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El País: Embates na fronteira com a Venezuela colocam Brasil numa encruzilhada diplomática
Mourão e Araújo vão à Colômbia tratar da crise no país vizinho que respingou em Pacaraima e tem potencial de acender barril de pólvora. Apoio do Governo Bolsonaro a ação humanitária põe em risco tradição da diplomacia
As virtudes diplomáticas do vice-presidente Hamilton Mourão estão à prova na mediação da crise com a Venezuela que respingou em Pacaraima neste final de semana. A cidade na fronteira do Brasil ficou em intensa adrenalina durante o sábado e domingo ao servir de passagem para dois caminhões de ajuda humanitária que chegariam aos venezuelanos neste sábado. Houve barreira de soldados chavistas, deserção de alguns militares, compatriotas em solo brasileiro jogando pedras contra a barreira chavista, e o revide com bombas de gás lacrimogênio. "Nunca vi Exército de outro país jogar bomba de gás lacrimogênio no Brasil", afirmou à rede Globo o coronel do Exército José Jacaúna, que integra a chamada Operação Acolhida.
A surpresa de Jacaúna mostra o nível de tensão que se instalou na cidade fronteiriça de Roraima, num dos momentos mais preocupantes do continente nos últimos tempos. No sábado, quatro pessoas foram mortas por forças chavistas na cidade de Santa Elena de Uairén, a 15 quilômetros de Pacaraima, quando tentavam se aproximar da fronteira com o Brasil para receber a ajuda humanitária destinada aos venezuelanos. Depois de ataques tão próximos, especialistas veem com apreensão o desenrolar da crise. “O perigo ali na fronteira dos dois países são as faíscas que podem se formar num quadro extremamente delicado”, diz Rafael Villa, cientista político venezuelano que vive no Brasil há 25 anos.
Leia-se por faísca qualquer situação que avance para um ataque ao Brasil e que acenda a pólvora de um conflito onde entrariam outros protagonistas de peso, como os Estados Unidos, que pressionam pela saída de Nicolas Maduro, e Rússia, que apoia o sucessor de Hugo Chávez. “Este é um conflito com capacidade de se tornar internacional rapidamente, com envolvimento de grandes potências, e aí a destruição é garantida, num conflito que não é nosso”, sublinha Dawisson Belem Lopes, professor de Política Internacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Com o Brasil no meio dessa potencial reedição da guerra fria, Mourão seguiu para a Colômbia neste domingo junto com o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, onde se reunirão com outros presidentes da região e com Juan Guaidó, que ganhou o apoio de 50 países ao se autoproclamar presidente interino da Venezuela, em desafio a Maduro. O chanceler esteve em Boa Vista e Pacaraima ao lado de María Teresa Belandria, a embaixadora venezuelana designada pelo presidente interino Juan Guaidó para o Brasil. A diplomacia internacional vê um claro contraste entre o general da reserva, vice do presidente Jair Bolsonaro, e Araújo. Enquanto o primeiro conta com o traquejo da ações internacionais, seja em missão de paz no Haiti ou como adido militar na Venezuela, o chanceler abraça uma linha que representa uma quebra com a tradição diplomática brasileira de ser um agente conciliador, segundo especialistas. Neste sábado, ele chegou a divulgar um vídeo afirmando que umcaminhão de mantimentos que estava em Pacaraima havia atravessado a fronteira e alcançado terreno venezuelano, dando a entender que furara o bloqueio de guardas chavistas para levar a ajuda. A informação, no entanto, não procedia de todo, pois o veículo ficou numa área neutra entre os dois países e não avançou. Outro caminhão, de porte pequeno também chegou ao mesmo ponto, mas os dois precisaram dar meia volta sem levar a carga de medicamentos e alimentos – a maioria vinda dos Estados Unidos e uma parte do Brasil – para o outro lado da fronteira. “Não dá para imaginar jamais que um diplomata da velha cepa tomasse esse tipo de atitude incitando a população, fazendo vídeos da fronteira. Não tem propósito prático, é um engajamento que me parece leviano”, diz Lopes, da UFMG.
Em entrevista à BBC na semana que passou, Mourão optou por um tom mais ameno. “Nós jamais entraremos em uma situação bélica com a Venezuela, a não ser que sejamos atacados, aí é diferente”, diz ele. “Mas eu acho que o Maduro não é tão louco a esse ponto”, concluiu o general da reserva. O vice se manteve discreto ao longo do final de semana, assim como o próprio presidente Jair Bolsonaro. Contumaz tuiteiro, evitou falar da Venezuela mesmo quando foram registradas quatro mortes perto de Pacaraima. Tuitou sobre placas solares na região do São Francisco ou vagas no Exército, e nenhuma palavra sobre Maduro. Bem diferente de outros mandatários da região, como o presidente da Colômbia Ivan Duque, e do Chile Sebastián Piñera, que se reuniram com Guaidó em cidade colombiana de Cúcuta, onde houve um show em apoio aos venezuelanos, e que passaram o final de semana criticando Maduro nas redes sociais. Ernesto Araújo, contudo, esteve ali, e representou o Brasil na reunião entre os presidentes. “Ayuda y libertad!" Em Cúcuta, Colômbia, fronteira com a Venezuela, em reunião com os Presidentes da Colômbia, Chile e Paraguai e líderes venezuelanos. Grande momento de mobilização internacional pela Venezuela e apoio ao governo legítimo de Guaidó”, tuitou ele.
Até o momento, os militares brasileiros têm demonstrado bastante cautela com a operação de ajuda humanitária à Venezuela. Segundo a edição deste sábado do jornal Folha de S. Paulo, a própria definição do papel do Brasil na ação humanitária dividiu opiniões no Governo. De acordo com o jornal, Bolsonaro pediu reunião com os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e David Alcolumbre, respectivamente, para saber se o Brasil deveria enviar a ajuda humanitária à Venezuela. O encontro incluía seleto grupo de ministros de confiança e o presidente do STF, Dias Toffoli. Maia e os militares eram contra a participação do Brasil, segundo a Folha. Os demais foram favoráveis.
Ainda, segundo a Folha, os generais Santos Cruz e Augusto Heleno temiam emitir sinais equivocados caso o Brasil se envolvesse na crise da Venezuela neste momento, alertando que o país poderia estar sendo usado como isca para fomentar conflito e dar margem a uma intervenção militar dos Estados Unidos na Venezuela. Bolsonaro então teria se comprometido a não autorizar o ingresso de tropas americanas pelo território brasileiro e determinou que só liberaria o carregamento de mercadorias se todos os veículos e motoristas fossem venezuelanos. A contribuição material do Brasil também foi pequena. A grande maioria da ajuda humanitária foi doada pelos Estados Unidos. Mesmo com toda a prevenção, o temor é que a situação saia do controle, ainda mais com a pressão por uma eventual intervenção militar ansiada por Guaidó, que custaria bem pouco para os Estados Unidos, por exemplo, mas traria um risco incalculável para o continente e para o Brasil.
Por ora, a paciência dos militares que atuam em Pacaraima está sendo testada com relativo sucesso. Neste domingo, venezuelanos em território brasileiro lançaram pedras e outros objetos por uma meia hora contra os soldados da Guarda Nacional Bolivariana que formaram uma barreira para impedir a passagem da ajuda humanitária para a Venezuela. Houve também queima de objetos no interior de um posto militar venezuelano, segundo a agência AFP. Os militares chavistas, que se encontravam um pouco distantes do limite com o Brasil, decidiram chegar mais perto do solo brasileiro e atiraram as bombas de gás. Militares brasileiros, então, isolaram os manifestantes para evitar confronto, contou a correspondente do EL PAÍS Naiara Galarraga, o que esfriou os ânimos naquele momento. A dúvida é até quando é possível manter esse controle da situação.
Para Rafael Villa, o Brasil acabou indo a reboque dos Estados Unidos ao oferecer suporte na ação de ajuda humanitária. “Esperava-se que o Brasil assumisse um papel de responsabilidade, não o de ceder às pressões americanas, indo à fronteira”, diz ele. “Isso reafirma um papel diplomático secundário, demonstrando que a diplomacia brasileira está sem norte”, avalia o venezuelano, pós doutor por Columbia. Sem o papel de mediador de outrora, o país deixa um vácuo na região que desequilibra o jogo político.
El País: Crise de candidatos laranja se agrava, fecha cerco a PSL e complica Bolsonaro
Novas denúncias aumentam suspeita de uso irregular de verba pública na campanha. Notícia de que funcionário de Flavio repassava dois terços do salário a Queiroz eleva pressão sobre senador
A crise gerada pelas denúncias de que aliados de Jair Bolsonaro teriam utilizado recursos públicos na campanha de candidatos de fachada, somada às suspeitas de cobrança de "pedágio" a funcionários no gabinete do filho do presidente, Flávio Bolsonaro, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro ganharam mais força nos últimos dias com a divulgação de novos depoimentos e mensagens de envolvidos nos casos. Um assessor de Flávio admitiu em depoimento ao Ministério Público que transferia dois terços do salário a Queiroz todos os meses. Também foram divulgadas mensagens nas quais um assessor do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, cobrava a devolução de verbas a uma candidata que recebeu fundos partidários às vésperas da eleição. Além disso, duas candidatas do PSL teriam recebido expressivos repasses para produzir milhões de panfletos pouco antes do pleito. As novas descobertas, que começam a fechar o cerco ao PSL na crise das candidaturas laranjas, trazem mais complicações ao presidente, que nas últimas semanas vem tentando se descolar de uma série de escândalos envolvendo seus correligionários.
No centro da crise, estão as fortes suspeitas de um esquema de desvio de recursos públicos destinados ao PSL, partido de Bolsonaro. Parte dessa verba teria sido destinada a candidaturas de fachada por dirigentes da sigla. O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL), foi apontado no início deste mês pela Folha de São Paulo como patrocinador do esquema em Minas Gerais, onde foi reeleito deputado federal. Segundo o jornal, o agora ministro (que dirigia o diretório estadual do PSL) teria autorizado o repasse da verba partidária a quatro candidatas laranjas durante a campanha eleitoral, e a verba teria ido parar na conta de empresas ligadas aos seus assessores na Câmara.
O ministro nega as acusações, mas na última quarta-feira a ex-candidata a deputada estadual Cleuzenir Barbosa (PSL-MG) apresentou ao Ministério Público uma mensagem de Whatsapp na qual um assessor de Álvaro Antônio, Haissander de Paula, cobra a devolução de verba pública de campanha para destiná-la a uma empresa ligada a outro assessor do político. Em depoimento, Barbosa contou que foi pressionada a transferir a metade dos 60.000 reais que havia recebido do partido para a conta da gráfica de um irmão de Roberto Soares, também assessor do ministro.
Jair Bolsonaro não fez comentários públicos sobre as suspeitas envolvendo o titular do Turismo, mas o caso das candidaturas laranjas chegou a ser tema de conversa entre ele e o ex secretário-geral da presidência, Gustavo Bebianno. A pedido de Bolsonaro, Bebianno assumiu a presidência do PSL durante a campanha eleitoral do ano passado e foi peça fundamental para a eleição do presidente. Responsável por autorizar transferências feitas pelo diretório nacional a candidatos, ele nega que estivesse envolvido em qualquer esquema. Bolsonaro, porém, ofereceu tratamentos diferenciados aos dois ministros supostamente envolvidos nos escândalos. Na última segunda-feira, Bebianno foi demitido em meio à crise do Planalto, impulsionado por uma queda de braço travada publicamente pelo filho do presidente, Carlos Bolsonaro.
Verbas para milhões de panfletos a dois dias da eleição
O fato de duas candidatas do PSL haverem destinado recursos públicos para a confecção de mais de 10 milhões de panfletos a apenas dois dias antes da eleição inflamou ainda mais as suspeitas do desvio de verbas por meio de candidaturas laranjas. Nesta sexta-feira, O Globo publicou que o partido transferiu 268.000 reais nas vésperas do pleito para as campanhas das candidatas a deputada Gislani Maia (Ceará) e Mariana Nunes (Pernambuco), que gastaram praticamente todo o valor recebido da executiva nacional da sigla em gráficas entre os dias 5 e 6 de outubro.
Gislani foi a única a receber verba do partido no Ceará, embora houvesse outras 18 candidatas pelo partido no Estado. Ela disse ao O Globo que o material impresso continha imagens de outros candidatos, mas sempre a seu lado. A maior parte da despesa da candidata (103,2 mil reais) foi concentrada em uma única gráfica, a M C de Holanda Carvalho, cujo nome fantasia é EH 8 Comunicação Visual. Apesar do investimento, Gislani só conseguiu 3.501 votos. Em Pernambuco, o centro da polêmica envolve a candidatura de Mariana Nunes, que obteve apenas 1.741 votos mesmo tendo usado 127.800 reais na campanha, segundo a prestação de contas entregue à Justiça Eleitoral. A maior parte dos recursos (118.000 reais) foi transferida pelo partido poucos dias antes da eleição e quase tudo (113.900 reais) foi gasto em uma única gráfica para a confecção de cinco milhões de santinhos e um milhão de adesivos.
Novas suspeitas sobre Flávio
Nos últimos dias, as suspeitas que pairam sobre o senador Flávio Bolsonarotambém ganharam novos capítulos. O filho mais velho do presidente já enfrentava há meses denúncias de cobrança de "pedágio" aos funcionários de seu gabinete no período em que foi deputado estadual no Rio de Janeiro. Agora, também surgiram indícios de que uma funcionária de sua campanha pode ter sido remunerada com os recursos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). A revista Crusoé publicou nesta sexta-feira que teve acesso ao contrato de trabalho da promotora de eventos Valdenice Meliga como funcionária da liderança do PSL na Casa. O contrato teria sido firmado um dia depois de Meliga fechar acordo com o então líder do partido, Flávio, para gerir as contas eleitorais da sigla. Não há menção de remuneração por este trabalho na prestação de contas feita à Justiça Eleitoral. Os acordos, conforme a revista, determinam que Valdenice Meliga trabalharia de graça na campanha de Flávio ao Senado e acumularia um cargo na Alerj. O valor do salário dela na Casa, porém, coincide com os cerca de 5.000 reais que a própria funcionária teria estimado para os serviços prestados à campanha de Flávio.
Além disso, nesta semana o Estadão divulgou o primeiro depoimento colhido pelo Ministério Público do Rio sobre as movimentações bancárias atípicas entre funcionários do gabinete do senador, identificadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). O ex-assessor Agostinho Moraes da Silva admitiu que depositava mensalmente cerca de dois terços do salário que recebia na Casa — o equivalente a 4.000 reais — na conta de Fabrício Queiroz, ex-motorista do agora senador. Segundo Silva, as transferências eram um investimento na compra e venda de veículos exercidas por Queiroz. No depoimento, ele também afirmou que Queiroz lhe devolvia de 4.500 reais a 4.700 reais em espécie todos os meses, como retorno do negócio, e que não tinha conhecimento da existência de funcionários fantasmas no gabinete. Silva, porém, não apresentou documentos que comprovassem suas declarações nem explicou porquê Queiroz lhe devolvia o dinheiro em espécie e não por transferência bancária, por exemplo.
A principal suspeita das autoridades que investigam o caso é que o valor movimentado pelo motorista seja uma espécie de pedágio cobrado por parlamentares de seus funcionários: os depósitos na conta de Queiroz eram feitos por pelo menos 20 integrantes do gabinete de Flávio, e coincidiam com as datas de pagamento da Assembleia Legislativa do Rio. O confisco de salários é ilegal, mas bastante difundido em assembleias, câmaras e prefeituras do país. Na TV, Queiroz negou ser "laranja" dos Bolsonaro e afirmou que o dinheiro na sua conta, que o Coaf considerou incompatível com seus rendimentos, é proveniente de negócios realizados por ele com carros usados.
Flávio Bolsonaro também é investigado no caso, além de responder por evolução patrimonial irregular com a venda de imóveis tanto na esfera criminal quanto na eleitoral, em razão da declaração de patrimônio que concedeu à Justiça Eleitoral no ano passado. Na última quinta-feira, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, definiu que as investigações criminais devem correr em primeira instância, sem foro privilegiado. Em entrevistas que concedeu à televisão nos últimos meses, o filho do presidente tem negado seu envolvimento nas irregularidades. Queiroz e Flávio faltaram os depoimentos ao Ministério Público.
El País: Na fronteira da Venezuela com a Colômbia, distúrbios violentos e dezenas de deserções chavistas
A tentativa frustrada de levar remédios e alimentos a partir da Colômbia e do Brasil eleva a pressão sobre Maduro. Pelo menos 60 soldados venezuelanos abandonaram as Forças Armadas
Os venezuelanos viveram neste sábado outro ponto de inflexão no confronto entre o chavismo e a oposição a Nicolás Maduro. A operação do presidente interino Juan Guaidó nas fronteiras, que com o apoio direto ou a solidariedade da imensa maioria da chamada comunidade internacional busca introduzir ajuda humanitária no país, gerou um novo quadro à margem do resultado da convocação. A repressão impediu a entrega de remédios e alimentos dirigidos a 300.000 cidadãos em risco de morte, recusada de forma peremptória pelo sucessor de Hugo Chávez, que lhe atribuiu o peso de uma interferência dos Estados Unidos. A jornada elevou à tensão máxima as passagens fronteiriçoas da Colômbia, onde se registraram graves incidentes, distúrbios e ataques policiais.
Na cidade de San Antonio de Táchira, que faz fronteira com a cidade colombiana de Cúcuta, se produziram choques entre as forças de segurança, a população e os seguidores de Guaidó, quem na sexta-feira cruzou a fronteira para liderar o operativo em aberto desafio ao Governo que lhe havia proibido sair do país. Os agentes tentaram dispersar os manifestantes com gases lacrimogênio e balas. Houve episódios de violência no lado venezuelano das pontes de Tienditas e Simón Bolívar. Ao caos atribuído a membros de coletivos de paramilitares chavistas acrescentou-se a repressão dos militares em resposta aos manifestantes, que o chavismo considera responsáveis pelos distúrbios.
A tentativa de Guaidó, presidente da Assembleia Nacional que há um mês se declarou chefe de Estado interino, de quebrar a unidade dos militares, conseguiu mais de 60 deserções de agentes da Guarda Nacional Bolivariana e duas da Policial Nacional que custodiavam a fronteira. Entregaram-se às autoridades de Migração Colômbia e pediram refúgio no país vizinho.
Enquanto milhares de voluntários seguiam tentando fazer chegar ao país os carregamentos com ajuda, procedentes em sua maioria dos EUA, em Caracas uma multidão de manifestantes dirigia-se para a base aérea da Carlota. Chegaram a rodear ao meio-dia entre gritos de "soldado, escuta, una-se à luta". O respaldo das Forças Armadas é um ponto chave para alcançar o poder na Venezuela, onde o aparelho estatal está profundamente militarizado, e Guaidó leva semanas apelando à consciência de sua cúpula e bases para convencê-los de que deem as costas a Maduro.
Neste sábado, o presidente interino se reuniu em Cúcuta com alguns desses desertores. "Os soldados com quem falei responderam a seu desejo de vida e futuro para seus filhos que o usurpador não lhes garante. Soldado venezuelano, a mensagem é clara. Faça o que manda a Constituição. Terá anistia e garantias para quem se coloque do lado do povo", lembrou. Também lançou uma mensagem às bases chavistas ainda fiéis ao ex-presidente morto em 2013 e àqueles cada vez mais insatisfeitos com Maduro. Sua intenção é incorporá-los num processo de transição e por isso fez questão de que sua leitura "é de todos e por todos os venezuelanos". "Quero fazer um especial chamado ao povo chavista e a quem estiver perto de se somar ao lado da Constituição, da convivência democrática e o bem-estar para todos".
O que resta do Governo de Maduro também procurou uma imagem de exibição de força, como vem sendo habitual, para contraprogramar os atos da oposição. O mandatário compareceu junto ao palácio presidencial de Miraflores ante seus seguidores, em sua maioria empregados públicos. Assegurou que "reta formalmente" a seu adversário a convocar eleições e se esforçou em demonstrar que 30 dias depois, em referência à proclamação de Guaidó, "o golpe de Estado fracassou". Ao mesmo tempo, lançou-lhe uma advertência. "Haverá justiça na Venezuela. Para que haja paz haverá justiça", disse. Maduro aludia ao não cumprimento da ordem expressa, emitida pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), de que Guaidó não saísse do território venezuelano.
Em definitiva, o chavismo recorreu a seu manual de sempre, acusando os opositores de montar um "show" na fronteira e provocar os incidentes. "Perturbaram levando a guarimba [o protesto] ao povo de San Antonio. Queimaram um ônibus. Um show para perturbá-los e tirar a tranquilidade aos formosos povos da fronteira. Ontem [pela sexta-feira] me vi obrigado a fechar as pontes fronteiriças até um novo aviso e estou avaliando o que fazer. Vocês sabem que eu não temo a nada", disse antes de chamar os militares e às centenas de milhares de milicianos armados pelo Governo a se levantar caso algo lhe acontecesse.
El País: Governo Bolsonaro mantém plano de ajuda para Venezuela apesar da fronteira fechada
Operação para entregar alimentos e remédios permanece prevista para sábado. Vice-presidente Mourão e chanceler Ernesto Araújo vão a Bogotá debater crise
Desta vez o líder chavista Nicolás Maduro cumpriu seu aviso de fechar a fronteira e antes do prazo que ele mesmo havia dado. As autoridades venezuelanas fecharam por volta das 15h de quarta-feira (16h em Brasília) o principal posto de fronteira com o Brasil, o de Pacaraima, no Estado de Roraima, para impedir a entrada de um comboio de ajuda humanitária organizado por Juan Guaidó — reconhecido por vários países como presidente interino da Venezuela — e vários Governos liderados pelos Estados Unidos. O fechamento aconteceu seis horas antes do horário anunciado por Maduro e dois dias antes da data designada por Guaidó para a entrada dos insumos. “Já fecharam”, anunciou o governador de Roraima, Antonio Denarium, à imprensa local.
O Brasil mantém seus planos apesar da decisão de Maduro, como ressaltou o porta-voz do Governo em sua aparição diária. Depois de ordenar o fechamento da fronteira de 2.100 quilômetros com o Brasil e dizer que cogita fazer o mesmo na muito mais transitada fronteira com a Colômbia, o líder venezuelano disse: “Quero uma fronteira dinâmica, aberta, mas sem provocações, sem agressões, porque sou obrigado, como chefe de Estado, como chefe de Governo e como comandante-chefe das Forças Armadas, a garantira a paz e a tranquilidade”.
Com perfil baixo, o Governo brasileiro se juntou ao operativo internacional para introduzir medicamentos e alimentos na Venezuela no sábado, dia 23. Roraima é um dos estados mais pobres do Brasil e o desembarque de 95.000 venezuelanos criou enormes tensões com a população local, apesar de ser um número mínimo em comparação com os três milhões que deixaram sua pátria. E, além disso, a eletricidade do Estado de Roraima vem da Venezuela, uma questão importante na dinâmica bilateral.
Embora Maduro tenha ameaçado em várias ocasiões fechar a fronteira desde que começaram as tensões com o Brasil por conta do êxodo dos venezuelanos, somente em poucas ocasiões o trânsito na fronteira foi interrompido, explicou na quarta-feira pelo telefone um morador de Pacaraima.
Jair Bolsonaro pisou no freio em relação ao país vizinho. Seu Executivo foi um dos primeiros a reconhecer Guaidó, presidente da Assembleia Nacional, como presidente interino da Venezuela, mas esperou até segunda-feira para confirmar sua participação no envio de ajuda humanitária e até agora tem sido extremamente sucinto nos detalhes. Não se sabe quando e quanta ajuda fornecerá. Entre os poucos detalhes dados pelo Ministério das Relações Exteriores figura que os suprimentos serão carregados em caminhões venezuelanos e que cruzarão o posto de fronteira dirigidos também por venezuelanos, de acordo com o comunicado divulgado na noite de segunda-feira.
A atitude do Gabinete do ultradireitista contrasta com a alardeada mobilização dos EUA de Trump, que enviaram toneladas de ajuda humanitária a Cúcuta (Colômbia), o cenário principal da queda de braço entre Guaidó e Maduro. A ajuda humanitária tem uma dupla finalidade: aliviar a escassez, mas também tentar que os militares que guardam as fronteiras deem as costas ao regime deixando entrar os carregamentos.
Tampouco existe algo previsto em Pacaraima que seja semelhante ao show com várias estrelas desta sexta-feira, organizado por Richard Branson — ao qual Maduro pretende responder com outro show com músicos afins — no principal posto de fronteira entre Venezuela e Colômbia.
Para além da retórica do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o Brasil está administrando com cautela essa ofensiva política para derrubar Maduro. Junto com o chanceler, foi designado para participar na próxima reunião do Grupo de Lima, que agrupa praticamente toda a região, o vice-presidente, Hamilton Mourão. O general aposentado, que conhece bem o estamento militar venezuelano, pois foi adido militar na Embaixada do Brasil em Caracas, participará da reunião na segunda-feira com os representantes de praticamente todos os países da América Latina, com exceção do México, para discutir os próximos passos destinados a que Maduro deixe o poder.
El País: Maduro fecha fronteira da Venezuela com Brasil para barrar ajuda humanitária
Presidente da Venezuela estuda tomar medida similar em relação à Colômbia, por onde está previsto começar a entrar a ajuda humanitária
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, ordenou o fechamento da fronteira de seu país com o norte do Brasil, em meio à escalada da tensão pela iniciativa dos países que não o reconhecem mais como presidente, entre eles os EUA e próprio Brasil, impedindo-os de entregar medicamentos e alimentos aos venezuelanos numa operação planejada para começar no sábado, 23 de fevereiro. Inicialmente, o presidente venezuelano havia afirmado que a medida entraria em vigor às 20h da Venezuela (19h no horário de Brasília), mas acabou fechando a entrada seis horas antes do previsto, segundo o governador de Roraima, Antonio Denarium (PSL). O Governo Bolsonaro ainda não se pronunciou.
A tentativa de enviar ajuda humanitária aumenta a disputa entre Juan Guaidó, presidente interino e reconhecido por mais de uma centena de países, e Maduro, que já havia elevado o alerta militar nas fronteiras e agora decreta o fechamento completo do limite de 2.200 quilômetros que separam a Venezuela e o norte brasileiro. O mandatário "avalia", além disso, tomar uma medida semelhante em relação à Colômbia. "A partir de hoje fechamos a fronteira com o Brasil, [e tomamos] todas as medidas de segurança e até segunda ordem", afirmou."Quero que seja uma fronteira dinâmica e aberta, mas sem provocações, sem agressão, porque sou obrigado como chefe de Estado, chefe de Governo e comandante em chefe da FANB a garantir paz e tranquilidade", afirmou.
A situação de Roraima
A medida foi anunciada um dia depois que a vice-presidente da Venezuela, Delcy Rodriguez, anunciou o fechamento da fronteira aérea e marítima com as Antilhas Holandesas e afirmou que Caracas colocou "sob revisão" as relações com esses países. Colômbia, Brasil e Curaçao acumularam toneladas de ajuda humanitária enviadas para a Venezuela, que está passando por uma profunda crise econômica com escassez de alimentos e remédios que levou pelo menos três milhões de venezuelanos a emigrarem, segundo dados da ONU. Maduro se opõe à entrada da ajuda humanitária, que ele descreveu como "uma armadilha", com o argumento de que é uma estratégia dos Estados Unidos e aliados para violar a soberania da Venezuela.
O principal ponto de entrada da ajuda, no plano da oposição, é pela Colômbia. Guaidó viajou nesta quinta-feira em direção à fronteira de seu país com a divisa colombiana para comandar o operação de ajuda, marcada para o sábado. O presidente interino se juntará a uma caravana de ônibus com centenas de pessoas e até um show na cidade de Cúcuta, a principal da fronteira, está marcado em apoio à resistência a Maduro.
Na fronteira com o Brasil, mais precisamente no Estado de Roraima, também haverá movimentação. O Governo brasileiro também vai disponibilizar medicamentos e alimentos com recursos próprios para a população da Venezuela. Segundo o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, a ajuda será disponibilizada nas cidades de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, e em Boa Vista, ambas em Roraima, o Estado que mais recebe venezuelanos no país. Entre 2017 e 2018, o Brasil recebeu 111.000 venezuelanos. De acordo com o Governo federal, entram por hora no país 33 venezuelanos, em média. Aproximadamente, 800 por dia.
El País: Governo promete militares na reforma da Previdência para mitigar resistência
Derrota em projeto simples nesta semana, falta de articulação com o Congresso e sinais de aliados acenderam sinal de alerta no Planalto
Por Afonso Benites, do El País
Parte também da estratégia de mitigar a resistência, o Governo se comprometeu a enviar até o dia 20 de março dois novos projetos ordinários. Um que altera o regime de aposentadoria dos militares e outro que fecha o cerco contra os grandes devedores previdenciários, tudo para tornar mais palatável politicamente um projeto geral de mudança da Previdência, considerado duro contra a elite do funcionalismo público que se aposentará no futuro, mas também visto com reserva em alguns setores por abrir a possibilidade de benefícios e pensões abaixo do salário mínimo.
Nesta equação, a percepção de que também pagarão seu quinhão os militares, categoria da qual faz parte o presidente e que forma um núcleo poderoso no Governo, é importante. A ausência dos militares nesta primeira investida foi questionada intensamente por presidentes de dois dos partidos aliados de Bolsonaro: o deputado Marcos Pereira (PRB-SP) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI). “A ausência dos militares das Forças Armadas na proposta de reforma da Previdência enviada hoje por Bolsonaro à Câmara é um sinal ruim para a sociedade e pode dificultar o andamento da proposta entre os deputados”, declarou Pereira em seu Twitter.
Assista ao pronunciamento oficial sobre a nova previdência. Um forte abraço a todos!
O secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, disse que a proposta dos militares tratará de três temas principais: ampliará o tempo mínimo de contribuição de 30 para 35 anos, aumentará a alíquota de contribuição de 7,5% para 10,5%, e passará a cobrar esse mesmo percentual das pensões pagas a viúvas e filhas de militares – hoje, elas recebem o valor sem nenhum desconto. O mesmo assunto foi tratado, ainda que superficialmente, por Bolsonaro em um pronunciamento em rede nacional. Ele tratou a reforma como "justa" e disse ela cortará privilégios dos mais ricos. “Também haverá a reforma dos sistemas de proteção social dos militares. Respeitaremos as diferenças, mas não excluiremos ninguém. E com justiça: quem ganha mais, contribuirá com mais, quem ganha menos, contribuirá com menos ainda”, discursou na TV.
Com relação aos grandes devedores, o Governo pretende alterar as regras de refinanciamento de dívida dos grandes devedores e ampliar a cobrança desses débitos. O objetivo é ter uma vacina para um dos argumentos mais populares dos opositores de qualquer reforma previdenciária, o de que, caso essa cobrança fosse feita com maior empenho, as mudanças nas regras das aposentadorias seriam desnecessárias ou, ao menos, menos drásticas. O Governo calcula que dos 490 bilhões de reais em dívidas é possível receber até 160 bilhões, são os chamados créditos recuperáveis. A estimativa é que, em dez anos, a Previdência economize um montante de 1,07 trilhão de reais.
“Mesmo se em um ano a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional recuperasse essa dívida toda, não resolveria o problema da Previdência”, afirmou o chefe do órgão, o procurador-geral adjunto de Gestão da Dívida Ativa da União e do FGTS, Cristiano Neuenschwander. Conforme a procuradoria, atualmente há cerca de 4.000 pessoas estão cadastradas como grandes devedoras. São as que tem débitos superiores a 15 milhões de reais.
Crise potencial
A reforma da Previdência chega hoje ao Congresso Nacional, na forma de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Você sabe como ela vai tramitar? A gente explica aqui:
O Governo começa a maratona da tramitação da reforma da Previdência após ter recebido um sinal de alerta na Câmara. Na terça, a gestão foi derrotada com a revogação parcial de um decreto presidencial que alterava a Lei de Acesso à Informação. Para impedir a derubada, era necessário apenas maioria simples, mas os votos pró-Governo não chegaram nem a 60 votos. “É uma reforma difícil, mas necessária, que chega ao Congresso num momento em que o Governo está desarticulado, sem interlocução no ambiente da Câmara e entre os poderes”, afirmou o líder do DEM, Elmar Nascimento (BA).
Os opositores, por sua vez aproveitaram para ressaltar a dificuldade em unificar sua base. “Articulação? Talvez o presidente consiga alguma articulação quando ele conseguir articular três frases seguidas”, criticou a líder da minoria na Câmara, Jandira Feghali (PCdoB-RJ). Ao lado de outros parlamentares oposicionistas, ela reclamou principalmente do pagamento de apenas 400 reais para os cidadãos miseráveis, com mais de 60 anos, que passariam a receber o benefício de prestação continuada (hoje esse valor é de um salário mínimo a partir de 65 anos). Apontando a linha de combate da oposição à esquerda, ela também criticou a definição da idade mínima de mulheres que se aposentarem aos 62 anos de idade e da fixação da idade de 60 anos para os trabalhadores rurais e professores (independentemente do gênero).
Sobre essa divisão da base e da dificuldade em aprovar a proposta, o presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), quis soar otimista. Disse que o Governo conseguirá se unir novamente. “Não há um racha. Há muita unicidade e vamos estar juntos de toda a base aliada do Governo”.
Um dos estrategistas centrais na tramitação, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) seguiu na mesma linha. Ele amenizou as queixas dos opositores, que alegam que as mudanças no benefício de prestação continuada criarão um “país de idosos pobres”. “O eixo principal da reforma tenho certeza que, daqueles que sabem fazer conta, terá apoio de todo mundo”. Maia estima que até junho o projeto deve ser pautado para ser votado na Câmara –onde precisa de ao menos 308 votos em dois turnos para ser aprovado e enviado ao Senado. O secretário Marinho, contudo, é mais otimista. Ele estima que até julho, tanto os deputados quanto os senadores já terão se debruçado sobre o assunto e votado a PEC.
El País: Bolsonaro demite Bebianno, mas o elogia em vídeo, na tentativa de atenuar crise
Nota de demissão foi lida por porta-voz do Planalto nesta segunda. Desfecho sem sequelas depende de reação de ex-ministro e reverberação na base do Congresso
O presidente não detalhou quais seriam os desentendimentos ou interpretações equivocadas, o que foi lido como uma tentativa de evitar que Bebianno, de 54 anos, se torne um homem-bomba, já que, pela proximidade com o presidente e por ter coordenado toda a sua campanha eleitoral, teve acesso a informações que poucos tiveram
Influência da família e sequelas políticas
O desfecho com a demissão de Bebianno é uma tentativa de por fim aos ruídos no círculo mais íntimo da presidência enquanto o Governo tenta levar adiante agendas que dependem do Congresso, como a reforma da Previdência, cujo projeto deve ser enviado na quarta-feira. No entanto, os dias de idas e vindas e as mensagens públicas –e mais ou menos públicas– trocadas entre os protagonistas da novela sinalizam que pode haver mais capítulos.
A fritura de Bebianno começou na quarta-feira passada, quando o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), disse que o então ministro havia mentido que ele tinha conversado três vezes com seu pai pelo telefone para tratar das denúncias sobre candidaturas laranjas do PSL em Pernambuco. Reportagens da Folha de S. Paulo publicadas nas últimas duas semanas mostraram indícios de que o partido do presidente lançou candidaturas femininas de fachada apenas para atingir a cota de 30% de mulheres candidatas. Uma delas teria recebido 400.000 reais de fundo partidário e recebido apenas 274 votos.
Desde que o presidente sinalizou que demitiria Bebianno, o então ministro passou a fazer ameaças. Dizia que não pediria demissão e que não cairia sozinho. Por ora, Bebianno ainda não se manifestou sobre sua exoneração. Para amenizar eventuais críticas e para evitar que seu antigo assessor, o presidente chegou a oferecer dois cargos a ele: conselheiro na estatal Itaipu ou embaixador do Brasil em Roma. O primeiro cargo foi refutado por Bebianno, apesar de receber quase três vezes o salário de um ministro. O segundo estava sendo analisado. Até a conclusão dessa reportagem, não houve o anúncio sobre decisão do ex-ministro. Quando questionado sobre essa oferta, o porta-voz presidencial disse desconhecer essa informação.
Otávio Rêgo Barros também não soube dizer se Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG), o ministro do Turismo, que é apontado como patrocinador de candidaturas laranjas em Minas Gerais, também teria o mesmo fim que Bebianno. Nas redes sociais, apoiadores do presidente e família promoviam uma hashtag de apoio para sinalizar que a crise estava debelada.
Agora, resta saber se haverá sequelas da decisão de Bolsonaro, para além da reação do ex-ministro. Na semana passada, tanto o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, como a ala militar do Governo defenderam Bebianno. No caso de Maia, foi explícita à crítica sobre a influência do filho de Bolsonaro nos rumos do Governo, e nos bastidores os militares avaliavam o mesmo. "(É um) risco muito grande pra um Governo que precisa analisar a liderança, unidade, porque vai ter desafios importantes começando pela Previdência", disse Maia ao G1.
El País: Cuba, a agonia de uma revolução
Na ilha houve uma tentativa, uma esperança e uma pretensão que não devem ser esquecidas. Mas o sonho que encarnou a chegada do Fidel Castro ao poder há 60 anos agoniza irremediavelmente
Pelo menos 30 movimentos guerrilheiros surgiram na América Latina desde que triunfou a revolução cubana até o fim dos anos oitenta. Hoje não resta nenhum, salvo o ELN da Colômbia, transformado em organização criminosa. A revolução − esse fantasma que hoje parece abandonar o continente − cativou os melhores políticos, artistas e intelectuais de sua época, e uma literatura esplendorosa brotou sob sua sombra. Até o cristianismo participou de seu feitiço justiceiro com a teologia da liberação. Mas essa fé hoje parece encerrar seu reinado. Dela restam, quando muito, discursos vazios, promessas e slogans que, de tanto ser repetidos sem nunca ser realizados, perderam seu sentido.
Para esses que sempre combateram a revolução, porque desde o início ela atentou contra seus interesses e os teve como inimigos declarados, sua morte é motivo de celebração. Mas lhes convém manter viva a ideia de sua ameaça, para que assim possam se apresentar como guardiães das maiorias e conservar o poder. Para aqueles que, por outro lado, acreditaram que outro mundo era possível e que a fraternidade poderia vencer o egoísmo, constatar que seus desejos alimentaram a intolerância, o abuso e a pobreza dói e tira a fala. Deve ser por isso que hoje a esquerda honesta está muda.
Os cubanos costumam discutir sobre quando a revolução perdeu seu encanto. Alguns dizem que foi no começo dos anos setenta, depois do caso Padilla, com a sovietização do chamado Quinquênio Cinza, quando até os edifícios foram projetados conforme os planos de Kruschev e se instalou o conceito de “diversionismo ideológico” para todo aquele que pensasse ou desejasse algo fora da norma estabelecida. Segundo outros, foi em 1989, com a Causa Número 1 − que terminou com o fuzilamento do general Ochoa, uma das figuras mais respeitadas da revolução − e a queda da URSS. O que veio depois, o Período Especial, os cubanos não esqueceram mais. O petróleo desapareceu e era tão curto o tempo que tinham luz elétrica que, em lugar de falar de apagões, eles falavam de alumbrones (“acesões”). Até gatos saíam à caça para comer.
O petróleo e a comida voltaram a Cuba com a chegada de Hugo Chávez à presidência da Venezuela. Chávez viu em Fidel a figura de um pai, de um modelo, de um guia. Quis seguir seus passos e reviver à sua maneira o sonho de revolução que agonizava adicionando a ele o sobrenome “bolivariana”. Comprou Governos em toda a América Latina enquanto o preço do petróleo estava nas nuvens e os somou ao chamado socialismo do século XXI, quando o certo é que o capitalismo já tinha triunfado e o dele não era nada mais que a triste caricatura de um fato histórico que se apagava. A revolução já não tinha artistas, nem intelectuais, nem poesia, nem fé.
Se em Cuba houve gerações que romperam as mãos cortando cana de açúcar, na Venezuela se pregava com maços de notas nas mãos. Se Chávez viu em Fidel um pai legitimador, Fidel encontrou em Chávez um filho como o que muitos cubanos têm no exterior, de onde lhes mandam dinheiro para sobreviver. Por mais duro que seja reconhecer isso, o sonho de socialismo e de dignidade de Cuba sempre foi financiado por outros.
Mas se a revolução cubana perpetuou no poder esse grupo que o conquistou no final da década de 1950, dando lugar a uma gerontocracia imune às mudanças, não gerou uma elite de milionários, como o chavismo. No início foram chamados de boliburgueses e hoje são conhecidos como enchufados (“conectados”). Comercializando petróleo, drogas, ouro e diamantes nacionais, acumularam fortunas imensuráveis, ao mesmo tempo em que vociferavam contra os ricos e a favor do povo. Hoje são eles os principais clientes dos poucos restaurantes de luxo que restam em Caracas, enquanto se multiplicam os refeitórios solidários (panelas comuns) para combater a desnutrição. As caixas de mantimentos CLAP (do Comitê Local de Abastecimento e Produção) que o Governo distribui para aliviar a crise alimentar, “são como o período, porque chegam uma vez por mês e duram uma semana”, brincam aqueles que as recebem. A pobreza e a desigualdade aumentaram notoriamente sob o Governo de Nicolás Maduro.
A Igreja revolucionária cubana está repleta de sacerdotes profissionais que já perderam a fé e de gestos que, desprovidos de significado, hoje parecem momices. Ninguém vive lá nem do cartão de abastecimento mensal nem do salário que o Estado paga. Alguns resumem assim: “Aqui uns fingem que trabalham e outros fingem que lhes pagam”. Com um salário oficial equivalente a 109 reais mensais, morrem de fome. A maior parte da economia nacional se desenvolve fora dessa estrutura socialista. Quem trabalha para uma empresa estatal faz isso principalmente para ter acesso aos bens que passam por ali: os caminhoneiros ao petróleo, os padeiros à farinha, os pedreiros ao cimento… e aí os roubam como formigas e os vendem no mercado negro. É um costume adquirido, de modo que nenhum cubano julga o outro por fazer isso. Se eu fosse descrever o grosso do funcionamento da economia cubana, diria que se trata de um capitalismo selvagem, desregulado e livre de impostos.
A esta altura, é um regime político em que ninguém acredita. Foi morto por seu orgulho, seu autoritarismo, sua burocracia. O iluminismo, a arrogância, o controle. Queria ser o mundo novo e se tornou um mundo velho. Faz tempo que seu objetivo não é a justiça, e sim a sobrevivência. Não saem em sua defesa os espíritos ousados e desrespeitosos. Aquilo que os barbudos de Sierra Maestra encarnaram alguma vez, hoje aponta o dedo contra eles e os condena. Um rastafári me disse o seguinte no parque Céspedes de Santiago de Cuba: “Como esses velhos podem continuar falando de revolução se lutam dia e noite para que nada mude?”.
Apesar de tudo, em Cuba houve uma tentativa, uma atrevimento, uma esperança e uma pretensão que deve voltar a nos encarar mais cedo do que tarde, porque o ser humano pode renascer depois do fracasso, mas a renúncia a toda a ilusão o mata para sempre. A tarefa de manter vivo o espírito de uma comunidade, de fazer com que cada homem também seja responsável pelos outros e assegurar que a liberdade de cada indivíduo não seja inimiga da liberdade de outros, ainda está de pé. Para torná-la crível, é indispensável se atrever a pensar de novo. Deixar para trás sem complexos aquela esquerda fracassada e pervertida. Acabar com esse matrimônio envenenado, para poder se apaixonar autenticamente outra vez.
*Patricio Fernández é fundador e diretor do semanário chileno ‘The Clinic’. Seu último livro, ‘Cuba − Viaje al Fin de la Revolución’, foi lançado no Chile em 24 de janeiro pela editora Debate.
El País: 2,6 milhões de dólares, o valor de uma vida exposta ao risco das barragens da Vale
Documento da mineradora estima indenização de potenciais vidas perdidas em rompimento de barragens. Estudo é utilizado na avaliação de companhias sobre quais os riscos elas estão dispostas a aceitar
Uma morte em caso de rompimento de barragem da Vale tem o valor de 2,6 milhões de dólares —9,8 milhões de reais, no câmbio atual—. É o que aponta um documento interno no qual a mineradora analisa os riscos de suas barragens e quantifica uma série de consequências econômicas de um eventual rompimento, incluindo as indenizações por morte. Este tipo de estudo é um procedimento normal das empresas cujas atividades são consideradas de risco e é utilizado na avaliação e valoração das companhias sobre quais os riscos de suas atividades que elas estão dispostas a aceitar. Nele, são avaliadas desde as implicações econômicas e ambientais até os prejuízos à imagem da empresa e os custos com saúde e segurança em caso de um eventual rompimento. A empresa estimou em 1,5 bilhão de dólares o custo de um rompimento hipotético.
Segundo a Vale, todas as informações contidas no documento, produzido em 2015, partem de "situações hipotéticas" e o valor da indenização que a empresa deverá pagar às famílias das vítimas fatais de Brumadinho ainda está em discussão com as autoridades brasileiras. A empresa insiste que a barragem I da Mina do Feijão, que ruiu no último dia 25 de janeiro, não apresentava riscos de ruptura e que nos últimos quatro anos aumentou em 180% o investimento em segurança nas suas barragens. Até a última quinta-feira, haviam sido contabilizadas 166 mortese 155 desaparecidos por conta do desastre.
O documento em que a empresa estima o valor das potenciais vidas humanas que podem ser perdidas no caso de rompimento de barragens é intitulado Análise Quantitativa de Riscos em Barramentos — Definição das Consequências. Ele registra que a “indenização por perdas de vidas humanas é o tema com maior divergência de opiniões, elevado grau de incerteza e questões éticas associadas”. E discute três metodologias para chegar a um valor de indenização. No fim, a Vale adota como base a chamada "curva de tolerabilidade de riscos", uma abordagem proposta pelo engenheiro norte-americano Robert Whitman na década de 1980 e que leva em consideração um gráfico que inclui consequências tanto em termos financeiros quanto em termos de potencial de perda de vidas humanas.
Com base nisso, essa metodologia instituiu na década de 1980 que o valor de uma vida é igual a um milhão de dólares. A própria Vale, no seu documento interno de 2015, corrige o valor para aquele ano e determina que a indenização por perdas de vida a ser considerada pela empresa deve ser de 2,6 milhões de dólares. "Esse valor deve ser convertido de dólar americano para reais conforme a cotação da moeda norte-americana na data de realização do cálculo do custo da indenização", aponta o documento. Com isso, a indenização por morte conforme os cálculos admitidos pela Vale poderia chegar a 9,2 milhões reais na cotação atual. Este cálculo, porém, não inclui uma correção monetária para 2019.
Os cálculos da Justiça brasileira
O valor estipulado pela mineradora é superior às indenizações determinadas pela Justiça brasileira em casos de morte, que têm variado entre 300 a 500 salários mínimos nos últimos anos (ou de 15.000 reais a 152.000 reais). Esta foi uma das opções ventiladas pela Vale no seu estudo, mas a própria empresa avaliou o valor pequeno. "Observa-se que, considerando a política e valores da Vale, nas quais a vida humana está em primeiro lugar, cabe destacar que os valores que vem sendo arbitrados são bastante reduzidos", argumenta a própria empresa no documento. A terceira metodologia considerada pela empresa tem como base de cálculo a quantia gasta para reduzir o risco ou quantia compensatória para se aceitar o risco, mas os valores eram tão discrepantes se aplicados a casos históricos que foram rechaçados pela mineradora.
Apesar de prever um valor superior de indenização à média determinada pela Justiça, não há como estimar o valor real das indenizações pagas pela Vale. No caso do rompimento da barragem de Mariana em 2015 — de propriedade da Samarco, empresa controlada pela Vale— foi feito um acordo extrajudicial para indenizar as vítimas que determina a confidencialidade dos valores. Parte das vítimas espera há três anos a reconstrução de suas casas. Também não é possível saber se o cálculo antes projetado pela Vale será considerado para indenizar os familiares das vítimas de Brumadinho. Questionada pelo EL PAÍS sobre isso, a mineradora disse apenas que "os estudos de risco e demais documentos elaborados por técnicos consideram, necessariamente, cenários hipotéticos para danos e perdas". E insistiu, em nota: "Não existe em nenhum relatório, laudo ou estudo conhecido qualquer menção a risco de colapso iminente da Barragem I da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho. Pelo contrário, a barragem possuía todos os certificados de estabilidade e segurança, atestados por especialistas nacionais e internacionais".
Impasses na negociação para indenizar vítimas
Chegar a um acordo sobre como será a indenização dos parentes das vítimas de Brumadinho não tem sido fácil. A Vale diz que os cálculos contidos no seu documento interno são apenas hipóteses e que os valores ainda estão em discussão com as autoridades. Na semana passada, o Ministério Público do Trabalho de Minas Gerais propôs à mineradora uma indenização de 2 milhões de reais ao grupo familiar dos trabalhadores mortos ou desaparecidos. Apesar do valor ser bem inferior aos 9 milhões de reais considerados em 2015 pela empresa em seu documento, a Vale não aceitou e fez uma contraproposta com o pagamento de indenização por danos morais de acordo com o parentesco com as vítimas. Seriam 300.000 reais ao cônjuge e a cada filho, 150.000 a cada pai e mãe e 75.000 a cada irmão. A empresa também pagaria plano de saúde para os familiares da vítima fatal, além de dois terços do salário líquido do trabalhador por mês até a data em que ele completaria 75 anos. Os familiares, porém, não aceitaram essa proposta. Nesta sexta-feira, a Vale acordou com os familiares que os salários dos funcionários mortos e desaparecidos continuarão sendo pagos até que se chegue a uma definição sobre as indenizações, cujos valores ainda estão em aberto.
O professor de Direito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Carlos Edison Monteiro, lamenta que empresas que desenvolvem atividades que podem pôr em risco a vida de pessoas quantifiquem as indenizações por mortes e muitas vezes usem este dado simplesmente como uma das referências para tomar decisões econômicas, aceitando riscos. "A vida humana não pode ser objeto de precificação, não pode ser [tratada como] um fator econômico que as empresas considerem para realizar atividades que põem em risco a vida das pessoas", afirma. "O sistema jurídico brasileiro repudia o entendimento de que a morte de seres humanos vale a pena. É muito errado fazer este cálculo e assumir o risco por questões econômicas. Infelizmente, isso faz parte da cultura do país", acrescenta.
Monteiro explica que o Código Civil brasileiro prevê na indenização material uma compensação por dano emergente (que inclui as despesas dos familiares logo após a morte, como despesas médicas anteriores ao óbito e funerais) e outra por lucro cessante (que visa compensar financeiramente os dependentes da pessoa que morreu). Mas a legislação prevê outra indenização, mais difícil de ser mensurada, que são os danos morais. Neste cálculo, há condicionantes. Em relação ao dever do responsável pela morte ao sustento dos dependentes, deve ser considerado quanto a vítima ganhava. Esse valor vai ser maior para dano material para alguém com um salário elevado que outro que ganhava apenas um salário mínimo, por exemplo. Já o dano moral é o mesmo para todas as vítimas.
El País: Aliados saem em defesa de Bebianno e cobram de Bolsonaro pulso com filho
"Misturar família" gera insegurança, diz Rodrigo Maia. Presidente vai dar "ordem unida" à "rapaziada", diz Mourão. Ministro, ligado a escândalo das candidaturas de fachada do PSL, resiste no cargo, por enquanto
Gustavo Bebianno passou de estratégico dirigente da campanha de Jair Bolsonaro a cambaleante ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República em apenas poucos dias. No comando do governista PSL quando supostas candidatas-laranja receberam verba pública na campanha eleitoral, Bebianno estava na berlinda e isso por si só já era uma dor de cabeça para a gestão. Mas, ao entrar na linha de ataque de um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, o vereador carioca Carlos, o ministro acabou ganhando apoio de integrantes do núcleo militar do Governo, de parlamentares do PSL e até do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Todos têm um ponto comum: estão preocupados com a escalada da crise –quando o Planalto apenas dá os primeiros passos na reforma da Previdência– e com o tamanho da influência da prole do mandatário nos destinos do Governo.
Durante toda a quinta-feira, nos bastidores do poder em Brasília, a principal discussão era sobre o momento em que Bebianno seria demitido pelo presidente –até a conclusão desta reportagem, isso não havia acontecido. Nesta quinta-feira, o ministro passou boa parte do dia no hotel onde mora, em Brasília. Não foi recebido por Bolsonaro, que ainda se recupera da cirurgia para a retirada da bolsa de colostomia. O presidente recebeu apenas um grupo de ministros e assessores no Palácio da Alvorada para tratar quase que exclusivamente da reforma da Previdência que enviará ao Congresso Nacional nos próximos dias.
Sempre que indagado se pediria demissão, Bebianno disse que não o faria. Como alguém que acompanhou de perto a trajetória do presidente, soou como quem enviava recados. Ao jornal O Estado de S. Paulo, provocou: “O que chamam de inferno, eu chamo de lar”. À revista eletrônica Crusoé, negou qualquer irregularidade nos repasses às candidatas do PSL, disse que não é moleque para ficar debatendo assuntos como esse na rede social e que Bolsonaro deve estar com medo de receber algum "respingo" da crise. “Não sou moleque e o presidente sabe. O presidente está com medo de receber algum respingo. Ele foi um mero candidato. Ele não participou da Executiva, ele não tinha mando no partido. Ele não tem responsabilidade nenhuma”.
A crise na qual se viu envolvido começou com as supostas candidaturas laranjas do PSL no período em que ele presidia interinamente o partido a mando de Bolsonaro. E chegou ao ápice – ao menos por enquanto – quando Carlos o chamou de mentiroso pelo Twitter e acabou replicado pelo seu pai. Seu processo de fritura pública começou na quarta-feira. O então ministro havia dito à imprensa que tinha conversado três vezes por telefone com Bolsonaro no período em que ele estava internado. O vereador entendeu que ele tinha tratado com o presidente sobre o suposto laranjal do PSL e quis afastar esse vínculo de uma possível irregularidade da campanha de seu pai. Carlos, então, publicou um áudio que Bolsonaro teria enviado a Bebianno em que ele se nega a atender seu assistente. Essa foi umas das mensagens replicadas pelo próprio Bolsonaro ainda na quarta. Mais tarde, em entrevista à TV Record, foi o presidente que chamou seu auxiliar de mentiroso e que, caso tivesse cometido algum erro, ele poderia “voltar às origens”.
Aproximação e defesas
Advogado de formação, Bebianno trabalha com Bolsonaro há apenas dois anos. Sua aproximação célere do presidente se deu um pouco antes da campanha eleitoral e sempre foi questionada por Carlos. Ambos chegaram a disputar quem comandaria a comunicação do Governo. Por fim, oficialmente, nenhum dos dois ficou com a máquina na mão. A Secretaria de Comunicação é hoje vinculada à Secretaria de Governo, ministério sob a batuta do general Carlos Alberto dos Santos Cruz. Na prática, contudo, é Carlos quem administra as redes sociais de seu pai.
Colocado como presidente interino do PSL de janeiro do ano passado até as eleições, cabia a Bebianno as decisões estratégicas da campanha. Ele foi o responsável por levar negociar a ida do então presidenciável ao partido ao invés de ir para o Patriota, com quem estava negociando antes de ser oficializado concorrente.
Se a queda de um ministro da cozinha do Planalto com menos de dois meses de Governo já preocupava governistas, a participação de Carlos Bolsonaro no episódio acendeu de vez os alertas. Desde antes mesmo da posse, o braço militar do Governo Bolsonaro tenta afastar a influência dos filhos dele na gestão. A questão ficou explícita nesta quinta-feira, quando, em entrevista à agência Reuters, o vice-presidente, o general Hamilton Mourão, disse que o presidente vai dar uma ordem aos seus filhos. “A minha visão é que estamos num momento de acomodação. Também tem que ser levado em conta que o presidente vem passando por uma série de problemas de saúde. É óbvio que isso deixa a pessoa numa situação mais frágil. Agora está voltando sem a preocupação de ter de fazer mais cirurgias, de correr riscos, então eu acredito que ele vai dar uma ordem unida aí nessa rapaziada”.
No Congresso, alguns dos representantes do PSL e outros aliados, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), queixaram-se da postura de Carlos e dessa interferência familiar em assuntos de Estado. “A impressão que dá é que o presidente está usando o filho para pedir para o Bebianno sair. E ele é presidente da República, não é? Não é mais um deputado, ele não é presidente da associação dos militares”, reclamou Maia ao portal G1. "Ele tem que comandar a solução, e não pode, do meu ponto de vista, misturar família com isso porque acaba gerando insegurança."
Um outro que reclamou foi o líder do PSL no Senado, major Olímpio Gomes. “Carlos é um amigo. Eu o respeito. Algumas atitudes podem ser tomadas de filho em relação ao pai. É simplesmente ajustar a sintonia e se distinguir o que é a defesa, uma manifestação em função do pai, e quais são as atividades, as competências e o tamanho da responsabilidade da presidência”, afirmou. Já a oposição, segue na clara tentativa de constranger o Governo. Nesta semana, representantes de dois partidos opositores, PSOL e PCdoB, apresentaram requerimento de convocações de ministros e entraram com representações junto à Procuradoria-Geral da República.
Indícios de candidatura de fachada
O esquema de candidaturas laranjas do PSL foi revelado pelo jornal Folha de S. Paulo. Em reportagens publicadas nas últimas duas semanas, há indícios de que, enquanto o partido era presidido interinamente por Bebianno, ao menos três mulheres de Minas Gerais e de Pernambuco, sem nenhuma expressão ou militância política, teriam se candidatado a cargos de deputada estadual e federal apenas para compor a cota de 30% obrigatório definido pela legislação eleitoral. Essas candidaturas laranjas são consideradas um delito, pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Os contornos negativos foram amplificados quando se revelou que recursos públicos foram investidos nessas campanhas, por meio do fundo partidário. Uma delas, a de Maria de Lourdes Paixão, recebeu 400.000 reais provindos do diretório nacional, dirigido por Bebianno. A maior parte desse valor foi gasta em uma gráfica aparentemente de fachada. Outra concorrente, Érika Siqueira Santos, recebeu 250.000 reais, da mesma maneira. Os valores estão entre os maiores repasses do partido. No caso de Paixão, ela recebeu mais recursos que o próprio presidente e que a deputada federal mais votada do país, Joice Hasselmann. Nenhuma delas se elegeu. Paixão teve 274 votos para a Câmara. Érika, 1.315 para a Assembleia Legislativa de Pernambuco.
Além das duas candidaturas laranjas, também há suspeita de que algo similar tenha acontecido em Minas Gerais, onde o partido é comandado pelo deputado federal e ministro Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG). Todos esses esquemas passaram a ser investigados pela Polícia Federal.
El País: Na TV, Bolsonaro diz que ministro mentiu e adverte o vice Mourão
Filho do presidente chamou ministro do núcleo duro do Planalto de "mentiroso" e foi retuitado pelo pai. Onyx defende colega, mas parlamentares se queixam de desgaste por causa dos indícios de sigla usou candidatas-laranja
Após 17 dias afastado do centro do poder político, o presidente Jair Bolsonaro(PSL) teve alta hospitalar e desembarcou nesta quarta-feira em Brasília com algumas bombas a desarmar. A principal delas é a crise provocada pelos indícios de que seu partido, o PSL, usou candidaturas-laranja na eleição e o mal-estar com o seu ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, que comandava a sigla durante a campanha. Bolsonaro endossou críticas públicas a Bebianno feita por um de seus filhos, o vereador Carlos Bolsonaro. A conta oficial do Twitter do mandatário replicou a mensagem de Carlos que acusava o ministro, até então um dos homens-fortes do Planalto, de mentir ao mencionar contatos com o presidente. Depois, o próprio Bolsonaro disse o mesmo em entrevista à TV Record.
"É mentira", disse o presidente na entrevista ao canal de TV, negando ter conversado com seu ministro a respeito da crise enquanto ainda convalescia de uma operação intestinal no hospital Albert Einstein, em São Paulo. Bolsonaro não anunciou, no entanto, que Bebianno deixaria o cargo. O mandatário disse ter ordenado à Polícia Federal que investigue os casos suspeitos no PSL. "Se (Bebianno) tiver envolvido, logicamente, e responsabilizado, lamentavelmente o destino não pode outro a não ser voltar às suas origens", seguiu.
Advogado de formação, Bebianno se aproximou de Bolsonaro há apenas dois anos. Em 2018, a pedido do então pré-candidato a presidente, assumiu interinamente o comando do PSL no período eleitoral, quando ao menos três candidaturas aparentemente fictícias foram lançadas pela legenda. Uma delas, a de Maria de Lourdes Paixão (PSL-PE), abocanhou 400.000 reais do fundo partidário, que é composto de dinheiro público. Outra, de Érika Siqueira Santos (PSL-PE), recebeu 250.000 reais, autorizados pelo hoje ministro. Os casos foram revelados pelo jornal Folha de S. Paulo.
O incômodo político-familiar cresceu depois que o ministro afirmou à imprensa que tinha conversado com Bolsonaro sobre as candidaturas-laranjas na terça-feira, quando ele ainda estava internado. Em um aparente movimento para blindar o pai do desgaste do escândalo, Carlos, usou suas redes sociais para dizer que Bebianno mentiu. “É uma mentira absoluta de Gustavo Bebbiano (sic) que ontem teria falado 3 vezes com Jair Bolsonaro para tratar do assunto citado pelo Globo e retransmitido pelo Antagonista.” Em mais um ineditismo de um Governo que orbita nas redes sociais, o vereador ainda publicou no Twitter um áudio no qual o presidente diz que não iria conversar com Bebianno naquele dia. “Ô Gustavo, tá complicado de conversar, ainda. Eu não vou falar, não vou falar com ninguém, a não ser estritamente o essencial. Estou em fase final de exames para possível baixa hoje. Tá, ok? Boa sorte, aí”, diz a gravação.
Horas depois, o presidente replicou as mensagens de Carlos. Já em Brasília, seguiu para o Palácio da Alvorada e não teve agenda pública. Bebianno, por sua vez, também não participou de eventos públicos nem respondeu às perguntas da reportagem, por telefone e por e-mail, sobre o tema. Ao G1, Bebianno disse que não pretende pedir demissão e que aguardará a decisão do mandatário.
Não há roupa suja a ser lavada! Apenas a verdade: Bolsonaro não tratou com Bebiano o assunto exposto pelo O Globo como disse que tratou: pic.twitter.com/pJ4bkvMMGj
Desgaste na base
Mesmo antes da entrevista da TV Record ir ao ar, entre assessores da presidência e alguns aliados do Governo a demissão de Bebianno era dada como quase certa. No plenário da Câmara, o deputado federal Alexandre Frota (PSL-SP) queixou-se das críticas que a legenda vem recebendo. “A maioria dos partidos de esquerda que subiram aqui [na tribuna da Câmara] falou que o PSL é um partido de laranjas. O PSL não é um partido de laranjas”. Disse ainda que ninguém será protegido pelo Governo, caso cometa alguma irregularidade. “Qualquer secretário, deputado, ministro envolvido em qualquer coisa, essa laranja podre vai cair.”
Outra parlamentar que atua na linha de frente de Bolsonaro, a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), reclamou das postagens de Carlos. “Não pode se misturar as coisas. Filho de presidente é filho de presidente. Temos que tomar cuidado para não fazer puxadinho da Presidência da República dentro de casa para expor um membro do alto escalão do governo dessa forma”, criticou.
O chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), amenizou a crise e defendeu seu colega na Esplanada dos Ministérios. “Ajustes nas relações são normais. Temos 40 dias de Governo. O presidente ficou quase 20 hospitalizado. Temos de ter calma. O ministro Gustavo Bebianno é uma pessoa superdedicada ao projeto, é um homem sério, responsável, correto”.
De oposição a Bolsonaro no Congresso, o PSOL apresentou um requerimentopedindo a convocação dele para prestar esclarecimentos na Câmara e uma representação criminal na Procuradoria-Geral da República.
Outras bombas a desarmar e advertência a Mourão
Em menos de dois meses de um Governo eleito com a bandeira anticorrupção, é o segundo caso em que o presidente é cobrado a se explicar. O outro, também em investigação, trata de movimentações suspeitas de um ex-assessor de seu filho, o senador Flávio Bolsonaro. Se não bastasse isso e agora a crise em seu partido, Bolsonaro terá ainda nos próximos dias de resolver problemas pontuais –e não tanto– nas mais diversas áreas. Na econômica, terá de dar encaminhamento à sua reforma da Previdência, escolhendo qual proposta será enviada ao Congresso até o dia 20. Na entrevista à TV Record, o presidente prometeu "bater o martelo" sobre a questão na tarde desta quinta-feira. Em outra frente, terá também de conter uma queda de braço entre os ministros Paulo Guedes (Economia) e Tereza Cristina (Agricultura), que não se entenderam sobre a taxação de leite que é importado pelo Brasil. A taxa caiu. Depois da reclamação da bancada ruralista, voltou.
Todos esses ruídos já acendem os primeiros alertas nos investidores do mercado financeiro, que esperam ansiosos por sinais de estabilidade que possam reforçar as chances de o Governo aprovar no Legislativo reformas econômicas liberais, especialmente a mudança nas aposentadorias. A questão é que, na relação com o Congresso, o presidente também terá de deter os primeiros danos: as críticas feitas ao seu inexperiente líder na Câmara dos Deputados, o major Vitor Hugo (PSL-GO), um parlamentar em primeiro mandato. Com Bolsonaro hospitalizado, Hugo tentou reunir os líderes do partido aliado e não conseguiu. Tem sido vítima até de fogo amigo do PSL. Deputados entendem que era necessário ter alguém mais experiente no trato com os colegas. Por ora, o presidente deverá mantê-lo na função.
Já no Senado, o presidente também está em busca do líder de seu Governo. A ideia é que seja algum político fora do PSL. O nome ventilado até agora é o de Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). Dois fatores pesam contra ele, no entanto, ser do MDB e aliado de Renan Calheiros (MDB-AL), o cacique que foi derrotado por Davi Alcolumbre (DEM-AP) na disputa pela presidência do Senado. Ainda falta definir também o líder do Governo no Congresso. Segundo o ministro Onyx, os nomes serão levados a Bolsonaro neste fim de semana e devem ser anunciados em breve.
Na entrevista à TV Record, o presidente acrescentou ainda um item na agenda de arestas: afinar os ponteiros com o vice-presidente, Hamilton Mourão. Questionado sobre a atuação do vice durante sua convalescência, Bolsonaro afirmou que o vice dá "escorregadas" ao falar com a imprensa, mas frisou que há harmonia entre os dois. "Circulou pela mídia que os generais do governo queriam que eu me afastasse para o Mourão assumir. Isso não houve, estamos muito bem no Governo".
Oliver Stuenkel: Mourão entra em campo contra os antiglobalistas
Vice-presidente, chamado informalmente de "o adulto na sala" por diplomatas estrangeiros, é visto como âncora de estabilidade de um Governo cuja atuação externa é volátil e confusa
Fica cada vez mais evidente que a estratégia da política externa brasileira, articulada pelo chanceler Ernesto Araújo, o presidente Bolsonaro e seu filho Eduardo, está deixando inseguros investidores internacionais e outros governos. Araújo é visto como ideológico demais (algo que os investidores sempre temem, não importa se a ideologia é de esquerda ou de direita). Já Eduardo, que atua como um ministro das Relações Exteriores informal, passa a imagem de ignorante e muito radical para inspirar confiança no exterior, mesmo por parte de funcionários do governo dos EUA, que veem com bons olhos o Governo Bolsonaro. O péssimo discurso de Bolsonaro em Davos pareceu resumir a atuação da turma antiglobalista até agora, desapontando investidores que tinham aguardado uma fala mais séria – e que, de certa maneira, estavam torcendo para o novo presidente.
"Ainda bem que eles têm Mourão" é um comentário que se ouve com cada vez mais frequência no exterior. De fato, o general da reserva e vice-presidente é agora visto pela comunidade internacional como a âncora de um navio que, sem ele, estaria à deriva no que diz respeito à estratégia internacional.
Mourão difere do resto da equipe de política externa de Bolsonaro em estilo e substância. Enquanto os outros atores do governo são conhecidos por sua retórica estridente e agressiva, Mourão é moderado e calmo. Em uma entrevista recente, o vice-presidente não se esquivou de responder perguntas difíceis – ao contrário de seu chefe, que frequentemente ataca jornalistas quando estes discordam dele. Mourão chamou a atenção no exterior quando, em entrevista a uma repórter espanhola e a um brasileiro, respondeu as perguntas em espanhol fluente, o qual aprendeu como adido militar em Caracas.
Quando se trata de conteúdo, Mourão resiste sabiamente às ideias mais radicais e mal concebidas dos antiglobalistas, como transferir a embaixada do Brasil em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, deixar o Acordo de Paris sobre mudança climática, abrigar uma base militar dos EUA e, a mais perigosa de todas, adotar tom agressivo em relação à China. Não é coincidência que um número crescente de embaixadores esteja procurando Mourão, o qual – eles esperam – continuará a impedir Bolsonaro de cometer graves erros políticos no âmbito externo. Nenhum vice-presidente na história recente foi tão necessário para a estabilidade da política externa do Brasil, já nas primeiras semanas de Governo, quanto Hamilton Mourão.
Ainda assim, previsivelmente, o papel estabilizador do vice-presidente na política externa do Brasil lhe rendeu a ira dos radicais (inclusive Olavo de Carvalho e Steve Bannon, dos EUA). A questão-chave é: até que ponto Mourão será capaz de vetar todas as ideias esdrúxulas que certamente ainda virão da ala antiglobalista do governo?
A verdade é que, idealmente, Mourão não deve ser apenas bombeiro-chefe e jogar na defesa para proteger a política externa brasileira de erros graves. Também tem potencial para adotar um papel mais ativo e propor novas iniciativas no âmbito externo. Três em particular vêm à mente.
Primeiro, Mourão seria o homem certo para liderar a posição do Brasil em relação à Venezuela, maior desafio em curto e médio prazos na política externa hoje. De longe a pessoa mais bem informada no gabinete sobre o assunto, Mourão também tem a vantagem de ser um militar, capaz, portanto, de lidar com a instituição que determinará o futuro do país vizinho: as Forças Armadas. Isso envolveria a articulação da resposta complexa à crise migratória venezuelana em todo o continente. Mourão poderia, ainda, convocar uma cúpula regional para discutir o assunto e decidir como coordenar conjuntamente o registro, a distribuição e a integração dos migrantes venezuelanos. Juntamente com outros países da região, ele também poderia organizar a criação de um fundo para compensar os países mais afetados pela crise migratória, como Colômbia, Equador e Peru. Além disso, coordenaria, com a Colômbia e outros, o envio de ajuda médica e humanitária à Venezuela, assim que o Governo Maduro – ou qualquer governo sucessor – o permitir.
Em segundo lugar, como projeto de médio prazo, Mourão poderia liderar um processo de aprofundamento da cooperação entre as Forças Armadas na América do Sul, dando continuidade a um movimento deflagrado por Nelson Jobim, ministro da Defesa de Lula. Isso poderia funcionar por meio de uma instituição existente, como o Conselho de Defesa Sul-Americano, e deveria envolver, entre outras iniciativas, exercícios militares conjuntos, missões para lidar com desastres naturais e participação em missões de paz da ONU. Isso até poderia ajudar a aumentar a pressão sobre suas contrapartes nas Forças Armadas da Venezuela – que perderão muito com uma transição para a democracia, dados os privilégios que acumularam sob Maduro – para permanecerem em seus quartéis independentemente de quem seja o futuro líder. A plataforma revigorada poderia, em futuras crises desse tipo, oferecer aos países vizinhos um canal adicional para o diálogo e a coordenação.
Finalmente, Mourão poderia se tornar responsável pela estratégia do Brasil em relação a Pequim, um tema de extrema relevância para o futuro do Brasil em curto, médio e longo prazos. Isso poderia incluir assumir o portfólio do grupo BRICS, que nem o presidente nem o ministro das Relações Exteriores consideram de grande relevância. Enquanto o presidente Bolsonaro, seu filho e o ministro das Relações Exteriores expressaram, até agora, ideias simplistas e preocupantes sobre a China, Mourão seria capaz de encontrar um meio-termo entre o receio legítimo sobre o que a ascensão chinesa implica e o otimismo quanto às muitas oportunidades na crescente presença do país na América Latina.
A queda de braço entre Hamilton Mourão e os antiglobalistas deverá marcar a estratégia internacional do governo Bolsonaro. Resta saber se Mourão sairá vitorioso e conseguirá salvar a política externa brasileira dos próximos anos.
*Oliver Stuenkel é professor adjunto de Relações Internacionais na FGV em São Paulo, onde coordena a Escola de Ciências Sociais em São Paulo e o MBA em Relações Internacionais. Também é non-resident fellow no Global Public Policy Institute (GPPi) em Berlim e membro do Carnegie Rising Democracies Network.