eleições 2022
Reinaldo Azevedo: Um texto em defesa do Supremo e da liberdade, ainda uma exceção
Não fosse o malhado inquérito 4.781, o país estaria à mercê de hordas que pregam abertamente a ruptura institucional
Reinaldo Azevedo / Folha de S. Paulo
Não tenho receio de um golpe de Estado. Temo um permanente estado de golpe. E isso não se esgota num jogo de palavras. Cultivamos uma certa crença mística nas nossas instituições e tardamos a reagir — refiro-me aos que pertencemos aos radares da sociedade, e a imprensa é um deles— àqueles que se organizam para assaltá-las. E noto que este texto se cingirá à democracia política. A social ainda está por ser inaugurada.
Penso no escarcéu que se fez quando, no dia 14 de março de 2019, o então presidente do Supremo, Dias Toffoli, abriu de ofício o correto e legal inquérito 4.781, que tem Alexandre de Moraes como relator. O país ainda vivia sob a égide da Lava Jato —esse “Fetiche da Destruição” que seduziu e ainda seduz tantas almas incautas—, que criou o ambiente ideal para a ascensão de um desordeiro destrambelhado.
Bolsonaro estava no poder havia menos de três meses. A reforma da Previdência chegara ao Congresso no dia 20 de fevereiro. Sem ela, os tais mercados teriam quebrado as pernas do fanfarrão antes que emitisse o primeiro insulto. A, vá lá, convergência entre os Poderes era fundamental para o mandato do próprio presidente.
Não obstante, a máquina de difamação dos Poderes e da democracia que o bolsonarismo havia montado ao longo de mais de três anos não refreou seu ânimo. Ao contrário. Ganhou musculatura. E restava evidente que, sem base parlamentar e sem articulação com atores políticos relevantes, o governo buscaria arrancar por meio do berro e da intimidação o que não conseguia por meio da negociação. Afinal, sobravam-lhe arruaceiros; faltavam-lhe interlocutores.
O Supremo se tornou o primeiro e principal alvo porque, afinal, ali estava o limite do Napoleão de hospício. Não é um Poder Moderador, mas é quem tem a última palavra sobre a Constituição. O general Augusto Heleno acredita que, acima da Carta, estão um cabo e um soldado, sem nem um jipe...
No 132º aniversário da República, nascida de um golpe, o regime de liberdade plena de organização e de manifestação no país ocupa exíguos 33 anos: da Constituição de 1988 a esta data. A crença mística a que me refiro no primeiro parágrafo, a exemplo de todas, é infundada: a liberdade plena, entre nós, é a exceção, não a regra.
Não fosse o malhado inquérito 4.781, o país estaria à mercê de hordas que hoje pregam abertamente a “ruptura institucional”, conforme mensagem que o próprio presidente mandou a seus sectários. Em 2019, a PGR, ainda sob o comando de Raquel Dodge, resolveu arquivá-lo, o que foi rejeitado por Moraes, com o apoio dos demais ministros.
Tardou para que a imprensa percebesse —e, até hoje, o reconhecimento é reticente e cheio de reservas— o que Toffoli e outros ministros do Supremo anteviram —e olhem que o então presidente do STF manteve relações cordiais com Bolsonaro: o nosso sistema de liberdades estava sob ameaça. A única barreira de contenção era o Ministério Público. E se ele não reagisse? E se a inércia, que já se verificava então, continuasse?
Infelizmente, involuiu-se para a conivência. A resposta à penúltima pergunta da entrevista concedida a esta Folha por Augusto Aras, procurador-geral da República, não faz sentido. Ainda não entendi por que Roberto Jefferson deveria ser livre para, por exemplo, incitar o assassinato de policiais, mas um colunista deveria merecer sanção legal por chamar Aras de “poste da República”. Ainda mais quando este se comporta como um poste diante de alguém que... incita o assassinato de policiais.
Com todos os defeitos —e não os terão o jornalismo, a academia e a assembleia dos santos?...—, este é um texto em defesa do Supremo. A ele coube conter os incensados arreganhos autoritários da Lava Jato, que avançou sob silêncios cúmplices, e é ele, hoje, a barreira em “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.
Vai entre aspas trecho do artigo 127 da Constituição, que define as atribuições do Ministério Público. A liberdade ainda é a exceção na nossa história. Quem se dispõe, de fato, a protegê-la, inclusive da desídia dos omissos?
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/reinaldoazevedo/2021/08/um-texto-em-defesa-do-supremo-e-da-liberdade-ainda-uma-excecao.shtml
Guedes defende PEC dos Precatórios com ameaça ao salário do funcionalismo
Ministro da Economia usa tom de ameaça para defender a aprovação da medida que permite o parcelamento por até 10 anos de dívidas judiciais da União. Para analistas, proposta é inconstitucional, e governo tem outras saídas para obter recursos
Rosana Hessel / Correio Braziliense
Enquanto o pessimismo no mercado cresce, e a desconfiança faz o dólar ficar acima de R$ 5,40, o ministro da Economia, Paulo Guedes, resolveu fazer ampla defesa da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios, a PEC 23/2021, e partiu para ameaça. Segundo ele, vai faltar dinheiro até para pagar salários dos servidores se a medida polêmica não for aprovada.
Os precatórios são dívidas judiciais do governo, em relação às quais não cabe mais recurso. Logo, o adiamento dessa despesa obrigatória é vista por especialistas como calote ou pedalada. Mas, segundo o ministro, o volume previsto para o Orçamento de 2022 foi inesperado e vai impedir o governo de cumprir outras despesas obrigatórias, porque ficou acima dos R$ 57,8 bilhões previstos e chegou a R$ 89,1 bilhões.
“Vai faltar para todos, inclusive, para salários”, disse Guedes, ontem, em audiência pública da Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal. Ele disse que essa despesa é “inexequível” e, com as leis vigentes, “vai parar Brasília”.PUBLICIDADE
A Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado Federal, aponta riscos e afirma que a PEC burla o teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior — e diminui a transparência das contas públicas.
A PEC foi a saída que a equipe econômica encontrou para abrir espaço no Orçamento de 2022 para dar espaço para o programa social do presidente Jair Bolsonaro, o Auxílio Brasil, que ainda não tem valor definido. Assim, a ameaça de Guedes sobre os salários foi vista como destituída de fundamento.
De acordo com o especialista em contas públicas Leonardo Cezar Ribeiro Novo, economista do Senado Federal, a posição de Guedes não se sustenta do ponto de vista técnico. “A União não sofre as mesmas restrições de financiamento observadas em governos subnacionais. Pode emitir dívida e tem o Banco Central depositando bilhões na conta única do Tesouro. O problema, na verdade, envolve governança fiscal e teto de gastos. Essa coisa de falar que vai faltar dinheiro só coloca cortina de fumaça numa discussão que deveria ser tratada com seriedade”, alertou.
A PEC 23 prevê o parcelamento de precatórios com valores superiores a R$ 66 bilhões por 10 anos e uma correção pela taxa básica de juros (Selic), em vez da inflação — alterando índices de correção já definidos na Justiça, uma das inconstitucionalidades apontadas por Eduardo Gouvêa, presidente da Comissão de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Segundo ele, a PEC fere oito artigos da Constituição e ainda poderá gerar, em 10 anos, um saldo de R$ 1 trilhão de passivos acumulados.
“O governo quer parcelar R$ 40 bilhões por ano que, somados com os anos seguintes, os juros e correção, vão virar uma bola de neve impagável”, alertou. Para Gouvêa, a declaração do ministro sobre os salários não se sustenta, porque é uma “estratégia pobre”.
Apesar de o ministro e da equipe econômica alegarem que não era possível prever o aumento expressivo no volume de precatórios, faltou planejamento e uma estratégia de negociação com os credores, de acordo com Gouvêa. Ele destacou que o governo precisa negociar e há alternativas melhores à PEC, como a compensação fiscal de estados e municípios, que estão entre os maiores credores dos precatórios.
Folga menor
O Ministério da Economia precisa enviar ao Congresso o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2022 e a previsão para o pagamento de sentenças judiciais deverá consumir a totalidade da folga de R$ 30,4 bilhões prevista pela pasta no limite para o cumprimento do teto de gastos.
Essa folga está encolhendo por conta da alta da inflação, devendo ficar abaixo de R$ 20 bilhões, pelas estimativas de economistas. Com a aprovação da PEC, o governo prevê um espaço adicional de R$ 33,5 bilhões.
Por conta disso, Guedes buscou priorizar as negociações sobre a PEC nesta semana e escolheu falar do assunto em uma audiência do Senado sobre Mercosul. Enquanto isso, não consegue emplacar a reforma do Imposto de Renda, o PL 2337/2021, que, após as mudanças feitas na Câmara, não deverá aumentar receita para o governo, e tem dividido opiniões entre os técnicos da pasta.
A falta de consenso na base aliada tem travado a tramitação do PL. “A posição da Economia é sempre a posição do governo”, disse o líder do governo na Câmara dos Deputados (PP-PR), Ricardo Barros, ao ser questionado se a Economia vai priorizar a PEC dos precatórios.https://c0a0ee6f920fb22972aacea674590856.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html
Na reforma do IR, o ministro tem como principal bandeira a taxação de dividendos em 20%. Diante da falta de respaldo dos aliados, Guedes partiu para negociar com oposicionistas. Ele telefonou para o líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), e marcou um encontro para a próxima terça-feira. O parlamentar pretende levar propostas de mudanças no PL 2337 ao ministro.
“Queremos uma reforma tributária que faça justiça fiscal no Brasil, que alivie o peso que as classes populares e a classe média carregam e cobre mais dos super-ricos”, disse Molon. Segundo ele, a proposta precisa reduzir as desigualdades e incentivar o desenvolvimento e a geração de emprego. “Se conseguirmos garantir isso no texto-base, vamos apoiar. Não somos a oposição do quanto pior, melhor. Queremos contribuir para o país sair da crise e voltar a crescer”, acrescentou.
R$ 89,1 bilhões
Valor dos precatórios com pagamento previsto para 2022
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AGU tenta suspender pagamentos a estados
A Advocacia-Geral da União (AGU) pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que suspenda a ordem dada ao governo para pagar dívidas judiciais com estados relativas a repasses do Fundef, fundo para o desenvolvimento do ensino fundamental e valorização do magistério que vigorou até 2006. O órgão também solicitou ao presidente do STF, Luiz Fux, que abra uma conciliação sobre o tema.
O pedido foi feito no âmbito de uma Ação Cível Originária (ACO) movida pelo Estado da Bahia, que tem R$ 8,767 bilhões a receber do governo federal em 2022. Mas a própria AGU já antecipou no documento que vai ingressar com solicitações semelhantes em outras três ações, movidas por Pernambuco, Ceará e Amazonas. Ao todo, o pedido alcançará R$ 15,6 bilhões em precatórios previstos no Orçamento do ano que vem.
Caso Fux aceite o pedido, União e Estados poderão negociar um acordo para o pagamento do passivo do Fundef, após a Corte ter reconhecido que os repasses foram subestimados no passado. A conciliação abriria caminho a uma possibilidade de parcelamento amigável da dívida.
A medida adotada pela AGU é mais uma investida do governo para tentar conter o “meteoro” de dívidas judiciais previstas para 2022. O termo foi usado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para se referir à fatura de R$ 89,1 bilhões em precatórios calculada para o ano que vem.
O crescimento expressivo dessa conta (61% ante 2021) ocupou todo o espaço que a equipe econômica tinha dentro do teto de gastos (a regra que limita o avanço das despesas à inflação) para ampliar o Bolsa Família — medida que é uma peça-chave nos planos do presidente Jair Bolsonaro para concorrer à reeleição.
Ao pedir a suspensão da expedição do precatório em favor da Bahia, a AGU argumentou que apenas quatro dívidas do Fundef autuadas em junho de 2021 pelo STF somam R$ 15,6 bilhões. O órgão jurídico cita considerações feitas pela Secretaria de Orçamento Federal (SOF) do Ministério da Economia para dizer que isso corresponde a 26% do total de precatórios apresentados contra a União para previsão no Orçamento de 2022.
A única regra de parcelamento prevista hoje na Constituição diz que um precatório que represente sozinho 15% da dívida total naquele ano pode ser pago em prestações. Na prática, é muito difícil um único débito atingir esse valor. Por isso, a AGU apresentou o argumento de que o tema do Fundef, de forma global, preenche o requisito atual de parcelamento. A AGU também cita que a legislação permite acordos diretos para pagamento de precatórios.
“O problema, na verdade, envolve governança fiscal e teto de gastos. Essa coisa de falar que vai faltar dinheiro só coloca cortina de fumaça numa discussão que deveria ser tratada com seriedade”
Leonardo Cezar Ribeiro Novo, economista do Senado Federal
Críticas ao Mercosul
O ministro da Economia, Paulo Guedes, não poupou críticas ao Mercosul e defendeu a modernização do bloco para avançar na redução de 10% da Tarifa Externa Comum (TEC), cobrada na importação de produtos de fora da região. Para ele, essa redução tem que ocorrer o quanto antes, porque vai ajudar o governo a combater a inflação.
“A inflação está subindo. A abertura vai começar e esses 10% são só o primeiro passo. É uma atitude de respeito à indústria nacional, que vai levantar e ir para a esteira, e não ficar sentada”, disse Guedes, ontem, durante audiência pública da Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal. “Interessa ao brasileiro comprar carro mais barato, mas vamos fazer a abertura com equilíbrio”, disse. Em resposta aos que defendem o protecionismo, Guedes disse que esse pequeno passo em direção à abertura comercial “não deve assustar ninguém”.
No entanto, não há consenso entre os demais países do bloco sobre a redução da TEC proposta pelo Brasil. A Argentina é contra e, segundo ele, o Uruguai apoia, o Paraguai ainda “está em cima do muro”, mas deve acompanhar o Brasil. Para o ministro, o Mercosul precisa ampliar o número de acordos, principalmente com Oriente Médio e Ásia, onde há o maior fluxo de crescimento econômico e de riquezas.
“Não é o Brasil que tem que ficar onde o Mercosul está. O Brasil é muito grande e não pode ficar preso por falta de compreensão dos parceiros que estão incomodados”, afirmou. Segundo ele, a Argentina não está no momento aceitando reduzir tarifas. “Compreendemos e aceitamos. E flexibilizamos. Não podemos aceitar sermos prisioneiros de uma armadilha de governos ideológicos. Hoje, o Mercosul não está entregando as expectativas de que nós precisamos”, acrescentou.
Dólar chega a R$ 4,42
Sob o mau humor generalizado que atingiu os principais ativos do exterior, e refletindo a insegurança com os rumos da política fiscal do governo Bolsonaro, o mercado brasileiro teve ontem um dia de turbulência e de contrastes. O dólar voltou a subir com força, chegou a bater em R$ 5,45 e fechou cotado a R$ 5,423 para venda, um avanço de 0,89%. Na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), o Ibvespa, principal indicador do pregão, conseguiu fechar em alta de 0,45%, após várias sessões de queda, marcando 117.164 pontos. O indicador passou a acumular perda de 3,32% na semana, de 3,81 em agosto e de 1,56% no ano
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2021/08/4944833-guedes-defende-pec-dos-precatorios-com-ameaca-ao-salario-do-funcionalismo.html
Luiz Carlos Azedo: A crise não viaja
Bolsonaro está em guerra com o Judiciário, que pretende subjugar. Primeiro, nomeando aliados; segundo, pelo confronto com o Supremo, que pretende intimidar
Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense
Toda vez que o presidente José Sarney viajava para o exterior, o então senador Fernando Henrique Cardoso dizia, maledicente: “A crise viajou”. Mais tarde, viria a exercer dois mandatos na Presidência, passando também por seus dissabores. Hoje, os ex-presidentes têm bom relacionamento, mas jamais se tornaram amigos. O presidente Jair Bolsonaro, porém, viaja muito pouco para o exterior. Ninguém o convida para compromissos bilaterais, e sua ida aos foros internacionais são puro desgaste, pela péssima imagem que tem no exterior. Com ele, a crise não viaja.
Políticas interna e externa não são assimétricas; quando isso ocorre, pode terminar muito mal, como no caso do governo de Jânio Quadros, cujo cavalo de pau no Itamaraty, ao condecorar Che Guevara em plena Guerra Fria, deixou-o em rota de colisão com os aliados, principalmente Carlos Lacerda, então governador da antiga Guanabara. Essa crise resultou na sua inopinada renúncia. A longo prazo, os eixos duradouros da política externa são as relações comerciais e a identidade nacional, muito mais do que a momentânea orientação política de governo. Hoje, a divisão internacional do trabalho nos reserva papel estratégico como produtor agrícola e de minérios e faz da China nosso principal parceiro comercial; em contrapartida, do ponto de vista identitário, o americanismo se amalgama à herança cultura ibérica, o que nos afasta do velho nacionalismo latino-americano.
Entretanto, politicamente, vivemos um ponto fora da curva no governo Bolsonaro. O presidente da República atua para nos colocar no eixo de países cujos governantes foram eleitos em pleitos manipulados, seja pelas regras do jogo, seja pelo controle dos meios de comunicação e/ou pela intimidação da oposição. Como o presidente da Federação Russa, Vladimir Putin, que ao assumir não tinha uma estratégia, Bolsonaro se movimenta exclusivamente para continuar no poder, com a diferença de que o líder russo sempre manteve alta popularidade, enquanto a sua derrete. Controle das Forças Armadas, dos serviços de segurança, do Ministério Público, do Judiciário; aliança com oligarcas amigos e
com a Igreja Ortodoxa Russa garantem a longa permanência de Putin no poder.
Controlar o Judiciário é uma via de passagem para o autoritarismo. Na Hungria de János Áder, no poder desde 2012, juízes foram forçados a renunciar, e o regime fez 1.284 nomeações políticas. Os que sobraram perderam autonomia. Aqueles que permaneceram em suas funções tiveram sua autonomia confrontada. Na Turquia, 4,5 mil juízes foram presos e espoliados, nos últimos cinco anos, pelo governo de Tayyip Erdogan. Centenas continuam presos.
O atual presidente da Polônia, Andrzej Duda, do Partido Lei e Justiça, para se reeleger, gastou 40 milhões de euros com uma rede de fake news contra o Judiciário, com apoio do Ministério da Justiça e do Ministério Público. Essas denúncias são do presidente da Associação Europeia de Juízes, José Igreja Matos, desembargador na cidade do Porto, em palestra virtual para magistrados brasileiros, segundo nos relata a jornalista Maria Cristina Fernandes, em sua coluna de ontem, no Valor Econômico.
Supremo
Esse é o eixo de extrema-direita ao qual pertence Bolsonaro, depois da derrota do ex-presidente Donald Trump, nos Estados Unidos, e do ex-primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, em Israel. Com nenhum desses países, inclusive a Rússia, o Brasil tem relações comerciais robustas para sustentar essa política externa. Mas o que importa é o modelo. Bolsonaro está em guerra com o Judiciário, que pretende subjugar.
Primeiro, nomeando aliados para cargos estratégicos, como o procurador-geral da República, Augusto Aras, que pretende reconduzir, e o ex-advogado-geral da União e pastor evangélico André Luiz de Almeida Mendonça, indicado para a vaga do ex-ministro Marco Aurélio Mello no Supremo Tribunal Federal (STF). Ambos serão sabatinados no Senado, que pode homologar ou não seus nomes. É do jogo.
Segundo, pelo confronto com o STF, que pretende intimidar com a ameaça de um golpe de Estado. Não é do jogo. A cassação de Hermes Lima, Evandro Lins e Silva e Victor Nunes Leal pelo regime militar, que provocou a renúncia dos ministros Antônio Carlos Lafayette de Andrada e Antônio Gonçalves de Oliveira, é um trauma no Supremo até hoje. Em 1971, o ministro Adaucto Lúcio Cardoso abandonou o plenário ao ser o único contrário à lei da censura prévia, editada pelo governo Médici. A regra permitia que censores ocupassem as redações dos jornais e vetassem a publicação de textos. Votou contra e renunciou ao cargo.
Mercado já começa a falar em desembarque do governo Bolsonaro
Analistas têm precificado as dificuldades impostas pelo risco de uma deterioração do quadro fiscal
Douglas Gavras e Isabela Bolzani / Folha de S. Paulo
O risco de um descontrole fiscal com aumento de gastos e perspectivas cada vez mais duras para a economia no ano que vem encontraram eco em uma piora do cenário externo, e o mercado já começa a falar em desembarque do governo de Jair Bolsonaro (sem partido).
Para ficar em uma figura de linguagem cara ao presidente, é como se o casamento do governo com os investidores estivesse mais próximo do divórcio do que da lua de mel.
Não é de hoje que os analistas têm precificado as dificuldades impostas pelo risco de uma deterioração do quadro fiscal, com a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos precatórios, e a inflação mais alta do que se antecipava.
Também pesa a crise política gerada pela tentativa de reeleição do presidente, que tem colocado em descrédito o processo eleitoral e confrontado ministros do Supremo Tribunal Federal.
As preocupações dos investidores já se refletem na Bolsa de Valores brasileira e na cotação do dólar.
Nos mercados de renda variável, o Ibovespa, principal índice acionário do país, que até a última sexta-feira (13) acumulava um ganho de 1,83%, reverteu o sinal ao longo desta semana, apesar da alta registrada nesta quinta-feira (19). Agora, o índice acumula uma perda de 1,56% desde o início do ano. Só nesta semana, o Ibovespa acumula uma queda de 3,32%.
O dólar encerrou a sessão desta quinta em alta de 0,87%, a R$ 5,4220. Na semana a moeda americana sobe 3,4%. No ano a alta é de 4,5%.
No exterior, parte da explicação para a piora das expectativas em relação à retomada da economia em um cenário pós-pandemia veio de dados fracos da China e dos Estados Unidos, desde a última segunda-feira (16).
O temor de um retrocesso econômico ganhou ainda mais força na terça (17), quando os Estados Unidos também reportaram dados aquém das expectativas: uma queda de 1,1% nas vendas do varejo em julho, ante a estabilidade esperada pelo mercado.
Outro ponto de influência nos mercados foi a ata da última reunião de política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Nela, a autoridade monetária sinalizou que o patamar de desemprego para que o suporte à economia seja reduzido pode ser atingido neste ano.
Essa desaceleração no ritmo dos estímulos dados pelo Fed à economia americana, na prática, também pode refletir em um aumento das taxas de juros nos Estados Unidos –o que, para o Brasil e os mercados emergentes, pode significar menos investimento.
No cenário interno, a percepção é de incerteza e insegurança, que tendem a aumentar caso o governo não sinalize um comprometimento com as regras fiscais, aumente gastos e mantenha um ambiente de confronto com as instituições até a eleição de 2022.
Um sintoma disso é que as curvas de juros futuros para cinco e nove anos voltaram a atingir os dois dígitos nesta semana, recuperando patamares de três anos atrás.
A deterioração da confiança do mercado no governo é visível e muitos já compreendem que a busca por uma reeleição por parte do presidente seria bastante preocupante do ponto de vista da agenda econômica, avalia a economista Zeina Latif.
"Às vezes, há um acúmulo de notícias negativas, mas o mercado demora a reagir por falta de um gatilho. Agora, esse gatilho veio lá de fora, com o Fed e um cenário externo não tão confortável, com a China desacelerando e o impacto nos preços de commodities. Isso acaba forçando o mercado a reavaliar o cenário interno", explica.
Segundo ela, cada vez mais o Brasil será afetado por ondas de volatilidade e, se antes o mercado apostava muito no governo Bolsonaro, hoje certamente não é assim. "É difícil falar sobre o mercado como uma entidade de opinião única, mas eu diria que antes havia mais unanimidade, como em 2018, e isso não existe agora.
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, é ainda mais enfático ao afirmar que o mercado já não espera que o governo entregue algo de relevante até as eleições do ano que vem.
Ele considera que o governo perdeu as condições de colocar em prática a política econômica às vésperas de uma disputa eleitoral que deve ser muito tensa. Essa combinação é ruim para o mercado, diz, e a taxa de câmbio deve continuar subindo, colocando pressão sobre a inflação e os juros.
Com um discurso golpista, o presidente acaba prejudicando a imagem do país e a capacidade do investidor de fazer negócios, diz Vale. "O governo Bolsonaro, nesse sentido, acaba sendo pior que o da ex-presidente Dilma Rousseff. As dificuldades econômicas de agora são similares ao que havia no fim do governo da petista, só que com riscos institucionais que não existiam", afirma.
"Hoje, com Bolsonaro criando crises, trazendo riscos fiscais crescentes e com a falta de equilíbrio na política, o mercado gradativamente vai abandonar o governo, o que já está acontecendo."
Ele ressalta que a perda de paciência com Bolsonaro não significa um embarque na candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que hoje lidera as pesquisas eleitorais. O mercado, na verdade, deve manter a expectativa por uma terceira via em 2022, aponta.
Há também um desconforto entre os analistas, ao avaliarem que muitas das medidas propostas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, não avançaram ou tiveram dificuldades para sair do papel. A reforma mais relevante até agora, a da Previdência, é vista como um esforço do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (sem partido-RJ).
"Com Arthur Lira [PP-AL], só temos tido bola fora, do ponto de vista fiscal. A reforma tributária que está se discutindo agora, por exemplo, é muito ruim. O mercado percebe que o governo e o ministro da Economia não são funcionais e esse elemento ajuda no desembarque", diz Vale.
O economista avalia que só ocorreria um reembarque do mercado se houvesse sinal por parte do Executivo de mudança da trajetória de gastos. "Talvez não tenha mais volta."
Para o ex-diretor do Banco Central e consultor da Schwartsman e Associados, Alexandre Schwartsman, apesar de vários alertas, o mercado ignorou os riscos domésticos, por estar surfando na onda de uma enorme liquidez mundial, que elevava o preço dos ativos. "Agora que há risco de o cenário mudar lá fora, os problemas domésticos ficaram à vista."
Ele acrescenta que é preciso diferenciar o mercado das pessoas que atuam nele, ao medir as chances de uma retirada do suporte dado ao governo.
"O mercado, em si, vende ativos sem dó e, portanto, pode-se dizer que já desembarcou. Sobre as pessoas, algumas já soltaram a mão do governo, como os manifestos recentes sugerem; outras, porém, há pouco erigiam estátuas em homenagem ao ministro Paulo Guedes."
Sob condição de anonimato, o economista de uma grande gestora de investimentos lembra que
o mercado sempre espera que o governo proponha boas reformas. O fato, diz esse economista, é que hoje os investidores estão céticos com a aprovação de medidas importantes até o final deste mandato, e agora começam a sentir os efeitos dos ruídos eleitorais e fiscais.
Ele também avalia que não havia como prever a proposta de adiamento no pagamento dos precatórios, por exemplo, nem o tamanho exato da pressão que haveria do Executivo para aumentar os gastos no ano que vem. Ainda segundo esse economista, o que o mercado vê hoje é que essa pressão é muito maior do que se imaginava.
Os precatórios são dívidas do governo reconhecidas pela Justiça. O ministro Paulo Guedes e sua equipe têm elevado a pressão no Congresso sobre os efeitos no Orçamento do ano que vem, caso o parcelamento das dívidas de precatórios não seja autorizado.
“Estávamos vindo de uma situação fiscal que trazia notícias positivas para o curto prazo, com uma redução da dívida pública, uma arrecadação mais forte e a volta da atividade. Mas todo o bom humor virou quando surgiu a questão do aumento da provisão de pagamento dos precatórios para o ano que vem”, diz a chefe de economia da Rico, Rachel de Sá.
Para o economista-chefe da Necton, André Perfeito, se o Banco Central conseguir ajustar a curva de juros para algo mais razoável, isso pode resolver parte dos problemas. "Mas o mercado já entende que as necessidades políticas e eleitorais do presidente estão cobrando um preço alto demais na disciplina fiscal."
Para parte dos investidores, a PEC dos precatórios é um desrespeito, e o mercado entende que a agenda que se imaginava no começo do governo não vai mais ser aprovada. "Mas isto é uma fotografia do momento. O rei está nu agora, mas pode voltar a se vestir", pondera o economista.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/08/desconfianca-cresce-e-mercado-ja-comeca-a-falar-em-desembarque-do-governo-bolsonaro.shtml
Merval Pereira: Esses tempos estranhos
Merval Pereira / O Globo
A reunião do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com os representantes de plataformas digitais como Facebook, YouTube, Instagram, Twitter e outras, para definir regras de pagamento a sites e plataformas durante o período eleitoral com o objetivo de evitar a propagação de fake news, deveria estabelecer critérios mais rígidos de monetização das notícias também em tempos além do eleitoral.
Me incomodou a decisão do corregedor-geral do TSE, ministro Luiz Felipe Salomão, de proibir o pagamento de qualquer notícia divulgada por canais bolsonaristas, com a intenção de cessar o financiamento dos blogs que espalham notícias falsas com objetivos políticos.
A “imprensa marrom” existe muito antes das redes digitais e deve ser combatida com a legislação existente quando calunia, difama e constrange cidadãos ou instituições, ou quando espalha boatos com a intenção de obter lucros econômicos ou políticos.
A expressão surgiu no fim do século XIX e vem do inglês “yellow press” (“jornalismo amarelo”). Os jornais New York World e The New York Journal disputavam as aventuras de Yellow Kid, a primeira história em quadrinhos. Uma disputa tão pesada que o amarelo passou a designar publicações sensacionalistas e sem ética.
A cor para identificar uma imprensa inescrupulosa passou a ser “marrom” no Brasil em 1959, na redação do jornal carioca Diário da Noite. Para noticiar um escândalo internacional da época, a manchete se referia à “imprensa amarela”, como nos jornais dos EUA, mas o editor achou que amarelo é uma cor muito alegre para classificar notícias escandalosas. Mudou para “marrom”, cor de excrementos.
Não é diferente com os meios digitais, com exceção do fato de terem alcance muito maior. O pagamento por visualizações, pelo número de seguidores, adotado por todas as plataformas, faz com que o noticiário digital perca credibilidade a cada dia, embora alcance um número altíssimo de pessoas e tenha efeito deletério nas relações sociais e políticas.
Mas punir os que espalham fake news com intervenção nas mídias sociais ou o bloqueio de financiamento não me parece o melhor caminho. A não ser que o governo subvencione canais ilegítimos. Críticas, por mais abusivas que sejam, devem ser aceitas como parte da vida democrática. Somente as ameaças físicas a cidadãos, não apenas a autoridades, como os ministros do STF, ou antidemocráticas a instituições deveriam ser interrompidas por uma intervenção fora dos processos cíveis ou criminais.
Outra coisa que é preciso rever é a análise por órgãos não especializados de questões complexas. A Polícia Federal descobriu a pólvora ao explicar que o noticiário desses blogueiros tornou-se uma máquina de ganhar dinheiro e que as notícias são replicadas inúmeras vezes para ter maior alcance e ser recompensadas devido à audiência pelas plataformas digitais. Ora, esse é o sistema adotado por esses novos meios, que realmente estimula notícias escandalosas e propagação de fake news, não apenas políticas ou econômicas.
O que seria preciso mudar é o conceito das plataformas digitais, que só buscam audiência, sem cuidar do que é divulgado. Os influenciadores que têm milhões de seguidores e recebem por isso podem ser inofensivos se tratam de assuntos de interesse geral. Mas esse sistema de pagamento para notícias políticas e econômicas precisa ser alterado.
Exemplo escandaloso de decisão jurídica inepta, sem base científica, é a da subprocuradora Lindôra Araújo sobre o não uso de máscara por parte do presidente Bolsonaro. Numa demonstração clara de que a Procuradoria-Geral da República sob Augusto Aras há muito perdeu sua função básica de defesa dos interesses da sociedade, ela não viu indícios de crime nas constantes aglomerações que Bolsonaro promove, sem máscara, pelo país inteiro. E divide a culpa com a população que acorre às aparições do presidente.
Contrariando todas as instruções médicas, nacionais e internacionais, ela diz que “há incerteza sobre o grau de eficiência do equipamento”. De maneira ridícula, alega que o presidente “não foi notificado a usar o equipamento” em suas viagens, como se fosse lícito a alguém argumentar que desconhece tal lei ao cometer uma infração. Tanto ela quanto Aras merecem ser processados.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/merval-pereira/post/esses-tempos-estranhos.html
Bolsonaristas apagam mais de 200 vídeos atacando urna após TSE bloquear verbas
Decisão do TSE contra a monetização de propagadores de mensagens falsas sobre as eleições atinge perfis ligados a 11 influenciadores digitais
Marlen Couto / O Globo
Ao menos 25 canais no YouTube alinhados ao presidente Jair Bolsonaro apagaram ou tornaram privados 263 vídeos com ataques às eleições brasileiras e a autoridades da Justiça Eleitoral e do Tribunal Superior Eleitoral (STF) nos últimos dias. A limpeza ocorreu após a decisão do ministro Luis Felipe Salomão, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que suspende os repasses de recursos financeiros de plataformas digitais a canais investigados por propagar desinformação sobre o processo eleitoral.
Leia também: Entre omissão e contradições da PGR, entenda as pressões sofridas por Aras
O monitoramento foi feito pela empresa de análise de dados Novelo Data, que filtrou as publicações a partir de palavras-chave para chegar aos números, como os nomes dos tribunais e de seus ministros, além de referências às urnas eletrônicas.
Na lista estão dois canais ligados ao youtuber bolsonarista Fernando Lisboa, conhecidos como Vlog do Lisboa, que foram alvos da determinação do TSE e somam mais de 800 mil seguidores. Foram excluídos dois vídeos, um deles com referências à live de Bolsonaro com alegações falsas de fraude nas urnas que levou o presidente a ser investigado e outro vídeo intitulado "Lula só GANHA com Fraude nas Urnas".
O canal com maior número de vídeos excluídos é o do youtuber Gustavo Gayer, com 59 postagens. A conta tem quase 500 mil inscritos e já teve postagens removidas pelo próprio YouTube por disseminar notícias falsas sobre a pandemia e apareceu no relatório enviado pela plataforma à CPI da Covid, em junho, como o segundo canal que mais arrecadou com monetização de vídeos desinformativos, com R$ 40,7 mil.
Uma das postagens de Gustavo Gayer excluídas era uma live feita no início de agosto com a também youtuber bolsonarista Camila Abdo, do canal Direto aos Fatos, também atingida pela desmonetização determinada pelo ministro Salomão. O tema discutido foi a proposta de impressão do voto que acabou rejeitada na Câmara. Gayer foi candidato a prefeito em Goiânia no ano passado pelo partido Democracia Cristã (DC), mas não foi eleito.
Outro canal que apagou postagens foi o "O Jacaré de Tanga", que tem mais de 1,2 milhão de inscritos e é mantido por Felipe Lintz, ex-candidato a prefeito de Mogi das Cruzes, em São Paulo, pelo PRTB. O perfil é alvo das apurações da CPI das Fake News no Congresso. Autointiulado "defensor de Deus, pátria e família", Lintz exibe fotos ao lado de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) nas redes sociais. Ao todo 26 vídeos do "O Jacaré de Tanga" foram tirados do ar ou colocados em modo privado.
Crise: Ciro Nogueira se encontra com Luiz Fux e fala em ‘harmonia entre os Poderes’
Guilherme Felitti, da Novelo Data, destaca que canais bolsonaristas que difundem desinformação costumam remover vídeos nos dias seguintes a ações de instituições como o TSE, o STF e a Polícia Federal:
— Foi assim quando a PF fez a primeira ação do inquérito de fake news do STF em junho de 2020, foi assim quando o STF ordenou a prisão do deputado Daniel Silveira em fevereiro de 2021 e foi assim também quando Roberto Jefferson foi preso e o TSE vetou a monetização dos canais em um espaço de poucos dias.
Como mostrou o GLOBO, a decisão do corregedor do TSE contra a monetização de propagadores de mensagens falsas sobre as eleições atinge perfis ligados a 11 influenciadores digitais, além três veículos de mídia (Terça Livre, Folha Política e Jornal da Cidade Online) e um movimento político (Nas Ruas) apoiadores de Bolsonaro. A maior parte dos alvos da decisão pela suspensão de repasses de verbas publicitárias pelas redes sociais já era investigada no inquérito sobre a organização de atos antidemocráticos aberto no ano passado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes.
Segundo a Polícia Federal, os perfis alvos da decisão integram uma rede organizada para estimular a polarização do debate político, especialmente com o impulsionamento de mensagens falsas sobre fraudes no sistema eletrônico de votação.
*Título do texto original foi alterado para publicação no portal da FAP
Rosângela Bittar: Angústia
Convém deixar que Bolsonaro se enrole na sua própria teia e consuma seu próprio veneno
Rosângela Bittar / O Estado de S. Paulo
O clima de Brasília está irrespirável. O ambiente funde o medo da morte, impregnado na nova expansão da pandemia descontrolada, com o desvario constante do homem que domina os palácios da capital. A cidade se transformou, desde o início, em campo de provas da negação da ciência, da vida e do bom senso. Um novo apocalipse.
Falsidades e mentiras são multiplicadas a cada dia da gestão Jair Bolsonaro. O presidente insiste em atacar, violentar, agredir, instituições e pessoas. Convém deixar que se enrole na sua própria teia e consuma seu próprio veneno. O que importa verdadeiramente é a sobrevivência dos cidadãos.
Pode-se listar as manobras rocambolescas de Bolsonaro:
1 - O pedido de impeachment dos ministros do Supremo não se deve a uma solidariedade fraternal ao ex-deputado preso Roberto Jefferson. Afinal, até o presidente sabe que não foi mera liberdade de expressão o que ele cometeu. A série de fotos e desaforos do ex-deputado, armado até os dentes, ameaçando autoridades, pelas redes sociais, não deixa dúvidas. Os provocadores, porém, aos ouvidos de Bolsonaro, o lembraram que, depois de Jefferson, o próximo alvo seria Carlos Bolsonaro.
2 - Ao reagir furioso ao encontro do ministro Luís Roberto Barroso com o vice-presidente Hamilton Mourão, Bolsonaro deu curso a seu traço marcante, de aplicar a tudo a teoria da conspiração. Avaliou que tal reunião se destinava a tramar sua derrubada da Presidência, deixando o poder com o vice. Foi do que se queixou, sem meias-palavras, a membros do Judiciário.
3 - A insistência com que repete que não haverá eleição no ano que vem, ameaça respaldada pelo general-ministro da Defesa, não define como e com quem dará o golpe. Um novo AI-5? Como ficariam os mandatos dos deputados e senadores? Os governadores terão seu tempo prorrogado? O Centrão, que se alimenta de eleições, concordará em extingui-las?
Com estas e muitas outras imprecisões e omissões, Bolsonaro conseguiu desviar a atenção do desastre do seu governo. Em todas as áreas, mas, em especial, na gestão da pandemia, que não acabou. Embora tenha se tornado tão incômoda aos seus planos eleitorais que o presidente nem sequer menciona mais a sua querida cloroquina.
A mobilização da sociedade está sendo insuficiente para conter as sucessivas ondas de insegurança geradas em cada palavra, gesto ou movimento do presidente.
Assim, o País precisa voltar ao que interessa, ao foco do qual o presidente quer desviar a atenção do eleitorado.
A constante morte de famosos lembra que a pandemia persiste e exige novas ações de combate. Outros países mais bem posicionados que o Brasil no enfrentamento da crise já estão retomando mecanismos extremos, como o lockdown. A pandemia se mostra viva e mutante. Até tirou a máscara do quarto ministro da Saúde do governo Bolsonaro, Marcelo Queiroga.
Posando de bom moço que nada devia à sociedade pelos malfeitos de seus antecessores, Queiroga entrou firme na campanha eleitoral da reeleição. Até transgrediu o plano nacional de imunização, reduzindo as doses de vacina devidas proporcionalmente a São Paulo. Mesquinharia incompatível com a gravidade da situação e mais uma questão para a Justiça arbitrar.
Ocupado apenas com seu destino e seu previsível fim, Bolsonaro inventa um enredo em que ele mesmo é o mocinho, o bandido, o padre, o pastor, o médico, o juiz de paz, o prefeito, o governador e a tropa de ataque à cidadela sitiada.
O que é mais mortal? Este Bolsonaro ou o coronavírus? A doença, é verdade, aproveita-se das populações mal governadas e abandonadas à própria sorte. Mas as instituições também precisam ampliar o seu papel de resistência. As convulsões diárias do faroeste bolsonarista não merecem tanta atenção.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,angustia,70003813898
Pacheco, Lira e Nogueira dizem a Bolsonaro o que ele não quer ouvir
O presidente do Senado é o único que poderá largar Bolsonaro de mão. Os outros querem um pouco de paz para tocar seus negócios
Blog do Noblat / Metrópoles
Rodrigo Pacheco (DEM-MG), presidente do Senado, Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados e Ciro Nogueira (PP-PI), chefe da Casa Civil da presidência da República, disseram a Jair Bolsonaro nas últimas 48 horas que sua situação está ficando cada vez mais difícil dentro e fora do Congresso.
E que a continuar assim ou até piorar, ficará complicado para eles ajudar o governo como gostariam e se dispuseram a fazer até agora. Um deles citou a mais recente pesquisa de opinião XP-Ipespe divulgada ontem. Ela mostra que Bolsonaro seria derrotado no segundo turno por qualquer um dos nomes testados.
Perderia não só para Lula (PT) como também para Ciro Gomes (PDT), Sérgio Moro, Luiz Henrique Mandetta (DEM), João Doria (PSDB) e até Eduardo Leite (PSDB), governador do Rio Grande do Sul, um ilustre desconhecido fora do seu Estado. 61% dos brasileiros dizem que jamais votariam em Bolsonaro.
A pesquisa trouxe outros dados que deveriam preocupar Bolsonaro como preocupam seus aliados. A avaliação positiva do seu governo segue em queda. A vacinação em massa aumentou a avaliação positiva dos governadores (de 36% para 43%) e dos prefeitos (de 45% para 55%), mas diminuiu a dele (de 22% para 21%).
Em julho, 59% dos brasileiros diziam que a economia estava no rumo errado, contra 29% que diziam que estava no rumo certo. Agora, 63% disseram que está no rumo errado, contra 27% que a julgam no rumo certo. 57% estão convencidos de que o governo se envolveu com corrupção. 67% acompanham a CPI da Covid.
Não se sabe o que Bolsonaro respondeu aos três suplicantes que bateram à sua porta com ar grave. Mas o que lhes disse não importa. Quantas vezes ele já não deu o dito pelo não dito, recuou mais tarde para novamente avançar. Quem o contraria não é ouvido com atenção e arrisca-se a deixar de ser ouvido.
Quando cobrado por decisões erradas do seu pai ou declarações estapafúrdias, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) costuma responder:
– Fui voto vencido.
Os suplicantes podem suplicar à vontade – Bolsonaro sabe que eles não o abandonarão para não perder o poder que têm. Lira é dono de um pedaço do Orçamento da União para administrar como quiser. Nogueira ocupa o segundo cargo mais importante do governo e livrou-se de ter que disputar o governo do Piauí.
Quanto a Pacheco… Confessa a amigos que está achando “danado de bom esse trem” de ser aspirante a candidato a presidente da República ano que vem pelo PSD de Gilberto Kassab. Dos três, é o único que de fato poderá chutar a bunda de Bolsonaro.
Ministro da Defesa chama de “regime de força” o que foi ditadura
General Braga Neto, um dos mais fiéis servidores de Bolsonaro que nega a Ciência, faz questão de negar a História
Se a Procuradoria-Geral da República considera o presidente Jair Bolsonaro um fora da lei ou acima dela, por que seus ministros, pelo menos os mais importantes deles, não estariam liberados para mentir, distorcer a verdade ou simplesmente dizer qualquer coisa em nome da liberdade de expressão?
O ministro da Defesa, general Braga Netto, não precisou de licença para mentir na Câmara dos Deputados ao dizer que não houve ditadura militar entre 1964 e 1985 no Brasil. “Se houvesse, talvez muitas pessoas não estariam aqui. Ditadura, como foi dito por outro deputado, é em outros países”, afirmou.
Stop! Rebobine o filme. Entre 1964 e 1985, no mínimo 434 pessoas foram mortas ou desapareceram por ação direta de cinco governos militares que cassaram mandatos de parlamentares e de ministros de tribunais superiores, fecharam o Congresso, suspenderam o direito ao habeas corpus e censuraram a imprensa.
A ordem jurídica foi para o brejo. A tortura de presos políticos foi adotada como política de Estado e autorizada por generais no exercício da presidência da República. Guerrilheiros que se entregaram vivos ao Exército foram fuzilados. E tudo em nome da defesa da democracia supostamente ameaçada pelo comunismo.
Os militares deram a ditadura como terminada quando perderam totalmente o apoio para mantê-la. Voltaram aos quartéis como derrotados. Mas lá passaram a ensinar aos que o sucederam que a ditadura, que preferem chamar de regime de força, ou de movimento militar, foi uma imposição do tempo em que viveram.
Continuam negando a História até hoje. A propósito da passagem de mais um aniversário, este ano, do golpe de 1964, nota oficial do Ministério da Defesa afirmou que a data deveria ser celebrada e que “o movimento permitiu pacificar o país”. Braga Neto, outro dia, disse que sem voto impresso a eleição de 2022 seria cancelada.
Repetiu o que Bolsonaro já disse mais uma vez. Para a maioria dos generais, a Constituição deve ser revista porque é de esquerda, e o Supremo Tribunal Federal expurgado de ministros “comunistas”. Bolsonaro remeterá ao Senado o pedido de impeachment dos ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso.
“Houve um regime forte, isso eu concordo”, declarou Braga Neto. “Cometeram excessos dois lados, mas isso tem que ser analisado na época da história, de Guerra Fria e tudo mais, não pegar uma coisa do passado e trazer para o dia de hoje”. Quem tenta ressuscitar o passado é gente como ele e Bolsonaro.
Fonte: Metrópoles
https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/ricardo-noblat/pacheco-lira-e-nogueira-dizem-a-bolsonaro-o-que-ele-nao-quer-ouvir
Câmara aprova em segundo turno volta das coligações, e texto vai ao Senado
Apesar de Pacheco afirmar não ter visto apoio à medida entre senadores, ele se comprometeu com Lira a levar proposta a votação
Ranier Bragon e Danielle Brant / Folha de S. Paulo
A Câmara dos Deputados concluiu na noite desta terça-feira (17) a votação da reforma eleitoral que retoma a possibilidade de coligações nas eleições para deputados e vereadores, além de colocar na Constituição amarras ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
O segundo turno da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) foi aprovado por 347 votos a 135. Por se tratar de mudança na Constituição, era preciso haver votos de ao menos 308 dos 513 deputados. Agora, o texto segue para o Senado.
Para valer para as eleições de 2022, as mudanças têm que ser promulgadas até o início de outubro deste ano.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou nesta terça ter obtido compromisso do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), de que a proposta não será engavetada.
"O Senado deve pautar [para votação], fez o compromisso de pauta. Agora, eu não posso, não devo e não vou me pronunciar sobre o que o Senado vai, no mérito, aprovar ou não. Os senadores decidem. Eu só pedi o respeito ao presidente Rodrigo Pacheco de, em a Câmara aprovando em segundo turno, pautar a PEC, mas sem compromisso nenhum de resultado", afirmou Lira.
Pacheco confirmou: "Em respeito à importância da matéria, vamos submetê-la à apreciação do Senado". Dias antes, o senador manifestou uma avaliação de que a proposta não será aprovada por lá.
A retomada das coligações entre os partidos para a eleição de deputados e vereadores está proibida desde o último pleito. Ela vai na contramão de regras que visam diminuir o leque das 33 siglas existentes hoje. O fim das coligações para a eleição ao Legislativo foi uma das medidas mais elogiadas pela ciência política nos últimos anos.
Partidos nanicos, sem representação significativa na sociedade e que funcionam muitas vezes como balcão de negócios, tendem a obter vagas no Legislativo apenas na união com siglas maiores.
Isso porque o sistema proporcional, hoje em vigor, distribui as cadeiras no Legislativo com base na votação total dada ao partido e aos seus candidatos. Um partido nanico ou pequeno tem chance maior de eleger representantes em conjunto do que isoladamente.
A proibição das coligações junta-se à cláusula de desempenho —que tira recursos das siglas com baixo desempenho nas urnas— na tentativa de dar maior racionalidade ao quadro político nacional.
Nas coligações, é comum também o eleitor votar, por exemplo, em um candidato defensor dos sem-terra e ajudar a eleger um ruralista, porque não raro siglas das mais diferentes ideologias se unem tendo em vista apenas as perspectivas de sucesso eleitoral.
As coligações foram aprovadas após acordo que sepultou, mais uma vez, a proposta de instituir o distritão nas eleições. Nesse modelo, são eleitos para a Câmara, Assembleias e Câmaras Municipais os candidatos mais bem posicionados. Os votos dados aos derrotados e os votos dados em excesso aos eleitos são desprezados.
O distritão fragiliza os partidos e tende a beneficiar políticos já bem posicionados ou celebridades.
Os deputados suprimiram um dispositivo que flexibilizava a cláusula de desempenho caso o partido conseguisse eleger ou tivesse pelo menos cinco senadores. Hoje, a regra prevê que é necessário eleger ao menos 11 deputados federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da federação.
Esse foi o caso da Rede em 2018, que teve uma votação muito ruim na Câmara, mas conseguiu eleger cinco senadores. Mesmo assim, ficou sem recursos e estrutura no Legislativo por causa da cláusula de barreira, que só leva em conta s votos dados aos candidatos a deputado federal.
A PEC aprovada em segundo turno nesta terça também altera a data de posse de presidentes da República (5 de janeiro) e de governadores e prefeitos (6 de janeiro), o que ocorre hoje no dia 1º de janeiro.
Um outro ponto da PEC estabelece que o voto dado a mulheres e negros terá peso duplo na definição da distribuição das verbas públicas —hoje o dinheiro é repartido de acordo com a votação que cada legenda tem na eleição para a Câmara dos Deputados.
A PEC impõe ainda amarras ao STF e ao TSE, colocando na Constituição a determinação que decisões suas que alterem regras eleitorais só podem valer na disputa se forem tomadas até um ano antes.
Esse trecho é uma antiga demanda dos congressistas, segundo quem o Judiciário tem extrapolado suas funções. Se esse ponto passar também no Senado, tende a ser judicializado.
O projeto ainda flexibiliza punições a partidos e dá mais liberdade para aplicação do dinheiro destinados por eles às suas fundações.
Além dessa proposta, a Câmara dos Deputados pretende votar projetos que visam alterar praticamente toda a legislação eleitoral e política do país, em uma reforma que, se entrar em vigor, será a maior da história desde a Constituição de 1988.
Projeto que pode ir a voto nas próximas semanas, relatado pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), tem 372 páginas e 902 artigos.
Além de censurar a divulgação de pesquisas eleitorais até a antevéspera do pleito, a proposta enfraquece as cotas para estímulo de participação de mulheres e negros na política, esvazia regras de fiscalização e punição a candidatos e partidos que façam mau uso das verbas públicas e também tenta colocar amarras ao poder da Justiça de editar resoluções para as eleições.
O projeto de Margarete, aliada de Arthur Lira, pretende revogar toda a legislação eleitoral e estabelecer um único código eleitoral. Uma primeira tentativa de alteração nas regras eleitorais já foi rejeitada pela Câmara.
No dia 10 o plenário da Câmara rejeitou projeto de emenda à Constituição que pretendia exigir a impressão do voto dado pelo eleitor na urna eletrônica.
A medida era uma das principais bandeiras do presidente Jair Bolsonaro. Desde antes de assumir, ele tem alimentado suspeitas contra as urnas eletrônicas, apesar de jamais ter apresentado qualquer indício concreto de fraude nas eleições.
Baseado nessas falsas suposições, e em um cenário de queda de popularidade e de maus resultados em pesquisas de intenção de voto, já ameaçou diversas vezes a realização da disputa do ano que vem.
O acordo para votação da PEC também incluiu a aprovação de projeto que permite a partidos políticos se organizarem em federação por ao menos quatro anos, o que representaria uma sobrevida a legendas pequenas, que correm risco de serem extintas por não alcançarem um percentual mínimo de votos nas eleições.
O presidente Jair Bolsonaro afirmou a auxiliares que vetará o projeto. Acordo que está sendo costurado prevê que o Congresso mantenha o veto.
ENTENDA A VOLTA DAS COLIGAÇÕES
O que são Desde 2020 os partidos estão proibidos de se coligar para a eleição de deputados e vereadores. A coligação para as eleições majoritárias permanece. Na Câmara, a medida foi fruto de um acordo entre os defensores do distritão e a oposição
Por que as coligações foram proibidas" Objetivo foi sufocar agremiações de aluguel e reduzir o número de partidos hoje no país (33)
Por que podem voltar Partidos nanicos e médios tendem a obter vagas no Legislativo apenas em coligações com siglas maiores. Com isso, pressionam pela retomada do modelo
PRÓXIMOS PASSOS DA PEC
- No Senado, a PEC começa a tramitar pela Comissão de Constituição e Justiça. Se aprovada, segue para votação em plenário (no Senado não há comissão especial)
- Para ser aprovada pelo Senado, é preciso o voto de ao menos 49 dos 81 senadores
- Se for aprovada sem modificação em relação ao texto da Câmara, a PEC é promulgada pelo próprio Congresso e passa a vigorar, sem sanção presidencial
- Para valer para as eleições de 2022, porém, as regras têm que entrar em vigor ao menos um ano antes, ou seja, no início de outubro de 2021
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/camara-aprova-em-segundo-turno-volta-das-coligacoes-e-texto-vai-ao-senado.shtml
Senado: ataque ao STF esgarça relação de Bolsonaro e ameaça pauta do governo
Presidente da Casa, Rodrigo Pacheco apontou que matérias voltadas à recuperação da economia podem ser afetadas
Daniel Gullino e Julia Lindner / O Globo
BRASÍLIA - Ao reafirmar que enviará os pedidos de impeachmento dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, ignorando conselhos de aliados e a sinalização de que o assunto não prosperará no Senado, o presidente Jair Bolsonaro pode agravar a má relação com a Casa que será palco de votações importantes para o governo nas próximas semanas. O Senado avaliará, por exemplo, a indicação do ex-ministro da AGU André Mendonça para o STF e receberá a reforma tributária atualmente em tramitação na Câmara. A falta de interlocução com senadores também reduz as chances de Bolsonaro conseguir algum tipo de suavização do relatório final da CPI da Covid, previsto para o mês que vem.
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O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já deixou claro a aliados que não dará andamento aos pedidos contra os ministros do Supremo. Nesta terça, ele afirmou que pautas voltadas à recuperação da economia podem ser afetadas pelo “esgarçamento das instituições”. Pacheco disse ainda que a análise de eventuais pedidos de afastamento de magistrados não é “recomendável” no momento:
— Entendemos que precipitarmos uma discussão de impeachment, seja do Supremo, seja do Presidente da República, ou qualquer tipo de ruptura, não é algo recomendável para um Brasil que espera uma retomada do crescimento, uma pacificação geral, uma pauta de desenvolvimento, de combate à pobreza e ao desemprego. Essa pauta ficaria prejudicada com o esgaçamento das instituições.
Aliados
Os próprios aliados de Bolsonaro já o aconselharam a recuar, sem sucesso até aqui, argumentando que há muito a perder num embate com o Senado. No horizonte, a Casa aparece como uma trincheira estratégica para o Planalto. E o primeiro prejuízo já está sendo contabilizado. Como informou a colunista do GLOBO Bela Megale, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre (AP-DEM), decidiu deixar em compasso de espera a sabatina de André Mendonça, indicado de Bolsonaro ao STF, na vaga deixada por Marco Aurélio Melo, aposentado no mês passado. A aliados, Alcolumbre tem dito que não pautará a indicação antes de setembro e que não descarta adiá-la para novembro.
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Também caberá aos senadores a decisão de reconduzir ou não Augusto Aras à cadeira da procurador-geral da República. Bolsonaro já enviou a mensagem pleiteando a manutenção de Aras no posto por mais dois anos. Ao contrário de Mendonça, cujo nome enfrenta forte resistência na Casa, o chefe do Ministério Público não deverá encontrar dificuldades para a aprovação.
Outro tema considerado prioritário pelo Planalto, a reforma tributária, não sairá do papel sem a chancela dos senadores. A matéria, no entanto, ainda tramita na Câmara, e sequer há consenso entre deputados e governo sobre o texto ideal. Ontem, a votação foi adiada pela segunda vez por falta de acordo.
O termômetro político-eleitoral também indica ao Executivo que uma cisão com Pacheco tende a ser prejudicial. O presidente do Senado chegou ao cargo com o apoio de Bolsonaro, de quem vem se distanciando, e hoje é cotado com uma das alternativas para disputar a Presidência da República no ano que vem como opção da chamada terceira via.
CPI DA COVID
Além disso, no Senado, a CPI da Covid caminha para a reta final. O relator do colegiado, Renan Calheiros (MDB-AL), deve apresentar seu parecer no dia 16 de setembro. A um mês da conclusão dos trabalhos, a comissão dá sinais de que o pedido de indiciamento do presidente é praticamente inevitável. Desde os primeiro movimento da CPI, o Planalto apresenta dificuldades para se articular e evitar derrotas aplicadas pelo colegiado.
CPI da Covid: Senadores querem enquadrar Bolsonaro por falsificação de documento após revelação de auditor
O novo ministro da Casa Civil e senador licenciado, Ciro Nogueira, reconhece nas conversas com ex-colegas que há sérios problemas na relação do governo com o Senado. Isso foi dito em reunião com parlamentares do PSD. O líder do partido, senador Nelson Trad (MS), presente à audiência, reverberou um sentimento comum a boa parte dos parlamentares da Casa.
— Fomos falar da ausência que estamos sentindo de uma interlocução melhor com o governo. Qual é o projeto do governo? Responde para mim. Como é que nós vamos defender ou ajudar uma coisa que a gente não sabe nem o que é? — queixou-se o líder da segunda maior bancada da Casa.
Pela manhã, Bolsonaro voltou a dizer que não recuaria do plano de dar andamento aos pedidos de impeachment de Moraes e Barroso.
— Eu vou entrar com um pedido de impedimento dos ministros no Senado. O local é lá. O que o Senado vai fazer? Está com o Senado agora, independência. Não vou agora tentar cooptar senadores, de uma forma ou de outra, oferecendo uma coisa para eles etc etc etc, para votar o impeachment deles — disse o presidente, à rádio Capital Notícia, de Cuiabá.
*Título original do texto foi alterado para publicação no portal da FAP
Luiz Carlos Azedo: Bolsonaro derrete e apela para o golpismo
A expectativa de poder que Bolsonaro mantém não se sustenta no projeto eleitoral, mas no governo como forma concentrada de poder e na narrativa do golpe de Estado
Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense
A pesquisa XP-Ipespe divulgada ontem mostra que Jair Bolsonaro derreteu eleitoralmente — perde para qualquer concorrente no segundo turno, se as eleições fossem hoje. Mais ainda, pode até ser derrotado pelo ex-presidente Luiz Inácio lula da Silva no primeiro turno, se mantiver a polarização com o petista e conseguir inviabilizar a chamada “terceira via”, como pretende. Segundo o cientista político Antônio Lavareda, mesmo com o recesso da CPI da Covid e o bom desempenho do Brasil nas Olimpíadas de Tóquio, que reduziram o noticiário negativo, o mau humor dos brasileiros com o presidente da República aumentou.
Não faltam motivos para isso, apesar do avanço da vacinação em massa e da redução do número de óbitos diários pela covid-19, que o povo atribui aos governadores e aos prefeitos. Com justa razão, Bolsonaro é identificado com o vírus da pandemia e não com a vacina. Fez tudo o que podia e não deveria para isso. Ontem mesmo, andou falando que as pessoas que tomaram a CoronaVac, a vacina chinesa produzida pelo Instituto Butantan, estão morrendo. Sua avaliação positiva caiu de 22 para 21%, enquanto a de governadores subiu de 36% para 46% e a dos prefeitos, de 45% para 55% — mesmo com o presidente da República culpando-os pela crise sanitária.
O estrago feito pelo ex-ministro Eduardo Pazuello e sua equipe de militares na Saúde, desnudado pela CPI do Senado, é irreversível: 57% da população acreditam no envolvimento do governo e de alguns de seus membros na corrupção. O apoio à CPI é robusto e inversamente proporcional: 57%. Na pesquisa, 67% dos entrevistados disseram que acompanham a CPI e 74% dos brasileiros perderam um parente, amigo ou colega na pandemia. O pior dos mundos para Bolsonaro é a percepção da economia, negativa para 63% da população. Em julho, eram 57%.
Ou seja, mesmo com alguns indicadores positivos, como o crescimento do PIB, e medidas recentes para ajudar a população de mais baixa renda, como o Auxílio Brasil, o programa federal que substituirá o Bolsa Família, o povo se queixa da inflação, dos juros altos e do desemprego, que formam um círculo vicioso. Nas simulações eleitorais, Bolsonaro perderia para Lula, Ciro Gomes, Sergio Moro, Luís Henrique Mandetta, João Doria e Eduardo Leite. Se aparecer mais um candidato, talvez perca para ele também. A expectativa de poder que mantém não se sustenta no seu projeto eleitoral, mas no governo como forma mais concentrada de poder e na narrativa do golpe de Estado. Esse é o xis da questão.
O ministro da Defesa, Braga Neto, compareceu ontem à Câmara para dizer que a ameaça de não realização das eleições, caso não fosse aprovado o voto impresso, nunca houve e é um assunto encerrado. É mesmo, porque a Câmara enterrou a proposta. Mas a narrativa golpista de Bolsonaro continua. É construída sobre três pilares: a disseminação da suspeita de fraude eleitoral para beneficiar a candidatura de Lula, o falso papel moderador que atribui às Forças Armadas nas relações entre os Poderes e o questionamento da autoridade do Supremo Tribunal Federal (STF) na exegese da Constituição.
Vivandeiras|
Bolsonaro escala seu confronto com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news, e Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para provocar uma grave crise institucional e arrastar as Forças Armadas para a aventura de um golpe de Estado, antecipando-se à derrota eleitoral que vislumbra no horizonte. Exuma o velho castilhismo castrense da Revolução de 1930, percorre quartéis e campos de manobras como “comandante supremo das Forças Armadas”. Parece uma daquelas “vivandeiras alvoroçadas” que percorriam os bivaques para “bulir com os granadeiros e pro- vocar extravagâncias do poder militar”, como disse, certa vez, o marechal Castello Branco, referindo-se aos políticos golpistas.
Os políticos do Centrão, entre os quais o novo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, tiram proveito da situação para avançar sobre cargos do governo e verbas do Orçamento da União, mas, até agora, não embarcaram no projeto golpista. Um golpe de Estado, quando nada, anularia todo o poder de barganha que hoje desfrutam. Além disso, não têm a mesma ojeriza dos militares a Lula, pois foram seus aliados quando o PT estava no poder — alguns até foram ministros. Atuam como a turma do deixa disso, mas não estão tendo sucesso na tentativa de protagonizar e viabilizar o projeto de reeleição de Bolsonaro.
Rejeição ao governo Bolsonaro chega a 54%, diz pesquisa XP/Ipespe
Entrevistados que avaliam a gestão bolsonarista como "boa" ou "ótima" somam 23%, dois pontos percentuais a menos que na pesquisa de julho
Talita Laurino / Metrópoles
A XP Investimentos divulgou, nesta terça-feira (17/8), a avaliação do governo Bolsonaro. De acordo com o levantamento, 54% dos eleitores dizem considerar a gestão bolsonarista “ruim” ou “péssima”, contra 52% em julho. A taxa de rejeição ao governo está em alta desde outubro de 2020, quando 31% avaliavam negativamente a administração federal.
Por outro lado, entrevistados que veem o governo como “bom” ou “ótimo” somam 23%, dois pontos percentuais a menos que na pesquisa de julho. Os números são os piores desde o início da série. A insatisfação ocorre junto à piora na percepção da direção da economia. O grupo dos que avaliam que a gestão federal está no caminho errado cresceu 4 pontos percentuais e chegou a 63%.
A visão contrasta com outros indicadores sobre a situação econômica. A percepção sobre as chances de manutenção de emprego, por exemplo, segue em tendência de alta desde maio. O grupo que vê possibilidade grande ou muito grande de continuar empregado atingiu 56%.
Foram realizadas mil entrevistas, em todo o país, de 11 a 14 de agosto. A margem de erro é de 3,2 pontos percentuais, para mais ou para menos. A pesquisa registrou também estabilidade sobre o sentimento da população em relação à pandemia: o grupo dos que dizem estar com muito medo do surto de Covid-19 oscilou de 38% para 39%.
A soma das pessoas que já se vacinaram com as que dizem que receberão o imunizante com certeza atingiu seu maior patamar, chegando a 96%.
Fonte: Metrópoles
https://www.metropoles.com/brasil/politica-brasil/rejeicao-ao-governo-bolsonaro-chega-a-54-diz-pesquisa-xp-ipespe