eleição
Por que não ser neutro
Roberto Freire,* Esquerda democrática
Resposta que dei a um eleitor de Simone Tebet que listou uma série de crimes e escândalos nos governos lulopetistas e pregou a neutralidade:
"Caro [...], nós do Cidadania – na época em que tudo isso acontecia nos governos de Lula e Dilma fazíamos uma firme oposição – podemos dizer que hoje, nos tempos de Bolsonaro, temos (em muito menos tempo de governo) tantos crimes e escândalos de corrupção como antes. Não vamos desempatar com o voto no segundo turno.
Estamos votando em Lula e vetando Bolsonaro, pelo que este representa de obscurantismo (vide posição na pandemia). Como órfão da ditadura, comete atos de desrespeito aos direitos humanos e atenta contra a democracia. Está pronta, inclusive, uma PEC para o caso de ele ser vitorioso, aumentando o número de ministros do STF para controlar o Judiciário. Não podemos esquecer que Chávez, pela esquerda, iniciou a escalada ditatorial com o controle do Judiciário, igualzinho a Orban na Hungria, pela extrema-direita, que também aumentou o número de ministros da Corte Suprema. E o resultado é o fascismo reinando no país dos magiares.
Não podemos admitir que isso ocorra entre nós. Daí o voto em Lula, que, apesar de corrupto (tal como Bolsonaro), nos mais de 13 anos de governo não promoveu nenhum ato para criar um regime autoritário. Convém não esquecer que ele próprio foi investigado e muitos dos dirigentes do PT condenados durante seu próprio governo."
Texto publicado no Facebook da Esquerda Democrática https://bit.ly/3Mv1WNU
Debate: Bolsonaro distorce dados sobre desmatamento
Paulo Motoryn*, Brasil de Fato
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu, durante o debate na TV Bandeirantes, na noite deste domingo (16), a preservação ambiental, enquanto o presidente Jair Bolsonaro (PL) distorceu os dados do desmatamento durante o seu governo. O tema dominou boa parte do terceiro bloco do confronto entre os candidatos ao Palácio do Planalto.
"Foi no nosso governo o menor desmatamento da Amazônia. Foi no nosso governo. E o seu é o maior todo ano. Vocês estão brincando de desmatar, vocês estão brincando de abrir cerca, vocês estão brincando de derrubar árvore, vocês vão ver o que vai acontecer com o comércio brasileiro, porque o brasileiro do agronegócio que é sério, aquele que quer ganhar dinheiro, aquele que quer exportar, sabe que não pode invadir a Amazônia", afirmou Lula.
"Nós vamos ganhar as eleições para poder cuidar da Amazônia e não permitir que haja invasão em terra indígena, em garimpo ilegal, e muito menos alguém querer plantar milho, soja ou algum outro produto no lugar que não se pode plantar", declarou o petista.
Na resposta, Bolsonaro disse: "Dá um Google em casa aí: 'Desmatamento 2003 a 2006', quatro anos do governo Lula. Depois dá um Google: 'Desmatamento, Jair Bolsonaro, 2019 a 22'. No seu governo foi desmatado mais do que o dobro do que o meu. Dá um Google em casa. Deixa eu terminar, Lula. Dá um Google em casa. Você desmatou duas vezes e meio mais do que no meu governo".
Logo em seguida, contudo, entidades que atuam com o tema contestaram o presidente nas redes sociais. O Observatório do Clima, rede da sociedade civil que luta contra a crise climática, publicou a seguinte mensagem no Twitter: "Jair Bolsonaro MENTE sobre desmatamento no governo Lula. O PT pegou o desmatamento em 25 mil km2 e reduziu a 4.500 km2. Bolsonaro pegou com 7.500 km2 e levou a 13.000 km2", escreveu.
*Texto publicado originalmente no Brasil de Fato. Título editado.
PSDB e Cidadania iniciam conversas para se fundir até o final do ano
Folha de São Paulo*
PSDB e Cidadania, partidos que atualmente formam uma federação, iniciaram tratativas para se fundir completamente até o final do ano.
As conversas vêm sendo feitas por lideranças das duas legendas no Congresso. Para a fusão se concretizar, será necessária a aprovação pelas respectivas direções nacionais.
A princípio, o nome PSDB seria mantido pela nova legenda, mas as conversas ainda não foram conclusivas sobre esse ponto.
A nova legenda teria 18 deputados a partir de 2023 (13 tucanos e 5 do Cidadania). Atualmente, a federação das duas siglas possui 29 parlamentares.
Ambos os partidos tiveram derrotas na atual eleição, sobretudo o PSDB, que perdeu o governo de São Paulo.
Criada pela legislação eleitoral neste ano, a federação é uma espécie de coligação permanente entre partidos, que no entanto mantêm suas identidades. No caso da fusão, há uma junção das estruturas.
Texto publicado originalmente na Folha de São Paulo.
Entenda por que o orçamento secreto flerta com ilegalidades e com a corrupção
Tiago Pereira*, Brasil de Fato
O orçamento Secreto está produzindo um rastro de destruição em áreas sensíveis do Estado brasileiro, como saúde e educação, já combalidas com a perda paulatina de recursos, em função do teto de gastos. Recursos que iriam para políticas públicas, por exemplo, foram desviados para atender ao apetite por emendas da base aliada do presidente Jair Bolsonaro no Congresso Nacional. No episódio mais recente, o governo Bolsonaro bloqueou mais R$ 2,4 bilhões de recursos que seriam destinados ao Ministério da Educação (MEC) deste ano. A verba vai para parlamentares aliados aplicarem como bem entenderem, em mais uma manobra do chamado orçamento secreto.
A manobra é resultado de um governo fraco, que precisou do Congresso para não investigar seus crimes de responsabilidade que poderiam levar a um impeachment. Desse modo, o Executivo passou a subordinar grande parte do Orçamento da União passou ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Lira coordena o esquema e sentou em cima de mais de 140 processos de impeachment contra o atual presidente. Por meio dessa barganha que fere os princípios republicanos, Lira recebeu somente neste ano R$ 492 milhões em emendas para aplicar nos seus redutos eleitorais. Como resultado, ele viu sua votação crescer mais de 50% nas últimas eleições, na comparação com pleitos anteriores.
Ignorando critérios técnicos, esses recursos são aplicados ao sabor dos interesses dos parlamentares agraciados com as chamadas “emendas de relator”. É possível saber quanto cada parlamentar recebeu. No entanto, não há transparência, e não se pode saber ao certo onde foi aplicado o dinheiro.
“Maior esquema de corrupção do planeta”
De acordo com a senadora Simone Tebet (MDB-MT), “podemos estar diante do maior esquema de corrupção do planeta Terra”. Em entrevista recente ao podcast Flow, a então candidata à presidência – que agora declarou apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno – explicou o funcionamento do esquema.
Ela citou o caso, revelado pela revista piauí, do município de Pedreira (MA). Com 39 mil habitantes, para justificar as emendas recebidas via Orçamento Secreto, a prefeitura informou que realizou mais de 540 mil extrações dentárias.
“Significa ter tirado 14 dentes de cada cidadão da cidade, inclusive do bebê recém-nascido, que não tem dente.”
A mesma reportagem mostra outro município do interior do Maranhão que realizou mais testes de HIV/aids do que toda a cidade de São Paulo, que tem mais de 12 milhões de habitantes.
“Então posso estar falando de uma nota fria onde digo ‘fiz tal coisa, me paguem’. Não estou falando daquela coisa de levar 10%, não (superfaturamento). Estou falando de uma nota inteira. O dinheiro pode ter saído de Brasília, chegado lá e ter ido para o bolso de alguém. Não tem sentido as menores cidadezinhas do Maranhão receberem os maiores recursos desse orçamento”, criticou Simone.
Para se ter ideia da influência das emendas do orçamento, o Maranhão deu 69% dos votos a Lula, elegeu o ex-governador Flávio Dino (PSB) com 62%, e também o candidato apoiado por ele, Carlos Brandão (PSB), com 51%. Por outro lado, dos 18 deputados federais eleitos pelo estado, 12 são de partidos apoiadores de Bolsonaro no segundo turno. Inclusive os quatro mais votados, dois do PL e dois do União Brasil.
Os “vencedores”
O Orçamento Secreto explica, em parte, porque o Brasil votou em Lula, mas deu ao PL de Bolsonaro a maior bancada de deputados federais.
Além das suspeitas de corrupção e dos desvios de finalidade, o Orçamento Secreto é um dos fatores que contribuiu para o crescimento das bancadas dos partidos do chamado Centrão – como o PL, PP, e Republicanos. O PL, por exemplo, conquistou 33 cadeiras nas eleições de 2018. Com a janela partidária, o partido de Bolsonaro subiu para 76, antes da eleição. Ma no último domingo (2), o partido elegeu 99 deputados para a próxima legislatura.
A votação de Bolsonaro, que teve cerca de 51 milhões de votos no primeiro turno, por si só, não explica o crescimento da bancada do seu partido. Fosse assim, o PT, que elegeu 68 deputados, deveria ter ficado com mais de 100 cadeiras na Câmara. Isso porque o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) obteve mais de 57 milhões de votos, 6 milhões a mais que Bolsonaro. Assim, uma das causas da diferença do tamanho das bancadas entre os dois partidos é o Orçamento Secreto, que serviu para irrigar candidaturas de aliados do presidente, e não da oposição.
Levantamento do jornal O Globo mostra que dos 13 que receberam de R$ 100 milhões do orçamento secreto neste ano, apenas um não se reelegeu. Outros dez tiveram votações mais expressivas agora do que nas últimas eleições. Arthur Lira, por exemplo, que recebeu R$ 492 milhões em emendas, viu sua votação saltar de 143.858, em 2018, para quase 220 mil votos nessas eleições, crescimento de 52,55% no total de sufrágios.
“Como você se sente ao ver que o Arthur Lira embolsou sozinho MEIO BILHÃO DE REAIS em emendas do orçamento secreto?”, questionou o cientista social Leonardo Rossato. “Não tem discussão de ideias que consiga concorrer com isso”, frisou o especialista. Assim, o orçamento secreto destrói com qualquer princípio de equidade entre os atores que disputam as eleições.
Batalha
A discussão em torno da revogação ou manutenção do Orçamento Secreto deve ser uma das principais batalhas no Congresso no ano que vem. Em caso de vitória de Bolsonaro, pouca coisa deve mudar, com os parlamentares avançando sobre fatias cada vez maiores das verbas da União. O ex-presidente Lula, por outro lado, promete acabar com o esquema, retomando para o governo federal a prerrogativa de decidir sobre a alocação dos recursos federais. O ex-presidente aposta no diálogo com os líderes do Congresso para pôr fim às emendas de relator.
Outro caminho é sepultar o orçamento secreto através do Supremo Tribunal Federal (STF). A ministra Rosa Weber, que assumiu a presidência da Corte no mês passado, é a relatora de um processo que questiona a legalidade das emendas de relator. O tema entraria em votação após o segundo turno das eleições.
No entanto, caciques do Centrão, como o próprio Arthur Lira, dizem que caso o STF ou o próximo presidente da República decida acabar com o Orçamento Secreto, os parlamentares do Centrão e aliados fariam passar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), oficializando o esquema. Lira ameaça inclusive se antecipar ao próprio STF, colocando a PEC em votação também logo após o segundo turno.
*Texto publicado originalmente no site Brasil de Fato
Esquerda precisa focar em emprego contra 'identitarismo de maioria'
Shin Suzuki*, BBC News Brasil
O pastor Alexandre Gonçalves, presidente do Movimento Cristãos Trabalhistas, ligado ao PDT, diz que "emprego, saúde e trabalho têm que ser o foco para a esquerda". "Porque se for entrar com a luta identitária, o Bolsonaro ganha com o identitarismo de maioria."
Ele se refere à substancial fatia da população brasileira que é evangélica e conservadora e se reúne em torno do ideal de "defesa da família" — associado a plataformas contra o aborto e o casamento gay.
Projeção do doutor e pesquisador em demografia José Eustáquio Alves aponta que os evangélicos serão o maior grupo religioso do Brasil em dez anos.
Gonçalves considera que atualmente há uma ênfase excessiva do que ele chama de "nova esquerda" na questão identitária (luta contra a discriminação racial, feminista e LGBT) em lugar de temas sociais, ligados a mais garantias e bem estar dos trabalhadores.
Para o pastor, que assessorou o candidato derrotado Ciro Gomes (PDT) no primeiro turno, isso, somado a uma atitude que ele chama de "condescendente" da esquerda em relação aos evangélicos, leva os neopentecostais conservadores a cerrar fileiras pela candidatura de Jair Bolsonaro (PL).
Gonçalves decidiu declarar voto em Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por sua oposição ao atual presidente, que considera o introdutor de uma "seita pseudocristã chamada 'bolsonarismo dentro da igreja'".
"Nós estamos indo para o caminho de uma ex-nação."
Carioca de 52 anos, ele é pastor da Igreja de Deus, uma denominação pentecostal, fundada em 1836 nos Estados Unidos, "conservadora e tradicional" e "que de 2014 para cá vem tendo umas ideias muito erradas em relação à questão política".
"Mesmo com todas as dificuldades, problemas e as nossas contradições, me mantenho ali porque ainda acredito que é um ambiente que a gente ainda pode de alguma forma viver sem que fique insalubre."
Em meio a pressões na igreja, Gonçalves deixou de ser pastor em tempo integral e desde 2004 é concursado da Polícia Rodoviária Federal. Mora hoje em Santa Catarina.
O Movimento Cristãos Trabalhistas, que ele ajudou a fundar no final de 2017, inicialmente era formado apenas por evangélicos como Assembleia de Deus, Presbiteriana, Batista e Quadrangular, e mais tarde agregou católicos.
O grupo ainda vai se reunir para definir a posição conjunta sobre o segundo turno — a declaração de voto em Lula é uma posição pessoal de Gonçalves.
Veja abaixo os principais trechos da entrevista com o pastor:
BBC News Brasil - Por que Lula e a esquerda têm dificuldades de obter o voto evangélico?
Pastor Alexandre Gonçalves - Se você pergunta para os evangélicos se eles querem ter saúde e escola públicas de qualidade, um transporte público ágil para não ficar 3 horas no trânsito e direitos trabalhistas como férias, eles vão dizer que sim. É dessa forma que a gente consegue se conectar com as igrejas.
Se você inicia um diálogo com temas transversais, ainda que eles tenham a sua importância, mas que são dominados por um identitarismo de minoria, isso acaba fazendo surgir um identitarismo de maioria. Isso faz muito bem à direita. A direita ganha nesse campo.
A prioridade hoje da chamada nova esquerda, que a gente acredita que é oriunda de uma tendência norte-americana, é de defesa de um identitarismo que entendemos ser raso e dissociado da luta universal dos trabalhadores em prol de sua emancipação.
E se você quer impor através do Estado conceitos de família, seja o conceito cristão tradicional ou o conceito liberal da esquerda, você vai causar conflito.
Emprego, saúde e trabalho têm que ser o foco para a esquerda ganhar alguma eleição majoritária. Porque se for entrar com a luta identitária, o Bolsonaro ganha com o identitarismo de maioria. É só saber matemática.
BBC News Brasil - Quais são os problemas de comunicação da esquerda com essa fatia da população?
Gonçalves - Se uma pessoa fala qualquer termo que não está de acordo com a linguagem da nova esquerda, o que acontece com essa pessoa? Ela não é ensinada: ela é massacrada. Não há uma pedagogia para essa pessoa. Ela não é, com amor, induzida a mudar o seu modo de pensar, ela é destruída.
Querem mudar uma estrutura brutal de opressão mudando a linguagem, ou seja, de fora para dentro. Eles acham que alterando a forma vão conseguir alterar o conteúdo. Primeiro, você tem que mexer lá dentro, no conteúdo. A forma vem depois.
Isso é ensinamento de Jesus: "Lave o copo por dentro". Ou seja, primeiro é ali dentro, tem que mexer nessa estrutura. E como mexe nessas estruturas? Justamente mexendo na economia.
A esquerda fica mais preocupada em falar "vamos legalizar o aborto". Não estou dizendo que essas pautas não sejam importantes. Elas têm a sua importância. Mas não vão resolver o problema estrutural. Qual é o motivo que faz as pessoas abortarem? Qual o motivo que faz com que pessoas transsexuais sejam discriminadas?
Outro ponto [ruim na comunicação] é a fragilidade moral da nova esquerda. Quando ela se tornou governo, houve uma realidade de roubalheira generalizada que é injustificável. Houve o lavajatismo? Houve sim, mas a autoridade moral que a esquerda tinha quando era oposição foi perdida.
BBC News Brasil - Mas por que denúncias de corrupção relacionadas ao governo e à família Bolsonaro, além de declarações do presidente que afrontam valores das igrejas cristãs, como a defesa do aborto feita no passado, não afetam o apoio majoritário dos evangélicos a ele?
Gonçalves - Aí são dois problemas: um na esquerda e outro dentro da igreja. No Brasil, entre os anos 1950 e 1960, entraram duas teologias: a do domínio e a da prosperidade, uma com ligação à outra. A do domínio pregava que o reino de Deus será estabelecido aqui na Terra pela igreja. Daí o nome.
E como é esse domínio? A igreja tem que exercer influência nas principais áreas da sociedade: política, economia, cultura, arte, tudo. E aí uma grande parte das igrejas, principalmente as neopentecostais, tomaram essa teologia podre, que veio para cá importada dos EUA, e colocaram na vida política.
Vários falam para mim: "Bolsonaro não é cristão, a gente sabe que ele não é. A gente sabe que ele tem um monte de erros, mas ele defende os valores cristãos".
Bom, mas você não vota num governante para que ele imponha princípios cristãos à sociedade. Você vota no governante para que ele possa administrar o bem público de forma que todos possam se beneficiar. Isso se inverteu na cabeça de grande parte dos evangélicos, principalmente por causa do aumento das igrejas mercantilistas massivas.
E a igreja evangélica tem o olhar reducionista sobre a esquerda: diz que todo mundo é comunista e não consegue separar entre sociais-democratas, trabalhistas etc. Reduz a esquerda a casamento gay, aborto e maconha. A esquerda, por sua vez, se sente superior, tem um olhar condescendente com os evangélicos.
BBC News Brasil - Há como a esquerda usar uma linguagem, usando as palavras do senhor, "menos condescendente" e defender temas como o combate à violência homofóbica e a legalização do aborto?
Gonçalves - Não numa eleição majoritária. Candidatos a presidente, a governador, não tem que entrar nessas pautas. Quem tem que entrar, quem vai entrar, são os candidatos a cargos proporcionais. É esse o ponto. Até porque o presidente não pode fazer nada sobre isso. Presidente não pode legalizar o aborto. Isso é tarefa do Congresso Nacional. Um candidato a presidente tem que fugir dessas cascas de banana. Numa campanha majoritária você não quer só o voto da esquerda, você quer o voto da maioria da população.
O que aconteceu no Chile recentemente foi uma oportunidade imensa de mudar o sistema previdenciário e introduzir uma nova Constituição. A nova esquerda do Chile introduziu esses temas na reforma constitucional. O que aconteceu? 60% de rejeição.
Nós temos um Brasil de interior com muita gente que não tem a mentalidade das grandes cidades. E mesmo dentro das grandes cidades, nas periferias, há pessoas com um pensamento muito diferente do que se vê nas novelas, nos filmes, na arte… e eles são brasileiros.
O caminho é não falar e deixar isso para as representações legislativas. Houve eleição de representantes transsexuais para a Câmara Federal. Essas pessoas terão que levar debates, por exemplo, sobre se o SUS [Sistema Único de Saúde] poderá bancar cirurgias de mudança de sexo, fazer projetos de lei e, dentro da democracia do país, ou seja, no Congresso Nacional, levar isso à votação, que será aprovado ou não.
BBC News Brasil - Nesta segunda-feira (8/10), Lula afirmou ser contra o aborto e que a discussão sobre o assunto é "papel do Legislativo". O que achou do anúncio?
Gonçalves - Eu acho que é a declaração correta. Ele falou aquilo que ele pensa. Com toda certeza se outra pessoa declarasse isso seria cancelada para o resto da vida na internet. Mas como é o Lula não tem problema, ele pode falar.
BBC News Brasil - Qual é a visão do senhor como pastor sobre o casamento gay e a comunidade transsexual?
Gonçalves - Nós temos uma posição clara no nosso movimento dos Cristãos Trabalhistas que não somos contra a união civil de pessoas do mesmo sexo e a existência de qualquer pessoa. Isso são fundamentos do Estado laico. Não somos contra que possam estabelecer seus direitos previdenciários, de plano de saúde, tudo.
O que nós nos colocamos contra é uma imposição para que, dentro das igrejas, pastores sejam obrigados a efetuar o casamento religioso de pessoas do mesmo sexo. Eu acho que aí deve ser de acordo com a consciência de cada pastor. Tem igrejas que fazem e tem igrejas que não fazem. É uma questão teológica, doutrinária, que diz respeito à liturgia dentro de cada igreja, e elas devem ter essa independência, que é um pressuposto do estado laico.
As pessoas num estado laico são livres para o que anteriormente se via como escolha e hoje pode ter uma força biológica. Isso não é algo que a igreja tenha que se intrometer. Essas pessoas têm todo o direito de existir e ter a sua plena cidadania. Dentro do movimento a gente tem bastante respeito.
BBC News Brasil - Como o senhor vai se posicionar no segundo turno?
Gonçalves - O nosso movimento está para se reunir, mas a minha posição pessoal é de voto silente no Lula. E as minhas razões não são de cunho econômico ou social porque eu entendo que Lula e Bolsonaro têm o mesmo modelo. É por conta de que, embora eles causem mal ao país de maneiras diferentes, Bolsonaro introduziu o que a gente chama de uma seita pseudocristã chamada "bolsonarismo dentro da igreja". É um mal que ele causa à igreja, muito maior do que o mal que, de maneira abstrata, Lula poderia causar. O mal do Bolsonaro é concreto porque tem entrado na estrutura da igreja usando símbolos cristãos em nome do poder. Não há como não me posicionar contra ele. E o que tem hoje contra ele é o Lula. Então, a minha posição é o voto em Lula.
*Texto publicado originalmente no site BBC News Brasil. Título editado
Ataques aos nordestinos se multiplicam nas redes sociais após 1º turno
Correio Braziliense*
A central da ONG de proteção aos Direitos Humanos Safernet Brasil recebeu cerca de 14 denúncias de xenofobia por hora na última segunda-feira. Ao todo, foram 348 registros no dia após o primeiro turno das eleições. O número quase supera o total de reclamações registrado nos primeiros seis meses do ano passado (358). No domingo, dia do pleito, foram registradas 10 denúncias.
Uma onda de ataques a nordestinos nas redes sociais se estabeleceu conforme a apuração dos votos mostrou o favoritismo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos nove estados que compõem a região. As mensagens partiam principalmente de perfis anônimos, mas que se identificam como apoiadores de Jair Bolsonaro (PL), e reduziam o Nordeste a uma imagem de pobreza e subdesenvolvimento.
Ontem, viralizou um vídeo no qual a advogada Flávia Moraes, então vice-presidente da Comissão da Mulher da OAB de Uberlândia (MG) — depois da repercussão, ela deixou o cargo —, ataca os nordestinos e diz que vivem de migalhas.
"Nós que geramos empregos, nós que pagamos impostos, vocês sabem o que a gente faz? Nós gastamos o nosso dinheiro lá no Nordeste. Não vamos fazer isso mais. Vamos gastar dinheiro com quem realmente merece. A gente não vai mais alimentar quem vive de migalhas. Vamos gastar nosso dinheiro no Sudeste, no Sul ou fora do país", disse, ao lado de duas amigas. O presidente da OAB/MG, Sérgio Leonardo, disse que vai haver processo disciplinar, cujas penas vão da advertência até a expulsão.
Comparando o primeiro semestre deste ano com o de 2021, a organização já havia observado aumento de 520,6% nas denúncias de xenofobia: pulou de 358 para 2.222 este ano.
Texto publicado originalmente no Correio Braziliense.
Tebet declara hoje apoio a Lula; Temer deve escolher Bolsonaro
Ricardo Abreu, Guilherme Balza e Julia Duailibi*, Globo News
Após o resultado do último domingo (2), apesar de já ter dado sinalizações de que não apoiaria em hipótese alguma o candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL), Simone Tebet (MDB) se reservou, aguardando uma decisão oficial do MDB. O partido liberou seus diretórios a apoiarem quem quiserem (veja íntegra da nota abaixo). Assim, o caminho fica livre para Simone declarar que está com Lula.
Já o ex-presidente Michel Temer deve se encontrar com Bolsonaro no fim de semana, e há expectativa de que anuncie apoio a ele.
No entanto, a forma de fazer o anúncio ainda é um entrave. Para fazer frente a Bolsonaro, que na terça (4) fechou apoio dos governadores de SP, MG e RJ, o PT quer logo uma foto de Lula e Simone. O petista terá hoje um encontro com lideranças políticas e parlamentares do congresso nacional, que demonstrarão apoio à candidatura. A ideia era mostrar a união e explorar a adesão da força de Simone.
No estado de São Paulo, o MDB anuncia apoio a Tarcisio de Freitas (Republicanos) nesta quarta (5) ao meio-dia, com participação do prefeito da capital, Ricardo Nunes.
Mas uma ala do MDB segue reticente sobre o encontro, e prefere um anúncio solo. Como o partido não vai completamente para o lado de Lula, seria uma forma de se resguardar, e mostrar que o apoio é crítico. Até a tarde desta quarta-feira (5), ligações, pedidos e acertos devem acontecer, de olho no anúncio.
A senadora Mara Gabrilli (PSDB), candidata a vice na chapa de Tebet, declarou na terça (4) que votará em branco no segundo turno.
Leia íntegra da nota divulgada pelo MDB
O MDB é o maior e mais democrático partido do País, o único com presença em quase todos os municípios. Tem convicções claras a favor da Liberdade, da Democracia e da Soberania do povo brasileiro, exercida por meio do voto direto.
Nesta eleição geral, apresentamos um projeto independente e equilibrado, fora da polarização, brilhantemente liderado por nossa candidata Simone Tebet. Não há a menor dúvida de que ela se consolidou como uma liderança nacional.
Nos Estados, reelegemos os governadores do Pará e do Distrito Federal, em primeiro turno. E vamos disputar o segundo turno no Amazonas e em Alagoas. Aumentamos nossa bancada na Câmara e mantivemos uma grande bancada no Senado.
Nas últimas 48 horas, dirigentes, congressistas, governadores e prefeitos externaram sua posição em relação à disputa nacional em segundo turno. Por ampla maioria, o MDB decidiu dar liberdade para que cada um se manifeste conforme sua consciência.
Em qualquer cenário, o MDB deixa claro que cobrará do vencedor o respeito ao voto popular, ao processo eleitoral como um todo e, sobretudo, a defesa intransigente da Constituição de 1988 e do Estado Democrático de Direito.
Deputado Baleia Rossi
Presidente da Executiva Nacional do MDB
Texto publicado originalmente no g1.
Constituição Cidadã, símbolo da democracia, comemora 34 anos
TSE*
Nesta quarta-feira (5 de outubro), a Constituição Federal de 1988, símbolo da democracia, completa 34 anos. Conhecida como “Constituição Cidadã”, ela trouxe avanços em relação aos direitos e garantias de brasileiras e brasileiros, além de dar voz à sociedade civil organizada e consolidar o Estado Democrático de Direito.
A Constituição é o maior conjunto de normas que rege o país. Ela estabelece, por exemplo, direitos e deveres dos cidadãs e cidadãos, disciplina o ordenamento jurídico e organiza o papel do poder público, definindo atribuições dos municípios, estados, União e dos três Poderes da República. Desde a promulgação da atual Constituição, o Brasil vive o mais longo período de estabilidade institucional de sua história.
A Constituição brasileira ficou conhecida como Constituição Cidadã porque apresenta cláusulas essenciais à manutenção e ao fortalecimento da democracia, como o pluralismo político, o voto direto e secreto, a garantia dos direitos políticos individuais, o princípio da anterioridade da lei eleitoral e as condições de elegibilidade do cidadão que concorre a determinado cargo eletivo.
A Justiça Eleitoral na Constituição
Garantias que permitem uma atuação marcante da Justiça Eleitoral, que desempenha papel essencial para o cumprimento dos dispositivos previstos na Constituição. A Carta Magna também deu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o papel de instituição responsável pela administração da Justiça Eleitoral juntamente com os 27 Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), os juízes eleitorais e as juntas eleitorais.
Assim como as demais instâncias máximas da Justiça brasileira, o TSE também tem suas competências, suas atribuições e sua composição definidas na Constituição Federal.
Voto secreto
A partir da promulgação da Constituição de 1988, ficou restabelecida a soberania popular em relação ao direito ao voto e ao poder de escolher seus governantes pelo sufrágio universal, com voto direto, secreto e com o mesmo valor para todos os eleitores e eleitoras. O direito ao voto também foi assegurado aos não alfabetizados e aos jovens, a partir dos 16 anos, que ganharam o direito de ajudar a decidir o futuro da nação.
A Constituição determina ainda a periodicidade das eleições, que devem ocorrer a cada dois anos, e fixa o primeiro turno eleitoral no primeiro domingo de outubro do ano anterior ao do término dos mandatos. Já o segundo turno, se houver, deve ocorrer no último domingo de outubro.
Além disso, apresenta cláusulas essenciais à manutenção e ao fortalecimento da democracia, como o pluralismo político, a liberdade partidária, a garantia dos direitos políticos individuais, a liberdade de imprensa, o voto direto e eleições livres e regulares em todos os níveis.
Texto originalmente publicado no portal do TSE.
À CNN, Roberto Freire diz que Cidadania anunciará apoio no 2º turno até terça-feira
Cidadania23*
Em entrevista à CNN neste domingo (02), o presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire, disse que anunciará o apoio do partido no segundo turno da eleição presidencial até amanhã (04).
“Nós não vamos nos omitir. Em 48 horas, daremos uma resposta”, afirmou
Presidente do Cidadania diz que não irá se omitir e anunciará apoio até terça (4)
O presidente do Cidadania, Roberto Freire, afirmou à CNN que anunciará quem o partido apoiará no segundo turno até terça-feira. “Nós não vamos nos omitir. Em 48 horas, daremos uma resposta”, disse. Este foi o prazo sugerido por Simone Tebet (MDB), em discurso na noite deste domingo (2). A senadora pelo Mato Grosso do Sul ficou em terceiro lugar na disputa pela Presidência da República, com pouco mais de 4,1% dos votos.
O Cidadania tentará reunir a direção do partido ainda nesta segunda-feira (3). A legenda forma uma federação junto com o PSDB. Mas primeiramente fará uma reunião à parte.
De acordo com lideranças da legenda, o posicionamento de segundo turno já vinha sendo analisado, uma vez que as chances de vitória de Tebet eram menores do que as dos principais colocados, o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Integrantes do partido ouvidos pela CNN, após o resultado, viram com preocupação o perfil dos candidatos eleitos para o Senado, mais alinhados com o atual governo, e chegaram a chamar de expressão do “obscurantismo” político. Este é um dos fatores que vão ser levados em consideração antes do anúncio de posição.
Houve avaliação de que o PT subestimou a disputa ao acreditar em vitória em primeiro turno. A leitura é de que Lula não conseguiu vencer, sem ir para segundo turno, nem mesmo no ápice de sua popularidade e que dificilmente este feito seria alcançado desta vez.
Texto publicado originalmente no portal do Cidadania23.
Lula precisa dar guinada ao centro se quiser governar, dizem economistas
Alexa Salomão, Folha de S. Paulo
Logo após a contagem dos votos no primeiro turno das eleições neste domingo (2), o presidente Jair Bolsonaro (PL) atribuiu o resultado a sua bem-sucedida estratégia na economia, que elevou o valor do Auxílio Brasil, ao mesmo tempo em que reduziu o preço dos combustíveis e a inflação às vésperas do pleito. Economistas que acompanham a cena política discordam.
A economia até pode ter ajudado um pouco, como ocorre em qualquer eleição. No entanto, analistas atribuem a arrancada bolsonarista ao avanço da uma onda conservadora —e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai precisar se adaptar a esse movimento para ganhar a eleição e, depois, governar com um Congresso mais a direita.
Terminada a contagem, Lula recebeu 48,4% dos votos válidos, resultado dentro da margem de erro sinalizada pelas pesquisas. Bolsonaro teve 43, 22%, uma diferença de quase sete pontos percentuais, que fortalece o presidente no segundo turno.
"Para ocorrer essa diferença no resultado do Bolsonaro em relação às pesquisas, cujos votos foram subestimados vergonhosamente, [o motivo] não foi a economia —o que estamos vendo é uma onda conservadora", afirma a economista e advogada Elena Landau, que coordenou o programa econômico de Simone Tebet (MDB).
"Tem o astronauta Marcos Pontes virando senador por São Paulo, Hamilton Mourão ganhando no Rio Grande do Sul, Magno Malta voltando pelo Espírito Santo, Eduardo Pazuello, o ex-ministro da Saúde, como deputado federal mais votado no Rio. Isso não tem nenhuma relação com a economia."
Elena sai satisfeita com o resultado de sua candidata. "Simone foi de completa desconhecida à terceira mais votada", afirma. No entanto, ela se declara muito preocupada com os futuros efeitos do conservadorismo em duas áreas específicas, caso Bolsonaro se reeleja: o meio ambiente e o STF (Supremo Tribunal Federal).
"O próximo presidente poderá indicar dois ministros para o Supremo", diz ela. "Imagine o efeito disso."
Elena aguarda a posição de sua candidata no segundo turno, que deve ser divulgada até terça-feira. Se Simone apoiar Lula, existe a expectativa de que parte de suas propostas para a economia possa ser levada para o PT.
O economista Nelson Marconi, que atuou na coordenação econômica nas campanhas de Ciro Gomes (PDT) em 2018 e 2022, também não acredita que a melhora da economia explique o resultado.
"No levantamento que encomendamos, dá para ver que o governo Bolsonaro injetou cerca de R$ 450 bilhões na economia neste segundo semestre, com medidas em diferentes áreas, então, as pesquisas teriam de estar muito erradas para não captarem isso antes", diz Marconi. "Acredito que ocorreu outro movimento, mais ligado a agenda dos costumes."
Marconi garante que o seu candidato não vai apoiar Bolsonaro, mas ainda não tem uma definição sobre um eventual apoio a Lula.
O economista Edmar Bacha, um dos pais do Plano Real, espera uma reação petista nos próximos dias. "Lula precisa dar uma guinada dramática ao centro se quiser segurar essa onda conservadora", diz Bacha, histórico apoiador do PSDB que participou da campanha de Tebet para "ajudar na construção da terceira via".
Para o economista, Lula precisa atuar para fortalecer sua coalizão no segundo turno.
Membro da Academia Brasileira de Letras, Bacha tem forte atuação nos bastidores do debate econômico como sócio-fundador do Casa das Graças, um instituto de estudos de política econômica no Rio de Janeiro voltado à promoção de debates sobre o desenvolvimento do Brasil. Neste ano, no entanto, preocupado com os rumos da política, assumiu uma posição mais pública.
Bacha diz que o primeiro passo do PT é concentrar esforços em São Paulo, onde Fernando Haddad (PT) chega ao segundo turno com 35,70% dos votos válidos, abaixo do que previam as pesquisas. O ex-ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas (Republicanos), apoiado por Bolsonaro, terminou o primeiro turno na frente, com 42,32%.
"Foi isso que fez a diferença para Bolsonaro, e será preciso reverter essa situação", afirma ele.
Petista histórico e ex-ministro do Planejamento e da Fazenda, o economista Nelson Barbosa, costuma estar em campos opostos aos colegas egressos do PSDB. Desta vez, porém, concorda com a importância das alianças mais amplas.
"Pelo aspecto político, o resultado indicou que Lula estava certo em construir uma frente ampla, pois só assim há chance de derrotar Bolsonaro", afirma Barbosa, que é colunista da Folha.
No segundo turno, Barbosa acredita, essa frente será mais ampla, com colaboração de pessoas que apoiavam Tebet e Ciro.
O economista Arminio Fraga, ex-presidente do BC (Banco Centra) e colunista da Folha, destaca que uma revisão na estratégia do PT é importante também por causa do perfil que a eleição deu ao Legislativo. "Bolsonaro sai muito forte no Congresso", diz ele. "Erros monumentais precisam ser corrigidos."
Cartas pró-democracia são lidas na Faculdade de Direito da USP
O PL de Bolsonaro ganhou ao menos 23 deputados, chegando a 99. Tornou-se a maior bancada eleita na Câmara nos últimos 24 anos. A sigla terá praticamente um em cada cinco votos , consolidando-se como um ator essencial nas negociações políticas entre os deputados. Terá praticamente um em cada cinco votos entre os deputados, consolidando-se como um ator essencial nas negociações políticas.
Um terço do Senado foi renovado, e.o resultado também consolida o PL como a maior bancada. Terá 14 cadeiras, 5 a mais do que tinha no primeiro semestre deste ano, e ainda pode chegar a 15. Entre os eleitos estão ex-ministros bolsonaristas, como Damares Alves (Republicanos-DF) e Rogério Marinho (PL-RN).
Sócio-fundador da Gávea Investimentos, Fraga prefere a a discrição e não gosta de exposição pública. Neste ano, porém, à medida que o cenário político ficava mais tenso, aderiu a movimentos de apoio ao equilíbrio institucional.
Em agosto, numa atitude inédita, discursou no evento da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da USP (Universidade de São Paulo), em que foi lançado um manifesto de apoio à democracia.
O economista Bernard Appy, que foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda na gestão de Lula, chama a atenção para a necessidade de alianças mais conservadoras para exercer o governo em caso de vitória.
"Será preciso levar a coalizão mais para o centro não apenas para ganhar a eleição, mas para garantir a governabilidade em caso de vitória", afirma ele. "Há muito a ser feito, em várias áreas, principalmente na economia, que depende do Legislativo."
Diretor do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), Appy integra o Grupo de Seis, que redigiu propostas de reformas para os presidenciáveis em diferentes áreas. Também fazem parte os economistas Francisco Gaetani, Marcelo Medeiros e Pérsio Arida, o professor Carlos Ari Sundfeld (FGV Direito SP) e o cientista político Sérgio Fausto. Eles redigiram uma proposta de governo com reformas, entregue aos presidenciáveis
*Texto publicado originalmente na Folha de S. Paulo
Eleições 2022: 'Economist' fala em 'vitória com gosto de derrota'
BBC News Brasil*
A eleição presidencial brasileira ocupou posições de destaque em portais da imprensa internacional — com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em geral, sendo apresentado como vitorioso, mas sem força suficiente para garantir uma vitória no primeiro turno sobre o presidente Jair Bolsonaro (PL).
A seguir, confira como alguns dos principais veículos de imprensa do mundo noticiaram a eleição presidencial brasileira, cujo segundo turno será disputado em 30 de outubro.
'Vitória com gosto de derrota'
A revista britânica The Economist, que deu destaque em seu site para o resultado do primeiro turno da eleição presidencial brasileira, abre sua reportagem principal afirmando que para o ex-presidente Lula, foi uma "vitória com gosto de derrota".
O texto destaca que Bolsonaro se saiu melhor do que o esperado, e que o momentum agora está com ele, e não com Lula — lembrando que muitos aliados do presidente foram eleitos para o Congresso.
Diante deste cenário, a reportagem afirma que se Lula vencer, pode ter dificuldades para governar.
"Isso terá implicações a longo prazo. Mesmo que Bolsonaro perca a presidência, o bolsonarismo parece uma força que chegou no Brasil para ficar."
E diz ainda que o "segundo turno será um teste para as instituições brasileiras".
"Especialmente se Lula acabar vencendo por uma margem estreita, e Bolsonaro se recusar a aceitar o resultado."
'Grande golpe para brasileiros progressistas'
O jornal The Guardian, também do Reino Unido, destacou que Lula foi vitorioso no primeiro turno, mas com desempenho insuficiente. O título de uma das matérias principais do site, que transmitiu os resultados da eleição brasileira em tempo real, dizia: "Ex-presidente Lula ganha em votos, mas não com vitória definitiva".
"O resultado da eleição foi um grande golpe para os brasileiros progressistas que estavam torcendo por uma vitória enfática sobre Bolsonaro, um ex-capitão do Exército que atacou repetidamente as instituições democráticas do país e vandalizou a reputação internacional do Brasil", diz um trecho da reportagem.
Pesquisas julgaram mal força dos conservadores
O jornal americano The New York Times, que criou uma página de transmissão ao vivo de informações sobre a eleição brasileira em seu site no domingo, destacou na página principal que Bolsonaro e Lula vão para o segundo turno.
A reportagem do site do jornal começa afirmando que Bolsonaro teve um desempenho melhor do que o previsto por analistas e pesquisas de intenção de voto — que, nas últimas semanas, "sugeriram que ele poderia até perder no primeiro turno".
"Durante meses, pesquisadores e analistas disseram que o presidente Jair Bolsonaro estava fadado ao fracasso."
"Em vez disso, Bolsonaro estava comemorando. Embora seu adversário, Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente de esquerda, tenha terminado a noite na frente, Bolsonaro superou em muito as previsões e levou a disputa ao segundo turno", acrescenta o texto.
A reportagem cita ainda as eleições estaduais e legislativas, dizendo que "as pesquisas pareceram julgar mal a força dos candidatos conservadores em todo o país."
Ainda assim, o jornal afirma que, nas próximas quatro semanas, Bolsonaro terá que abrir vantagem sobre Lula, que saiu na frente no primeiro turno.
"O presidente de direita está tentando evitar se tornar o primeiro presidente no cargo a perder sua candidatura à reeleição desde o início da democracia moderna no Brasil em 1988."
A publicação destaca ainda que a eleição de 30 de outubro é considerada "a votação mais importante em décadas para o país" — "vista como um grande teste para uma das maiores democracias do mundo".
Para muitos brasileiros, o impensável aconteceu
O Washington Post também destacou no topo de sua página principal que o Brasil teria um segundo turno, afirmando que "o próximo turno colocará Bolsonaro, um incendiário contrário a regulações (pelo Estado) que é chamado de versão brasileira de Donald Trump, contra seu inimigo político, da Silva, líder do Partido dos Trabalhadores".
"A eleição chamou atenção global como o mais novo palco para a luta mundial entre a democracia e o autoritarismo", diz uma parte do texto.
O jornal também mencionou a disparidade entre as pequisas de intenção de voto, que "mostraram consistentemente que Bolsonaro perderia — e perderia feio", e o resultado nas urnas.
"Para muitos brasileiros, o impensável já aconteceu", afirma o texto.
E avalia que o Brasil entra agora em um período "potencialmente desestabilizador" até o segundo turno.
"O país mergulhará agora no que pode ser seu momento politicamente mais incerto desde que deixou o jugo da ditadura. O medo que muitas pessoas já sentiam ao entrar nesta eleição — medo da violência, medo do futuro do país — só aumentará nas próximas semanas."
Feridas continuam abertas
O jornal Público, de Portugal, destacou na manchete "Brasil vai ao 2º turno. Lula vence por 6 milhões de votos" — e trouxe ainda no topo do seu site várias matérias e artigos, além de um editorial com título "Brasil: as feridas continuam abertas".
O Diário de Notícias também publicou no site várias notícias sobre a eleição brasileira, incluindo a manchete "Lula e Bolsonaro vão ao segundo turno".
Já o francês Le Monde destacou o resultado no Brasil como manchete do site: "Eleição presidencial no Brasil: Lula à frente de Bolsonaro, com segundo turno a ocorrer em 30 de setembro".
O subtítulo acrescentava: "Com 48% dos votos, o representante do Partido dos Trabalhadores, antigo chefe de Estado de 2003 a 2010, tem quatro pontos e meio de vantagem em relação ao presidente de extrema direita".
Na América Latina
No México, maior país da América Latina depois do Brasil, um dos principais jornais do país, o El Universal, também colocou como manchete o resultado da eleição brasileira: "Lula e Bolsonaro definirão a presidência do Brasil em segundo turno".
O colombiano El Tiempo manchetou que "Lula da Silva e Jair Bolsonaro irão ao segundo turno".
Eleição surpreendente e apertada
Na Argentina, o jornal Clarín destacou na manchete o resultado da eleição brasileira como inesperado: "Eleição surpreendente e apertada: Lula ganhou mas irá a disputa com Bolsonaro". O jornal trouxe ainda no topo do site uma seção com informações em tempo real sobre a eleição brasileira.
Final com suspense
O La Nación também trouxe na manchete a surpresa do resultado:
"Final com suspense no Brasil. Lula ganhou, mas a surpresa foi Bolsonaro e haverá mais uma rodada de votação."
*Texto publicado originalmente no site BBC News Brasil
Revista online | Editorial: O calendário da democracia
Estamos às vésperas do primeiro turno das eleições gerais deste ano, momento propício para fazer o balanço das tarefas postas para candidatos, partidos e eleitores situados no campo da democracia, na resistência, portanto, aos esforços governistas de romper ou avariar os pilares do estado democrático de direito no país. Essas tarefas se distribuem ao longo do tempo, em etapas bem demarcadas pelo calendário eleitoral.
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O primeiro objetivo consiste na vitória eleitoral sobre o candidato do governo, no primeiro ou no segundo turno. Para tanto, é urgente, em primeiro lugar, praticar a campanha em prol do comparecimento às urnas, combater, consequentemente, o absenteísmo eleitoral no círculo de parentes, amigos e conhecidos. Em segundo lugar, persistir nos argumentos em favor do voto válido. Convencer o maior número possível de concidadãos a fugir do voto em branco e do voto nulo, uma vez que atitudes de recusa do conjunto de partidos e candidatos não são compatíveis com o momento presente, de alto risco para a democracia. Finalmente, levar com empenho, para o maior número possível de pessoas, o argumento do verdadeiro voto útil: toda opção é legítima e louvável, do ponto de vista da democracia, exceto o voto no candidato do governo.
A presente eleição é singular, ou seja, ao contrário das anteriores, o inesperado pode ocorrer, entre a proclamação dos resultados e a posse dos eleitos. Não faltaram, ao longo dos últimos quatro anos, ameaças, abertas e veladas, de confronto com a vontade dos eleitores, a pretexto da possibilidade fantasiosa de fraude eleitoral em benefício de candidatos da oposição. É fundamental, portanto, apoiar com serenidade e firmeza a Justiça Eleitoral, ao longo da apuração e após o anúncio dos resultados. Toda tentativa de contestação a esses resultados deve ser repudiada de público por todos os atores do campo democrático.
Confira, a seguir, galeria de fotos:
Finalmente, o sucesso na eleição e na garantia do seu resultado resultará na posse dos eleitos. Abre-se então a terceira fase de recuperação da democracia no país, a reconstrução das instituições. Essa etapa exigirá um acordo amplo, construído de forma aberta e transparente, em torno dos pontos cruciais da agenda democrática, pontos que devem unificar todas as forças desse campo, independentemente de seu posicionamento enquanto governo ou oposição.
Há que reparar a arquitetura institucional do país, com um esforço de reforma direcionado com maior ênfase para todos os setores que demonstraram vulnerabilidades, após três décadas de operação à sombra das regras da Carta de 1988.
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