. Repete outro erro de Dilma, que comprou 3.401 veículos da Volkswagen e da Mercedes-Benz para o Exército, a um custo total de R$ 1,1 bilhão, ou seja, em média, R$ 323,4 mil por viatura. Os modelos comprados são o VW Worker e o Atego. O que foi uma festa nos quartéis no dia da entrega, virou um problema: o 72º Batalhão de Infantaria Motorizada, sediado em Petrolina, que tinha cinco caminhões, por exemplo, agora tem 50 veículos parados, sem recursos para manutenção.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-haddad-repete-dilma/


El País: A máquina de ‘fake news’ nos grupos a favor de Bolsonaro no WhatsApp

Reportagem do EL PAÍS acompanhou mobilização on-line por três semanas e detectou ativação para responder mídia, mentiras e teoria de conspiração

Difusão de mentiras camufladas como notícias, vídeos que tentam desmentir publicações negativas da imprensa, desconfiança das pesquisas e falsos apoios de celebridades à candidatura Jair Bolsonaro. Assim funcionam no aplicativo de mensagens WhatsAapp uma amostra de grupos públicos de eleitores do presidenciável do PSL. Nas últimas três semanas, a reportagem do EL PAÍS se inscreveu em três desses grupos – juntos, eles publicam mais de 1.000 mensagens ao dia. Em dois deles a presença de fake news é mais evidente e forte do que em outro, mas em todos o discurso é o de que é preciso usar a plataforma, de uso massivo em todas as faixas de renda no país e de difícil monitoramento, para combater a "grande mídia tendenciosa" e ajudar na disseminação das mensagens.

No acompanhamento da reportagem ou no monitoramento dos pesquisadores da universidade, aparecem resultados semelhantes que incluem a difusão de informações falsas. Para entrar nos ambientes, basta receber um convite de algum dos participantes ou buscar o caminho pela Internet. Foi o que o EL PAÍS fez para entrar em dois grupos nos quais todos os participantes podem trocar informações. No “Brasil é Bolsonaro 17” e “Mulheres de Bem” se pode identificar uma circulação intensa de boataria criada por apoiadores voluntários –não se constatou, a princípio, a presença de militantes pagos.

Em outro grupo, chamado “Vídeos do Bolsonaro”, onde são distribuídas imagens para viralizar, são só dois administradores e ambos vivem no exterior (Estados Unidos e Portugal) – raramente aí há informações falsas. A maioria das mensagens de “Vídeos do Bolsonaro” trata de promover a candidatura do militar reformado do Exército ou exibir discursos de quem está ao seu lado, como os feitos pelo seu vice, o general Hamilton Mourão. "Além da guerra entre os partidos esta eleição será marcada pela guerra virtual. Uma guerra entre a grande mídia tendenciosa e a mídia nas redes sociais onde tem de tudo, mas com certeza é mais democrática e está se mostrando mais poderosa", diz Carlos Nacli, que mora em Portugal e afirma ter criado 50 grupos para fazer campanha.

As estratégias

De maneira geral, todos os grupos acompanhados servem para produzir respostas às notícias publicadas pela imprensa. Por exemplo, depois que, com base em documentos do Ministério das Relações Exteriores, a Folha de S. Paulonoticiou que uma das ex-mulheres de Bolsonaro relatou ter sido ameaçada por ele em 2011, todos os grupos divulgaram um vídeo em que a Ana Cristina Valle “desmente” a informação. Ela é candidata a deputada federal pelo Rio de Janeiro e, com autorização de seu ex-marido, passou a usar o mesmo sobrenome dele.

Em outra frente, os grupos distribuem fake news. Um dos boatos é o de que as urnas eletrônicas no Brasil já foram fraudadas – apesar de que nenhuma irregularidade tenha sido comprovada em 22 anos de uso do sistema, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral. Há ainda a falsa informação de que Manuela D’ávila (PCdoB), candidata a vice-presidente na chapa do petista Fernando Haddad (PT), teria recebido diversas ligações de Adélio Bispo de Oliveira, o criminoso que esfaqueou Bolsonaro, no mesmo dia do atentado, em 6 de setembro. Há ainda questionamentos em que se tenta imputar a culpa do ataque à facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) ou em adversários do político. Num deles, há uma montagem de fotos de 12 políticos seguidos da pergunta: “Quem mandou matar Bolsonaro?”. Até o momento, as investigações da Polícia Federal apontam que o agressor agiu sozinho, era um lobo solitário.

Outro boato que circulou nos grupos foi o de que uma entrevista com Adélio Bispo de Oliveira seria publicada em breve e nela o agressor diria que o atentado foi planejado pelo próprio Bolsonaro e sua equipe: ou seja, uma fake news para alertar sobre uma possível fake news futura. Algumas das mensagens diziam que a publicação ocorreria nesta quarta-feira (dia 26). Outras, no dia 5 de outubro, a dois dias do primeiro turno das eleições. Eis uma delas: “Adelio foi autorizado a dar entrevista dia 5 sexta-feira depois que acabar o horário eleitoral. Fontes confiáveis e dignas viram os textos. Ele vai dizer q foi o próprio partido de Bolsonaro que armou tudo. Vai contar todos os detalhes. Não acreditem, meus irmãos, será a última cartada nojenta, nazista dessa gentalha vermes vermelhos”.

Essas antecipações de “notícias” também criam diversas teorias da conspiração. A jornalista Joice Hasselmann, que é candidata a deputada federal pelo PSL de São Paulo, divulgou um vídeo no qual diz que uma fonte confiável lhe disse que um órgão de imprensa teria recebido 600 milhões de reais para, nesta reta final de campanha, detonar a candidatura de Bolsonaro. Mesmo que ela não tenha apresentado nenhuma prova, a notícia se propaga como fogo em mato seco.

Além da mobilização dos voluntários, a própria campanha de Bolsonaro distribuiu ela mesma informações falsas, como a de que códigos das urnas eletrônicas foram passados à Venezuela ou mentiras a respeito da mobilização de mulheres. O candidato, porém, também tem sido alvo de manipulações. Há um áudio falso em que ele xingaria enfermeiras no hospital, por exemplo. Até mesmo uma reportagem do EL PAÍS sobre um caso de pedofilia no Rio teve o título falseado no Facebook para ligar o acusado a Bolsonaro.

Pesquisas e falsos apoios

Outro foco de constante desconfiança nos grupos pró-Bolsonaro é sobre pesquisas eleitorais. Os militantes creem que Bolsonaro será eleito no primeiro turno. Quando leem algo de que ele estancou nas pesquisas Ibope ou Datafolha abaixo dos 30% e que Fernando Haddad vem se aproximando dele, rapidamente dizem que os dados foram fraudados. Criticam a rede Globo, que costuma contratar alguns desses institutos, ou os jornais que a divulgaram, principalmente Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. Alguns desses membros passaram a pedir que as pessoas colaborassem com uma vaquinha virtual (um crowdfunding) para bancar uma pesquisa sobre intenções de votos para presidente, sobre o regime de Governo e sobre o voto distrital. A iniciativa foi proposta pelo Movimento Parlamentarista Brasileiro, uma entidade suprapartidária sediada no Rio Grande do Sul que quer mensurar o apoio ao regime parlamentar. “Não temos vinculações com os partidos ou candidatos, mas queremos aproveitar esse momento para sabermos o apoio que nossas ideias têm na sociedade”, explicou o advogado Vinicius Boeira, presidente dessa organização.

Nesses grupos ainda há falsas declarações de apoios à candidatura do militar de extrema direita. Por exemplo, difundiram imagens de que o apresentador e empresário Silvio Santos, o treinador e ex-goleiro Rogério Ceni e a cantora Sandy estariam fazendo campanha para Bolsonaro. Algo que foi desmentido por todos eles. A mensagem falsa de Silvio dizia o seguinte: “Desde quando fundei meu próprio canal [o SBT], sempre tive como princípio a união da família brasileira. Hoje, vejo somente uma pessoa disposta a praticar o mesmo princípio na política: o sr. Jair Bolsonaro. Por isso, ele tem não só o meu apoio, mas o meu voto e os votos de todos de minha família!”. Em nota, o apresentador afirmou que não declarou apoio a ninguém e que não revela em quem votará.

Houve também uma tentativa de complementar, com mentiras, informações publicadas na imprensa. Na semana passada, o jornalista Ricardo Noblat, da revista Veja, publicou em seu blog que um dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal pretendia se aposentar caso Bolsonaro fosse eleito. O nome desse ministro não foi revelado. A informação era de que esse ministro queria que o atual presidente, Michel Temer (MDB), indicasse seu sucessor. Não daria essa oportunidade a Bolsonaro, já que o magistrado seria obrigado a se aposentar nos próximos quatro anos, pois está próximo de completar 75 anos, data limite para o afastamento compulsório. Nesse período, apenas dois ministros chegarão a essa idade, Celso de Mello, que completa 75 anos em novembro de 2020, e Marco Aurélio Mello, em julho de 2021. Ainda assim, a rede de fake news pró-Bolsonaro atribuiu a informação a Gilmar Mendes, o polêmico ministro, de 63 anos de idade, que desperta a ira de diversas correntes políticas porque costuma conceder habeas corpus a dezenas de condenados. “Se o Gilmar Mendes se aposentar, ele será o maior cabo eleitoral do Bolsonaro”, advertiu um dos membros dos grupos pró-Bolsonaro.

Uma outra estratégia é de tentar mobilizar os bolsonarianos, como alguns deles se chamam, para criticar os opositores do candidato. Nesses grupos é comum se deparar com mensagens de pessoas pedindo para entrarem nos perfis de artistas que se declararam a favor da campanha #EleNão, contra Bolsonaro, e “descurtirem” as publicações. Dizia uma das mensagens, seguida dos links das páginas dos artistas: “Vamos dar dislike: negativar -- Meta pra hoje MILHÕES DE DESLIKES vamos mostrar para ele que nossa bandeira não é vermelha”. A campanh, liderada por mulheres opositoras de Bolsonaro, promete uma mobilização nas ruas no próximo dia 29.

Como esses grupos são públicos é comum eles serem invadidos por militantes de partidos adversários de Bolsonaro. Na madrugada do último sábado, por exemplo, ao menos três simpatizantes do PT entraram no grupo “Mulheres de Bem” e passaram a xingar as participantes. Enviaram imagens pornográficas, além de dezenas de fotos dos candidatos petistas. Foram mais de 500 mensagens em menos de quatro horas. Na manhã seguinte, acabaram sendo expulsos do grupo. Como os membros ficaram em alerta, qualquer um que postasse uma informação que não fosse de apoio a Bolsonaro virava potencial alvo. Por exemplo, uma apoiadora perguntou se era verdadeira uma reportagem crítica sobre o economista Paulo Guedes, o possível ministro da Fazenda do militar. Em dois minutos outros participantes decretaram: “Ela tem de ser expulsa daqui!”. Ao que a mulher disse: “Calma, gente. Eu sou Bolsonaro. Só quero saber se é verdade para saber como responder”. A desconfiança que o candidato tem com relação a quase tudo parece contagiar seus seguidores.


Bruno Boghossian: Temer busca carona com próximo presidente para lustrar biografia

Emedebista tenta usar transição para preencher embalagem vazia do ajuste fiscal

Sem gasolina há meses, Michel Temer quer pegar uma carona com o próximo presidente. O passageiro já ousa dar orientações para o sucessor e chega a sentenciar que “dificilmente” o novo governo conseguirá seguir uma rota diferente da atual. “Quem poderá fazê-lo?”, perguntou, na semana passada.

Temer fala como se a escolha do próximo presidente e sua participação na transição pudessem ajudá-lo a recuperar algum poder. Foi sua impopularidade, no entanto, que contaminou as pautas elaboradas durante seu mandato —e não o contrário.

Em viagem a Nova York, Temer decidiu “anunciar” (e não “sugerir”) que faria uma reforma da Previdência logo depois da eleição. “Procurarei o presidente eleito, seja ele quem for, e tenho certeza de que ele atentará para o fato de que a medida é indispensável”, afirmou.

A intenção pode ser nobre, dada a situação precária das contas do país, mas Temer deixa de levar em consideração que o grupo eleito em outubro terá muito mais força do que ele para apresentar uma agenda ao Congresso, mesmo antes de subir a rampa do Planalto.

O governo atual deixa um legado de projetos não aprovados que podem ou não ser aproveitados pelo próximo presidente. Basta lembrar que o PT rechaça a ideia de Temer de mudança nas aposentadorias. O time de Jair Bolsonaro até concorda com o projeto, mas certamente tentará impor sua marca ao texto.

Temer até conseguiu reverter a recessão aberta pela gestão Dilma Rousseff e começou a reequilibrar os cofres públicos. O país, no entanto, está longe de retomar o crescimento e o emprego.

Na prática, o presidente quer diluir as fronteiras de seu mandato para insinuar que criou uma “doutrina” capaz de dar resultados nos próximos anos e lustrar sua biografia.

Depois de sofrer uma pane seca que paralisou a votação de assuntos importantes, Temer tenta deixar como legado a embalagem do ajuste fiscal, esperando que seu sucessor preencha o espaço vazio.