eleições 2022
Bruno Boghossian: Lula retoma territórios, e Bolsonaro se agarra a base mais restrita, aponta Datafolha
A fidelidade da base lulista e a hesitação do eleitorado que aderiu a Jair Bolsonaro (sem partido) em 2018 ajudam a explicar o descolamento entre os dois principais personagens da próxima corrida presidencial.
De volta ao jogo depois que o STF (Supremo Tribunal Federal) anulou condenações que o impediam de concorrer no ano que vem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) retomou o controle de territórios tradicionalmente petistas, de acordo com números da primeira pesquisa do Datafolha para a disputa de 2022.
Uma fatia da vantagem que o ex-presidente abriu sobre seus adversários aparece principalmente no grupo mais pobre da população —o que sugere que bandeiras petistas como as plataformas de distribuição de renda e redução da pobreza ainda ressoam nesse eleitorado.
Os números indicam que essa faixa é uma trincheira inicial de Lula. Entre eleitores que ganham até dois salários mínimos, o petista aparece com 47% no primeiro turno. Nos demais grupos de renda, ele não passa de 34%. Também está ali sua menor rejeição: 29%, contra mais de 40% em outros segmentos de renda.
Num eventual segundo turno contra Bolsonaro, os mais pobres dariam ao petista uma vitória por 60% a 28%.
A margem de Lula nesse recorte é relevante, no ponto de partida, porque o segmento de baixa renda representa mais da metade do eleitorado brasileiro. Além disso, esses grupos foram alvos de investidas de Bolsonaro ao longo do último ano.
O pagamento das parcelas de R$ 600 do auxílio emergencial, até setembro de 2020, aproximou esse eleitorado da órbita do presidente. O segmento ajudou o governo, em certa medida, a manter sua aprovação estável na pandemia e após a crise com o ex-juiz Sergio Moro, quando Bolsonaro perdeu popularidade em grupos de renda mais alta.
Os índices apresentados pelo Datafolha apontam que o presidente se agarra, agora, a uma base mais restrita. Com uma nova rodada do auxílio em valores menores, Bolsonaro não conseguiu avançar entre os mais pobres. Do outro lado, ele tem seus maiores índices de rejeição em segmentos mais ricos e com escolaridade mais alta.
Embora o presidente tenha consolidado um eleitorado fiel, ele encontra esse obstáculo em sua corrida à reeleição. Brasileiros com ensino superior completo foram alguns dos primeiros grupos a impulsionar a candidatura de Bolsonaro em 2018, abrindo caminho para sua vitória.
Agora, parte deles rejeita o presidente e parece buscar uma alternativa. Nesse segmento, Lula aparece com 30%, contra 22% de Bolsonaro, enquanto outros 36% se dividem entre os candidatos que disputam o rótulo da terceira via: Ciro Gomes (11%), Sergio Moro (10%), João Amoêdo (6%), Luciano Huck, João Doria e Luiz Henrique Mandetta (3% cada).
Esse pelotão, no entanto, não ameaça a vaga de Bolsonaro no segundo turno ou a liderança de Lula em nenhum recorte da população com peso relevante na pesquisa. Pode ser um sinal de que o eleitorado que rejeita os dois principais concorrentes não é tão numeroso quanto gostariam os demais candidatos.
Caso o cenário se cristalize como uma disputa concentrada entre Lula e Bolsonaro, a corrida vai se desenhar ao longo do próximo ano a partir dos movimentos dos dois líderes para preservar redutos, ampliar seus domínios e estimular a rejeição ao adversário.
No numeroso segmento de baixa renda, o desempenho da economia e o uso da caneta presidencial podem mexer nas curvas de intenção de voto. Ainda que os petistas enxerguem um vínculo histórico com esse grupo, a experiência do auxílio emergencial mostrou que parte dos eleitores responde rapidamente a medidas que tenham efeito direto sobre seu bolso.
As discussões no governo sobre a ampliação de despesas, os benefícios prometidos pelo presidente a categorias como caminhoneiros e o enfraquecimento da agenda de cortes do ministro da Economia, Paulo Guedes, indicam que Bolsonaro tem disposição para tomar decisões com potencial eleitoral considerável.
Além disso, auxiliares do presidente esperam que sinais de recuperação econômica e avanços na vacinação, embora extremamente lentos, possam se consolidar até 2022 e ajudar a reduzir a rejeição ao governo pela condução da resposta à pandemia da Covid-19.
A esperança dos bolsonaristas é recuperar, assim, parte do eleitorado que esteve com o presidente em 2018 e que não votaria em Lula no ano que vem. O foco da campanha seria despertar novamente o antipetismo, principalmente em segmentos da classe média e em grupos mais ricos da população.
Na visão de aliados do Palácio do Planalto, se nenhum outro candidato se mostrar competitivo até os meses finais da campanha, parte desse eleitorado poderia se aproximar de Bolsonaro por gravidade para derrotar o PT.
Fonte:
Folha de S. Paulo
Ricardo Noblat: No seu pior momento e no melhor de Lula, Bolsonaro perde feio
Um truísmo, mas vá lá. Pesquisa de opinião é um retrato do momento. Tendência, a evolução de alguma coisa num sentido determinado. O que uma pesquisa revela só vira uma tendência se confirmada por futuras e sucessivas pesquisas.
Os resultados da pesquisa Datafolha divulgada nas últimas horas foram péssimos para o presidente Jair Bolsonaro e ótimos para o ex-presidente Lula. Manda a prudência, contudo, que se esperem novas pesquisas para conferir se isso configura uma tendência.
Pode ser também o que pesquisadores chamam de “soluço”, algo ocasional que, mais tarde, será naturalmente corrigido. De resto, faltam 20 meses para o primeiro turno da eleição presidencial do ano que vem. Mesmo uma tendência pode ser revertida.
Tais ressalvas não tiram a importância do que a pesquisa Datafolha registrou: se a eleição tivesse sido realizada nessa quarta-feira (12/5), Lula teria batido Bolsonaro com folga de votos no primeiro ou no segundo turno. Bolsonaro deve preocupar-se, e Lula comemorar.
Bolsonaro atravessa seu pior momento. Embora em queda, a pandemia da Covid já matou quase 430 mil pessoas, em grande parte por incúria dele mesmo. Uma CPI apura tudo. Há 14 milhões de desempregados, e a recuperação da economia é lenta.
A série histórica da pesquisa mostra que, de dezembro para cá, a popularidade de Bolsonaro derreteu. A fatia de ótimo ou bom, que no último mês de 2020 atingia o recorde de 37%, caiu até chegar ao atual patamar, de 24% (queda de 13 pontos percentuais).
O grupo dos que consideram o governo ruim ou péssimo, que em dezembro correspondia a 32%, cresceu até atingir os atuais 45% (alta de 13 pontos). Bolsonaro amarga ao mesmo tempo o maior percentual de rejeição e o menor de aprovação.
Lula vive o melhor momento de sua vida desde que foi preso, condenado e trancafiado em Curitiba por 580 dias. A Justiça anulou suas condenações e declarou suspeito o ex-juiz Sergio Moro, que conduziu os processos. Por ora, nada de ruim gruda nele.
Tornou-se de bom-tom adversários políticos responderem a acenos de Lula com afabilidade, e se convidados, reunirem-se com ele. Sua passagem recente por Brasília foi um sucesso. Quem não esteve com ele insinua em conversas que poderia ter estado.
Em vista disso tudo, é compreensível que na simulação de primeiro turno feita pelo Datafolha Lula apareça com 41% das intenções de voto, contra 23% de Bolsonaro, 7% de Moro, 6% de Ciro, 4% de Luciano Huck, 3% de João Doria e 2% de Mandetta.
Num eventual segundo turno contra Bolsonaro, Lula o derrotaria por 55% dos votos a 32%. Para o petista, migraria a maioria dos votos de Doria, Ciro e Huck. Bolsonaro herdaria a maior fatia dos votos de Moro, seu ex-ministro da Justiça e desafeto declarado.
Lula venceria Moro no segundo turno por 53% a 33%, e Doria por 57% a 21%. Bolsonaro empataria tecnicamente com Doria (39%, a contra 40%) e perderia para Ciro (36%, a 48%). Os que disseram que jamais votariam em Bolsonaro são 54%, contra 36% de Lula.
O barco do PT navega, por enquanto, em mar de almirante. O céu não é de brigadeiro para Bolsonaro.
Candidato de centro a presidente ainda não deu o ar de sua graça
Quem souber de um, favor informar aos partidos interessados em construir alternativa a Lula e a Bolsonaro
Por ora, a eleição presidencial daqui a 20 meses será travada por apenas dois nomes com chances de vencer, segundo a pesquisa de intenções de voto do Datafolha, a primeira aplicada presencialmente: Lula e Bolsonaro. Não tem para mais ninguém.
Ciro Gomes, do PDT, que será pela quarta vez candidato? Foi rebaixado pela entrada de Lula no páreo. Antes, apostava em atrair boa parte dos votos da esquerda. Agora, ambiciona os votos do centro direita para tirar Bolsonaro do primeiro turno.
João Doria, do PSDB, governador de São Paulo e pai da vacina? Reúne míseros 3% das intenções de voto e enfrenta forte resistência dos seus governados. Eles o rejeitam até quando reconhecem que, se não fosse Doria, não se vacinariam tão cedo.
Sergio Moro, o ex-juiz? É carta fora do baralho. Não só porque anunciou que não se candidatará, mas porque os políticos em geral não o suportam. Moro criminalizou a política, e os políticos querem vê-lo morto e enterrado. Não há acordo possível entre eles.
Luciano Huck, o apresentador do programa das tardes de sábado na Rede Globo de Televisão? Seu destino é trocar de dia, sucedendo Faustão nos fins de tarde do domingo. É jovem, pode esperar que a fila ande e trocar de palco mais adiante.
Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde? Esse até quer ser candidato e deixa boa impressão por onde passa. Mas seu partido, o DEM, está em liquidação e sem cacife para alçar voo. Mandetta admite disputar o governo do Rio ou uma vaga no Senado.
Faltou algum nome na lista dos pretendentes a candidato do centro? O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) e o governador do Rio Grande do Sul Eduardo Leite (PSDB) foram lançados só para atrapalhar a vida de Doria, e estão atrapalhando.
O deputado Aécio Neves (PSDB-MG) encabeça um movimento para que seu partido não tenha candidato próprio a presidente. Ele e boa parte dos seus pares estão interessados na grana do Fundo Partidário para se reeleger. Sobrará mais grana para eles.
Em resumo: quem souber do paradeiro de um viável candidato de centro a presidente da República será regiamente gratificado.
Fonte:
Metrópoles
Bruno Boghossian: Chefe da Anvisa escancara na CPI conduta destrutiva de Bolsonaro
Antônio Barra Torres se diz amigo de Jair Bolsonaro. Nos primeiros meses da pandemia, o presidente da Anvisa frequentava o Palácio da Alvorada e aconselhava um presidente que já fazia questão de minimizar os riscos daquela crise. Agora, com o país mergulhado na tragédia, ele reconheceu que o governo levou o país pelo caminho errado.
O depoimento de Barra Torres à CPI da Covid escancara a conduta destrutiva de Bolsonaro. A comissão já esperava colher depoimentos incômodos para o presidente entre seus desafetos, como o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, mas nem mesmo um amigo foi capaz de acobertar o estrago feito até aqui.
Indicado por Bolsonaro para o comando da Anvisa, o contra-almirante disse que as declarações feitas pelo presidente sobre a vacinação vão “contra tudo” o que a agência defende. “Discordar de vacina, falar contra vacina não guarda uma razoabilidade histórica”, afirmou. “Eu penso que a população não deva se orientar por condutas dessa maneira.”
Barra Torres tem mandato na Anvisa até 2024. A estabilidade no cargo deve ter garantido tranquilidade para que ele entregasse os delitos do presidente. No depoimento, o contra-almirante disse, sem meias palavras, que a cloroquina não funciona contra a Covid-19 e confirmou que o Palácio do Planalto sediou uma reunião para tentar adequar a bula do remédio aos delírios de Bolsonaro.
Embora tenha participado de uma manifestação ao lado do presidente quando o coronavírus já circulava no país, Barra Torres criticou o incentivo a aglomerações. “[Apesar] da amizade que tenho, a conduta do presidente difere da minha nesse sentido”, declarou. “Não tem nenhum sentido do ponto de vista sanitário.”
O depoimento do amigo de Bolsonaro mostrou que o governo vai ter dificuldades para controlar os estragos que podem ser produzidos pela CPI. O futuro do presidente depende cada vez mais de puxa-sacos como Eduardo Pazuello e de uma tropa de choque bem alimentada formada por políticos do centrão.
Fonte:
Folha de S. Paulo
Rosângela Bittar: Fraulein, o regresso
Assim como não existe legalmente, o Centrão não tem preços fixos. De um lado do balcão, o presidente da República. Do outro lado, as legendas, da Câmara sobretudo. Com suas condições no atacado e no varejo. Em postos bem posicionados, com domínio de comissões decisivas para a linha de montagem dos produtos, representantes fanáticas do presidente Jair Bolsonaro.
Essas transações produzem um escândalo atrás do outro. Quem se importa ou se envergonha?
A Câmara dos Deputados descobriu que o preço do presidente Jair Bolsonaro está abaixo da expectativa do Centrão, uma vez que os critérios da barganha parlamentar só consideram de milhões para cima. Para a sociedade tudo isso é incompreensível e doloroso. Como compatibilizar a votação de uma mudança de costumes com as obras físicas inúteis e superfaturadas? Como pesar o engavetamento do impeachment tendo no outro prato da balança a anulação das minorias parlamentares com uma simples mudança do regimento?
As concessões de Bolsonaro são em moeda corrente. Já o capital do Centrão inclui principalmente bens intangíveis. O preço da involução dos costumes, por exemplo, está ficando insuportavelmente alto. As imposições do presidente são, na verdade, um conjunto de ideias fixas, resultantes de seu voluntarismo.
A abertura da Câmara para o voto impresso, por exemplo, é inexplicável em qualquer idioma, um risco não tabelado.
O presidente da Câmara, que conduz as negociações, não atua propriamente como líder, mas como um intermediário que costura composições onerosas.
Quem presta atenção no fato de que puxam o Brasil para trás, exatamente no quesito com que causam admiração ao mundo?
Absurdo que este retrocesso, com a revogação do sistema eletrônico de votação, parta de uma pessoa que não respira a não ser pelos aparelhos do Instagram, do WhatsApp, do Facebook, do Telegram, etc. Nem sabe ainda o que fazer da montanha de papéis inúteis que produzirá.
Colocada à mesa de negociações diante de outra insensatez, que é a demolição do sistema educacional brasileiro e seus avanços seculares, a Câmara se entregou. Achou uma pechincha a imposição da velha escola, a domiciliar. Que tal uma enquete com os pais de estudantes que estão vivendo esta longa temporada de pandemia com os filhos submetidos a aulas remotas ou a aula nenhuma? Como se fosse possível suprimir o papel dos professores e a socialização das crianças e adolescentes, ou eliminar as novas técnicas pedagógicas e sua integração com a ciência e a vida.
A volta a este passado invoca um dos personagens marcantes da literatura brasileira que está no livro Amar, Verbo Intransitivo, de Mário de Andrade, publicado em 1927. A inesquecível fraulein Elza, mais que professora, mestra em tudo. É esta a proposta? O ensino doméstico acabou na primeira Lei de Diretrizes e Bases.
Quem poderá pagar por isso? Quem controlará os planos, métodos e conteúdos? A quem se prestará contas? Quem fará a atualização de conhecimento? Não vale a pena sequer especular.
Produtos caríssimos, que o Centrão paga sem pedir desconto.
Nesse escambo, vale quanto pesa a regressão nas reformas constitucionais. Ou fatiar a reforma tributária não é o mesmo que dela desistir?
Para ter os votos da maioria que transformam o país nesta colcha de retalhos, o presidente vai criando novas moedas, e o Centrão se farta. A mais recente está expressa em um orçamento paralelo e secreto, revelado por Breno Pires em reportagem publicada pelo Estadão. Invenção que vale ouro nesta contabilidade. O resultado pode ser um trator trombando com uma retroescavadeira, um hospital ao lado de outro, uma rodoviária em cima da outra. Obras eleitorais explodirão neste governo como resultado da cooptação da Câmara.
E o vírus da pandemia sob dezenas de novas cepas.
Fonte:
O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,fraulein-o-regresso,70003712017
Fernando Exman: Centro entra na briga pelo “agro-eleitor”
Fevereiro de 2015. Cerca de nove meses antes do início do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, estavam mais do que dados os sinais da polarização em gestação e que há anos trava o jogo político. Aquele evento no Rio de Janeiro, agendado para ser um ato em defesa da administração petista e a gestão do partido à frente da Petrobras, seria lembrado até hoje por produtores rurais que justificam a decisão de aderir ao projeto político do presidente Jair Bolsonaro e já entraram no radar das siglas de centro.
Havia tensão no ar. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegara ao local depois que militantes petistas e oposicionistas já haviam trocado sopapos. A polícia precisou ser acionada.
“Em vez de ficarmos chorando, vamos defender o que é nosso. Defender a Petrobras é defender a democracia e defender a democracia é defender a continuidade do desenvolvimento social neste país”, discursou Lula, convocando os aliados a saírem pelas ruas. Aplausos na plateia.
Entre os presentes, pouco importava a proposital confusão entre a defesa de uma empresa estatal que sofrera um verdadeiro saque e o desagravo a um governo em derrocada. Sabia-se que Dilma não chegaria ao último dia de mandato. Mas, para Lula e seus aliados, era necessário, antes de tudo, manter a militância vigilante.
Ao concluir sua fala, o petista deu a senha para aqueles que precisavam de um motivo para radicalizar do outro lado: “Quero paz e democracia. Mas, se eles não querem, nós sabemos brigar também. Sobretudo quando o João Pedro Stédile colocar o exército dele do nosso lado”.
Era uma óbvia referência ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e à sua capacidade de mobilização no campo ou na cidade. O MST sempre esteve onde o PT ou outros movimentos sociais precisaram de uma forcinha para aumentar o número de participantes em manifestações.
Àquela altura, não estava claro até onde iria chegar o esgarçamento das relações partidárias, quem emergiria para vencer o pleito de 2018 e de que lado se posicionariam os atores políticos dali em diante. Ficou patente, contudo, que o agronegócio teria que procurar alternativas, embora Lula tenha colocado em seu próprio ministério Roberto Rodrigues, uma unanimidade no setor.
Decidiu-se, então, adubar a campanha do deputado Jair Bolsonaro. Os dois grupos passaram a caminhar lado a lado. Só deixarão de marchar juntos novamente em 2022, se uma força de centro conseguir atrair o setor agropecuário para fortalecer uma terceira via.
Depois de eleito, o presidente até achou que poderia governar se aproveitando dessa proximidade. Sua ideia era driblar os partidos e falar diretamente com as bancadas temáticas do Parlamento, entre as quais se destaca justamente a frente parlamentar do agronegócio. Não conseguiu, para a satisfação do Centrão, mas mesmo assim nunca deixou de patrocinar as pautas de interesse do segmento.
Neste mês, por exemplo, duas propostas defendidas pela bancada ruralista passaram a tramitar de forma mais rápida. A Câmara dos Deputados deve aprovar em breve um novo marco regulatório para o licenciamento ambiental. Outro projeto em discussão versa sobre regularização fundiária, bandeira comum entre produtores rurais e autoridades do governo que citam essa medida como panaceia para o combate ao desmatamento ilegal na Amazônia.
Além dos programas conduzidos pelo Ministério da Agricultura, com o Ministério da Infraestrutura Bolsonaro tem buscado dar um empurrão em diversas obras voltadas ao escoamento da produção. Ao Ministério do Desenvolvimento Regional, cabe acelerar a entrega dos empreendimentos relacionados à irrigação.
A Caixa Econômica Federal deve passar a atuar com mais intensidade no setor, onde o Banco do Brasil já é uma referência. Uma das apostas do governo é assegurar oferta de crédito para a construção de silos. Essa medida daria um conveniente apoio ao produtor de menor porte.
Também se tenta destravar os debates internos sobre o próximo Plano Safra, o qual tende a ter seu desenho concluído ainda neste mês. Restrições orçamentárias devem limitar o seu alcance.
A política de flexibilização do acesso a armas e munições também atende ao homem do campo, mas nada se compara ao que se observa em relação à atual debilidade do MST. A escassez de notícias de novas invasões realizadas pelo movimento se tornou um grande trunfo de Bolsonaro. O presidente já incorporou esse fato ao seu discurso. Isso inevitavelmente estará presente na campanha à reeleição.
A redução desse tipo de ocorrência e a alta do preço das commodities estreitam a cada dia a relação dos produtores rurais com o atual ocupante do Palácio do Planalto. Essa conjunção de fatores parece fazê-los esquecer que em praticamente toda semana algum representante do governo federal, se não o próprio presidente da República, protagoniza algum desaforo em direção à China, principal cliente do setor.
Um ato nacional está sendo preparado para o dia 15 e basta percorrer de carro o país para se ter outras evidências dessa parceria. São muitas as placas publicitárias instaladas às margens das estradas por associações rurais locais. Todas em apoio ao presidente.
Se o Ministério Público não tomar alguma atitude para retirar esses anúncios em razão da proximidade do período eleitoral, dificilmente alguma legenda formalizará pedido na Justiça para que a prática seja considerada campanha antecipada. Restaria aos partidos uma saída que buscasse criar conexões diretas com essa parcela da população, como a escolha de um vice originário do agronegócio para a composição de uma chapa alternativa às que serão encabeçadas por Lula e Bolsonaro. É isso o que lideranças políticas de Brasília pensam quando falam de um vice ideal para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, se o mineiro decidir mesmo deixar o DEM e filiar-se ao PSD para concorrer a Presidência da República
Fonte:
Valor Econômico
https://valor.globo.com/politica/coluna/centro-entra-na-briga-pelo-agro-eleitor.ghtml
Ricardo Noblat: O que disse Barra Torres à CPI da Covid calou Bolsonaro
De manhã, antes do início do depoimento à CPI da Covid-19 no Senado do contra-almirante Antonio Barra Torres, presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Jair Bolsonaro fez o de costume antes de ir trabalhar: reuniu-se nos jardins do Palácio da Alvorada, onde mora, com um grupo de devotos, e deitou falação. Entre outras coisas, chamou jornalistas de “canalhas”.
No meio da tarde, informado sobre o que dissera Barra Torres, e ainda dizia, perdeu a voz. Sequer discursou como estava previsto na cerimônia em que o governo anunciou a liberação de mais dinheiro para a área da Saúde e socorro aos brasileiros pobres atingidos pela pandemia. Aquela seria uma ocasião para faturar politicamente, mas ele não o fez. Parecia bufar de tão furioso.
Não era por menos. Foi até aqui o depoimento que mais afrontou o governo e pessoalmente o presidente da República. Os dos ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich saíram conforme o previsto, assim como o de Marcelo Queiroga, o atual ministro, que poupou o governo e Bolsonaro dos maiores embaraços. Queiroga mentiu e sonegou informações.
Barras Torres, não. Ele confirmou que no início da pandemia houve uma reunião, no Palácio do Planalto, para discutir uma mudança na bula da cloroquina. Disse que não concorda com uso de cloroquina no suposto tratamento precoce do vírus. Defendeu o uso de máscaras e testagem em massa, e afirmou que falas de Bolsonaro sobre vacinas atrapalham o combate à pandemia.
Quer mais? Disse estar arrependido de ter aparecido ao lado de Bolsonaro em manifestação antidemocrática. O ato ocorreu em março de 2020. Considerou “inadequado” o passeio de moto feito pelo presidente no último domingo. E deu em Bolsonaro uma cutucada que ele jamais esquecerá: “No meio militar o que causa mais irritação é o cidadão que quer ser algo que não é”.
Cercado de militares vassalos que só lhe dizem amém, Bolsonaro deve ter imaginado que Barras Torres se comportaria como eles. Como o general Eduardo Pazuello, por exemplo, adepto da teoria do manda quem pode, obedece quem tem juízo. Pazuello irá depor à CPI na próxima quarta-feira, se possível protegido por um habeas corpus que pedirá à justiça para calar-se ou falar pouco.
Tem tudo para ser comparado com Barras Torres e sair de lá execrado, ao contrário do seu colega de farda.
Demitido, Fabio Wajngarten volta a assombrar o governo
Provas, a CPI da Covid-19 ainda não tem. Espera obtê-las ao longo das próximas semanas. Mas evidências ela já reuniu de que Fabio Wajngarten, publicitário e ex-Secretário de Comunicação do governo federal, fez lobby a favor da compra da vacina da Pzifer. Esperava, segundo dois senadores ouvidos por este blog, amealhar alguns trocados. Não por isso, Wajngarten acabou demitido.
Bolsonaro detestou o depoimento prestado à CPI pelo contra-almirante Barras Torres, presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Mas o que ele teme é o que o seu ex-secretário de Comunicação possa dizer. Para livrar-se de suspeitas no caso da vacina da Pzifer, Wajngarten atirou na cabecinha do general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, em entrevista à VEJA.
Wajngarten saiu do governo magoado, de resto como Pazuello. Sempre foi fiel a Bolsonaro desde os tempos da facada em Juiz de Fora, no dia 6 de setembro de 2018. Foi ele que mobilizou empresários e meios de transporte para que Bolsonaro fosse transferido de lá para São Paulo e internado no Albert Einstein, um dos hospitais mais caros do país.
Acabou sendo vítima de intrigas palacianas e perdeu lugar no governo. Está inconformado. Queixa-se, principalmente, do general Luiz Eduardo Ramos, chefe da Casa Civil, que a ele só se refere de forma depreciativa. Poderá usar seu depoimento na CPI para detonar desafetos, ou então para mostrar a Bolsonaro que continua a merecer a sua confiança.
Fonte:
Metrópoles
Bernardo Mello Franco: Engavetador em campanha
Um assessor parlamentar deposita R$ 89 mil na conta da primeira-dama. Quando a história vem à tona, o presidente diz que o dinheiro era para ele. Ao ser questionado sobre o motivo dos cheques, o político se descontrola. Fecha a cara, solta palavrões e ameaça agredir o jornalista com um soco na boca.
A pergunta do repórter do GLOBO ganhou as redes sociais: “Presidente, por que sua esposa, Michelle, recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz?”. Nove meses depois, Jair Bolsonaro ainda não se dignou a respondê-la. Se depender da Procuradoria-Geral da República, continuará em confortável silêncio.
Na segunda-feira, o procurador Augusto Aras rejeitou abrir inquérito sobre o caso. Ele afirmou ao Supremo que não vê “lastro probatório mínimo” contra o capitão. O parecer contrariou o advogado Ricardo Bretanha Schmidt, autor do pedido de investigação. “Quando se trata do presidente, a PGR nunca tem disposição de elucidar os fatos”, protesta.
Desde que foi nomeado por Bolsonaro, Aras se comporta como um aliado do governo. Virou o novo engavetador-geral da República, título inaugurado por Geraldo Brindeiro na Era FH. O procurador já arquivou múltiplas representações contra o presidente. Entre outras coisas, recusou-se a investigar os desmandos na pandemia e o uso da Lei de Segurança Nacional contra opositores.
Em janeiro, a submissão de Aras ao Planalto tirou seus colegas do sério. Numa cobrança pública, seis integrantes do Conselho Superior do Ministério Público escreveram que ele “precisa cumprir o seu papel de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e de titular da persecução penal”. Em outra frente, a Associação Nacional dos Procuradores da República afirmou que “a sociedade brasileira não admite omissão neste momento”.
A fidelidade de Aras a Bolsonaro tinha um motivo conhecido: ele sonhava ser nomeado ministro do Supremo. Como o capitão prometeu a vaga a um jurista “terrivelmente evangélico”, o procurador teve que mudar os planos. Virou candidato a um segundo mandato na PGR. Em 2019, ele convenceu o presidente a nomeá-lo fora da lista tríplice. Agora está em campanha para repetir a dose em setembro.
Fonte:
O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/bernardo-mello-franco/post/engavetador-em-campanha.html
Vera Magalhães: Haja trator para tanto escândalo
Tratores são, como o nome indica, veículos de tração, responsáveis por movimentar cargas muito pesadas, de difícil deslocamento. Haja trator superfaturado para empurrar Jair Bolsonaro até o fim do mandato com tanto escândalo, tanto fracasso e tanta incompetência.
O escândalo do tratoraço, revelado pelo “Estadão”, que começou a puxar o fio da meada de um mecanismo novo de apropriação do Orçamento da União por pequenos grupos para dar sustentação a um governo insustentável, é a chave para ajudar a responder, juntamente com o fanatismo de um setor da sociedade, à pergunta de um milhão de dólares: por que Bolsonaro não cai?
O ministro Luiz Eduardo Ramos costuma se gabar de que, depois de sua passagem pela Secretaria de Governo da Presidência, a máxima segundo a qual não havia articulação política no Planalto foi derrubada.
Agora se sabe com que expedientes.
Uma engenhosa urdidura permitiu que o Centrão caísse no colo do presidente, e lá vai permanecer enquanto houver trator para arrancar. A base desse arranjo foi a criação de um tipo de superemenda (a RP9, domínio do relator do Orçamento), usada como uma conta-mãe de que parlamentares aliados sacam nacos para suas bases à custa de fidelidade nas votações e mediante ofícios por baixo dos panos.
Esse tipo de emenda chegou a ser vetado por Bolsonaro, aconselhado à época, em 2019, por aqueles que viam no expediente o que ele é: uma burla à fiscalização da aplicação das verbas orçamentárias pelos órgãos de controle e uma forma de injetar dinheiro público mais rápido e sem restrições nas bases de deputados e senadores leais.
O que se seguiu foi um roteiro sórdido, em que o Congresso não derrubou o veto, não aprovou um projeto, o PLN4, que o regularizaria de novo, mas passou a usar a superemenda a rodo.
O fio puxado pelo tratoraço deve revelar outros “aços” em pastas espalhadas pela Esplanada e suas estatais e autarquias, igualmente aparelhadas e desviadas de sua finalidade, como a Codevasf, a meca do tratorista Rogério Marinho.
Não foi à toa o silêncio de Paulo Guedes quando questionado por quatro horas a respeito do tema nesta terça-feira na Câmara: além de ser um esquema com todas as digitais de seu desafeto no Ministério, o tratoraço é tudo aquilo que o ministro da Economia, em sua ilusão de que ser liberal bastaria, achou que Bolsonaro enterraria na relação entre dinheiro público e política. Não só não enterrou, como aperfeiçoou.
Hoje a Codevasf virou uma estatal anabolizada, outra antítese da cantilena liberal com que Bolsonaro ludibriou o Posto Ipiranga e boa parcela do eleitorado.
O Centrão, que não se ilude com ninguém e só apoia quem lhe dá algo em troca, esperou calmamente a diatribe de “não preciso da velha política” do capitão passar e agora vive a febre do maquinário agrícola sem medo de ser feliz.
O que pode estragar a festa dos tratoreiros? Uma investigação mais a fundo do esquema, que comprove: 1) que o Orçamento secreto é uma forma de burlar a execução orçamentária; 2) desvio de finalidade de empresas públicas, como a Codevasf; 3) corrupção explícita, desvio de recursos na ponta do que é enviado via RP9 para as bases dos parlamentares; 4) favorecimento a empresas ligadas aos políticos na compra de serviços e maquinários.
Tudo isso está quicando, pronto para ser descoberto. O Tribunal de Contas da União já tem uma investigação aberta sobre irregularidades na Codevasf (quem se lembra dos Correios como piloto do mensalão, ou da Petrobras do petrolão?). Cabe à imprensa vasculhar os ofícios em todas as pastas e rastrear os recursos enviados pelo Orçamento secreto a estados e municípios. Quando esse edifício começar a ruir, os que subiram na boleia dos tratores serão os primeiros a descer, e a blindagem de Bolsonaro começará a ceder.
Fonte:
O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/vera-magalhaes/post/haja-trator-para-tanto-escandalo.html
Datafolha: Lula lidera corrida eleitoral de 2022 e marca 55% contra 32% de Bolsonaro no 2º turno
Fábio Zanini, Folha de S. Paulo
Pouco mais de dois meses após ter seus direitos políticos restabelecidos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera a corrida para a Presidência com margem confortável no primeiro turno e venceria o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na segunda etapa, revela pesquisa Datafolha.
O petista alcança 41% das intenções de voto no primeiro turno, contra 23% de Bolsonaro.
Em um segundo pelotão, embolados, aparecem o ex-ministro da Justiça Sergio Moro (sem partido), com 7%, o ex-ministro da Integração Ciro Gomes (PDT), com 6%, o apresentador Luciano Huck (sem partido), com 4%, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que obtém 3%, e, empatados com 2%, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM) e o empresário João Amoêdo (Novo).
Somados, os adversários de Lula chegam a 47%, apenas seis pontos percentuais a mais do que o petista. Outros 9% disseram que pretendem votar em branco, nulo, ou em nenhum candidato, e 4% se disseram indecisos.
O levantamento foi realizado com 2.071 pessoas, de forma presencial, em 146 municípios, nos dias 11 e 12 de maio. A margem de erro é de dois pontos percentuais.
Num eventual segundo turno contra Bolsonaro, Lula levaria ampla vantagem, com uma margem de 55% a 32%. Ele receberia a maioria dos votos dados a Doria, Ciro e Huck, enquanto o presidente herdaria a maior fatia dos que optam por Moro, seu ex-ministro da Justiça e atual desafeto.
O petista também venceria na segunda etapa contra Moro (53% a 33%) e Doria (57% a 21%).
Já Bolsonaro empataria tecnicamente com Doria, marcando 39%, contra 40% para o tucano. E perderia para Ciro, obtendo 36%, contra 48% para o pedetista.
É a primeira pesquisa de intenção de voto do Datafolha feita desde que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, anulou as condenações judiciais do petista, com a justificativa de que a Justiça Federal em Curitiba não era o foro competente para as ações.
A decisão de Fachin depois foi referendada pelo plenário do STF, que deu a Lula outra vitória relacionada à Lava Jato: o reconhecimento de que o ex-juiz Sergio Moro foi parcial ao condenar o petista no caso do tríplex de Guarujá (SP).
As decisões do Supremo não significam a absolvição de Lula, uma vez que as quatro ações penais do ex-presidente na Lava Jato foram transferidas para Brasília.
Na prática, o petista readquiriu o direito de disputar a Presidência no ano que vem, e não perdeu tempo em retomar contatos políticos.
Após ter sido imunizado com as duas doses contra a Covid-19, ele viajou a Brasília na semana passada, onde teve encontros com representantes de diversos partidos.
Além de contatos com a esquerda, também conversou com líderes do centrão e até do MDB, partido que capitaneou o impeachment conta a ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016.
Assim que a pandemia permitir, ele pretende também realizar viagens por estados brasileiros, numa espécie de pré-campanha. Segundo aliados, Lula pretende se apresentar como um político moderado, de centro, e cogita repetir a fórmula de suas duas vitoriosas campanhas presidenciais, em 2002 e 2006, com um empresário como vice.
Nesta pesquisa, Lula mantém seu padrão tradicional de apoio, com índices superiores de intenção de voto em segmentos de menor renda e escolaridade.
Ele marca 51% entre os que declaram ter ensino fundamental, e 47% na faixa de renda familiar de até dois salários mínimos mensais.
Por outro lado, seu índice cai para 30% nos que têm curso superior, e 18% no estrato mais rico, o de renda maior do que dez salários mínimos. Mais uma vez, o Nordeste demonstra ser o maior reduto eleitoral para o petista, onde ele atinge 56%.
Bolsonaro, por sua vez, vive um momento de abalo em sua imagem, em razão da criticada gestão da pandemia, que é objeto de uma CPI no Senado.
Ele tem 36% das intenções de voto entre os que declaram estar vivendo normalmente, mesmo com a pandemia, em empate técnico com Lula (33%). Bolsonaro tem promovido aglomerações, e muitas vezes dispensa o uso de máscaras.
Na outra ponta, aqueles que dizem estar totalmente isolados apoiam Lula de forma maciça (58%), contra apenas 8% dados a Bolsonaro.
O presidente tem mais apoio do que a média entre os homens (29%), os eleitores que têm ensino médio (26%) e os de renda de 5 a 10 salários mínimos (30%).
O presidente perde para o petista em todas as regiões, mas tem melhor desempenho no Sul e no Centro-Oeste/Norte, nas quais é forte o agronegócio, uma de suas grandes bases de apoio. Tem 28% em ambas.
Em outro segmento que costuma dar apoio ao presidente, o dos evangélicos, Bolsonaro tem 34%. Mas Lula também vai bem neste grupo, com 35% das intenções de voto, uma situação de empate técnico.
Bolsonaro também sofre os efeitos do aumento do desemprego e do repique da inflação, sobretudo a de alimentos.
No mês passado, o pagamento do auxílio emergencial pelo governo federal foi retomado, mas com um valor mais baixo, o que limitou a recuperação da popularidade do presidente. Dentre os que receberam o benefício, 22% declaram intenção de voto em Bolsonaro, o que não destoa da média geral aferida pelo instituto.
Entre os que se declaram desempregados à procura de trabalho, Bolsonaro tem apenas 16% das intenções de voto. O único estrato profissional em que ele lidera é o dos empresários, com 49% contra 26% de Lula.
Com o avanço da CPI da Covid, os apoiadores do presidente retomaram a participação em manifestações de rua, muitas vezes ignorando os protocolos de proteção contra a pandemia. Isso ocorreu em diversas cidades no Dia do Trabalho, enquanto o próprio presidente prestigiou um ato de motociclistas em Brasília no domingo (8).
As últimas semanas também viram uma intensa movimentação de Ciro, que busca dar uma guinada ao centro, após a volta de Lula ao cenário eleitoral.
Seu partido contratou o publicitário João Santana, que trabalhou com o PT, para mostrá-lo como uma alternativa à polarização representada por Lula e Bolsonaro. Em vídeos divulgados em redes sociais, Santana também tem buscado suavizar a imagem do ex-ministro, conhecido pelo pavio curto.
Ele se sai melhor entre os que têm ensino superior (11%) e no estrato mais rico (13%).
A pesquisa revela ainda que Doria segue tendo dificuldades para capitalizar politicamente o fato de ter trazido ao Brasil a Coronavac, parceria do Instituto Butantan com um laboratório chinês.
Até o momento, cerca de 80% das vacinas aplicadas no Brasil são fruto desta parceria, mas o tucano não tem conseguido transformar esse fato em intenções de voto.
Com relação aos demais candidatos, há dúvidas se vão mesmo concorrer. Huck teria de deixar um lucrativo contrato com a TV Globo, enquanto Moro desgastou-se após a série de derrotas sofrida pela Lava Jato.
54% DIZEM QUE NÃO VOTARIAM EM BOLSONARO DE JEITO NENHUM EM 2022
Para se reeleger em 2022, Jair Bolsonaro também terá de enfrentar um alto índice de rejeição, que ultrapassa metade do eleitorado e poderá ser um complicador, especialmente em um segundo turno.
Dentre os entrevistados pela pesquisa Datafolha, 54% dizem que jamais votariam nele.
A rejeição de Lula é a segunda maior, com 36%, seguida pelas de Doria (30%), Huck (29%), Moro (26%) e Ciro (24%).
Fonte:
Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/05/datafolha-lula-lidera-corrida-eleitoral-de-2022-e-marca-55-contra-32-de-bolsonaro-no-2o-turno.shtml
Vinicius Torres Freire: A epidemia vai morrer de morte morrida, não matada por ação de governo
Estamos cansados de distanciamento, de medo de perder o emprego ou o negócio, de mortes. Há sempre um escândalo ou ultraje novo que abafa o horror ou a mutreta da semana passada. O conjunto da ruína soterra no esquecimento outros desastres. Quem ainda se comove com o desmatamento crescente, “recorde”, da Amazônia? Assim é também com as mortes de Covid e a vacinação lenta.
A epidemia está em um nível de morticínio que, até a metade de março, era o recorde e causava escândalo, provocava panelaço e incentivou a instalação da CPI. São ainda mais de 2.000 mortes notificadas por dia no Brasil. A estatística funérea caiu bastante desde o pico do horror (meados de abril), uns 33%. Mas, no ritmo em que vamos, ainda em meados de junho teremos mil mortes por dia, como em janeiro, que por sua vez contava o dobro do número de mortes de novembro, no entanto.
E daí?
Não sabemos se o número de mortes vai continuar caindo nesse ritmo já lento. Faz cerca de duas semanas, o número de novas internações por Covid em UTIs no Estado de São Paulo está praticamente estável (em torno de 2.235 por dia, muito acima da média de 1.500 por ainda de fevereiro).
Pode ser que a “fila esteja andando”. No último auge da epidemia, muitos doentes não conseguiam leitos de terapia intensiva, agora mais disponíveis. Ou seja, o número de internados e, pois, de doentes muito graves era subestimado e agora pode estar superestimado. Mas não sabemos.
Ainda estamos na pior fase da epidemia, que começou em meados de março. Ajuda ou deveria ajudar a nos lembrar que não foi adotada nenhuma das grandes providências para conter o morticínio. O tal “comitê nacional” de Jair Bolsonaro e seus cúmplices no Congresso, sobre o que houve tanta fanfarra, era uma farsa. Não houve aceleração na oferta de vacinas —é bem provável que neste maio tenhamos mais doses do que em abril, mas junho é uma incógnita tétrica.
Boa parte da economia (negócios de alimentação, entretenimento, turismo) não voltará a funcionar em parte ou totalmente (espetáculos, feiras de negócios) enquanto não se controlar a epidemia, está todo mundo também cansado de saber. Adianta fazer o alerta? Cada vez menos. A inação fundamental continua.
A CPI é necessária para responsabilizar política e criminalmente o governo Bolsonaro, mas não tem como resolver o problema prático. A ação depende de planos nacionais de pesquisa, rastreamento, testagem, de contenção de circulação de pessoas e até de barreira contra a entrada de novas variantes. Ninguém aguenta mais ouvir falar disso, mas nada disso foi feito nacionalmente.
A epidemia vai definhar por si mesma, com ajuda de vacinas, se não aparecer variante assassina nova. Embora não se saiba precisamente quanto, os infectados ficam imunes; a metade adulta do país deve estar vacinada até fins de julho —o vírus vai matar menos por esgotamento, pois. Até lá devem morrer mais 125 mil pessoas, por baixo. Lembram de quando o país chegou com horror a 100 mil mortes, em agosto de 2020?
Não se sabe se vai ter consequência o escândalo do orçamento “Bolsolão”, revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo. Em breve, talvez nesta semana mesmo, teremos o escândalo do desmonte da lei de licenciamento ambiental, que está para ser votada por estes dias. Daqui a mais um pouco, pode passar a lei da grilagem, presente para os amigos de Bolsonaro. Ah, já estamos esquecendo da matança do Jacarezinho, “tudo bandido”, né? Quando voltarmos a mil mortes de Covid por dia talvez se faça uma festa pela “volta à normalidade”.
Fonte:
Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/viniciustorres/2021/05/a-epidemia-vai-morrer-de-morte-morrida-nao-matada-por-acao-de-governo.shtml
Ruy Castro: Pequeno manual para a CPI
Uma sessão de CPI, em que parlamentares interrogam judicialmente um depoente, se parece com uma coletiva de imprensa, em que jornalistas fazem perguntas a uma pessoa. Em ambas, o objetivo é extrair informações. O entrevistado pode omitir ou mentir para os repórteres, porque sabe que nada lhe acontecerá. Já o inquirido pela CPI está sob juramento. É obrigado a responder a tudo e só dizer a verdade, ou sair dali preso. Mas, na prática, contando com a própria esperteza ou com o despreparo dos inquisidores, ele também omite ou mente à vontade e volta para casa assobiando.
Tanto o entrevistado como o inquirido percebem logo o que o espera. Repórteres e inquisidores vaidosos, adeptos de perguntas longas, em que uma questão vai saindo de dentro da outra —e, no fundo, respondendo-se mutuamente—, não oferecem perigo. Dão tempo para que o sujeito mastigue com calma o assunto e prepare uma resposta neutra. O que ele teme são perguntas curtas, diretas, objetivas, que não lhe deixem brecha para escapar. Ou responde e assume o risco ou mente e tenta fugir, mas isso será tão ostensivo que permitirá a quem pergunta um repique tão agudo quanto.
Nem todos os repórteres e parlamentares se dão conta de que o importante não é a pergunta, e sim a resposta. Mas, para isso, a pergunta, além de à queima-roupa, exige trabalho de casa. Perguntas sobre “o que o senhor acha” ou “sabe” sobre isso ou aquilo dão margem a vaguezas ou surtos de amnésia. A pergunta certa ainda é aquela que os antigos jornalistas aprendiam: a que começa com quem, quando, onde, como, por que e com quem —e termina por um mortífero ponto de interrogação.
Antes de perguntar, deve-se também prever uma possível resposta e preparar o repique. Nenhuma pergunta pode ficar sem resposta.
Se for para ficar, é melhor sair dali, entregar a chave ao porteiro e continuar o papo no botequim.
Fonte:
Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/ruycastro/2021/05/pequeno-manual-para-a-cpi.shtml
Bruno Boghossian: Chefe da Anvisa escancara na CPI conduta destrutiva de Bolsonaro
Antônio Barra Torres se diz amigo de Jair Bolsonaro. Nos primeiros meses da pandemia, o presidente da Anvisa frequentava o Palácio da Alvorada e aconselhava um presidente que já fazia questão de minimizar os riscos daquela crise. Agora, com o país mergulhado na tragédia, ele reconheceu que o governo levou o país pelo caminho errado.
O depoimento de Barra Torres à CPI da Covid escancara a conduta destrutiva de Bolsonaro. A comissão já esperava colher depoimentos incômodos para o presidente entre seus desafetos, como o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, mas nem mesmo um amigo foi capaz de acobertar o estrago feito até aqui.
Indicado por Bolsonaro para o comando da Anvisa, o contra-almirante disse que as declarações feitas pelo presidente sobre a vacinação vão “contra tudo” o que a agência defende. “Discordar de vacina, falar contra vacina não guarda uma razoabilidade histórica”, afirmou. “Eu penso que a população não deva se orientar por condutas dessa maneira.”
Barra Torres tem mandato na Anvisa até 2024. A estabilidade no cargo deve ter garantido tranquilidade para que ele entregasse os delitos do presidente. No depoimento, o contra-almirante disse, sem meias palavras, que a cloroquina não funciona contra a Covid-19 e confirmou que o Palácio do Planalto sediou uma reunião para tentar adequar a bula do remédio aos delírios de Bolsonaro.
Embora tenha participado de uma manifestação ao lado do presidente quando o coronavírus já circulava no país, Barra Torres criticou o incentivo a aglomerações. “[Apesar] da amizade que tenho, a conduta do presidente difere da minha nesse sentido”, declarou. “Não tem nenhum sentido do ponto de vista sanitário.”
O depoimento do amigo de Bolsonaro mostrou que o governo vai ter dificuldades para controlar os estragos que podem ser produzidos pela CPI. O futuro do presidente depende cada vez mais de puxa-sacos como Eduardo Pazuello e de uma tropa de choque bem alimentada formada por políticos do centrão.
Fonte:
Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/bruno-boghossian/2021/05/chefe-da-anvisa-escancara-na-cpi-conduta-destrutiva-de-bolsonaro.shtml