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El País: Após concessão ao etanol dos EUA, indústria de açúcar do Brasil espera fim das barreiras de Trump

Setor sucroalcooleiro aguarda contrapartida a gesto do Governo com o fim de restrições para a importação de açúcar do Brasil. Especialista vê Bolsonaro agindo somente a favor do governo americano

A decisão do Governo Jair Bolsonaro de aumentar de 600 milhões para 750 milhões de litros o volume de etanol que pode entrar no Brasil sem taxação extra de 20% animou parte do setor sucroalcooleiro brasileiro. Dois especialistas e um representante de produtores rurais entendem que essa elevação representa uma sinalização de que o Brasil está disposto a ampliar o seu mercado e que espera uma reciprocidade do Governo Donald Trump com relação à taxação do açúcar. Brasil e Estados Unidos são os principais produtores de etanol do mundo. “Essa mudança não vai criar grandes distorções no mercado, mas condicionar novas conversas a uma efetiva abertura do mercado americano de açúcar. Foi uma solução salomônica. Uma decisão extremamente firme e equilibrada”, afirmou o presidente da União das Indústrias de Cana de Açúcar (Unica), Evandro Gussi.

Na segunda, Trump comemorou a ampliação do mercado brasileiro num tuíte que surpreendeu pela informalidade de um assunto que sempre desperta dúvidas sobre ganhos e perdas para o Brasil. Há quem veja nesta movimentação que o Governo brasileiro está cedendo demasiadamente à gestão Trump sem, por enquanto, ter nada em troca.

O anúncio sobre a ampliação dessa margem ocorreu um dia após o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o deputado federal e filho do presidente, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o assessor internacional do Planalto, Filipe Martins, participarem de reuniões com membros do governo americano. Eduardo deve ser o indicado pelo pai como embaixador do Brasil nos Estados Unidos, embora sua aprovação para o posto depende do aval dos senadores.

Hoje, cerca de 1,6 bilhão de litros de etanol norte-americano entram no Brasil. As indústrias brasileiras produzem cerca de 30 bilhões de litros ao ano, quantidade que deixaria o país autossuficiente, já que o consumo é similar à produção. Ou seja, o uso de etanol de outros países não atinge 5% do que é consumido no país.

A importação, contudo, tem razões mercadológicas. Em determinadas regiões do país, como parte do Norte e do Nordeste, é mais barato usar o etanol importado do que o nacional, devido à logística para o produto chegar a algumas cidades. “Diminui a rentabilidade dos produtores nacionais, mas acho que não há razão para o Brasil temer essa competição com os Estados Unidos”, alertou o economista Edmar de Almeida, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “No fim, quem ganha é o consumidor”, completa.

Ex-presidente da Unica, o professor de agronegócio global do Insper Marcos Jank diz que não faz sentido proteger o etanol e ter tarifas tão baixas para o petróleo e a gasolina. “Se estamos buscando um ambiente mais saudável, com biocombustíveis, temos de reduzir o protecionismo do etanol”. Vendo a decisão do Governo como positiva, Jank ressalta, porém, que é necessário ter um retorno dos americanos. “Espero que seja visto como um sinal para que os americanos compensem o Brasil em um futuro breve na questão do açúcar”.

Pelas contas da Unica, a tonelada do açúcar custa cerca de 266 dólares, mas a tarifa aplicada pelos Estados Unidos é de 339 dólares para cada tonelada que supere a cota anual definida pelo Governo. Por essa razão, o Brasil exporta apenas 150.000 toneladas do produto para o mercado norte-americano, que é o limite permitido sem a aplicação dessa tarifa.

Uma outra frente de negociação, que tanto produtores quanto especialistas esperam que avance, é a que trata do aumento da mistura de etanol na gasolina dos Estados Unidos. Trump anunciou pelo Twitter que pretende aumentar de 10% para 15% o percentual do biocombustível no combustível fóssil. No Brasil, essa mistura chega a 27%.

Caso se concretize, há a possibilidade de o mercado para os brasileiros se ampliar. Ainda mais levando em conta que a produtividade da cana-de-açúcar, a matéria prima do etanol aqui, é quase cinco vezes maior do que a do milho, de onde os americanos extraem seu combustível. “Essa mudança no percentual traria uma demanda de cerca de 25 bilhões de litros a mais de etanol por ano. Duvido que o Trump vá mudar, realmente”, ponderou o professor Jank.

Se entre o setor sucroalcooleiro brasileiro há quem comemore a decisão, nos Estados Unidos uma das associações que representam o setor reclamou da flexibilização feita pela gestão Bolsonaro. Eles queriam a abertura completa, não parcial. “A simbólica elevação da cota não ajuda em nada os consumidores brasileiros que enfrentam preços mais altos de combustíveis por causa da política discriminatória do Brasil”, disse a Renewable Fuels Association (RFA), em nota reproduzida pela agência Reuters.

Outro crítico à abertura do mercado foi o cientista político David Fleischer, professor da Universidade de Brasília. “Para garantir sua indicação à embaixada em Washington, o Eduardo Bolsonaro está mostrando serviço ao Governo americano, mas ele tem de lembrar que quem vota essa indicação são os senadores brasileiros”, analisou.

Recentemente, Eduardo também se envolveu em um tema de extremo interesse da Casa Branca, a compra da Time Warner pela AT&T. O deputado esteve na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para pressionar os seus conselheiros a aprovarem o negócio. Para a venda ser concretizada a Time Warner precisa da autorização dos 18 países onde possui registros, e só o Brasil ainda não a deu. No último dia 22, os conselheiros da Anatel se reuniram, mas não houve um consenso sobre o tema, porque um deles pediu vistas para analisar melhor o processo.


El País: A encruzilhada da direita que já nega Bolsonaro, mas ainda não tem voto

Atlas Político mostra pico de imagem negativa do presidente, mas também de João Doria em São Paulo e de Rodrigo Maia. Números alimentam xadrez da corrida precoce para 2020, que tem a volta de Huck ao debate

O que se anunciava nos últimos meses tomou forma explícita no fim de semana. Expoentes da centro-direita brasileira selaram seu divórcio de Jair Bolsonaro e recolocaram na praça o projeto de se reaglutinar em torno do apresentador Luciano Huck, num precoce movimento rumo a 2022. As declarações do apresentador ao Estado de S. Paulo ao lado da entrevista a OGlobo do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga se complementam numa campanha para retomar um difícil lugar do espectro político, mais próximo do ponto médio. Num país que dizimou o centro nas últimas eleições e com Bolsonaro firmemente disposto a segurar seu bastião de fiéis por meio da radicalização, Huck surge como esperança de ser um puxador de voto para as ideias liberais na economia sem ser conservador nos costumes.

A fotografia atual das pesquisas vale pouco para prever algo tão adiante como as próximas presidenciais, mas ajudam a entender as atuais articulações. Os números da consultoria Atlas Político mostram, na mesma linha do Datafolha, como avança a rejeição de Bolsonaro —ultrapassou 50% os que dizem que ter uma imagem negativa do ocupante do Planalto. As cifras do Atlas, no entanto, mostram que não foi só o presidente que viu minguar a simpatia do eleitorado. As imagens de todos os políticos avaliados pioraram, com exceção nada desprezível do ministro da Justiça, Sergio Moro, que se manteve na liderança do ranking de imagem, com mais de 50% opinando positivamente sobre ele.

Chama atenção, por exemplo, a performance ruim do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), outro nome da direita que tenta se descolar de Bolsonaro após a união superexplorada na campanha. O tucano outsider viu sua imagem negativa disparar no último mês. Entre julho e agosto, a visão negativa do governador passou de 42,5% para 58,3%, segundo a pesquisa. O Atlas Político ouviu 2.000 pessoas recrutadas aleatoriamente na Internet, com amostra rebalanceada por meio de um algoritmo para ter representatividade nacional. A margem de erro é de 2 pontos percentuais.

Rodrigo Maia, herói do mercado financeiro por ter liderado a aprovação da reforma da Previdência, também viu sua imagem negativa avançar, de 60,7% para 66%, também em um mês. Maia é um dos símbolos em Brasília da ideia de que é preciso preencher um espaço que fuja do radicalismo e de "propostas exageradas", como o retrocesso dos direitos da mulher, ou a abertura escancarada para a venda de armas. A rejeição ao extremismo adotado por Jair Bolsonaro vem tanto de nomes como o presidente da Câmara como de integrantes do próprio partido do presidente. “Estamos trabalhando na construção de uma candidatura de centro direita”, disse um deputado do PSL, pouco antes de se encontrar com Maia, que também enxerga nessa via o caminho natural para encontrar um candidato que venha a presidir o Brasil em 2022.

O presidente da Câmara, que costuma dizer sem delongas que ele próprio não seria um alavancador de votos, é um dos poucos que falam abertamente que Bolsonaro é de extrema direita, um rótulo que o mandatário refuta. Na semana passada, quando se viu numa disputa verbal com o presidente francês, Emmanuel Macron, por causa das queimadas na Amazônia, Bolsonaro se autointitulou de centro-direita. “Essa inverdade do Macron ganhou força porque ele é de esquerda, e eu sou de centro-direita”, disse Bolsonaro. Dias antes o Palácio do Eliseu afirmara que Bolsonaro mentiu para Macron durante a cúpula do G-20, em Osaka, quando disse que se comprometia com compromissos ambientais para fechar o acordo Mercosul- União Europeia.

Nenhum avanço da oposição tampouco

"O centro está abandonando o Bolsonaro, mas a base bolsonarista é ainda bastante coesa. A centro-direita sofre com a polarização política igual à centro-esquerda", analisa Andrei Roman, diretor do Atlas Político. "Outro aspecto surpreendente da queda de popularidade do presidente é que ela não resulta tampouco no avanço de nenhuma figura da oposição à esquerda. Os níveis de aprovação e desaprovação de Lula, Haddad e Ciro estão estagnados", segue Roman.

É neste cenário que a resiliência da base bolsonarista chama atenção ao passo que a busca de um nome como Huck cobra lógica na ótica dos expoentes da centro-direita bem vistos pelo empresariado e pelo mercado financeiro, como Armínio Fraga e o ex-governador do Espírito Santo, Paulo Hartung. Fraga enviou recado ao empresariado e aos investidores: Bolsonaro já danifica a democracia e, portanto, é uma ameaça para os negócios, disse ao Globo. Aos solavancos da retórica do presidente, como na crise da Amazônia, não há blindagem de projeto liberal que resista, enunciou. Ao mesmo tempo, na contramão dos movimentos de polarização do eleitorado que não são vistos apenas no Brasil, o apresentador da TV Globo buscou um posicionamento clássico contra os rótulos ideológicos: "O povo está cada vez com mais dificuldade em rotular as posturas e pensamentos entre direita, esquerda ou centro”, disse ao Estado. É preciso, pregou, “chutar com as duas pernas”.

"Em contextos de polarização política muito forte, os candidatos de centro tendem a ser dizimados — veja a Marina Silva nas últimas duas eleições, por exemplo—, a não ser que os polos ideológicos estejam tão desgastados que possa surgir uma nova alternativa centrista, como aconteceu na França com o Macron, um candidato carismático que conseguiu fazer uma síntese de uma pauta econômica liberal com valores progressistas", diz Roman. "Huck é provavelmente um candidato mais frágil do que o Macron era e as condições estruturais do país são muito diferentes", segue o diretor do Atlas.

Uma das perguntas também é quanto tempo Huck, agora tão explicitamente no jogo político, resistirá à frente de uma vitrine imbatível como o seu Caldeirão do Huck. Às vésperas da campanha de 2018, circulou que a Globo fez o apresentador saber que um salto ao mundo político seria um ponto de não retorno. Qualquer que seja o desfecho, já estará feito o trabalho de imagem de décadas, onde ele combina a aparição das celebridades do momento com quadros sociais/assistenciais pelo país. Uma de suas bandeira é nada menos do que a educação pública.

Seja como for, no momento Bolsonaro ainda exibe uma base firme e fiel que dará trabalho para um futuro competidor. Um observador atento ao jogo político do Brasil lembra que a construção de uma candidatura leva tempo – e por ora o nome de Huck parece forte por contar com uma elite articulada e recursos para se expor – e que, por isso, é muito cedo para fazer prognósticos seguros. “Há muita água para passar por baixo da ponte e 2020 é primeiro teste. Mas nada é decisivo, como mostrou a eleição de 2016, quando Geraldo Alckmin saiu como o grande vitorioso por ter apostado em João Doria para a Prefeitura de São Paulo, que ganhou em primeiro turno”, diz. “Dois anos depois, Alckmin não era ninguém”, pondera ele, lembrando os ínfimos 5% que o tucano levou na corrida presidencial vencida por Bolsonaro.

O Planalto tampouco assiste aos movimentos de braços cruzados. Bolsonaro, que se engajou num jogo de desgaste com Sergio Moro, já havia partido para as críticas a Doria e até mesmo a Huck, lançando-se à reeleição sem maiores disfarces, numa aceleração explícita do calendário eleitoral. Em 2018, o capitão reformado do Exército se impôs ao sistema partidário tradicional, concorrendo a bordo do minúsculo PSL —a mesma elite partidária que expeliu o ultradireitista, aliás, também não acolheu Huck, preferindo Alckmin. Agora Bolsonaro não só tem a máquina da presidência como seu PSL é de dono de um montante relevante do fundo partidário rumo às municipais. Poderá um Governo voltado a uma minoria radicalizada se perpetuar? Depois de rever muitos de seus dogmas no ano passado, a ciência política brasileira também aguarda para escrever a quente esse novíssimo capítulo.


El País: Bolsonaro passará por nova cirurgia para corrigir hérnia no local da facada

Informação foi confirmada pelo Planalto após o presidente passar por exames na manhã deste domingo em São Paulo. Operação deve ocorrer no próximo domingo, 8 de setembro

O presidente Jair Bolsonaro será submetido a mais uma cirurgia e deverá ficar afastado em recuperação por cerca de dez dias. A informação foi confirmada na manhã deste domingo pelo Palácio do Planalto, horas após o presidente realizar uma série de exames no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Em nota divulgada nas redes sociais do mandatário, assinada pelo médico Ricardo Peixoto Camarinha, o Governo diz que a cirurgia é necessária para corrigir uma "hérnia incisional, que surgiu em decorrência das intervenções cirúrgicas previamente realizadas", na região do abdome, como consequência da facada que Bolsonaro levou há quase um ano, durante um ato da sua campanha em Juiz de Fora (MG).

De acordo com informações do site G1 e da GloboNews, a cirurgia está prevista para acontecer no próximo domingo, 8 de setembro, mas a data ainda não foi confirmada pela assessoria presidencial. Em seu perfil no Twitter, o presidente Jair Bolsonaro publicou uma foto ao lado da equipe médica que o atendeu após passar pelos exames neste domingo, e disse apenas que deve "curtir uns 10 dias de férias".

Jair M. Bolsonaro

@jairbolsonaro

- Agora em São Paulo com os Drs. Macedo e Leandro.

- Pelo que tudo indica “curtirei” uns 10 dias de férias com eles brevemente.
- Bom dia a todos.

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Esta será a quarta cirurgia que o mandatário deverá se submeter como consequência da facada que levou —o ataque contra ele completa um ano na sexta-feira, 6 de setembro. Trata-se de uma operação de médio porte, segundo informou ao G1 o médico Antonio Luiz Macedo (da equipe que atende o presidente no hospital Albert Einstein). "Abriremos três vezes no mesmo lugar. Enfraqueceu", afirmou.

Adélio Bispo de Oliveira, o autor da facada que atingiu o abdome do então candidato à Presidência, continua internado por tempo indeterminado na Penitenciária Federal de Segurança Máxima de Campo Grande (MS). Em julho, ele foi considerado pela Justiça inimputável por problemas psicológicos.


Juan Arias: Na guerra sobre a Amazônia, o Brasil ganhou e Bolsonaro perdeu

Quem sai engrandecido dessa guerra são, de fato, os brasileiros e sua luta na defesa do meio ambiente

Na guerra sobre a destruição da Amazônia, o presidente, Jair Bolsonaro, saiu derrotado enquanto o Brasil e suas riquezas naturais foram defendidos em todo o mundo. As ideias destrutivas do líder brasileiro e seus comentários depreciativos e até grosseiros pronunciados, por exemplo, sobre presidentes europeus como Emmanuel Macron, da França, e Angela Merkel, da Alemanha, acabaram ofuscando ainda mais sua já surrada figura no exterior.

O presidente brasileiro que havia dito, dias atrás, que não iria ser um presidente “banana”, acabou sendo visto como tal pelos líderes mais importantes do estrangeiro. Suas chacotas sobre a Amazônia apelando até a uma linguagem de cunho anal como quando disse que bastava “um cocô petrificado de índio” para paralisar uma obra, não foram apreciadas fora do Brasil. O mundo sempre admirou e até invejou o santuário natural da Amazônia que abriga o maior bioma do planeta e que é reconhecido como um dos maiores tesouros ecológicos ainda vivos da Terra.

Também se tornaram um bumerangue as zombarias sobre o Presidente Macron nas redes sociais aplaudidas por Bolsonaro sobre a comparação entre sua esposa, Brigitte, já idosa, e a jovem Michelle, a esposa do Presidente brasileiro. E mesmo as brincadeiras de mau gosto do vice-presidente, o general Mourão, sobre os tremores que às vezes afetam a líder alemã Merkel. Todas essas atitudes serviram principalmente para que o mundo constatasse que o Brasil, possuidor não somente de imensas riquezas naturais, como também humanas, merecia alguém mais digno e preparado para ser governado.

A atitude do Presidente brasileiro e de seu governo durante o episódio da Amazônia, que abalou o mundo, serviu também para expor a ausência dramática de uma política externa à altura das circunstâncias, algo que sempre foi considerado como uma das glórias e acertos da política brasileira, seja de direita ou de esquerda.

Basta observar nesses dias as manchetes dos grandes jornais internacionais para constatar a condenação universal sobre as opiniões e posturas de Bolsonaro sobre a Amazônia. Nas análises de tais jornais, que pautam a opinião mundial, fica bem clara a distinção que se faz no exterior entre as posturas iconoclastas do líder brasileiro sobre a Amazônia e a postura de resistência dos brasileiros.

Fica claro, internacionalmente, que é o novo Presidente Bolsonaro e não os brasileiros que prefere ver a Amazônia transformada em pasto para gado, cultivo de soja e em túneis abertos em suas entranhas para a extração de minerais, o grande sonho dos capitalistas. Assim como gostaria de ver os indígenas expulsos dessas terras que sempre foram suas e têm o direito de habitar.

Ao mesmo tempo, na abundante informação mundial sobre o conflito do novo Governo de extrema direita sobre os incêndios cada dia maiores e mais numerosos vistos na Amazônia, criminosos em sua grande maioria, ficou clara a distinção entre as posturas de Bolsonaro e o que os brasileiros mereciam ter na liderança para resolver seus problemas.

Quem talvez melhor o tenha expressado e que honra a todos os brasileiros e os que decidiram fazer desse país sua casa, foi o Presidente francês Macron com essas palavras; “Como tenho uma grande amizade e respeito pelo povo do Brasil, espero que tenham rapidamente um presidente que se comporte à altura”.

Quem sai engrandecido dessa guerra são, de fato, os brasileiros e sua luta na defesa da Amazônia, que continuam angariando a simpatia do mundo. E isso, nesse momento, é o que mais importa, já que os presidentes e os governos passam, e os brasileiros continuarão sendo vistos com estima e afeto, merecedores de estadistas capazes de defender suas essências e suas riquezas.

Alguém poderia dizer que Bolsonaro pouco se importa com a opinião dos líderes estrangeiros. Que o que lhe serve são os votos de seus fanáticos defensores, por certo sempre menores, a quem parece querer especialmente agradar. Ele se esquece que o mundo hoje mudou e que, às vezes, a um líder pode ser tão ou mais perigoso o repúdio internacional que o de seus próprios compatriotas.

Os nacionalismos exasperados, os sonhos de muros e barreiras para não se deixar contaminar com o que vem de fora estão ficando cada vez mais obsoletos. Apesar das tentações totalitárias e do ressurgir dos novos patriotismos que a globalização destruiu, hoje é mais fácil, às vezes, ganhar e perder eleições presidenciais fora do que dentro do país.

Hoje é cada vez mais evidente, por exemplo, que o ex-presidente brasileiro, o ex-operário Lula, deve suas duas eleições e as de sua pupila Dilma, tão ou mais que a seu consenso interno, onde muitos o temiam ao chegar, ao indiscutível consenso e aplauso que possuía internacionalmente. Aplauso que mantém ainda hoje na prisão e que, se não me engano, ainda será fundamental para que possa recuperar sua liberdade.

Deveriam explicar a Bolsonaro que sua sobrevivência no poder depende hoje não só dos brasileiros, e sim também de sua imagem no exterior. Esquecer e desprezar tal conselho pode lhe ser fatal. Ou já está sendo?


El País: Boicote por crise dos incêndios na Amazônia chega ao mercado financeiro e acende alerta

Banco nórdico, Nordea, suspende compras de títulos do Governo brasileiro por incêndios. Onda de queimadas provoca cautela diante dos fundos que levam em conta práticas ambientais, sociais e de governança, que estão em alta

Os reflexos da crise ambiental desencadeada pelo aumento das queimadas na Amazônia chegou nesta semana ao mercado financeiro. O Nordea, o maior banco dos países nórdicos, afirmou que decidiu suspender as compras de títulos do Governo brasileiro, devido a preocupação com as respostas do Governo de Jair Bolsonaro dadas até agora aos incêndios na Amazônia. Banco nórdico, Nordea, suspende compras de títulos do Governo brasileiro devido ao aumento de incêndios.

A instituição financeira sediada em Helsinque, na capital da Finlândia, informou que está adotando uma "quarentena temporária" para a compra de bônus brasileiros denominados em dólar e real. "O que significa que não há compras adicionais e apenas ações potenciais de venda", afirmou à agência Reuters Thede Ruest, chefe de dívida dos mercados emergentes do Nordea. “Se avaliarmos desenvolvimentos positivos, podemos suspender a quarentena antes de uma data definida – igualmente se a situação piorar, talvez tenhamos que excluir os títulos do Governo brasileiro do nosso universo”, acrescentou. A Nordea Asset Management disse que sua exposição atual a esses títulos do Brasil é de aproximadamente 100 milhões de euros.

A decisão do banco nórdico é um alerta de que a questão ambiental ainda pode trazer implicações maiores ao Brasil, segundo o economista Lívio Ribeiro, da Fundação Getúlio Vargas. "Essa gestora é muito grande e o tema é bastante relevante, um sinal importante. Se esse episódio do Nordea for replicado, ele pode trazer implicações negativas importantes. A decisão não pode ser menosprezada. A última coisa que precisamos é de mais ruído para a economia brasileira", explica.

A responsabilidade ambiental, social e de governança (ESG, na sigla em inglês) é um critério crescente nos portfólios de fundos de investimentos pelo mundo, como reflexo dos grupos de pressão na sociedade organizados em torno do combate ao aquecimento global ou contra a exploração do trabalho. Veículos especializados noticiaram nesta semana que outros grupos orientados pelo ESG disseram que a onda de queimadas entrou no radar, mas nenhum deles havia anunciado ainda o passo tomado pelo Nordea.

De acordo com a Reuters, outros investidores nórdicos também têm demonstrado preocupações sobre o tema, incluindo o KLP, um fundo de pensão norueguês com mais de 80 bilhões de dólares em ativos sob gestão. O fundo disse estar em contato com empresas norte-americanas - com a quais possui investimentos- que fizeram negócios com produtores agrícolas para solicitar "ações concretas".

“Também analisaremos as empresas norueguesas que importam produtos de soja do Brasil para avaliar isso e pedimos que façam o possível para proteger as florestas tropicais”, afirmou Jeanett Bergan, chefe de investimentos responsáveis da KLP, em comunicado, segundo a Reuters.

O anúncio do banco nórdico é a mais recente reação aos milhares de incêndios no norte brasileiro, que, há semanas, geram uma crise internacional para o país, com protestos da população e de líderes mundiais preocupados com a forma em que o Governo de Bolsonaro está conduzindo a situação. A avaliação é que o presidente brasileiro teve uma reação tardia e pouco faz para proteger a maior floresta tropical do mundo.

Ambientalistas defendem grande parte dos incêndios foi ilegalmente provocada por grileiros e fazendeiros que procuram expandir pastagens na Amazônia e que se sentem encorajados pelas críticas do presidente a excessivas proteções ambientais. Bolsonaro nega, no entanto, que os incêndios sejam deliberados.

O banco nórdico afirmou, em nota, que o modo que ao Governo lida com a questão poderia afetar a estabilidade política no Brasil, ameaçando inclusive o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, e potencialmente levar companhias internacionais a boicotar produtos agrícolas brasileiros.

Multinacionais já ameaçam suspender a importação de produtos do Brasil caso a situação não se resolva. A empresa dona de marcas populares entre a classe média do país, como Kipling, Timberland e Vans, confirmou a jornais brasileiros que não utilizará mais o couro vindo do Brasil até que tenha absoluta segurança da origem dos produtos. Já a maior produtora norueguesa de salmão avalia boicotar a soja brasileira, enquanto a empresa Nestlé afirmou que está revisando a compra de subprodutos de carne e cacau da região amazônica "para garantir que esteja alinhada ao padrão de fornecimento responsável".

Além do risco de um boicote aos produtos agropecuários brasileiros, outro revés financeiro já está em curso. A Noruega e a Alemanha suspenderamrepasses de quase 300 milhões de reais ao Fundo Amazônia, entidade responsável por fomentar e gerir projetos ambientais na região. Os dois países acusam Bolsonaro de falta de compromisso com a preservação. Recursos internacionais são responsáveis por quase 99% do dinheiro do fundo, que é utilizado pelos governos estaduais para a compra de viaturas e aeronaves de combate a incêndio, e também por ONGs conservacionistas.

"Europa não tem lições para nos dar"

Apesar de ter ido à TV falar sobre seu compromisso com a floresta, Bolsonaro  segue insistindo em rever reservas indígenas, que coincidem com as áreas amazônicas mais preservadas, ou prometendo liberar atividade econômica como garimpo nas áreas. Mesmo diante da forte pressão internacional, Bolsonaro continua confrontando os países críticos de sua política ambiental.

Na manhã desta sexta-feira, ele afirmou que a Europa "não tem nada a ensinar" ao Brasil sobre preservação ambiental, enquanto novos incêndios foram detectados na região amazônica no primeiro dia em que passou a valer um decreto do presidente que proíbe queimadas por 60 dias, salvo em situações permitidas pelos órgãos de fiscalização. De acordo com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), desde janeiro até a última terça-feira foram registrados 83.329 focos de incêndios no Brasil, sendo mais da metade (52,1%) na selva amazônica.

O presidente brasileiro acusa a Alemanha e a França de tentarem "comprar" a soberania do Brasil após o G7, bloco que reúne as maiores potências ocidentais, oferecer 20 milhões de dólares em ajuda para combater o fogo e se negou a receber ajuda até o presidente francês, Emannuel Macron, retirar seus comentários críticos e de internacionalizar a proteção da Amazônia.

"Europa toda junta não tem lições para nos dar no tocante ao meio ambiente", afirmou Bolsonaro a jornalistas em Brasília. Mais tarde, no entanto, o presidente fez um aceno mais amigável a Alemanha e disse ter tido uma conversa por telefone "bastante produtiva" com a chanceler alemã Angela Merkel. "A pedido do Governo Alemão, o Serviço Europeu de Ação Externa foi mobilizado para avaliar a situação das queimadas na América do Sul. Segundo o SEAE, as informações de satélite do Sistema Copernicus demonstram que a área com queimadas no Brasil teve um decréscimo entre janeiro e agosto de 2019, levando-se em conta o mesmo período de 2018, o que prova o compromisso do nosso Governo com a questão ambiental", escreveu o presidente brasileiro em sua conta do Twitter.

A aliança preferencial do presidente brasileiro segue sendo com Donald Trump, a quem disse ter pedido ajuda sobre a Amazônia. Eduardo Bolsonaro, indicado pelo pai para ser embaixador do Brasil em Washington, algo que ainda depende da aprovação no Senado, esteve nesta sexta em reunião express na Casa Branca para agradecer Trump pelo apoio na crise. O presidente norte-americano também foi notícia nesta semana por ter tem tomado medidas que afrouxam a política de combate ao aquecimento global nos EUA.

Com agências Reuters e AFP

Jair M. Bolsonaro

@jairbolsonaro

Hoje tive uma conversa bastante produtiva com a Chanceler Ângela Merkel, a qual reafirmou a soberania brasileira na nossa região amazônica. A pedido do Governo Alemão, o Serviço Europeu de Ação Externa foi mobilizado para avaliar a situação das queimadas na América do Sul.

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El País: Ex-líder dissidente das FARC anuncia retomada à luta armada na Colômbia

Iván Márquez, ex-negociador-chefe da extinta guerrilha, reaparece em um vídeo ao lado de outros antigos líderes e anuncia "nova etapa da luta"

“Nunca fomos vencidos nem derrotados ideologicamente. É por isso que a luta continua. A história registrará em suas páginas que fomos forçados a voltar às armas”, diz Márquez no vídeo ao lado de homens armados com fuzis. Entre eles, estão outros líderes importantes das antigas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, que se afastaram de seus compromissos com a Jurisdição Especial para a Paz (JEP): Seuxis Paucias Hernández, conhecido como Jesús Santrich e procurado pela Justiça sob a acusação de narcotráfico, e Hernán Darío Velázquez, El Paisa, que liderou uma das estruturas mais sangrentas da insurgência.

“Anunciamos ao mundo que começou a segunda Marquetalia [referência o lugar emblemático onde as FARC nasceram, mais de meio século atrás] sob o amparo do direito universal que todos os povos do mundo têm de se levantarem em armas contra a opressão", proclama Márquez na gravação de 32 minutos, datada de 29 de agosto de 2019. Afirma que falam de algum lugar do rio Inírida, na região amazônica ao sudeste do país, perto das fronteiras com a Venezuela e o Brasil. No entanto, vários observadores e informações de inteligência sugerem que o grupo de ex-comandantes dissidentes se encontra em território venezuelano.

Márquez aparece no vídeo em traje verde militar e com uma arma na cintura. Diz que a decisão de retornar às armas "é a continuação da luta guerrilheira em resposta à traição do Estado ao acordo de paz de Havana" e que buscarão alianças com o Exército de Libertação Nacional (ELN) —última guerrilha ativa na Colômbia—, com forte presença na fronteira com a Venezuela. Embora o presidente Iván Duque, com pouco mais de um ano no cargo, tenha reiterado a necessidade de fazer correções no acordo —uma promessa de campanha—, também endossou o compromisso do Governo de acompanhar os mais de 10.000 ex-combatentes em processo reintegração, que fazem sua transição para a vida civil.

“A paz é uma conquista histórica que não tem volta. Esta não é a primeira nem será a última crise”, disse Humberto de La Calle, o negociador-chefe do Governo de Juan Manuel Santos durante os diálogos, ao mesmo tempo em que exortou a comunidade internacional a redobrar seu apoio e monitoramento do processo. O Governo de Duque “tem que assumir com decisão e com critério de Estado a liderança do processo de paz e deixar de atuar com critérios de partido, como fez até esta data”, se queixou De La Calle. O atual presidente é herdeiro político do ex-presidente Álvaro Uribe, o mais férreo crítico da negociação com as FARC.

As FARC —que já foram a maior guerrilha do continente e, após largar as armas, se tornaram um partido político—  hoje se sentam no Congresso colombiano em dez cadeiras garantidas como parte do acordo de paz. Mas o paradeiro desconhecido de Márquez, Santrich e El Paisa, líderes que deixaram os espaços de reintegração alegando insegurança física e jurídica, já havia despertado alarmes sobre o futuro dos ex-combatentes. Os maiores temores são de que esses líderes alimentem o fogo das dissidências que operam em diferentes regiões. Algo que o vídeo parece confirmar. No entanto, não fica claro se o grupo de ex-comandantes está articulado com outros dissidentes, como aqueles encabeçados por Gentil Duarte, ou se esses grupos tenham alguma cadeia de comando.

Esses temores já haviam sido alimentados por pronunciamentos de Márquez, já na clandestinidade, nos quais havia qualificado por duas ocasiões o desarmamento como um "erro grave", porque alegava que os fuzis eram a única maneira de garantir que o Estado cumprisse o pactuado. E também pelo caso rocambolesco de Jesús Santrich, que passou um ano na prisão. Os Estados Unidos pediram sua extradição, mas ele foi libertado por ordem da Justiça de transição e se tornou formalmente um foragido da Justiça.

Márquez, que chegou a ser o “número 2” dos guerrilheiros, manteve durante os diálogos de paz, um embate com o chefe rebelde máximo, Rodrigo Londoño, Timochenko, agora presidente da Força Alternativa Revolucionária do Comum, o partido que surgiu dos acordos e que herdou as siglas da guerrilha. “Sinto vergonha por todas as pessoas que nos acompanharam de fora. Quero reiterar à Colômbia, a Cuba, à Noruega [os países verificadores], às Nações Unidas e a toda a comunidade [internacional] que nosso compromisso permanece acima das dificuldades”, disse Londoño, em uma das primeiras reações do partido FARC. "Acho que nós que estamos no processo somos mais e melhores e não vamos esmorecer", afirmou à W Radio.

“A decisão que eles tomaram é um grande erro. Há uma desconexão com a realidade que o país vive atualmente", acrescentou Iván Gallo, conhecido como Carlos Antonio Lozada, senador pelas Farc. "Embora seja verdade que existem vários argumentos com fundamento sobre descumprimentos, a via armada não tem cabimento na Colômbia."

Márquez diz no vídeo que a nova insurgência, que leva o nome e os símbolos das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, não tem como alvo soldados nem policiais "respeitosos dos interesses populares", mas "essa oligarquia excludente e corrupta, mafiosa e violenta que acredita que pode continuar a atravancar a porta do futuro de um país". Afirma que o Estado conhecerá "uma nova modalidade operativa (...) Nós responderemos apenas à ofensiva".

Promete também um "total afastamento das retenções para fins econômicos", em uma aparente referência a sequestros, embora procurem "o diálogo com empresários, pecuaristas, comerciantes e pessoas abastadas do país, buscando assim sua contribuição para o progresso de comunidades rurais e urbanas". Márquez afirma que desde a assinatura do acordo, no final de 2016, os assassinatos de líderes sociais e ex-guerrilheiros não pararam.

E acrescenta: "Tudo isso, a armadilha, a traição e a perfídia, a modificação unilateral do texto do acordo, o descumprimento dos compromissos por parte do Estado, as armações judiciais e a insegurança jurídica, nos forçaram a voltar para a montanha". No final do manifesto, Santrich intervém para gritar o bordão "Viva as FARC-EP", que os demais guerrilheiros respondem com um "Viva!".

Na véspera, a Fundação Paz e Reconciliação-Pares havia alertado que as dissidências operam em 85 municípios, estão agrupadas em 23 estruturas e têm 1.800 guerrilheiros, além de 300 novos recrutas. Segundo os investigadores, a criação de uma nova guerrilha é um dos cenários mais delicados para o futuro. "O mais provável é que Iván Márquez, Jesús Santrich e os 11 comandantes que se retiraram do acordo de paz ano passado tenham entrado em contato com alguns grupos dissidentes, o que reforçaria a possibilidade de criação de uma nova estrutura com ambições políticas", aponta o relatório.


El País: PIB surpreende, avança 0,4% no segundo trimestre e Brasil escapa da recessão técnica

País tem retomada tímida de indicadores de investimento das empresas e consumo das famílias. Resultado foi puxado pelos ganhos da indústria e dos serviços

O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu 0,4% no segundo trimestre em relação ao três primeiros meses deste ano, de acordo com dados divulgados nesta quinta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE). O avanço da atividade, que veio acima das principais projeções, fez com que país escapasse da recessão técnica, quando a economia deixa de crescer por dois trimestres consecutivos, já que entre janeiro e março, o Brasil registrou um recuo de 0,2%.

O resultado foi puxado, principalmente, pelos ganhos da indústria (0,7%) e dos serviços (0,3%). Já a agropecuária caiu 0,4%. O crescimento na indústria foi influenciado pela expansão das indústrias de transformação (2%) e construção (1,9%). Já as extrativas recuaram (-3.8%) no período. Em valores correntes, o PIB no segundo trimestre totalizou 1,78 trilhão de reais.

Mesmo com uma agenda de reformas em andamento, um cenário de inflação fraca e juros em uma mínima histórica de 6%,o desemprego ainda é um entrave e permanece elevado - atingindo mais de 12 milhões de pessoas, o que restringe os gastos dos brasileiros. Segundo o IBGE, o consumo das famílias avançou apenas 0,3%.

Já o investimento (Formação Bruta de Capital Fixo) - que inclui os recursos em máquinas e equipamentos, construção civil e inovação- se destacou com um aumento de 3,2%, impulsionado principalmente pela construção. Foi o melhor resultado desde o mesmo período de 2013, quando ele cresceu 5,8%. No segundo trimestre de 2019, a taxa de investimento foi de 15,9% do PIB, acima da observada no mesmo período de 2018 (15,3%).

A construção civil responde por cerca de metade do investimento no país e o setor finalmente apresentou resultado positivo. Segundo o IBGE, a atividade  que avançou 1,9% em relação ao trimestre anterior, interrompeu uma série de 20 trimestre consecutivos de queda. A melhora do setor foi impulsionada principalmente pelo mercado imobiliário e não por obras de infraestrutura.

Na avaliação do economista André Perfeito, da corretora Necton, o avanço do PIB maior do que o projetado pelo mercado - que apontavam para alta de 0.2% - "é uma surpresa extremamente" positiva e irá forçar revisões em nossas projeções.

O desempenho do PIB repercutiu positivamente na Bolsa de Valores de São Paulo na manhã desta quinta-feira. O Ibovespa opera em alta seguindo também as bolsas internacionais. Às 11h50 ( horário de Brasília), o índice avançava 0,73%, a 99.041 pontos.

Economia ainda patina

Apesar do avanço no segundo trimestre, a economia brasileira ainda patina e não conseguiu se recuperar da recessão de 2015 e 2016, quando a atividade somou uma queda de 8%. A retomada tem sido uma das maias lentas das últimas décadas. Após sair oficialmente da recessão há dois anos, o país cresceu apenas 1,1% em 2017 e repetiu o valor no ano passado. Para 2019, as projeções do mercado são de um avanço de cerca de 0,8%, um resultado ainda mais fraco que os dois últimos anos.

“Não dá para afirmar que há recuperação, precisamos de um período maior de análise”, afirmou a gerente de contas trimestrais do IBGE, Claudia Dionísio, ao ser questionada por jornalistas se o resultado indica uma retomada. De acordo com Dionísio, com a recuperação lenta e gradual, a economia recuperou até o momento apenas 3,7% das perdas registradas durante a recessão até o 4º trimestre de 2016.

Embora haja perspectivas positivas para o futuro da economia, como o histórico acordo comercial do Mercosul com a União Europeia, o país ainda é suscetível às intempéries do ambiente político e do exterior. Enquanto o cenário global se complica, com o acirramento da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China e os temores de uma recessão mundial avança, a crise ambiental desencadeada pelo aumento das queimadas na Amazônia e pela reação tardia do Governo de Jair Bolsonaro já respingam na economia. Pelo menos dezoito marcas brasileiras confirmaram que suspenderão o uso do couro brasileiro até que seja esclarecida a origem dos produtos.

Além disso, a já debilitada economia Argentina, o parceiro comercial mais importante do Brasil na região, passa por uma nova turbulência após as primárias revelarem o favoritismo de Alberto Fernández, nas eleições presidenciais. O país vizinho apelou ao FMI e credores por mais tempo para pagar a dívida. A notícia deve ter reflexo no mercado brasileiro.

Setor externo

No segundo trimestre, as exportações registraram desempenho negativo. No período, as vendas do Brasil para outros países caíram 1,6%, em relação aos três primeiros meses do ano. A queda foi maior do que a projetada pelas consultorias. Já as importações de Bens e Serviços cresceram 1,0% em relação ao primeiro trimestre de 2019.


Eliane Brum: Planeta em chamas

Enquanto bombeiros tentam apagar fogo na Europa, no Brasil fazendeiros queimam a Amazônia

A ativista adolescente Greta Thunberg costuma afirmar, na tentativa de acordar os adultos para a emergência climática: “Nossa casa está em chamas”. No momento, a sueca de 16 anos atravessa o oceano num barco à vela rumo à Conferência da ONU, em Nova York. O que Greta pode não ter imaginado, porém, é ainda mais assustador: fazendeiros e grileiros atearem fogo na floresta, deliberadamente, como manifesto político. É o que aconteceu na Amazônia, em 10 de agosto, segundo foi anunciado no jornal de Novo Progresso.

Fazendeiros e grileiros do entorno da BR-163, uma das regiões de maior conflito na Amazônia brasileira, programaram o “Dia do Fogo”. Na data, queimaram áreas de pasto e em processo de desmatamento. Segundo uma das lideranças, entrevistada pelo jornal Folha do Progresso, setores do agronegócio se sentem “amparados pelas palavras de Jair Bolsonaro”, que estimula a abertura das áreas protegidas da floresta para exploração agropecuária e mineração. Disseram também que desejavam mostrar ao presidente do Brasil “que querem trabalhar e o único jeito é derrubando, e para formar e limpar nossas pastagens é com fogo”.

Tudo indica que conseguiram. Anunciaram, pelo jornal, cinco dias antes. E cinco dias depois a Amazônia queimou — mais. Segundo os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, na data marcada Novo Progresso teve um número 300% maior de “queimadas”, com 124 focos de incêndio. No dia seguinte, o número saltou para 203. Em Altamira, as estatísticas mostraram uma realidade ainda mais assustadora: 743% de aumento, com 194 focos de incêndio. No domingo, chegaram a 237.

Enquanto Greta Thunberg navega para Nova York, sua frase se literaliza: há incêndios em diferentes partes do planeta, da Gran Canária, na Espanha, a Sibéria, na Rússia. A conexão com a crise climática pode ser mais ou menos direta. Na Europa, os focos apareceram depois do julho mais quente da história. No Ártico, os incêndios recordes criaram um ciclo vicioso: o fogo libera CO2 para a atmosfera e agrava o colapso climático. O trabalho dos bombeiros, em todas as partes, está sendo dificultado pelas ondas de calor e pela falta de umidade. Na América Latina, a Amazônia queima, assim como pedaços da Bolívia e do Paraguai.

As más notícias para superaquecer o planeta não param. Diante da explosão do desmatamento no Governo de Bolsonaro, Alemanha e Noruega suspenderam quase 300 milhões de reais destinados à proteção da Amazônia. Bolsonaro respondeu ao Governo alemão: “A Alemanha vai parar de comprar a Amazônia a prestações”. E, aos noruegueses: “Pega a grana e ajude a Angela Merkel a reflorestar a Alemanha".

Bolsonaro não é apenas estúpido — e muito mal educado. As declarações servem para acirrar a paranoia de seus seguidores: o antipresidente e seu clã defendem que a preocupação com a floresta é uma desculpa para tomar a Amazônia do Brasil. O curioso nacionalismo pregado por Bolsonaro amaldiçoa a Europa em nome da soberania e se curva até a cueca aparecer diante dos Estados Unidos de Donald Trump. Para setores do empresariado brasileiro, porém, a única boa notícia no atual governo foi o acordo entre União Europeia e Mercosul, costurado durante 20 anos pelos governos anteriores e hoje ameaçado pela escandalosa destruição da Amazônia. A Europa precisa decidir: se continuar comprando carne de desmatadores e produtos empapados de agrotóxicos, o agronegócio predatório vai continuar se sentindo à vontade para ampliar os dias de fogo, estimulado pelo perverso que hoje lidera o Brasil.


El País || Governadores cobram plano de Bolsonaro para a Amazônia: 'Estamos perdendo tempo com o Macron'

Em reunião com o presidente, líderes dos nove Estados da Amazônia legal cobram plano de ação para conter avanço do desmatamento. Presidente sugere que demarcações de áreas indígenas e quilombolas prejudicam o país

Enquanto governadores dos nove Estados da Amazônia Legal cobravam pragmatismo nas ações para combater o desmatamento e os incêndios florestais, além de planejamento para os próximos anos, o presidente Jair Bolsonaro tentou usar uma reunião na manhã desta terça-feira para amplificar seu discurso anti-Macron. Com o contínuo aumento das queimadas na Amazônia (já são cerca de 80.000 focos), o presidente convocou os governadores para um encontro no qual, em tese, seriam apresentadas soluções para o tema. Mas o que ficou acertado foi a realização de uma nova reunião entre governadores e ministros e a promessa de que um pacote de mudanças legislativas será enviado ao Congresso até a próxima semana. Essas sugestões não foram detalhadas.

Essa foi a primeira vez que uma reunião da qual participaram nove governadores, o presidente, sete ministros e quatro assessores foi transmitida ao vivo pela internet nos canais pessoais do presidente, pela TV estatal e pelas redes sociais do Palácio do Planalto. Justamente um dia após uma pesquisa de opinião elaborada pela CNT/MDA mostrar que a rejeição ao seu Governo atingiu a marca de 39,5% da população.

Em duas horas e vinte minutos de conversas, Bolsonaro reclamou da proposta do presidente da França, Emanuel Macron, de internacionalizar a floresta e disse que o francês teria intenções que superam o tema ambiental. Nos últimos dias, Macron usou a reunião dos sete países mais ricos do mundo, o G7, em Biarritz, para discursar contra Bolsonaro, e acabou oferecendo doações para ajuda no combate ao incêndio, o que foi rejeitado pelo Palácio do Planalto. “Não temos nada contra o G7. Temos contra um presidente do G7, que sabemos o que ele está reverberando, qual é a sua intenção”.

Suas falas foram reforçadas por seu ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno e pelo governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (DEM). “A França não pode dar lição a ninguém. Onde eles passaram [como colonizadores] deixaram rastro de destruição, confusão e miséria. Eles não podem dar esse tipo de conselho a ninguém. Isso é molecagem”. O mato-grossense reclamou da batalha comercial que se aproxima com as queixas do presidente francês. “Essa guerra de comunicação que está sendo patrocinada pelos nossos principais concorrentes internacionais. O senhor Macron está surfando nas cinzas da Amazônia”.

Já Hélder Barbalho (MDB), governador do Pará, e Flávio Dino (PCdoB), se queixaram dos debates extremistas dos últimos dias. “Estamos perdendo muito tempo com o Macron. Temos de cuidar da nossa vida”, afirmou Barbalho. “Acho fundamental que façamos sempre um discurso ponderado. Quando se solta uma faísca nos níveis hierárquicos mais altos, quando vai chegando ao chão da realidade, pode se transformar em um incêndio”, acrescentou Dino.

Quem ficou no meio do termo, foi o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC). “Não temos tempo para discutir quem falou o quê ou quem deixou de falar. Mas também não aceitamos qualquer insinuação de internacionalização da Amazônia”.

Grilagem e indígenas

Quase todos os governadores reclamaram da ausência de projetos para reduzir a grilagem de terras e a de incluir as comunidades locais, como indígenas, nos planos federais. “Temos de pensar em médio e longo prazo”, alertou o governador do Amapá, Waldez Góes (PDT).

No encontro, ao menos quatro dos nove governadores cobraram o presidente sobre o uso do Fundo Amazônia, uma doação de 288 milhões de reais anuais feito principalmente pela Noruega e pela Alemanha para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) cujo destino final era ampliar a fiscalização na floresta. “Não podemos abrir mão do fundo. Não podemos rasgar dinheiro”, ressaltou o maranhense Flávio Dino (PCdoB). O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, começou a responder aos mandatários que um novo planejamento para o uso dos recursos estava sendo traçado. Mas Bolsonaro sugeriu que esse dinheiro tinha condicionantes para ser usado. “O Fundo Amazônia tem um preço: demarcações de terras indígenas, apas [áreas de proteções ambientais], [áreas] quilombolas, parques nacionais, etc. Isso leva um destino que já sabemos, a insolvência do Brasil”, afirmou o presidente. Na sequência, alegou que caso se dobrasse às potências internacionais, o problema do incêndio estaria resolvido. “Se eu demarcar agora, o fogo acaba na Amazônia em alguns minutos, com certeza”.

Nos últimos dias, em suas redes sociais, o presidente afirmou que na reunião com os governadores, ele apresentaria “a verdade sobre o que os outros querem com essa rica região”. No encontro, contudo, o único dado apresentado por ele foi um balanço sobre a quantia de pedidos de demarcações de áreas indígenas e áreas quilombolas nos nove Estados da Amazônia legal.

Segundo Bolsonaro, há 936 pedidos em trâmite final para quilombolas e 54 para reservas indígenas. Conforme o presidente, se esses pedidos de novas demarcações prosperassem, o agronegócio ficaria inviabilizado. “E se acabar o nosso agronegócio acabou a nossa economia. Vamos ficar aqui como naquela casa em que falta pão, todos brigam e ninguém tem razão”. Nesta quarta-feira, representantes dos nove Estados estarão com ministros do Governo para tentar dar início aos debates sobre o uso do Fundo Amazônia e sobre as próximas ações no combate ao incêndio.


El País || Brasil afasta fantasma de recessão técnica de olho na China e Argentina

Temores de crise global entram no radar do país, que não teve o “tsunami de investimentos” esperado com o encaminhamento da reforma da Previdência. PIB do segundo tri será divulgado dia 29

O Brasil coleciona um rosário de preocupações na economia que travam a retomada dos negócios e a recuperação do emprego. Hoje o país tem 12 milhões de pessoas desempregadas. Mesmo com reformas da Previdência e tributária em andamento, e o cenário político interno relativamente controlado, o cenário global se complica. A guerra comercial entre os Estados Unidos e a China se acirra, ao mesmo tempo que o gigante asiático desacelera, e os temores de uma crise mundial avançam. A Alemanha, por exemplo, flerta com a recessão técnica, e há dúvidas em relação à economia norte-americana.

Por ora, o temor da crise global estimulou a fuga de capitais da bolsa brasileira. De janeiro até o dia 15 de agosto já haviam saído 19 bilhões de reais de investidores estrangeiros, o maior volume desde 1996, como constatou o jornal Valor Econômico. Para além dos temores nos países desenvolvidos, há problemas domésticos e na vizinhança que teriam poder para contagiar o Brasil. A já debilitada economia argentina, o parceiro comercial mais importante do Brasil na região, passa por uma nova turbulência após as primárias revelarem o favoritismo de Alberto Fernández, nas eleições presidenciais. A Argentina está no radar imediato do Brasil. A instabilidade que se instalou no país vizinho após a vitória do Alberto Fernandez nas primárias eleitorais tem potencial para contagiar o Brasil. Nos cálculos do Itaú, para cada 5% de queda na produção industrial argentina, a exportação do Brasil cairia 25%, o que significaria uma queda de 0,2% no PIB.

O economista Luka Barbosa, do Itaú, ressalta, no entanto, que a situação econômica da China importa mais hoje do que a do país vizinho, uma vez que a queda de crescimento do país asiático afeta a economia brasileira tanto pela diminuição das exportações quanto no preço das commodities. “O que acontece na China é muito mais importante para o Brasil do que está acontecendo com a Argentina”, afirma Barbosa. O economista lembra que 30% das exportações do Brasil vão pra China, 20% pros Estados Unidos e apenas 5% para a Argentina.

Internamente, a cautela das empresas para investir dificulta a retomada. “A Previdência não gerou um tsunami de investimentos no Brasil, embora fosse essa narrativa. Falta narrativa de urgência”, observa o analista Thiago de Aragão, que transita entre Washington e Nova York, de onde conversa com fundos globais semanalmente. Aragão aponta a necessidade de microrreformas para destravar investimentos, como o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 79 que atualiza a Lei Geral das Telecomunicações e tem potencial para atrair mais recurso de longo prazo.

Aragão lembra que o Brasil depende de dois tipos de investidores: os que conhecem o Brasil de verdade, e filtram informações negativas, e outros sazonais que dependem “da sensação térmica” do mundo. “Para esses, quando tudo vai bem, incluindo os Estados Unidos, se permitem testar em novas águas. Mas quando o mundo não está bem como o esperado, temem mais os emergentes como o Brasil”, completa. O Governo Bolsonaro, no entanto, decidiu apostar primeiro num programa ambicioso de privatizações para entrar no radar dos investidores. Na semana passada, anunciou que 14 estatais serão privatizadas com a expectativa de arrecadar 2 trilhões de reais. O pacote inclui os Correios e até a Casa da Moeda.

Na avaliação de Silvio Campos, da consultoria Tendências, a demanda ainda está muito comprometida pela situação financeira das empresas e das famílias em um quadro fiscal complexo em que o Governo está sem espaço para estímulo. "O que resta é apostar em uma agenda competitiva. Algo que o país já esta fazendo há um tempo, desde a reforma trabalhista de 2017 e a lei da terceirização. Agora temos cadastro positivo, a reforma da Previdência, a medida provisória (MP) da liberdade econômica, a reforma tributária. São todas tentativas de tirar travas, criar um ambiente de negócios melhor", afirma. Sem recursos para o investimento público, o país perde uma importante válvula de escape, segundo Campos. "Perdemos este escape via financiamento subsidiado, ele se esgotou pela situação fiscal", afirma.

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, concorda que o investimento público hoje está parado, representa apenas 0,5% do PIB e deve continuar achatado por conta da regra do teto de gastos. "A equipe econômica foi afoita ao pensar que as concessões e leilões iriam deslanchar rápido e aquecer a economia. Tudo tem seu tempo. E hoje os investimentos privados estão parados também porque as empresas têm uma capacidade ociosa enorme. Estamos num processo de retomada lenta há muito tempo", explica.

Vale ressalta ainda que, embora devêssemos celebrar os efeitos positivos gerados pelas reformas que estão bem encaminhadas - principalmente a da Previdência –, o presidente Jair Bolsonaro não ajuda porque traz muito ruído no processo de retomada econômica. "Quando ele começa a falar sobre desmatamento e meio ambiente e usa um tom agressivo com países como a Alemanha, ele pode estar colocar em risco o próprio acordo comercial com a União Europeia. Bolsonaro tem potencial de impactar futuras parcerias comerciais". Nesta semana, o presidente francês, Emmanuele Macron já deixou claro que pode bloquear o acordo da União Europeia com o Mercosul depois da crise aberta com as queimadas na Amazônia.

Para Vale, como não há espaço para que o Governo produza novos estímulos econômicos, o que poderia ser colocado em discussão é a diminuição do spread bancário - a diferenças entre os juros que os bancos pagam quando você investe seu dinheiro e os juros que eles cobram quando fazem um empréstimo. "Não adianta reduzir a taxa básica de juros se ela tem pouca efetividade para a pessoa física. Hoje a média do spread bancário é de quase 40%, uma taxa muito elevada. É preciso aproximar de uma média mundial que é de 3%. Indo nessa direção você pode estimular consumo e crescimento", explica.


El País || A ‘Amazônia fora da lei’ de Bolsonaro

Incêndios são habituais nesta época, mas flexibilização dos controles ambientais no atual Governo acelerou a perda de vegetação. Neste sábado, aviões militares começaram a combater o fogo

A 3.000 quilômetros de distância em direção ao norte, em Rondônia, o território indígena dos Uru-eu-Wau-Wau queima. Nos últimos meses, sofreu sucessivas invasões que causaram desmatamento e, na sequência, incêndios para abrir o terreno. "Estamos denunciando desde janeiro", conta Ivaneide Bandeira, da ONG Kanindé Associação de Defesa Etnoambiental. A fumaça que sai da reserva indígena, em teoria protegida pelo Governo Federal, viaja 400 quilômetros e chega com força à capital Porto Velho, onde mora a ativista. Em imagens divulgadas nas redes sociais se vê uma espessa névoa que faz com que mal se possa respirar. Os hospitais estão abarrotados. "Em meu bairro a sensação é de que o mundo está caindo sobre nós", conta por telefone.

Os incêndios são comuns nessa época de seca na região e nem sempre são ilegais. Os dados indicam, entretanto, que as autoridades perderam o controle sobre a situação e que o país vive a maior onda de incêndios dos últimos cinco anos, de acordo com o Instituto Nacional de Investigação Espacial (INPE). Entre 1 de janeiro e 22 de agosto foram registrados 76.720 focos de incêndios, 85% a mais do que no mesmo período de 2018 (quando houve 41.400). Os satélites mostram que mais de 80% do território devorado pelas chamas está na Amazônia.

Os mesmos satélites utilizados pelo INPE indicam que o desmatamento aumentou 34% em maio, 88% em junho e 212% em julho em relação aos mesmos meses de 2018. Bolsonaro criticou a instituição e seus números em um encontro com jornalistas. O físico Ricardo Galvão, que comandava o INPE, contradisse publicamente o presidente e foi exonerado. Desde estão, a Amazônia está na mira internacional.

"O Brasil era um vilão ambiental. Mas desde que começamos a reduzir o desmatamento, nos transformamos em líderes na agenda ambiental global. Agora voltamos a uma situação até mesmo pior do que a que tínhamos na década de oitenta", diz a ex-ministra e ex-candidata presidencial Marina Silva. Ela agora elabora com outros ex-ministros e membros da sociedade civil uma carta ao Congresso pedindo que sejam suspensos os projetos para afrouxar as leis ambientais e a criação de uma comissão para debater políticas que combatam a crise ambiental. "Infelizmente, o que está acontecendo se deve às políticas desastrosas e irresponsáveis do Governo de Bolsonaro, que não tem competência para lidar com essa situação", afirma.

"Nem todos os incêndios estão relacionados ao desmatamento, mas os satélites indicam um aumento substancial dos fenômenos. São consequência basicamente das políticas do novo Governo, que incentiva a ocupação ilegal de terras na Amazônia e, consequentemente, a ocorrência dos incêndios ilegais", diz Paulo Artaxo, professor de Física da Universidade de São Paulo.

O especialista, que fez parte do Painel Governamental da Mudança Climática das Nações Unidas, diz que ainda é preciso fazer uma comparação mais detalhada entre as áreas desmatadas e as destruídas pelo fogo. Mas os especialistas dão como certo de que os aumentos dos dois fenômenos estão relacionados. Um levantamento do site InfoAmazonia, com base em dados públicos, indica que entre os dez municípios com mais incêndios, sete estão entre os que também mais sofreram com desmatamento anterior. Um relatório do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) chega à mesma conclusão.

Fonte: Programa de Monitoramento de Queimadas e Terra Brasilis - DETER - INPE. Publicado originalmente em infoamazonia.org.
Fonte: Programa de Monitoramento de Queimadas e Terra Brasilis - DETER - INPE. Publicado originalmente em infoamazonia.org.

As principais instituições do Ministério do Meio Ambiente são o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), responsável pela fiscalização e preservação de áreas naturais, e o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), órgão responsável pela formação de áreas de conservação. Bolsonaro colocou em andamento uma série de mudanças que tiram responsabilidades desses órgãos que, como denunciam ambientalistas e uma inédita aliança de oito ex-ministros, desmantelam a política ambiental brasileira. "Sempre houve desmatamento, mas agora é promovida pelo ministro, que desmantelou a governança ambiental", diz Marina Silva.

Cortes do Orçamento

Os cortes orçamentários também tiveram seu efeito. A prevenção e o controle de incêndios perderam 38,4% de seu Orçamento. "Nas proximidades de Porto Velho vejo bombeiros controlando os incêndios. Mas os órgãos não possuem meios suficientes para deter a invasão do território indígena", diz a ativista Ivaneide Bandeira.

Parte dos focos ocorre em áreas privadas que se expandem em direção à reserva natural que todas as propriedades têm obrigação de manter. Outra parte ocorre em áreas públicas protegidas e em territórios indígenas protegidos que sempre estiveram ameaçados por invasores, madeireiros e fazendeiros que querem invadir a terra. Há áreas ricas em minerais como o ouro e árvores centenárias em risco de extinção. E, principalmente, um espaço enorme que pode se transformar em pasto para o gado. Em todos esses casos é preciso abrir o terreno. E isso é sempre feito com fogo.

Ivar Busatto é coordenador da ONG Operação Amazônia Nativa no Mato Grosso, um dos territórios que mais sofrem com a seca —não chove há 90 dias— e que foram atingidos pelos incêndios. Sua organização contabilizou 24 focos em nove comunidades indígenas. "Moro aqui há 48 anos e sempre existiu fogo", diz. A seca é severa, com previsão de chuva somente no final de setembro. Nesse período é proibido por lei utilizar o fogo para qualquer atividade.

Seu Estado vive do negócio agrícola e produz parte da soja e do milho que o país exporta. O fogo serve para limpar os campos e para que os fazendeiros se expandam, legal e ilegalmente em direção a territórios protegidos. Parte da vegetação nativa já não existe. Mas agora, quando todos os olhos do mundo estão voltados às matas do Brasil, até o agronegócio se preocupa com as ações ambientais. A pressão internacional pode resultar em medidas drásticas, como sanções ao comércio brasileiro ou até a não ratificação do acordo entre o Mercosul e a União Europeia, como sugeriu o presidente francês Emmanuel Macron, na última quinta-feira, e o presidente do Conselho Europeu, neste sábado.

Jair M. Bolsonaro

@jairbolsonaro

- Confira a ação das aeronaves C-130 Hércules, da nossa Força Aérea, no combate aos focos de incêndio na Amazônia, partindo de Porto Velho (RO)! via @DefesaGovBr

Vídeo incorporado

18,5 mil pessoas estão falando sobre isso

Enquanto o G7, grupo dos países mais ricos do mundo, se reúne em Biarritz e coloca entre suas pautas a Amazônia brasileira, o Governo Bolsonaro, que chegou a sugerir que ONGs eram suspeitas da onda de incêndio, toma suas primeiras ações concretas para conter o fogo que devasta a floresta há semanas. "Mais de 43.000 militares das Forças Armadas reforçam ações de combate a incêndios na Amazônia", comemorou o presidente neste sábado, no Twitter. Ele compartilhou também imagens de aeronaves militares despejando água sobre as queimadas, nas primeiras missões após a decretação, nesta sexta, da chamada "GLO Ambiental", como ficou conhecida a Garantia da Lei e da Ordem voltada para a floresta.


El País: A eterna catástrofe na Amazônia

Cientistas afirmam que os múltiplos incêndios deste inverno não são uma exceção, e que ainda é cedo para falar em recorde

“Nossa casa está em chamas. Literalmente. A selva amazônica —os pulmões que produzem 20% do oxigênio do nosso planeta— está em chamas. É uma crise internacional”, proclamou na quinta-feira o presidente francês, Emmanuel Macron, na sua conta do Twitter. Alguns especialistas consultados são mais precavidos. “O que mostram nossos dados é que houve uma intensidade diária de incêndios acima da média em algumas partes da Amazônia durante as duas primeiras semanas de agosto”, diz Mark Parrington, do Copérnico, o programa europeu de observação da Terra. “Mas, em geral, as emissões totais [de CO2 gerado pelos incêndios] estimadas para agosto estiveram dentro dos limites normais: mais altas que nos últimos seis ou sete anos, porém mais baixas que no começo da década de 2000”, salienta.

Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) do Brasil detectou mais de 76.620 focos desde o começo do ano, quase o dobro que no mesmo período de 2018 (41.400), mas uma cifra não tão distante dos 70.625 registrados em 2016. “O número de incêndios aumentou com relação aos últimos anos e está perto da média de longo prazo”, explica Alberto Setzer, pesquisador do INPE.

NASA também é cautelosa. "Não é incomum ver incêndios no Brasil nesta época do ano, devido às altas temperaturas e à baixa umidade. O tempo dirá se este ano é um recorde ou simplesmente está dentro dos limites normais", tranquiliza a agência espacial norte-americana em seu site. A NASA recorda que os incêndios na bacia amazônica são muito raros no resto do ano, mas seu número aumenta a partir de julho, durante a estação seca, quando muitos fazendeiros utilizam o fogo para manter seus cultivos ou para limpar a terra para pastos ou outros fins. Os incêndios costumam alcançar seu pico em setembro e desaparecem em novembro.

“É verdade que a floresta amazônicasofre incêndios regularmente, mas de maneira nenhuma isto significa que seja normal. A Amazônia não evoluiu com incêndios frequentes. Os incêndios recorrentes não são um elemento natural na dinâmica da selva tropical, como em outros entornos, como o Cerrado”, adverte a bióloga brasileira Manoela Machado.

“A Amazônia queima durante as secas, mas não por causa secas. É queimada porque há uma demanda por pastos e terras de cultivo, e o Governo atual [presidido por Jair Bolsonaro] não só não inclui o desenvolvimento sustentável em seus planos como também estimula o desmatamento e restringe as ações sistemáticas contra ele”, lamenta Machado, pesquisadora da Universidade de Sheffield (Reino Unido) que estuda os impactos das atividades humanas nas selvas tropicais. “Não podemos saber exatamente e imediatamente como são os padrões atuais de incêndios comparados com os de outros anos, mas não deveríamos ver isto como algo normal, absolutamente”, alerta.

“Acredito que este ano, até agora, esteja normal em média, embora a gravidade dos incêndios varie por regiões. A diferença é que neste ano os meios de comunicação repercutiram a queima da Amazônia, o que é ótimo”, opina o ecólogo David Edwards, chefe do mesmo laboratório da Universidade de Sheffield. O pesquisador recorda que as queimadas na bacia amazônica são especialmente graves quando ocorre o El Niño, um fenômeno meteorológico natural e cíclico, vinculado a um aumento das temperaturas na parte oriental do Pacífico tropical. Os 70.625 focos registrados em 2016 coincidiram com um El Niño potente. Neste ano, entretanto, o fenômeno é fraco e, apesar disso, detectaram-se mais incêndios.

A selva amazônica abriga 10% de todas as espécies conhecidas de animais e plantas e armazena 100 bilhões de toneladas de carbono, uma quantidade dez vezes superior à emitida a cada ano pelo uso de combustíveis fósseis, segundo os cálculos da Universidade do Estado de Oregon (EUA). Edwards adverte que se trata de um peixe que morde o próprio rabo. “O problema é que a mata incendiada perde carbono à medida que as árvores queimadas vão morrendo lentamente, o que provoca uma maior mudança climática e uma maior perda da biodiversidade”, aponta.

“Em última instância, o fogo significa que as florestas têm mais probabilidades de voltar a queimar. E poderíamos acabar vendo essas florestas tropicais úmidas se transformarem em um sistema de savanas”, lamenta Edwards, que recorda que o problema não é exclusivo da Amazônia. “Enormes superfícies de Bornéu e Sumatra [no Sudeste Asiático] também sofrem incêndios, especialmente durante anos com um fenômeno potente do El Niño.”

A progressiva transformação da selva em cerrado é uma ameaça real, conforme alertou em 2016 uma equipe de cientistas brasileiros encabeçada pelo climatologista Carlos Nobre, da Academia Nacional de Ciências dos EUA. Em um artigo publicado na revista PNAS, os pesquisadores advertiam que a região amazônica se aqueceu em um grau Celsius nos últimos 60 anos, enquanto perdia 20% de sua superfície pelo desmatamento. Os modelos matemáticos sugerem que chegar a 40% representaria um ponto de inflexão. “Se esse limite for ultrapassado, poderia ocorrer a savanização em grande escala da maior parte do Sul e Leste da Amazônia”, diziam os cientistas.

O holandês Pepijn Veefkind dirige o instrumento Tropomi, um sensor a bordo do satélite europeu Sentinel-5P que é capaz de identificar pontos quentes de gases poluentes na atmosfera. “É verdade que os incêndios em grande escala na região amazônica ocorrem todos os anos. Embora as condições meteorológicas possam desempenhar um papel, é preciso salientar que a maioria desses focos é provocada pelo ser humano”, afirma. “Nossas observações confirmam: a maior parte dos incêndios tem lugar nas beiradas da floresta tropical. Se 2019 terá uma temporada recorde de incêndios é algo que só poderemos saber no final da estação seca.”