eleições municipais

Vinicius Torres Freire: Meteoros vermelhos caem, esquerda se renova e centrão domina

Eleição municipal foi uma onda cinza, dominada pelo crescimento do PSD e pelo ressurgimento do DEM

Os meteoros vermelhos que brilharam nesta eleição caíram. Os candidatos mais jovens da esquerda perderam, por diferença de votos maior do que as das projeções de véspera das pesquisas. O PT não venceu nenhuma capital. O PSOL conquistou Belém, com Edmilson Rodrigues, prefeito agora pela terceira vez, com um vice do PT, batendo o candidato bolsonarista.

De destaque, foi tudo. A eleição foi uma onda cinza, dominada pelas sub-legendas do centrão, pelo crescimento do PSD e pelo ressurgimento do DEM, onda confirmada neste segundo turno.

Guilherme Boulos (PSOL) perdeu para o PSDB em São Paulo, Marília Arraes (PT) perdeu para a “esquerda de centro” do PSB em Recife, Manuela D’Ávila (PC do B) perdeu para a velha política do MDB em Porto Alegre.

Sob certo aspecto, ainda assim essas derrotas têm um quê de ressurreição no fundo do poço. Nessas cidades muito grandes, simbólicas e importantes, candidatos de cara nova mostraram que a esquerda tem um grande potencial de votos. Deve haver mais gente no restante do país disposta a ouvir candidatos esquerdistas. Talvez seja necessário mudar a conversa.

As derrotas do PT e a passagem dos meteoros vermelhos indicam que o eleitorado desse campo do território político procura alternativas ou pode prestar atenção nelas. As lideranças nacionais da esquerda, ao menos em poder de voto, estão agora divididas em vários partidos, das velhas às novas, de Ciro a Boulos. O PT aparece no retrato, mas num canto.

Das legendas contadas como “esquerda” na geografia do Congresso, apenas o PDT de Ciro Gomes teve resultados razoáveis, em termos de números. Quase manteve o número de prefeituras conquistadas pelo país na eleição passada. Ganhou em duas capitais, Aracaju e Fortaleza.

O PT levou apenas 4 das suas 15 disputas de segundo turno, em redutos tradicionais em Minas Gerais, com duas prefeitas eleitas (Contagem e Juiz de Fora), e na região metropolitana de São Paulo (Mauá e Diadema).

Foi o partido com mais candidatos na disputa final deste domingo (em 2016, disputou apenas 7 rodadas finais). Mas esse desempenho não apaga nem traços do desastre na cidade de São Paulo e da derrota da renovação que seria Marília Arraes, novidade sabotada pelo PT local até quase as vésperas da campanha eleitoral.

Um problema do partido, notável neste século, pode explicar parte de suas dificuldades: o centralismo, o culto da personalidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o escanteamento das novas lideranças, o abafamento de quem ponha a cabeça para a fora, a desconexão crescente com os novos movimentos sociais. Tudo isso dificulta a renovação de quadros e ideias do PT.

Em parte, o PSOL, em especial o paulista, cresceu neste vácuo, mostrando caras novas e levando coletivos e movimentos sociais novos da periferia para o Legislativo.


Hélio Schwartsman: O encolhimento do PT

Partido precisa apresentar lideranças renovadas

O PT é um dos partidos que saem derrotados destas eleições. Pela primeira vez em 35 anos, não comandará nenhuma capital do país.

No cômputo geral, viu o total de prefeituras conquistadas reduzir-se de 254 em 2016 para 183 agora, com o incômodo detalhe de que as eleições municipais anteriores já haviam sido catastróficas para a legenda, que despencara de seu recorde de 630 prefeituras em 2012.

E não é só. Em duas das capitais mais dinâmicas, São Paulo e Porto Alegre, nas quais o PT tinha quase que cadeira cativa no segundo turno, os candidatos de esquerda que chegaram à disputa final eram de outros partidos, PSOL e PCdoB.

Esses são fatos objetivos que só um Trump ou um Bolsonaro ousaria negar. Apesar disso, eles não pintam um quadro muito completo da realidade. Se escarafuncharmos bem os dados, encontraremos pelo menos uma boa notícia para a sigla.

Embora tenha vencido em apenas quatro, o PT chegou ao segundo turno em 15 cidades (o maior número de participações entre todas as legendas). Em 2016, haviam sido apenas sete, dos quais saiu derrotado de todos. Acho que dá para afirmar que o eleitor dos maiores centros urbanos recolocou o partido na condição de ator importante, ainda que não o tenha contemplado com tantas vitórias.

Não há nada de muito surpreendente aí. Tirando momentos de recessão democrática como o atual, o embate mais natural de uma democracia é entre forças de centro-esquerda e de centro-direita. O PT havia sido, nas últimas quatro décadas, a sigla que melhor representava a centro-esquerda.

Poderá continuar a exercer esse papel, desde que interprete corretamente os recados dos eleitores e responda a eles. O mais eloquente é que o PT precisa apresentar lideranças renovadas. Não dá para as três prioridades do partido continuarem sendo o salvamento da biografia de Lula, e a quarta, a defesa de regimes como o venezuelano e o cubano.


Cristina Serra: A difícil travessia de 2021

Foi um alívio assistir à confirmação do fracasso de Bolsonaro como cabo eleitoral

As eleições municipais de 2020 desenham alguns contornos importantes sobre o realinhamento de forças conservadoras e progressistas no Brasil. Desde a ruptura institucional de 2016, que deve ser chamada pelo nome de fato, ou seja, golpe, essas forças vêm passando por uma reacomodação.

No pleito de agora, foi um alívio assistir à confirmação do fracasso de Bolsonaro como cabo eleitoral, sobretudo com a derrota esmagadora de seu aliado no Rio de Janeiro, o inqualificável bispo Crivella. Até aí, estamos falando da extrema direita. Já no campo da direita mais tradicional, é preciso, antes de tudo, apontar uma falácia. Partidos de direita fazem um tremendo esforço para vender a imagem de centristas. Mas é preciso não perder de vista o DNA dessas legendas. PP e DEM, por exemplo, têm sua origem no PDS, partido de sustentação da ditadura. Haja marketing para tirar esse bolor.

Também é difícil reconhecer no PSDB comandado por Bolsodória o perfil de centro (alguns diriam centro-esquerda) do partido criado em 1988 por FHC, Mário Covas e Franco Montoro. Como já era esperado, no dia seguinte às eleições, Doria voltou a adotar medidas impopulares de restrição, em São Paulo, para tentar conter a pandemia. Qual o custo humano de esperar o fechamento das urnas para anunciar essa decisão? Feitas essas considerações, é forçoso reconhecer que as legendas de direita —e não o centro— saíram fortalecidas em 2020.

Entre os progressistas, há um vácuo de estratégia. O PT perdeu preponderância, e partidos que disputam o mesmo campo não conseguem envergadura nacional. É de se notar, porém, uma bem-vinda renovação geracional na figura de Guilherme Boulos. Como esses eixos políticos se alinharão para 2022 depende menos desta eleição e muito mais da travessia que faremos em 2021. Bolsonaro e sua irresponsabilidade criminosa continuam. A pandemia também, com todos seus efeitos: morte, desemprego e fome. Com o agravante de que estamos todos exaustos.


Demétrio Magnoli: A cidade de Crivella

Não há como fugir à constatação de que prefeito venceu no primeiro turno em territórios controlados por uma milícia específica

No primeiro turno das eleições municipais de São Paulo, Bruno Covas (PSDB) obteve 33% dos votos, e Guilherme Boulos (PSOL), seu rival no segundo turno, 20%. A ampla diferença, de 13 pontos percentuais, refletiu-se no triunfo de Covas em todos os distritos da capital paulista. No primeiro turno do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (DEM) conseguiu 37% dos votos, contra 22% de Marcelo Crivella (Republicanos). Mas a diferença, de 15 pontos percentuais, não se traduziu por vitórias de Paes em todos os distritos. O atual prefeito venceu em cinco zonas eleitorais, quatro delas situadas na Zona Oeste. O mapa eleitoral conta uma história sobre o Rio.

Há uma regra sociológica geral, violada pelo mapa do primeiro turno no Rio. No caso de eleições decididas por margens apertadas, é normal que se verifiquem vencedores distintos em diferentes regiões. Contudo, em pleitos muito assimétricos, o primeiro colocado triunfa em todas as grandes regiões. As exceções merecem análise específica, pois decorrem de cisões sociais marcantes. O mapa de Crivella inscreve-se nessa categoria.

A cisão de renda não explica o fenômeno. Certamente, o atual prefeito obteve suas escassas vitórias em áreas pobres da cidade — mas não em todas, nem na maioria delas. O cenário Leblon versus Campo Grande, tão atraente para analistas apressados, distorce radicalmente a realidade eleitoral do primeiro turno. Prova disso está nos triunfos de Paes em diversos bairros ainda mais pobres da própria Zona Oeste.

A influência neopentecostal da Igreja Universal explica apenas um aspecto do fenômeno. A Universal opera com força em quase todas as periferias da cidade, não apenas nos bairros que deram maioria ao prefeito. Não há como fugir à constatação de que Crivella venceu em territórios controlados por uma milícia específica.

A territorialização de grupos armados ilegais percorre duas etapas clássicas. Na primeira, os milicianos estabelecem redes de negócios, explorando o mercado compulsório formado pelos habitantes das áreas sob seu domínio. Na segunda, a fim de consolidar tais atividades econômicas, infiltram-se na esfera política, capturando instituições estatais. O mapa de Crivella evidencia o grau de progresso das milícias cariocas nessa direção.

No Rio, as milícias nasceram no interior da polícia, um aparato estatal, e já operam há tempo na política, elegendo vereadores e deputados. A impunidade prolongada dos grupos de milicianos, bem como a natureza explícita de seus negócios, indica a cumplicidade passiva ou ativa de sucessivos governos estaduais e municipais com essas organizações criminosas. Policiais-milicianos foram celebrados e agraciados por comendas parlamentares. As casamatas das milícias atravessaram, intocadas, o longo período de intervenção militar federal na segurança pública do estado. Hoje, em certas regiões da cidade, como revela o mapa de Crivella, as milícias sequestraram o direito de voto dos cidadãos.

Campo Grande, centro do mapa de Crivella, é a base da Liga da Justiça (hoje Bonde do Ecko), maior milícia carioca, fundada pelos irmãos Natalino Guimarães, ex-deputado estadual, e Jerominho Guimarães, ex-vereador. A milícia expandiu-se para a Baixada Fluminense e controla negócios variados e bem conhecidos, com um foco especial em condomínios do programa Minha Casa Minha Vida.

As empresas do grupo financiam campanhas eleitorais de inúmeros candidatos. Um inquérito policial apura o envolvimento de milicianos do Bonde do Ecko no assassinato de diversos pré-candidatos rivais às câmaras de vereadores da Baixada Fluminense, do ano passado para cá. Desde as eleições de 2016, a organização criminosa tem candidato a prefeito — e o nome dele é Crivella. A cruz do pastor e a arma do miliciano marcham juntas na Zona Oeste do Rio.

O conceito de “Estado falido” aplica-se aos países em que o poder estatal perdeu, total ou parcialmente, o monopólio da força. O Brasil ainda não pode ser rotulado como “Estado falido”, mas a classificação descreve à perfeição a paisagem de sua segunda maior cidade. O mapa eleitoral não mente.


Fernando Gabeira: Um momento decisivo no Rio

Um potencial de desenvolvimento limpo e grandes problemas sociais pela frente são um enorme desafio para o novo prefeito

As eleições de hoje são importantes em todas as 57 cidades em que há segundo turno. Mas, no Rio de Janeiro, parecem ser uma questão de vida ou morte porque a cidade vive um longo processo de decadência prestes a ultrapassar um ponto de não retorno.

Personalidades cariocas enfatizam que a cidade, bonita por natureza, ainda pode encontrar sua vocação no desenvolvimento sustentável, produção do conhecimento, turismo e cultura.

Segundo algumas pesquisas, mais da metade do território do Rio é controlado pelas milícias. Um entre quatro moradores do Rio vive em favelas, sem endereço legal, título de propriedade, serviços públicos, sobretudo saneamento básico.

Uma velha canção diz que quando derem vez ao morro, toda a cidade vai cantar. Um potencial de desenvolvimento limpo e grandes problemas sociais pela frente são um grande desafio para o novo prefeito.

As pesquisas indicam que Eduardo Paes tem 70 dos votos contra apenas 30 do atual prefeito Marcelo Crivella.

Tudo indica que as necessidades de uma metrópole cosmopolita chocaram-se com a estreita visão religiosa de Crivella que subestimou até o carnaval, ponto central do calendário turístico, ao lado de outros como o Rock in Rio.

Apesar da crise profunda, ou talvez por causa dela, a sociedade se move. Durante a pandemia, morros como o do Alemão criaram comitês de crise para angariar fundos e ajudar a população, algo semelhante ao que aconteceu em Paraisópolis, São Paulo, embora num nível menor.

Há mais de um ano, um grande grupo de profissionais e urbanistas foi constituído na internet: o Juntos somos +Rio.

No momento mais intenso da crise, os debates sobre o futuro da cidade abriram para ações, como por exemplo alugar hotéis para que funcionários da saúde descansassem sem colocar em risco suas famílias.

Eduardo Paes foi prefeito do Rio duas vezes. Parece sensível a todos os problemas. É um político, sobrevivente da era Cabral, e terá de provar que aprendeu com os erros e não apenas se adaptou ao novo momento para vencer as eleições.

As lagoas da Barra da Tijuca, bairro onde Paes vive, jamais foram recuperadas num projeto urbano que poderia reviver na área o movimento aquático de uma Veneza.

Da mesma forma, Paes contraiu covid-19 um pouco antes da campanha e teve sintomas leves. É importante que se organize para enfrentar a pandemia e preparar o caminho para uma vacinação em massa, o que pode viabilizar o carnaval remarcado para o meio do ano que vem.

Até o momento não se dedicou muito ao tema, sequer visitou a Fundação Oswaldo Cruz, onde a vacina será fabricada.

O final de campanha no Rio foi marcado pelo baixo nível. Crivella acusa Paes de ter o apoio o PSOL, que iria para o setor de educação promover a pedofilia. O padrinho de Crivella, Bolsonaro, fortalece essa acusação, revivendo a famosa mamadeira de piroca que foi uma das estrela de sua campanha de fake news.

Se conseguir realmente demonstrar maturidade, Paes pode mobilizar o potencial da sociedade assustada com o processo de decadência. Se quiser, por exemplo, além da qualidade de vida num território contido entre o mar e Mata Atlântica, poderá implementar os passos de uma cidade inteligente.

O conhecimento para esse passo revolucionário na administração já é desenvolvido na Universidade Federal do Rio e estaria à sua disposição.

Portanto, apesar de discretas, sob o impacto da pandemias, as eleições no Rio podem marcar o futuro, inclusive porque este ano está prevista uma revisão do Plano Diretor da cidade - decisões que envolvem praticamente tudo no cotidiano dos cariocas.


Vinicius Torres Freire: Boulos e como jovens e velhos decidem as eleições de São Paulo

Eleitor de mais de 60 é cada vez mais relevante e vota à direita; jovens são inconstantes

Em São Paulo, a disputa principal foi sempre entre esquerda e direita desde que a cidade voltou a eleger seu prefeito, em 1988. O voto dos mais velhos é sempre marcadamente mais direitista. Mas em poucas vezes a maioria dos mais jovens votou na esquerda; em poucas vezes o voto dos idosos teve um peso tão decisivo quanto deve ter no segundo turno deste ano, entre Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL).

É entre os eleitores de 60 anos ou mais que Covas abre sua maior vantagem sobre Boulos, consideradas as categorias maiores e mais tradicionais em que as pesquisas dividem o eleitorado (sexo, idade, renda, instrução) e com dados comparáveis com os levantamentos mais antigos.

Na pesquisa Datafolha mais recente, de 24 e 25 de novembro, Boulos vence Covas entre os eleitores de 16 até 44 anos; entre o eleitorado de 16 até 59 anos, empatam. Entre aqueles de 60 anos ou mais, o tucano vence de longe, por 61% a 28% (ou 68% a 32%, nos votos válidos).

Além da diferença percentual grande, a diferença absoluta é importante. A população paulistana envelhece. No Censo de 1991, os paulistanos com 60 anos ou mais eram 11,6% do total da população com mais de 16 anos (agora apta a votar). Em 2010, eram 15,3%. Em 2019, eram 21,7%.

Há, claro, outras maneiras de entender as vantagens que Covas tinha sobre Boulos no início da semana. O tucano vence entre os que fizeram até o ensino fundamental (57% a 31% nos votos totais) e entre os mais pobres. Na conta total dos votos, porém, essas diferenças são inferiores àquela que Covas obtém entre os “idosos”.

A esquerda ganhou a eleição paulistana com folga ou endureceu o jogo quando ao menos dividiu com a direita os votos de mais pobres e menos escolarizados, é fácil de entender. Boulos disputa palmo a palmo o povo de renda mais baixa. Mas fica longe entre quem passou poucos anos na escola. Os mais jovens de qualquer classe não vão resolver o problema eleitoral do psolista, pois.

De 1988 até 2000, petistas enfrentaram os malufistas. De 2004 a 2016, foi o tempo de petistas vs. tucanos e agregados. Agora, é PSDB contra PSOL.

Houve tempo em que os malufistas venceram em todas as categorias relevantes, entre os mais jovens e os mais pobres inclusive, como quando Celso Pitta (PPB) bateu Luiza Erundina (PT), em 1996, ou na pesquisa de uma hipotética disputa final entre João Doria (PSDB) e Fernando Haddad (PT), em 2016, quando Doria levou no primeiro turno.

Os mais jovens estavam divididos quase igualmente entre o vitorioso Paulo Maluf (PDS) e Eduardo Suplicy (PT) em 1992, entre o vencedor, José Serra (PSDB), e Marta Suplicy (PT), em 2004, e entre o eleito Gilberto Kassab (DEM) e Marta, em 2008.

Os jovens votaram na esquerda mesmo apenas quando Marta ganhou em 2000 e Haddad em 2012. Na verdade, nessas eleições os petistas ganharam em quase todas as categorias, exceto entre os “idosos” (e, em Haddad vs. Serra, exceto entre os mais ricos).

Na eleição em que Erundina bateu Maluf, em 1988, as pesquisas de véspera davam quase empate entre os mais jovens. Mas não se sabe bem o que se passou. Erundina, agora vice de Boulos, virou a eleição nos últimos dias e não havia segundo turno.

Em suma, o peso crescente do “idosos” e sua preferência regular e marcada de votar à direita fazem desse eleitorado força decisiva especial. Note-se ainda que não conseguir falar com muitos dos eleitores que passaram menos anos na escola e sempre confundi-los com os mais pobres é outro problema para a esquerda.


Celso Rocha de Barros: Esquerda entrou fragmentada no Rio e em São Paulo, com resultados diferentes

Sobrou para a carioca, em 2020, fazer campanha para o DEM no 2º turno

Em um episódio recente do podcast Foro de Teresina, o jornalista José Roberto de Toledo chamou atenção para a semelhança das estratégias da esquerda no Rio e em São Paulo. Em nenhum dos dois lugares a esquerda entrou unida no primeiro turno.

Em São Paulo, foi ao segundo turno e faz uma bela campanha. No Rio de Janeiro, ficou fora do segundo turno, mesmo tendo uma boa votação na soma das candidaturas.

Comparar os dois casos pode ser um exercício interessante. Quando a fragmentação da esquerda no primeiro turno é administrável (como em São Paulo) e quando não é (como no Rio)? A pergunta tem implicações óbvias para a eleição presidencial de 2022.

Não há dúvida de que grande parte do sucesso da chapa Boulos/Erundina se deve à qualidade dos candidatos e da campanha. O ativismo social de Boulos e a reputação de competência e honestidade de Erundina são exatamente o que o eleitorado paulistano viu no PT quando lhe deu a prefeitura por três vezes.

A campanha foi ágil e inovadora. Todos os partidos de esquerda têm que aprender alguma coisa com a campanha do PSOL de São Paulo.

Mas no Rio as campanhas de Benedita da Silva (PT), Marta Rocha (PDT) e Renata Souza (PSOL) também foram bonitas, cada uma no seu nicho. A de Boulos foi melhor, mas não acho que o suficiente para explicar a diferença de desempenho.

Há uma outra diferença entre as duas eleições que me parece importante para pensar 2022. Nos dois casos, a direita tinha entre os concorrentes um centro-direitista bem avaliado e uma mediocridade bolsonarista. Mas só a mediocridade bolsonarista do Rio concorria à reeleição. Crivella tinha a máquina na mão, Russomanno não.

A máquina funciona melhor na mão de quem é bem avaliado, como Bruno Covas, do que na do sujeito que tem 62% de rejeição e é o pior prefeito da história da cidade, como Marcelo Crivella. Mas mesmo Crivella conseguiu a chance de ir ao segundo turno tomar a surra de escangalhar o cabra que se anuncia para semana que vem.

Na campanha presidencial de 2022, Bolsonaro também concorrerá à reeleição. Se chegará como favorito depende da gestão da crise de 2021, que vai ser feia. Mas é mais seguro apostar que em 2022 ter a máquina ainda será uma vantagem, nem que seja para dar a Bolsonaro o direito de apanhar no segundo turno.

Os desafiantes de Bolsonaro pela direita e centro-direita em 2022 —Doria, Huck, Moro etc.— serão mais parecidos com Eduardo Paes ou com Celso Russomanno? Ainda não sabemos. Vai depender, inclusive, do quanto a crise de 2021 vai virar o eixo ideológico da discussão para um lado ou para outro.

Talvez Bolsonaro desmoralize a direita a ponto de derrubar seus concorrentes moderados. É mais prudente que a esquerda se prepare para o pior cenário. Se o cenário em 2022 estiver com mais cara de Rio 2020 do que de São Paulo 2020, a esquerda vai ter que pensar a sério na possibilidade de fazer o máximo possível de alianças no primeiro turno.

Não é realista imaginar uma candidatura única, mas, se houver fragmentação demais, é bom que todos se conformem com a sorte da esquerda carioca neste ano: fazer campanha para o DEM no segundo turno. O fato é que a propaganda de Boulos com Ciro, Lula, Marina e Flávio Dino foram os segundos de TV aberta que mais emocionaram os progressistas brasileiros em muito tempo.​

*Celso Rocha de Barros, servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).


Ricardo Noblat: Em cena, o jogo sujo dos candidatos ameaçados de perder a eleição

Propaganda negativa para destruir os adversários

É assim por toda parte, aqui e no exterior, quando o fantasma da derrota bate à porta dos candidatos na reta final da campanha. Eles apelam para qualquer coisa, de preferência a mentira, como derradeira arma para impedir a vitória dos adversários.

A seis dias do segundo turno, a disputa em São Paulo parece uma guerra travada por monges piedosos desprovidos de armas letais se comparada com o que ocorre de maneira particularmente dura em pelo menos duas capitais: Rio e Recife.

Campeão nacional de rejeição entre os candidatos a prefeito das maiores cidades do país, Marcelo Crivella (Republicanos) mandou distribuir no fim de semana 1,5 milhão de panfletos impressos em uma gráfica do Rio com pesadas acusações a Eduardo Paes (DEM).

Acusações que, de fato, não passam de fake news. Crivella diz que Paes é a favor da legalização do aborto, da liberação do consumo de drogas e do uso do “kit gay” para educar alunos da rede municipal. “Kit gay” foi invenção de Bolsonaro na eleição de 2018.

A mais recente pesquisa Datafolha conferiu a Paes 71% das intenções de voto contra 29% de Crivella. Só entre os evangélicos, Crivella, bispo da Igreja Universal, ainda vence Paes. O apoio de Bolsonaro será incapaz de salvá-lo de uma derrota humilhante.

Nada indica que uma derrota por diferença gigantesca esteja no radar de qualquer dos candidatos a prefeito do Recife que restaram no páreo – João Campos (PSB), bisneto de Miguel Arraes que governou Pernambuco três vezes, e Marília (PT), neta.

Mas Campos, herdeiro do pai Eduardo, que governou o Estado e morreu em um acidente aéreo em 2014 quando concorria à presidência da República, foi ultrapassado pela prima nas pesquisas e 10 pontos percentuais separam os dois.

A luz vermelha acendeu para Campos. E a saída encontrada por estrategistas de sua campanha foi desqualificar Marília. Na propaganda de televisão, ela foi acusada de ser contra a Bíblia. Em panfletos apócrifos, de ser pau mandado do PT.

A justiça proibiu Campos de questionar a religiosidade de Marília, católica, e que ontem ganhou o apoio de 13 igrejas evangélicas. Quanto à suposta subserviência de Marília ao PT, nada fez nem poderia fazer. É uma acusação política. Ela que se defenda.

O antipetismo no Recife é forte, e nisso Campos joga sua última cartada. Acontece que ele e o PSB sempre foram aliados do PT. Estiveram juntos na campanha por Lula livre e Fernando Haddad presidente. Juntos, ainda governam Pernambuco.

Do primeiro para o segundo turno, Campos não conquistou novos apoios e viu Marília crescer no eleitorado que votou nos candidatos da direita – Mendonça Filho (DEM) e a Delegada Patrícia Amorim (PODEMOS), avalizada por Bolsonaro em live no Facebook.

Esta semana, 3 pesquisas de intenção de voto darão uma ideia de como vai o humor dos recifenses. Ou Marília ampliará a vantagem sobre Campos ou assistiremos, domingo, a uma apuração dramática de votos. A primeira hipótese parece mais provável.

No combate à Covid-19, um novo desastre se anuncia

Imunização parcial

Enquanto o Ministério da Saúde se cala, e os especialistas no assunto discutem se esta ainda é a primeira ou o começo da segunda onda, só no Estado do Rio de Janeiro, em comparação com duas semanas atrás, houve um aumento de 112% na média móvel de casos e de 153% na de mortos pelo coronavírus.

Pelo sexto dia consecutivo, a doença avança no Rio. Desde março passado, ali foram infectadas 338.263 pessoas, e mortas 21.974. No país, segundo números de ontem, o vírus já infectou 6.070.419 de pessoas, matando 169.197. Ele ganhou fôlego um pouco em toda parte com o relaxamento das medidas de isolamento.

A levar-se em conta o desempenho desastroso do governo federal no combate à pandemia, o próximo desastre ganha contornos nítidos. Um total de 6,86 milhões de testes para o diagnóstico do vírus comprados pelo Ministério da Saúde perde a validade até janeiro. Estão estocados num armazém em Guarulhos, São Paulo.

O ministério informou que assinará em breve “cartas de intenção não-vinculantes” para a compra de vacinas produzidas pela Pfizer, Janssen, Bharat Biotech, Fundo Russo de Investimento Direto (responsável pela Sputinik V) e Moderna. Não citou a Coronavac, a vacina chinesa aqui produzida pelo Instituto Butantã.

O general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, quer evitar colidir outra vez com o presidente Jair Bolsonaro que deu as costas à vacina chinesa porque ela será adotada pelo governo de São Paulo. Bolsonaro elegeu o governador João Dória (PSDB) como seu principal adversário nas eleições de 2022.

O governo federal diz haver previsão de acesso a 142,9 milhões de doses pelos contratos já firmados, o que garantiria a imunização de cerca de 30% da população brasileira. A imunização de toda a população dos Estados Unidos e dos principais países da Europa já foi garantida por seus respectivos governos.


Época: O horizonte da extrama-direita após o baque das eleições municipais

Como o bolsonarismo se reorganizará depois do fracasso nas urnas de 2020

Natália Portinari e Naira Trindade, de Brasília, e Gustavo Schmitt e Guilherme Caetano, Revista Época

O sábado 14, um dia antes do primeiro turno das eleições municipais, foi quando o presidente Jair Bolsonaro caiu em si. Apesar de ter passado a última semana fazendo lives em prol dos candidatos que apoiaria no dia seguinte, já sabia que o desfecho que se desenhava não era promissor. Suas principais apostas, Celso Russomanno, em São Paulo, e Marcelo Crivella, no Rio de Janeiro, amargavam números desanimadores, segundo as últimas pesquisas. Sem muita modéstia, atrelou o mau resultado dos aliados a sua própria ausência da corrida eleitoral — já que suas lives se tornaram frequentes apenas às vésperas do pleito. Mas reconheceu estar preocupado mesmo com outra coisa: o desempenho de seu filho Carlos Bolsonaro, candidato à reeleição para vereador no Rio de Janeiro.

Não se tratava, obviamente, do medo de que o zero dois não se elegesse. Carlos tinha sido o vereador com mais votos em 2016, e sua recondução ao cargo estava assegurada. O que deixava o presidente tenso era a possibilidade de sua votação ser abaixo do esperado. Bolsonaro atingiu em setembro o maior índice de aprovação numa pesquisa do Ibope desde que assumiu — 40% —, mas o respaldo dos eleitores ao filho serviria como um termômetro atualizado da popularidade do pai no reduto eleitoral da família. Abertas as urnas, ficou claro que os temores do presidente tinham, sim, fundamento. Carlos, que o acompanhou em carro aberto no dia da posse, acabou saindo menor do que entrou na campanha municipal. Em 2016, obteve 106 mil votos. Neste ano, não passou de 71 mil, uma queda de 33%. E, de quebra, o filho perdeu o posto de vereador mais votado da cidade para Tarcísio Motta, do PSOL.

Esse foi o pior recado do pleito, mas não o único. Russomanno, que contou com o apoio expresso do presidente, largou na frente nas pesquisas. No começo da campanha, isso encheu de esperança o Palácio do Planalto, que anseia fincar raízes no reduto eleitoral de seu adversário, João Doria, governador de São Paulo. Na tarde nublada de 3 de outubro, na Zona Sul de São Paulo, após um evento de campanha de Russomanno, Fabio Wajngarten, secretário executivo da Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom), era só otimismo. A bordo de um jipe Mercedes preto, disse a ÉPOCA, sorridente: “Ele (Russomanno) já está eleito”. E prosseguiu em sua análise: “De um lado, a esquerda está acabada por causa da Lava Jato. De outro, tem o PSDB desgastado em São Paulo. Ninguém aguenta mais. Foi assim em 2018”, apostou o secretário. Russomanno amargou o quarto lugar, com apenas 560 mil votos (10,5% do total), enquanto o adversário do tucano Bruno Covas no segundo turno será Guilherme Boulos, do PSOL — cenário que configura dupla derrota para o presidente, que há dois anos venceu na capital paulista com 60% dos votos.

Foto: Marcos Corrêa/PR

Em todo o país, dos 44 candidatos que ganharam o aval do presidente, apenas nove se elegeram. Entre esses poucos sortudos não estão parentes de sobrenomes considerados ilustres no bolsonarismo, como o irmão da deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP). Ela tem 1 milhão de seguidores no Twitter e 2,2 milhões no Facebook. Ele atraiu apenas 12 mil votos, abaixo da linha de corte para conseguir uma vaga na Câmara Municipal de São Paulo. O pai de Zambelli, candidato a vice-prefeito em Mairiporã, no interior paulista, tampouco prosperou. Edson Salomão, líder do Movimento Conservador e aliado do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o zero três, ficou de fora da Câmara de Vereadores de São Paulo. No Rio de Janeiro, Rogéria Bolsonaro, ex-mulher do presidente e mãe de seus três filhos mais velhos, não foi eleita, apesar do sobrenome e do empenho, principalmente de Carlos.

Antes de dormir, no dia 15, Bolsonaro tentou minimizar a contagem de mortos e feridos. Escreveu em sua conta no Twitter que sua “ajuda a alguns poucos candidatos a prefeito resumiu-se a 4 lives num total de 3 horas”, que a esquerda saiu derrotada e que a “onda conservadora chegou em 2018 para ficar”. Dois dias depois, ao se reunir com alguns parlamentares empenhados na criação de seu (ainda inexistente) partido, o Aliança pelo Brasil, compartilhou uma análise mais realista sobre o pleito. Para o presidente, a direita foi prejudicada em razão da pulverização partidária: “Quem saiu ganhando foi o pessoal do (Luciano) Huck”, vaticinou. A preocupação exposta naquela conversa não demorou a migrar para dentro do grupo de WhatsApp do Aliança pelo Brasil, onde deputados, senadores, ministros e integrantes do governo Bolsonaro debatem a criação do novo partido.

O sentimento geral, segundo um membro do grupo relatou a ÉPOCA, foi de um “choque de realidade” diante do que a cúpula da legenda reconhece ser uma derrota da extrema-direita. Sem um partido que abarcasse toda a direita radical, seus candidatos haviam ficado dispersos por várias siglas nas eleições municipais. “A direita bolsonarista aprendeu uma lição nesta eleição, a de que existe um eleitor de direita não necessariamente bolsonarista”, disse Alexandre Borges, analista político e proveniente de antigos círculos de estudo de Olavo de Carvalho. “É uma descoberta dura para o bolsonarismo, que se achava dono desse campo político.”

Entre os que aproveitaram o fraco desempenho dos aliados do Planalto nas urnas para criticar o presidente, ninguém se compara aos que o ajudaram a se eleger em 2018 e depois romperam. “O grande derrotado dessas eleições é o bolsonarismo. O presidente virou o Mick Jagger. Ele apoiava alguém e o cara morria (nas pesquisas) no dia seguinte”, disse o Major Olimpio, senador do PSL por São Paulo, referindo-se à fama de pé-frio do vocalista dos Rolling Stones. O senador defende um “expurgo” de bolsonaristas do PSL e cita a deputada Zambelli como alvo. “A direita, na verdade, por princípio, respeita o indivíduo e a individualidade. O autoritarismo não convive com uma filosofia direitista. A lógica bolsonarista é muito mais próxima de Stálin, que perseguiu seus principais apoiadores”, disse a deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP), convidada para ser a vice na chapa de Bolsonaro em 2018 e hoje uma feroz crítica. Mesmo dentro do bolsonarismo não faltou virulência.

“TORNA-SE CADA VEZ MAIS CONCRETA A POSSIBILIDADE DE BOLSONARO SE FILIAR A UM PARTIDO DO CENTRÃO PARA CONCORRER EM 2022, COMO PP, PL OU REPUBLICANOS — ESTE ÚLTIMO É ONDE ESTÃO ABRIGADOS SEUS FILHOS CARLOS E FLÁVIO BOLSONARO DESDE QUE DEIXARAM O PSL”

Parafraseando a máxima do escritor russo Tolstói, quando vencem, todos os grupos políticos se parecem, mas, quando perdem, cada um perde a sua maneira. Isso ficou evidente após a eleição. Os apoiadores do presidente deram início a um processo de busca de causas e explicações com características bem bolsonaristas. Não faltaram dissimulações e uma facção apontando o dedo contra a outra. O presidente logo engatou uma segunda marcha e passou a defender a interlocutores que o pleito municipal não serve como previsão do que ocorrerá na eleição presidencial de 2022. Mas a tentativa de baixar a temperatura não evitou uma lavagem de roupa suja e o fogo amigo.

Mateus Colombo Mendes, diretor do Departamento de Conteúdo e Gestão de Canais Digitais da Secom, escreveu uma longa análise e desabafo em sua rede social. “Chega do pensamento mágico de confiar apenas na imagem do presidente e de se ficar sempre esperando que o presidente resolva tudo sozinho, enquanto o restante fica resmungando nas redes, cada um na sua.” Filipe Martins, assessor especial da Presidência, compartilhou a postagem, logo depois de fazer sua própria reflexão, expondo indiretamente seu chefe. “Muitos se perguntam por que candidatos apoiados por cabos eleitorais de peso foram derrotados. A resposta é simples: perderam porque eleição municipal é base, é construção, não é improviso. Não adianta chegar às vésperas da eleição e dar carteirada nem tentar levar no grito”, escreveu.

O guru de Martins e do bolsonarismo, Olavo de Carvalho, aproveitou o momento de fragilidade para endurecer as críticas aos alvos de sempre: os militares, que ele acredita terem um projeto próprio de poder que não inclui necessariamente Bolsonaro e o núcleo ideológico de seu governo. “O péssimo desempenho dos bolsonaristas na eleição não tem mistério nenhum. Ludibriado pela conversa mole de generais-melancias, o presidente confiou demais no sucesso inevitável da sua liderança pessoal, sem perceber que ela não passava, precisamente, disso: uma liderança pessoal sem respaldo militante e incapaz, por isso, de transmitir seu prestígio a qualquer aliado.” “Melancia”, no vocabulário da direita extremada é sinônimo de quem é vermelho (comunista) por dentro.

Para a fúria ainda maior dos mais radicais da extrema-direita, Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo e, aparentemente, um dos “melancias” na visão de Carvalho, foi às redes comemorar o desempenho do centrão nas eleições. Ramos disse que o PT foi mal e frisou que PSD, PP, DEM e MDB vão governar mais prefeituras do que o partido do ex-presidente Lula. Para os olavistas, o centrão é o problema, não a solução. Para a ala mais pragmática do governo, o caminho após o fracasso eleitoral é mais, e não menos, centrão. A aposta é que, nas eleições presidenciais de 2022, a base de sustentação da campanha de Bolsonaro será formada por partidos tradicionais, os mesmos que o apoiam hoje no Congresso.

Como num roteiro de série de TV, os principais atores do bolsonarismo vivem um drama que envolve passado e futuro. Muitos apoiadores não acreditam que Bolsonaro conseguirá se firmar como um candidato competitivo à reeleição seguindo a fórmula adotada em 2018, com foco quase que exclusivo nas redes sociais. Para os defensores dessa tese, as eleições municipais deram algumas evidências favoráveis ao mostrar que forças de diferentes pontos do espectro político acordaram para a necessidade de ocupar espaços nas redes sociais. WhatsApp, Facebook, Instagram e Twitter já não são uma raia exclusiva do bolsonarismo. Isso aconteceu, por exemplo, na campanha para a prefeitura de São Paulo. Trabalhar nas redes sociais foi o que fizeram tanto Guilherme Boulos como Arthur do Val, o Mamãe Falei, ligado ao Movimento Brasil Livre (MBL), que atraiu 10% dos votos. “Nós trabalhamos bem com a rede. O PT apanhou e perdeu espaço para o PSOL porque ainda está na lógica ‘meio acadêmico, sindicato e Igreja’. O PSOL fez uma campanha virtual boa”, reconheceu o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP), um dos fundadores do MBL.

Enquanto o campo virtual tem sido povoado por diferentes nuances partidárias, o mundo real ainda carece de ser compreendido pelos políticos da nova direita advinda do bolsonarismo — fraqueza que muitos enxergam como a principal ameaça à continuidade de um projeto conservador no Brasil. Estrategistas políticos que trabalharam em campanhas de candidatos ditos conservadores nestas eleições relataram a ÉPOCA as dificuldades em convencer seus clientes da importância de articulação política e dos atos de rua. “Eu disse a eles: ‘Saiam da internet’. Mas eles não entendiam. Diziam que o Jair Bolsonaro tinha sido eleito pela força das redes sociais e que em 2020 seria assim de novo. Diziam que não precisavam de coligação porque o PSL não havia feito isso em 2018”, afirmou Rodrigo Morais, que trabalhou no governo de transição de Bolsonaro e hoje tem uma consultoria política.

Solenidade de posse do General Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República.
Foto: Marcos Corrêa/PR

No entorno do presidente, é ruidoso o grupo que, ao contrário do general Ramos, defende que o bolsonarismo precisa de um partido para chamar de seu. Daí as tentativas, até agora infrutíferas, de criar o Aliança pelo Brasil. Bolsonaro nunca foi dirigente partidário, tampouco seus filhos. A dinâmica maçante da formação de uma sigla e seus diretórios é o que garante musculatura para que candidatos disputem cargos a cada dois anos. Sem isso, não surpreende que o presidente não tenha conseguido engajar eleitores para o pleito municipal. A burocracia partidária e seus dissabores — incluindo divergências políticas — foi o que ajudou a azedar a relação de Bolsonaro com sua legenda anterior, o PSL. Mas quem apoia o presidente hoje diz que, quando ele tiver seu próprio partido, tudo será diferente. “A eleição municipal deixa claro a desvantagem da direita em relação à esquerda, já que falta estrutura partidária. Fora isso, a esquerda tem ONGs, centro de estudo e de formação de pensamento. A direita também tem de ter isso”, disse o empresário Otávio Fakhoury, aliado de primeira hora de Bolsonaro e hoje investigado nos inquéritos das fake news e da promoção de atos não democráticos.

Um ano depois de sua concepção, o plano de fundar o Aliança não conseguiu reunir nem 10% das 492 mil assinaturas necessárias para o registro da legenda junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). E as trocas de farpas entre bolsonaristas durante todo o processo denota que a concordância ideológica não se converte em harmonia na hora de dividir o poder. Integrantes do grupo rivalizam entre si por protagonismo e sofrem com uma ausência de definição, da parte de Bolsonaro, de quem é o verdadeiro responsável pelo Aliança. Quem vem assumindo as rédeas do projeto é o advogado Luis Felipe Belmonte, que coordenou viagens e eventos em prol da sigla nos últimos meses. Mas o futuro do Aliança é ainda incerto. Parte da base de apoiadores nos estados se voltou contra os organizadores, como Belmonte e os também advogados Karina Kufa e Admar Gonzaga. As brigas dificultam ainda mais a criação da legenda e a coleta de assinaturas. Oficialmente, porém, o grupo atribui à pandemia e às eleições municipais a demora do registro dos apoiamentos no TSE.

Depois dos desentendimentos passados com Luciano Bivar, presidente do PSL, o presidente parece estar reticente diante da possibilidade de “entregar” seu partido às mãos de alguém que não seja um de seus filhos. Bolsonaro também teme que o gesto de alavancar o Aliança desagrade ao centrão, que hoje é a base de seu governo, sobretudo diante da possibilidade, cada vez mais concreta, de que ele se filie a um partido tradicional para concorrer em 2022, como o PP, o PL e Republicanos, que é onde estão abrigados seus filhos Carlos e Flávio Bolsonaro. Sem a onda antipolítica alimentada pela Operação Lava Jato e com poder de fogo das redes sociais reduzido, o caminho para a direita bolsonarista a partir de 2021 é incerto porque requer diálogo — item escasso por aquelas bandas.


George Gurgel de Oliveira: As eleições municipais, as novas representações políticas e os desafios da democracia

As eleições municipais colocaram em disputa as concepções de governar e de se relacionar de cada um de nós e da Sociedade em geral, desafiando a maneira tradicional de fazer política, antes e durante a pandemia, e a nossa maneira de ser e estar em Sociedade.

Os resultados do primeiro turno das eleições municipais foram construídos nas Redes Sociais, nos Meios de Comunicação, nos Movimentos Sociais e Suprapartidários da Sociedade Civil, resultando na eleição de novas lideranças mais comprometidas com as agendas sociais, culturais, econômicas , ambientais e comportamentais da Cidadania.

Segundo os resultados da pesquisa do Instituto IDEIA, em parceria com a Revista Exame, realizada recentemente, no período de 16 a 19 de novembro, 27% dos brasileiros ficaram indiferentes aos resultados das eleições municipais realizadas no último 15 de novembro. Esta indiferença está próxima ao nível de abstenção recorde de 23% registrado pelo Tribunal Superior Eleitoral, refletindo no nível de satisfação do eleitorado: os satisfeitos com a eleição somam apenas 41% e o nível de insatisfação registrado é de 31%.

Quais são as causas e as consequências desta indiferença e não participação da Cidadania no processo político-eleitoral em curso, sendo o voto obrigatório?

Esta análise deve ser feita, para melhor conhecimento da nossa realidade política e social. São questões a serem consideradas no caminho de construção de uma alternativa política democrática para enfrentar os desafios eleitorais de 2022.

Ao mesmo tempo, nesta eleição municipal houve um maior protagonismo dos movimentos sociais em defesa de uma efetiva participação política das mulheres, dos negros, dos indígenas, dos LGBT+, nas questões sociais e ambientais em geral, traduzido em uma renovação das Câmaras Legislativas e Prefeituras dos médios e grandes municípios, trazendo a voz rouca dos excluídos da Sociedade para o exercício do poder municipal. Ainda, neste cenário, há que considerar a eleição de lideranças religiosas, na maioria evangélicas, o que já vem ocorrendo no Brasil, há muitos anos.

Portanto, a Sociedade colocou para os seus representantes a urgência de superação dos reais problemas do dia a dia da população. Os(as) prefeitos(as) e vereadores(as) eleitos(as) vão enfrentar, desde o primeiro dia dos seus mandatos, a difícil realidade de uma parcela majoritária da população dos municípios brasileiros, que vive em condições precárias de moradia, segurança, educação, saúde, saneamento e mobilidade urbana.

Assim, estes(as) vereadores(as) e prefeitos(as) eleitos(as) devem estar comprometidos(as) com o enfrentamento sistemático desses graves problemas sociais, econômicos e ambientais, agravados com a pandemia que deverá se estender pelo ano de 2021.

A maneira de governar e de se relacionar com a Sociedade coloca-se, cada vez mais, como a centralidade nas relações entre os governantes e os governados. Devendo se refletir no processo de construção de novos conteúdos de uma governança que se quer democrática para a realização das mudanças necessárias durante e pós-pandemia, em cada município brasileiro.

Os resultados eleitorais, no primeiro turno, apontam para o fortalecimento do centro político. A alta popularidade do presidente Bolsonaro não lhe trouxe os resultados eleitorais almejados. As populações dos municípios sinalizaram que a polarização da Sociedade não resolve as dificuldades cotidianas da Cidadania, muitas vezes, agrava, quando trazemos para a realidade municipal as polarizações políticas nacionais, que não ajudam a enfrentar os reais problemas da Sociedade.

Naturalmente, os resultados das eleições municipais não interferem diretamente nas eleições de 2022. No entanto, o surgimento de novas lideranças municipais e regionais podem mudar a composição atual das bancadas estaduais e federais, objeto de uma maior preocupação da maioria dos partidos, frente à nova legislação eleitoral: a eleição de uma numerosa bancada federal em 2022 vai ser determinante na existência de cada partido que queira continuar a ter um protagonismo na política nacional .

Assim, a população falou nas urnas. Quer mudar, com a urgência devida, a nossa trágica realidade social, desnudada com a pandemia.

O Brasil bipolar, dos extremos, não conseguiu e nem consegue enfrentar e construir soluções para os complexos desafios da realidade brasileira, nem a nível municipal, muito menos em escala nacional. O segundo turno deve confirmar esta tendência nas urnas. Os desafios econômicos, sociais e ambientais, históricos e atuais da sociedade brasileira devem ser enfrentados de uma maneira propositiva, ampliando a capacidade de diálogo e de construção de pactos políticos e sociais que avance e consolide a democracia brasileira, no caminho de transformação da nossa injusta realidade política, econômica e social.

Neste contexto, todos(as) estão desafiados(as) a ter uma efetiva participação na construção e na implementação de políticas públicas municipais, colaborando com o processo de avaliação permanente destas políticas, na busca de atender as demandas municipais, em sintonia com as outras políticas públicas regionais e nacionais, no caminho da sustentabilidade econômica, social e ambiental de cada município brasileiro.

Os(As) vereadores(as) e prefeitos(as) eleitos(as) estão desafiados(as) a construir novas relações de Governança entre o Estado, o Mercado e a Sociedade em geral. As atuais relações não atendem às demandas da maioria da população dos municípios brasileiros.

A criação de mecanismos institucionais de acompanhar e avaliar as relações entre o Executivo, o Legislativo e a Sociedade municipal, desafia a Cidadania e o poder público à construção de novas relações entre os atores políticos, econômicos e sociais do município, na busca da sustentabilidade econômica, social e ambiental da Sociedade.

Considerando sempre a necessidade de uma visão sistêmica no processo de construção das políticas públicas em geral. Colocando-se como imperativa a escolha de prioridades, através de dialogo permanente entre governantes e governados, que garantam a implementação de políticas públicas voltadas para a sustentabilidade municipal, articuladas às políticas regionais, sob responsabilidade estadual e federal, construindo pactos de cooperação entre o Estado, o Mercado e a Sociedade Civil, através de redes regionais, nacionais e internacionais, com foco na melhoria do bem-estar da população.

Estes são os nossos dilemas a serem superados para o avanço da democracia brasileira, com a inclusão desta maioria excluída da população no processo de construção de políticas públicas sustentáveis nas áreas de educação, moradia, saúde, saneamento básico, segurança, mobilidade, trabalho e renda, como condições elementares para a dignidade da vida social em cada município brasileiro.

Portanto, o exercício pleno da Cidadania, com a participação proativa da Sociedade, é a práxis que vai criar as condições para uma efetiva transformação da realidade política, econômica e social de cada município e de toda a Sociedade brasileira.

São os desafios permanentes dos prefeitos(as), dos vereadores(as) e da Cidadania brasileira.

*George Gurgel de Oliveira, professor da Universidade Federal da Bahia e da Oficina da Cátedra da UNESCO-Sustentabilidade


Ricardo Noblat: Arraes é o novo!

Na guerra dos primos, Marília, candidata do PT, sai na frente com apoio da direita

O novo virou velho e o velho o novo na guerra pela prefeitura do Recife travada por João Campos (PSB) e Marília Arraes (PT) – ele, filho do ex-governador Eduardo Campos que morreu em um acidente aéreo em agosto de 2014; ela, filha de um dos 10 filhos de Miguel Arraes que governou Pernambuco três vezes. Portanto, João, bisneto de Arraes, e Marília, neta.

Se a idade pesasse na definição de quem seria o novo, João venceria Marília. Ele tem 26 anos, ela 36. Mas na política, o novo e o velho se alternam a depender do que cada candidato representa. Coube a João representar um conjunto de forças que ocupa há 14 anos o Palácio do Campo das Princesas, sede do governo de Pernambuco, desde que ali chegou seu pai, neto de Arraes.

João foi o candidato mais votado no primeiro turno com 29,13% do total de votos válidos. Marília, o segundo com 27,90%. Pesquisa do Ibope aplicada entre a última segunda-feira e ontem conferiu a Marília 53% das intenções de voto e a João, 47%. Para Marília migrou parte dos votos de Mendonça Filho (DEM) e da Delegada Patrícia (PODEMOS), terceiro e quarto colocados.

Se a direita não tivesse se dividido no primeiro turno, ela estaria no segundo. Somados, Mendonça Filho e a Delegada Patrícia obtiveram 40% do total dos votos válidos. O PT só disputa o segundo turno em duas capitais – Vitória e Recife. Deve perder em Vitória e ganhar no Recife onde o PT e a direita se uniram para derrotar o PSB de Eduardo Campos e de João, seu herdeiro.

Marília foi três vezes vereadora do Recife– uma pelo PSB e duas pelo PT. Sua votação cresceu a cada eleição. Lançou-se candidata pelo PT a governadora há dois anos, mas na última hora, o partido passou-lhe a perna e apoiou o atual governador do PSB Paulo Câmara. Ela então disputou uma vaga de deputada federal. Elegeu-se como o segundo nome mais votado – o primeiro foi João.

Criada pelos pais livre e solta, Marília meteu-se na política desde cedo e à sombra do avô. João começou a despontar para a política quando apareceu no alto de um carro do Corpo de Bombeiros que conduzia o caixão com o corpo do seu pai. Foi uma das cenas mais comoventes que o Recife testemunhou. Menos de 2 anos depois, foi nomeado chefe de gabinete de Câmara.

Sob o comando do senador Humberto Costa, o PT de Pernambuco tentou barrar a candidatura de Marília a prefeita. Desta vez, a direção nacional do PT bancou a candidatura. O PT de Costa tem cargos no governo estadual e torce sem discrição para que Marília perca. Lula gravou mensagem pedindo votos para ela e prometeu comparecer à sua eventual posse como prefeita.

O PODEMOS da Delegada Patrícia e o PTB do senador Armando Monteiro Neto que apoiou Mendonça Filho anunciaram o apoio a Marília. O Cidadania, que votou em Patrícia, mas faz dura oposição ao PSB, deverá ir pelo mesmo caminho. O bolsonarista Anderson Ferreira (PL), prefeito reeleito de Jaboatão, município vizinho ao Recife, aderiu a Marília. O PL votou em Mendonça Filho.

João conseguiu no primeiro turno esconder o apoio dos dois maiores caciques locais do PSB – Câmara, o governador, e Geraldo Júlio, prefeito do Recife. É grande a reprovação aos dois. Esse será um dos trunfos de Marília no horário de propaganda eleitoral e nos debates de televisão com João. O PSB foi amplamente derrotado nas eleições para prefeito nas maiores cidades do Estado.

Se ocorrer de fato, a vitória de Marília poderá marcar o início do declínio do PSB como partido nacional de médio porte. Em 2012, liderado por Eduardo, pai de João, o PSB conquistou 433 prefeituras. Em 2016, sem Eduardo que morrera, 405. Agora, 250.


Vinicius Torres Freire: Eleição municipal abafa polarização e dificulta frente ampla contra Bolsonaro

Resultado das urnas torna ainda mais difícil a ideia de criar 'frente ampla' contra Bolsonaro

Quem ganhou a eleição municipal? A mera massa de números de conquistas locais de cada partido não diz grande coisa.

Além do mais, as reviravoltas de Junho de 2013 e a vitória de Jair Bolsonaro em 2018 deveriam incentivar alguma modéstia na especulação e dos politólogos. Mas os resultados das municipais já motivam rearticulações, reavaliação de estratégias e reivindicações de poder.

O que parece menos incerto?

Em termos de prefeituras conquistadas, a esquerda se tornou nanica e mais fragmentada. PT, PC do B e PSB (esquerda rosa-chá) perderam muitas prefeituras; nesse quesito, o PSOL ainda praticamente inexiste. O PDT se manteve mal e mal.

A esquerda teve e pode ter outras vitórias simbólicas relevantes, abrindo uma fresta para respirar na tumba em que está metida. Terá disputas duras em Recife, Porto Alegre, Belém e Vitória e uma quase impossível, em São Paulo.

Ainda assim: 1) ficou evidente que o eleitorado de grandes cidades está disposto a caminhar no “campo progressista”; 2) partidos como o PSOL voltaram a fazer o papel da esquerda, que é levar o povo miúdo para o governo, como o PT já fez de modo extensivo um dia.

Faz década se fala em coletivos de periferias e movimentos renovados de minorias. Essas pessoas começaram a chegar ao poder, como na Câmara de São Paulo. É pouco, mas faz barulho e será uma inspiração.

As derrotas da esquerda encorparam a onda cinza. Partidos de centro, sublegendas do centrão, centro-direita e direita dominam ainda mais prefeituras. Nesse bloco, o poder também está mais disperso com a ascensão do PSD e a ressurreição do DEM.Diz-se que o MDB continua o partido majoritário, com mais cadeiras de prefeito. É verdade, na aritmética.

O partido perdeu muitas prefeituras. Nas maiores cidades, é medalha de bronze. Trata-se aqui dos 204 municípios que abrigam metade da população brasileira. Neles, o PSDB contou 32 vitórias (eleitos ou em primeiro lugar no primeiro turno), seguido de PSD (28), MDB (27) e DEM (19).Somadas essas 204 cidades ao bloco intermediário (as maiores de 20 mil habitantes), tem-se 85% da população.

Aí, os partidos líderes em prefeituras ou vitórias parciais são quase os mesmos. Pela ordem: MDB (244), PSD (211), PP (202), PSDB (195) e DEM (151).O sucesso do DEM foi o grande crescimento; na política parlamentar, ora lidera o conservadorismo tradicional.

O sucesso do PSD é o crescimento contínuo, agora firme também nas grandes cidades. Gilberto Kassab, líder e organizador dessa “start-up” do centrismo-centrão, diz que o PSD pensa em lançar candidatos a presidente e que Bolsonaro perdeu. Em suma, avisa ao governo e aos partidos com ambições para 2022 que o PSD tem de ser considerado no jogo, pois é time grande.

O PSDB também perdeu prefeituras. Mas está forte em grandes cidades e, para variar, no tucanistão (o estado de São Paulo, segundo a esquerda). PSDB, DEM e MDB vinham fazia um tempo com uma conversa meio mole de serem aliados em 2022; a depender do futuro de Bolsonaro, podem juntar também o PSD. Falta apenas ter o que dizer ao povo e arrumar um candidato (quem tem muitos, não tem nenhum).

Mas há ainda mais incentivo para que formem um bloco distinto do centrão e com força para disputar o governo federal —se organizar direitinho, todo mundo terá um carguinho.O que ficou ainda mais difícil, dadas as derrotas da esquerda e a baixa da “polarização”, foi a ideia de criar uma frente ampla contra Bolsonaro: ele perdeu agora, mas pode, quem sabe, se beneficiar dessa divisão.