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Política Democrática: ‘Bolsonaro foi deputado de inexpressiva atuação em quase 30 anos de mandato’, diz Marina Silva

Em artigo publicado na revista Política Democrática online de dezembro, a ex-senadora avalia como a falência do modelo político brasileiro provocou a eleição do candidato do PSL à Presidência da República

Por Cleomar Alemeida

A falência do modelo político brasileiro, com as principais forças políticas representadas pelo PT e PSDB, levou à eleição de Jair Bolsonaro à Presidência da República, na avaliação da ex-senadora Marina Silva (Rede). Em artigo publicado na revista Política Democrática online de dezembro, ela ressalta que, até se eleger para o maior posto do Executivo brasileiro, Bolsonaro foi um “deputado de inexpressiva atuação em quase 30 anos de mandato.

» Acesse aqui a revista Política Democrática online de dezembro

“Foi justamente a falência do modelo político brasileiro, a meu ver, que possibilitou a eleição de Jair Bolsonaro, deputado do chamado ‘baixo clero’ de inexpressiva atuação em quase 30 anos de mandatos”, destacou Marina Silva, que também é ambientalista. “Essa falência não se deu de um dia para outro. Desde a redemocratização, as principais forças políticas representadas pelo PT e pelo PSDB, dois partidos da social-democracia que foram incapazes de produzir um alinhamento político mínimo que fosse”, afirmou.

No artigo, Marina Silva acentua que PT e PSDB “travaram uma guerra sem tréguas, em que a conquista e a manutenção do poder se sobrepunham aos interesses mais legítimos da sociedade brasileira, e se aliaram com a direita para governarem”. “O Brasil necessitava que se sentassem à mesa para construírem uma plataforma de governo conjunta, ou uma agenda básica de reformas, ou, no mínimo, um acordo para manter regras num jogo saudável da oposição democrática e civilizada. Ao contrário, protagonizaram ao longo de duas décadas uma polarização política destrutiva que acabou favorecendo a emergência de projetos autoritários que ameaçam a democracia”, disse.

Na avaliação da ex-senadora, o PT, que ela chama de “polo vencedor da disputa”, acabou assumindo e representando todo o sistema político. “Fica a ponto de gerar nova polarização: no lugar de PT x PSDB, revelou-se luta de morte PT x Anti-PT. O principal ponto de inflexão na formação de um crescente sentimento antipetista foi a revelação de que o partido, que nasceu para defender os mais pobres e a ética na gestão pública, após 14 anos no poder, era o protagonista dos maiores escândalos de corrupção da história do Brasil, como o Mensalão e o Petrolão, além de diversos outros”, ponderou.

Em outro trecho, Marina Silva observou que “as forças conservadoras que deram sustentação à candidatura de Bolsonaro são numerosas e enraizadas na história e na sociedade brasileira”. “Destacam-se aqui parcelas expressivas dos militares, agronegócio, elite financeira e empresarial e segmentos religiosos. Vale atentar para que diz o professor Eduardo Viola, da UnB, sobre a base religiosa que aderiu fortemente à candidatura de Bolsonaro: para além das questões ligadas a valores e costumes morais, este segmento tem maior aderência a uma visão econômica mais liberal, na qual a lógica do esforço pessoal e do mérito individual é mais bem-aceita que a ênfase na dependência da ação do Estado e da caridade alheia”.

No artigo, a ex-senadora avaliou o uso de rede social pelo presidente eleito. “Ficou internacionalmente conhecido o uso massivo de redes sociais, especialmente do WhatsApp, onde a campanha de Bolsonaro propagava em escala industrial as chamadas fake news contra os demais candidatos. Por sua relevância, essa estratégia, capaz de dar grande vantagem eleitoral, exige uma análise à parte, que, aliás, vem sendo feita em nível internacional, pois está na base da eleição de Trump, no Brexit e outros episódios de relevância mundial”.

 

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Maurício Huertas: Das fake news ao fake gov. Será o início do fim?

Eu suspeitei desde o princípio: os discursos e as ações não combinavam. Aquele moralismo propagandeado era falso. Agora as desculpas esfarrapadas tornam evidente o estelionato eleitoral.

Toda a campanha foi marcada pelo roto falando do rasgado. Era a direita chucra e truculenta atacando a esquerda burra e calhorda. Tudo farinha do mesmo saco da velha política. Duas gangues armadas (e desalmadas) na disputa de sempre, no vale tudo pelo poder. Ganhasse quem ganhasse, perderia o Brasil.

Das fake news ao fake gov, quanto tempo ainda vai durar a espuma dessa onda de popularidade do "mito"? A casa começou a ruir. O novo presidente nem tomou posse e já há claros sinais de imperícia e ingovernabilidade. Não bastavam ministros réus e apoiadores suspeitos, denúncias consistentes atingem em cheio o núcleo da família Bolsonaro. As respostas parecem tiradas do manual de qualquer advogado de porta de cadeia, falas reeditadas de Lula, Dilma e companhia petista. Aliás, quando todos se farão companhia?

Não chega a ser uma metamorfose ambulante para quem já não esperava nada desse futuro governo impostor. Mas para a maioria de seus eleitores, será. Nem tanto para os bolsominions, com aquela velha opinião formada sobre tudo, porém eles são minoria dentro dos 57,7 milhões de brasileiros incrédulos ou de boa fé que elegeram Jair Bolsonaro, que parece cada vez mais dizer agora o oposto do que disse antes (perdão, Raul).

Quando vai cair a ficha do povão? E o que restará diante de mais desesperança? Que reação veremos desencadeada perante um novo sentimento de frustração? Qual a saída para o Brasil? Surgirão novos movimentos cívicos nas redes e nas ruas? Parece lógico que aqui está reservado o papel de uma oposição democrática e republicana, que ajude a preservar as liberdades individuais e os direitos coletivos diante da ameaça do caos. Tô dentro!

Se a mera expectativa de poder já provoca uma disputa aberta nas hostes bolsonaristas, com brigas internas e acusações num nível tão indecoroso e rasteiro, imagine quando o governo enfrentar problemas concretos, resistência externa e começar a desmoronar de vez. Vai ser um salve-se quem puder! Aí sim teremos um risco real e objetivo às instituições. Precisamos, com a Constituição nas mãos, seguir atentos e vigilantes contra oportunistas e revanchistas, à direita e à esquerda. Xô, golpistas!

Lembro que em determinado período dos governos petistas, entre os primeiros indícios do mensalão e as condenações do petrolão, dizia-se que o presidente Lula tinha cobertura teflon, aquela substância antiaderente que recobre as panelas, porque parecia que nenhuma denúncia grudava nele. Bolsonaro vive um momento similar. Seu pré-governo parece aquele "joão-bobo", tradicional brinquedo inflável de criança que apanha, inclina, balança mas insiste em permanecer de pé. O problema é que basta um furo para o ar vazar e a brincadeira acabar. Viveremos um 2019 de fortes emoções. Não sabe brincar, não desce pro play.

*Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS/SP, líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do Blog do PPS e apresentador do #ProgramaDiferente


Bernardo Mello Franco: Novo documentário sobre 2016 ajuda a entender 2018

Estreia nesta semana o 3º documentário sobre o impeachment. A queda de Dilma já parece pré-história, mas o filme ajuda a entender como Bolsonaro se elegeu

Estreia na quinta-feira “Excelentíssimos”, o terceiro documentário sobre o impeachment de Dilma Rousseff. A derrubada da ex-presidente já parece pré-história, mas o filme mantém interesse pelo que viria a seguir. As cenas captadas em 2016 ajudam a entender o processo que desembocou na vitória de um candidato da direita radical em 2018.

O diretor Douglas Duarte chegou a Brasília com o objetivo de mostrar os bastidores do Congresso. A crise o convenceu a abandonar o roteiro original. O foco passou a ser a articulação para varrer o PT e a esquerda do poder.

Com a promessa de que o filme só seria exibido depois da votação, os deputados adotam uma sinceridade incomum em conversas gravadas. “Eu vou ser franco com você”, diz o emedebista Carlos Marun. “Fosse o que dissessem lá, eu votaria a favor do impeachment. Se dissessem lá que ela roubou um picolé, eu votaria”, admite.

No discurso oficial, a razão do processo de impeachment eram as pedaladas fiscais. Mais tarde, Marun seria recompensado com o cargo de ministro do governo Michel Temer.

Em outra sequência, o documentário acompanha uma reunião fechada em que líderes partidários contam votos para derrubar a presidente. Mendonça Filho, do DEM, interrompe a conversa para saber se os microfones estão abertos.

Diante da resposta afirmativa, a equipe é convidada a deixar a sala. Entre os novos deputados presentes, dois virariam ministros de Temer. Um terceiro, Onyx Lorenzoni, chefiará a Casa Civil de Jair Bolsonaro.

O presidente eleito foi um coadjuvante no impeachment, mas tem papel de destaque no filme. Numa comissão dominada por ruralistas, ele se refere a líderes sem-terra como “vermes” e “carrapatos”. Seu filho Eduardo chama o presidente da Contag de “vagabundo”.

As cenas gravadas no gramado em frente ao Congresso mostram como os Bolsonaro estavam afinados com o humor das ruas. Numa passagem que ilustra a fúria contra o sistema político, deputados pró-impeachment tentam confraternizar com os manifestantes, mas são convencidos a voltar sob uma chuva de pedradas.

Durante a votação decisiva, manifestantes de verde e amarelo urram palavrões contra o PT e seus aliados. “Sua bicha!”, reage um homem ao ouvir o voto de Jean Wyllys, do PSOL. “Fora, Dilma, sua p...”, grita uma mulher ao festejar o resultado final. No lado derrotado, o descontrole aflora quando uma militante chama o deputado José Carlos Aleluia, do DEM, de “fascista” e “bandido assassino”.

“Excelentíssimos” fica devendo bastidores do grupo afastado do poder. Dilma só aparece em solenidades no palácio e numa rápida saída, cercada de seguranças. O deputado Sílvio Costa desponta como voz solitária do governismo. Numa fala tragicômica, ele desdenha da oposição. “Sabe qual é a probabilidade de ter impeachment? É a mesma de eu casar com a filha do Obama. Zero!”, garante.

Um discurso de Temer mostra que os vencedores também fizeram previsões furadas. “O povo precisa colaborar e aplaudir as medidas que venhamos a tomar”, diz o vice ao virar presidente. Não foi exatamente o que aconteceu.


Cacá Diegues: O futuro depois da eleição

Só posso entender clara vitória de Bolsonaro como uma punição que o povo resolveu dar ao país, sobretudo às suas elites governantes

Como se supunha que fosse acontecer, Jair Bolsonaro foi eleito presidente da República. Não há mistério algum em saber quem ele é, não preciso sussurrar num tom de voz conspiratório que ouvi dizer isso ou aquilo dele, do que disse ou andou fazendo. O que ele é, o próprio Bolsonaro nos revela em tantos vídeos que ele mesmo grava ou deixa gravar para exibição pública.

Através desses vídeos, ficamos sabendo que ele considera a ONU uma perigosa reunião de comunistas; que afastaria o Brasil do Acordo de Paris; que pretende resolver a polarização radicalizada da sociedade brasileira eliminando um dos lados, aquele que chama de “vermelho”, dando a seus ativistas a opção de deixar o Brasil ou ir para a cadeia. Os mesmos vídeos nos quais seu filho Eduardo, deputado como ele, afirma que um cabo e um soldado são suficientes para fechar o Supremo Tribunal Federal, confirmando a anedota pessimista do jurista Nelson Hungria: “Acima do Supremo, só os tanques e as baionetas”.

Os vídeos nos mostram que Bolsonaro prefere um regime autoritário e é a favor da tortura, tratando como herói um célebre torturador dos porões de nossa ditadura, Carlos Alberto Brilhante Ustra. O ex-capitão adotou, como slogan de sua campanha à Presidência, a frase patriótica e religiosa: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”. Como dificilmente o Senhor vai se dar ao trabalho de descer à Terra para ajudá-lo a governar o país nesses próximos quatro anos, só restará a Bolsonaro se auto-nomear delegado d’Ele, autorizando a si mesmo os gestos que julgar que Deus praticaria.

Nada do que é dito nos parágrafos anteriores é fofoca, disse me disse com a intenção de prejudicar a imagem de um candidato legitimamente eleito pelo povo do país. Tudo foi dito por ele mesmo, ao vivo ou em vídeos que tratou de difundir pelos programas digitais dos quais participou em campanha. Uma novidade inteligente, pois o mundo digital cria novas tecnologias e faz o raciocínio analógico único envelhecer.

Como não acredito que existam 60 milhões de brasileiros que pensam desse modo, que tenham pelos outros brasileiros sentimento tão destrutivo, só posso entender essa clara vitória de Bolsonaro como uma punição que o povo resolveu dar ao país, sobretudo às suas elites governantes. É como se dissessem à população que estão cansados de serem iludidos, de ouvir promessas que não se cumprem, de sofrerem calados à espera de uma remissão que nunca chega. Chega de incompetência, chega de malfeitos, chega de corrupção, chega de brincadeira com a felicidade do povo, agora vai ser pau puro, vocês que se danem.

Não me venham com a velha história de que o povo foi enganado, de que não faz ideia de quem são esses caras. Pela alegria que vejo nas ruas, o povo votou consciente, era isso mesmo o que ele queria. Os eleitores de Bolsonaro não são militantes de nenhum partido, nem ativistas de nenhuma ideologia, não têm uma cartilha doutrinária pela qual rezam sua doutrina. Ideologia de emergente é ascensão social, e não luta de classes. E o “perigo comunista” acabou há muito tempo, hoje só existe como pretexto para golpes de Estado.

Apenas os eleitores se cansaram e só nos resta respeitar sua decisão. Eles quiseram punir o Brasil pela distância entre a imagem ideal do país e o que ele é de fato. Quem não estiver de acordo, que se prepare para a oposição que a democracia lhes dá o direito de exercer. A democracia que obriga o poder a aceitar a diferença, sem exigir nenhuma submissão do pensamento, apenas o respeito às regras e às leis.

Em 1776, a Revolução Americana inaugurou a democracia moderna. Mas foi na França, em 1789, um século antes da Proclamação da República no Brasil, que a ideia de democracia foi formulada com mais precisão, através de mote célebre: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. A liberdade se tornou uma reivindicação básica do capitalismo; e a igualdade, do socialismo. Sempre esperei que o Brasil resolvesse o impasse inventando a fraternidade dos tempos modernos, resolvendo com uma face humana o confronto contemporâneo entre o indivíduo e a sociedade, o direito de sermos o que somos sem fazer mal a ninguém, de bem com todos. Ainda temos o direito de sonhar.


Mauricio Huertas: Presidente Bolsonaro, conte comigo… na oposição!

Dentro da normalidade democrática, a alternância de poder é salutar. Um aditivo republicano que evita que os políticos se perpetuem nos cargos, com os mesmos vícios, e garante a soberania exercida pelo povo.

Portanto, eleito Jair Bolsonaro pela vontade da maioria do eleitorado brasileiro, dentro das regras da democracia, resta a quem não votou nele nem acredita neste “novo” presidente, como é o meu caso, ser oposição em todos os 1.461 dias do seu governo.

Essa é, inclusive, uma garantia para a manutenção das nossas conquistas e para o bom funcionamento das nossas instituições. Que sigamos vigilantes e mobilizados na luta contra qualquer retrocesso.

Porém, aqui entra um detalhe importante que nos diferencia do tradicional oposicionismo petista, patenteado desde os anos 80: o Brasil precisa de uma oposição responsável, não meramente ideológica ou recomendada pelo marketing estratégico e eleitoreiro de ser “do contra”. Sistemático deve ser o papel fiscalizador da oposição, jamais o “quanto pior, melhor”, o ódio, o revanchismo ou a intransigência.

Para levantar uma situação objetiva, concreta: se houver o encaminhamento correto das reformas estruturais tão necessárias para reorganizar o modelo de gestão do país, entre outras urgências, é preciso debater com seriedade, fazer os ajustes cabíveis e também ajudar a aprová-las. Ou não?

A fiscalização ao governo deve ser diária, permanente, minuciosa e disciplinada, para que os arroubos totalitários demonstrados durante a campanha não tenham sido nada além de bravatas e peças de retórica. Para que nenhum abuso seja cometido. Para que nenhum direito seja suprimido. Para que nada que não esteja previsto constitucionalmente seja imposto, sob qualquer pretexto, sem o devido amparo do estado democrático de direito.

O fato é que só agora vamos saber de verdade quem é o presidente Bolsonaro, pois conhecemos apenas o candidato de um partido fictício (que nesta eleição se tornou o segundo maior do Brasil) e teve limitada a sua presença em raros debates no 1º turno, com pouquíssimo tempo de propaganda oficial e mobilidade cerceada desde o dia 6 de setembro pelo atentado cometido contra ele. O fenômeno, o mito, vai ter que descer do pedestal, arregaçar as mangas e botar os pés no chão.

Chegou a hora, afinal, de descobrir o que tem a oferecer aquele seu tão propalado “posto Ipiranga” para a economia e o desenvolvimento do Brasil. O que ele pretende para a Reforma da Previdência, por exemplo? E para a Educação? Vai continuar com essa bobagem de fundir a Agricultura com o Meio Ambiente, sem entender que muitas vezes terá que mediar interesses antagônicos do agronegócio e da sustentabilidade? Como enfrentará o que chama indevidamente de “coitadismo” de negros, gays, mulheres e índios? Teremos ativistas perseguidos? Liberdades ameaçadas? Minorias desassistidas?

Como o presidente vai se portar diante das exigências formais do cargo? Respeitará a independência e a harmonia dos poderes? Como será a relação com esse Congresso sabidamente conservador, fragmentado e fisiológico? Que tipo de reação terá com uma oposição que se anuncia ruidosa e rigorosa? Como vai se desenrolar a Operação Lava Jato e outras investigações do tipo contra a corrupção envolvendo políticos e partidos, muitos dos quais também vão estar na sua base de sustentação?

Outra coisa importante, que descobriremos com o tempo, é como o governo vai reagir quando essa onda bolsonarista baixar – o que é natural – e o presidente deixar de surfar nesses índices gigantescos e fenomenais de popularidade. Os problemas corriqueiros do dia a dia, as frustrações, a burocracia para ver implantadas as suas ideias. Até que ponto irá a paciência da população que buscou eleger um salvador da Pátria? Cadê as soluções mágicas para a insegurança e o desemprego? Por que segue aumentando a conta de luz, a passagem do ônibus e o preço do feijão no supermercado?

Então é isso, presidente. Parabéns pela sua eleição, mas saiba que a partir de 1º de janeiro de 2019 acaba a festa e começa a cobrança e o trabalho duro. Conte comigo… na oposição! Sempre! Não pretendo dar um dia de trégua na fiscalização. Mas não vou torcer pelo seu insucesso, ao contrário. O Brasil não merece outro governo interrompido pela incompetência, pela irresponsabilidade, pela mediocridade ou pela falta de caráter de seus mandatários.

Vamos testar na prática a sua conhecida truculência. Que tenha ficado para trás, pelo bem de todos. Falo por mim, neste artigo assinado, mas sei que posso estar representando o pensamento de muitos, que por ora se recompõem em partidos reformulados e nos movimentos cívicos, nas redes e nas ruas. Nosso reencontro está marcado para 2022, nas urnas, democraticamente. E que Deus nos proteja dos fantasmas do passado que rondaram a sua eleição e insistem em nos assombrar.

*Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS-SP, diretor executivo da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do Blog do PPS e apresentador do #ProgramaDiferente


Míriam Leitão: Democracia nunca foi uma planície

Foi muito longa e penosa a estrada que nos deu o voto direto. Quem for eleito hoje governará nos limites da ordem democrática que construímos

Hoje, 147 milhões e 300 mil brasileiros farão História. São os que estão aptos a votar. Quem não for, ou votar nulo, também está dentro desse universo de decisão. Jamais deixarei de me emocionar em momentos assim. Foi muito longa e penosa a estrada que nos deu o voto direto. A democracia brasileira nunca foi uma planície. É como se tivesse que ser conquistada de novo a cada momento. Ela se expande, toma susto, é desafiada, volta a crescer, encontra obstáculo, supera. Sempre será essa incompleta obra coletiva. Como um tecido que fiamos juntos e os pontos às vezes se rompem.

Temia-se, desta vez, o desinteresse. Não foi o que tivemos. Houve momentos desta campanha em que parecia não haver outro assunto possível. O envolvimento é parte fundamental da renovação dos laços com o regime democrático. Saímos desta jornada exaustos, mas o país se engajou nesta escolha e o tema central passou a ser a própria democracia. Pelos cenários feitos, havia uma lista dos temas que certamente seriam os mais relevantes — e continuam sendo — segurança, educação, crise fiscal, desemprego. Mas o país se dividiu, discutiu, brigou pela democracia em si. Ela foi boa até aqui? Fez um bom trabalho? Tem defeitos? É frágil? É robusta?

A resposta é sim para todas as perguntas acima, apesar de parecer contraditório. É boa, fez um bom trabalho, tem defeitos. É frágil e robusta ao mesmo tempo. Fatos assustadores pareciam ser o prenúncio de volta do que o Brasil viveu. Sexta-feira foi o dia de ver de perto algo impensável. A repressão aos protestos em universidades. É da natureza dos jovens o debate acalorado que os mais velhos podem até achar radical, mas a ausência de liberdade de pensamento e manifestação nega a própria essência da universidade. O tempo cuidará de moderar o jovem, mas nada resgatará o que, alienado, não tiver olhos para nenhuma causa coletiva.

Tivemos, ao longo da República, períodos de democracia interrompidos por surtos autoritários. Foi assim no Estado Novo. Foi assim no regime de 1964-1985. Alguns preferem chamar de ditadura civil-militar. Respeito os argumentos, mas só os generais foram presidentes. O máximo a que um civil chegou foi à Vice-Presidência e o destino de Pedro Aleixo não nos deixa ter ilusões de que o poder fosse compartilhado.

Não falarei da dor dos que viram a face mais dura daquele governo, mas evidentemente a tenho em mente neste momento. O que parece mais relevante, contudo, foi o caminho que nos levou de volta à democracia. Houve fatos memoráveis. Falarei de um. O “Não” de Ulysses Guimarães e de Barbosa Lima Sobrinho, na anticandidatura de 1973-74, parecia um ato quixotesco, até exótico. Para que fazer campanha por todo o país para uma escolha que já fora tomada? Era uma luta tão perdida. O próximo presidente seria Ernesto Geisel. Estava decidido. Por que o deputado discursava pelo Brasil? Só quem, em momento pessoal de grande aflição, ouviu Ulysses prever a volta da democracia — “Alvíssaras, meu capitão, terra à vista” — pode entender o valor daquele ato político. As urnas se encheram de voto no antigo MDB na eleição seguinte. Além de acalmar os aflitos, o cálculo eleitoral do velho funcionou perfeitamente. Mas, depois, veio novo susto: o fechamento do Congresso, em 1977. E outros. E bombas no Riocentro.

Nunca houve planície. Foi de altos, baixos, solavancos e quedas a caminhada até a votação dentro daquele mesmo colégio eleitoral, usando a arma do regime contra o regime, que Tancredo Neves foi eleito. E, de novo, veio o susto. O que impediu as Forças Armadas e os porões ainda abertos a voltarem após a morte de Tancredo? A democracia já era forte ao nascer.

O Brasil fez então sua Constituinte. E, de novo, a palavra de Ulysses: “Conhecemos o caminho maldito. Rasgar a Constituição. Trancar as portas do Parlamento. Garrotear a liberdade. Mandar patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério.”

A democracia renegociou a dívida externa deixada pelos militares, venceu a hiperinflação, aumentou a inclusão de brasileiros, ampliou o espaço de decisão, tem combatido a corrupção. Há ainda uma lista interminável de tarefas. Nunca será um caminho plano. Será sempre trabalhoso e desafiador viver a democracia. Mas a alternativa é o “caminho maldito”. O que for eleito hoje governará nos limites da ordem democrática que construímos.


Luiz Carlos Azedo: Como melar uma eleição

“O PT subiu o tom dos ataques a Bolsonaro, que enfrenta o pedido de cassação de sua candidatura feito pela campanha de Haddad, por suposto abuso de poder econômico nas redes sociais”

O pedido de impugnação da candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) por abuso de poder econômico e uso de caixa dois no primeiro turno, tendo por base o seu suposto envolvimento com empresas privadas que financiaram o impulsionamento de fake news contra o candidato do PT, Fernando Haddad, tem o objetivo de melar a eleição. Bolsonaro tem 18 pontos de vantagem em relação ao petista e somente um fato novo, como o que está sendo criado pelo PT, poderia produzir condições para reversão dessa dianteira.

O PT fez uma jogada muito comum no movimento sindical, onde as eleições costumam ser “judicializadas” quando uma chapa se vê em grande desvantagem às vésperas do pleito. Aproveitou-se de uma denúncia do jornal Folha de S. Paulo para deslegitimar os 49,2 milhões de votos obtidos por Bolsonaro no primeiro turno, com argumento de que houve fraude na utilização do WhatsApp como ferramenta de campanha. Com isso, submeteu o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a uma tremenda saia justa, pois cabia à Justiça fiscalizar o pleito e detectar as supostas irregularidades, o que não aconteceu.

O ministro Jorge Mussi, corregedor do TSE, não teve outra alternativa a não ser dar prosseguimento à ação apresentada pela campanha do petista, mas rejeitou todos os pedidos de investigação e quebra de sigilo feitos pelo PT. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que também é a procuradora eleitoral, foi igualmente instada a tomar providências, no caso, solicitou uma investigação da Polícia Federal.

O pleito principal do PT é a cassação dos direitos políticos de Bolsonaro por oito anos e a anulação dos seus votos, o que traria para a disputa de segundo turno o terceiro colocado, Ciro Gomes (PDT), que obteve 13,3 milhões de votos. O pedetista entraria na disputa uma semana antes da votação, prazo exíguo para tirar a diferença 18 milhões de votos que o separa de Haddad, que foi votado por 31,3 milhões de pessoas. Esses números são relevantes porque revelam as intenções dos respectivos eleitores, que não podem ser desconsideradas pela Justiça Eleitoral.

Se a denúncia tivesse sido feita antes do primeiro turno, quando os fatos supostamente ocorreram, seria mais factível a impugnação da candidatura ou a anulação do pleito. Depois da contagem dos votos, é muito difícil reverter uma situação como a descrita na denúncia. Nenhum eleitor admitirá que votou manipulado num pleito em que ninguém sofreu coerção nas seções eleitorais e o voto foi secreto.

O melhor exemplo é o julgamento da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, acusada de abuso de poder por Aécio Neves (PSDB), o tucano derrotado pela ex-presidente nas eleições de 2014. Mesmo com “abundância de provas”, segundo o relator, a maioria do TSE, então presidido pelo ministro Gilmar Mendes, rejeitou o relatório que pedia a cassação da chapa. Como Dilma já havia sido afastada do poder pelo impeachment; nesse caso, quem poderia ser cassado era o presidente Michel Temer.

Liminares
Não foi à toa, portanto, que o ministro Jorge Mussi rejeitou o pedido de liminares antes de se ouvir a outra parte, anunciando que agirá com cautela para não influenciar os rumos da eleição. Baseado em reportagens jornalísticas, segundo o ministro, os fatos apontados não permitem neste momento demonstrar a veracidade das suspeitas. Em tese, os impulsionamentos pagos por empresas podem ser considerados doações ilegais. Mussi pretende examinar a questão em “momento próprio” e deu um prazo de cinco dias para que Bolsonaro preste esclarecimentos.

Com a denúncia, o PT ganhou novo ânimo e subiu ainda mais o tom dos ataques a Bolsonaro, elevando a temperatura. A rigor, a denúncia passou a ser um novo divisor de águas da campanha, que possibilita a “vitimização” de Haddad e a retomada da narrativa de que o país está em risco de assistir à derrocada da democracia e a ascensão, pelo voto, do fascismo. Nas redes sociais, essa ofensiva é fundamental para neutralizar Bolsonaro: primeiro, porque inibe sua campanha nas redes; segundo, por dar mais moral à militância petista.

O problema dessa estratégia é que ela exacerba os setores mais radicalizados da campanha de Bolsonaro, que revidam os ataques do PT com igual ou maior truculência. Esse clima de radicalização não é nada bom para a democracia, porque abre espaço para a contestação futura da legitimidade do presidente que vier a ser eleito. É obvio que essa avaliação parte do pressuposto de que a denúncia morrerá na praia; se isso não ocorrer, e Bolsonaro for cassado, o que é muito improvável, o país corre risco de convulsão, porque os eleitores de Bolsonaro não são fake e se indignarão.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-como-melar-uma-eleicao/


Filmes debatem fatos políticos e históricos no mês das eleições

Programação do Cineclube Vladimir Carvalho vai tratar sobre ditadura chilena, João Goulart, Revolução de 30, campanha de Bill Clinton e Segunda Guerra

Por Cleomar Rosa

Brasil, Chile, Estados Unidos e Polônia serão representados na programação de outubro do Cineclube Vladimir Carvalho, no Espaço Arildo Dória, no Conic, próximo à Rodoviária do Plano Piloto de Brasília (DF). As sessões, realizadas sempre às terças-feiras, seguem o cronograma e a proposta de difusão de conhecimento e cultura da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), mantenedora do cineclube. A entrada é gratuita.

No mês das eleições, os filmes vão tratar de fatos políticos e históricos como a situação política e social chilena na época do ditador Augusto Pinochet, o presidente João Goulart que foi eleito democraticamente e deposto, a Revolução de 30 no Brasil, a campanha presidencial de Bill Clinton e a história de um jovem ligado à frente nacionalista durante a Segunda Guerra Mundial.

O filme NO (Chile) vai abrir a programação no dia 2 de outubro. No dia 9, o público poderá conferir a Revolução de 30 (Brasil). A exibição de Dossiê Jango acontecerá no dia 16, The War Room (Estados Unidos) será a atração do dia 23, enquanto Cinzas e Diamantes (Polônia) vai fechar a lista de filmes exibidos no mês no dia 30. As sessões terão início às 18h30 e, ao final de cada uma, haverá roda de conversa sobre o tema do filme exibido.

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Dirigido por Pablo Larrain, em 2012, o filme NO mostra que, em 1988, no Chile, o governo ditatorial convoca um plebiscito para perguntar se a população apoia os militares. Um militar fica responsável pela campanha do Não, com ideias ousadas para convencer o povo a acabar com o regime militar. O filme tem classificação de 12 anos e 1h58 de duração.

O filme de Larrain tem relação com o episódio de outubro de 1972, que serviu como um marco para o regime militar chileno. Na época, os caminhoneiros paralisaram o país pela primeira vez, protestando contra a autoridade nacional do transporte. A crise econômica impulsionou os militares a depor o então presidente do país, Salvador Allende, um ano depois.

Já Dossiê Jango retrata a situação vivida por João Goulart, presidente eleito no Brasil democraticamente, mas que acabou deposto. O filme traz a questão de sua morte misteriosa à tona e tenta esclarecer fatos obscuros da história do país.

O filme Revolução de 30, dirigido por Sylvio Back, em 1980, no Brasil, é uma colagem de mais de 30 documentários e filmes de ficção dos anos 1920, com cenas inéditas do histórico episódio de destituição do então presidente Washington Luís e de ascensão de Getúlio Vargas ao governo do país. É permitido para pessoas com idade a partir de 14 anos e tem 1h58 de duração.

No caso brasileiro, outubro de 1930 serviu como período de intensas movimentações e mudanças políticas. No dia 24 daquele mês, a junta provisória militar assumiu o comando do país, após depor Washington Luís com apoio de grupos que fizeram incursões armadas no território nacional. Getúlio Vargas assumiu o governo dez dias depois com apoio da junta, que lhe transferiu o poder.

Eleições e Segunda Guerra Mundial

Don Alan Pennebaker é quem dirigiu o documentário The War Room, em 1993, nos Estados Unidos, mostrando como os “generais” George Stephanopoulos e James Carville e seus colaboradores revolucionaram a campanha presidencial de Bill Clinton, em 1992. O grupo articulou uma das grandes viradas políticas americanas. O filme tem 1h36 de duração.

Em outubro de 1992, à véspera da eleição para presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton se encorajou ainda mais, fortalecendo sua imagem perante o seu eleitorado. Ele foi eleito o 42º presidente dos EUA, no dia 3 de novembro daquele ano. Ele recebeu quase 45 milhões de votos, 43% do total. George Bush, que tentava a reeleição, teve 38%.

Já o drama Cinzas e Diamantes, de 1958, e com direção de Andrzej Wajda, mostra a história de um jovem rebelde ligado à frente nacionalista. No último dia da Segunda Guerra Mundial, ele recebe a missão de assassinar um líder comunista. Perturbado pela transformação repentina de aliados em inimigos, o jovem decide aproveitar a vida por uma noite, quando se apaixona por uma garçonete e pensa em desistir da luta.

Com capacidade para 65 lugares, o Cineclube Vladimir Carvalho fica na parte superior do Espaço Arildo Dória, dentro da Biblioteca Salomão Malina – mantida pela Fundação Astrojildo Pereira. Todos os filmes serão exibidos em uma tela de projeção retrátil de 150 polegadas, com imagem de ótima qualidade. Participe!

 

 

 

 


Cristovam Buarque: Governo em parceria

Governar é a arte de enfrentar ou a arte de concertar. Promover a disputa entre os interesses da sociedade ou ter habilidade para combinar parceria com todos os agentes sociais. E a arte da parceria deve assumir que o Estado existe para servir ao público, não o contrário.

No lugar de fomentar a união com a sociedade, os últimos governos do DF promoveram enfrentamento entre partidos, sindicatos, servidores, usuários, empresários, contribuintes e o público. Negociaram para chegar ao Buriti e, depois de eleitos, fizeram acordos com deputados para atender aos pedidos deles. Acataram reivindicações de sindicatos, fizeram disputa entre siglas de partidos e acertos com empresas, usando dinheiro público e deixando os usuários dos serviços em filas.

A consequência foi o sacrifício do contribuinte, seja por superfaturamento para beneficiar empreiteiras, com obras desnecessárias e ineficientes, seja pelo aumento de remunerações e rendas, sem cuidar da qualidade do atendimento ao público. O resultado foi a falência da máquina do governo, que não consegue cumprir suas funções por falta de recursos.

As relações dos últimos governos do DF com os deputados distritais foram de favorecimento, com nomeações que nem sempre respeitavam o mérito para o cargo. A arte da parceria exige o diálogo respeitoso com os parlamentares, mas sempre pautado no interesse público, não em compromissos eleitorais. O mérito e a dedicação de nomeados são mais importantes que as opções partidárias deles.

A corrupção é exemplo do desrespeito ao público, mas a ineficiência e o desperdício também são consequência da falta de parceria entre público e governo. Se ela existisse, o governo do DF não teria cometido a insensatez de gastar quase R$ 2 bilhões na construção do Estádio Nacional de Brasília. Foi o desprezo ao público e ao contribuinte que permitiu o vergonhoso desperdício, com suspeitas de superfaturamento e pagamento de milhões de reais em propinas.

O DF teve uma experiência de governo parceiro: a implantação da faixa de pedestre foi possível graças à parceria entre o governo, o Correio Braziliense, a Rede Globo, motoristas e pedestres, que desenvolveram o respeito a uma simples tinta no chão. A Bolsa Escola foi uma parceria entre mães, professores e governo, para que as crianças não faltassem às aulas. A responsabilidade fiscal, que deixou as finanças do governo sólidas, entre 1995 e 1998, foi uma prova de respeito ao contribuinte, mesmo que não tenha atendido a reivindicações corporativas, nem erguido obras gigantescas. A adoção e a execução do orçamento participativo também foram exemplos bem-sucedidos dessa união de forças.

Nosso desafio em 2018 será eleger um governo que exerça a arte de uma grande parceria entre os agentes sociais. A arte de respeitar e dialogar sem ceder à força dos empreiteiros, nem ao capricho dos sindicatos; proteger o contribuinte e os usuários com austeridade que evite desperdícios e excesso de gastos, garantindo-lhes a máxima qualidade nas obras e nos serviços.

Nada impede que, este ano, outro governo seja eleito com a filosofia de exercer a arte da parceria entre agentes da sociedade: Executivo e Legislativo a serviço do público; contribuintes satisfeitos com a eficiência e a austeridade; servidores motivados e comprometidos com usuários. O governo sendo o maestro que combina pagar bem aos servidores sem sacrificar os contribuintes, oferecendo serviços com competência, respeito e dedicação. Um governador que conviva com seu vice e todos os parlamentares, com respeito entre si e deles com o povo.

Para isso, a eleição em si deve ser uma parceria entre eleitores e candidatos, para a escolha de políticos que, depois de eleitos, sejam capazes de se tornar parceiros do público. O primeiro passo para isso é preocupar-se menos com as siglas de partidos que disputam as eleições e mais com as propostas apresentadas pelos candidatos realmente comprometidos com o bem da população e com o crescimento do DF. (Correio Braziliense – 19/06/2018)

 


Cristovam Buarque: Mesmos compromissos

Na semana passada, ao descer do apartamento onde moro desde 1980, encontrei minha vizinha Maria José Conceição, a conhecida Maninha, que foi a criadora e executora do programa Saúde em Casa, quando Secretária de Saúde do meu governo entre 1995-98. Há quase 40 anos, somos vizinhos no mesmo bloco na Asa Norte. De maneira simpática, ela e o Toninho, seu marido, que foi Secretário de Administração, reclamaram da foto nas redes sociais que me colocou ao lado de políticos do DF que já estiveram em lados diferentes daquele em que ela e eu estávamos. A pressa para um compromisso meu em Arniqueiras não permitiu aprofundarmos o debate sobre outra foto em que eu deveria estar na eleição deste ano e, com isso, recomendar o voto do eleitor.

Não seria na foto dos que desistiram, achando que tudo ficou igual e corrupto na política; não seria na foto dos que ainda se consideram os únicos donos da cor vermelha; nem dos que se negam a fazer uma autocrítica diante dos erros éticos, políticos e estratégicos que cometeram.

Até pouco tempo atrás, ela e eu, e uma imensa legião de militantes idealistas, fazíamos parte do chamado bloco vermelho da política do DF, que se opunha ao bloco azul. Nestes 25 anos, a política no Brasil passou por um terremoto ideológico e moral. A pureza ética do bloco vermelho foi manchada; muitos se afastaram por causa disso; outros, ao perceber que a crise moral tinha uma causa anterior: a perda de substância do bloco vermelho para fazer as necessárias reformas estruturais de que o povo precisa, principalmente na educação; nem as reformas econômicas e sociais para o Brasil não ignorar as transformações que ocorrem no mundo. Partidos que se diziam de esquerda perderam substância transformadora, antes de perder a vergonha.

Deixaram de perceber mudanças fundamentais na realidade, desejos novos da população, especialmente dos jovens; de perceber a realidade da globalização, da robótica, da importância decisiva da educação, do empreendedorismo e da inovação. A velha esquerda ficou reacionária para os novos tempos da civilização; deixou de ser vanguardista no entendimento da realidade e nas propostas para transformar a realidade. Ao se opor às transformações na realidade e nos sonhos dos jovens, o vermelho amarelou. A velha esquerda não entendeu que não se faz justiça social sem economia eficiente e sem equilíbrio nas contas públicas; não entendeu que a robótica exige novas leis nas relações do capital com o trabalho; nem percebeu que as elites dirigentes usaram o Estado para servir aos seus interesses, quebrando as finanças públicas, deixando Previdência e fundos de pensão arruinados; não entendeu que o Estado foi privatizado e colocado a serviço do partido no poder, de empreiteiras, de políticos e de sindicatos, sem colocar os órgãos estatais a serviço do público.

Hoje, o “lado certo” está com aqueles que, não importa a sigla partidária, defendem a ética no exercício do poder, colocam os interesses do povo e do público na frente dos empresários, dos deputados e senadores, dos partidos e dos sindicatos; usam as mais modernas ferramentas para fazer os serviços públicos mais eficientes; têm menos preocupações com obras e mais com os serviços.

Para tentar levar adiante esses compromissos, é preciso não cair na omissão, o que é uma tentação, sobretudo para quem nenhum benefício pessoal recebe do cargo político, nem mesmo salário. A alternativa não é se unir àqueles que não entenderam as transformações em marcha. O que está em jogo não é apenas lutar por bandeiras antigas, mas construir as novas bandeiras que o mundo exige. Nosso antigo lado perdeu substância no comportamento e nas propostas, na política e na ética. A pergunta não é mais como continuar no mesmo lado, mas quais são os sonhos e os projetos do lado certo neste momento; e ter coragem de dar o passo em direção a ele.

Na administração de 1995-98, Maninha não precisou de obras caras para melhorar a saúde; conseguiu isso com saneamento, levando o atendimento médico às casas dos doentes e com boa gestão nos hospitais. Mas esse período em que fui governador e Maninha, secretária, só foi eleito porque contou com o apoio do PSDB, na eleição de 1994. Eu vou continuar insistindo, tentando, com os compromissos de sempre, com as ideias adaptadas à realidade, mantendo os sonhos e em fotos com aqueles que quiserem se unir comprometidos por um grande encontro por Brasília, olhando para o futuro.

 


Luiz Carlos Azedo: Candidato a Messias

A pesquisa MDA/CNT desta semana continua alimentando cenários eleitorais. Os principais mostram que o deputado Jair Bolsonaro, que ontem se filiou ao PSL, tem quase assegurada uma vaga no segundo turno das eleições. Essa afirmação é controversa porque alguns analistas acreditam que seus votos estão consolidados e ele estará mesmo numa segunda rodada de votações. Bolsonaro é o candidato de extrema-direita, com um discurso contra a corrupção e a criminalidade, a favor dos “valores da família”, como anunciou o senador Magno Malta (PSL-ES).

Na pesquisa, Bolsonaro tem de 20% a 20,9%, dependendo do adversário. Qualquer um deles enfrentará dificuldades para derrotá-lo, seja Marina Silva (Rede), seja Ciro Gomes (PDT), seja Geraldo Alckmin (PSDB), que estão embolados na disputa para enfrentá-lo. Corre por fora Álvaro Dias (Podemos), que cresce no Sul do país. Marina Silva se mantém no páreo, apesar da crise na Rede. Cresce de 7% para 12% quando Lula sai da disputa, mas Bolsonaro sobe de 16% para 20%.

Os dois estão herdando os votos do petista. No caso de Marina, essa é uma deriva natural da parcela do eleitorado petista que se identifica com a ex-seringueira e ex-senadora que se elegeu pela legenda no Acre. No caso de Bolsonaro, desloca-se o eleitor de mais baixa renda que acredita em salvador da pátria. Ontem, na cerimônia de filiação ao PSL, Bolsonaro não se fez de rogado: “Eu sou o messias. Jair Messias Bolsonaro”, discursou.

A palavra “messias” deriva do termo hebraico almashita, significava “ungido”, ou seja, alguém marcado na testa com óleo sagrado para realizar cerimônias religiosas. Com o passar do tempo, passou a descrever uma figura semidivina que deveria vir à Terra para resgatar seu povo. Para os judeus, “o salvador” deveria ser um rei descendente de Davi (que reinou no antigo Israel entre 1000 a.C. e 962 a.C.), com a missão de livrá-los da opressão estrangeira e implantar um mundo de justiça e salvação.

Quando o Novo Testamento foi escrito, em grego, no primeiro século da era cristã, a expressão mashiah foi traduzida como christos e se tornou o título de Jesus — ou seja, “Jesus Cristo” é o mesmo que “Jesus, o Messias”. Entretanto, o “messianismo” não se limita ao judaísmo e ao cristianismo, todas as grandes religiões do mundo têm uma figura messiânica, que virá para combater o mal e a injustiça, restaurando o paraíso sobre a Terra. Esse foi o sentido dado por Bolsonaro. No Brasil, tem a ver também com o “sebastianismo”, a crença de um salvador da pátria inspirado em Dom Sebastião, “O Desejado”, o jovem rei português que foi morto na batalha de Alcácer-Quibir, em 1578.

Eleição aberta

De onde vem a consolidação dos votos de Bolsonaro? Da extrema-direita saudosista do regime militar e dos evangélicos, mas também desse nosso “sebastianismo” lulista. Entretanto, Bolsonaro enfrenta dificuldades para seduzir os setores conservadores e liberais, que buscam uma alternativa mais moderada. A chamada direita progressista deseja modernizar a economia e aceita as mudanças dos costumes. Esses setores ainda estão em busca de uma alternativa. Marina não tem capacidade de seduzi-los, muito menos Ciro Gomes ou Álvaro Dias. A eleição está aberta, dependendo do cenário, de 38,7% a 42,1% dos eleitores não têm candidatos.

Quem pode atrair esses eleitores é o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que sobe de 6,4% para 8,7% com Lula fora da disputa. O governador paulista, porém, enfrenta um cenário muito pior do que o das eleições de 2006, quando disputou com o petista e foi para o segundo turno, mas teve menos voto do que no primeiro. Naquela ocasião, o senador Aécio Neves foi acusado de cristianizá-lo para se eleger governador de Minas. Agora, a situação é pior ainda, pois o petista Fernando Pimentel lidera as pesquisas e Aécio respira de canudinho por causa da Lava-Jato. Alckmin está sem palanque em Minas porque o senador Antônio Anastasia (PSDB-MG) não quer ser candidato ao governo.

Do outro lado do espectro político, a situação do PT é de quem vai pro mato sem cachorro. A legenda insiste na candidatura de Lula mesmo sabendo que ele está inelegível por causa da Lei da Ficha Limpa, que é autoexplicativa. Essa estratégia tem muito mais o objetivo de evitar a prisão de Lula do que viabilizar um candidato substituto. Em todos os cenários pesquisados, o ex-prefeito Fernando Haddad, que seria a alternativa petista, não passa de 2,4% das intenções de votos. Numa campanha curta, deixar a escolha para a última hora pode ser um haraquiri político, ainda mais se Lula estiver preso. (Correio Braziliense – 08/03/2018)


Mauricio Huertas: Hoje só nos resta desejar: Feliz 2019, Brasil!

Num 2017 que termina com o tal “insulto” natalino do presidente Michel Temer para um terço dos condenados na Lava Jato; com a liberação de um sorridente mensaleiro (Henrique Pizzolato, aquele que fugiu do Brasil se passando pelo irmão morto), juntando-se a outros indultados famosos, como José Dirceu, José Genoíno eJoão Paulo Cunha; com o mercado comemorando um reaquecimento ínfimo (que beneficia os investidores da bolsa, enquanto para o trabalhador o desemprego volta a subir, em plena época natalina); com a demissão de um ministro do Trabalho que ninguém sabe quem é (e a entrada de outro, idem!), isso num ano em que se aprovou uma reforma trabalhista e se discute a reforma previdenciária; só nos resta mesmo desejar aos brasileiros um Feliz 2019!

Se já sabíamos que entraríamos num período de transição no pós-impeachment de Dilma Rousseff, este 2018 será o auge desse rito de passagem. Com o agravante de uma eleição presidencial determinante, mas completamente imprevisível, num cenário de descrença generalizada nas instituições democráticas e republicanas, e um porto nada seguro para o novo ciclo que se iniciará com o resultado a ser proclamado em outubro de 2018.

O calendário do ano novo (novo?) está posto, com aquela estranha sensação de déjà vu logo na sua chegada: manifestações contra o aumento de 20 centavos no transporte público de São Paulo estão marcadas para 11 de janeiro (onde certamente teremos a monótona repetição de cenas de depredação e violência); além do julgamento de Lula em segunda instância no dia 24 de janeiro – e isso nos remete ao início deste texto, quando mencionamos o indulto concedido aos bandidos do Mensalão e da Lava Jato. Teremos afinal a condenação do chefe dessas duas quadrilhas? Ele estará afastado das eleições? Vai recorrer para sair candidato? Será preso ou responderá em liberdade?

Mas isso é só o começo de janeiro, neste ano (de novo: novo?) que entramos com ranço dos anos 70 e 80: afinal, temos Paulo Maluf e José Maria Marin atrás das grades; enquanto Jair Bolsonaro e Lulalideram livres, leves e soltos as pesquisas de intenção de voto. Nada mais emblemático destes velhos novos tempos. O que mais virá por aí entre o Carnaval, logo no início de fevereiro, a Copa do Mundo no meio do ano, seguida pelas campanhas eleitorais, a eleição em si e… 2018 vai voar!

De todo modo, será uma boa chance para a (re)definição dos campos partidários e talvez até para o necessário surgimento de novas lideranças. Crise é oportunidade, diz a sabedoria milenar. Esse último suspiro do (des)governo Temer – na súbita e típica melhora do paciente terminal antes da morte – pode clarear um pouco o horizonte político ao atrair para o seu entorno oportunistas de todas as matizes que se reunirão para dilapidar o que resta da máquina estatal. Do lado oposto, o vitimismo dos que construíram a narrativa do golpe e o queremismo redivivo do pai dos pobres.

Isso abre um flanco estratégico para uma candidatura equidistante do governo e da oposição tradicional, ambos comprovadamente quadrilheiros e indesejáveis para o país que desejamos construir para o futuro – e que aí sim poderemos estufar o peito e encher a boca para bradar: UM BRASIL NOVO! Renovado, reformado, recuperado, reestruturado, reconstruído.

Sem os Malufs e Marins, sem os Temers e Lulas, sem os Bolsonarosou Meirelles, políticos vetustos com novos disfarces, que tentam esconder a velha política com as suas práticas obsoletas, deletérias e condenáveis. Não precisamos de mais do mesmo! Basta de indultos aos maus políticos! Basta da complacência da sociedade com tudo aquilo que empurra o Brasil para o buraco, que arrasa com a nossa esperança por dias melhores e que coloca em risco a nossa jovem estabilidade democrática.

Se queremos felizes 2019, 2020, 2021 (…) precisamos construir isso nos próximos meses. Não vamos delegar aos mesmos enganadores e exterminadores de sonhos, o nosso futuro. Vamos assumir a nossa responsabilidade e exercer o nosso protagonismo para forjar a mudança que desejamos. Vamos criar, inovar, fazer nascer e crescer um novo Brasil! Já!

Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS/SP, diretor executivo da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do Blog do PPS e apresentador do #ProgramaDiferente