Cristovam Buarque

Cristovam Buarque defende educação como prioridade nacional

"Nossa história é de escravidão e de desigualdade. A educação precisa ser igual para todos, precisa ser prioridade”, destaca o professor emérito de UnB e educacionista.

João Rodrigues, da equipe da FAP

No podcast Rádio FAP desta semana, que publicado na manhã desta sexta-feira (27), o professor emérito de UnB e educacionista sugere que a educação deve ser o vetor do progresso no Brasil. “Nossa história é de escravidão e de desigualdade. A educação precisa ser igual para todos, precisa ser prioridade”, explica Cristovam Buarque. O programa de áudio é divulgado em diversas plataformas de streaming como Spotify, Google Podcasts, Youtube, Ancora, RadioPublic e Pocket Casts.

Ouça aqui o podcast.




Cristovam Buarque: Réquiem ao Homo Sapiens

O homo sapiens é a mais surpreendente criação da natureza: capaz de inventar sapato e, 5.500 anos depois, deixar um bilhão de seus semelhantes descalços e outro bilhão se endividando para comprar mais do que consegue calçar. Neste período, deixou de jogar pedras com a mão e passou a fabricar bombas atômicas para jogá-las desde foguetes, com a mesma ética belicista do passado. Sua técnica agrícola passou da plantação manual no solo, para tratores robóticos e sementes manipuladas, mas no lugar de distribuir para quem tem fome, prefere jogar fora a comida que sobra do que podem comprar.

Capaz de contar centenas de milhões de votos em minutos, mas incapaz de tomar decisões que levem em conta os interesses de toda a humanidade do futuro. A natureza criou um animal que evoluiu na lógica ao ponto de manipular a natureza, mas demonstra ser incapaz de regular o uso de sua força de maneira sustentável e decente: um animal com inteligência, mas sem saber usá-la inteligentemente. 

O escritor Arthur Koestler parece ter razão com a hipótese de que o homo sapiens foi resultado de um erro de mutação, ao adquirir um cérebro com lógica que evolui, mas com uma moral que não evolui: a lógica da bomba atômica, a ética da política tribal. O resultado é que, para aumentar a produção, a racionalidade técnica provocou o aquecimento global, mas deixou a ética e a politica despreparadas para evitar a catástrofe. Para acertar, a mutação deveria ter impedido o surgimento da inteligência ou dado responsabilidade moral. 

Diferentemente dos insetos, que sem consciência da morte se organizam para a sobrevivência da espécie, o homo sapiens condena-se à extinção na busca de aumentar o tempo de sua vida pessoal com o máximo de riqueza e consumo. A maior maravilha criada pela natureza é uma espécie que marcha para o suicídio, ao usar o poder do cérebro lógico a serviço do individualismo com voracidade de consumir e ganância por lucro. 

A natureza que criou a inteligência é vítima dela, porque não é capaz de dominar sua própria força. É como se a evolução das espécies tivesse fabricado um animal que age com efeitos parecidos a um meteoro gigante vindo do espaço em direção à Terra. Outros meteoros estão a caminho há milhões de anos, mas o meteoro sapiens tem apenas 40.000 anos - menos 300, se levarmos em conta sua mutação para o homo sapiens industrial. 

A suspeita de que o homo sapiens é suicida parece confirmada pelo relatório das Nações Unidas que detalha as mudanças climáticas que aquecem o Planeta, com a consequente desarticulação da agricultura, elevação no nível do mar, extinção de animais. Apesar de que, há mais de 60 anos, a humanidade é alertada dos riscos, as políticas nacional e internacional não conseguiram até aqui barrar as catástrofes ecológicas e a desigualdade social em marcha. 

As mudanças climáticas mostram que voracidade de consumo, ganância de lucro, poder tecnológico, consciência da morte e política individualista conspiram contra o futuro da humanidade. Nada indica que o poder catastrófico em escala global será controlado pelo voto que reflete os interesses individuais e imediatos do eleitor, não do planeta e da humanidade. O homo sapiens, na sua forma industrial, parece caminhar para seu próprio fim.

Salvo se usar a biotecnologia e a inteligência artificial para promover nova evolução que fabrique um “neo-homo sapiens”, forte, inteligente e longevo, e deixe para trás bilhões de “neo-neandertais”, debilitados física e mentalmente, dessemelhantes e passíveis de extinção física, não apenas de exclusão social como atualmente. Se optar pela catástrofe ecológica da extinção ou pela catástrofe moral da ruptura da espécie, o atual homo sapiens e sua humanidade deixarão de existir. Koestler teria tido razão: por um erro de fabricação, o homo sapiens é a única espécie programada para o suicídio, afogado nos produtos de sua inteligência irresponsável. 

Felizmente, ainda há esperança de que a inteligência pode despertar sua própria irresponsabilidade moral, a falta de valores éticos comprometidos com a sobrevivência da espécie: o uso de tecnologia a serviço de todos buscando um desenvolvimento harmônico entre os seres humanos e deles com a natureza. Ainda há esperança, mas a história das últimas décadas parece dar razão a Koestler e justificar um réquiem ao homo sapiens. 

*Professor Emérito da UnB e membro da Comissão Internacional da Unesco para o futuro da Educação

Texto original: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2021/08/4945483-artigo-requiem-ao-homo-sapiens.html


Cristovam Buarque: A Via Brasil

O risco de um deputado chamado Jair Bolsonaro que quase ninguém escutou

Blog do Noblat / Metrópoles

O blog do Noblat lembrou esta semana os dez anos de uma curta fala do jornalista Bob Fernandes alertando para o risco de um deputado chamado Jair Bolsonaro. A fala não parecia ter relação com a realidade, mas se transformou em uma triste previsão. Pena que não foi escutada na época.

Se o alerta do Bob Fernandes tivesse sido escutado, as forças democráticas não teriam cometido tantos erros que levaram à eleição de um governo tão desastroso, irresponsável e ameaçador. Mas dez anos atrás era impossível dar crédito à possibilidade de um maluco defensor de tortura ganhar eleição, embora fosse perfeitamente previsível que os democratas estavam esgotando seu crédito de esperanças e credibilidade eleitoral. E por isto deveriam perder em algum momento no futuro, para forças radicalmente contrárias ao discurso democrático e progressista.

Era óbvio o descontentamento do eleitorado diante da corrupção, da falta de reformas estruturais para enfrentar os grandes problemas do país e de uma mensagem empolgante para um futuro diferente. Apesar disto, os partidos democráticos se consideravam mais adversários entre eles do que dos problemas brasileiros. Não tinham mensagem para o futuro, não acreditavam em volta ao passado e passavam o presente disputando quem seria o próximo prefeito de São Paulo. PSDB e PT se consideravam os donos da história que lhes parecia satisfatória com a democracia, a estabilidade monetária, a bolsa escola/família e o crescimento econômico induzido pela China. Os outros eram apenas auxiliares, puxadinhos de um ou outro. Como continuam sendo. Sem uma mensagem para futuro e desprezo aos alertas, se dedicavam a brigar entre eles para ver quem tinha o melhor marqueteiro para convencer aos eleitores. Eram os marqueteiros que tentavam mostrar as diferenças inexistentes nos vazios de propostas que eles tinham.

Não ouviram então e continuam sem escutar, apesar de que hoje o risco ser mais visível e muito mais grave. Bolsonaro já não é um desconhecido e a eleição será um plebiscito a seu estilo e propósitos de governar. Na outra os outros perderam, na próxima receberá respaldo para seu tipo maldito de governo.

Não é preciso ter a percepção profética do Bob Fernandes para prever o risco que o Brasil corre em 2022. Desta vez, a eleição daquele deputado será mais do que recusa aos outros, será um aval ao seu comportamento genocida, desastroso na administração do país, devastador de nossos recursos nacionais e de nosso prestígio internacional.

Desta vez a culpa será dos estão se colocando como candidatos e colocam seus nomes e seus partidos na frente dos interesses do Brasil. A culpa será da incapacidade destes cinco a dez nomes que não conseguem oferecer um nome de unidade contra a continuação da barbárie que leva o país na sua marcha à decadência.

A culpa será da insensatez do divisionismo simbolizado no lema nem nem, no lugar de um sonoro e unido NÃO. O PT diz nem Bolsonaro nem os outros, os outros dizem nem Bolsonaro nem o PT.

Lamentável que não tenham escutado a voz do Bob Fernandes, há dez anos, agora é imperdoável que não estejam atentos ao risco de um segundo turno depois das acusações mútuas no primeiro das urnas, nem do risco maior de um terceiro turno pelas armas, como vem sendo espalhafatosamente preparado.

Vocês, candidatos, percebam a responsabilidade que têm e escolham aquele que melhor poderá barrar a marcha ao abismo e sigam juntos em uma única via. A divisão de vocês está criando as condições para a reeleição, no segundo ou terceiro turno, se provocada por uma derrota dele por diferença pequena. A democracia precisa de uma vitória ampla no plebiscito do Brasil contra as insanidades perversas e antipatriotas do Bolsonaro. Uma vitória nas urnas que cale todos que pensam usar as armas. O Brasil precisa que vocês sentem e encontrem um nome que unifique todas as forças democráticas caminhando juntas em uma via única: da sensatez, do futuro, do Brasil.

*Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador


Cristovam Buarque: Derrota de Pirro

A derrota de Bolsonaro serve perfeitamente ao propósito de criar o clima de suspeita de fraude para recusar o resultado das eleições em 2022

Blog do Noblat / Metrópoles

Faz mais de dois mil anos que o Rei Pirro, de Épiro, teve uma vitória sobre as tropas romanas, mas a um custo tão elevado que ele próprio reconheceu valer como uma derrota. Venceu, mas se enfraqueceu. “Com outra derrota desta, eu perco meu reino”, dizem que ele falou conscientemente. Este caso criou até hoje a expressão de “Vitória de Pirro”. O que não se inventou ainda foi o conceito de “Derrota de Pirro”, quando uma perda serve aos propósitos do derrotado. É o que aconteceu esta semana com a derrota de Bolsonaro no caso do voto impresso. Ele perdeu, mas sua derrota serve perfeitamente ao propósito de criar o clima de suspeita de fraude para recusar o resultado das eleições em 2022. E colocar suas milícias, “seu” Exército e motociclistas nas ruas em um terceiro turno golpista.

A decisão da Câmara de Deputados acabou com a sua intenção de complicar a apuração dos votos, mas não elimina sua mensagem mentirosa e irresponsável de que poderá haver fraude, nem sua justificativa para um golpe caso perca as eleições. O clima de desconfiança se manterá, porque não precisa de racionalidade. E ele terá condições de tentar aqui o que Trump tentou sem conseguir. E com mais chances pela tradição do “ethos” de nossas FFAA e a fragilidade de nossas instituições, mas sobretudo pelo divisionismo das FFOO, as forças da oposição.

Bolsonaro teve uma “Derrota de Pirro”, perdeu sem perder, e as oposições tiveram um “Vitória de Pirro”, ganharam perdendo. Sobretudo porque, diferentemente do Rei Pirro, não percebem a fragilidade decorrente da sua divisão que sofrem. A democracia continua igualmente ameaçada.

Além disto, por algumas semanas Bolsonaro conseguiu desviar todo debate sobre os desastres de seu governo: a CPI, as informações sobre o aquecimento global, a continuação da epidemia, a inflação, o desemprego, as dificuldades da volta às aulas. O debate sobre o voto impresso abafou estas notícias, e o resultado em nada diminui a malandragem de sua mensagem sobre o risco de fraude. Bolsonaro ganhou sobretudo porque em nada avançou e até diminuiu a possibilidade de aliança entre os democratas. Esta unidade é a única forma de impedir o uso da desculpa de fraude com uma vitória acachapante no primeiro turno.

Mas nada indica que os líderes da oposição terão maturidade, bom senso, patriotismo para se unirem. Preferem continuar contando com as “Derrotas de Pirro” que Bolsonaro coleciona, até transformá-las em vitória pelas armas quando não conseguir pelas urnas. E dará a desculpa de que seus seguidores acreditam, inclusive mais uma vez entre militares: a defesa da democracia por eleições limpas.

*Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador

Fonte: Blog do Noblat / Metrópoles
https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/artigos/derrota-de-pirro-por-cristovam-buarque


'Sistema Nacional Único de Educação deve colocar país na vanguarda'

Proposta é feita pelo ex-ministro Cristovam Buarque, em artigo na 57ª  edição da revista Política Democrática impressa, a ser lançada em evento virtual da FAP na quinta (12/8)

Cleomar Almeida, da equipe da FAP

No país com 11 milhões de pessoas que não sabem ler nem escrever, a educação de base deve ser uma questão nacional, financiada e coordenada pelo governo federal, segundo o ex-ministro da Educação, ex-senador e ex-governador do Distrito Federal Cristovam Buarque. “O Sistema Nacional Único de Educação deve nos colocar na vanguarda nos métodos de formação e transmissão de conhecimento”, afirma ele.


Assista!




A análise de Cristovam está publicada na 57ª edição da revista Política Democrática impressa, editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), dedicada exclusivamente à educação e que está à venda na internet.

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O ex-ministro e outros autores participarão do primeiro de cinco eventos on-line de lançamento da publicação, na quinta-feira (12/8), a partir das 19h. A transmissão será realizada no portal e redes sociais (Facebook e Youtube) da entidade.



As importantes reflexões e análises de 19 autores começam com o artigo de Cristovam Buarque, fazendo um chamado para que a educação brasileira crie condições para dar um salto de qualidade em sua existência.

 “O Brasil não terá futuro se não oferecer a cada uma de nossas crianças a escola da qual elas gostem no presente e que lhes ofereça a chance de melhorar seu futuro e construir o país. Só educação não faz, mas sem educação não se faz uma nação”, diz o ex-senador.

“Entraves ao progresso”
Na avaliação de Cristovam Buarque, o Brasil está com seu progresso amarrado não apenas por causa da educação, mas, segundo ele, “o atraso e a desigualdade de nossa educação têm um papel central na rede de entraves ao progresso”.

Para que haja um salto de qualidade, segundo ele, é preciso manter descentralização gerencial em cada escola e liberdade pedagógica em cada sala de aula, de forma que toda criança seja tratada como brasileira, não como municipal ou estadual.

“A estratégia deve consistir, portanto, em um processo de substituição, por adoção, dos frágeis sistemas municipais por um robusto sistema nacional: com carreira federal para todo professor, padrões nacionais de qualidade nas edificações e nos equipamentos das escolas, todas em horário integral, com atividades pedagógicas, culturais e esportivas” afirma o autor, em outro trecho.

Cristovam Buarque explica que, em vez de espalhar escolas individualmente, o governo federal, ao longo do tempo, substituiria, por cidade, cada sistema municipal por um novo sistema federal. “Por grupos de cidades a cada ano, o novo sistema nacional chegaria a todas as escolas, todos os professores e todos os brasileiros, no prazo de duas a três décadas”, acentua o ex-ministro.


Cristovam Buarque: "Atraso e a desigualdade de nossa educação têm um papel central na rede de entraves ao progresso". Foto: Pedro França/Agência Senado

Aula teatral X Aula cinematográfica
De acordo com ele, o futuro vai exigir mais do que um sistema educacional, já que, conforme acrescenta, também será preciso que haja uma revolução no conceito e na prática do processo educacional. Segundo ele, as novas tecnologias já estão disponíveis, mas ainda não estão sendo usadas para a passagem da tradicional aula teatral – professor, quadro negro e aluno presencialmente – para a nova aula cinematográfica.

Esta última, conforme explica o autor, consiste no professor sendo o roteirista da peça pedagógica, cinematográfica com os recursos da teleinformática, da computação e da cinematografia, para levar para dentro da sala de aula as informações disponíveis nos bancos de dados, imagem e som, usando a prática presencial, remota ou híbrida.


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“Este sistema novo não pode, porém, perder a importância do convívio do aluno com a realidade social ao redor, na convivência com os colegas e com o mundo. Uma aula sobre a vida natural das florestas ganhará muito graças às novas técnicas da teleinformática, mas isto não dispensa a eficiência e a beleza da visita presencial à floresta que é estudada. A escola tem que se modernizar sem perder a comunhão com o mundo”, sugere.

O ex-ministro também diz que a superação de cada problema e a realização de cada propósito – produtividade, distribuição de renda, pacificação nas ruas, eleição de políticos honestos, paz nas ruas, estabilidade institucional, superação do quadro de pobreza, estabilidade, sustentabilidade – exigem diversas ações.

No entanto, segundo ele, cada problema fundamental passa pelo atraso da educação nacional e pela desigualdade, como ela é distribuída, conforme a renda e o endereço da família, impedindo o país de aproveitar o maior de seus recursos: a inteligência potencial dos cérebros de sua população.

“Cada pessoa sem educação de qualidade representará uma perda de capital ao longo do Terceiro Centenário: o Século do Conhecimento. Cada criança sem escola de qualidade no presente seria sintoma de um país sem qualidade no futuro”, alerta.

Lançamento da revista Política Democrática impressa 57ª edição | Educação
Data: 12/8/2021
Transmissão: a partir das 19 horas
Onde: Portal e redes sociais (Facebook e Youtube) da Fundação Astrojildo Pereira


Cristovam Buarque: Nudez da desigualdade e do atraso

Cristovam Buarque / Correio Braziliense

A covid-19 não provocou a tragédia da educação brasileira. Ela apenas desnudou a realidade do atraso e da desigualdade na educação. Desde sempre, as avaliações colocam o Brasil entre os países com uma das piores e com a mais desigual educação de base no mundo, conforme a renda da criança.

Apesar disso, a população brasileira, eleitores e eleitos, não parecia perceber a dimensão da tragédia, nem estava atenta às terríveis consequências disso para o futuro das crianças e do país. A baixa qualidade impede o aumento da produtividade para gerar renda nacional e a desigualdade na educação é a principal causa da pobreza social e da concentração de renda e suas consequências. A epidemia da covid não criou essa situação, apenas denudou a realidade e explicitou os desafios que já existiam.

A sociedade brasileira sempre tratou com descaso o fato de termos a oitava maior população de analfabetos entre todos os países do mundo, e termos apenas metade dos brasileiros terminando o ensino médio e no máximo metade deles em condições de alfabetização para o mundo contemporâneo: conhecer bem a língua portuguesa e falar pelo menos mais um idioma, saber matemática, as bases das ciências, história, geografia, problemas do mundo e dispor de um ofício para conseguir emprego e renda. A pandemia permitiu descobrirmos a realidade: o Brasil tem escolas e fake escolas. As primeiras, embora ainda deficientes, foram capazes de se ajustar e mantiveram um mínimo de qualidade, as outras praticamente abandonaram as crianças por falta dos equipamentos necessários, de professores preparados e motivados e de governantes que dessem importância à educação.

Além disso, a imensa maioria das famílias brasileiras não dispunha em casa dos equipamentos básicos para receber aulas transmitidas, no caso da escola que estivesse em condições de transmiti-las remotamente.

A covid-19 desnudou nosso despreparo para o uso das modernas técnicas de teleinformática aplicadas à educação. Há pelo menos duas décadas, o avanço técnico já tinha criado as condições para a execução das aulas remotas. O ensino à distância é uma realidade que o ensino superior vem praticando, mas que a educação de base nem ao menos considerava. Além de desnudar a desigualdade, a pandemia desnudou o atraso no equipamento de nossas escolas.

Ao desnudar o atraso e a desigualdade, ela nos trouxe dois desafios: como equipar as escolas para aproveitar todas as vantagens da modernidade da teleinformática, dos bancos de dados e imagens, e como oferecer essas vantagens a todos, independentemente da renda e do endereço de cada criança.

A pandemia mostrou que a pedagogia está atravessando, 100 anos depois, o desafio que a arte dramática enfrentou na passagem do teatro para o cinema, devendo adaptar as aulas teatrais – professor, aluno, quadro negro – para as aulas cinematográficas – onde o professor usa o seu conhecimento, os equipamentos e linguagens novas para ensinar presencial ou remotamente. O desafio está em formar professores e oferecer a eles o apoio técnico e os equipamentos necessários para o novo tipo de magistério que vai caracterizar os próximos anos.

Será uma estupidez nacional não aproveitar as novas técnicas, será uma indecência se esta nova pedagogia continuar como privilégio de poucos. O desafio trazido pela covid, ao desnudar a realidade do atraso e da desigualdade, vai exigir que o Brasil desperte para o atraso e a desigualdade: crie um Sistema Único Nacional de Educação de Base, capaz de oferecer em condições iguais o potencial das novas técnicas, aliadas às concepções humanistas da pedagogia.

A pedagogia precisa dar o salto que o cinema deu para universalizar a arte dramática, permitindo a qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, assistir os melhores diretores e atores, que eram privilégio dos ricos em cidades grandes. As novas técnicas digitais e de teleinformática vão permitir atividade pedagógica de qualidade: mais agradável ao aluno, mais eficiente para o aprendizado e mais democrática ao se espalhar para todos. No caso da passagem do teatro ao cinema, não houve necessidade de vítimas, nem mortos. No caso da educação, tanto demoramos para abrir os olhos que foi preciso a maldição da covid-19 para mostrar a nudez do atraso e da desigualdade. Pior será se percebermos a nudez, mas não enfrentarmos os desafios de modernizar e dar equidade à educação de base oferecida às crianças brasileiras.

*Professor Emérito da UnB e membro da Comissão Internacional da Unesco para o futuro da educação

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2021/08/4942638-artigo-nudez-da-desigualdade-e-do-atraso.html


Cristovam Buarque: O Brasil avisa

Bolsonaro está avisando e as oposições não levam a sério: no lugar de unidade e resistência, continuam divididas

Cristovam Buarque / Blog do Noblat / Metrópoles

Bolsonaro tem avisado. A história vai dizer que ele foi o pior dos presidentes eleitos ao longo dos primeiros duzentos anos do Brasil como país independente. Mas vai ter de reconhecer que ele não surpreendeu, porque avisou. Avisou que vinha para destruir ou reduzir o que havia sido feito até sua posse: na cultura, na educação, na construção da democracia, os avanços nos direitos das minorias. Também avisou que não acreditava nas constatações da ciência quanto ao aquecimento global e medidas sanitárias, inclusive vacinas. Avisou que seu governo ia reduzir as leis de proteção ambiental e ocupar as florestas do Brasil, incentivando incêndios e desflorestamento. Avisou que retiraria o Brasil do cenário internacional e manteria aliança exclusiva com seu mentor norte americano. Deixou claro que buscava fazer do Brasil um pária internacional, isolado na resistência ao fantasma do comunismo morto há décadas. Quando a epidemia chegou, ele avisou que ela seria tratada como uma gripezinha, repetidas vezes disse que todos morrem e por isto não havia razão para sofrer diante de centenas de milhares de pessoas mortas.

Ele não avisou que haveria esquema de corrupção na compra de vacinas, nem que se aliaria ao centrão que sempre tratou como corja de corruptos. Mas, em geral, entre os defeitos de Bolsonaro não está o fato de não ter avisado. Não haverá desculpa para aqueles que não souberam enfrentar as ameaças que ele fez.

Agora, Bolsonaro avisa que não respeitará os resultados das eleições se elas não forem feitas com as que ele quer. Age com franqueza diferente dos militares de 1964, que até 1° de Abril juravam lealdade à Constituição e ao presidente, mas o destituíram jogaram o Brasil em uma ditadura autoritária por 21 anos, com tortura, prisão, controle da imprensa, da Justiça e do Congresso.

Ele está avisando mais uma vez. E tomando publicamente as medidas necessárias para cumprir seu aviso quando chegar a hora em 2022: denunciando que se perder será por fraude, armando seus seguidores e seus milicianos, cooptando politicamente as Forças Armadas e as polícias estaduais, compondo apoio internacional entre neonazistas do mundo e silenciando os políticos do centrão.

Apesar disto, aparentemente as oposições democráticas não estão levando a sério as ameaças de Bolsonaro: Ele avisa que não respeitará o resultado da eleição, diz que o Exército é dele, os motoqueiros e as milícias armadas ou digitais são dele, os parlamentares do centrão são dele, os líderes neonazistas do mundo são dele, mas apesar disto as oposições não demonstram unidade para enfrentar suas ameaças..

Bolsonaro está avisando e as oposições não levam a sério: no lugar de unidade e resistência, continuam divididas como se não houvesse ameaça. Só pensam qual deles vai vencer aos outros. Tolhidos pela ambição pessoal ou partidária e por preconceitos mútuos, ignoram os avisos de Bolsonaro e disputam entre si. Caminham para repetir os mesmos erros que elegeram Bolsonaro em 2018, apesar dos avisos que ele deu. Desta vez, com o agravante de elegerem mais do que um fanfarrão, elegerem um estilo de fascismo tropical do século XXI que o eleitor votará conhecendo. Estão dormindo e talvez só acordem no exílio.

O Brasil também avisa: desta vez não serão perdoados aqueles que por omissão, vaidade, partidarismo disputarem as urnas divididos entre eles, nem aqueles que usarem as armas e participarem do golpe que Bolsonaro avisa que vai dar. Da outra vez se passaram 21 anos e os crimes da ditadura foram perdoados, o Brasil avisa que desta vez podem passar mais que este tempo, mas os crimes contra a democracia não serão perdoados. Não serão perdoados os que erraram usando as armas, nem os que erraram por se dividirem nas urnas.

*Cristovam Buarque foi senador, governador e ministro


Fonte: Blog do Noblat / Metrópoles
https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/artigos/o-brasil-avisa-por-cristovam-buarque


Cristovam Buarque: O espírito do tempo e a educação

Estamos percebendo a necessidade de captar as mudanças adiante, de acordo com o espírito do tempo, as curvas que a história está fazendo

Em janeiro do ano passado, a Unesco criou um grupo de 15 pessoas para elaborar proposta sobre o futuro da educação no mundo. A diferença desta nova proposta para outras duas, décadas atrás, é o espírito do tempo atual. Os relatórios anteriores foram elaborados em momentos de evolução, sem as rupturas que temos em marcha no século XXI. Nos debates do grupo, do qual participo, estamos percebendo a necessidade de captar as mudanças adiante, de acordo com o espírito do tempo, as curvas que a história está fazendo.

Uma mudança diz respeito aos novos recursos tecnológicos, graças à computação, à telecomunicação, aos grandes acervos de imagem e som, à inteligência artificial, às redes sociais digitais e a tudo que permite levar a realidade para dentro da sala de aula, e fazer o ensino-aprendizagem à distância, de forma remota entre professores e alunos. O espírito deste tempo permite e induz à passagem da “aula teatral” – professor e quadro negro na presença dos alunos – para a “aula cinematográfica” - professor usando todos os modernos recursos audiovisuais e computacionais para uma aula dinâmica, presencial ou não. A escola do futuro não será apenas um aperfeiçoamento da atual, será uma “nova escola”. Da mesma forma que, um século atrás, a arte dramática descobriu o potencial do cinema, levando o teatro ao mundo inteiro e com uma linguagem que rompia os limites do palco.

A segunda mudança se refere aos novos conhecimentos a serem desenvolvidos. Os destinos, dificuldades e potenciais de cada ser humano ficaram interligados planetariamente à toda a humanidade. Até pouco tempo atrás, as ideias de planeta e humanidade eram temas limitados a astrônomos e filósofos. No espírito do tempo atual, estes conceitos dizem respeito ao dia a dia de cada pessoa: os alunos do futuro viverão na Terra, não apenas em um país, e a preocupação deles deve ser com toda a raça humana, além da família e dos compatriotas. O ensino deverá tratar dos problemas que ameaçam a humanidade: mudanças climáticas; abismo da desigualdade que está quebrando a semelhança da espécie humana; pobreza e desemprego estrutural; riscos e vantagens da inteligência artificial; o entendimento do papel da ciência na construção de um mundo melhor e mais belo; a prática da solidariedade com todos os seres humanos, especialmente os pobres nacionais, os refugiados apátridas, os migrantes e todos que sofrem exclusão e discriminação; o valor da diversidade social e natural, com respeito às especificidades.

O terceiro desafio é fazer o ensino-aprendizagem em sintonia com o rápido avanço do conhecimento, que evolui e se transforma a cada instante. Esta velocidade faz obsoletos os conhecimentos, as profissões, a concepção de escola e os métodos pedagógicos, inclusive a posição relativa entre professor e aluno. A educação do futuro exige que o aprendizado seja contínuo, não termine ao longo da vida de uma pessoa; diplomas devem ser provisórios. O verbo aprender deve ser usado no gerúndio, sempre aprendendo e aprendendo sempre.

É um desafio também, sobretudo no ensino superior, sair das algemas do conhecimento por disciplina e adotar o conhecimento multidisciplinar, única forma de avançar para novas ciências que estão nascendo nas fronteiras das atuais e de trazer os problemas da realidade para dentro do processo de ensino-aprendizagem. Especialmente os problemas éticos que desafiam a humanidade e as possibilidades da educação de base para construir o futuro, ao formar as novas gerações.

O quinto desafio é a coerência entre o conteúdo humanista e planetário com o compromisso político de assegurar o direito de cada criança desenvolver seu potencial, desde a primeira infância, independente da nacionalidade e do status social, da renda e do endereço; cada criança do mundo tratada como filha da humanidade, com o mesmo direito à educação para seu próprio benefício e para que seu talento beneficie sua família, sua vila, seu país e toda a humanidade. A educação de qualidade - respirar conhecimento -  deve ser um direito tão humano, quanto aspirar oxigênio para estar vivo, aprendendo ao longo de toda a vida. Ninguém deixado para trás na alfabetização para a contemporaneidade: falar, escrever e ler bem seu idioma, falar pelo menos um outro idioma, adquirir um ofício, conhecer história e geografia, filosofia e as bases da matemática e das ciências, ser capaz de usar as ferramentas do mundo moderno.

Certamente que o espírito do tempo exige um plano mundial para dar apoio à educação das crianças do mundo inteiro.

*Professor Emérito da Universidade de Brasília


Fonte:
Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2021/07/4939914-cristovam-buarque-o-espirito-do-tempo-e-a-educacao.html


Cristovam Buarque: Lei incompleta

A Lei Áurea é considerada um marco social, pela extinção do regime escravocrata, e marco legal pela simplicidade de apenas um artigo: “É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil”. Nada mais do que 12 palavras e acabou a infâmia de tratar pessoas como mercadoria.

Esta simplicidade deixou a lei incompleta e de certa forma inócua para o propósito de ir além da proibição da venda, compra e propriedade de pessoas, e de servir também para a garantia da liberdade, promoção social e progresso dos afrodescendentes no Brasil. Aquele artigo simples foi capaz de acabar com os grilhões, mas não de incorporar a população negra à sociedade brasileira. Manteve-se a desigualdade, a exclusão, a pobreza e, consequentemente, o racismo.

Teria sido diferente se a Lei Áurea tivesse mais um artigo: “Fica estabelecido no Brasil um sistema único, público, de educação para todos”. Mas a lei ficou incompleta. Ao longo dos 134 anos de sua vigência, comemorados na semana que passou, o Brasil sem escravismo manteve a escravidão, porque sem educação as algemas físicas que aprisionavam os escravos se transformaram em algemas mentais que amarram todos os pobres brasileiros. Não apenas os negros, mas sobretudo estes, por formarem a maior parte dos pobres do País.

Ao longo destes 134 anos, desde 1888, o Brasil manteve uma desigualdade abismal entre a educação dos que podem pagar por uma boa educação e aqueles que não podem. Se desde aquela época os descendentes dos escravos e seus senhores estudassem em um mesmo sistema escolar com qualidade para todos brasileiros, ao longo destas três ou quatro gerações, a desigualdade que ainda existisse, além de pequena, seria graças ao talento dos que se dedicam aos estudos. A desigualdade não seria herança financeira, que termina sendo também herança racial. Sem o segundo artigo, a Lei Áurea ficou incompleta.

Além da lei incompleta de 1888, atravessamos toda a história pós-abolição e republicana sem acrescentar o artigo e outras ações que faltam. Por 40 anos depois da Lei, nem ao menos criamos um Ministério da Educação; quando criado já nos anos 1930, serviu para coordenar a educação da minoria dos filhos da população branca e rica, ou quase rica, nas poucas escolas de base que foram criadas ao longo das décadas. A obrigatoriedade de vaga aos seis anos só veio em 1988 com a Constituição; aos 4 anos, em 2013; a obrigatoriedade de vaga até os 17 anos, só em 2016; o Piso Nacional Salarial para o Professor, em 2008.

Até hoje, o Brasil deixa a educação nas mãos dos pobres e desiguais municípios. Foram feitas leis como a Merenda Escolar (1955), Emenda Calmon (1983), Livro Didático (1985), Fundef (1996), PNE-I (2001), Fundeb (2007), Piso Salarial do Professor (2008), PNE-II (2011), BNCC (2020), e o Brasil continua com educação entre as piores do mundo e provavelmente a mais desigual entre todos os países.

Até hoje, o Brasil não decidiu completar a Lei Áurea criando um Sistema Nacional de Educação de Base. A sociedade brasileira, seus eleitores e líderes continuam com a mesma visão da Princesa Izabel e do Primeiro-Ministro João Alfredo – basta o primeiro e único artigo da Lei Áurea, a educação de cada criança é assunto da família ou do prefeito, não do país. O resultado é que um século e meio depois da Lei Áurea, temos duas vezes mais adultos analfabetos do que no ano da abolição incompleta, todos eles pobres e quase todos afrodescendentes.

Na verdade, todos os governos seguintes, ditadura ou democracia, de direita ou esquerda, negaram-se a assumir a educação de nossas crianças como uma questão nacional: levar a sério o artigo da Constituição que assegura a educação como um direito de todos os brasileiros e tornar a educação como o vetor do progresso do país.

Nos navios negreiros, havia marujos com a tarefa de impedir os escravos desesperados pularem no mar, já que a morte deles era uma perda financeira para o proprietário. Hoje, não oferecemos escolas que assegurem a seus alunos quererem permanecer nelas, e se eles quiserem pular no mar da deseducação, aceitamos que o façam sem percebermos a perda que isso representa para o futuro de cada um deles, para suas famílias e para todo o País.

Faz 134 anos que demos alforria aos escravos, mas não os libertamos, porque não lhes demos a educação, sem a qual a liberdade é apenas uma ilusão. Por falta de um artigo a mais na Lei Áurea, mantivemos uma última trincheira da escravidão, mantivemos os descendentes dos escravos em um novo tipo de servidão e amarramos o progresso do país.

*Professor Emérito da Universidade de Brasília

Fonte:

Correio Braziliense

https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2021/05/4925679-lei-incompleta.html


Cristovam Buarque: A perplexidade do óbvio

Lula x Bolsonaro na próxima eleição

As chamadas forças contrárias ao Bolsonaro e também ao PT estão perplexas diante da resiliência do primeiro, apesar de seu governo desastroso e indecente, e diante do crescimento do apoio ao Lula, apesar de todas notícias do ocorrido em estatais durante seu governo. É uma perplexidade diante do óbvio: o país e seu eleitorado estão divididos de maneira polarizada, o que facilita bases sectárias para os dois lados terem provavelmente lugar no segundo turno. Além disto, cada um destes lados tem se mobilizado no sentido de ampliar sua base de apoio, não só para fortalecer-se no primeiro turno, mas também para ganhar no segundo.

Apesar de todo mal que faz, da incompetência reconhecida de seu governo, de indicadores claros de corrupção na família e na relação com o Congresso, apesar de quase 450.000 mortos pelo covid por relaxamento e negacionismo, apesar de tudo isto, Bolsonaro amplia sua base junto ao Centrão e outros grupos políticos, sem perder sua base central. Sobretudo, devido ao medo da volta do PT ao poder. Por sua vez, o Lula circula desembaraçado, com a auréola de vítima de perseguições jurídicas, fazendo aliança nos estados com partidos do centro e conseguindo apoio em meios conservadores, políticos e empresariais, que nada perderam e até ganharam durante os governos petistas.

Enquanto isto acontece no lado do Lula e do Bolsonaro, o chamado bloco democrático e seus candidatos, Ciro, Huck, Dória, Tasso, Leite, Mandetta, parecem perplexos diante do óbvio. A sensação é de que estes candidatos se concentram tanto em suas respectivas candidaturas, que caem na perplexidade ao óbvio: em tempo de extremos, os partidos mais radicais têm facilidade para chegar ao segundo turno, se os outros não se unificam desde o primeiro turno.

Prova desta perplexidade é uma mensagem colocada pelo PSDB em suas redes com a capa de um livro hipotético, tendo a foto de Bolsonaro e o título “Como trazer o PT de volta ao poder”. Uma mensagem que passa perplexidade e derrotismo.

No lugar de uma estratégia para ocupar ganhar os votos dos muitos que não desejam um ou outro dos extremos, o chamado polo democrático se divide para saber quem será o candidato. Ficam à espera de previas dentro do PSDB entre e da vontade de outros postulantes dos demais partidos.Todos batendo cabeça e perplexos quando percebem que os outros dois estão conseguindo apoio.

Está na hora de os que não estão com Lula ou Bolsonaro darem um prazo aos que se propõem a ser alternativa, para encontrarem um nome que os unifique, com uma proposta que seduza, passando confiança aos eleitores. Talvez ainda seja tempo de saírem da perplexidade do óbvio. Se não saírem e se unirem, não vai demorar que seus apoiadores migrarão para um dos outros dois lados.

*Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador

Fonte:

Blog do Noblat/Metrópoles

https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/artigos/a-perplexidade-do-obvio-por-cristovam-buarque


Cristovam Buarque lista lacunas que entravam desenvolvimento

Ex-senador vai participar do primeiro debate da série de eventos on-line em pré-comemoração ao bicentenário da Independência, realizado pela FAP e Folha da Manhã

Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP

O ex-senador Cristovam Buarque afirma que as políticas econômicas do Brasil foram marcadas pelo que ele chama de “lacunas”, como a incapacidade de perceber que a pobreza, os limites ecológicos, o planejamento de curto prazo e a falta da “educação de base como vetor do progresso” entravam o desenvolvimento do país.

Professor emérito da Universidade de Brasília (UnB) e ex-governador do Distrito Federal (DF), Cristovam diz, em entrevista ao portal da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), que “o país trata a pobreza como assunto meramente social, uma questão de consciência ética para erradicá-la”.


Confira o vídeo!


“Não percebemos que o quadro de pobreza – pessoas sem saúde, sem saneamento, sem comida, sem educação – entrava no desenvolvimento. Tratamos de pobreza como se ela fosse solucionada pelo crescimento econômico, como agora estamos vendo que o fato de não termos superado a pobreza entrava em nosso desenvolvimento”, analisa.

Cristovam vai participar do primeiro debate da série de eventos on-line em pré-comemoração ao bicentenário da Independência, que será realizado, na sexta-feira (14/5), a partir das 16 horas, pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP) e Folha da Manhã. Veja mais detalhes do webinar ao final desta reportagem.

Foto: Reprodução/TV Senado
Maior lacuna contrária ao desenvolvimento é a falta de percepção sobre “a educação de base como vetor do progresso”, avalia Cristovam Buarque. Foto: Reprodução/TV Senado

Desenvolvimento sustentável

O ex-senador ressalta, ainda, que os limites ecológicos prejudicam o desenvolvimento nacional. Ele lembra que o Brasil iniciou o Proálcool, em 1975, em uma década na qual “deveria ter se pensado em desenvolvimento sustentável”. “Mas nossos economistas não pensaram nisso”, critica.

Depois de 17 anos, o país sediou a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio 92, mas, segundo o ex-governador do DF, não aproveitou a chance de se tornar o líder do desenvolvimento sustentável. “Agora a gente está percebendo que vai ter que mudar a orientação do processo produtivo”, alerta.

“Os combustíveis fósseis vão ser proibidos em questão de tempo. O Brasil poderia ser pioneiro em automóveis elétricos, mas não trabalhamos nisso. Foi uma lacuna não ter percebido o desenvolvimento”, ressalta.

Na avaliação dele, a maior lacuna contrária ao desenvolvimento é a falta de percepção sobre “a educação de base como vetor do progresso”. “Tratamos educação como serviço social, assim como saneamento, coleta de lixo, habitação. Educação é mais do que um serviço, é um vetor. Por isso, uma criança fora da escola é vista como problema da família e dela própria, não do país’, lamenta.

Além disso, de acordo com Cristovam, a falta de planejamento a médio e longo prazos prejudicam o desenvolvimento do país. “Nunca se pensou na perspectiva de 30 a 50 anos, o que iria acontecer no futuro. Chineses e sul-coreanos pensam assim, e deram certo”, compara ele.

“Mordomias, desperdícios”

Ele também chama a atenção para o “esgotamento do estado” como entrave para o desenvolvimento. “Há esgotamento financeiro, já que não dá mais pra aumentar imposto, e moral, como a corrupção entranhada. Os planos de desenvolvimento, como eram chamados, cederam a mordomias, desperdícios, ineficiências, tudo isso foi tolerado e continua”, assevera.

O professor emérito da UnB também avalia que economistas foram responsáveis por dar legitimidade aos populistas, esquecendo todas essas lacunas. “Quem toma decisão são os políticos, mas quem pensa para os políticos são os economistas, os quais nem chamo de ideólogos, são teólogos dessa religião”, afirma.

Ele lembra, também, que, desde a Independência até 1942, o Brasil teve só uma moeda. “De 42 a 94, seis moedas diferentes, isso foi o resultado da inflação, produzida por alianças entre políticos populistas e economistas que não perceberam os limites fiscais. Os economistas chamam de gastos os investimentos em educação e saneamento, por exemplo”, critica.

SERVIÇO
Webinar | Bicentenário da Independência: a política econômica do desenvolvimento, de Vargas aos nossos dias
Data:
 14/5/2021
Transmissão: a partir das 16h
Onde: Portal da FAP e redes sociais (Facebook e Youtube) da entidade
Realização: Fundação Astrojildo Pereira e Folha da Manhã

 

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