Economia

Luiz Carlos Azedo: Três tenores e um anjo torto

Grupo acompanhou a trajetória política do Brasil desde o golpe que destituiu João Goulart, em 1964, até a recente confusão armada por Bolsonaro

Luiz Carlos Azedo / Nas entrelinhas / Correio Braziliense

Um evento importante para a política será realizado, hoje, para discutir a crise brasileira, com a participação dos ex-presidentes José Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, no qual o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Nelson Jobim fará uma abertura sobre a crise institucional que estamos atravessando, com mediação do ex-governador fluminense Moreira Franco. O seminário “Um novo rumo para o Brasil” é promovido pelas fundações do MDB, PSDB, DEM e Cidadania, e contará ainda com os presidentes dos respectivos partidos — o deputado federal Baleia Rossi (SP), o ex-ministro das Cidades Bruno Araújo, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto e o ex-senador Roberto Freire, respectivamente.

O evento estava sendo organizado havia meses, para começar em 8 de setembro, mas o ex-presidente Michel Temer, premonitoriamente, sugeriu que fosse adiado por uma semana, não apenas por causa do feriadão do 7 de setembro, mas porque se temia que, no Dia da Independência, algum fato relevante ocorresse, como acabou acontecendo, exigindo certa decantação para que o evento não se transformasse numa operação de apagar incêndio. Ou seja, que deixasse de discutir saídas para a crise política que o país atravessa e o choque entre Poderes. Acabou que foi exatamente isso o que ocorreu no dia 8 de setembro, uma operação para conter as chamas dos discursos incendiários de Bolsonaro, que provocaram um locaute de caminhoneiros e que assombraram os agentes econômicos e aliados do governo.

O título da coluna, obviamente, é uma analogia, porque Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer nem de longe têm a potência de voz dos três tenores aos quais se remete: Plácido Do- mingo, José Carreras e Luciano Pavarotti, que cantaram juntos, em concertos, durante a década de 1990 e no início da década de 2000. A primeira performance do trio ocorreu nas Termas de Caracala, em Roma, Itália, em 7 de julho de 1990 — no encerramento da Copa do Mundo de Futebol de 1990. Zubin Mehta conduziu a Orquestra Maggio Musicale Fiorentino e a Orquestra do Teatro da Ópera de Roma.

Potência de voz no sentido figurado, porque são vozes influentes ainda hoje na política brasileira. Sarney virou um oráculo de muitos senadores influentes; FHC é o único que pode juntar os cacos do PSDB e continua sendo a referência política do grupo de economistas que salvou o país da hiperinflação; finalmente, Temer renasceu das cinzas, sendo o único interlocutor do presidente Jair Bolsonaro no mundo da alta política — os demais são operadores do baixo clero. O ex-ministro Nelson Jobim dispensa apresentação: é um personagem importante na calibragem das propostas que podem surgir do evento, porque foi ministro da Justiça de Fernando Henrique, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e ministro da Defesa do ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de personagem muito importante na elaboração da Constituição de 1988.\

O anjo torto
Do time de presidentes de partidos, Roberto Freire (Cidadania) é o único que participou da Constituinte. Viveu todos os momentos da transição à democracia, desde sua eleição a deputado federal em 1978. Baleia Rossi (MDB), Bruno Araújo (PS- DB) e ACM Neto (DEM) pertencem à nova geração que comanda o Congresso. No seminário, formarão uma espécie de backing vocal. Na música, muita gente subestima o coro que dá sustentação aos tenores e outros solistas, mas é preciso muita habilidade para desempenhar esse papel. É necessário percepção e habilidades que são desenvolvidas com estudos. Ter um ouvido bem apurado e prestar bastante atenção para não “entrar” na voz principal.

O encontro será transmitido ao vivo pelas redes sociais, a partir das 18h30, o primeiro da série de oito debates programáticos (economia, meio ambiente, saúde, educação, segurança, diversidade, relações exteriores), com grandes especialistas, na tentativa de formular uma agenda nova para o país, entre as quais uma saída sustentável para a crise econômica. Há muita experiência vivida nesse grupo, que acompanhou a trajetória política do Brasil desde o golpe que destituiu o presidente João Goulart, em 1964, até a confusão armada por Bolsonaro, na semana passada.

Para resumir a linha de pensamento vitoriosa nesse processo, há dois eixos: a defesa da democracia e a conciliação política. Mas ninguém se iluda: todos nesse grupo foram capazes de tomar decisões firmes em momentos difíceis e liderar rupturas. Por isso mesmo, não se deve esperar um debate monocórdico, um coro perfeito. Quem será o anjo torto?

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-tres-tenores-e-um-anjo-torto

Felipe Salto: Bolsonaro é cordeiro em pele de cordeiro

No ambiente criado por Bolsonaro, não há a menor possibilidade de avançar com as reformas

Felipe Saito / O Estado de S. Paulo

Winston Churchill costumava referir-se a Clement Attlee, líder trabalhista, por meio dessa versão modificada da conhecida expressão “lobo em pele de cordeiro”. A alcunha ajeita-se perfeitamente ao perfil do presidente Jair Bolsonaro. Ele não governa a partir de um ideário e de um plano construído com o Congresso Nacional, como se espera no modelo presidencialista vigente. Planta o caos, cria canais diretos com seus seguidores mais radicais, ignora a importância do equilíbrio institucional e, quando julga ter passado do tom, volta atrás. Neste ambiente, não há a menor possibilidade de o País avançar na agenda de reformas. A direção simetricamente oposta é a mais provável: retroceder nas áreas tributária, social, econômica e fiscal.

A famigerada carta veiculada após as manifestações do 7 de setembro não é senão um recuo, mas com prazo de validade. Enquanto isso, o País padece em meio à inflação de 10%, ao desemprego e à ausência de rumo em todas as áreas. Perde-se tempo e vidas continuam sendo ceifadas pela pandemia e pela crise econômica e social. Entretanto, o que importa ao chefe do Poder Executivo e a seus auxiliares é plantar tempestades para, então, acenar com uma aparente diástole. Ocorre que essa instabilidade não passa incólume. A economia vai crescer abaixo de 2% no ano que vem. No segundo semestre de 2021, deve ficar estacionada, no melhor dos cenários – isto é, se não houver uma crise energética e hídrica, como muitos já preveem.

O argumento de que o Supremo Tribunal Federal (STF) ou mesmo o Congresso impediriam o presidente de executar seus projetos para o País não tem fundamentação lógica ou empírica. As instituições trabalham dentro das suas atribuições, de modo que o fracasso retumbante na economia, na área social, na saúde, nas contas públicas, na política ambiental e na política externa é do governo. O centrão apoia Bolsonaro, mas a agenda é tão mal-ajambrada que nenhum tema relevante proposto pelo Executivo avançou. Quando conseguiu aprovar uma PEC, como no caso da Emenda 109, foi para piorar o regramento do teto de gastos. Para ter claro, a regra a acionar medidas de ajuste fiscal simplesmente não tem como ser ativada. Gastou-se capital político, é claro, e agora restou apresentar um Orçamento fake para 2022.

No lugar de preocupar-se com entregar resultados à população, a preferência é por conduzir o País em toada beligerante, alimentando o ódio à corrupção (dos outros) como combustível para segurar-se na corda bamba da baixa popularidade. Não adianta. No fim do dia, o que importa para as pessoas é se conseguirão voltar ao mercado de trabalho, botar comida na mesa, enfim, ter o mínimo para viver com dignidade.

A súcia de destemperados que foi às ruas no feriado da Independência, em sua maioria, nem sabia o que estava fazendo lá. Bradava palavras de ordem para um Bolsonaro que já não existe ou, melhor dizendo, que nunca existiu. Mas o Brasil real – expressão de Machado de Assis que também Darcy Ribeiro e Ariano Suassuna utilizavam – sofre e imagina, um dia, poder melhorar sua situação econômica. As pessoas, no fundo, querem ser felizes.

Os arroubos de autoritarismo do presidente da República já não encontram o mesmo eco no mercado. Os donos do poder financeiro perceberam que não haverá progresso com alguém que, cotidianamente, deixa em aberto o futuro. Sobe ao palanque para atacar o ministro Alexandre de Moraes num dia, para, então, elogiá-lo logo depois. Em qual Bolsonaro depositar confiança?

A ameaça golpista é real, mas até o momento não encontrou respaldo na sociedade civil e no seio das instituições, sobretudo das Forças Armadas. Bolsonaro tenta o improvável e, sim, há uma chance de conseguir. Esbarra, contudo, na realidade de um governo anódino, que não prospera e não faz prosperar. O resultado é muito direto: o vaivém do discurso e a paralisação decisória, incluída aí a incompetência para lidar com o Congresso, a política e os diversos setores representativos da sociedade.

É possível arguir tratar-se de um lobo, mesmo, em pele de ovelha. Mas isso requereria certa sofisticação do mandatário ou, ao menos, de seus assessores próximos, além de algum tipo de planejamento, de visão de país e de mundo. Bolsonaro não os tem. Continua a ser o deputado apagado que ganhou adeptos pendurando fotografias de ex-presidentes militares no gabinete e exaltando Brilhante Ustra. Aquele mesmo que passou quase três décadas no Congresso e nada aprendeu. Pior, nada de bom produziu. Chegou ao posto máximo da República na esteira de uma insatisfação geral com “tudo isto que aí estava”.

O presidente é um lobo solitário perigoso, potencialmente, mas, até agora, um cordeiro em pele de cordeiro. Cabe às forças democráticas, de lado a lado, espantar os abutres do meio de campo e garantir uma arena possível para o pleito do ano que vem.

*Diretor-Executivo da IFI, vencedor do prêmio Jabuti, em 2017, com o livro ‘Finanças Públicas: da Contabilidade Criativa ao Resgate da Credibilidade’ (Record, 2016).

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,cordeiro-em-pele-de-cordeiro,70003838959


Senadores repercutem carta de recuo do presidente Bolsonaro

Por meio de suas redes sociais, Pacheco, afirmou que é necessário "respeito entre os Poderes e obediência à Constituição"

Agência Senado

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, defendeu nesta quinta-feira (9), pelo Twitter, “respeito entre os Poderes, obediência à Constituição e compromisso árduo no trabalho em favor do desenvolvimento do país”. Ele ressaltou que "é disso que o país precisa".

Pacheco publicou essas declarações após o presidente Jair Bolsonaro divulgar carta em que afirma não ter tido "nenhuma intenção de agredir quaisquer dos poderes" durante suas manifestações no dia 7 de setembro e que suas "palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento".

A mensagem de Bolsonaro repercutiu entre os senadores, que também se manifestaram nas redes sociais.

“Quantas horas vai durar o espírito pacífico e respeitador das leis de Bolsonaro? Talvez até a próxima live. Quem acredita nas intenções democráticas de Bolsonaro? Para a situação do Brasil só há uma saída segura: o impeachment do presidente”, publicou o senador Humberto Costa (PT-PE).

Para o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), Bolsonaro "é o barril de pólvora que está implodindo o país”. Ele disse ainda que o presidente da República é um “fabricador de crises, viúvo da ditadura, péssimo governante, tiranete desequilibrado. Sua nota de hoje [a carta divulgada nesta quinta-feira] é mais uma vergonha para a República. Impeachment para esse terrorista! Bolsonaro é um típico covarde manipulador. Faz da ameaça um método de governabilidade para conseguir o que quer. E tem funcionado! Avança e recua, afrouxando todos os limites do Estado Democrático de Direito. É só aguardar o próximo ataque: ele virá!”.

Já o senador Alvaro Dias (Podemos-PR) avaliou que a reação de Bolsonaro após os protestos já era esperada. “Recuo previsto, acontece”, publicou o parlamentar.

Michel Temer

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) também fez críticas à carta de Bolsonaro e à notícia de que o documento teria sido escrito sob orientação do ex-presidente Michel Temer. “Li a cartinha do Temer que o Bolsonaro assinou. Será que agora o Temer passa a governar também? Será que vai redigir cartinha explicando mansões e rachadinhas? Vai vendo, Brasil. Quem votou ‘para mudar tudo isso aí’ faz o quê? Espera cartinha para baixar o preço da gasolina? Desenhando para inocentes apaixonados. Bolsonaro é só mais uma peça no sistema, preocupado em esconder rachadinhas, mansões e incompetência. E o sistema adora presidentes fracos. Facilita demais o acesso a cargos, grana e impunidade. Basta ler a sequência de notinhas ensaiadas.”

O senador Rogério Carvalho (PT-SE), por sua vez, disse que Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade e não pode ficar impune. “Até o golpista Temer aconselhou o Bolsonaro a recuar da brava autoritária. As instituições precisam permanecer vigilantes aos arroubos antidemocráticos de Bolsonaro, que não irão parar. Os crimes de responsabilidade já cometidos não podem passar impunes!”

Diálogo

Outros senadores, no entanto, elogiaram a mensagem divulgada por Bolsonaro e defenderam o diálogo. Um deles foi o senador licenciado Ciro Nogueira (PP-PI), atual ministro da Casa Civil. “A harmonia e o diálogo entre os poderes compõem as bases nas quais se sustenta nosso país. O gesto do presidente Jair Bolsonaro demonstra que estamos unidos no trabalho pelo que mais importa, a recuperação do nosso país e o cuidado com os brasileiros.”

O diálogo também foi defendido pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO). “Sou um pacificador. Sempre defendi o diálogo, o entendimento e o respeito entre poderes, partidos e pessoas. É disso que o Brasil precisa, sobretudo neste momento de retomada.”

Para o senador Elmano Férrer (PP-PI), é oportuna a declaração de Bolsonaro sobre os Poderes ("Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando juntos em favor do povo e todos respeitando a Constituição"). Elmano disse que “Executivo, Legislativo e Judiciário devem trabalhar juntos. Com diálogo e entendimento, é possível fortalecer a democracia brasileira. Esse é o caminho que vamos continuar defendendo”.

Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, o senador Omar Aziz (PSD-AM) também manifestou-se no Twitter. “O dia 9 de setembro é histórico. Dia em que Bolsonaro fez autocrítica sobre a China. E dia em que ele recuou na tensão com outros Poderes. Se for ato genuíno, é louvável. Se for jogada para liberação dos recursos de precatórios para programas eleitoreiros em 2022, é lastimável. Estaremos alerta!”

Fonte: Agência Senado
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/09/09/senadores-repercutem-carta-divulgada-por-bolsonaro-apos-manifestacoes-em-7-de-setembro


Os recuos de Bolsonaro entre os dias 7 e 9/9

Confira quatro pontos claros de recuo do presidente em um comparativo de seu discurso no último dia 7 e na nota deste dia 9

Mariana Sanches / BBC News Brasil

Congressistas e integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF), além de especialistas em direito e analistas políticos consideraram que as declarações de Bolsonaro tinham "teor golpista" e eram passíveis de ser enquadradas como crime de responsabilidade, punível com abertura de processo de impeachment.

Entre outras coisas, Bolsonaro afirmou que não mais cumpriria decisões judiciais do ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo inquérito das fake news do qual Bolsonaro é alvo, e ameaçou fechar o STF caso seu presidente, Luiz Fux, não "enquadrasse" Moraes.

Também afirmou que apenas Deus poderia retirá-lo da cadeira presidencial e afirmou: "quero dizer aos canalhas que nunca serei preso".

Diante da repercussão negativa das falas tanto no mundo político, que retomou as discussões de impedimento do presidente, como no mercado, que reagiu com alta do dólar e tombo da bolsa de valores, Bolsonaro deu um passo atrás. Na nota, justificou-se: "quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum".

Bolsonaro também disse que "na vida pública as pessoas que exercem o poder não têm o direito de "esticar a corda", a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia". Sua manifestação do dia 7 levou à paralisação de caminhoneiros em mais de 15 Estados e provocou desabastecimento de combustíveis em alimentos em partes do país. Isso deve pressionar ainda mais a economia do país, em recuperação frágil da recessão causada pela pandemia de covid-19. O PIB do último trimestre teve resultado negativo e a inflação se aproximou dos dois dígitos no acumulado dos 12 meses.

Veja a seguir quatro pontos claros de recuo do presidente em um comparativo de seu discurso no último dia 7 e na nota deste dia 9.

1. Supremo Tribunal Federal

Bolsonaro em 7/9: "Ou o chefe desse Poder enquadra o seu ou esse Poder pode sofrer aquilo que nós não queremos."

Bolsonaro em 9/9: "Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes."

2. Ministro Alexandre de Moraes

Bolsonaro em 7/9: "Não vamos mais admitir que pessoas como Alexandre de Moraes continuem a açoitar a nossa democracia."

Bolsonaro em 9/9: "Em que pesem suas qualidades como jurista e professor, existem naturais divergências em algumas decisões do Ministro Alexandre de Moraes."

3. Respeito a decisões de outros poderes

Bolsonaro em 7/9: "Qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou."

Bolsonaro em 9/9: "Reitero meu respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país."

4. Democracia

Bolsonaro em 7/9: "Tinha que esperar um pouco mais de modo que a população aos poucos ou cada vez mais fosse se conscientizando do que é um regime ditatorial. Agora chegou o momento de nós dizermos a essas pessoas que abusam da força do poder para nos subjugar, dizer a esses poucos que agora tudo vai ser diferente".

Bolsonaro em 9/9: "Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando juntos em favor do povo e todos respeitando a Constituição."

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58510022


'Game over': bolsonaristas se revoltam com recuo do presidente

Recuo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em nota divulgada nesta quinta (9/9) foi mal recebido por seus apoiadores

BBC Brasil

"Game Over", disse o blogueiro Allan Santos no Twitter — o termo em inglês pode ser traduzido como "fim do jogo" ou simplesmente "acabou".Pule Twitter post, 1

GAME OVER pic.twitter.com/EiEgzB5FPV— Allan Dos Santos  (@allanldsantos) September 9, 2021

Final de Twitter post, 1

Rodrigo Constantino usou a mesma expressão, mas foi mais enfático nas críticas ao presidente. Para ele, Bolsonaro demonstrou "fraqueza" e "levou um xeque-mate".

"Bolsonaro pode ter assinado sua derrota", afirmou no Twitter.

Se era xadrez 4D, parece que Bolsonaro tomou um xeque-mate de uma rainha tridimensional. Depois da demonstração de força do povo, o presidente demonstra fraqueza. Situação bem complicada para os patriotas. Bolsonaro pode ter assinado sua derrota hoje...— Rodrigo Constantino (@Rconstantino) September 9, 2021

O empresário Leandro Ruschel fez um prognóstico semelhante sobre o futuro político do presidente.

"Impressão inicial, ainda provisória: com o ato de hoje, Bolsonaro está abrindo mão da candidatura à reeleição. A conferir", disse ele.

Impressão inicial, ainda provisória: com o ato de hoje, Bolsonaro está abrindo mão da candidatura à reeleição.

A conferir.— Leandro Ruschel 🇧🇷🇺🇸🇮🇹🇩🇪 (@leandroruschel) September 9, 2021

O pastor Silas Malafaia deixou claro que não pretende seguir o presidente em sua recém-adquirida moderação e voltou a atacar Alexandre de Moraes, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

"Continuo aliado, mas não alienado", tuitou. "Minhas convicções são inegociáveis."

CONTINUO ALIADO , MAS NÃO ALIENADO ! Bolsonaro pode colocar a nota que quiser , Alexandre de Moraes continua a ser um ditador da toga que rasgou a constituição e prendeu gente inocente . MINHAS CONVICÇÕES SÃO INEGOCIÁVEIS !— Silas Malafaia (@PastorMalafaia) September 9, 2021

'No calor do momento'

Bolsonaro divulgou a nota um dia após o presidente do STF, Luiz Fux, afirmar que suas ameaças poderiam culminar em um processo de impeachment.

O presidente participou de atos no 7 de setembro que pediram o fechamento do STF e do Congresso. Em seus discursos, ele atacou a Corte e seus ministros e disse que poderia não cumprir novas decisões de Moraes, a quem chamou de "canalha".

No comunicado divulgado pelo Planalto, Bolsonaro baixou o tom e afirmou que as declarações foram feitas no "calor do momento" e que "nunca teve intenção de agredir quaisquer dos poderes".

O presidente ainda disse que "não tem direito de esticar a corda a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia" e que suas divergências com o ministro Alexandre de Moraes — seu maior desafeto no STF e a quem chamou de "canalha" em sua fala nos protestos — deveriam ser resolvidas por meio da via judicial.

"Reitero meu respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país", afirmou Bolsonaro.

'Traidor'

Apoiadores do presidente em Brasília
Apoiadores de Bolsonaro em frente ao Congresso Nacional. Foto: EPA

Em grupos de apoio ao presidente no aplicativo Telegram, os bolsonaristas se dividiram entre a revolta, a incredulidade e a decepção com a reação do presidente.

"Traidor", disse uma integrante de um grupo com mais de 11 mil participantes.

"Eu vim para Brasília apoiar o presidente e ele faz isso", comentou outro membro.

Em outro grupo, com 2 mil pessoas, um apoiador disse: "O presidente se rendeu, se acovardou. Eu esperava muito mais".

"Também não acreditei!!! Será alguma estratégia?!?", respondeu outra participante.

"Será que o presidente vai renunciar à reeleição? Será que o sistema fez com Bolsonaro o mesmo que fez com Trump?", questionou uma terceira.

Em outro grupo, com 36 mil inscritos, um membro interpretou assim o comunicado: "Nosso capitão recuou".

"Infelizmente", respondeu outro.

"Alguém confirma", questionou um integrante, que ouviu em resposta: "Sim, é verdade. O presidente nos abandonou."

"Ele disse que não ia respeitar o STF e agora tá se desculpando por nota", comentou um apoiador.

Outra participantes disse que a atitude de Bolsonaro foi uma "falta de respeito com o povo que ele pediu para ir às ruas".

"Não vivia falando que tá com o povo aonde o povo estiver e agora??? Somos chacota da esquerda."

"Que decepção", escreveu um terceiro, "mas acredito que isso tenha sido só para pacificar as coisas apenas uma estratégia a mando de alguém;"

"Decepção total, o sistema venceu o nosso presidente", afirmou mais um

Mas nem todos perderam a confiança em Bolsonaro.

"Não recuou não, estão malucos? Ele tem razão em fazer, tenham certeza, é uma demonstração de bom senso e autoproteção. Parem para pensar caramba", disse um membro desse mesmo grupo.

Outro afirmou que "recuar não é derrota".

"Temos que ter paciência, galera", pediu um outro apoiador.

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58510232


Bolsonaro agora diz que não teve "intenção de agredir" STF

Nota em tom de recuo diz que "divergências" com Moraes serão resolvidas na Justiça. Texto foi redigido com auxílio de Michel Temer

DW Brasil

Depois de ameaçar abertamente o Supremo Tribunal Federal (STF) e pregar desobediência a decisões da Corte durante discursos nos atos de 7 de Setembro, o presidente Jair Bolsonaro divulgou nesta quinta-feira (09/09) uma "Declaração à Nação", em tom de recuo tático após a má repercussão de suas falas, que tiveram consequências negativas até mesmo na economia.

No texto, o presidente afirma agora que nunca teve "intenção de agredir quaisquer dos poderes. A harmonia entre eles não é vontade minha, mas determinação constitucional que todos, sem exceção, devem respeitar".

Bolsonaro decidiu divulgar a declaração após aconselhamento do ex-presidente Michel Temer. O presidente enviou um avião para buscar Temer em São Paulo, para que ambos pudessem discutir a crise institucional, que nas últimas horas foi agravada por bloqueios em estradas organizados por caminhoneiros bolsonaristas.

Segundo apurou a emissora CNN Brasil, o ex-presidente teria inclusive redigido ele próprio o texto, assinado por Bolsonaro. Temer teria promovido um contato telefônico entre Bolsonaro e o ministro Alexandre de Moraes do STF, que nomeado para o tribunal durante o governo do emedebista.

Bolsonaro utilizou o termo "divergências" para expressar sua posição em relação a decisões de Moraes, mas ressalvou que essas questões devem ser resolvidas "por medidas judiciais que serão tomadas de forma a assegurar a observância dos direitos e garantias fundamentais previsto no Artigo 5º da Constituição Federal".

"Sei que boa parte dessas divergências decorrem de conflitos de entendimento acerca das decisões adotadas pelo Ministro Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das fake news”, observou. "Mas na vida pública as pessoas que exercem o poder, não têm o direito de ‘esticar a corda', a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia.”

No ato pró-governo em São Paulo, Bolsonaro chegou a chamar Moraes de "canalha" e disse que não cumpriria mais as decisões do magistrado.

"Dizer a vocês que, qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, este presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou, ele tem tempo ainda de pedir o seu boné e ir cuidar da sua vida. Ele, para nós, não existe mais", disse o presidente.

"Calor do momento"

Entretanto, no texto divulgado nesta quinta-feira, o presidente afirma que suas palavras, "por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum", relativizou.

Bolsonaro encerrou a nota com o lema "Deus, Pátria, Família", originalmente um slogan da Ação Integralista Brasileira (AIB), movimento de viés fascista que atuou no Brasil na década de 1930. Recentemente, Bolsonaro e membros da sua família também usaram o slogan em publicações relacionadas à natimorta Aliança pelo Brasil, o partido que o presidente tentou criar em 2019 e que nunca saiu do papel.

A nota de Bolsonaro foi divulgada após reações enérgicas do presidente do STF, Luiz Fux, e do ministro Luís Roberto Barroso. Fux advertiu na quarta-feira que o desrespeito a decisões da Corte "configura crime de responsabilidade". Ele também afirmou que a população deve estar atenta aos "falsos profetas do patriotismo" e que o Tribunal não aceitará ameaças. Já Barroso chamou Bolsonaro de "farsante" e disse que o Brasil é "alvo de chacota" no exterior por causa da falta de compostura de Bolsonaro.

Não é a primeira vez que Bolsonaro recua de uma ofensiva contra outros Poderes. Em maio de 2020, ele já havia dito "ordens absurdas [do STF] não se cumprem" durante outro episódio de tensão com o STF, quando o Tribunal apertava o cerco contra bolsonaristas suspeitos de atuarem como divulgadores e financiadores de fake news. Na ocasião, ele adotou um tom mais ameno no dia seguinte, diante da má repercussão das sua falas. O roteiro foi o mesmo em ofensivas contra o STF e governadores nos mais de dois anos de governo Bolsonaro, num padrão repetitivo de ataque e recuo tático, que mobilizou regularmente a base radical bolsonarista no decorrer das crises.

Desta vez, porém, a publicação do texto gerou má repercussão em redes sociais da base extremista do presidente, que esperava que Bolsonaro continuasse a manter a ofensiva contra o STF sem qualquer recuo. Após a publicação da nota, o comentarista bolsonarista Rodrigo Constantino escreveu em seu Twitter: "O sistema declarou guerra ao povo. O presidente sucumbiu ao sistema". "Bandeira branca", escreveu o influencer bolsonarista Leandro Ruschel. O mesmo tom se repetiu em publicações de outros ativistas bolsonaristas.

A nota também não convenceu membros da oposição. "Ou Jair Bolsonaro mentiu para seus seguidores no 7 de Setembro ou ele está mentindo para todos os brasileiros com a nota divulgada hoje. O fato é que o presidente não tem palavra, o Brasil não tem governo e Bolsonaro não pode continuar no Palácio do Planalto", escreveu o deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ).

Enfrentando queda constante de aprovação, economia em crise, pandemia, o fantasma de um apagão energético, insatisfação crescente entre o empresariado e denúncias de corrupção, Jair Bolsonaro usou o 7 de Setembro como uma tenativa de demonstração de força, convocando sua base radical a tomar as ruas contra o STF.

O foco das falas do presidente durante os atos foi especialmente dirigido aos ministros do STF Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso – este também presidente do TSE –, que são com frequência tratados como inimigos pelo presidente e sua base.

Moraes é responsável por diversos inquéritos que afetam bolsonaristas e determinou a prisão de aliados do presidente, como o deputado Daniel Silveira e o presidente do PTB, Roberto Jefferson, que incitaram violência contra ministros do Supremo.

Já Barroso, na condição de presidente do TSE, se opõe à adoção do voto impresso, uma bandeira bolsonarista, encarada como uma forma de minar a confiança no processo eleitoral e tumultuar as eleições de 2022, que se desenham extremamente desfavoráveis para Bolsonaro, segundo pesquisas.

Fonte: DW Brasil


A crise, as instituições e os "diálogos institucionais"

Jair Bolsonaro afronta reiteradamente as instituições do Estado democrático de Direito, disseminando insegurança jurídica

José Eduardo Faria / Horizontes Democráticos / O Estado de S. Paulo

Autocrata, ignaro e incapaz de agir politicamente dentro das regras democráticas estabelecidas pela Constituição, como está sendo evidenciado neste feriado de 7 de setembro, desde que ascendeu ao poder o presidente Jair Bolsonaro afronta reiteradamente as instituições do Estado democrático de Direito, disseminando insegurança jurídica, levando a economia a se deteriorar e deflagrando uma crise de governabilidade permanente.

Em seu primeiro ano de gestão, ele afirmou que devia lealdade apenas ao “povo brasileiro”, desprezando a mediação parlamentar e, por conse’quência, o perfil liberal da democracia brasileira. Já no segundo ano, ao participar de agressões dominicais ao Supremo Tribunal Federal, defendendo o uso da violência contra alguns de seus ministros, passou a testar os limites da Constituição. E agora, em seu terceiro ano de mandato, quando praticamente todas as iniciativas de seu governo tiveram sua constitucionalidade questionada na corte, o presidente da República se apropriou dos festejos da Independência para promover uma manifestação por ele classificada como um “ultimato” a dois ministros. Ele se esquece — ou melhor, não aceita — que a Constituição promulgada após a redemocratização do País tenha conferido ao STF o poder de rever a constitucionalidade dos atos dos demais poderes.

Diante dessa escalada, dois fatos passaram a ocupar as manchetes dos jornais nos últimos tempos. De um lado, lideranças políticas, governadores e entidades empresariais começaram a propor sucessivos diálogos entre os presidentes dos três Poderes, e até um pacto interinstitucional, com o objetivo de preservar a ordem jurídica e a democracia. De outro lado, em decorrência das diatribes autoritárias presidenciais e de projetos de lei e propostas de emenda constitucional sem mínima consistência jurídica, bem como da aprovação pelo Legislativo de várias leis economicamente insensatas, a vida política do país tornou-se cada vez mais dependente das posições da cúpula do Poder Judiciário.

Esses dois fatos dão a medida da profunda crise institucional que o País atravessa. No primeiro caso, como a judicialização da vida política ocorreu somente porque o Executivo não soube e/ou não quis formar uma coalização majoritária para governar e porque as lideranças do Legislativo necessitaram de uma arbitragem externa por não conseguir resolver seus impasses internos, o que uma corte suprema pode oferecer nesses diálogos a não ser fazer cumprir o que a Constituição determina?

Mas não é só. O STF é um órgão colegiado e seu presidente tem uma ação basicamente administrativa. Nos julgamentos, pode sugerir ou orientar seus pares nos julgamentos. Contudo, não pode não impor sua vontade. Desse modo, como firmar um pacto com o chefe do Executivo, comprometendo-se em nome da corte e se responsabilizando por seus resultados? Ao agir assim, não estaria entregando a outros Poderes a última palavra quanto a certas matérias decididas por uma corte suprema? Em suma, de que modo o STF pode abrir mão de sua atribuição funcional de julgar como inconstitucional uma iniciativa do inquilino do Palácio do Planalto só porque ela foi politicamente negociada em troca de uma promessa do presidente da República de que passará a respeitar o Judiciário? Além de paradoxal, esse cenário seria a negação da democracia, sob a justificativa de preservá-la.

Já o segundo fato aponta uma outra importante faceta da crise institucional. Ainda que Bolsonaro e seu entorno militar insistam em afirmar que a Constituição não os deixa governar, eles se esquecem de que, se há de uma trava constitucional limitando a discricionaridade dos governantes na gestão pública, ela é uma decorrência da ditadura militar que até hoje justificam, defendem e canonizam. Ainda que Bolsonaro e seu entorno militar insinuem que a Constituição de 1988 não os deixa governar, eles se esquecem de que, se há uma trava constitucional, ela se justifica historicamente, ainda que de maneira indireta, como proteção contra práticas tornadas rotineiras na ditadura militar que até hoje eles justificam, defendem e canonizam.

Os abusos e absurdos cometidos pelos militares entre março de 1964 e 14 de março de 1985 foram tantos que não restou aos constituintes de 1988 outra saída a não ser incluir no texto constitucional – e assegurar sua preservação por meio da figura jurídica das cláusulas pétreas, em alguns casos — uma série de dispositivos não só no campo das liberdades fundamentais e das garantias públicas, mas, igualmente, em matérias econômicas e sociais. A ordem constitucional daí resultante foi de caráter aspiracional, não só no sentido de assegurar direitos básicos, mas, também, de caminhar rumo a uma sociedade menos desigual e iníqua e mais justa e igualitária.

Resultante de uma circunstância histórica, essa ordem constitucional foi concebida de modo deliberadamente abrangente, transferindo questões do campo da política para o âmbito do direito positivo. Foi uma estratégia pensada para tentar impedir que, nas eleições futuras, as novas configurações do Legislativo revogassem esses direitos e essas orientações programáticas.

Ato de promulgação da Constituição Federal de 1988. Foto: Reprodução

Dessa maneira, conforme lembra o historiador J. Reinaldo de Lima Lopes, como nem mesmo as propostas de emendas constitucionais poderiam reduzi-los, a saída que restou aos governos das chamada Nova República foi recorrer à judicialização e à hermenêutica jurídica. Mais precisamente, à tentativa de fazer com que o STF, devidamente demandado por ações de controle de constitucionalidade, interpretasse os dispositivos da Carta conforme as respectivas agendas de cada governo. Isso ocorreu em todas as gestões presidenciais após a redemocratização, desde a primeira eleição de Fernando Collor pelo voto direto, em 1989, até a de Bolsonaro, em 2018, o que levou as ações de constitucionalidade a judiciais a se multiplicarem no STF. Só nas duas primeiras décadas após a promulgação da Constituição, por exemplo, foram propostas perante o STF mais de 4 mil Ações Diretas de Inconstitucionalidade. Na mesma corte, o número de novos processos por exercício passou de 18,5 mil em 1990, para 160,4 mil em 2002, segundo as estatísticas do Conselho Nacional de Justiça.

Foi a partir daí que surgiu um conceito equivocado, o de ativismo judicial, utilizado por quem tinha a expectativa de que os ministros da corte alterassem o alcance dos direitos e das orientações programáticas da Constituição por vias hermenêuticas. Também foi a partir daí que começaram as pressões contra os magistrados “ativistas” — o que se exacerbou quando o atual governo autocrata, assessorado por advogados públicos medíocres e por juristas oportunistas, passou a afrontar o Supremo e a convocar manifestações de protesto sob a justificativa de dar “um ultimato” a dois de seus onze ministros.

Com isso, o círculo se fecha. Caso ceda às pressões, aceitando as propostas de um diálogo entre os três Poderes e de um pacto interinstitucional, ou, então, curvando-se a manifestações populares organizadas com explícito viés golpista, os ministros do STF perderão sua independência, que está na essência de sua razão de existir. Por consequência, teriam sua credibilidade e legitimidade comprometidas, na medida em que estariam negando a Constituição que juraram cumprir. Resistir às diferentes estratégias antidemocráticas, é claro, tem um custo. Mas ele nunca será mais alto do que o preço a ser pago por aquele que, entre os onze ministros da corte, acabar com sua imagem enxovalhada pela subserviência, deixando-se dobrar à ofensiva antidemocrática bolsonarista.

Fonte: Estado da Arte, 07 de setembro de 2021 / Blogo Horizontes Democráticos
https://estadodaarte.estadao.com.br/jef-07-setembro-dialogos-stf/
https://horizontesdemocraticos.com.br/a-crise-as-instituicoes-e-os-dialogos-institucionais/


O que esperar do Brasil após o 7 de Setembro?

Com intenção de não mais cumprir decisões do STF, Bolsonaro escala a crise institucional. Defesa da democracia entra na ordem do dia

Jornal da USP

O 7 de Setembro galvanizou as atenções do País, acelerando o processo político em direção a um horizonte incerto. No lugar dos tradicionais desfiles militares em Brasília e outras capitais, o cenário foi tomado tanto pelas manifestações orquestradas pelo presidente Jair Bolsonaro quanto pelas convocadas pelas oposições. Em Brasília e na Avenida Paulista, em São Paulo, o presidente Bolsonaro, após dois meses de pregação preparatória dos eventos por todo o País, discursou para públicos expressivos, mas bem menores do que o esperado pelos organizadores. Nem uma palavra sobre os problemas reais que afligem o País, muito menos sobre como resolvê-los.

Suas falas se concentraram em críticas ao uso das urnas eletrônicas nas eleições, sistema recentemente confirmado e mantido por votação na Câmara dos Deputados. E em ataques ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que comanda inquéritos que o envolvem e podem atingir filhos e correligionários — e será presidente do Tribunal Superior Eleitoral nas eleições de 2022.

Em meio ao seu discurso em São Paulo, Bolsonaro disse que não mais acatará qualquer decisão emanada do ministro Moraes, apontando para uma possível futura postura de desrespeito à Constituição.

As manifestações das oposições, também por todo o País, concentraram-se em fortes críticas a problemas como o desemprego, fome, inflação, que estão dificultando a vida das camadas mais pobres da população, e as confusões na campanha de vacinação contra a pandemia do coronavírus, que se desenvolve mais lentamente do que o necessário.

Os discursos de Bolsonaro já estão gerando repercussões e reações no mundo jurídico e político e na sociedade. Abaixo, o Jornal da USP publica a opinião e a análise de especialistas da Universidade de São Paulo.

Renato Janine Ribeiro – Foto: Reprodução/Vermelho

Renato Janine Ribeiro
Professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)

“O presidente manteve seu discurso habitual, inclusive ameaçando o Judiciário […] Faltou a menção aos quase 600 mil brasileiros mortos por covid […] Faltou menção à crise econômica que estamos vivendo […]. Faltou uma menção à educação, ciência e pesquisa […]. Faltou preocupação com a vida das pessoas […]. É uma pena que o presidente não se preocupe com essas questões.”


José Álvaro Moisés – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

José Álvaro Moisés

Professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP

“As manifestações se constituíram, de certo modo, num ato de campanha eleitoral do presidente para concorrer à eleição – campanha fora de tempo é crime, e isso é mais grave se envolve o uso de recursos públicos, como parece ter ocorrido nesse caso […]. Mas o ponto mais controverso constitui o fato de Bolsonaro ter dado elementos para a atualização das propostas do seu próprio impeachment. Ao propor, em nome da Constituição, medidas que burlam a autonomia e a independência de alguns dos Poderes republicanos mais importantes, como é o caso do Supremo Tribunal Federal, o presidente pode ter oferecido precisamente a base para a abertura de um processo de seu impedimento.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.


Simão Silber – Foto: Reprodução

Simão Silber

Professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP

“Sem os discursos, a situação da economia brasileira já era ruim […]. Com os dois discursos pregando rupturas com as instituições, trazendo uma incerteza muito grande, mexeu com as expectativas dos agentes econômicos […]. O resultado veio hoje na abertura dos mercados, com a bolsa caindo mais que 1% […] e uma pressão sobre o dólar que se desvalorizou e tem uma tendência a se desvalorizar mais ainda […]. Foi um beijo na morte que estava faltando.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.


Marcos Fava Neves – Foto: Arquivo pessoal

Marcos Fava Neves

Professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da USP

“Este 7 de Setembro me deixou com sensações mistas […]. As manifestações foram muito bem organizadas, pacíficas, bonitas de se ver […]. As pautas contra o ambiente democrático não têm o meu apoio, isso custa muito caro para um país […]. Para a economia, esse ambiente belicista que o Brasil vive, não bastasse a crise sanitária […] A crise da economia melhorou um pouco, mas poderia estar mais forte [ainda mais com] a crise hídrica brutal no País […]. Para o ambiente econômico isso não é bom, o Brasil precisa passar por um processo de pacificação.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.


Rafael Mafei – Foto: Reprodução

Rafael Mafei

Faculdade de Direito da USP

“As manifestações do 7 de Setembro de que o presidente participou foram marcadas por pautas declaradamente antidemocráticas, a principal das quais a retaliação e ameaça contra o Supremo Tribunal Federal, em especial a dois de seus ministros […]. A Constituição é taxativa em dizer que o Judiciário tem poder para rever atos da Presidência da República e de ministros de Estado […]. Quando toma qualquer medida que porventura invalide uma política do presidente, o Judiciário está cumprindo o seu papel de fazer com que a Constituição seja observada […]. O presidente não tem o direito constitucional de não ser contrariado por juízes […]. A Constituição e as leis estabelecem que o presidente tem o dever de acatar decisões judiciais e tem o dever de não ameaçar ou incitar a população.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.

Maria Hermínia Tavares – Foto: IEA

Maria Hermínia Tavares

Professora aposentada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas e do Instituto de Relações Internacionais, ambos da USP

“As manifestações promovidas pelo presidente Jair Bolsonaro ontem são mais um passo na escalada que ele tem promovido de ataque às instituições brasileiras. Embora fale de liberdade, o presidente frequentemente assedia jornalistas e ameaça opositores […], embora fale de democracia, o seu entendimento é aquele sistema no qual as eleições entregam para quem teve a maioria dos votos um mandato ilimitado […]. Isso não é democracia, é um autoritarismo de base eleitoral […]. A democracia verdadeira é aquela na qual o poder legítimo dos mandatários eleitos é limitado pelas leis e instituições do sistema democrático […]. O presidente é um autoritário que foi eleito pela regra democrática […]. Ontem, nas ruas, vimos a extensão e a limitação do seu poder […]. Ele divide o País, um País que precisa estar unido.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.


Deisy Ventura – Foto: Arquivo pessoal

Deisy Ventura

Professora da Faculdade de Saúde Pública da USP

“O que estamos vendo acontecer no Brasil não é novidade nem em relação ao que o presidente da República, que é um agitador extremista, vem anunciando e prometendo […], mas também não é novidade histórica nenhuma […]. Os movimentos totalitaristas agem exatamente dessa forma […], muitas vezes chegam ao poder pela via eleitoral, como no Brasil, e depois utilizam o aparelho do Estado contra a população […]. Quem está hipnotizado por esse movimento […] realmente não o vê como o perigo que é […]. Essa é a hora de surgirem os estadistas […] esta é a hora de surgirem as lideranças sociais […]. Este é um momento de enorme gravidade que precisa ser tratado como tal.”Tocador de áudio00:0000:00Use as setas para cima ou para baixo para aumentar ou diminuir o volume.

Fonte: Jornal da USP
https://jornal.usp.br/atualidades/o-que-esperar-do-brasil-apos-o-7-de-setembro/


Presidente do TSE critica ameaças à democracia brasileira

Barroso ressaltou que a 'democracia tem lugar para conservadores e progressistas, só não tem lugar para quem pretenda destruí-la'

Ascom / TSE

Ao abrir a sessão plenária na manhã desta quinta-feira (9), o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, mais uma vez defendeu a Justiça Eleitoral e os servidores que nela atuam com verdadeiro patriotismo, trabalho duro e dedicado. Segundo ele, essas pessoas não podem ficar indefesas diante da linguagem abusiva e da mentira, ao se referir aos eventos e pronunciamentos do último dia 7 de setembro em que novas acusações foram feitas em relação à credibilidade da Justiça Eleitoral.

O presidente do TSE defendeu enfaticamente a democracia e criticou a polarização. “A democracia tem lugar para conservadores, liberais e progressistas. O que nos une na diferença é o respeito à Constituição, aos valores comuns que compartilhamos e que estão nela inscritos. A democracia só não tem lugar para quem pretenda destruí-la”, disse.

O ministro respondeu objetivamente às acusações feitas à Justiça Eleitoral e, na oportunidade, afirmou que o debate público permanente e de qualidade é o que permite que todos os cidadãos recebam informações corretas, formem sua opinião e apresentem seus argumentos. Portanto, esse debate não pode ser contaminado por discursos de ódio, campanhas de desinformação e teorias conspiratórias infundadas, sob pena de afronta à democracia.

“O slogan para o momento brasileiro, ao contrário do propalado, parece ser: “conhecerás a mentira e a mentira te aprisionará”, destacou.

Em relação às críticas à segurança do sistema eleitoral, Barroso detalhou novamente todas as fases de transparência, segurança e auditabildiade da urna eletrônica e afirmou que “o sistema é certamente inseguro para quem acha que o único resultado possível é a própria vitória”. Acrescentou ainda que “para maus perdedores não há remédio na farmacologia jurídica”.

Ele ainda reafirmou que as eleições brasileiras são totalmente limpas, democráticas e auditáveis e lembrou novamente que nunca se documentou fraude e que por esse sistema foram eleitos Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro.

Ministro Luís Roberto Barroso - STF


Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Plenário do STF. Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
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Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Plenário do STF. Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Ministro Luís Roberto Barroso. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
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“Depois de quase três anos de campanha diuturna e insidiosa contra as urnas eletrônicas, por parte de ninguém menos do que o presidente da República, uma minoria de eleitores passou a ter dúvida sobre a segurança do processo eleitoral. Dúvida criada artificialmente por uma máquina governamental de propaganda. Assim que pararem de circular as mentiras, as dúvidas se dissiparão”, afirmou.

Conforme destacou o presidente do TSE, são retóricas vazias. “Hoje em dia, salvo os fanáticos (que são cegos pelo radicalismo) e os mercenários (que são cegos pela monetização da mentira), todas as pessoas de bem sabem que não houve fraude e quem é o farsante nessa história”.

Por fim, Barroso destacou que “insulto não é argumento e ofensa não é coragem”. Acrescentou ainda que a falta de compostura nos envergonha perante o mundo e a marca Brasil sofre, atualmente, uma desvalorização global.

“Somos vítimas de chacota e de desprezo mundial”, afirmou, ao destacar que vivemos um desprestígio maior do que a inflação, do que o desemprego, do que a queda de renda, do que a alta do dólar, do que a queda da bolsa, do que o desmatamento da Amazônia, do que o número de mortos pela pandemia, do que a fuga de cérebros e de investimentos. “Não podemos permitir a destruição das instituições para encobrir o fracasso econômico, social e moral que estamos vivendo”, enfatizou.

 “Com a bênção de Deus – o Deus do bem, do amor e do respeito ao próximo – e a proteção das instituições, um presidente eleito democraticamente pelo voto popular tomará posse no dia 1º de janeiro de 2023”, finalizou.

Confira a íntegra do pronunciamento.

Fonte: TSE
https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2021/Setembro/presidente-do-tse-critica-ameacas-a-democracia-brasileira


Agronegócio ficará para trás se não considerar mudanças climáticas

Falta ao governo uma estratégia para ampliar a produção de alimentos no país, diz Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura

João Fellet / BBC News Brasil

Em entrevista à BBC News Brasil, Rodrigues cita a estimativa de que a produção agrícola brasileira precisaria crescer 40% em dez anos para que, considerando o aumento projetado em outros países, a fome seja erradicada no mundo.

"As condições que temos agora permitiria que isso acontecesse. Mas vai acontecer? Não vai, porque não há estratégia", diz Rodrigues.

O ex-ministro afirma que falta ao país um plano integrado que promova melhorias logísticas, acordos comerciais com países grandes, seguros para agricultores e incentivos à formação de cooperativas.

Diz ainda que a agricultura brasileira sofrerá se não se adaptar à nova realidade imposta pelas mudanças climáticas - o que implicará mais investimentos em pesquisa e a adequação a novas regras comerciais que penalizarão atividades mais poluentes.

"Se não tivermos sustentabilidade, vamos ficar para trás", afirma.

Nascido em 1942 em Cordeirópolis (SP), Rodrigues foi ministro da Agricultura entre 2003 e 2006, no governo Lula.

Antes, foi secretário de Agricultura no Estado de São Paulo (1993-1994) e presidiu várias organizações setoriais, como a Sociedade Rural Brasileira (SRB), a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag).

A última, que representa grandes empresas e indústrias do setor, ampliou um racha no agronegócio ao divulgar um manifesto em que cita preocupações com "desafios à harmonia político-institucional e, como consequência, à estabilidade econômica e social".

O manifesto foi lido como uma crítica a Jair Bolsonaro em sua ofensiva contra as instituições.

A entrevista com Rodrigues ocorreu na sexta-feira (3/7). Na ocasião, ele disse que via as manifestações pró-governo programadas para o 7 de Setembro como "pacíficas" e que a adesão de agricultores aos atos não mancharia a imagem do setor.

No dia 8, a BBC voltou a contatá-lo para questionar se sua posição se mantinha. Ele disse que sim, mas que preferia não comentar assuntos políticos.

Confira os principais trechos da entrevista.

BBC News Brasil - Antonio Galvan, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), produto que é o carro-chefe do agronegócio brasileiro, está sendo investigado por integrar um grupo de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro que, segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), estaria tramando ameaças à democracia. Qual a sua avaliação?

Roberto Rodrigues - De certa forma, houve um desmentido em relação às ameaças. Não há ameaça nenhuma, o que há é uma movimentação muito grande, englobando vários setores de serviços e da produção no Brasil, para questionar medidas tomadas pelo STF que estariam restringindo a liberdade de pessoas ou instituições. É uma manifestação.

O produtor rural brasileiro, de qualquer Estado, de qualquer produto, é pacifista. O papel dele é produzir e fazer o país ir para a frente.

A Floresta Amazônica é questão central no debate ecológico internacional. Foto: Adriano Gambarini/WWF-Brasil

BBC - O presidente Bolsonaro tem feito várias ameaças às instituições, insuflou a população a comprar fuzis e convocou as pessoas às ruas para o 7 de Setembro. Essas pessoas do agronegócio não chancelam as posições dele ao estar presente ali, a pedido dele?

Rodrigues - Primeiro, não tenho certeza se é a pedido dele. Acho que é uma coisa mais espontânea ligada a vários segmentos: caminhoneiros, serviços e produtores de algumas áreas do país. E também da área urbana.

Mas, por outro lado, como a ideia é muito pacífica, sem nenhuma provocação contra ninguém, a não ser contra ações de alguns ministros do STF, não vejo nenhuma violência que possa manchar a imagem do agro brasileiro.

Se houvesse uma grande greve, como foi anunciado no começo, aí seria uma coisa mais preocupante, porque pararia o país, e esse não é o papel do produtor rural brasileiro. Mas esse ponto, parece-me, foi afastado.

(Nota da redação: Em Uberlândia, em 31 de agosto, Bolsonaro convocou seus apoiadores a ir às ruas no 7 de Setembro: "Acho que chegou a hora de, no dia 7, nos tornarmos independentes pra valer e dizer que não aceitamos que uma ou outra pessoa em Brasília queira impor sua vontade. A vontade que vale é a vontade de todos vocês", afirmou.)

BBC - O que explica a identificação tão grande desse setor do agronegócio com o Bolsonaro?

Rodrigues - O presidente escolheu uma ministra da Agricultura muito ligada ao movimento, que conhece os problemas do agro.

Depois, de alguma forma, ele mitigou processos anteriores muito difíceis para o produtor rural sobre temas ligados à questão trabalhista, fundiária, ambiental.

Instituições que cuidam desses temas, tipo Incra, Ibama, Ministério do Trabalho, ficaram menos agressivas, digamos assim, ao produtor rural, o que deu um conforto maior do que havia no passado. Isso gerou gratidão por parte do produtor rural de maneira geral, sobretudo na fronteira agrícola.

Também houve a troca de ministros das Relações Exteriores e do Meio Ambiente por pessoas mais alinhadas ao agro. O primeiro chanceler foi um pouco agressivo em relação à China, nosso principal mercado, criando problemas de imagem. A troca dos dois foi muito bem vista.

DESMATAMENTO NO BRASIL


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BBC - Qual sua avaliação do governo?

Rodrigues - Essa é uma questão muito política, sobre a qual não gosto de falar. Acho que nós precisamos ter atenção a questões estratégicas para o país. Agora mesmo, temos o tema energético, que é central para o crescimento do país. É fundamental que a energia esteja disponível.

Sabia-se que a seca muito grande que aconteceu de março até agosto deste ano poderia gerar problemas na oferta de energia, mas só na semana passada veio se falar nesse assunto. São temas dessa natureza, muito estratégicos para o país, que precisam ser tratados com mais antecipação e cuidado.

Precisamos ter resolvidas a reforma tributária e a do Estado. São coisas importantes que estavam anunciadas e não aconteceram ainda. Falta uma estratégia para que possamos avançar.

BBC - Temos visto uma divisão entre alguns setores do agronegócio. De um lado, grupos empresariais encabeçados pela Abag (Associação Brasileira do Agronegócio) têm tido posições mais críticas ao governo e ao desmatamento da Amazônia. De outro, grupos como os sojicultores seguem alinhados ao governo. Como avalia essas divergências?

Rodrigues - Não acho que sejam divergências. A Abag, que ajudei a fundar, em 1993, é uma instituição de representação do agronegócio, não da agropecuária. Ela lida com cadeia produtiva, indústria de insumos, transformação etc. Existem aproximações diferentes, com interesses diferentes.

BBC - Houve ao longo da história do Brasil diferentes setores da agropecuária que foram dominantes politicamente. Houve a época da cana, do café, e hoje temos um setor de grãos muito forte. Como é a relação entre esses diferentes setores?

Rodrigues - Nós tivemos ciclos anteriores, da borracha, da cana, do café, com uma coincidência entre quase todos eles: eram ciclos fortemente amparados por instituições de governo. Havia uma relação muito íntima entre política pública e o setor produtivo.

Os (setores de) grãos são muito mais livres, cujas regras estão muito mais ligadas a bolsas de Chicago, Nova York, mercado internacional, preço em dólar, estoques globais.

Não há dependência desse setor em relação ao governo. O que cria uma certa liberdade, uma independência, salvo naqueles temas que têm a ver com a agricultura de maneira geral.

Máquina agrícola em campo
Agronegócio corresponde a mais de 20% do PIB brasileiro. Foto: BBC/Getty

BBC - E em relação às agendas defendidas pelo setor? Vemos no Congresso muita ênfase em pautas como a regularização fundiária, uma pauta que faz mais sentido em áreas de fronteira agrícola, assim como pautas contra a demarcação de terras indígenas. Há muitas iniciativas para dificultar as demarcações e facilitar o arrendamento de terras indígenas. Como o senhor vê o envolvimento do setor com essas pautas?

Rodrigues - São pautas polêmicas, porque interessam a alguns setores do agronegócio, e não a todos. Mas faz parte da história do país.

A questão fundiária da Amazônia é típica. Tem milhares de famílias levadas para lá há décadas que até hoje não têm o direito à propriedade.

E, sem o direito à propriedade, não tem como oferecer garantia ao crédito rural. E, sem crédito rural, tem que sobreviver de alguma forma, até desmatando de maneira ilegal. Temos que acabar com as ilegalidades todas.

O importante desse tema é acabar com a ilegalidade: ter todos processos institucionais definidos para que a ilegalidade seja combatida rigorosa e vigorosamente pelo Estado brasileiro. As ilegalidades é que mancham a imagem de um agro profissional competitivo e sustentável que o Brasil tem.

Esses projetos que circulam hoje têm prerrogativa de criar um marco legal definitivo para que não haja condição de transigência nesse processo todo.

BBC - Mas o que se comenta é essas propostas buscam combater a ilegalidade legalizando o que é ilegal. Uma das propostas de regularização fundiária, por exemplo, cria a possibilidade de regularizar áreas públicas desmatadas até os dias de hoje.

Rodrigues - Isso é inaceitável. Deve-se legalizar o que é legalizável. O que é ilegalizável, ninguém quer. São injunções eventuais de interesses específicos de setores, mas o agronegócio como um todo não quer isso.

Ninguém quer legalizar grilagem de terra ou invasão de terras públicas. É uma discussão ideológica que está fora dos desejo dos produtores rurais brasileiros profissionais.

Roberto Rodrigues presidiu várias organizações do setor agrícola. Foto: FAO/Giulio Napolitano

BBC - Então haveria uma falta de conexão entre os congressistas que defendem essas pautas e o setor como um todo?

Rodrigues - Não sei se entre quem defende isso na ponta ou se é dentro do Congresso que há defasagem da discussão. No setor rural profissional, quem vive disso, quem trabalha com isso, ninguém quer nada ilegal.

Nem desmatamento, nem incêndio, nem grilagem, nem descumprimento dos contratos. Todos querem a legalização dos processos, sem que legalizar processos facilite a vida de bandido ou de invasor.

BBC - Existe um discurso forte entre aliados do Bolsonaro de que uma vitória do Lula em 2022 poderia levar o Brasil ao socialismo. O que o senhor, que foi ministro no governo Lula, acha desse discurso?

Rodrigues - Eu fui ministro dele e não sou socialista. Sou cooperativista. A vida inteira trabalhei com cooperativas, com associações de classe, mecanismos de integração regional, setorial etc.

Se ele me levou ao ministério da Agricultura e depois trouxe outros ministros que não eram socialistas, não eram comunistas, acho que não há nenhuma acusação de radicalização contra ele.

Não vejo no Lula essa visão ideológica de esquerda radical.

BBC - O senhor tem dialogado com ele?

Rodrigues - Há muitos anos não o vejo. A última vez foi há quatro, cinco anos, num grande evento em Milão, quando ele fez uma fala e eu dei alguns dados para ele.

BBC - Fala-se muito do papel que o Brasil tem para alimentar uma crescente população global. Mas temos visto que, mesmo com crescimento das exportações agrícolas do Brasil, tem havido no país um aumento da fome e um encarecimento de produtos que fazem parte da dieta brasileira. Por quê?

Rodrigues - O que existe é a lei universal da oferta e da procura. Quando a oferta é menor que a demanda, os preços crescem.

Com a pandemia, os estoques mundiais de grãos, particularmente, eram baixos. Muitos países foram afetados pela pandemia na medida em que houve colapso de transporte, faltou contêiner, faltou navio.

Por outro lado, tínhamos um problema de desemprego, agravado pela pandemia.

Nós produzimos, tivemos safras poderosas. A oferta cresceu aqui, mas não cresceu no mundo por circunstâncias climáticas. Os preços subiram em dólar.

E nós tivemos aqui um adicional: como o dólar ficou valorizado aqui, os preços aumentaram mais ainda, gerando uma inflação de alimentos.

Só tem um jeito de resolver isso aí: com uma safra grande, que aumente os estoques globais, para que os preços caiam.

BBC - Alguns setores defendem que o governo restrinja exportações de alimentos para baixar os preços internos. O que o senhor acha?

Rodrigues - Acho que o mercado tem de funcionar. Se você exporta e falta comida, que importe. Tem que ter uma política liberal. Cada vez que você interfere no comércio ou cria um tipo de subvenção ou de proteção, distorce o mercado.

Há um tema discutido de formação de estoques. O Estado não deve ter o estoque dele, mas pode financiar estoques privados. Isso pode ajudar muito em crises como a deste ano.

Maior associação de produtores de soja é próxima de Bolsonaro e deixou a Abag por discordar de carta com sugestões para frear o desmatamento. Foto: Brasil Rural

BBC - Há vários anos o senhor deu uma entrevista dizendo que o Brasil poderia colaborar com a falta de alimentos no mundo ampliando a produtividade e também abrindo novas áreas para a agricultura. O senhor continua defendendo a abertura de novas áreas?

Rodrigues - A legislação brasileira ficou muito mais restritiva e rigorosa. Por outro lado, não vejo a necessidade de abrir novas áreas. Estamos com tecnologias, como a integração lavoura-pecuária-floresta, que hoje tem milhões de hectares no Brasil, e reduziu a demanda por áreas novas.

Hoje o que está impulsionado a produção de comida (no Brasil) é pasto que está virando alimento.

A liberação de áreas de pastagem é suficiente pra plantar alimento, fibras, energia, madeira, sem precisar desmatar mais nada.

O que acho é que nós no Brasil temos de nos preocupar não apenas em exportar alimentos, mas em ensinar países tropicais com tecnologias e instituições que nós fizemos para que eles também sejam mais capazes de se autoalimentar.

BBC - O senhor vê a agricultura brasileira preparada, consciente e se planejando para lidar com as mudanças climáticas?

Rodrigues - A questão das mudanças climáticas é um dado da realidade e já preocupa muita gente. Até porque vai implicar tecnologias inovadoras que permitam cultivar em áreas que se tornarão improdutivas.

Mas, mais do que isso, tem a ver com regras de comércio que estão sendo criadas na Europa e evoluindo para EUA, China e outros grandes compradores do mundo tendo em vista a inibição da emissão de carbono. É um tema determinante para a competitividade.

Se não tivermos sustentabilidade, vamos ficar para trás. Essa questão já está muito clara na cabeça dos produtores rurais brasileiros, sobretudo as lideranças, e o processo está avançando. Estaremos na COP-26 (conferência climática da ONU), em Glasgow (Escócia), em novembro, para tratar das mudanças climáticas e regras de comércio.

O pessoal está acordado para o processo esperando que o governo faça a parte dele nas negociações e não engula qualquer métrica que seja imposta de fora para dentro. Temos de ter nossas métricas também para avaliar qual o tamanho da emissão associada às nossas exportações.

BBC - Quais os temas centrais para a agricultura brasileira hoje?

Rodrigues - Tem um estudo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) dizendo que, em dez anos, a oferta mundial de alimento precisa crescer 20% para que não haja fome no mundo.

Para que isso ocorra, a produção do Brasil precisaria crescer 40%. As condições que temos agora permitiria que isso acontecesse. Mas vai acontecer? Não vai, porque não há estratégia. Falta-nos estratégia.

Não existe logística e infraestrutura, o que só vai ser resolvido com parceria público-privada. O setor privado só vai investir com segurança jurídica. E a segurança jurídica só vai existir com reformas: tributária, reforma política, do Estado.

O segundo ponto é o comércio. Hoje 40% do comércio global de alimentos acontece no âmbito de acordos bilaterais e multilaterais. Não temos nenhum acordo importante.

O acordo do Mercosul com a União Europeia, que é crucial para nós, está patinando até hoje por erros de conduta do Brasil e de outros países do Mercosul.

O terceiro ponto é tecnologia. Tem que investir mais do que estamos investindo, porque os países desenvolvidos estão investindo, inclusive em países tropicais, para plantar lá.

Um quarto ponto é a política de renda. Basicamente, temos de estabilizar quem está produzindo no campo com seguro rural. Hoje só tem 10% da produção agrícola segurada porque o governo não faz a parte dele nos orçamentos do seguro rural.

Falta uma estratégia que considere logística, política de comércio, política tecnológica, política de renda no campo, sustentabilidade na área sanitária, rastreabilidade, certificação de produtos e organização rural.

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58495162


Tensão na Esplanada eleva riscos e piora expectativas do mercado

Incerteza reduz investimentos e limita ainda mais o crescimento. Com inflação em alta e contas fiscais sob pressão, juros também sobem

Rosana Hessel / Correio Braziliense

Os agentes econômicos reagiram da pior forma possível às manifestações de 7 de Setembro e às declarações do presidente Jair Bolsonaro intensificando o confronto com os demais Poderes. O consenso entre analistas é de que, daqui para a frente, o cenário, que já era pessimista, ficou mais nebuloso devido ao aumento do “custo Bolsonaro”. Com isso, a população terá de arcar com a fatura da maior incerteza, via baixo crescimento da economia e alta da inflação. A previsão é de que os índices de preços podem chegar à casa dos dois dígitos, como já acontece com os juros cobrados pelo mercado para investir em títulos públicos. Os papéis com vencimento em janeiro de 2031, por exemplo, voltaram a ser negociados acima de 11% ao ano.

Os pronunciamentos, ontem, dos chefes do Judiciário e do Legislativo, contrapondo-se ao presidente, deixaram dúvidas sobre o que ainda virá no cenário político. O mercado está também na expectativa em relação às manifestações da oposição ao governo, marcadas para o próximo domingo. Analistas avaliam que Bolsonaro, apesar da queda na popularidade, ainda conta com apoio de uma fatia da população que não pode ser ignorada. Contudo, avaliam que o governo terá muito mais dificuldade para avançar com reformas, como a tributária e a administrativa, e, para piorar, vai retroceder no ajuste fiscal. A previsão é de que o Centrão cobrará caro para barrar o impeachment, e, como não há espaço para novas despesas no Orçamento de 2022, a saída deverá ser via estouro do teto de gastos — regra constitucional que limita o aumento de despesas à inflação.

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Outro consenso entre os analistas é o de que, ao voltar a desafiar o Supremo Tribunal Federal (STF), Bolsonaro travou a saída que vinha sendo negociada com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para o problema dos precatórios, as dívidas judiciais da União. No total, R$ 89,1 bilhões devem ser pagos em 2022, o que não deixa espaço para a promessa do presidente de aumentar o valor dos benefícios do Bolsa Família nos meses que antecedem as eleições do próximo ano. “O risco fiscal aumentou e, se não houver solução para os precatórios, o governo deverá estourar o teto”, alertou Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos.

Volatilidade

Não à toa, a piora nas expectativas derrubou a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) e fez o dólar subir com força, ontem. De acordo com o economista Juan Jensen, sócio da 4E Consultoria, a tendência é de muita volatilidade no mercado financeiro até as eleições de 2022. “As perspectivas pioraram. Esse governo só entregou a reforma da Previdência e não vai conseguir entregar mais nada, nem ajuste fiscal. Se vier alguma coisa, será muito pontual”, afirmou Jensen. “A reforma administrativa é pouco ambiciosa. E a reforma do Imposto de Renda, é melhor enterrar, porque ficou tão ruim que a melhor opção é não fazer”, acrescentou.

Jensen reduziu de 5,2% para 4,9% a previsão de alta do Produto Interno Bruto (PIB) de 2021, mas manteve em 2,4% a estimativa de expansão em 2022. Mais pessimista, o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, passou a prever altas de 4,1%, neste ano, e de 1,1% em 2022 — “na melhor das hipóteses”, porque a estimativa não considera os efeitos de um agravamento da crise hídrica.

“Tudo mudou de patamar e, agora, ninguém sabe o que vai acontecer”, disse Gonçalves. “O país só não entra em recessão por acaso”, alertou. O economista, porém, não descarta as chances de o país entrar em um cenário de estagflação — baixíssimo crescimento com inflação — já que o Banco Central continuará elevando os juros para conter o processo inflacionário e, consequentemente, ajudará a frear o PIB. “Na melhor das hipóteses, o país voltará a registrar taxas de crescimento medíocres”, frisou.

O economista e consultor Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, que passou a prever altas do PIB de 4,9%, neste ano, e de 1,5%, em 2022, observa que o crescimento do país será “modesto”, especialmente, devido à limitação do principal motor do PIB: o consumo das famílias, que ficou estagnado no segundo trimestre. Ele destacou que a recuperação do consumo “parece travada pelo mau desempenho do mercado de trabalho”. “Acredito que melhore na segunda metade do ano, na esteira da vacinação, seja pelo consumo maior de serviços seja pelo aumento do emprego associado a esse setor, mas lembrando que o sarrafo está baixo”, disse.

PROTESTOS CONTRA BOLSONARO NO 7 DE SETEMBRO


Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
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Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
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Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
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Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
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Investimentos

De acordo com a economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), outro motor do crescimento do PIB, os investimentos, não deve contribuir para taxas mais robustas da atividade. “A tendência é de queda dos investimentos nos próximos trimestres devido ao efeito base, e eles não devem ajudar na retomada”, alertou.

Sílvia Mastros comentou ainda que acabou a contabilidade criativa que vinha turbinando os investimentos na segunda metade de 2020: as reimportações fictícias de plataformas de petróleo antigas, que, na verdade, nunca saíram do país.

Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, lembrou que a inevitável piora nas contas públicas está freando o capital estrangeiro. “Os investidores não estão de costas para o Brasil, mas olhando para o país com uma lupa gigantesca e começando a discutir ações de garantia e maior prêmio de risco para investirem aqui”, resumiu.

Bolsa desaba e dólar sobe

Os atos do 7 de Setembro tiveram efeito devastador no mercado financeiro. O Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), despencou 3,78% ontem, fechando o pregão aos 113.413 pontos. Foi a maior queda da Bolsa desde a anulação da condenação do ex-presidente Lula pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em março deste ano. Com a retração do valor das ações, as empresas listadas na B3 sofreram uma perda de R$ 195 bilhões em valor de mercado, segundo dados da consultoria Economática. O Ibovespa acumula recuo de 4,52% no mês e perda de 4,71% no ano.

Os ruídos e a animosidade no cenário político também se refletiram no dólar, que teve alta de 2,89%, fechando a quarta-feira a R$ 5,326. Cristiane Quartaroli, economista do Banco Ourinvest, afirma que a moeda, que já abriu em alta, subiu ainda mais após as declarações do presidente do STF, Luiz Fux, que reagiu duramente às críticas que o presidente Jair Bolsonaro vem fazendo à Corte — indicando que a temperatura política continuará elevada. “A sensação de piora da crise institucional deve continuar aumentando tanto a volatilidade quanto a aversão ao risco aqui no Brasil, provocando pressão na nossa moeda”, alertou Quartaroli.

O economista Lívio Ribeiro, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV) e sócio da BRCG, reforçou que as questões domésticas deverão continuar afetando o mercado até que o clima político seja minimamente pacificado. “A instabilidade deve continuar enquanto a gente estiver cercada de tantas incertezas, que afugentam investidores. Nesse ambiente pouco favorável, não há como planejar investimentos”, pontuou.

Dos R$ 195 bilhões perdidos em valor de mercado, ontem, pelas empresas da bolsa, R$ 28,7 bi foram referentes às três principais estatais brasileiras no Ibovespa: Petrobras, Eletrobras e Banco do Brasil. De acordo com o economista da Economática Einar Rivero, a Petrobras foi a empresa que mais perdeu, R$ 19,65 bilhões. A seguir vieram Ambev, com R$ 15,4 bilhões; Itaú, R$ 14,3 bilhões; Bradesco, R$ 12,2 bilhões; e Vale, R$ 10,1 bilhões.

As paralisações de caminhoneiros em algumas estradas também ajudou a azedar o humor dos investidores, explicou Daniel Miraglia, economista chefe da Integral Group. “Uma coisa é eles reivindicarem queda do preço de diesel e gasolina, o que já não seria uma boa notícia, mas as reivindicações estão ligadas ao discurso que o presidente fez na terça-feira”, ressaltou.

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2021/09/4948492-crise-eleva-riscos-e-piora-expectativas.html


Luiz Carlos Azedo: O dia seguinte

Bolsonaro tem uma interpretação do Poder delegado pelos eleitores à Presidência que extrapola seus limites constitucionais, vem daí o conflito institucional

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense

O presidente Jair Bolsonaro demonstrou grande capacidade de mobilização no dia 7 de setembro. Maior do que a oposição imaginava, porém, menor do que gostaria que fosse, para ir adiante no seu projeto de emparedar o Supremo Tribunal Federal (STF) e/ou dar um golpe de Estado. Grande o suficiente para garantir uma base parlamentar capaz de barrar um processo de impeachment, como ficou claro no pronunciamento do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL). Não o bastante para intimidar o STF, como deixou claro o seu presidente, ministro Luiz Fux.

O país está prisioneiro de uma armadilha criada pelo presidente da República. É um impasse no qual as pesquisas de opinião apontam o seu enfraquecimento, mas não ainda o suficiente para inviabilizar sua presença no segundo turno. Bolsonaro perde a expectativa de reeleição, mas continua controlando a forma mais concentrada de poder: o governo, que arrecada, normatiza e coage. Sua gestão é um desastre multifacetado, que turva o horizonte político e econômico e agrava os problemas sociais, é certo. Mesmo assim, Bolsonaro contém a expetativa de poder da oposição, gerada principalmente pelo favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com a ameaça de impedir as eleições ou não aceitar seu resultado. Ou seja, de não deixar que o petista tome posse, caso vença as eleições, como ameaçara Carlos Lacerda na campanha eleitoral de 1950.

Como diria o Barão de Itararé, tudo seria fácil se não fossem as dificuldades. Os episódios do Dia da Independência e os de ontem, com os pronunciamentos do presidente da Câmara e do presidente do Supremo, refletem o outro lado da mobilização bolsonarista. Além de uma fieira de crimes eleitorais — propaganda antecipada, uso indevido de recursos públicos, financiamento ilegal etc. —, Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade ao atacar o Supremo e dizer que não aceitaria decisões do ministro Alexandre de Moraes. A premissa de um processo de impeachment já está dada; a forma, ainda não. É um processo político, que somente começa quando o presidente da Câmara tira da gaveta um dos pedidos de impeachment.

Bolsonaro lançar suas falanges políticas contra as instituições, que trata como se fosse a oposição e não Poderes e/ou agências de Estado, foi um erro crasso. Em vez de sair do isolamento e retomar a capacidade de iniciativa política, acabou mais isolado ainda. Criou um clima favorável ao surgimento de uma candidatura de centro, comprometida com a democracia, ou seja, alternativa a ele próprio, e não a Lula. O monitoramento das redes sociais pelas agências de risco aponta nessa direção. Há pré-candidatos assumidos: Ciro Gomes (PDT), João Doria (PSDB), Luiz Henrique Mandetta (DEM), Alessandro Vieira (Cidadania), ou que se fingem de mortos — Sérgio Moro (sem partido) e Rodrigo Pacheco (DEM). Quem conseguir galvanizar “a direita da esquerda e a esquerda da direita” do eleitorado pode emergir como alternativa de poder e chegar ao segundo turno. Seus partidos já dialogam intensamente, em busca de uma coalizão contra Bolsonaro.

Estado-maior

É muito difícil entender a cabeça do presidente da República, porque ele foge aos paradigmas tradicionais da política e da normalidade institucional. Mas é possível definir o caráter bonapartista de seu governo, em conflito com a Constituição de 1988 e hegemonizado por três generais amigos — o ministro da Defesa, Braga Neto, o golpista; Luiz Ramos, secretário-geral da Presidência, o mais amigo, e Augusto Heleno, chefe do Serviço de Segurança Institucional, o ideólogo —, e pelos filhos, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), o articulador empresarial; o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que coordena os grupos de extrema direta; e o vereador carioca Carlos Bolsonaro, o grande operador de suas redes sociais. Os demais ministros são meros coadjuvantes, mesmo o novo chefe da Casa Civil, senador Ciro Nogueira (PP-PI), que entrou no governo para tirar Bolsonaro do isolamento e foi engolido pela radicalização.

A estratégia de Bolsonaro é politizar ao máximo fracasso econômico e administrativo, deslocando o eixo da discussão dos problemas reais da população e transferindo responsabilidades para governadores, prefeitos e os demais Poderes, na linha de que o Judiciário não deixa o presidente da República governar, nem o Congresso aprova as reformas. Bolsonaro tem uma interpretação do Poder delegado pelos eleitores à Presidência que extrapola seus limites constitucionais, vem daí o conflito institucional. Ontem, apoiadores mais radicais e truculentos tentaram invadir o Supremo Tribunal Federal (STF). Bolsonaro incitou-os e sinalizou que pretende mobilizá-los para impedir as eleições de 2022, na véspera, uma ameaça muito grave à democracia.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-dia-seguintex