Economia

Benito Salomão: Nuances do ajuste fiscal

O pacote anunciado indica que há esforço para construir no país um ambiente de racionalidade fiscal

Benito Salomão*, artigo publicado originalmente no Correio Braziliense

A temática fiscal predomina no debate econômico do país há mais de uma década. O pacote anunciado no último dia 28 prevê uma economia de R$ 70 bilhões entre os exercícios de 2024 e 25. Se esse impacto for de fato realista, há a possibilidade de se zerar o deficit primário no próximo exercício fiscal, preservando os parâmetros do Arcabouço (NAF).

É importante salientar que o pacote anunciado, caso efetivo, não estabiliza a relação dívida/PIB, de forma que novos pacotes deverão estar no radar da política econômica nos próximos anos. Entretanto, é igualmente importante ressaltar que o seu objetivo não é estabilizar o endividamento público, mas, sim, preservar os parâmetros do NAF. Desde a sua concepção, já se sabia que o NAF não seria capaz, na ausência de reformas adicionais, de estabilizar a relação dívida/PIB.

Na verdade, tem-se aprendido muito em matéria de estabilização de dívidas soberanas, de forma que hoje é consensual na literatura que mudanças na sua inclinação não dependem apenas do que se passa no front fiscal da política econômica. O crescimento do PIB exerce um papel importante na dinâmica do endividamento público, tal como o que se passa no lado monetário (nesse aspecto, a dinâmica da ponta longa da taxa de juros é essencial para que tal estabilização ocorra). Em outras palavras, a dinâmica do endividamento soberano requer esforços para além da política fiscal.

Reconhecer que a política fiscal não é suficiente para estabilizar a relação dívida/PIB não significa dizer que ela não seja necessária. Nesse sentido, temos o fatídico pacote fiscal que, apesar de não estabilizar a relação dívida/PIB, tenta administrar seu crescimento para que ela não assuma uma dinâmica explosiva a partir da preservação dos parâmetros do NAF. Se ele será bem-sucedido em impedir uma aceleração explosiva do endividamento público, não se pode afirmar a priori, particularmente creio que medidas adicionais deverão ser anunciadas num futuro próximo.

No entanto, convém dizer que esse pacote trouxe novidades bastante interessantes do ponto de vista da concepção de um ajuste fiscal ideal. Ajustes fiscais não são um fim, mas um meio, e, ao longo da última década, quando esse debate esteve na ordem do dia, muito se discutiu sobre a estabilização da relação dívida/PIB, porém pouco se avançou no debate de como alcançá-la. Em países grandes e heterogêneos, como o Brasil, há inúmeras formas pelas quais um ajuste fiscal é estabelecido. Eles podem acontecer pelo lado do gasto, dos impostos, ou por uma combinação de ambos.

Meu conhecimento sobre o tema diz que planos de austeridade empreendidos exclusivamente pelo lado das receitas são inefetivos para estabilizar a relação dívida/PIB. Já planos executados exclusivamente pelo lado dos gastos são efetivos, porém à custa de um elevado sacrifício social que pode ter sérias repercussões políticas. De forma que o ideal é realmente empreender uma política que concilie ambos os lados.

Outra discussão que o anúncio desse pacote escancarou foi de economia política. Até então, planos fiscais eram apresentados e aprovados sem uma discussão mais aprofundada sobre em quem eles recairiam. Isso permitiu anos de congelamento real do salário-mínimo (SM) coexistindo com expansões significativas de renúncias fiscais para setores econômicos. Congelar salários e transferir recursos para empresas é a forma não recomendada de empreender um ajuste fiscal.

Na transição de governos, foi prometida a expansão real do SM, o pacote agora anunciado prevê que esses ganhos reais ocorram dentro dos parâmetros da regra fiscal vigente. Isso é bastante razoável. O mesmo está se passando com as polêmicas emendas parlamentares. Há, portanto, um esforço de construir no país um ambiente de racionalidade fiscal.

O ponto mais polêmico desse pacote, no entanto, foi a desoneração do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) para pessoas com renda inferior a R$ 5 mil (o equivalente a 3,5 SMs). É difícil saber ex ante qual o real impacto fiscal dessa medida; o governo fala em R$ 35 bilhões em renúncias de receitas; agentes do mercado falam em R$ 50 bilhões. O provável é que o impacto seja um meio termo disso. Pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), tal subsídio deve ser compensado com outra fonte de financiamento orçamentária, o governo prevê a criação de um imposto para faixas de renda superiores a R$ 50 mil (ou 35 SMs).

Tal anúncio, prometido na campanha eleitoral, gerou reações em preços financeiros. Essas reações foram, a meu juízo, desproporcionais. O debate está focado exclusivamente nos seus aspectos de curto prazo — isto é, seu impacto no orçamento imediato e se a criação do imposto para os "super-ricos" seria suficiente para compensar esse impacto. Há, com isso, uma externalidade de longo prazo sendo negligenciada.

Famílias cuja renda é inferior a 3,5 SMs têm elevada propensão a consumir. Desonerá-las irá elevar sua renda permanente (no sentido de Friedman) e elevar seu consumo de forma perene. Isso tem efeitos expansionistas significativos, similares aos de um programa de transferência de renda. Ao passo que famílias cuja renda é maior que 35 SMs têm uma elevada propensão a poupar e não mudam seus padrões de consumo no curto prazo pela incidência de um imposto. Essa mudança qualitativa no padrão de consumo das famílias de baixa renda é uma ótima notícia do ponto de vista do crescimento econômico, e esses efeitos deverão transbordar para o longo prazo.

*Benito Salomão é professor de macroeconomia no Instituto de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (IERI-UFU) e integrante do Conselho Curador da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Cidadania 23.


Vídeo | O que pode mudar com Proagro após anúncio de Fernando Haddad

Economista Benito Salomão analisa medidas que podem atingir programa

Comunicação FAP

O ministro Fernando Haddad detalhou as medidas do pacote fiscal do governo, e um dos pontos abordados é o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro).

O economista Benito Salomão, integrante do Conselho Curador da Fundação Astrojido Pereira (FAP), vinculada ao Cidadania 23, concedeu entrevista sobre o assunto ao Canal Agromais, do Grupo Bandeirantes.

Benito também é professor de macroeconomia no Instituto de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (IERI-UFU).

Veja vídeo, abaixo:

https://www.youtube.com/watch?v=46ZXfBXSWRE

Livro Como Construímos outra Década Perdida, de Benito Salomão

Livro mostra década do “pior desempenho econômico” da história republicana do Brasil

Em sua nova obra, economista Benito Salomão reúne escritos publicados de 2010 a 2020

Comunicação FAP

A Fundação Astrojildo Pereira (FAP) publicou o livro Como Construímos Outra Década Perdida? Escritos entre 2010 e 2020 (344 p.), de autoria do economista Benito Adelmo Salomão Neto. Na obra, o autor mostra de que forma o país alcançou, no período, “o pior desempenho econômico da sua história republicana”.

> Em breve, o livro será colocado à venda na estante virtual da FAP!

Com 12 capítulos, o livro é resultado da larga experiência do autor, que, ao longo de anos, qualificou ainda mais as suas análises sobre os cenários políticos e econômicos, em dezenas de artigos publicados e que foram revisitados na produção da obra. “Relendo o que escrevi, pude constatar que meus artigos anteciparam muitos eventos que acabaram acontecendo no Brasil ao longo da década”, diz ele, que é conselheiro da FAP.

De acordo com o livro, em 2010, o Brasil apresentava um conjunto de problemas econômicos, como baixa produtividade, pressões fiscais e desequilíbrios macroeconômicos, além de desafios políticos relacionados ao populismo dos governos. A partir daquele mesmo ano, segundo o autor, o Brasil, que viu sua democracia se consolidar nos anos 1990 e 2000, passou a conviver com um ambiente constante de radicalismo e polarização.

Em 2020, na avaliação do economista, a situação do país piorou ainda mais por causa de novos problemas que se somaram aos já existentes, como ameaças à democracia e proliferação da fome, da pobreza e da miséria, questões que se impõem como desafios ainda nos dias de hoje.

A obra aponta que o Brasil tem problemas de curto e longo prazo que precisam ser atacados simultaneamente. “Não é tarefa fácil”, analisa o autor. Segundo ele, um dos problemas econômicos mais urgentes é a estabilização da dívida pública e a sustentabilidade da política fiscal. “Por outro lado, o problema do desemprego se coloca de forma muito violenta”, acrescenta. “Não basta gerar empregos, é preciso estar atento à qualidade desses empregos gerados”, assevera, em outro trecho.

Ao defender que o país deve conciliar políticas educacionais, industriais e de desenvolvimento regional, o economista diz que o objetivo deve ser estabelecer um parque produtivo diversificado e complexo, capaz de competir com o resto do mundo. É uma sugestão que, segundo ele, não tem nada a ver com o modelo de industrialização pautado na substituição de importação dos anos 1930, 1950 e 1970.

A leitura do livro é atual, já que continuam ocorrendo muitos dos problemas registrados no passado. A obra, porém, não apresenta uma interpretação econômica pura sobre a crise da economia brasileira, justamente porque Benito é um economista com ampla vivência no mundo político.

Em tom de alerta, o autor ressalta que, se os anos de 2010 a 2020 foram perdidos em termos econômicos e políticos, a década atual não pode seguir o mesmo caminho. “E isso depende de decisões coletivas acertadas que precisam ser tomadas”, escreveu.

O AUTOR

Benito Salomão é um conhecido economista, pesquisador e intelectual brasileiro da nova geração. Possui doutorado em Economia pelo Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal de Uberlândia, com tese sobre a política fiscal no Brasil, e Mestrado em Economia, com dissertação sobre os efeitos orçamentários da criação de municípios pela mesma Instituição. Em 2020, foi Visiting Scholar Researcher na Vancouver School of Economics of the University of British Columbia no Canadá, onde desenvolveu pesquisa sobre avaliação de políticas públicas aplicadas aos municípios do MATOPIBA.

Atualmente, Benito Salomão é professor do Instituto de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (IERI-UFU), tendo anteriormente atuado como economista chefe de uma casa de análises voltada para avaliação de ativos financeiros e valores mobiliários no Brasil.

O economista assina como autor quinze ensaios científicos em periódicos de renome no Brasil e no exterior, também é autor do livro Perspectivas de Desenvolvimento no Município de Uberlândia: Uma Abordagem Econômica, Social e das Finanças Públicas; além de organizador do livro Retomada do Desenvolvimento: Reflexões Econômicas para um Modelo de Crescimento com Inclusão Social, ambos editados pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP). Participou das principais conferências científicas do Brasil e do mundo nos últimos anos e atua no debate público com mais de 215 artigos de opinião publicados nos principais jornais brasileiros.

Sua pesquisa venceu, em três edições, o Prêmio Brasil de Economia do Conselho Federal de Economia (Cofecon), ficando, em 2022 e 2020, no 1° lugar e, em 2018, em 3° lugar. Em 2021, foi indicado ao Prêmio Economista do Ano pela Revista Economia em Ação. Desde então, é membro associado do International Institute of Public Finance (IIPF), que reúne estudiosos e pesquisadores da área de economia do setor público de mais de 50 países.


Economia 2023 | Imagem: xalien/Shutterstock

Economia informal e saúde fiscal: a contradição em busca da superação(1)

Eduardo Rocha*, economista pela Universidade Mackenzie

“O verdadeiro não se encontra na superfície visível.

Singularmente naquilo que deve ser científico,

a razão não pode dormir e é preciso usar a reflexão.”

Hegel[1]

“(...) toda a ciência seria supérflua se houvesse coincidência

imediata entre a aparência e a essência das coisas”.

Marx[2]

O inferno está vazio, pois todos os demônios estão presentes na “guerra” em curso nos bastidores da República brasileira sobre os fundamentos da futura reforma tributária e do novo marco fiscal ou arcabouço fiscal ou âncora fiscal.

Essas expressões (distantíssimas do pobre que paga altos impostos frente ao rico que paga pouco imposto) dizem respeito à engenharia política que definirá as diretrizes de como recompor as receitas disciplinando as despesas públicas.

Trata-se, num primeiro momento, de mudar o teto fiscal, mas isso não basta. Isso é espuma frente às necessidades do país. A estrutura do rio está mais embaixo: está na reforma tributária, expressão de lutas de grandes interesses.

Neste debate, não faltam malabarismos tecnocrático-herméticos e desfiles linguístico-exibicionistas – alguns absurdos - que defendem o arrocho social e levantam-se contra o arrocho aos privilégios, como via para melhorar as finanças públicas e a vida do povo.

E os privilégios a grupos econômicos são vastos. Vamos a eles.

Num interessante artigo (O dreno financeiro que paralisa o país: a farsa do déficit[3]), Ladislau Dowbor, professor de Economia nas pós-graduações da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), aponta o que ele chama de “drenos financeiros” que desnutrem o Estado.

Dentre os quais se destacam:

  1. dreno dos juros da dívida pública, em 2022 terão sido entre 600 e 700 bilhões drenados;
  2. dreno dos juros praticados no Brasil, que, em 2016, tiravam um trilhão de reais da economia real (16% do PIB);
  3. dreno da evasão fiscal: “em 2020, o Brasil perdeu R$ 562 bilhões devido a práticas ilícitas para evitar o pagamento de impostos”;
  4. dreno das renúncias fiscais, que segundo informe da Câmara dos Deputados, “as renúncias de impostos concedidos pela União a parcelas da sociedade devem chegar a R$ 456 bilhões em 2023, ou 4,29% do Produto Interno Bruto (PIB)”;
  5. dreno dos lucros e dividendos distribuídos que, no Brasil, não pagam impostos. Ou seja, diz Dowbor, “os 290 bilionários que aparecem na Forbes de 2022 são isentos de impostos, com a justificativa de que as empresas que possuem já os pagaram”;
  6. dreno dos impostos de exportação que permite, por exemplo, que  a produção exportada pela Vale do Rio Doce, gere dividendos aos acionistas, mas não receitas para o Estado - trata-se da Lei Kandir, de 1996, que isenta de tributos a produção de bens primários e semielaborados destinados à exportação e
  7. dreno do Imposto Territorial Rural (ITR), onde reina a sonegação irrestrita e declarações fraudulentas, que reduzem ao mínimo do mínimo a arrecadação fiscal.

Há, contudo, nesta pluritemática fiscal, um tema ausente, que é incontornável e desafia a inteligência político-intelectual-fiscal. É o tema da economia informal e os prejuízos fiscal-públicos que ela traz a municípios, Estados e União.

Em 2022, a economia informal brasileira atingiu 17,8% do PIB (Produto Interno Bruto, conjunto de bens e serviços produzidos formalmente pelo país, que chegou a R$ 9,9 trilhões) - algo próximo a R$ 1,7 trilhões de reais.

É o que mostra o Índice da Economia Subterrânea (IES), cálculo feito pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial, o ETCO, em conjunto com o Instituto Brasileiro de Economia (FGV IBRE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

ETCO e IBRE-FGV conceituam a economia subterrânea como “a produção de bens e serviços não reportada ao governo deliberadamente, com o objetivo de sonegar impostos, evadir contribuições para a seguridade social, driblar o cumprimento de leis e regulamentações trabalhistas e evitar custos decorrentes da observância às normas aplicáveis a cada atividade”[4].

Qual o impacto negativo da informalidade na arrecadação dos entes federados em proporção ao PIB? Quanto ela prejudica a economia e a sociabilidade brasileira como um todo? O que fazer diante deste “buraco negro fiscal”?

Em 2018, União, Estados e municípios deixaram de arrecadar R$ 382 bilhões em tributos devido à economia subterrânea, o equivalente a 5,6% do PIB. Os dados constam de levantamento feito pela economista Vilma da Conceição Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV)[5].

Não há inocentes neste debate sobre a reforma tributária e o marco/arcabouço/âncora fiscal; seja ele um debate acadêmico, parlamentar, partidário ou, principalmente, quando travado no chamado mercado - pois o dinheiro, sob certas circunstâncias, transforma o não em sim e o sim em não.

O debate não é técnico (ainda que contenha inevitavelmente esses elementos, claro!), ele é um debate político, que determinará quem se apropria da renda nacional e quem concentra e exerce de fato o poder político – expressão concentrada da economia.

A saúde fiscal do Estado brasileiro, em suas três dimensões (União, Estados e municípios), tem, assim, vários inimigos por todos os lados e de diversas cepas que lhe atacam e lhe desnutrem financeiramente e, simultaneamente, aumentam a concentração da riqueza e o bem estar social nas mãos de poucos – mantendo a triste e injusta distribuição de renda no Brasil e a infelicidade de milhões de cidadãos e cidadãs.

É necessário o debate que busque soluções para possibilitar a que os entes da Federação (União, Estados e municípios) tenham condições financeiras sustentáveis para promover as políticas públicas previstas constitucionalmente.

Proponho que a questão de como anular e superar os prejuízos fiscais originados pela informalidade econômica seja considerado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, e pelo Congresso Nacional. Que criem uma comissão com especialistas e com todos que trabalham na informalidade para debater isso.

A economia informal deve entrar de fato no debate nacional-fiscal, pois há, sim, mecanismos para trazê-la, pelo menos em parte, ao mundo fiscal formal. E será isso que abordaremos nos próximos textos.


[1] Hegel, Georg Wilhelm Friedrich. Lecciones sobre la filosofia de la historia universal. 6º ed. Madrid, España. Alianza Universidad: 1997. p. 45

[2] Marx, Karl. O Capital: crítica da economia política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. Tomo 3. p. 1080.

[3]    Dowbor, Ladislau. O dreno financeiro que paralisa o país: a farsa do déficit.  2023. Disponível em:    https://sul21.com.br/opiniao/2023/02/o-dreno-financeiro-que-paralisa-o-pais-a-farsa-do-deficit-por-ladislau-dowbor/ . Acesso em: 14 de abril de 2023.

[4] Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial – ETCO . Economia Subterranea. https://www.etco.org.br/economia-subterranea/ . Acesso em 14 de abril de 2023.

[5] Este cálculo, diga-se, teve por base o crescimento Produto Interno Bruto (PIB) de 1,3% em 2018. No entanto, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revisou o cálculo anterior e anunciou que PIB brasileiro de 2018 passou de 1,3% para 1,8%. Portanto, num cálculo grosso, e obedecendo ao percentual de 5,6% do PIB da economista Vilma da Conceição Pinto, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV, e o matematizarmos aos 1,8%, dá, conservadoramente, uma perda fiscal de R$ 392,2 bilhões. Valor este que prejudica o Brasil nas esferas da educação, saúde, infraestrutura e ciência e tecnologia.

Sobre o autor

Eduardo Rocha é pós-Graduado com Especialização em Economia do Trabalho e Sindicalismo pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Foi Economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).

** Artigo produzido para a Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor. Por isso, não reflete, necessariamente, as opiniões da revista nem da FAP.


Governo Lula: FAP realiza webinar sobre rumos da economia

Comunicação FAP

A Fundação Astrojildo Pereira (FAP) realizará, nesta quarta-feira (26/4), a partir das 19 horas, webinar sobre os rumos do governo Lula na economia. O evento online será transmitido em tempo real, no site e nas redes sociais (Youtube e Facebook) da entidade, para todas as pessoas interessadas.

https://www.youtube.com/watch?v=AWXZ2ACU8ko

Clique aqui e veja série de eventos da FAP

Nova obra destaca propostas para desenvolvimento com inclusão social

Participam do debate o economista Benito Salomão, conselheiro da FAP e doutor em economia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), e a ex-presidente do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) Vanessa Petrelli, que também foi secretária municipal de Agricultura e Abastecimento de Uberlândia. Os dois são professores de economia e relações internacionais na UFU.

Otaviano Canuto, professor na Elliott School of International Affairs da George Washington University, também está confirmado para o debate. Ele ainda é professor afiliado na Universidade Politécnica Mohamed VI e do Center for Macroeconomics and Development em Washington.

A mediação é de Cezar Rogelio Vasquez, engenheiro de Produção pela UFRJ, mestre em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ e membro do Conselho Curador da FAP.

Estadão | Pesquisadores lançam propostas para retomada do desenvolvimento com inclusão social

Correio Braziliense | Livro debate desenvolvimento em várias frentes técnicas e ideológicas


Economia: moeda Real, dinheiro e calculadora | Foto: Marcello Casal Jr/ Agência Brasil

Revista online | Muito além da Selic

Henrique Mendes Dau*, economista, especial para a revista Política Democrática online (52ª edição)

A recente animosidade entre o presidente Lula e Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, despertou um velho e mal resolvido debate na sociedade brasileira: o papel da taxa de juros. As principais instituições de excelência e os mais renomados economistas entendem que a política monetária tem efeito neutro sobre a economia no longo prazo. Ainda assim, há um ruidoso debate sobre o assunto. O objetivo deste artigo não é fazer uma defesa de qualquer uma das duas posições defendidas, nem mesmo opinar sobre as decisões de política monetária que observamos no Brasil de hoje. O intuito é chamar atenção para o fato de que esta discussão sobre política monetária é desnecessariamente barulhenta e estamos negligenciando discussões muito mais urgentes.

Essencialmente, a riqueza de um país é a soma da produtividade de cada indivíduo. A produtividade é uma função de muitas variáveis, como regras tributárias, qualificação da mão de obra e investimentos. A discussão sobre a taxa de juros é ambígua, pois juros menores estimulam investimentos, mas tendem a desvalorizar o câmbio e prejudicar a importação de bens intermediários, fundamentais para o desenvolvimento das atividades econômicas domésticas. Nos países desenvolvidos, observamos juros baixíssimos. Seria esse um argumento contra a elevação da Selic? Não, pois o fato de que os países ricos tendem a ter juros baixos não implica que sejam ricos por esse motivo. O Brasil tem inflação alta, e a elevação da Selic é o principal instrumento de contenção das pressões inflacionárias, que, dentre outros males, agrava a desigualdade e gera estagnação econômica. Entretanto, a apreciação cambial subsequente pode reduzir a competitividade das exportações nacionais.

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Fica evidente que todos os caminhos possíveis apresentam pesos e contrapesos, explicitando a complexidade do assunto. É claro que os bancos centrais utilizam sofisticados modelos econômicos para estimar os efeitos da política monetária e tomar decisões ótimas. Ainda assim, não é um exercício trivial e está sujeito a muitas imprecisões, além de envolver preferências subjetivas que podem gerar conflitos políticos. Diante das ambiguidades inerentes à política monetária, devemos nos concentrar em soluções estruturais para elevar a produtividade e combater a inflação. Como dito antes, a produtividade depende de fatores que vão além da taxa de juros. Precisamos lembrar que a economia é formada por indivíduos, os quais dedicam tempo para trabalhar. Se pagar impostos for uma tarefa árdua, tempo e energia que poderiam ser ocupados com atividades produtivas são desperdiçados com tarefas que não geram riqueza. Da mesma maneira, se a educação vai mal, os indivíduos produzem menos e assim por diante. Além disso, se a elevação da taxa de juros é um instrumento de combate à inflação, devemos buscar entender os motivos para que o país padeça desse mal e como resolvê-lo.

Os problemas econômicos do Brasil são de natureza estrutural e exigem reformas profundas em diversas áreas. Segundo dados do Banco Mundial, o Brasil é um dos países com maior complexidade tributária do mundo, o que além de desperdiçar tempo e recursos, leva à distorção dos preços relativos. Tornou-se corriqueiro para o Estado conceder benefícios tributários a grupos de interesse sob o pretexto de contribuir para o desenvolvimento de um determinado setor. Nesse processo, cria-se a sensação de que a atividade desonerada é mais atraente do que de fato é, induzindo os agentes a empreenderem de forma ineficiente e tornando o país mais pobre no longo prazo. 

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A complexidade tributária também é responsável pelo oceano de contencioso tributário e infindáveis disputas judiciais entre empresas e governo sobre a interpretação dos valores devidos, algo que afeta substancialmente a segurança jurídica brasileira. Com relação à educação, o Brasil não vai nada bem. Segundo dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), o país ocupa a 63ª posição em leitura, a 66ª em matemática e a 59ª em ciências, em um ranking com 77 países. Como consequência desse cenário, enquanto um trabalhador americano produz 74 dólares por hora trabalhada e um francês, 66 dólares, em 2020, a produtividade brasileira foi de 28 dólares. A irresponsabilidade fiscal agrava esse cenário. Gastos excessivos e medidas inconsequentes, como a PEC dos Precatórios, contribuem tanto para a elevação artificial da demanda, como para a desvalorização cambial, ambos causadores de inflação. Até mesmo políticas sociais mal calibradas podem prejudicar justamente os mais pobres, como é o caso do Auxílio Emergencial, cujo elevado valor levou a aumentos de preços nos locais onde havia maior concentração de beneficiários. 

A explicação para que os países desenvolvidos gozem de baixas taxas de juros está relacionada à instituições fortes, que não cedem a pressões de grupos de interesse, e à qualificação da mão de obra. Isso proporciona um ambiente fértil para a alocação eficiente de recursos em atividades econômicas altamente produtivas, exercidas por indivíduos qualificados. Além disso, o controle fiscal garante que não haja inflação, evitando a necessidade de taxas de juros que atrapalhem o surgimento de novos investimentos no país. O Brasil precisa de reformas em questões como a tributária, a fiscal e a educacional. Essas são as discussões que deveriam tomar as capas dos jornais e o debate público, em vez do excessivo debate sobre política monetária, que embora seja importante, certamente não é a solução para os nossos desafios.

Saiba mais sobre o autor

*Henrique Mendes Dau é economista pelo Insper, diretor executivo da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) e do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de fevereiro de 2023 (52ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não reflete, necessariamente, as opiniões da revista.

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Banco Central e taxas de juros no governo Lula serão debatidos em live da FAP

Alvos de recentes polêmicas, a autonomia do Banco Central do Brasil e o seu papel de fixação das taxas de juros serão debatidos em live da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), na segunda-feira (27/2), das 18h às 19h. Economistas discutirão o assunto durante o evento online, que será aberto ao público e terá transmissão em tempo real no site e redes sociais da entidade.

https://www.youtube.com/watch?v=LJQ1xf7Lbds

Participarão da live os economistas Benito Salomão, doutor em economia e pesquisador; Larissa Chermont, doutora em Ciências do Desenvolvimento Socioambiental e professora de economia na Universidade Federal do Pará (UFPa); e José Luis Oreiro, professor da Universidade de Brasília (UnB) e doutor em Economia da Indústria e da Tecnologia.

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Também têm participação confirmada na live o doutor em economia Mário Ribeiro, professor da UFPa e ex-presidente do Banpará (Banco do Estado do Pará); e a ex-presidente do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas) Aspásia Camargo. Ela também é doutora em sociologia e ex-secretária-executiva do Meio Ambiente no governo FHC (Fernando Henrique Cardoso).

A live será mediada pelo presidente estadual do Cidadania no Pará, o ex-deputado federal Arnaldo Jordy. O público poderá acompanhar o debate online pelo site da fundação, pela página da FAP no Facebook e pelo canal da entidade no Youtube.

Polêmica

O assunto ganhou ainda mais relevância nas últimas semanas depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticar a decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) de manter a taxa de juros a 13,75% pela quinta vez seguida. Segundo ele, a decisão influencia no crescimento do país.

A guerra entre favoráveis e contrários ao presidente se acirrou também depois de ele afirmar que iria cobrar o Banco Central . Lula ainda chamou a independência da instituição de "bobagem".

Além da fixação da taxa de juros, o Banco Central é responsável pela emissão de moedas e atuação no câmbio e em modalidades como controle de garantias – depósitos compulsórios e mais).

A independência do Banco Central, discutida por mais de 30 anos, ocorreu para evitar interferência política nas decisões econômicas, além de intercalar os mandatos do presidente da instituição com o do presidente do país.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, por exemplo, fica no posto até o fim do ano que vem, no meio do governo Lula. Ele tomou posse no cargo em fevereiro de 2019, logo após reunião privada com o então presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), dentro do Palácio do Alvorada.


Nas entrelinhas: Lula tem razão: os juros estão exagerados

Luiz Carlos Azedo/Correio Braziliense

”É melhor ser feliz do que ter razão.” A frase do poeta Ferreira Gullar se aplica a muitas coisas. Ao motociclista no trânsito, por exemplo. E se aplica também ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, principalmente nessa polêmica sobre os juros e a concentração de renda no Brasil. Realmente, as taxas de juros do Banco Central (BC), com a Selic a 13,75%, são escorchantes (ultrapassam muito a medida justa; abusivas, exorbitantes), ainda mais com uma previsão de que a inflação ficará, neste ano, em 5,5% (Focus). São 8,25% de diferença. Nenhum país do mundo pratica uma taxa de juros real dessa magnitude.

O enriquecimento no Brasil não pode ser atribuída apenas ao talento empresarial e à capacidade de trabalho. Porém, é injusta a generalização da tese de que os empresários não trabalham — a maioria trabalha muito. Entretanto, o rentismo e o patrimonialismo são formas seculares de acumulação de capital no Brasil, a gênese da formação do grande parte do empresariado brasileiro e, digamos também, da elite política do país. A inflação e as altas taxas de juros tornam os ricos mais ricos e os pobres mais pobres no Brasil.

Esse processo explica por que a elite econômica, os ricos, em sua maioria, apoiaram a reeleição de Jair Bolsonaro, mesmo sabendo dos riscos para a nossa democracia. O mesmo fenômeno ocorreu após o golpe militar de 1964, que obteve maciço apoio até da classe média, durante o chamado “milagre econômico”, que fez o bolo crescer sem dividi-lo — ao contrário do que fora prometido pelo então ministro da Fazenda, Delfim Netto. A eleição de Lula mostrou um país dividido não apenas ideologicamente, mas também socialmente.

Entretanto, Lula precisa entender que já não vivemos numa sociedade industrial como aquela que se formou em meados do século passado, e que o transformou na maior liderança operária do país. Ele transitou do mundo sindical para a alta política, chegou à Presidência pela terceira vez numa “modernidade líquida”, como diria o sociólogo polonês Zygmunt Baumann. A velha estrutura de classes sociais bem definidas, que deu origem à democracia representativa, não existe mais.

A política se organiza por meio dos partidos no plano institucional. Porém, na sociedade o espaço público vem sendo ocupado cada vez mais pelas redes sociais, às vezes clandestinas. Os sindicatos e outras agências da sociedade civil perderam protagonismo nesse mundo novo, marcado por novas relações sociais, econômicas e de produção frágeis, fugazes e maleáveis. Ideias e relações pessoais passam por transformações rápidas e imprevisíveis. Instabilidade financeira, novas tecnologias e mudanças na estrutura produtiva diluíram o mundo que se conhecia até o final do século passado. As ideias de coletividade deram lugar ao individualismo.

Concentração de renda

Voltando a juros altos, inflação e retomada do crescimento. A herança do nosso passado se faz presente. Até 1930, nosso desenvolvimento econômico seguiu o modelo clássico, voltado para o setor exportador. A partir daí, as atividades voltadas para o mercado interno passaram a predominar, em decorrência da crise de 1929 e da II Guerra Mundial, e da manutenção e ampliação da renda interna. Nosso desenvolvimento econômico, particularmente a industrialização, caminhou sobre essas duas pernas.

A inflação brasileira, até então, refletia a política monetária e creditícia, mas passou a ser consequência também dos desajustes estruturais da economia. Depois de 1954, quando o governo federal passou a fazer também grandes investimentos públicos, a inflação foi uma das formas de financiamento da industrialização e se tornou um instrumento de concentração de renda, em favor de empresários, industriais, comerciantes e empreiteiros. Assalariados, trabalhadores rurais e classe média pagaram a conta. Greves operárias, manifestações estudantis e ocupações de terras foram a resposta ao modelo. O desequilíbrio do balanço de pagamentos e o sistema cambial também favoreceram a concentração de renda.

Quando Lula fala que existe uma cultura de juros altos, precisa levar em conta que existe, também, uma memória da inflação inercial, que foi superada pelo Plano Real, mas passa por uma recidiva desde o governo Dilma Rousseff. Por isso, a ideia de se tolerar um pouco mais de inflação para o país se reindustrializar e voltar a crescer é muito perigosa.

Hoje, a inflação está fora de controle. É resultado de uma política de juros baixos (2%) e câmbio alto adotada por Roberto Campos Neto no BC, no começo do governo Bolsonaro, sob orientação de Paulo Guedes, não apenas por causa da pandemia e da guerra na Ucrânia. A alta do dólar favoreceu o setor exportador; a taxa de juros, o rentismo.

A vitória eleitoral de Lula foi uma reação popular a esse modelo, como fora a volta de Getúlio Vargas ao poder, em 1950. O presidente tem razão quando ataca os juros extorsivos praticados pelo BC, mas isso não resolve o problema. Pelo contrário: a forma como está fazendo isso tem uma lógica eleitoral evidente, porém, facilita a vida da oposição bolsonarista e aperta o nó do conflito distributivo, quando deveria afrouxá-lo.

Nove entre 10 grandes banqueiros discordam da atual política monetária. As fintechs é que estão ditando as regras do jogo. Além disso, arma-se uma casa de caboclo para Lula no Congresso, a pretexto de defender o BC. Não basta ter razão para ser feliz.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-lula-tem-razao-os-juros-estao-exagerados/

Plano real economia Brasil | Imagem: rafapress/Shutterstock

Revista online | O debate ausente: o desequilíbrio externo persistente da economia brasileira

José Luis Oreiro*, professor de Economia da UnB, especial para a revista Política Democrática online (50ª edição | Dezembro de 2022)

O período que sucedeu a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno das eleições presidenciais foi marcado pelas controvérsias sobre o “estouro do teto de gastos” previsto pela “PEC da Transição”. Na versão aprovada pelo Senado Federal no dia 07 de dezembro de 2022, ficou estabelecido que o governo federal poderá gastar até R$ 145 bilhões “fora do Teto” para executar políticas como a manutenção do Bolsa Família em R$ 600 com acréscimo de R$ 150 por filho, recompor o orçamento do programa farmácia popular, entre outras políticas sociais e assistenciais. Muitos economistas, a maioria deles ligada direta ou indiretamente ao mercado financeiro, se opuseram publicamente a essa medida alegando que a “farra fiscal” (sic) iria produzir uma fuga de capitais do país, a interrupção do financiamento da dívida pública por parte do mercado, uma maxidesvalorização cambial e o recrudescimento da inflação ao longo do ano de 2023, o que levaria a uma queda do salário real e a um agravamento da situação de fome e pobreza no país. 

Confira a versão anterior da revista Política Democrática online

Não é a primeira vez que esse tipo de cenário apocalíptico é desenhado. Em 2020, durante a pandemia da covid-19, não foram poucos os que disseram que o Brasil caminhava para um “abismo fiscal” devido aos gastos excessivos com o auxílio emergencial, os quais levariam a relação dívida pública/PIB para perto de 100% em 2022 e que, devido a algum mecanismo mágico, a economia brasileira entraria numa espécie de “buraco negro” com consequências catastróficas para a economia do país. Como sabemos, nada disso ocorreu. Graças, em larga medida, ao auxílio emergencial, a economia brasileira teve uma contração modesta em 2020 (de apenas 3,3%) na comparação com os Estados Unidos e os países da União Europeia. Além disso, a relação dívida pública/PIB no Brasil deve fechar em torno de 78% em 2022, muito abaixo do cenário desenhado pelos profetas do apocalipse.

Está claro que a situação fiscal no Brasil está longe de ser confortável, mas a dívida pública brasileira (% do PIB) é similar a de países como Índia e China. Se o próximo governo for capaz de desenhar uma nova regra fiscal para pôr no lugar do teto de gastos, que seja capaz de conciliar o espaço fiscal necessário para o aumento do investimento público em infraestrutura e dos gastos assistenciais com a redução da dívida pública como proporção do PIB no médio prazo, para um patamar em torno de 65% do PIB, não há razão para acreditar que o crescimento econômico possa ser restrito pelo lado fiscal. 

Uma ausência gritante, para não dizer escandalosa, no debate econômico brasileiro é o desequilíbrio externo. Conforme verificamos na figura 1 abaixo, a partir de maio de 2008, no acumulado em 12 meses, o Brasil começou a apresentar déficit crescente na conta de transações correntes do balanço de pagamentos, o qual atingiu a marca de 4,25% do PIB em outubro de 2015. Esse desequilíbrio externo resultou numa desvalorização da taxa real efetiva de câmbio de 17,12% entre janeiro e dezembro de 2015, contribuindo de forma decisiva para a aceleração da inflação neste ano e para a elevação da taxa básica de juros por parte do Banco Central, amplificando a recessão que havia começado no segundo semestre de 2014. 

Fonte: Ipeadata. Elaboração do autor 

Graças à forte desvalorização cambial e à queda de mais de 8% do PIB entre o segundo semestre de 2014 e o último trimestre de 2016, o déficit em conta corrente se reduziu para 0,894% do PIB em março de 2018. Embora déficits em conta corrente inferiores a 1% do PIB não sejam preocupantes do ponto de vista do financiamento externo, chama atenção que, após a maior recessão dos últimos 40 anos e de uma forte desvalorização da taxa de câmbio, a economia brasileira se mostrou incapaz de voltar a gerar superávits em conta corrente, como no período de junho de 2003 a dezembro de 2007. Mais grave ainda é o fato de que, uma vez passados os efeitos da grande recessão brasileira (2014-2016), o déficit em conta corrente como proporção do PIB no acumulado em 12 meses volta a se elevar atingindo 3,52% do PIB em junho de 2020, já no período da pandemia do covid-19. 

De fevereiro de 2020 a maio de 2021, a taxa real efetiva de câmbio se desvaloriza em 30,75%, e a economia se encontra em recessão. Apesar da enorme mudança de preços relativos e da queda do nível de atividade econômica, o déficit em conta corrente no acumulado em 12 meses se reduz para apenas 1,90% em agosto de 2021, apresentando desde então nova tendência a elevação. 

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Os dados apresentados parecem apontar para o retorno da rigidez estrutural do balanço de pagamentos, situação na qual a desvalorização cambial se mostra incapaz de resolver o desequilíbrio externo devido ao perfil da pauta de exportações. A desindustrialização precoce da economia brasileira resultou numa reprimarização da pauta de exportações, reduzindo assim a sensibilidade das exportações ao câmbio. Nesse contexto, o crescimento do PIB a um ritmo mais robusto será inevitavelmente estrangulado pelo aumento explosivo do déficit em conta corrente, que termina sempre desencadeando uma crise cambial, com maxidesvalorização do câmbio, elevação da inflação e da taxa de juros, abortando assim a retomada do crescimento. 

Sobre o autor

*José Luis Oreiro é professor do Departamento de Economia da UnB. E-mail: joreiro@unb.br.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de dezembro/2022 (50ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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Gráfico da ibovespa | Foto: QuoteInspector

Revista online | Desafios fiscais, reforma do Estado e redução das desigualdades sociais

Eduardo Rocha*, especial para a revista Política Democrática online (49ª edição: novembro/2022)

A saúde das finanças públicas – ao lado de outras medidas saneadoras e regulatórias - é um grande objetivo a ser conquistado para viabilizar a retomada estratégica do investimento público e privado, crescimento, emprego, renda, melhoria dos serviços e desenvolvimento no Brasil, com um claro compromisso de redução das terríveis desigualdades que ainda persistem. Assim, a responsabilidade fiscal não pode gerar a irresponsabilidade social; a saúde fiscal não pode ter como contrapartida a ruína social.

O novo governo recém-eleito com Luís Inácio Lula da Silva, assumindo pela terceira vez a Presidência da República, não logrará sair de imediato do atoleiro fiscal, da desnutrição dos investimentos e da desestruturação sistêmica das políticas públicas, bem como não conseguirá redução do seu custeio – medidas maléficas produzidas pelo desgoverno Bolsonaro.

Nova obra destaca propostas para desenvolvimento com inclusão social

Este novo governo – cuja natureza e alianças políticas são mais amplas do que o PT e seus aliados históricos – precisa realizar um pacto democrático centrado, entre outras tantas agendas econômico-sociais e político-institucionais, na criação de alternativas financeiro-fiscais extensivas e intensivas inéditas que permitam, de um lado, cortar despesas supérfluas e mantenedoras de privilégios e, de outro, promover a elevação das receitas públicas sem tirar mais um centavo de imposto do já espoliado, cansado e insatisfeito contribuinte. Os grandes contribuintes, porém, têm de entrar na órbita contributivo-fiscal, pois a manutenção de seus privilégios histórico-estruturais inviabiliza o futuro social e mina as bases sociais da democracia.

Veja, a seguir, galeria:

Foto: Lela Beltrão / El País
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Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
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Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Foto: Bruno Cecim/Agência Pará/Fotos Públicas
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Condomínio invadido do Minha Casa, Minha Vida, no Rio
Foto Tânia Rêgo Agência Brasiil
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
EsgotoCeuAbertoValterCampanatoAgenciaBrasil
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Comércio e atividades consideradas não essenciais fecham as portas durante lockdown no Distrito Federal.
Comércio da cidade do Rio de Janeiro funciona com restrições após decreto estadual que flexibiliza medidas de isolamento
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Além de criar as condições – ainda que paliativas – para cumprir as promessas eleitorais da eleição de 2022, é inequívoca a necessidade histórica para a construção democrática de uma ampla, profunda e estrutural reforma fiscal que vise promover uma otimização fiscal repartida, isto é, otimização seja do lado da receita seja do lado da despesa.

Tal reforma necessita criar uma imprescindível correlação de forças sociopolítica para construir progressivamente uma estrutura tributária e fiscal mais justa; redefinir em sentido democrático e progressista a natureza tributária tanto em termos de arrecadação quanto em termos de distribuição do bolo;  atualizar a tabela do imposto de renda; reduzir a multiplicidade e a complexidade das regras; redesenhar a política de incentivos fiscais para estimular determinados setores geradores de emprego e aumentar a produtividade do trabalho e a competitividade da produção; incorporar o mercado informal ao mundo fiscal formal e, por fim, construir um orçamento que possibilite o financiamento das políticas públicas direcionadas à redução progressiva da terrível desigualdade social e intelectual-cultural existente entre milhões de cidadãs e cidadãos brasileiros. As desigualdades gravíssimas persistem mesmo depois de 34 anos da promulgação da Constituição Cidadã de 1988.

São desafios fiscais gigantescos a serem enfrentados e nada garante que serão facilmente superados. Fazem parte ainda desses desafios o fim de privilégios fiscais e o combate eficiente e eficaz da sonegação. De acordo com o site www.quantocustaobrasil.com.br, de 01/01/2022 a 05/12/2022, o Sonegômetro registrava que o Brasil havia perdido em torno de R$ 582 bilhões, de acordo com estudo realizado pela Receita Federal, que revela quanto deixou de ser pago nos tributos PIS/Cofins, concessão de subsídios/benefícios fiscais ao setor privado. Essa receita é impraticável nos curtos e médios prazos. É, com certeza, um cálculo conservador, mas o número impressiona. 

Essa reforma fiscal, que abarque as esferas da União, estados e municípios, deve ser construída pela interação democrática entre governo, parlamento e sociedade civil. Ela é parte integrante da própria e necessária reforma democrática do Estado brasileiro para que o país sepulte, de forma definitiva, duas tradições perversas da nossa história fiscal: de um lado, a penalização e sofrimento para a cidadania, dos mais humildes, dos pobres, dos miseráveis, e, de outro, a isenção fiscal e manutenção de privilégios para as oligarquias, nas mais diversas modalidades.

Fala-se muito em “Estado máximo” e “Estado mínimo”. Seriam dois concretos antitéticos. Na vida real, concreta, material, objetiva, contudo, o Estado brasileiro realmente existente é, ao mesmo tempo, os dois termos suprassumidos na dança dialética do concreto, numa síntese trágica expressa na existência real de um Estado que é máximo para uma minoria privilegiada e, ao mesmo tempo, é um Estado mínimo para a maioria da população brasileira.

No lugar desse Estado que aí está – que faz a alegria das oligarquias, da especulação financeira e das castas privilegiadas; desse Estado que é gigante para o que faz e pigmeu para fazer o que deve ser feito; desse Estado que é – é preciso constituir um Estado democrático, desprivatizado, publicizado, transparente, realmente federativo e republicano, de maneira a oferecer, dentro das regras da democracia consagrada na Constituição de 1988, oportunidades para uma vida melhor, social e cultural ao seu povo e uma integração econômica em novas bases com a economia mundial.

Para tanto, é preciso, em primeiro lugar, declarar sem meias palavras: precisamos de mais Estado para a cidadania e o desenvolvimento e menos Estado para as oligarquias e os privilégios.

É preciso inverter essa tradição das trevas fiscais de modo que, do lado da despesa, cortem-se os gastos supérfluos e dos privilégios de uma minoria e acabe-se com a agiotagem financeira contra as finanças públicas, vitalizando assim as políticas sociais e de investimentos que dinamizem o setor produtivo. Do lado da receita, deve-se eliminar a regressividade da estrutura tributária, fazendo com o que os que mais têm e ganham paguem mais, por meio da progressividade sobre a renda e propriedade.

Sobre o autor

*Eduardo Rocha é economista pela Universidade Mackenzie com pós-graduação em Economia do Trabalho pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

** Artigo produzido para publicação na revista Política Democrática online de novembro/2022 (49ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da publicação.

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Documento traz 16 propostas a serem adotadas no próximo período, como o fomento à agroecologia - Articulação Nacional de Agroecologia

Reforma agrária, agroecologia e desmatamento zero: MST lança carta ao povo brasileiro

Brasil de Fato*

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) publicou uma carta aos brasileiros, nesta terça-feira (29), na qual defende propostas relacionadas à reforma agrária e ao desmatamento zero que serão levadas para o governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"Contribuiremos de todas as formas possíveis para que elas sejam aplicadas", afirma o MST na carta.

Entre as propostas, estão o fortalecimento da agricultura familiar e a distribuição de terras, principalmente aquelas que estão situadas próximas às cidades.

"Não precisamos derrubar mais nenhuma árvore. Precisamos, sim, é de um Plano Nacional de Reflorestamento urgente, plantando milhões de arvores, em todo país, em todos os biomas, no campo e na cidades", diz um trecho da carta.

O movimento também defende a implementação de políticas públicas que visem a soberania alimentar, a partir da produção de alimentos saudáveis em todo o país. Por isso, também propõe o estímulo à agroecologia com ferramentas modernas, "sem agredir a natureza, gerando mais empregos e melhorando a produtividade física das lavouras".

Leia a carta na íntegra:

"Carta do MST ao povo brasileiro 

O Brasil vive a pior crise de sua história, que se manifesta na economia, na sociedade, no aumento da desigualdade social, nos crimes ambientais, na fome, no desespero e falta de perspectiva que atinge mais de 70 milhões de trabalhadores. Tudo isso se aprofundou nos últimos seis anos, após o golpe contra o Governo Dilma e os quatro anos de um governo neoliberal com praticas fascistas e autoritárias.

A vitória política de Lula nas últimas eleições revelou a vontade da maioria dos brasileiros de mudarmos os rumos, retomarmos os caminhos democráticos, para resolver os problemas urgentes da população brasileira. Essa vitória foi fruto de uma ampla aliança social de todas as forças progressistas e, certamente, marcará também um governo de Frente Ampla, com os mais diversos setores representados.

O Governo Lula terá o desafio fundamental de enfrentar em caráter emergente as necessidades fundamentais do povo, como o combate à fome, ao desemprego, e investimentos pesados em educação e saúde. E no médio prazo debater com toda sociedade um novo projeto de país, fundado na reindustrialização e na agricultura produtora de alimentos saudáveis, única forma de retomarmos o crescimento econômico com justiça social.

Na agricultura, se enfrentam há décadas três modelos de organização da produção. O latifúndio predador, que enriquece com a especulação imobiliária e da apropriação das riquezas naturais; O agronegócio, que produz apenas commodities agrícolas para exportação, concentrados em apenas cinco produtos (soja, milho, cana, algodão e pecuária bovina). Os fazendeiros enriquecem, mas não pagam impostos à sociedade graças às isenções das exportações e agridem a natureza com o desmatamento, o uso de agrotóxicos e o monocultivo. E o terceiro modelo é da agricultura familiar, que usando mão-de-obra familiar protege a natureza e se dedica a produzir alimentos para suas famílias e para o mercado interno.

Nossa Constituição Federal exige que a Terra cumpra sua função social, produzindo racionalmente, respeitando a legislação trabalhista e o meio ambiente. Assim como nossa Constituição, defendemos sempre que o latifúndio é antissocial e deve ser banido e o agronegócio precisa assumir sua responsabilidade socioambiental, adequar-se as necessidades da sociedade, pagar impostos, parar de usar agrotóxicos e dar condições de dignidade os seus trabalhadores.

Defendemos a agricultura familiar e dentro dela a distribuição de terras dos latifúndios, sobretudo nas proximidades das cidades, para que se multipliquem as famílias camponesas produtoras de alimentos.

Defendemos o desmatamento zero. Não precisamos derrubar mais nenhuma arvore. Precisamos, sim, é de um Plano Nacional de Reflorestamento urgente, plantando milhões de árvores, em todo país, em todos os biomas, no campo e na cidades. Condição necessária para combater as mudanças climáticas que afligem a população em todo território e a todo planeta.

Defendemos que o novo governo deve implementar urgentemente diversas medidas de políticas públicas – como os Programas de Aquisição de Alimentos e de Alimentação Escolar - buscando a soberania alimentar e para que se amplie imediatamente a produção de alimentos saudáveis em todo pais. E que se usem os mecanismos de aumento de renda, via Bolsa Família, e aumento do salário mínimo e do emprego para que o povo tenha condições de se alimentar dignamente.

Defendemos o estímulo da agroecologia como um modelo tecnológico que busca produzir alimentos saudáveis, sem agredir a natureza, gerando mais empregos e melhorando a produtividade física das lavouras. Garantindo assim saúde para nosso povo.

Defendemos um programa urgente de implementação de máquinas agrícolas para agricultura familiar, para que possamos aumentar a produtividade do trabalho, diminuindo o sacrifício humano.

Defendemos a implantação de um amplo programa de agroindústrias cooperativadas em todos os municípios, para beneficiar alimentos e gerar emprego e renda para mulheres e jovens no campo. Devemos combater todas as forças de exploração no campo, como o trabalho escravo, e as péssimas condições dos assalariados sem direitos trabalhistas. Devemos combater o garimpo e ação perversa das mineradoras que depredam nosso meio ambiente e riqueza natural apenas em função do lucro privado. Os bens da natureza devem estar subordinados às necessidades de todo povo.

Defendemos um amplo programa de educação e cultura no meio rural que dê oportunidade a todas as pessoas, em especial aos jovens, que erradique o analfabetismo, ofertando todas as formas de escolarização no interior do país, que preserve e fomente as manifestações e expressões culturais do povo.

Combateremos e denunciaremos todas as formas de violência, discriminação, racismo, misoginia, LGBTfobias e intolerância religiosa que foram alimentados pelo bolsonarismo fascista.

Levaremos essas propostas e ideias para o próximo governo Lula e contribuiremos de todas as formas possíveis para que elas sejam aplicadas.

Nossa missão maior, é seguir organizando o povo, para que lute por seus direitos, consagrados na Constituinte de 1988, pois sabemos que sem mobilização popular não haverá nenhuma mudança verdadeira no país.

Esses são nossos compromissos, que queríamos reafirmá-los para toda sociedade brasileira, em tempos de crise e de mudanças necessárias."

*Texto publicado originalmente no site Brasil de Fato


Foto: José Cruz/Agência Brasil

Revista online | Economia: Cenários para 2023

Nelson Tavares Filho*, especial para a revista Política Democrática online (49ª edição: novembro/2022)

1) O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, através de um de seus representantes no Legislativo, protocolou um Projeto de Emenda à Constituição (PEC) que exclui do Teto de Gastos R$ 198 bilhões durante o período de quatro anos. Os recursos seriam utilizados em projetos sociais.

2) Todos sabemos que se inicia agora um processo de negociação para aprovação do projeto. Dificilmente, um projeto desse impacto é aprovado integralmente, tal qual elaborado.

3) Além do corporativismo dos legisladores, cada um tentando impedir impactos negativos nos setores que representam, este projeto apresenta justos motivos para não ser aprovado tal como está.

4) 2022 foi um ano melhor do que os últimos cincos que o procederam. A perspectiva de um aumento mais significativo do PIB (2,7%) e a queda do desemprego, retornando à casa de um dígito, cerca de 8%, são elementos que diferenciam este ano.

5) A dívida pública situava-se no início deste ano na ordem de R$ 5,6 trilhões. Ao longo do ano, sua relação com o PIB, que estava na casa de 90%, apresentou certa diminuição, basicamente devido ao crescimento do produto e da inflação, que permitiu ao governo maior arrecadação.

6) Este cenário não deve permanecer em 2023. Neste ano, a economia dos 20 maiores países – G20 – deverá apresentar taxas menores de crescimento, devido à crise energética e a guerra no continente europeu. Os Estados Unidos também passam por um processo de ajustamento, que dificultará o crescimento. Alguns analistas preveem uma recessão mundial.

7) No Brasil, a maior arrecadação obtida pelo governo no ano de 2022 não foi suficiente para zerar o déficit. A relação dívida pública/PIB diminuiu mais pelo crescimento do denominador.

8) O cenário de 2023 indica, sem contar os efeitos da PEC, um déficit público de R$ 200 bilhões. A aceitação integral da PEC significará elevar o déficit em quase 100%.

9) Teremos um cenário de crescimento da dívida, que deverá superar o montante de R$ 6 trilhões.

10) A elevação do déficit de R$ 400 bilhões anuais (R$ 200 bilhões da PEC mais R$ 200 bilhões de gastos correntes e outros) significará a necessidade de um esforço anual de R$ 40 bilhões, se calculada uma taxa média de juros de 10%.

Confira, a seguir, galeria:

Inflação Brasil economia | Imagem: Andrii Yalanskyi/Shutterstock
Baixo crescimento econômico | Imagem: motioncenter/Shutterstock
Brasil em baixa econômica | Imagem: Poring Studio/Shutterstock
Carrinho de supermercado subindo a bandeira do Brasil | Imagem: Marciobnws/Shutterstock
Inflação de mercado no Brasil | Foto: FJZEA/Shutterstock
Inflação real no Brasil | Imagem: rafastockbr/Shutterstock
Regressão econômica | Imagem: eamesBot/Shutterstock
Economia 2023 | Imagem: xalien/Shutterstock
Inflação Brasil economia
Baixo crescimento econômico
Brasil em baixa econômica
Carrinho de supermercado subindo a bandeira do Brasil
Inflação de mercado no Brasil
Inflação real no Brasil
Regressão econômica
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Inflação Brasil economia
Baixo crescimento econômico
Brasil em baixa econômica
Carrinho de supermercado subindo a bandeira do Brasil
Inflação de mercado no Brasil
Inflação real no Brasil
Regressão econômica
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11) Para uma receita corrente que deve se situar perto de R$ 3 trilhões, significa que, a cada ano, teremos que arrecadar, no mínimo, 13% a mais do que o ano anterior, mantida as demais despesas constantes. Hoje R$ 40 bilhões significam 1,6% do orçamento, verba maior que a de muitos ministérios.

12) Não haverá outra solução sem que, além do maior esforço de arrecadação, diminua-se a verba orçamentária de outros ministérios. Corre-se o risco de tentar resolver um problema criando outro maior.

13) Ninguém discute a necessidade de, pelo menos para o próximo ano, fazer maior esforço para combater a miséria. Mas a busca de recursos para os demais anos deveria ser proveniente de uma análise aprofundada e revisão dos gastos do orçamento.

Sobre o autor

*Nelson Tavares Filho é economista, especialista em planejamento estratégico.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de novembro/2022 (49ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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