Economia
Everardo Maciel: Realismo e prudência
Os efeitos da reforma tributária de Trump, recém-aprovada pelo Congresso americano, ainda não estão claros, inclusive sobre a saúde fiscal dos EUA. Sua concepção contrariou a bem urdida proposta do seu próprio partido, o Republicano, e constitui uma complexa redução na tributação das pessoas jurídicas e físicas, com efeitos diferenciados por tipo de negócio.
O aspecto mais visível da reforma foi a redução, na alíquota do IRPJ, de 35% para 21%. Esse fato estimulou, imediatamente, especulações no Brasil quanto à necessidade de acompanhar a iniciativa americana, sob pena de perdermos competitividade fiscal, malgrado se saiba que estamos enfrentando um colossal déficit fiscal, que, se não mitigado, afugentará investimentos. A competição fiscal é tão antiga quanto a história dos impostos e somente se torna predatória quando afronta leis internas ou convenções internacionais.
No âmbito internacional, é difícil prevenir a competição nociva, porque inexiste uma convenção multilateral para fixar os limites da competição e um organismo capaz de impor sanções aos países infratores. É longeva a predação perpetrada pelos paraísos fiscais, que abrigam múltiplas espécies de crime, como sonegação, corrupção, atividades financeiras associadas ao terrorismo e ao tráfico de armas e drogas, etc.
Mas reduções nas alíquotas do IRPJ devem ser vistas com cautela. Uma alíquota nominal, ainda que óbvio, não determina o imposto devido, o que conta é a efetiva, que inclui a base de cálculo.
Em 1995, as alíquotas do IRPJ, no Brasil, foram reduzidas: a máxima, de 42% para 25%; a mínima, de 25% para 15%. A arrecadação, contudo, cresceu consistentemente, conforme atestam os dados da Receita. Foram muitas as razões. A mais destacada delas foi a eliminação da dedutibilidade da correção monetária do patrimônio líquido, mais perverso instrumento de concentração de renda, pela via tributária, já concebido no País. Em 1992, por exemplo, com inflação muito alta, o recolhimento do IRPJ das grandes empresas foi pífio.
A arrecadação cresceu porque a redução da alíquota nominal foi compensada por um grande aumento na base de cálculo, ainda que mitigado pela introdução dos juros remuneratórios do capital próprio, isenção na distribuição dos resultados, aumento dos limites de opção pelo lucro presumido, etc.
De qualquer forma, é certo que a reforma de Trump vai produzir mudanças na competição fiscal internacional. Mas é preciso tempo para avaliar as repercussões, inclusive em virtude das contramedidas que serão adotadas por outros países. Alguns exemplos: Portugal e Itália já adotaram incentivos para a transferência de domicílio fiscal de não residentes; o Reino Unido e a Argentina fixaram uma trajetória decrescente de alíquotas do IRPJ; ainda que de eficácia incerta, os países da União Europeia deflagraram retaliações aos paraísos fiscais.
O presidente francês, Emmanuel Macron (Valor, 25/1/2018), conquanto tenha extinto o esdrúxulo imposto de solidariedade sobre a fortuna, ponderou que a propensão generalizada à redução de impostos pode ser uma corrida para o fundo do poço. Os investidores estrangeiros buscam, com legitimidade, aplicar seus recursos em países que ofereçam maior segurança, rentabilidade e liquidez, para o que concorre, com relevância, a tributação.
O Brasil dispõe de institutos, como juros remuneratórios do capital próprio e isenção na distribuição de resultados, que podem ser diferenciais na atração de investimentos. Lamentavelmente, temos, em contraste, um iníquo processo tributário e uma parafernália burocrática, que inferniza a vida do contribuinte e estimula a corrupção. Essa é a reforma da vez. No campo tributário, nada mais repele o investidor estrangeiro que a insegurança jurídica, a lerdeza processual e as saúvas burocráticas.
De resto, é acompanhar, com realismo e prudência, a evolução dos fatores que interferem na competição fiscal internacional, não só a alíquota nominal, para agir no momento certo.
* Everardo Maciel é consultor tributário, foi secretário da Receita Federal (1995-2002)
G1: Instituição Fiscal Independente estima rombo de R$ 126 bilhões nas contas do governo em 2017
Meta para o ano de 2017 é de um resultado negativo de até R$ 159 bilhões. Números oficiais, da Secretaria do Tesouro Nacional, sairão somente no dia 30 de janeiro
Por Alexandro Martello, G1, Brasília
A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal, estimou que as contas do governo devem registrar um rombo de R$ 126,1 bilhões em 2017.
Se confirmado, esse resultado ficará abaixo do limite da meta fiscal revisada do ano passado, que é de um déficit de até R$ 159 bilhões. O valor ficará menor também do que a meta inicial, que era de até R$ 139 bilhões para 2017.
O conceito utilizado nas metas fiscais é o "primário", que, configurando déficit, considera que as despesas ficarão acima das receitas, mas sem contar os juros da dívida pública.
O valor previsto para o rombo nas contas do governo pela IFI em 2017 também ficaria abaixo do rombo fiscal de R$ 161,27 bilhões registrado em 2016, segundo números revisados pelo governo. Em 2015, o déficit somou R$ 114,74 bilhões.
O resultado oficial das contas do governo será conhecido somente na terça-feira (30) da semana que vem, por meio de divulgação da Secretaria do Tesouro Nacional.
"Os dados preliminares foram extraídos do sistema Siga Brasil, do Senado Federal, a partir de filtros construídos pela IFI. Por serem de elaboração própria, os critérios podem divergir dos adotados pelo Poder Executivo, que publica o resultado oficial ao final de cada mês", acrescentou a IFI.
Ainda de acordo com a Instituição Fiscal Independente, a explicação para a estimativa para as contas do governo em 2017 ter ficado bem abaixo da meta se deve "principalmente pelo desempenho da receita primária líquida (+2,6%, em termos reais), mas também conta com leve redução na despesa total (-0,8%, em termos reais)".
A IFI observou ainda que houve o ingresso de "montante relevante" de receitas atípicas no último ano, tais como:
programas de regularização tributária (R$ 34,3 bilhões);
concessões nos setores de petróleo e gás (R$ 10 bilhões),
hidrelétricas (R$ 12 bilhões) e infraestrutura aeroportuária (R$ 8 bilhões);
restituição de precatórios não sacados (R$ 11 bilhões).
Do lado das despesas, a Instituição Fiscal Independente estimou que a queda prevista de 0,8% em 2017, em termos reais, é influenciada principalmente pelas despesas discricionárias, com queda real próxima a 14% no ano.
"O recuo das discricionárias poderia ter sido maior, em função do expressivo contingenciamento realizado no primeiro semestre, mas que foi parcialmente revertido nos últimos meses, quando as possibilidades de cumprimento da meta fiscal passaram a ficar mais claras", afirmou, em relatório.
No grupo, as despesas do PAC devem ter o menor recuo de 32%, com destaque para o Programa Minha Casa Minha Vida, com "queda ainda mais expressiva (-56%)".
http://www.fundacaoastrojildo.com.br/2015/wp-content/uploads/2018/01/RAF12_JAN2018.pdf
Míriam Leitão: Otimismo curto
Os estoques deixados pela supersafra de 2017 vão garantir a estabilidade dos preços dos alimentos este ano. A produção vai cair, mas os preços não terão altas muito fortes. O desemprego ficará alto, mas o consumo pode continuar aumentando. Essa é a visão do economista José Roberto Mendonça de Barros. Ele aposta em um crescimento do PIB de 3,5%. Mas não tem visão positiva sobre 2019.
Todo mundo sabe que o ano passado foi excelente para a agropecuária brasileira, mas nem sempre se tem uma medida desse desempenho. José Roberto comparou a primeira previsão de safra de 2017, feita ainda em 2016, com o que acabou sendo colhido e chegou a um número impressionante:
— Foram 30 milhões de toneladas de grãos além da estimativa.
Isso não vai se repetir, e a colheita deve ser menor. Muita gente acha que isso significa forte pressão nos preços, mas ele acredita que não haverá isso porque os estoques de passagem (de um ano para o outro) estão altos:
— O milho terá uma produção menor mas o estoque é de 12 milhões de toneladas. Na soja, a queda da produção deve ser de apenas 3%. Com o país bem abastecido de milho e soja, não há por que ter grande variação nos preços da carne.
Mendonça de Barros esclarece que o desempenho do agronegócio não foi apenas pelo excelente ano climático. Foi também pelo aumento constante da produtividade. Isso significa que, mesmo com um ano climático não tão bom quanto 2017, o país continuará elevando a competitividade.
Acha que a inflação será baixa, em torno de 4%, porque outros fatores vão manter os preços estáveis:
— Os mecanismos de realimentação da inflação estão baixos porque os IGPs ficaram negativos e haverá até quem queira reduzir os preços de aluguéis, o IPCA ficou abaixo do piso da meta, e o INPC ficou em 2%.
Ele também não teme que o câmbio possa ser um fator de pressão caso a volatilidade aumente pela incerteza eleitoral e crise política. Pondera que o país “está cheio de dólar”. Houve um superávit histórico na balança comercial, o país recebeu investimento direto, e o balanço de transações correntes está perto de zero. Com abundância de oferta da moeda americana, e as reservas do BC, o país pode absorver, na opinião do economista, qualquer instabilidade no câmbio.
E o desemprego? Não há visão positiva que negue o problema, que permanece alto demais. José Roberto acha que os números continuarão negativos e o desemprego permanecerá em níveis elevados:
— Mas está caindo aquela sensação de que ‘eu posso ser o próximo na fila do desemprego.’ Essa sensação segurou muito o consumo no ano passado, porque mesmo quem estava empregado temia perder o posto de trabalho. Mas, agora, a escalada de demissões diminuiu. Há empresas que voltaram a contratar. E isso pode manter o consumo das famílias.
Ele acha que uma das provas desse fenômeno está nos dados de vendas de varejo. Os bens de maior valor, que precisam de financiamento, estão com um crescimento maior do que os que não precisam de crédito porque têm valor menor. Por isso, no seu cenário está um aumento do consumo, apesar de não haver uma melhora significativa no mercado de trabalho.
O desemprego hoje, na opinião de Mendonça de Barros, é um freio na retomada do crescimento. A recuperação econômica, após a recessão, está sendo mais lenta porque o desemprego está alto.
Se os dados positivos do cenário se confirmarem, o país atravessará um ano tumultuado na política com a economia em recuperação branda, não criando marolas. Afinal, a política já produzirá bastante tremor. O conflito se dará, segundo o economista, entre candidatos populistas e reformistas:
— O problema é que o candidato reformista ainda não está definido.
Mesmo um economista com uma visão otimista sobre a economia em 2018 nada garante sobre 2019. Para sustentar essa recuperação será preciso aumentar o investimento e isso exige um horizonte de estabilidade fiscal para alavancar investimentos públicos e privados. O país vai comemorar o dado bom de cada dia — como o de ontem, em que o IBC-Br teve alta 1% em 11 meses do ano passado — mas não tem qualquer certeza para além de 2018.
El País: “O Brasil está experimentando uma das maiores desindustrializações da história da economia”, diz Ha-Joon Chang
Considerado de direita na Coreia do Sul e de esquerda na Inglaterra, economista critica rumo das políticas brasileiras e defende protecionismo nos países emergentes
Você se considera de esquerda? Mesmo acostumado a dar entrevistas, essa pergunta ainda faz gaguejar Ha-Joon Chang, professor de economia da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, que se tornou conhecido por expor os problemas do capitalismo. “Bem...eu possivelmente sou”, respondeu um pouco reticente o acadêmico, como quem confessasse um pecado. Para ele, no mundo polarizado de hoje, admitir-se de qualquer tendência ideológica pode significar uma sentença de morte para um potencial diálogo. Além disso, em diferentes países, a percepção de direita e esquerda é diferente. “Na Coreia do Sul e Japão, por exemplo, o tipo de política industrial que defendo é considerada de direita. Já na Inglaterra, onde vivo hoje em dia, é uma política de esquerda”, afirmou o autor sul-coreano do best-seller Chutando a Escada: A Estratégia do Desenvolvimento em Perspectiva Histórica (Editora Unesp), que veio ao Brasil participar do Fórum de Desenvolvimento, em Belo Horizonte. Ha-Joon Chang conversou com o El PAÍS sobre polarização política, história econômica e o futuro do sistema econômico mundial, que, para ele, não é nem capitalista, nem socialista.
Pergunta. Como a polarização política afeta o desenvolvimento econômico?
Resposta. A polarização é a pior coisa que pode acontecer para a economia. Tudo se torna simbólico. Você começa a se opor a determinada política simplesmente porque ela está associada a um partido de esquerda ou direita. Os debates estão se tornando cada vez mais difíceis. Ambos os lados, ao invés de debater, gritam uns com os outros. Eu gosto de me descrever como um pragmatista. Não importa de onde vem determinada política para o desenvolvimento econômico, contanto que ela funcione.
P. Desde o Consenso de Washington, no final da década de 1980, muitos países pobres abraçaram as recomendações internacionais para propagar o livre comércio como uma das formas de combater a miséria e se desenvolver. Como você avalia o resultado dessa medida?
R: Hoje, quando olhamos para os países ricos, em sua maioria, eles praticam o livre comércio. Por isso, é comum pensarmos que foi com esta receita que eles se desenvolveram. Mas, na realidade, eles se tornaram ricos usando o protecionismo e as empresas estatais. Foi só quando eles enriqueceram é que adotaram o livre comércio para si e também como uma imposição a outros Estados. O nome do meu livro, Chutando a escada, faz referência a um livro de um economista alemão do século XIX, Friedrich List, que foi exilado político nos Estados Unidos em 1820. Ele critica a Inglaterra por querer impor aos EUA e à Alemanha o livre comércio. Afinal, quando você olha para a história inglesa, eles usaram todo o tipo de protecionismo para se tornar uma nação rica. A Inglaterra dizendo que países não podem usar o protecionismo é como alguém que após subir no topo de uma escada, chuta a escada para que outros não possam usá-la novamente.
P: Como se deu o desenvolvimento dos países ricos na prática?
R:Estes países cresceram com base no que Alexander Hamilton [1789-1795], primeiro secretário do Tesouro dos Estados Unidos [que estabeleceu os alicerces do capitalismo norte-americano], defendeu como o argumento da indústria nascente. Do mesmo jeito que mandamos nossas crianças para a escola ao invés do trabalho quando são pequenas, e as protegemos elas crescerem, os Governos de economias emergentes têm que proteger suas indústrias até que elas cresçam e possam competir com as indústrias de países ricos. Praticamente todos os países ricos, começando pela Inglaterra no século XVIII, Estados Unidos e Alemanha, no século XIX, Suécia no começo do século XX, além de Japão, Coreia do Sul e Taiwan...todos estes países se desenvolveram usando protecionismo, subsídios estatais, controle do investimento direto estrangeiro, e em alguns casos, até mesmo empresas estatais.
P: Como esse passado dialoga com as medidas atuais de austeridade, que se tornaram fetiche em todo mundo como promessa de crescimento?
R: A receita de austeridade usada na Grécia é a mesma tentada na América Latina, na África e em alguns países da Ásia nas décadas de 1980 e 1990, e que criou desastrosos resultados econômicos. Investir em política de austeridade é contraproducente. As pessoas que defendem esse tipo de política entendem que, quando você tem uma grande dívida pública, um jeito de reduzir essa dívida é cortar os gastos do Governo a fim de reduzir o déficit fiscal. Mas um jeito melhor de reduzir o déficit é fazer a economia crescer mais rápido. Depois da Segunda Guerra Mundial, a Grã-Bretanha tinha uma dívida mais de 200% de seu PIB [Produto Interno Bruto], mas sua economia estava crescendo rápido. E depois de algumas décadas, isso deixou de ser um problema. Hoje, a Inglaterra tem tentado uma política de austeridade, mais amena que a da Grécia, é verdade, mas também sem sucesso em reduzir o déficit público proporcionalmente a renda nacional. Isso porque o PIB está crescendo muito lentamente. Se você corta os gastos, seu endividamento pode ficar um pouco menor, mas a renda precisa crescer.
P: O país corre o risco de ficar estagnado?
R: Exatamente. O que é incrível é que essa política vem sendo usada várias vezes, como no Brasil nas décadas de 1980 e 1990, e nunca funcionou. Albert Einsteinfalava que a definição de loucura é fazer a mesma coisa várias vezes e esperar resultados diferentes. O problema é que muitos economistas que defendem essas medidas, quando sua teoria não funciona, culpam a realidade. Como se a teoria nunca estivesse errada.
P: Você é bastante crítico da desindustrialização dos países emergentes. Por que é tão ruim ser dependente das commodities?
R: As pessoas têm que entender como é séria a redução da indústria de transformação no Brasil. Nos anos 80 e 90, no ponto mais alto da industrialização, esse setor representou 35% da produção nacional. Hoje não é nem 12% e está caindo. O Brasil está experimentando uma das maiores desindustrializações da história, em um período muito curto. O país tem que se preocupar. E eu não estou dizendo nada novo. Muitos economistas latino-americanos já levantavam o problema da dependência de commodities primárias na década de 1950 e 1960. Quando você é dependente de commodities primárias há uma tendência de que o preço dos produtos caia no longo prazo em comparação com os produtos manufaturados. Além disso, os países dependentes de commodities não conseguem controlar seu destino.
P: Por exemplo?
R: Quando alguém inventa uma alternativa para o seu produto, isso pode devastar o valor de sua economia. A indústria brasileira de borracha foi um grande hit até que os americanos e russos inventaram a borracha sintética nos anos 1930 e 1940. Quando os alemães inventaram a chamada síntese de Haber-Bosch para a produção de amônia, a ser usado na fabricação de fertilizantes, Chile e Peru, que costumavam ganhar muito dinheiro exportando o fertilizante natural guano, que foi o mais valioso fertilizante nos século XIX, tiveram anos de estagnação econômica. Isso sem contar o potencial lento de crescimento das commodities e relação a outras indústrias, como a de tecnologia.
P: Mas o caso do Brasil não seria diferente, já que o país investe em tecnologia na área agrícola, e não só extração de commodity?
R: Para ser justo, eu sei que o Brasil tem tido algum sucesso na área agrícola, como produzir soja no Cerrado, que é uma região muito árida, onde tradicionalmente esta espécie não cresceria. É realmente impressionante. Mas quando você se especializa em soja você não pode aumentar sua produtividade da mesma forma que um país especializado em alta tecnologia, que pode aumentar sua produtividade em 20%, 30% ao ano. Sinceramente, o Brasil é um dos países que parece estar voltando no tempo no seu desenvolvimento econômico.
P: Como você avalia o papel do Estado neste cenário?
R: Ao contrário de outros países em desenvolvido, o Brasil tem a habilidade de fazer as coisas acontecerem por meio da intervenção governamental. A Embraer, por exemplo, é uma empresa de economia mista. A agricultura no Cerrado é subsidiada com recursos do governo. Em vários setores, o país já mostrou que quando quer fazer uma coisa, ele consegue. Infelizmente, os responsáveis por fazerem as políticas públicas parecem que perderam o rumo. Eles basicamente desistiram do modelo de desenvolvimento econômico por meio de um upgradena economia, com investimento em indústrias de alta tecnologia.
P: Onde você acha que a política pública falhou?
R: Eu conheci vários empresários irritados em São Paulo pois as pessoas no Governo não parecem estar preocupadas com o declínio da indústria manufatureira no país. Sei que muitos economistas defendem que não importa se você está exportando soja ou aviões, desde que esteja fazendo dinheiro. E, no curto prazo, isso pode até ser verdade. Mas no longo prazo, é muito ruim para a economia. Além disso, as políticas macroeconômicas têm sido muito ruins para o setor industrial, especialmente a alta taxa de juros, uma das maiores do mundo.
P: No Governo Dilma, vários setores receberam subsídio e mesmo assim, os empresários não pareciam estar satisfeitos. O que faltou?
R: O Governo de Dilma canalizou vários subsídios em alguns setores em particular. Mas isso só foi necessário por conta da política de alta taxa de juros, uma vez que as companhias brasileiras não conseguem competir no mercado global de outra forma. Não sei todos os detalhes. Mas sei que houve erros, corrupção. As metas governamentais também foram determinadas de forma equivocada...sempre privilegiando a estabilidade macroeconômica. Já o declínio da indústria não foi considerado um problema. Focou em ações como Bolsa Família, mas sem prestar atenção em dar um upgrade na economia.
P: A Coreia do Sul pode ser considerada um exemplo de economia que conseguiu dar esse upgrade?
R: Depende de qual Coreia do Sul que estamos falando. A Coreia do Sul depois da crise asiática de 1997 abraçou o neoliberalismo, não tanto como os países da América Latina, mas desregulamentou o mercado financeiro e alavancou políticas industriais. O resultado é que uma economia que costumava crescer 6%, 7%, 8% até 1990, agora está sofrendo para crescer 3%. Isso porque as mudanças que criaram líderes globais na área industrial, automotiva e eletrônica, também produziram baixo crescimento, falta de trabalho e não impediram que estas indústrias migrassem para outros países. E mesmo assim, não tivemos o colapso industrial que se vê no Brasil.
P: Qual foi o papel da educação no crescimento da Coreia do Sul?
R: No começo, a educação teve um papel muito importante. Até os anos 80, era possível alguém de uma família pobre se tornar juiz, governador ou cirurgião. Infelizmente, a partir dos anos 90, tivemos um sobreinvestimento em educação, com o crescimento dos negócios privados. Tínhamos o maior investimento em educação do mundo. Mas hoje, considerando o valor que estamos investindo, e o tempo que os estudantes estão gastando para conseguir suas qualificações...o sistema se tornou bem ineficiente. A mobilidade social caiu muito nos últimos anos, porque as políticas educacionais deixaram de ser coordenadas com políticas industriais.
P: Você comenta que estamos entrando no fim da abordagem neoliberal ao desenvolvimento. O Brexit seria um exemplo desse começo do fim?
R: Poderia ser. Mas temos que considerar que há três tipos de pessoas que votaram pelo Brexit. Um deles são os liberais que votaram para se livrar das regulamentações impostas pela União Europeia. Há ainda o grupo anti-estrangeiros e anti-imigração. E um terceiro grupo, os trabalhadores no Norte da Inglaterra, que já foi o centro produtor do país, e que experimentou uma desindustrialização massiva. Estas pessoas perderam seus trabalhos, e agora culpam trabalhadores da Polônia, Romênia e Hungria pela sua sorte. Podemos dizer que é o começo do fim no sentido em que isso aconteceu com a insatisfação que muitas pessoas têm com a globalização e o livre comércio.
P: Há algum lugar onde estaria sendo gestada uma solução para o modelo de desenvolvimento econômico dos países?
R: Cingapura é hoje o exemplo mais bem sucedido de um país com desenvolvimento pragmático e não ideológico. Quando lemos sobre Cingapura nos jornais The Wall Street Journal e na revista The Economist sempre ouvimos falar da política de livre comércio e o acolhimento positivo que o país tem com o investidor estrangeiro. O que é verdade. Mas não se fala que 90% das terras do país são de propriedade do Governo; 85% das casas são de propriedade do governo; e 22% do PIB é produzido por empresas públicas. Eles têm um modelo pragmático de economia, que mistura elementos do capitalismo de livre mercado e do socialismo. Eles não são capitalistas, nem socialistas. São pragmatistas. Uma de minhas frases favoritas é de Deng Xiaoping, o ex-líder Chinês: “Eu não ligo se o gato é preto ou branco, contanto que seja bom em pegar ratos”. Isso é o pragmatismo.
Luiz Carlos Azedo: O par dialético
A economia voltou a crescer, mas a crise de financiamento do Estado impõe um “voo de galinha”. Com a mudança de cenário na economia mundial, o nosso velho desenvolvimentismo não tem vez
A esquerda brasileira tem uma forte tradição nacionalista, resultado da convergência de velhas concepções nacional-libertadoras e do populismo. Até o golpe de 1964, a luta contra o imperialismo era considerada mais importante do que a defesa da democracia. No governo João Goulart, por exemplo, a aliança entre comunistas, petebistas e pessedistas que levou Juscelino Kubitschek à Presidência foi rompida. A esquerda considerava um retrocesso político sua volta ao poder nas eleições marcadas para 1965, devido à sua “conciliação” com os Estados Unidos. Enquanto o líder petebista Leonel Brizola se lançava candidato a presidente (“cunhado não é parente”), o líder comunista Luís Carlos Prestes articulava a reeleição de João Goulart. A divisão do campo democrático por causa das ideias nacionalistas jogou os liberais nos braços dos setores conservadores liderados por Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, que articulavam o golpe de Estado. Entre eles estavam, por exemplo, o próprio Juscelino e aquele que viria a liderar a campanha das Diretas Já, Ulysses Guimarães.
Com a deposição de Goulart, o então presidente da Câmara dos Deputados Ranieri Mazzilli assumiu interinamente a Presidência da República, mas a junta militar (general Artur da Costa e Silva, brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo e o almirante Augusto Rademaker), autodenominada “Comando Supremo da Revolução”, exigiu plenos poderes do Congresso para fazer cassações de mandatos e demitir servidores públicos. O historiador Hélio Silva conta que, em 8 de abril de 1964, um grupo de parlamentares, do qual fazia parte Ulysses, redigiu o ato constitucional a ser votado pelo Congresso para delegar esses poderes. No dia 9, porém, os militares editaram o Ato Institucional nº 1 (AI-1), que conferia poderes extraordinários ao Executivo e estipulava a eleição de um novo presidente e de um vice-presidente no prazo de dois dias. Em 11 de abril, foram eleitos indiretamente para a Presidência da República o general Humberto de Alencar Castelo Branco e, para a vice-presidência, José Maria Alkmin, indicado pela maioria do Congresso. Quatro dias depois, tomaram posse. Ulysses e outros pessedistas que apoiaram o golpe de 1964 logo romperam com os militares, sendo seguidos por políticos da antiga UDN. Juscelino e Lacerda foram cassados.
Uma parte da esquerda aprendeu a lição do golpe e passou a defender a democracia, mas outra optou pela luta armada, numa perspectiva de que a tomada de poder coincidiria com uma revolução, nos moldes da cubana. Tendo a guerra fria como pano de fundo, demorou para que os setores moderados da esquerda, como os antigos PCB, PTB e PSB, na ilegalidade, conseguissem convencer os demais de que o caminho da luta pela redemocratização do país passava pela disputa eleitoral e pelo apoio ao partido de oposição criado pelo próprio regime, o MDB, já então liderado pelo deputado Ulysses Guimarães e outros caciques pessedistas, como Amaral Peixoto e Tancredo Neves. Essa experiência de luta contra o regime militar levou a esquerda, na redemocratização, a inverter o chamado “par dialético”: a luta passou a ser democrática e nacional. Trocando em miúdos, subordinou-se o nacionalismo à defesa da democracia.
Desenvolvimentismo
Quando a esquerda chegou ao poder no Brasil, o mundo já não era o mesmo da guerra fria. O velho colonialismo havia acabado, logo se viu o Muro de Berlim ser derrubado e a antiga União Soviética se desintegrar, enquanto a China fazia as pazes com o capitalismo. Entretanto, o nacional desenvolvimentismo continuou sendo o eixo de sua doutrina econômica, principalmente porque a nossa industrialização fora protagonizada pala presença do Estado na atividade produtiva, num acelerado processo de substituição de importações. Era uma economia autárquica, que entrou em colapso após a crise do petróleo dos anos 1970. O Estado perdeu a capacidade de financiamento e o país passou por um longo ciclo de crises e baixo crescimento, com hiperinflação no governo Sarney e recessão no governo Dilma. Somente agora a economia voltou a crescer, mas a crise de financiamento do Estado continua impondo um “voo de galinha”. Por trás da crise, há uma mudança de cenário na economia mundial, na qual o velho desenvolvimentismo não tem vez.
No governo de Fernando Henrique Cardoso, o permanente choque entre desenvolvimentistas e social-liberais na equipe econômica já havia mostrado a resiliência das ideias nacionalistas; mas foi nos governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff que elas dominaram a cena e demonstraram seu anacronismo em relação à globalização e às mudança tecnológicas que ocorrem no mundo. Quem acredita que o impeachment de Dilma Rousseff sepultou essas ideias está muito enganado. A recente entrevista do professor Luiz Gonzaga Beluzzo sobre a conjuntura política e econômica do país mostra bem isso. Entretanto, na Europa e nos Estados Unidos, o nacionalismo é a bandeira das forças mais conservadoras e retrógradas da Europa e dos Estados Unidos. Aqui não é muito diferente: a aposta na democracia e na integração do Brasil à economia mundial corre perigo nas eleições de 2018.
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-par-dialetico/
Míriam Leitão: Alavanca da retomada
A vitória sobre a inflação construiu o caminho pelo qual o país saiu da recessão. Por causa da queda dos preços, houve uma sequência de eventos favoráveis na economia que permitiu o início da retomada. Não foi a recessão que derrubou a inflação, foi a queda da inflação que superou a recessão. Nas causas da vitória estão a produção agrícola e a ação do Banco Central.
O mocinho da virada foi o preço de alimentos, mas a redução da inflação foi generalizada, tanto que, como disse o Banco Central, sem os alimentos a taxa teria ficado em 4,54%. A queda foi resultado da supersafra, mas também dos acertos da política econômica, principalmente do BC.
A inflação estava acima de 10% em janeiro de 2016 e terminou 2017 em 2,95%. O INPC, que mede a evolução da cesta de consumo de famílias até cinco salários mínimos, terminou o ano em 2,07%. Como esse índice corrige benefícios previdenciários, isso ajudará também nas contas públicas, porque o Orçamento foi elaborado prevendo 3,1%.
Por causa da queda dos preços, houve mais espaço no orçamento das famílias para outros consumos. E isso aconteceu principalmente porque foram os alimentos que puxaram a média dos preços para baixo. Em 2016, houve momentos em que a inflação de alimentos se aproximou de 15%. O grupo terminou 2017 com deflação de 4,8%. Com a queda da inflação, os juros puderam ser reduzidos em mais de sete pontos percentuais. O relaxamento monetário permitiu renegociação de dívidas privadas e redução dos preços de rolagem da dívida pública. Com menos inflação e menos juros, houve um aumento da confiança e, mais tarde, da produção e das vendas.
Um evento levou ao outro, numa sequência de fatos positivos na economia que desafiou o ambiente tóxico da política, com a revelação da inaceitável conversa entre o presidente e o empresário Joesley Batista e todas as articulações nefastas para manter o governo.
Apesar da confusão política, a economia foi encontrando seu caminho para sair do buraco de duas quedas sequenciais do PIB de 3,5%. Mas a crise política impõe um teto para a recuperação. A alta do PIB de 2017 deve ter ficado em torno de 1%. Pouco para o tamanho da perda, apenas permite que o país comece a fazer o caminho de volta.
Ao contrário de todos os outros momentos da história do real, esta queda da inflação não elevou a popularidade presidencial e a aprovação do governo. Uma das razões é que o ambiente ainda é de crise, a renda permanece em níveis mais baixos do que já esteve, o desemprego continua muito alto. Além disso, os vilões — preços que subiram muito apesar da queda geral — atingem em cheio a classe média: combustíveis, mensalidades escolares, energia, planos de saúde. Essa recuperação é também diferente de outras recessões, porque o país está saindo à francesa. Lentamente. A última recessão deste tamanho foi provocada pelo Plano Collor. A recuperação ocorreu no governo Itamar, e o país saiu do PIB negativo de 1992 para a alta de quase 5% em 1993. O clima agora ainda é de crise, o país continua com sequelas, as empresas investem pouco, o governo enfrenta graves dificuldades fiscais.
Sair desse fosso pela queda dos preços é um fato curioso no Brasil que teve durante tanto tempo uma relação atormentada com a inflação. Ela arruinou a economia do país várias vezes. Quando voltou a dois dígitos no fim de 2015 e começo de 2016, temia-se a reindexação da economia. O cenário felizmente não se confirmou.
A ideia de que foi a recessão que derrubou a inflação não explica o que aconteceu. No Brasil, várias vezes tivemos recessão com preços subindo, a última vez foi em 2015. O país colheu uma supersafra e isso foi providencial. A produção agrícola foi o grande jogador em campo. Mas a atuação do Banco Central buscando a meta, quando parecia difícil ser atingida, e os acertos da política econômica ajudaram a derrubar os índices de preços. Os IGPs da FGV terminaram o ano com deflação. Em 2018, a inflação sobe um pouco, mas o temor do descontrole que havia no começo de 2016 foi superado. Na velha briga do Brasil contra a inflação, o país venceu desta vez.
(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)
Míriam Leitão: Urgência da hora
A história fiscal do país foi quebrada em 2014 com a entrada na era dos déficits altos e crescentes. A série do Banco Central, iniciada em 1991, mostra que no período Dilma-Temer o país entrou numa anomalia tão grande que exige o uso de armas mais poderosas do que os pequenos pacotes de ajuste. Houve uma mudança na natureza da crise, é preciso muito mais ousadia para enfrentá-la.
Durante os 23 anos que vão de 1991 a 2013 o país teve superávit primário em 22 deles e um pequeno déficit de 0,25% do PIB em 1997. Nessa longa temporada de mais de duas décadas, o país incorporou na contabilidade parte da dívida que estava fora das estatísticas e assumiu os chamados esqueletos. Por isso a dívida aumentou inicialmente. Os superávits permitiram que ela ficasse estável e, depois, caísse. Nos últimos anos, entrou numa escalada que atingiu níveis perigosos. Este é o quinto ano de déficit. Estão projetados resultados negativos para os próximos dois. Serão, então, sete anos de vermelho nas contas. O gráfico abaixo ilustra a mudança radical que houve. Descontrole desse tamanho só aparece nas contas dos países atingidos pelas crises bancárias de 2008, como Espanha, Grécia, Islândia, Irlanda, Portugal. Aqui não houve crise bancária, apenas uma calamitosa administração econômica nos anos Dilma, cujos erros o atual governo não conseguiu reverter e, às vezes, repete.
O ano de 2019 é o ponto que não se pode ultrapassar. Há uma barreira no caminho chamada “regra de ouro”. Ela foi pensada exatamente para ser parada obrigatória. Suspendê-la no momento da crise é um erro. Mesmo que o governo queira cercar a decisão com outras propostas. O fato de haver essa pedra no caminho serve para mostrar que o país tem que olhar mais profundamente o que fazer para superar a crise fiscal.
Medidas como contingenciar, cortar investimentos, limitar as viagens, aumentar IOF, elevar a alíquota de alguns produtos, mudar a época da cobrança de impostos, tudo já se esgotou. Foram úteis quando o que se precisava era menor. Agora é preciso uma proposta ampla para reformular completamente o gasto público. Por isso, o governo, em vez de propor a quebra de uma regra disciplinadora, tem que fazer a coisa certa e propor uma radical mudança no Orçamento e na estrutura dos gastos públicos.
Um país que precisa de um ajuste de 2% do PIB, entre R$ 180 bilhões a R$ 200 bilhões, não pode dar 4% do PIB para empresários. O Banco Mundial recentemente mostrou que as transferências para o capital saíram de 3% para 4,5% de 2003 a 2015. O dinheiro vai para empresas na Zona Franca de Manaus, para a indústria automobilística, para setores que foram desonerados, para empresas que entraram na lista ampliada do Simples. Alguns subsídios mais absurdos, como o PSI, foram cortados, mas os que permanecem são gigantes.
A reforma da Previdência é indispensável. Mas a proposta foi sendo modificada para ser aceita pelos mais diversos lobbies, principalmente de setores do funcionalismo. O governo capitulou logo no início diante da pressão dos militares. A Previdência brasileira como está não se aguenta em pé. As despesas com o pagamento de pensões e aposentadorias cresce a cada ano de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões. Isso é equivalente a tudo o que o governo investiu no ano passado.
Um país cujo governo só tem como mexer em 8% do Orçamento precisa ter a ousadia de mudar leis, alterar a Constituição e mudar radicalmente a forma de distribuir o dinheiro coletivo. Essa não é uma crise fiscal a mais. É a maior.
Monica De Bolle: Fogo e Fúria
As labaredas do nacionalismo econômico cativam as massas como, entre outros, no fascismo europeu dos anos 30
De pronto, devo confessar: passei o fim de semana lendo o explosivo livro de Michael Wolff, provavelmente o melhor livro de fofoca política que será publicado este ano sobre o governo Trump. Este artigo, entretanto, não é – exatamente – sobre o livro de Wolff, tampouco sobre o que revela ou deixa de revelar acerca da acuidade mental e do temperamento do ocupante da Casa Branca. O livro é, antes de tudo, o retrato do nacionalismo econômico defendido com fogo e fúria pelo defenestrado Steve Bannon, ex-estrategista de Trump, ex-conselheiro sênior da Casa Branca, ideólogo e articulador do Trumpismo que nem Trump sabe o que é.
A última semana foi marcada por dois eventos que, em tese, nada têm em comum: a publicação da obra de Wolff e as reuniões anuais da American Economic Association (ASSA 2018) – evento acadêmico que reúne desde aspirantes em busca de seu primeiro emprego universitário pós-PhD a vencedores do Nobel e outros renomados economistas.
Como não poderia deixar de ser, houve sessão dedicada aos movimentos “populistas” que pipocam mundo afora, tema que já abordei neste espaço. Economistas, cientistas políticos, sociólogos, e outros cientistas sociais não têm definição consensual sobre o populismo. De modo geral – e como visto na ASSA 2018 –, o mínimo denominador comum do populismo é que se trata de visão que contrapõe as massas à elite corrupta, cuja ideologia é desidratada, podendo, portanto, ser cooptada pela direita ou pela esquerda, e que funciona tanto em democracias quanto em regimes autoritários. Embora esses aspectos sejam aceitáveis como esboço para caracterizar o populismo, falta nessa delineação traço fundamental de qualquer movimento que se pretenda populista: o nacionalismo econômico.
Mas o que é nacionalismo econômico? Pesquisa minha em colaboração com um colega do Peterson Institute for International Economics ainda em estágio muito inicial define o nacionalismo econômico moderno sobre cinco pilares: 1. A política industrial como instrumento de promoção de setores econômicos específicos, vistos como estratégicos seja por questões de segurança nacional, seja porque acredita-se possuam maior peso na criação de empregos, sobretudo na indústria tradicional; 2. A subordinação de políticas de concorrência que preservam o livre funcionamento do mercado com regulação aos objetivos da política industrial; 3. Uma visão mercantilista acerca do comércio mundial, exaltando as exportações de produtos nacionais e vilificando as importações; 4. A submissão da estabilidade macroeconômica a outros objetivos como a criação de empregos e/ou o impulso ao crescimento de curto prazo; 5. O repúdio a tratados e acordos internacionais que restrinjam a capacidade de implantar os quatro pilares do nacionalismo econômico citados.
Volto ao livro de Wolff. As partes mais interessantes de Fogo e Fúria não são as fofocas e intrigas, embora tenham o grande mérito de divertir imensamente o leitor. As partes mais interessantes são as que retratam a incansável batalha de Bannon para imprimir às políticas defendidas pela Casa Branca conteúdo nacionalista baseado nos cinco pilares mencionados acima. O livro, portanto, pode ser lido como coletânea de mexericos, ou como a melhor exposição do Trumpismo idealizado por Steve Bannon – que, afinal, é o real protagonista da obra de Wolff, citado que é página sim, outra também.
O ex-todo-poderoso do Trumpismo parece – por ora – ter caído em desgraça. Contudo, para qualquer um que acompanhe o debate político e econômico nos EUA, na Europa, no México, e, pasmem, no Brasil, a verdade é que fogo e fúria têm consumido mentes e corações, debates e bate-bites, como bem disse Nelson Motta em contexto distinto. As labaredas do nacionalismo econômico cativam as massas como no fascismo europeu dos anos 30, na ascensão do Japão nos anos 50, no milagre econômico da Coreia e de Taiwan em 1960 e 1970, no Varguismo e no Peronismo do pós-guerra, na transformação da China em potência mundial. Em todos esses episódios, ao menos três dos cinco pilares sobre os quais definimos o nacionalismo econômico estiveram presentes. Difícil é, portanto, imaginar que fogo e fúria tenham destino certo, ou hora para acabar.
* Monica de Bolle é economista, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics e professora da Sais/Johns Hopkins University
Murillo de Aragão: Melhor que a encomenda, o Brasil se salvou, e 2018 poderá ser bom
Termina 2017 melhor do que a encomenda e as expectativas mais prudentes. Avançamos significativamente na modernização das relações trabalhistas graças à proposta do Executivo acatada pelo Congresso, que também aprovou outras medidas relevantes para alentar a economia.
Entre elas estão a PEC destinada a conter os gastos públicos, a nova lei de exploração do pré-sal (quebra da exclusividade da Petrobras, que terá participação de um terço dos investimentos) e a mudança da taxa de juros do BNDES, agora referenciada no que o governo paga para se financiar no mercado, entre outros projetos voltados para o equilíbrio fiscal e o retorno à estabilidade.
O leitor já conhece uma série de estatísticas que demonstram as conquistas do programa de reformas que o governo pôs em prática como meta a alcançar. Mas alguns números funcionam como selo de validade dessa nova fase.
Entre janeiro e outubro, segundo dados que o presidente Temer mencionou – e sofreram depois pequeno ajuste – em artigo publicado no jornal “O Estado de S. Paulo”, o superávit da balança comercial atingiu US$ 58,47 bilhões, com evolução de 51,8%. Até dezembro (segundo o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços), esse valor vai a US$ 64,3 bilhões. Depois de longo período estagnada, a produção industrial cresceu 1,6%.
Sinal dessa virada, as exportações de veículos escalaram 55,7%, superando as 560 mil unidades nas contas do acumulado de 2017. A venda de veículos novos no mercado interno aumentou 9,28% em relação a igual período do ano anterior.
Ou seja: recuperamos o dinamismo econômico e vamos crescer mais de 1% depois da tragédia dilmista. A operação Lava Jato também avançou e continuou a promover alterações sistêmicas no cenário político. As ações do Judiciário, especialmente do Supremo e do TSE, apesar de seu ativismo, colaboraram com os ventos modernizadores encampados pela sociedade.
Não prosperamos mais por conta das ações atabalhoadas da Procuradoria Geral da República de Rodrigo Janot que, no afã de impedir Raquel Dodge, tumultuou a cena polícia com denúncias do tipo meio barro, meio tijolo. O saldo foi um desgaste injustificado para o país que custou meio ponto no PIB. Entre maio e agosto, o Brasil ficou em compasso de espera.
O comércio varejista viveu o melhor Natal desde 2010, segundo informações divulgadas nesta terça-feira pela Serasa Experian. As vendas realizadas na semana que concentra as atividades das lojas aumentaram 5,6% em relação a igual período do ano anterior. A previsão da Confederação Nacional do Comércio (CNC) também é otimista – crescimento de 5,2% neste ano.
Isso confirma a expectativa de que a economia chega ao final de 2017 melhor do que imaginavam os mais generosos especialistas. Muita gente começou o ano prevendo crescimento do PIB de apenas 0,5%. Agora, segundo “O Globo”, com a retomada mais intensa do nível de emprego e do consumo do público, melhoraram também as projeções econômicas para 2018. “Há estudos que indicam expansão acima de 3% no ano”, diz o jornal.
A reforma previdenciária poderia ter sido aprovada e consolidado melhores expectativas. Venceu, nesse ponto, o corporativismo e o obscurantismo.
Pelo menos o debate da reforma ganhou consistência, mesmo tendo sido sabotado pelo discurso pseudoprogressista de setores da oposição. Os brasileiros não devem se enganar. A Previdência pública consome bilhões para sustentar poucos. E o modelo é insustentável.
Assim, entre mortos e feridos, o Brasil se salvou e poderá ter um 2018 um pouco melhor.
* Murillo de Aragão é cientista político
Miriam Leitão: Os brasileiros que vi
Os brasileiros que têm projetos e sonham. Verônica, 17 anos, é aluna de escola técnica pública em Franca. “Você vai entrevistar só homens, ou vai falar também com mulheres na sua série?", perguntou em tom de desafio. E avisou: “sou feminista". O barco deslizava no Rio Negro e eu quis saber de Roberto, o barqueiro, o que ele fazia antes da atual ocupação. “Era madeireiro, meu pai e meu avô também foram. Hoje trabalho pela sustentabilidade."
O ano de 2017 foi todo cheio de conversas marcantes. Passei o ano viajando pelo Brasil para gravar uma série para a GloboNews. Os encontros me protegeram contra o pessimismo natural derivado da crise política e econômica. Hoje é o último dia do ano e eu deveria publicar aqui uma coluna sobre o balanço do que houve na economia em 2017. Escrevi o balanço. O leitor poderá encontrá-lo no meu blog. Mas preferi dedicar o espaço para falar de alguns brasileiros que conheci no ano.
O país visto de perto arrebata e emociona. Marivaldo, jovem, negro, violinista, sentado debaixo de uma árvore, falava com entusiasmo e visível sinceridade. Ele perdeu o irmão em um acidente de moto. O pai morreu logo depois. Está no projeto Neojibá desde o início, há dez anos. O projeto protege jovens e crianças na Bahia através da música clássica. Hoje Marivaldo é um multiplicador, porque além de tocar na orquestra, ele ensina nos núcleos de estudantes mais jovens. Perguntei sobre o futuro.
— Só vejo música, multiplicação. Todo mundo tocando junto. Porque na música não tem diferença, todo mundo é igual. A gente pensa num Brasil em que todo mundo é igual, todo mundo buscando o mesmo objetivo que é um país sem diferença.
Foi assim o meu ano. Uma parte de mim acompanhava a conjuntura, outra se deixava levar pelas conversas sempre surpreendentes com brasileiros de todas as regiões, das mais variadas atividades. Conheci muita gente. Walter, trabalhador de Santa Catarina, que aos 95 anos vai entrar agora em janeiro no livro “Guinness” como a pessoa há mais tempo numa mesma empresa. Sua carteira de trabalho mostra a devastação monetária que o Brasil viveu no século XX: há registros em nove moedas.
No Rio Grande do Norte, conheci um produtor rural que gosta de ser chamado de Zé Peneira. Sua renda aumentou desde que as torres de energia eólica começaram a ser instaladas na região. Ele primeiro forneceu matéria-prima, depois arrendou parte da terra para a empresa de energia. O dinheiro foi investido na propriedade e nos estudos dos netos.
— Tinha uma neta minha estudando pra ser médica. Eu já estava para cansar. Com o dinheiro eu ajudei e ela, daqui a dois meses, já está cortando gente.
A neta cirurgiã, e o avô inventando tecnologias para aumentar a produtividade da sua lavoura. Costuma apontar para a cabeça e dizer “tudo saiu daqui" quando vai contar alguma solução engenhosa. Saía da sua fazenda em Parazinho, já com os equipamentos na van para retomar a estrada, quando José Peneira me convidou:
— Se a “incelência” me der o prazer de voltar, vai encontrar tudo “meorado".
No Acre, a jovem Sarah Evellyn criou uma organização social, o Impacta Jovem, para divulgar informações sobre oportunidades de intercâmbio. Em Belo Horizonte, Laura Leal fez parte do Impacta Jovem e depois criou seu próprio movimento, que quer ampliar as chances das meninas nas ciências exatas. Em Roraima, a jovem estudante Ariene Wapixama quer que seu povo e outros indígenas elejam um representante do estado para o Congresso.
O país mergulhado no pessimismo com que atravessou o ano, e seu Zé Peneira tem certeza de que tudo estará melhor no futuro, Marivaldo sonha com um país sem diferença, Roberto, o barqueiro, ensina a importância de manter em pé as árvores que no passado derrubaria, Verônica quer ser advogada e defender a causa feminista.
Entrevistei tanta gente interessante que não cabe neste espaço. Foi o trabalho de transformar o meu livro “História do Futuro” em uma série de dez episódios para a GloboNews. As reportagens foram sobre as possibilidades e tendências do Brasil, mas fiquei marcada pelas conversas com esses e outros brasileiros. Por isso, neste último dia do ano quis trazê-los a este espaço para falar de esperança. Feliz 2018.
Merval Pereira: Cenário aquecido
A recuperação econômica e a eleição de 2018. Começaremos o ano eleitoral de 2018 sem sequer saber quais serão os candidatos a presidente da República em outubro, o que é fato inédito e explicita a crise moral e política que vivemos. Ao mesmo tempo que estamos superando aos trancos e barrancos a crise econômica, saindo da maior recessão já ocorrida no país, o fator político deve ganhar peso na formação das expectativas.
Sob esse ponto de vista, o economista Carlos Geraldo Langoni, ex-presidente do Banco Central e atual diretor do Centro de Economia Mundial da FGV, montou os cenários possíveis para o ano que começa amanhã, prevendo um crescimento do PIB na faixa de 3%. Haverá, segundo Langoni, uma reação lenta do mercado de trabalho, gerando percepção de alguma melhora social, sendo possível que, no meio do ano, a taxa de desocupação volte a um dígito.
Esse reaquecimento, combinado com ganhos reais na massa salarial, deve influenciar positivamente as expectativas da classe média, com importantes desdobramentos para as eleições presidenciais. Para Langoni, “será feita uma escolha crucial entre o populismo irresponsável — mas com a atração fatal das soluções mágicas — e a continuidade do ciclo de reformas — de implementação duvidosa”.
Apesar deste contexto complexo, para Langoni permanece alta a probabilidade de um cenário econômico positivo que combine expansão mais rápida com inflação baixa e maior mobilidade social. A visibilidade dessa recuperação multidimensional tornará mais difícil a desconstrução da estratégia macro com viés liberal, minimizando as opções radicais. Para ele, a esperada maior volatilidade nos índices de confiança, acompanhando as pesquisas eleitorais, deve ser compensada pela aceleração do ritmo de crescimento em ambiente de inflação baixa.
Esse crescimento será alavancado pela economia mundial, pois, segundo Langoni, o PIB mundial deve sustentar expansão sincronizada liderada pelo comércio internacional. A China, mesmo com restrições do endividamento excessivo, contribuirá para o avanço rápido dos emergentes e para a estabilização das commodities. Por outro lado, os efeitos da “Trumpeconomics”, a economia da era Trump nos Estados Unidos, pode trazer problemas internos. Langoni vê na reforma tributária dos Estados Unidos, pelo viés expansionista, uma ameaça ao gradualismo do Fed, o banco central americano. Na sua análise, eventual alta mais brusca nos juros poderia levar o dólar a novo patamar global de valorização, com impactos negativos sobre as moedas emergentes, inclusive o real.
O maior desafio do governo Temer é o ajuste fiscal incompleto, e o rumo da reforma da Previdência no 1º trimestre será o grande teste de consistência da política econômica. “Será crucial para definir a tendência de risco-país — hoje na faixa de 200 pontos-base (spreads do CDS) — ampliando ou amortecendo as tensões eleitorais”.
Em contraste, “com expectativas ancoradas” na definição de Langoni, a inflação deve permanecer abaixo da meta (IPCA em torno de 4%). Esse é importante trunfo que deve viabilizar a continuidade, pelo Banco Central, de uma política monetária expansionista com a taxa básica de 7% e juros reais de 3%.
No cenário mais provável de Langoni, o avanço mais rápido do PIB será acompanhado de desempenho setorial mais homogêneo, com avanço da indústria e serviços e menor dependência da agricultura. Haverá também maior equilíbrio sob a ótica da demanda: a saída da recessão foi liderada pelo consumo das famílias. Com a melhora da confiança, marcos regulatórios consistentes e juros reais historicamente baixos, Langoni prevê que o investimento deverá reagir, apontando para a sustentação da retomada.
O ajuste externo bem-sucedido deverá estender-se a 2018: o megassuperávit deste ano (US$ 65 bi) dificilmente será repetido, até porque espera-se maior crescimento das importações, acompanhando o aquecimento do mercado interno. O cenário externo continuará favorecendo as exportações, mas o ritmo será mais lento, de 18% para cerca de 10%. Relativa estabilidade do câmbio deve ser mantida, o ajuste externo com trajetória benigna: alta apenas moderada no déficit em contacorrente, para US$ 30 bi, financiado com facilidade, por capitais de longo prazo. O investimento direto estrangeiro permanecerá estável em US$ 80 bi.
A solidez das contas externas deverá sustentar o atual patamar da taxa de câmbio (R$ 3,30/US$), apesar da maior volatilidade associada à evolução das pesquisas eleitorais. Deve-se levar em consideração, entretanto, o viés de desvalorização, refletindo o “efeito Trump” no cenário internacional e o “efeito Lula” no país.
Um feliz ano novo a todos.
Samuel Pessôa: Olhando para a frente e para trás
Na coluna com o mesmo título publicada em 1º de janeiro de 2017, destaquei que o cenário de 2017 seria contingente à tramitação da proposta da Previdência.
Meu cenário central era que três quartos do texto seria aprovado, o que posteriormente ocorreu na comissão da Câmara em abril, e que, a aprovação definitiva pelo Congresso, seria uma condição para o que então escrevi:
"O crescimento econômico será de 0,3%, a inflação, de 5%, e a Selic no final de ano estará na casa de 10,5%, com câmbio por volta de R$ 3,40 por dólar".
O cenário mostrou-se errado. A tramitação da Previdência engasgou -talvez seja aprovada em fevereiro- e, no entanto, o mercado aceitou confortavelmente esse revés. Diferentemente do que ocorreu no segundo semestre de 2015, o câmbio e o risco-país não explodiram.
Adicionalmente, o PIB será de 1%, e não de 0,3%; a inflação será de pouco menos de 3%, e não de 5%, e a Selic é 7%, e não 10,5%.
A surpresa positiva na atividade veio da agropecuária. Este setor cresceu 12,5% e contribuiu, portanto, com 0,6 ponto percentual (pp) para o crescimento. A expansão da economia excluindo a agropecuária -que representa 5% do total- foi de 0,4%. Por outro lado, a safra excelente gerou forte surpresa desinflacionária: 1,6 ponto percentual da diferença de 2 pontos entre meu prognóstico e a inflação observada deveu-se à desinflação de alimentos. O restante da surpresa desinflacionária veio dos serviços: esperávamos desinflação neste setor de 1,4 pp, e ela foi de 2,4 pp. Meus modelos não captaram a quebra da inércia inflacionária nos serviços.
Também houve surpresa positiva na inflação dos EUA: ficou 0,6 ponto percentual abaixo do projetado.
Entrementes a dívida pública se acumula e nos aproximamos da dominância fiscal (quando a dívida é tão grande que a política monetária perde a capacidade de conter a inflação). Temos um encontro marcado com as contas públicas no primeiro semestre de 2019.
As surpresas positivas na inflação doméstica e internacional nos deram tempo: transpusemos 2017 com relativa calma, mesmo sem a aprovação da reforma da Previdência. Trata-se de um interregno. De fato, o mercado aponta que em 2020 a Selic subirá para a casa de 11% a 12%.
Para 2018, minha projeção é de crescimento de 2,8%, com recuo da agropecuária de 2%. O crescimento da economia excluindo agropecuária sairá de 0,4% em 2017 para 2,9% em 2018. Aceleração liderada pelo consumo das famílias e com recuperação, por volta de 4%, do investimento. A inflação deve ficar em torno de 3,5%, com os preços administrados rodando a 5%, e os livres, a 3,2%. Deve haver queda adicional na inflação de serviços de pouco menos de 1 ponto percentual e a inflação de alimentos ficará relativamente baixa, na casa de 2,5%. A safra de 2018 será muito boa, mas não excepcional como a de 2017.
Há dois riscos para o cenário básico. Primeiro que haja surpresa inflacionária na economia americana ou na chinesa. Os juros internacionais subiriam mais cedo.
O segundo risco é repetirmos 2014: o processo eleitoral não discutir o problema fiscal e não haver, portanto, delegação da sociedade para enfrentá-lo.
A solução do problema fiscal demandará um cardápio que associará em doses variáveis elevação de receita e redução do gasto. Há diversas combinações que atendem ao princípio da estabilidade fiscal. Elas não são neutras do ponto de vista distributivo. Há espaço para a política. Que ela seja empregada com sabedoria.
* Samuel Pessôa é economista