cultura
Henrique Brandão faz homenagem a Artur Xexéo: “Um craque”
Artigo publicado na revista Política Democrática online de agosto lembra grandeza da carreira do dramaturgo
Cleomar Almeida, da equipe FAP
Em texto de homenagem, o jornalista Henrique Brandão exalta a grandeza do colega de profissão, escritor e dramaturgo Artur Xexéo, que morreu, em junho, aos 69 anos, após ser diagnosticado com câncer tipo linfoma não-hodgkin. “Era, assim, um craque. Fazia bem tudo em que se metia", afirma Brandão, em artigo na revista mensal Política Democrática online de agosto (34ª edição).
Veja, aqui, a versão flip da Política Democrática online de agosto (34ª edição)
Jornalista de formação, Xexéo foi também apresentador de TV, comentarista de rádio, tradutor. “Por onde esteve, deixou sua marca, virou referência”, escreve Brandão, na revista mensal, produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e que disponibiliza todo o conteúdo da publicação, na versão flip, gratuitamente, em seu portal.
O jornalismo não foi a primeira escolha de Xexéo, na hora de entrar para a faculdade. Como era bom em matemática, achou que daria um bom engenheiro. “Quando eu cheguei à engenharia, levei um susto, porque não gostava de nada. Fiquei apavorado, era inteiramente entediante para mim”, disse o dramaturgo, em depoimento ao projeto Memória Globo.
Para não desapontar os pais, conforme lembra Brandão, Xexéo seguiu na faculdade. “Foi fazer jornalismo. O erro de cálculo do jovem bom de matemática revelou-se um acerto. Perdeu a engenharia, mas ganhamos todos um brilhante jornalista”, comemora o jornalista, no artigo que escreveu para a Política Democrática online de agosto.
Xexéo começou a trabalhar na imprensa em 1975. “Passou pelos principais jornais do Rio – ‘Jornal do Brasil’ e ‘O Globo’ –, onde foi colunista e editor, e pelas revistas ‘Veja’ e ‘IstoÉ’. Além da imprensa escrita, Xexéo participou do programa Estudio I, da Globo News, e foi comentarista da entrega do Oscar na TV Globo. No rádio, participou de programa semanal na CBN”, conta o colega de profissão.
De acordo com Brandão, Xexéo tinha vasta cultura cinematográfica e teatral. “Em suas colunas, estava sempre comentando filmes e peças, e não apenas as estreias do circuito nacional. Viajava com frequência para Nova York ou Londres, cidades que conhecia como a palma da mão, onde acompanhava os lançamentos cinematográficos e as novidades da Broadway e do West End londrino”.
Confira, aqui, a relação de todos os autores da 34ª edição
A íntegra do artigo de Brandão pode ser conferida na versão flip da revista, disponibilizada no portal da entidade.
Os internautas também podem ler, na nova edição, entrevista exclusiva com a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), reportagem sobre escândalo das vacinas contra Covid-19 e artigos sobre política, economia, meio ambiente e cultura.
Compõem o conselho editorial da revista o diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo, o jornalista e escritor Francisco Almeida e o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques. A Política Democrática online é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado.
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O que é o marco temporal e como ele atinge os indígenas do Brasil
Entenda por que a tese, que deve ir a votação no STF, pode significar um retrocesso na demarcação de terras dos povos originários
Edison Veiga / DW Brasil
"São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens." O texto é do artigo 231 da Constituição do Brasil, e não determina nenhuma data.
Mas um conflito entre indígenas e agricultores em Roraima, quando chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), em 2009, acabou desencadeando na tese do marco temporal. Isto porque, para resolver a questão sobre a quem pertenceria de direito a Terra Indígena Raposo Serra do Sol, os ministros argumentaram em favor do povo indígena — alegando que eles lá estavam quando foi promulgada a Constituição, em 5 de outubro de 1988.
Se naquele caso a tese era favorável aos povos originários, o precedente ficou aberto para a argumentação em contrário: ou seja, que indígenas não pudessem reivindicar como suas as terras que não estivessem ocupando em 1988.
"É uma ironia dos juristas, um deboche muito grande, essa teoria do marco temporal. Alguns povos não estavam em suas terras em 1988 porque a forma histórica de colonização do Brasil deixou muitas marcas, com indígenas sendo expulsos de seus territórios”, argumenta o pedagogo Alberto Terena, coordenador da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
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No epicentro dessa discussão, a Advocacia Geral da União (AGU) entendeu, em 2017, que seria pertinente a tese do marco temporal. Como resultado, há cerca de 30 processos de demarcação de terra emperrados no Ministério Público Federal, à espera de uma definição do STF. Entre eles, um caso concreto bastante simbólico: o dos indígenas Xokleng, da Terra Indígena Ibirama La-Klãnõ, em Santa Catarina.
Historicamente perseguidos pelos colonizadores, os remanescentes da etnia acabaram afastados de suas terras originais na primeira metade do século 20. Em 1996, contudo, conseguiram a demarcação de 15 mil hectares — que depois se expandiria, em 2003, para 37 mil hectares.
Com o argumento do marco temporal, a área é reivindicada pela Fundação de Amparo Tecnológico ao Meio Ambiente. O caso foi parar no STF — com o entendimento de que a decisão final deve servir para balizar todos as disputas do tipo.
Em paralelo, tramita na Câmara o projeto de lei 490, de 2007, que pretende tornar mais difícil a demarcação de terras indígenas — inclusive utilizando o argumento do marco temporal.
"Objetivamente, o projeto significa um enorme retrocesso para o reconhecimento do direito dos povos nativos à terra e à manutenção de sua cultura”, avalia o sociólogo Rogério Baptistini Mendes, professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Qual seria o impacto para os indígenas?
Pesquisadora na Universidade de Brasília, a antropóloga Luísa Molina afirma, por sua vez, que a tese do marco temporal "reduz o acesso ao direito originário da terra" por parte dos povos indígenas.
"Uma terra indígena não é substituível por outra área, porque é um lugar sagrado, que tem história, onde se cultiva um modo de ser de cada povo”, explica Molina. "Ela é fundamental para a existência de um povo como coletivo diferenciado. É o que faz dele um povo. Se essa terra se perder, as condições da produção da diferença são atacadas e inviabilizadas."
A pesquisadora ressalta que, no caso, "cultura e vida estão na terra, no modo de viver na terra". E é esse o ponto que estaria em risco.
"De certa forma e incorrendo no exagero, é possível inferir a tentativa de aniquilação desses povos, pois a nova lei permite o avanço sobre terras demarcadas com a instalação de postos militares, expansão de malha viária e exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico, por exemplo”, afirma, por sua vez, Terena. "E, considerando o exemplo da história, particularmente neste período de governo Bolsonaro, não somente os nativos estão ameaçados, mas também o ambiente que ocupam e preservam.”
Terena argumenta que, se aprovada, a tese do marco temporal trará insegurança para os territórios ocupados pelos povos nativos — atualmente são 434 terras ocupadas tradicionalmente e demarcadas no país. "O nosso direito originário sobre a terra é constitucional. Negar isso vai trazer grande conflito, porque nosso povo nunca vai deixar de lutar pelo território”, diz ele.
A antropóloga Molina também vê riscos de disputas. "Coloca gasolina no incêndio, porque a realidade brasileira é de guerra fundiária”, comenta. "Essa tese intensifica muito esses conflitos, na medida em que viram arma de contestação.”
"Nossa terra é nossa mãe. Ela vai além do espaço geográfico. Ali está nossa história, nosso modo de vida, nosso sonho para as novas gerações. Ela significa a manutenção de tradições”, ressalta Terena. "A sociedade, conforme vem pregando esse governo, está tentando tirar nossa organização social.”
Para o sociólogo Mendes, a possibilidade de aprovação dessa tese — e do projeto em tramitação no Congresso — significa que os povos indígenas podem sofrer "ameaças ainda maiores do que as que enfrentam nestes dias de fiscalização precária e incentivo à invasão de suas terras”.
O sociólogo recorre aos registros da Câmara para comprovar a indisposição do atual presidente do país com a questão. Em 1998, o então deputado federal Jair Bolsonaro reclamou que o Brasil vivia "o governo da entregação”. E alardeou: "Competente, sim, foi a cavalaria norte-americana, que dizimou seus índios no passado e, hoje em dia, não tem esse problema em seu país — se bem que não prego que façam a mesma coisa com o índio brasileiro; recomendo apenas o que foi idealizado há alguns anos, que seja demarcar reservas indígenas em tamanho compatível com a população."
Texto original: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/o-que-%C3%A9-o-marco-temporal-e-como-ele-atinge-os-ind%C3%ADgenas-do-brasil/a-58965557
“Giocondo Dias - O Ilustre Clandestino” é tema de podcast
O cineasta Vladmir Carvalho fala sobre a chegada do filme ao NOW, da NET, e da história de vida desse importante personagem da história política do Brasil
João Rodrigues, da equipe da FAP
Sucesso no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 2019, o documentário “Giocondo Dias - O Ilustre Clandestino” chegou à disposição do grande público no NOW, da NET, uma das maiores plataformas de streaming do Brasil, nesta semana. O filme retrata a vida do líder comunista baiano Giocondo Dias, militante de esquerda que viveu dois terços de sua vida na clandestinidade e liderou o PCB como secretário-geral.
Além de resgatar um importante personagem da história política do Brasil, sobretudo na resistência à ditadura, o documentário é uma obra notável do cineasta Vladimir Carvalho, convidado desta edição do podcast da Fundação Astrojildo Pereira. O programa conta com perguntas de Caetano Araújo (diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado), Ivan Alves Filho (jornalista, historiador e escritor), Renato Ferraz (jornalista e gerente de Comunicação da FAP), Gilvan Cavalcanti de Melo (editor do blog Democracia Política e novo Reformismo) e Luiz Carlos Azedo (colunista do Correio Braziliense e do Estado de Minas).
Ouça o podcast!
O episódio tem áudios do filme “Giocondo Dias - O Ilustre Clandestino Online”, documentário #MINHABRASÍLIA 60 Candangos e do Canal Curta!, no Youtube.
O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Google Podcasts, Youtube, Ancora, RadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues. A edição-executiva é de Renato Ferraz.
Confira o documentário no link: www.nowonline.com.br/filme/giocondo-dias-o-ilustre-clandestino/1838586.
'Incêndio na Cinemateca não é acidente',diz cineasta Luiz Bolognesi
Após repetidos alertas sobre risco de fogo, cineasta Luiz Bolognesi pede responsabilização das autoridades e diz que comunidade artística internacional está chocada. "Cinematecas guardam o acervo audiovisual de um povo."
Para o cineasta Luiz Bolognesi, o fogo que atingiu parte do acervo da Cinemateca Brasileira na quinta-feira (29/07) não se trata de um acidente – diante dos avisos repetidos e insistentes de que a entidade estava abandonada e que havia risco de incêndio – mas de um crime administrativo, pelo qual as autoridades competentes precisam ser responsabilizadas.
"Estamos diante de um crime administrativo, de a pessoa não cumprir a função para a qual tem um salário e atribuições. Precisa de uma investigação e está na hora de as pessoas responderem pelos crimes", afirma Bolognesi em entrevista à DW Brasil.
Ele disse que o ocorrido na Cinemateca é uma "tragédia" e que a comunidade artística internacional está "chocada". "Cinemateca de qualquer país é tratada com muito cuidado. É onde está depositado o acervo audiovisual de um povo", diz.
O cineasta, que venceu uma mostra da Berlinale deste ano pelo filme A última floresta, sobre o povo Yanomami, afirma que o governo Jair Bolsonaro, como todo governo com "tendência totalitária", tem um "projeto político" para "destruir o cinema".
"A arte é o âmbito da diversidade e sempre foi questionadora. Se você tem um governo de esquerda, a arte questiona o governo de esquerda. Se tem um governo de direita, a arte questiona o governo de direita. E um governo que está o tempo todo ameaçando o Supremo, o Congresso, as eleições, é um governo que tem uma tendência totalitária, e esses governos procuram sempre destruir a cultura. Porque você não controla o artista", afirma.
Ele diz que o "salto quântico" na degradação da Cinemateca coincide com a gestão Bolsonaro, e identifica um problema semelhante na Agência Nacional de Cinema (Ancine), que é financiada por tributos recolhidos de produtores de conteúdo e de empresas de telecomunicação, mas não tem destinado recursos para obras brasileiras. "Há ali também desvio do objetivo, porque eles arrecadam os recursos, pagam os salários dos funcionários, mas não fazem a finalidade de fomento", diz.
O secretário especial de Cultura, Mario Frias, que está em Roma para uma conferência dos ministros da Cultura do G20, postou mensagem no Twitter culpando a gestão petista pelo descaso na Cinemateca e disse que solicitou perícia da Polícia Federal para apurar o motivo do incêndio.
Como você avalia o incêndio no acervo da Cinemateca?
A comunidade artística sente isso como uma tragédia, inclusive a comunidade internacional, que está chocada porque uma cinemateca de qualquer país é tratada com muito cuidado. Seja nos Estados Unidos, no México, na França, na Alemanha. É onde está depositado o acervo audiovisual de um povo. Depois que a gente já teve um incêndio no Museu Nacional, agora temos um incêndio que queimou uma parte do acervo da Cinemateca. A gente já sabe que tinham negativos de curta metragem, parece que de longas metragens também. Toda uma história de Embrafilme, do Instituto Brasileiro de Cinema, toneladas de documentos que contam a nossa história, é gravíssimo.
Agora, isso não é um acidente, vem sendo avisado há mais de um ano que as estruturas estão abandonadas. Uma coisa é a Cinemateca não funcionar legal porque não tem investimento. Mas o mínimo, manter uma equipe que permita que o acervo de um país não se incendeie, não tem como não ter. O custo não é elevado nem discutível.
Trata-se de um crime, e tem que ser responsabilizado criminalmente quem foi avisado ao longo de um ano... Há nove dias, a Procuradoria da República notificou o governo do perigo iminente de um incêndio e nenhuma atitude foi tomada. Na minha opinião, estamos diante de um crime administrativo, de a pessoa não cumprir a função para a qual tem um salário e atribuições. Precisa de uma investigação e está na hora de as pessoas responderem pelos crimes.
Nesta sexta, um dia após o incêndio, o governo publicou edital para contratar uma entidade para gerir e preservar o acervo da Cinemateca. O que isso indica?
Eles já estão com medo da responsabilização jurídica. Acho que algumas autoridades, agora orientadas por seus advogados, sabem que correm risco. E aí falam "estávamos em processo, não deu tempo". É isso, medo da responsabilidade judicial, é uma omissão administrativa, muito grave.
O descaso que você menciona é resultado de um projeto ou de pouca capacidade administrativa?
A minha interpretação, pelo conjunto da obra, pela paralisação da Agência Nacional de Cinema, que não está mais fazendo fomento, pelo abandono da Cinemateca, pelo abandono da Funarte [Fundação Nacional de Artes], o corte de verbas para a universidade, o corte de investimentos em ciência e tecnologia, parece que é um projeto de um governo que está atacando frontalmente a cultura, a ciência e a inteligência brasileira. Me parece que é um projeto político.
Em relação à Cinemateca, não era a hora de já ter todo o acervo digitalizado?
A Cinemateca estava em um processo lento e contínuo de digitalização do acervo, que foi totalmente interrompido. Essa é uma tendência de todas as cinematecas, guardar e preservar as suas fontes originárias, sejam películas dos anos 1920, sejam fitas magnéticas de 1970, e guardar uma cópia digital que fica para a eternidade. A gente está muito atrasado nesse processo se for comparar com a Cinemateca do México, a francesa ou a alemã.
Além de parar a digitalização, cortaram-se os investimentos a ponto de não ter profissionais e tecnologia suficiente para impedir a destruição de um material que é extremamente delicado e sensível ao fogo. As películas pegam fogo quase como álcool, todo mundo sabe que existem mil cuidados para guardar esse material. Isso vinha sendo denunciado e se agravou muito desde o início do governo Bolsonaro.
Qual é o marco temporal da piora na administração da Cinemateca?
O abandono maior realmente começa com o governo Bolsonaro. A Cinemateca vinha tendo um tratamento melhor sendo construído, passamos algumas crises de redução de investimento no governo Dilma [Rousseff], que a turma da cultura reclamou, mas o salto quântico no abandono, a ponto de todo mundo falar "está para pegar fogo" e o cara não fazer nada até o dia que pega fogo, coincide com as mudanças que foram feitas a partir do governo Bolsonaro, que retirou todo mundo que tinha lá e largou tudo abandonado.
O povo do cinema tentou manter a Cinemateca funcionando com recursos não federais, levantando recursos, e o Ministério da Cultura entrou com uma ação e, com o uso da Polícia Federal, tirou o povo do cinema e disse "vocês não vão cuidar de nada, porque isso é um equipamento que tem uma vinculação com o Poder Federal e nós vamos cuidar".
De forma geral, como o governo Bolsonaro lida com o cinema brasileiro?
O governo Bolsonaro tenta destruir o cinema brasileiro. Porque a arte é o âmbito da diversidade, traz um pensamento complexo e sempre foi questionadora. Se você tem um governo de esquerda, a arte questiona o governo de esquerda. Se tem um governo direita, a arte questiona o governo de direita. E um governo que está o tempo todo ameaçando o Supremo, o Congresso, as eleições, é um governo que tem uma tendência totalitária, e esses governos procuram sempre destruir a cultura. Porque você não controla o artista.
No âmbito do cinema, a Agência Nacional de Cinema parou de fazer fomento. Os recursos do audiovisual brasileiro não vêm de Lei Rouanet nem do Orçamento. Tem um imposto criado na época da privatização das empresas de telefonia pelo governo Fernando Henrique [Cardoso] que teria que ser utilizado para o desenvolvimento da indústria de informática e o audiovisual. Até hoje esse recurso é recolhido e direcionado, [entre outras finalidades] para que a Agência Nacional de Cinema faça a política de fomento. Desde que o governo Bolsonaro chegou, o dinheiro entra e sai a conta gotas. Há ali também desvio do objetivo da agência, porque eles arrecadam os recursos, pagam os salários dos funcionários, mas não fazem a finalidade de fomento.
Qual é a situação atual do audiovisual brasileiro?
O audiovisual brasileiro é muito potente. Com esse imposto criado no governo Fernando Henrique e regularizado no governo Lula, o Brasil estava entre os dez maiores produtores de audiovisual do planeta, quando o governo Bolsonaro começa. Não é pouca coisa, estamos do lado de quem produz muito e barato, por um custo em dólar extremamente competitivo, e somos um dos maiores consumidores de streaming do planeta, como Netflix e Amazon. Então, apesar de a Ancine ter paralisado a nossa produção autoral, a indústria do audiovisual continua resistindo e produzindo porque os players estrangeiros viram uma oportunidade de produzir séries e filmes de qualidade, tanto na dramaturgia como tecnicamente.
Uma parte da indústria está sobrevivendo trabalhando para players americanos, mas estamos perdendo o nosso próprio patrimônio audiovisual, porque por meio da Ancine as produtoras brasileiras eram detentoras dos produtos feitos aqui, dirigíamos a linguagem do que queríamos fazer. Hoje a indústria brasileira está trabalhando para os players estrangeiros, não totalmente porque tem a Globoplay e alguns outros.
Mas o objetivo do governo era quebrar toda uma indústria que tem cerca de 60 mil empregos diretos e 300 mil indiretos porque a cultura vai contra o projeto totalitário. Uma economia de R$ 25 bilhões, maior que a do turismo em termos de faturamento. O incêndio na Cinemateca é só uma manifestação absurda de toda uma política de destruição de uma indústria e de uma memória.
Fonte:
DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/inc%C3%AAndio-na-cinemateca-n%C3%A3o-%C3%A9-acidente/a-58710325
Incêndio na Cinemateca Brasileira põe mais um acervo cultural no Brasil em risco
Objeto de denúncia do MPF contra a União por abandono e afetado por enchentes, acervo histórico tem sido vítima de falta de apoio, descaso — e agora, fogo
Lucas Berti e Joana Oliveira, do El País
Ainda sem se recuperar do incêndio que em 2018 destruiu o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, o Brasil assistiu nesta quinta-feira as chamas —que chegaram até seis metros de altura— ameaçarem, mais uma vez, o acervo de um dos galpões da Cinemateca Brasileira, no bairro da Vila Leopoldina, Zona Oeste de São Paulo. De acordo com representantes do Corpo de Bombeiros que atuavam no local, o fogo começou por volta das seis da tarde e afetou três salas no primeiro andar do imóvel alugado na Rua Othão, número 290: duas delas abrigam o acervo histórico de filmes da entidade, e a terceira armazena documentos impressos. Às 20h, as chamas estavam controladas, mas ainda havia pequenos focos de incêndio no interior do edifício, rodeado por chamas. Cinco caminhões e 70 bombeiros atuaram para controlar a situação, que não deixou vítimas.
Cinemateca Brasileira está pegando fogo!
Galpão localizado na Vila Leopoldina em SP existe desde 2011, e já sofreu com alagamentos em 2020. O local tem cerca de 200 filmes e há poucos meses trabalhadores da cinemateca denunciaram o abandono da instituição pic.twitter.com/fYMuEgwGSt
— Mídia NINJA (@MidiaNINJA) July 29, 2021
Uma das hipóteses é de que o fogo tenha começado durante a manutenção do sistema de ar condicionado, realizado por uma empresa terceirizada no galpão, segundo Robson Bertolotto, diretor da Defesa Civil da Lapa, que atuou no local, que teve 25% de sua estrutura comprometida e cujo teto desabou. “Vimos danos causados tanto pelo fogo, quanto pela água. Visualmente, constatei muitos rolos de filmes preservados, mas também vimos prateleiras retorcidas”, contou Bertolotto após uma vistoria no galpão.
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Criada na década de 1940 e conhecida como a quinta maior cinemateca em restauro do mundo, a instituição abriga 250.000 rolos de filme, sendo 44.000 títulos de curta, média e longa-metragens, além de programas de TV e registros de jogos de futebol. Entre seus maiores tesouros, estão o arquivo completo de Glauber Rocha, maior expoente do Cinema Novo e as gravações de Marechal Rondon sobre as Forças Expedicionárias Brasileiras. A maior parte desse acervo fica na sede da Cinemateca Brasileira, na Vila Mariana, mas estima-se que quatro toneladas de documentos sobre políticas públicas de cinema do Brasil tenham sido queimadas no galpão que armazena parte das películas e arquivos, o que coloca em risco a memória das instituições e programas audiovisuais brasileiros.
“Dependendo da extensão do dano, uma parte da história de preservação do cinema e do Estado brasileiro vai se perder para sempre”, lamentou o ex-conselheiro da Cinemateca Brasileira e professor de História do Audiovisual da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA-USP), Eduardo Morettin. Além de conhecer a estrutura, Morettin costuma levar alunos universitários à instituição.
Um funcionário que trabalha da sede principal da Cinemateca e que não quis se identificar, contou à reportagem que os riscos de incêndio não são exclusivos aos galpões distantes do prédio principal: “Ainda bem que [o incêndio] não foi aqui. Mesmo assim, a gente vive com o coração na mão. Toda hora fazemos ronda, sabendo que um incêndio também pode acontecer aqui, e a qualquer momento”.
A extensão real do dano ao acervo só será conhecida após a perícia da Polícia Federal, solicitada pelo secretário especial da Cultura, Mario Frias, que também revelará se o incêndio pode ter sido criminoso. “Tenho compromisso com o acervo ali guardado, por isso mesmo quero entender o que aconteceu”, escreveu Frias nas redes sociais.
Já solicitei a perícia da Polícia Federal, que irá tomar as devidas providências para verificar se o incêndio na Cinemateca foi criminoso ou não. Tenho compromisso com o acervo ali guardado, por isso mesmo quero entender o que aconteceu.
— MarioFrias (@mfriasoficial) July 30, 2021
Em nota oficial, a Secretaria Especial da Cultura afirma que “lamenta profundamente” o incêndio e que acompanha de perto a situação. Segundo a pasta, a manutenção do sistema de climatização do local foi realizada há cerca de um mês, “como parte do esforço do Governo Federal para manter o acervo da instituição”.
No último ano, a Cinemateca Brasileira tornou-se um símbolo da escassez de políticas públicas culturais do Governo Bolsonaro. Uma forte enchente no ano passado alagou as dependências hoje consumidas pelo fogo, o que motivou o Ministério Público Federal de São Paulo (MPF-SP) a mover um processo contra a União diante da situação de abandono do local. A ação, no entanto, foi suspensa após o Governo prometer comprovar ações de reparo e preservação em um prazo de 45 dias.
Em 2016, parte do acervo foi atingida por um incêndio de condições similares ao dessa quinta-feira. Além disso, o ponto enfrenta um histórico de atrasos salariais, que motivaram funcionários a criar uma campanha pública para pedir apoio.
Repercussão
O incêndio de mais uma instituição histórica e cultural gerou indignação nas redes sociais, sobretudo pela situação de abandono em que se encontrava o local em que estão valiosos documentos, filmes e curtas nacionais —fato que vem na esteira de anos em que as posições do Governo Bolsonaro em relação à valorização cultural brasileira seguem em cheque.
O ex-governador e candidato à presidência em 2022, Ciro Gomes (PDT), disse que a “tragédia” vem de um “rastro de destruição de um governo que apaga nossa história”. Até o momento, porém, autoridades não haviam confirmado motivação criminosa por trás do incêndio. A vereadora de São Paulo, Erika Hilton (PSOL), relembrou a destruição do Museu Nacional há três anos e disse tratar-se de um “descaso organizado”.
Que tragédia, meu Deus! Incêndio na Cinemateca Brasileira. Quem pagará por este pavoroso crime contra a memória nacional? É o rastro de destruição deste governo genocida que mata brasileiros e destrói nossa história. Chega, chega! Fora criminosos!
pic.twitter.com/Q1LF7pgJMA
— Ciro Gomes (@cirogomes) July 29, 2021
Já o governador de São Paulo, João Doria, afirmouque a “morte gradual da cultura nacional” é resultado do “desprezo pela arte e pela memória do Brasil”.
O incêndio na Cinemateca de São Paulo é um crime com a cultura do país. Desprezo pela arte e pela memória do Brasil dá nisso: a morte gradual da cultura nacional.
— João Doria (@jdoriajr) July 29, 2021
Fonte:
Biblioteca Salomão Malina retoma atendimento presencial em Brasília
Unidade da FAP adotará uma série de medidas de enfrentamento à pandemia da Covid-19 para retomar o atendimento. Local conta com acesso gratuito à internet e acervo de mais de 3,5 mil livros para empréstimo
Brasília voltou a ter, nesta quarta-feira (30/6), mais uma opção de local de estudo e leitura, com acesso gratuito à internet e mais de 3,5 mil livros para empréstimo, sem qualquer custo, no Conic, no meio da capital federal. Mantida pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), a Biblioteca Salomão Malina foi reaberta ao público quase um ano e meio depois de suspender atendimento presencial por causa da pandemia da Covid-19.
O técnico em enfermagem e recém-graduado em filosofia Carlos Gustavo Araújo dos Santos, de 29 anos, é um dos que já comemoram a reabertura da unidade mantida pela FAP. “A biblioteca significa muito para mim”, destaca. “Quando estava fazendo meu trabalho de conclusão de curso, foi o meio acessível de estudo e pesquisa por ter acervo com livros de qualidade disponibilizados gratuitamente”, afirma.
Conheça a Biblioteca Salomão Malina!
A biblioteca foi reaberta com restrição de funcionamento, das 10h às 16h, sem fechamento no horário de almoço. Oito pessoas, no máximo, poderão usar o local no mesmo momento, considerando a necessidade de distanciamento social e outras medidas de enfrentamento à pandemia. Não há necessidade de agendamento prévio. Em 2019, no ano antes da crise sanitária global, a unidade da FAP atendeu a mais de 6 mil pessoas.
Durante o período em que ficou fechada para atendimento presencial, a biblioteca manteve as atividades administrativas e aumentou a quantidade de livros editados pela FAP à venda na internet. Já são 32 títulos disponíveis para aquisição em plataformas digitais sobre assuntos de interesse público, como política, meio ambiente e democracia, entre outros. Veja relação de todos ao final desta reportagem.
» Jovens relatam qualidade de empréstimo delivery gratuito da Biblioteca Salomão Malina
» Biblioteca Salomão Malina oferece empréstimo de livro em casa, de forma gratuita
» Como produzir texto – Veja técnicas em encontro on-line da Biblioteca Salomão Malina
» Webinar da Biblioteca Salomão Malina debate desafios do novo normal cultural
» Webinar da Biblioteca Salomão Malina mostra dica de organizar livros
» Biblioteca Salomão Malina e Espaço Arildo Dória são reinaugurados em Brasília
Além de oferecer serviços de leitura e estudo em ambiente climatizado, a Biblioteca Salomão Malina faz doação de livros. Em maio, a Library of Congress Office, uma das maiores bibliotecas de Washington (EUA), fez o mais recente pedido de doação de livros do acervo da unidade mantida pela FAP.
A solicitação foi realizada pela bibliotecária sênior e representante da Library of Congress Office em Brasília, Elen Rocha. Ela também já enviou algumas publicações doadas pela biblioteca da FAP para a Biblioteca Jurídica em Washington, que, em seu acervo virtual (https://catalog.loc.gov/), disponibiliza 72 títulos relacionados à Fundação Astrojildo Pereira.
Confira a localização da Biblioteca Salomão Malina
Plano de retomada
Para retomar o atendimento presencial gradativamente, a Biblioteca Salomão Malina elaborou um plano, seguindo rigorosamente os protocolos de enfrentamento à pandemia da Covid-19. Como não há necessidade de agendamento prévio para as pessoas terem acesso ao local, a unidade vai disponibilizar todas as informações necessárias ao público logo na porta de entrada.
O controle de vagas disponíveis no espaço será sinalizado na porta principal da entrada da biblioteca da seguinte forma: um caderno em espiral plastificado com as numerações de 0 a 8 ficará pendurado na porta de vidro, sinalizando a quantidade de vagas disponíveis, à medida em que os leitores chegarem para utilizar o espaço ou o deixarem.
Na entrada da biblioteca, será aferida a temperatura de cada usuário, com orientação da utilização do álcool em gel nas mãos. O usuário deverá fazer a assinatura no caderno de presença, com canetas previamente higienizadas, e receberá a chave do guarda volumes, também higienizada.
Serão adotados os seguintes protocolos na biblioteca:
» Disponibilização de álcool em gel na entrada;
» Disponibilização de álcool 70% em borrifadores para os próprios usuários higienizarem mesas e cadeiras, quando acharem necessário. (Antes da pandemia, já havia essa prática na biblioteca);
» Aferição de temperatura de todos os usuários, visitantes e funcionários antes de entrar no ambiente. Caso a temperatura detectada seja superior à 37,8°C, a pessoa será orientada a procurar os serviços de saúde e não poderá entrar na biblioteca;
» Sinalização na entrada da biblioteca: informações sobre a obrigatoriedade do uso de máscaras, sobre o distanciamento de 2 metros entre as pessoas e sobre higienizar as mãos com álcool em gel;
» Proibir a entrada e a circulação de qualquer pessoa nas dependências da biblioteca sem o uso de máscaras, garantindo que estas sejam utilizadas de forma correta, cobrindo totalmente a boca e o nariz, e estejam bem ajustadas ao rosto, sem deixar espaços laterais;
» Excepcionalmente, a biblioteca poderá fornecer máscara a visitante que não possua;
» Solicitar aos usuários e visitantes que observem todas as orientações de prevenção à Covid-19 adotadas na biblioteca.
» A mesa coletiva poderá ser ocupada apenas por quatro pessoas, sentadas de forma intercalada, sendo a mesa subdividida por placas de proteção de acrílico, delimitando os espaços;
» Os dois sofás terão um de seus assentos demarcado para não ser utilizado;
» Das três baias individuais de estudo, apenas duas estarão disponíveis. A baia do centro será isolada para manter o distanciamento mínimo de 2 metros entre as pessoas;
» Demarcação com fitas no chão, a cada 2 metros, para o distanciamento nas filas dos balcões de atendimento;
» Balcão de atendimento receberá uma estrutura em acrílico para bloquear o espaço entre o funcionário e o usuário;
» Será evitado o uso de ar condicionado e privilegiada a ventilação natural. Para isso, janelas e portas ficarão abertas;
» O acervo será isolado por separadores de fila. O leitor deverá solicitar no balcão o livro desejado e um dos funcionários irá retirar o(s) livro(s) com luvas;
» Após a utilização, os livros serão recolhidos e isolados em quarentena por 10 dias (tempo relativo para tornar corona vírus indetectável);
» Após o período de quarentena, os livros deverão retornar ao acervo;
» Não serão disponibilizados jornais e revistas para precaver qualquer tipo de contaminação em materiais bibliográficos que são compartilhados;
» O recebimento de doações de livros ficará suspensa temporariamente.
Acervo
Veja, abaixo, livros sobre o PCB disponíveis ao público na Biblioteca Salomão Malina, em Brasília
Veja, abaixo, a relação de obras da FAP à venda nos sites da Amazon, Americanas, Submarino e Shoptime
Nomadland encanta pelas contradições e se consagra como vencedor do Oscar 2021
Análise é da crítica de cinema Lilia Lustosa, em artigo que publicou na revista Política Democrática Online de abril
Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP
Doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL), a crítica de cinema Lilia Lustosa acredita que o ano de 2021 pode representar um grande avanço para a conquista feminina no cinema.
“Ao que tudo indica, o ano de 2021, apesar de seu roteiro mais para cyberpunk ou filme-catástrofe, parece que vem para marcar positivamente a história do cinema. Pelo menos no quesito conquista feminina”, afirma Lilia, em artigo que publicou na revista mensal Política Democrática Online de abril (30ª edição).
Veja versão flip da 30ª edição da Política Democrática Online: abril de 2021
A publicação é produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. O acesso a todos os conteúdos da revista é gratuito no site da entidade.
Dirigido, roteirizado, montado e produzido por Chloé Zhao, uma chinesa radicada nos Estados Unidos, Nomadland vem roubando todas as atenções e levando os prêmios mais importantes da temporada, na avaliação de Lilia Lustosa. O filme se tornou o segundo dirigido por uma mulher a receber a estatueta maior da grande premiação hollywoodiana (Melhor Filme) – e Chloé Zhao também repetiu o feito no prêmio de direção (Melhor Diretor).
Roadmovie
“Um roadmovie que mistura realidade e ficção, ao percorrer o oeste dos EUA retratando a vida dos novos nômades do país, tendo como protagonista a já oscarizada Frances McDormand”, conta a crítica de cinema, em seu artigo publicado na revista Política Democrática Online.
A origem asiática da diretora chama também a atenção, já que, conforme ressalta Lilia, a sociedade está assistindo, na vida real, a um aumento da violência contra pessoas nascidas naquela região, “a quem muitas vezes tem sido atribuída a culpa pelo surgimento do coronavírus”.
“Um cenário macabro de uma ficção científica rasa e injusta!”, critica Lilia. “Mas, enquanto o movimento Stop Asian Hate ganha forças nas ruas, Cloé Zhao brilha absoluta nos palcos dos festivais e nas telas de cinema, televisores, computadores, tablets ou smartphones de todo o mundo”, destaca o artigo da revista online da FAP.
Globo de Ouro
Em fevereiro último, como lembra Lilia, Cloé Zhao se tornou a primeira diretora a ter uma produção premiada com o Globo de Ouro de melhor filme, além de ser a segunda a levar a estatueta de melhor direção e a primeira asiática a conseguir esse feito.
“No Critics Choice Award, Zhao também saiu com o prêmio de direção, e Nomadland, com o de melhor filme. Fato que se repetiu no PGA Awards, premiação do Sindicato dos Produtores de Hollywood, em que seu filme foi laureado mais uma vez como o melhor do ano”, diz.
Para saber todos os detalhes da crítica de cinema produzida por Lilia, acesse diretamente a versão flip da revista Política Democrática Online de abril. A publicação também tem entrevista exclusiva com o ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão, artigos de política nacional, política externa, cultura, entre outros, e reportagem especial sobre avanço de crimes cibernéticos.
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'Elite consome muito o que vem da periferia', diz coordenador cultural do Slam-DéF
Organizador do Slam-DéF realizará encontro online de jovens artistas da periferia, no dia 28 de abril, com transmissão ao vivo pela internet
Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP
Músicas, sons, ritmos e toda forma de manifestação artística têm sido usados por jovens da periferia do Distrito Federal para se integrarem, por meio de encontros virtuais, durante a pandemia, e manterem o distanciamento social. Em eventos online, eles fazem até batalha de poesias para amenizar um pouco a solidão do isolamento.
Palco de batalhas de arte falada, poesia viva, encenação com muito carão e entonação de voz, o Slam-DéF realiza, no dia 28 de abril, para mais uma competição de poesias criadas pelos próprios participantes.
Assista ao vivo!
O evento será realizado em parceria com a Biblioteca Salomão Malina, mantida, em Brasília, pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), localizada na capital federal.
Feridas escancaradas
Os artistas anônimos usam suas vozes e seu corpo para escancarar feridas que seguem abertas no país, como a pandemia, o racismo, o machismo, a homofobia, entre outros. (Veja mais detalhes do evento ao final desta reportagem).
Na mesma linha de um movimento nacional que reúne jovens autores de poesias e que ainda estão no anonimato, o Slam-DéF é um dos grupos que possibilitam a integração do público por meio da internet, de forma dinâmica e interativa. Em cada encontro, segundo o coordenador Will Júnio, fica a certeza de que a cultura da periferia segue cada vez mais empoderada.
“Devido ao crescimento e estilos musicais originados na periferia, como funk e hip hop, a própria elite consome muito o que vem da periferia”, afirma o coordenador, que também é professor de língua portuguesa em escola pública.
"Periferia também é arte"
Segundo ele, o empoderamento da periferia é um passo muito importante na luta por direitos. “Antigamente não era assim, houve todo um processo de luta, engajamento e discernimento, por parte da periferia, para entender que o que produzimos na periferia também é arte, como qualquer outra, e muito rica. Se não nos dão oportunidade, nós a criamos”, ressalta.
De acordo com Will, a cultura é muito importante para a periferia porque, como ele observa, quem mora nelas vive à margem da sociedade. Dessa forma, segundo o professor, nos encontros online, essas pessoas encontram alternativa para expor seu sofrimento, sua luta, seu dia a dia.
“Muitos desses jovens encontraram na música, como funk e hip hop, e no grafite uma maneira de mostrar o que vêm passando no seu dia a dia. A cultura para esse pessoal é o seu grito para a sociedade ouvir”, destaca Will.
SERVIÇO
Batalha de Poesias Slam-DéF
Dia: 28/4/2021
Horário da transmissão: das 19h às 20h30
Onde: portal da FAP, redes sociais da entidade (Youtube e Facebook) e página da Biblioteca Salomão Malina no Facebook.
Realização: Slam-DéF, em parceria com Biblioteca Salomão Malina e Fundação Astrojildo Pereira (FAP)
Observação: Os arquivos dos eventos ficam disponíveis para o público no portal e nas redes sociais da entidade, por tempo indeterminado
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Luiz Carlos Azedo: A nobreza, o povo e a plebe
Temos o regime de votação mais moderno e eficiente do mundo, o voto direto, secreto e universal na urna eletrônica, ao lado de uma sociedade extremamente desigual
A palavra isogênese — no dicionário, igualdade ou semelhança de origem ou desenvolvimento — é a linha que separa a democracia moderna das antigas, que se baseavam na participação direta apenas de uma elite de proprietários, como na República de Platão. É o fundamento ideal do regime democrático, que se baseia na concepção enraizada no Ocidente de que a natureza humana faz os homens originalmente iguais, não importa a condição social. Para que essa compreensão se tornasse hegemônica, muito contribuiu o fundamento cristão de que todos os homens são irmãos, porque são filhos de Deus.
Essa ideia-força foi um dos pilares da Revolução Francesa (1789-1799), que secularizou a fraternidade e ancorou o jusnaturalismo, ou seja, a doutrina de que os indivíduos são pessoas dotadas de moral e direitos inalienáveis e invioláveis, que lhes pertencem por natureza. Assim, a ideia de soberania popular se contrapõe à soberania do príncipe. Para se ter uma ideia de como as coisas avançaram neste terreno, basta lembrar que Nicolau Maquiavel, nas Histórias florentinas, dizia: “Em Florença se distinguem os nobres entre si, os nobres e o povo, e por último o povo e a plebe.”
Um pouco de filosofia e teoria política não faz mal a ninguém: o povo é uma abstração conceitual, consagrada em nossa Constituição de 1988 como fonte de todo o poder — que emana do povo, para o povo e em seu nome é exercido. A sutileza do enunciado está no fato de que a democracia moderna não é direta, é representativa, e os indivíduos, com seus defeitos e interesses, são de carne e osso. Não por acaso o respeito aos direitos humanos está no centro da dinâmica de funcionamento e das disputas dos regimes representativos. No Brasil, em razão do grande número de eleitores e do caráter direto e universal do nosso sistema eleitoral, vivemos numa democracia de massas. Além disso, o Estado brasileiro é ampliado, em razão da separação entre os Poderes, do regime federativo, da existência de uma burocracia profissional e de agências autárquicas. Os governantes eleitos não fazem o que querem e bem entendem; precisam governar com base na Lei e no compartilhamento de responsabilidades. A “moral política” é subordinada à ética.
Alguém já disse que o passado é como um diamante, ninguém joga fora. O nosso nos garantiu instituições políticas seculares – como o Senado e o Supremo Tribunal Federal, por exemplo, pilares do Estado nacional, da integridade territorial e da conciliação entre as elites —; de outro, uma ordem social iníqua, em que a herança da escravidão até hoje se faz presente. Temos o regime de votação mais moderno e eficiente do mundo, o voto direto, secreto e universal na urna eletrônica, ao lado de uma sociedade extremamente desigual, na qual as distâncias abissais entre os ricos, a classe média e os pobres somente não são as da antiga república florentina — entre a nobreza, o povo e plebe — porque as eleições igualam todo mundo na hora do voto.
Solidariedade
O que conseguimos de progresso e redução de diferenças sociais ao longo de nossa República se deve a isso. Durante o regime militar, o milagre econômico alavancou o poder aquisitivo de nossa classe média, mas houve muita concentração de renda e foi exatamente isso, com o achatamento dos salários, que provocou a entrada em cena dos operários e seus sindicatos na luta pela democracia. Entretanto, nossa democracia nunca esteve tão ameaçada, desde a eleição de Tancredo Neves, em 1985.
Isso ocorre em todo o mundo, em razão das mudanças de regras de comportamento nas sociedades secularizadas; da não-integração plena dos estratos sociais de mais baixa renda; e dos avanços tecnológicos. Mas aqui a situação é mais grave. O presidente Jair Bolsonaro sonha com uma “ditadura do Executivo”. Vive fazendo ameaças aos demais Poderes e energiza grupos radicais, alguns verdadeiras milícias políticas armadas, dispostos a defendê-lo a qualquer preço contra a oposição. O agravamento da crise social pela pandemia é um terreno fértil para a violência social e política, por causa do desespero das famílias que passam por necessidades, daí a importância da solidariedade com os menos favorecidos, os “invisíveis”, para mitigar suas dificuldades nessa crise sanitária, sobretudo a fome.
Obs: Publicada domingo, dia 18 de abril, no Correio Braziliense e no Estado de Minas.
Alma Preta: Paraíba adotará cotas raciais na aplicação da Lei Aldir Blanc
Medida integra pacote de ações para auxiliar a classe artística preta e periférica do estado com uma renda emergencial durante o período de pandemia da Covid-19
Trabalhadoras e trabalhadores pretos e periféricos da cultura na Paraíba serão beneficiados com cotas raciais na aplicação dos recursos federais da Lei de Emergência Cultural Aldir Blanc. A medida foi acordada na sexta-feira (16), em reunião conduzida pelo Ministério Público Federal (MPF) e Defensoria Pública da União (DPU). A medida também prevê criação de comissão de heteroidentificação para evitar fraudes no acesso às cotas.
Por meio da Lei Aldir Blanc, foi destinado à Paraíba, em 2020, o montante de R$ 36.605.274,22, dos quais restou um saldo estimado em pouco mais de R$ 19 milhões. Além da Paraíba, os estados do Ceará, Bahia e Pará também solicitaram a prorrogação de execução da lei ao STF.
Para a integrante do Fórum de Artistas Pretes, Pretas e Pretos na Paraíba, a atriz e contadora de histórias, Fernanda Ferreira, a adoção das cotas raciais pelo estado da Paraíba, na Lei Aldir Blanc, é uma conquista dentre as muitas reivindicações dos movimentos sociais e culturais de pessoas negras organizadas em todo o Brasil, na luta por equidade racial.
“A adoção de 30% para es artistas negres nos editais gerais lançados pela SecultPB (Secretaria de Estado da Cultura da Paraíba), constitui uma possibilidade de fazer justiça numa conquista que pode ser considerada um marco histórico, em nível nacional, uma vez que nenhum outro estado brasileiro assumiu esse compromisso com a parcela negra/preta da população, neste momento de pandemia, em que a comunidade artística/cultural é um dos setores mais prejudicados e os negros/as estão em maior condição de vulnerabilidade diante da crise sanitária por que passa o nosso país”, observou.
Novos editais serão abertos
De acordo com o secretário da Cultura, Damião Ramos Cavalcanti, novos editais poderão ser divulgados na próxima quinta-feira (22). "A utilização dos 19 milhões restantes, nessa segunda fase, cuja aprovação sairá, com muita probabilidade, na próxima quinta-feira, abrirá muitos e diversificados editais, que, em quantidade e qualidade, serão significativos quanto a essas necessidades emergenciais.", afirmou.
RPD || Lilia Lustosa: Cinema feminino e plural
Apesar da tragédia da pandemia do novo coronavírus, 2021 marca positivamente a história do cinema ao destacar a presença feminina, com duas mulheres concorrendo à categoria de Melhor Direção
Quantas diretoras de cinema você conhece? Dá para encher uma mão? E diretores? Muito mais fácil de lembrar, não? Eles são tantos!
A verdade é que a indústria cinematográfica sempre foi dominada pelos homens, embora as mulheres tenham tido participação fundamental em sua consolidação. No entanto, como costuma acontecer em outras áreas, muitas dessas personagens femininas foram apagadas, esquecidas, editadas ou simplesmente cortadas da História. Ora, todos já ouvimos falar dos Irmãos Lumière, de Méliès, de Edison, certo? Mas quem conhece Alice Guy ou Lois Weber? Mulheres que, desde os primórdios do cinema, já atuavam por detrás das câmeras, mas cuja passagem pelos estúdios e salas escuras ficou perdida lá no passado!
No Brasil, também foram muitas as que atuaram na construção do nosso cinema, como Carmem Santos, atriz, roteirista, diretora e produtora, que, já nos anos 20, criou a Film Artistico Brasileiro (F.A.B.) e, nos anos 30, com a chegada do sonoro, a Brasil Vita Filmes. Ou ainda Cléo de Verberena, atriz e produtora, primeira mulher a dirigir um longa de ficção no país, o desaparecido O Mistério do Dominó Preto (1931). Isso sem falar de Adélia Sampaio, Helena Solberg, Helena Ignez… Tantas, mas das quais sabemos tão pouco!
Ao que tudo indica, porém, o ano de 2021, apesar de seu roteiro mais para cyberpunk ou filme-catástrofe, parece que vem para marcar positivamente a história do cinema. Pelo menos no quesito conquista feminina! Isso porque o filme que vem roubando todas as atenções e levando os prêmios mais importantes da temporada é Nomadland, dirigido, roteirizado, montado e produzido por Chloé Zhao, uma chinesa radicada nos Estados Unidos. Um roadmovie que mistura realidade e ficção, ao percorrer o oeste dos EUA retratando a vida dos novos nômades do país, tendo como protagonista a já oscarizada Frances McDormand.
A origem asiática da diretora chama também a atenção, já que estamos assistindo, na vida real, a um aumento da violência contra essa gente, a quem muitas vezes tem sido atribuída a culpa pelo surgimento do coronavírus. Um cenário macabro de uma ficção científica rasa e injusta! Mas enquanto o movimento Stop Asian Hate ganha forças nas ruas, Cloé Zhao brilha absoluta nos palcos dos festivais e nas telas de cinema, televisores, computadores, tablets ou smartphones de todo o mundo. Em fevereiro último, ela se tornou a primeira diretora a ter uma produção premiada com o Globo de Ouro de melhor filme, além de ser a segunda a levar a estatueta de melhor direção e a primeira asiática a conseguir esse feito. No Critics Choice Award, Zhao também saiu com o prêmio de direção, e Nomadland, com o de melhor filme. Fato que se repetiu no PGA Awards, premiação do Sindicato dos Produtores de Hollywood, em que seu filmefoi laureado mais uma vez como o melhor do ano.
Resta agora o prêmio mais badalado da terra do tio Sam: o Oscar. No dia 25 deste mês, Nomadland concorrerá ali em seis categorias: melhor longa, direção, roteiro adaptado, montagem, fotografia e atriz. Dessas indicações, quatro levam a assinatura de Zhao. Uma proeza e tanto para tempos em que a desigualdade de gênero ainda é a regra do mercado!
E o melhor de tudo é que a diretora nascida em Pequim não está sozinha nessa empreitada, já que a britânica Emerald Fennell também concorre ao prêmio de direção por seu inusitado Bela Vingança (2020), sendo este o primeiro Oscar a ter duas mulheres disputando essa categoria. Até então, em suas 93 edições, apenas cinco haviam sido indicadas por direção, mas nunca duas ao mesmo tempo. Fennell concorre ainda por roteiro original, e Bela Vingança, que tem a violência contra mulher como tema central, por melhor filme e montagem. Uma trama cheia de dores, cores e dissabores, e que traz uma Carey Mulligan esbanjando talento no papel da vingativa Cassandra, o que lhe rendeu, aliás, a indicação ao Oscar de melhor atriz.
Fora Zhao e Fennell, outras tantas profissionais estão concorrendo nas mais diversas categorias. Sem dúvida, um grande passo para a tão almejada igualdade, mas que não deixa de sublinhar o triste fato de que, em pleno século 21, ainda tenhamos que aplaudir de pé a indicação de duas mulheres às categorias principais do Oscar. Pergunto-me então o que teria gerado essa “evolução”? A luta de tantos anos? Mudanças na composição dos boards dos prêmios? Ou será que o confinamento levou à reflexão, fazendo-nos entender de uma vez por todas que há espaço para talentos de todos os gêneros e raças nos sets de filmagem?
Que venham as estatuetas!
*Lilia Lustosa é crítica de cinema e doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL).
- ** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de abril (30ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
- *** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.
Folha de S. Paulo: Curta indicado ao Oscar usa repetição para expor o racismo
Cássio Starling Carlos, Folha de S. Paulo
No longínquo 1993, “Feitiço do Tempo” foi considerado um filme original ao explorar o paradoxo da repetição em uma camada da vida, o tempo, em que tudo parece condenado a não voltar.
Sinal dos tempos, nos anos recentes apareceram várias ficções nas quais personagens ficam presos numa lógica perversa de repetições. Do terror à comédia, passando pelo drama adolescente e pela animação, a ideia de não conseguir escapar de uma situação dá corpo ao medo, que todo mundo tem, de não conseguir superar um incômodo.
“Dois Estranhos” pode parecer só mais um produto dessa ondinha. Mas o curta de Travon Free e Martin Desmond Roe vai além da repetição da fórmula. O filme de 32 minutos, que concorre ao Oscar de melhor curta, mostra uma série de situações protagonizadas por Carter, um cartunista negro.
Ao final de uma noite gostosa ao lado de uma garota linda, Carter volta para casa para cuidar do seu cão que ficou sozinho. Ao sair do prédio dela, ele é interpelado por um policial e logo a situação sai do controle.
A repetição aqui deixa de ser um mero recurso narrativo e se torna um recurso de denúncia, uma demonstração que o racismo é uma situação banal, que se repete infinitamente e que ser vítima de preconceito racial equivale a uma condenação.
Travis Free, roteirista e co-diretor de “Dois Estranhos”, evoca uma experiência pessoal como inspiração. “Como um homem negro, eu experimentei e vi uma quantidade enorme de mortes e de violência armada. Já tive a arma de um policial apontada para minha cara. Fiquei olhando para o cano de uma arma da polícia e isso não é algo que todo mundo sentiu ou deveria experimentar.”
“Dois Estranhos”
Direção: Travis Free e Martin Desmond Rae
EUA, 2020, 32 min
Onde assistir: Netflix