Correio Braziliense
Luiz Carlos Azedo: Bolsonaro, agora, politiza o fracasso
A maioria dos ministros se queixa do foco errado. O Palácio do Planalto é uma ‘jaula de cristal’, na qual o presidente da República constrói um mundo só dele
Aos 32 meses de mandato, o presidente Jair Bolsonaro se depara com um cenário mórbido e nebuloso: a “gripezinha” matou 575 mil pessoas, o país tem 14 milhões de desempregados e a inflação pode chegar a 9%, se não houver uma mudança de rumo. Deficit fiscal, insegurança jurídica e instabilidade política formam o tripé que afugenta os investidores. A janela de oportunidade da retomada da economia global está sendo perdida.
Os verdadeiros problemas do país são de natureza objetiva e exigem soluções criativas, exequíveis e amparadas por amplo consenso nacional. Em circunstancias normais, diante da gravidade da pandemia e de suas sequelas, principalmente a iniquidade social, o presidente da República, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) convergiriam suas decisões na direção dessas soluções. Mas não é o que acontece. Estamos na antessala de uma grave crise institucional, fabricada por Bolsonaro.
Seu problema não é falta de governabilidade — conta com o apoio do Centrão no Congresso. É a governança, “a maneira pela qual o poder é exercido na administração dos recursos sociais e econômicos de um país, visando o desenvolvimento, e a capacidade dos governos de planejar, formular e programar políticas e cumprir funções”, segundo o Banco Mundial. São características da boa governança: Estado de direito, transparência, responsabilidade, orientação por consenso, igualdade e inclusividade, efetividade e eficiência e prestação de contas. Essa não é a praia de Bolsonaro.
A agenda do país é discutida em milhares de lives, pelos mais diversos públicos, que buscam saídas para a situação em que nos encontramos de olho no futuro. O presidente ignora tudo isso, empenhado em levar adiante um programa ideológico, que só empolga os setores mais reacionários da sociedade. Mesmo os conservadores, que o apoiaram na eleição e participam do governo, têm uma agenda liberal voltada para os problemas reais, ainda que ignorem as questões sociais. Bolsonaro está governando apenas para seus seguidores fanatizados. A maioria dos ministros já se deu conta disso e se queixa do foco equivocado. O Palácio do Planalto é uma “jaula de cristal”, na qual Bolsonaro constrói um mundo só dele.
As atenções do país estão voltadas para as manifestações convocadas para o dia 7 de setembro, que são apoiadas por Bolsonaro. Não haverá desfiles militares por causa da pandemia, porém estão previstas concentrações de defensores da intervenção militar em muitas cidades. Até a semana passada, pretendiam parar o país, cercar Brasília, invadir e fechar o Supremo Tribunal Federal (STF). Como era de se esperar, os mais ousados, como o presidente do PTB, Roberto Jefferson, e o cantor Sérgio Reis, já sofreram as consequências desse projeto sedicioso. Mas Bolsonaro, em solidariedade a eles, pediu o impeachment do ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news, que investiga a atuação de grupos extremistas, e escalou mais um degrau no seu confronto com o Supremo.
Ontem, 23 governadores e dois vices se reuniram em Brasília para discutir a situação e construir uma barreira de contenção à escalada da radicalização golpista. Querem um encontro com Bolsonaro para discutir a relação republicana entre os entes federados. Coincidentemente, o governador de São Paulo, João Doria, demitiu o coronel da Polícia Militar que comandava a corporação no interior paulista porque atuava nas redes sociais convocando para os atos de 7 de setembro e pedindo o fechamento do Supremo. Os governadores firmaram uma espécie de pacto para impedir motins nas polícias militares. O caldo de cultura para isso existe, foi fomentado pelo presidente.
Ciclo fechado
Enquanto segue o baile da política, a economia se deteriora a olhos vistos. O cenário é de menos crescimento e mais inflação. Os juros de longo prazo superam 10% ao ano, segundo as taxas dos contratos futuros com vencimento em janeiro de 2031. As apostas para o crescimento em 2022 caminham para a casa de 1,5%, uma taxa incapaz de gerar um volume expressivo de empregos. Para 2021, ainda prevalecem estimativas na casa dos 5% ou um pouco mais. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) pode fechar 2021 em 7,5%, muito acima da meta de 3,75% deste ano.
As reformas tributária e administrativa subiram no telhado. O que não passou até agora, provavelmente não mais passará. O Congresso não quer saber de remédios amargos. Bolsonaro também é negacionista na política monetária. O cobertor é curto, a política econômica deriva para o naufrágio. A alternativa que restou foi politizar o fracasso e pôr a culpa nos outros. Como não pode responsabilizar a oposição, culpa as instituições da República, principalmente o Supremo. É a velha cantilena de que a democracia não funciona.
Luiz Carlos Azedo: Bolsonaro não se ajuda
O impeachment de Bolsonaro não empolga os partidos de oposição, mas ganha apoio da opinião pública e já começa a ser visto como uma contingência que não pode ser descartada
Parece que o fracasso subiu à cabeça do presidente Jair Bolsonaro, que não se ajuda. Com dificuldades de se relacionar com as regras do jogo da Constituição de 1988, está levando o país para uma situação dramática. Cria uma situação de grave crise institucional, na qual seus aliados não têm muito como ajudá-lo, porque contraria seus interesses políticos e eleitorais regionais. O ministro da Economia, Paulo Guedes, faz mais ou menos a mesma coisa com a boa vontade dos agentes econômicos, que davam sustentação ao governo em função da necessidade de estabilidade na economia, mas agora se afastam.
A escalada do confronto do presidente Jair Bolsonaro com o Supremo Tribunal Federal (STF) não tem chance de terminar bem, apesar dos esforços do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), para amortecer a trombada com o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, que sempre teve uma postura cordata e moderada. Na sexta-feira, Bolsonaro entrou com um pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes, que imediatamente recebeu a solidariedade de seus pares, em nota assinada por Fux. Quem imaginava que Bolsonaro havia desistido do pedido em relação ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, deve esperar mais um pouco: nos bastidores do Planalto, comenta-se que isso também deve ocorrer nesta semana.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM), pretende examinar o pedido de impeachment de Alexandre de Moraes tecnicamente, por obrigação, mas já disse que a medida não tem acolhida política. Ou seja, se não for engavetado, será derrubado em plenário. O sinal de que o tempo fechou para Bolsonaro no Senado veio também do presidente da Comissão de Constituição e Justiça, sena- dor Davi Alcolumbre (DEM-AP), que suspendeu a sabatina do ex-advogado-geral da União André Mendonça, indicado para a vaga do ex- ministro Marco Aurélio Mello no Supremo. Apesar de contar até com o apoio da bancada do PT, a aprovação de Mendonça subiu no telhado.
Bolsonaro não ajuda mesmo os seus aliados. Ciro Nogueira já está desconfortável no cargo, porque suas negociações políticas não são honradas pelo presidente da República. Na semana passada, tentou uma reaproximação de Bolsonaro com Fux, mas as conversas fo-
ram desmentidas pelos fatos. O presidente do PP assumiu a Casa Civil com a missão de melhorar o relacionamento do governo com o Congresso e costurar alianças eleitorais robustas, principalmente no Nordeste, mas está fracassando mais rápido do que se imaginava. É uma situação muito parecida com a do ex-senador Jorge Bornhausen, que assumiu a articulação política do governo Collor de Mello e não conseguiu evitar o impeachment.
Impeachment
A propósito, o impeachment de Bolsonaro não tem aceitação entre os principais atores políticos do país, inclusive na maioria dos partidos de oposição. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera com folga a corrida para as eleições presidenciais de 2022, quer Bolsonaro sangrando até a eleição. Entretanto, o impeachment ganha crescente apoio da opinião pública e já começa a ser visto como uma contingência que não pode ser descartada, mais uma vez, porque Bolsonaro não se ajuda. Por exemplo, está anunciando que pretende comparecer à manifestação bolsonarista de 7 de setembro, na Avenida Paulista, enquanto nas suas redes sociais as convocações para bloquear Brasília e invadir o Supremo Tribunal Federal prosseguem. Onde vamos parar?
Essa é a pergunta que ninguém sabe responder, porque o bom senso não orienta as decisões de Bolsonaro, somente o confronto. Entretanto, sua rota de colisão com o Supremo precisa ser interrompida, antes que o país mergulhe no caos. Não apenas por cau- sa da crescente radicalização dos bolsonaristas, que o presidente da República emula, mas por causa da economia. O ministro da Economia, Paulo Guedes, também escolheu a rota do fracasso.
Na semana passada, Guedes implodiu a proposta de reforma tributária que estava em discussão no Senado, com a equipe do relator, senador Roberto Rocha, e era apoiada pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco. Chantageia o Congresso com a história de que não terá dinheiro para pagar os servidores e o Auxílio Brasil, programa que substituirá o Bolsa Família, se a PEC dos Precatórios não for aprovada. A medida é polêmica porque agrava o deficit fiscal e gera muita insegurança política. Além disso, inflação e desemprego agravam a crise social e são o caldo de cultura para maior radicalização política.
Integrantes do Centrão veem governo Bolsonaro como 'canoa furada'
Grupo de partidos marcados por ideologias distintas tem sido o fiador do governo no Congresso, mas o relacionamento corre o risco de ser abreviado por conta do desempenho eleitoral de Bolsonaro no ano que vem
Ingrid Soares e Israel Medeiros / Correio Braziliense
Com frequentes crises, investigações de corrupção e polêmicas, o governo do presidente Jair Bolsonaro se sustenta graças ao Centrão. Em troca de cargos e prestígio político para se perpetuar no poder, esse grupo, formado por diversos partidos com identidades distintas, tem sido a base governista. À medida que a situação de Bolsonaro se complica, no entanto, o relacionamento que resultou em Ciro Nogueira (PP-PI) – que já foi aliado do PT – na Casa Civil, parece ter os dias contados.
A pesquisa XP/Ipespe, divulgada na semana passada, mostrou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ampliou a vantagem na disputa pelo Planalto em 2022. O petista aparece com 40%, 2 pontos percentuais a mais que no levantamento anterior, enquanto Bolsonaro tem 24%, 2 pontos a menos que na última sondagem. Já a rejeição ao nome do presidente no pleito chegou a 61%, contra 45% de Lula. Somado a isso, o chefe do Executivo não tem conseguido dar prosseguimento a projetos prioritários do governo como as reformas tributária e administrativa em meio a uma escalada contra o Judiciário.
Aliados do governo já enxergam a gestão de Bolsonaro como uma “canoa furada” e ensaiam um desembarque, rumo à candidatura de Lula. Faltando aproximadamente um ano e dois meses para o pleito de 2022, a situação desses partidos começa a se definir e os políticos terão de decidir qual caminho será mais benéfico para eles eleitoralmente. No caso de Ciro Nogueira, por exemplo, há a intenção de se candidatar ao governo do Piauí, estado nordestino com grande potencial de voto petista. Vale lembrar que o atual governador, Wellington Dias, é do PT. Não seria uma surpresa, portanto, se Nogueira ignorasse o fato de ser “a alma do governo” — como foi apelidado por Bolsonaro — e corresse para os braços de Lula.
O cientista político Cristiano Noronha, da consultoria Arko Advice, ressalta que, apesar do derretimento da popularidade do mandatário, há um timing para o Centrão decidir se mudará de lado ou se seguirá apoiando o governo, o que deve coincidir com o período eleitoral, no começo de abril do próximo ano.
No entanto, destaca, ainda não é de interesse do bloco deixar o governo. “Falta muito tempo até a eleição do próximo ano. Em um segundo ponto, no Brasil vigorou o aspecto da verticalização que condicionava as alianças no plano estadual e federal. Não há obrigação de obedecer à risca a coligação federal e isso cria a possibilidade de que tenham outro candidato em âmbito local se for conveniente para eles”, explica.
Mesmo que o Centrão apoie outro candidato em 2022, acredita, não significa que Bolsonaro ficará totalmente descoberto. “O centrão não tem problema em apoiar um candidato à presidência e, eventualmente ganhando outro, ele se associar. Existem tipos de abandono. Podem apoiar outro candidato, mas abandono não significa apoiar um impeachment, por exemplo”.
“Se o Centrão sair do governo não necessariamente significa grande derrota pois se Bolsonaro for reeleito, eles poderiam voltar ao poder. Vão esperar o máximo que puderem. É uma decisão que será tomada só no ano que vem. Além disso, não são um bloco que age unido. Pode ser que conte com o apoio de alguns partidos do Centrão em alguns estados. Creio que vão analisar e levar em consideração a característica local. Mas claro, no âmbito federal o presidente não terá todos os partidos do centro compondo na chapa dele”, acrescenta.
Cenário de negociação intensa
O analista político do portal Inteligência Política, Melillo Dinis, destaca que a inconstância do chefe do Executivo é um cenário positivo para o Centrão, que aumenta seu preço, amplia os recursos e as manobras de captura do orçamento público e impõe maiores ganhos dos espaços de poder. “Bolsonaro vive da colisão entre os Poderes e a submissão ao grupo. Neste zigue-zague permanente de tensões, Bolsonaro tem um projeto de reeleição e uma permanente tentação autoritária. O presidente não tem um partido para chamar de seu. Está sozinho no espectro partidário e ainda não conseguiu um que se doe inteiramente ao modelo que deseja. A estratégia da maioria dos atuais partidos é sobreviver aos limites da legislação que exigem investimentos em bancadas e não em candidatos para o executivo. Nessa linha, cada vez mais será necessário viver a solidão e a sofrência”, expõe.
Ricardo Caichiolo, cientista político do Ibmec-DF, afirma que se trata de um cenário de negociações intensas entre os partidos, mesmo a mais de um ano das eleições, envolvendo movimentações tanto por parte de Lula, de Bolsonaro, e da chamada “terceira via”.
“Fica claro que os partidos do Centrão, mais uma vez, serão pragmáticos e apoiarão o candidato que apresentar a melhor probabilidade de se sair vencedor no ano que vem. Tanto que o Republicanos e o Progressistas procuraram o petista para costurar acordos regionais, impulsionados pelas recentes pesquisas que o apontam na liderança da corrida presidencial”, avalia.
O presidente está em uma situação delicada diante do cenário pandêmico, de inflação e crise hídrica, analisa. “A grande aposta para a reversão desse cenário eleitoral desfavorável a ele é que a economia cresça em um ritmo mais acelerado no último trimestre de 2021 e ao longo de 2022, o que parece improvável”.
Diferentemente, o quadro que se pinta para 2022 é de um crescimento do PIB em torno de apenas 2%, combinado com um aumento da inflação e com uma taxa altíssima de desempregados. Por fim, referindo-se à chamada “terceira via”, o cenário atual é de dúvida quanto à possibilidade de que os atores envolvidos cheguem ao consenso quanto ao lançamento de um único nome”, continua. (IS e IM)
"Fica claro que os partidos do Centrão, mais uma vez, serão pragmáticos e apoiarão o candidato que apresentar a melhor probabilidade de se sair vencedor no ano que vem”
Melillo Dinis, analista político
Tendência de dispersão na campanha
O deputado Fábio Trad (PSD-MS) explica que o Centrão é uma força que só existe durante o mandato e que, por ser formado por vários partidos com identidades próprias, é natural que, em época de campanha eleitoral, o grupo fique disperso. “Na campanha, ele se dispersa com lideranças apoiando um ou outro. Não são uma força política de campanha, mas de mandato. Sobretudo no Nordeste, é possível que migrem aos poucos para a candidatura do Lula. Mas não haverá uma percepção orgânica súdita, como se fosse uma decisão unificada.”
Ele acredita que se Bolsonaro continuar na guerra declarada ao Supremo, há uma grande possibilidade de o Centrão desembarcar do governo. Fidelidade não é uma característica desse grupo. “Ele (o Centrão) não admite esse tipo de investida. Nós estamos observando que o Centrão foi que votou contra o voto impresso, por exemplo. A criminalização de decisões de ministros é reprimida pelo centrão. Se o Bolsonaro apostar nesse tensionamento, a tendência é desgastar mais ainda”, aponta.
Trad explica que seu partido, o PSD, tem tomado um posicionamento mais independente. “O presidente Kassab critica algumas posturas do presidente, mas a maioria da bancada tem a tendência de acompanhar o governo na maioria dos projetos. Ultimamente eu não tenho visto isso. Não é mais aquela adesão automática e incondicional, está aos poucos se aproximando de uma postura de análise prévia do que está sendo analisado e o partido tem se tornado mais independente”.
A legenda possui, por exemplo, o senador Omar Aziz (AM), no comando da CPI da covid. Ao mesmo tempo, o deputado governista Reinhold Stephanes Junior (PR), que tumultuou uma sessão da CPI no início de agosto, também é do mesmo partido. Há, portanto, diversidade de pensamentos.
Já o deputado de oposição Afonso Florence (PT-BA) lembra que o modelo de presidencialismo de coalizão, que vigora no país, obriga o chefe do Executivo a fazer acordos com partidos se quiser garantir a governabilidade. Florence aponta, no entanto, que independente dos acordos feitos por Bolsonaro com o centrão, o que não faltam são provas de que o chefe do Executivo cometeu crimes no exercício do mandato.
“Ele tem resiliência, mas a perda de popularidade tem sido tão rápida que de fato ele é um político que joga os aliados, os partidos de centro na incerteza. No plenário, é comum ver alguém que era nosso aliado, passou a votar com o governo e agora diz que Lula vai ganhar as eleições e quer voltar para o nosso lado”, revela.
O deputado, que já foi ministro do governo Dilma, pontua que, no caso dos partidos do Centrão, há convergências econômicas com o governo, o que faz com que a iminência de um governo progressista soe como ameaça a esses partidos. Daí, segundo ele, nascem iniciativas como a mudança do sistema de governo, o fim do financiamento público de campanhas (com o objetivo de limitar as candidaturas) e assim por diante.
Para o petista, a chegada de Ciro Nogueira à Casa Civil foi estratégica para o presidente do PP, que visa ser candidato a governador no Piauí no ano que vem. Por isso, para ele, vale a pena ser ministro do governo Bolsonaro, enquanto isso lhe render mídia espontânea. Por outro lado, a influência de Nogueira em temas legislativos também é benéfica. “Assumir um ministério é algo positivo para ele, um senador virar ministro. Por outro lado, eles (Centrão) também querem legislar. Estou coordenando a reforma tributária na oposição e eles estão pilotando-a”, opina o parlamentar. (IS e IM)
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/08/4945174-integrantes-do-centrao-veem-bolsonaro-como-canoa-furada-e-avaliam-desembarque.html
É a primeira vez que um presidente pede o impeachment de um ministro do STF
Bolsonaro entrega ao Senado pedido de impeachment de Moraes. A investida é reação à decisão do ministro de autorizar busca e apreensão contra 10 apoiadores do governo, como o deputado Otoni de Paula e o cantor Sérgio Reis, por incitar atos antidemocráticos
Augusto Fernandes e Luana Patriolino / Correio Braziliense
A semana, que começou com negociações para pacificar a relação entre Executivo e Judiciário, se encerra com novo round entre os dois Poderes. O presidente Jair Bolsonaro investiu novamente contra o Supremo Tribunal Federal (STF) ao apresentar ao Senado, ontem à noite, um pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes, ministro da Corte.
A ofensiva do chefe do governo ocorreu horas depois de o magistrado ter autorizado busca e apreensão de documentos e aparelhos eletrônicos de 10 bolsonaristas que estariam envolvidos na organização de uma manifestação para o 7 de Setembro em que uma das principais reivindicações seria a destituição dos 11 ministros do Supremo.
Mesmo não estando em Brasília, Bolsonaro autorizou que um assessor do Palácio do Planalto fosse à Secretaria-Geral do Senado para entregar o documento. É a primeira vez na história da República que um presidente pede o afastamento de um ministro do STF.
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
A reação do Supremo não tardou. Em nota, a Corte repudiou o ato de Bolsonaro “de oferecer denúncia contra um de seus integrantes por conta de decisões em inquérito chancelado pelo plenário da Corte”. “O Estado democrático de direito não tolera que um magistrado seja acusado por suas decisões, uma vez que devem ser questionadas nas vias recursais próprias, obedecido o devido processo legal”, destacou. “O STF, ao mesmo tempo em que manifesta total confiança na independência e imparcialidade do ministro Alexandre de Moraes, aguardará, de forma republicana, a deliberação do Senado Federal.”
Investigados
Entre os atingidos pela decisão de Moraes, estão o deputado Otoni de Paula (PSC-RJ), ex-vice-líder do governo na Câmara, e o cantor Sérgio Rei, que passarão a ser investigados pelo Supremo. O magistrado determinou à Polícia Federal o cumprimento dos mandados, após receber relatório da Procuradoria-Geral da República (PGR) revelando uma série de ameaças e ofensas contra os ministros do STF praticadas pelos organizadores do ato de 7 de setembro. A peça da PGR não foi assinada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, mas, sim, pela subprocuradora-geral Lindôra Araújo (veja reportagem abaixo).
De acordo com o documento, a atuação dos alvos da operação “não trata de mera retórica política de militante partidário, mas, sim, de atos materiais em curso, que podem atentar contra a democracia e o regular funcionamento de suas instituições”.
“O objetivo do levante seria forçar o governo e o Exército a ‘tomar uma posição’ em uma mobilização em Brasília em prol do voto impresso, bem como a destituição dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Para tanto, pretendem dar um ‘ultimato’ no presidente do Senado Federal, invadir o prédio do Supremo Tribunal Federal, ‘quebrar tudo’ e retirar os magistrados dos respectivos cargos ‘na marra’”, escreveu Lindôra.
A subprocuradora-geral da República e Moraes suspeitam de que a mobilização dos envolvidos no caso indique a atividade de uma organização com objetivo criminoso. O grupo tinha até iniciado uma “vaquinha” para juntar os recursos necessários ao financiamento do ato no feriado da Independência. Por meio de uma chave Pix, os organizadores receberam diversas doações particulares.
“As condutas dos investigados, narradas pela Procuradoria-Geral da República, revelam-se ilícitas e gravíssimas, constituindo ameaça ilegal à segurança dos ministros do Supremo Tribunal Federal e aos membros do Congresso Nacional, revestindo-se de claro intuito de, por meio de violência e grave ameaça, coagir e impedir o exercício da judicatura e da atividade parlamentar, atentando contra a independência dos Poderes Judiciário e Legislativo, com flagrante afronta à manutenção do Estado democrático de direito”, enfatizou Moraes.
Reis e Otoni
Sérgio Reis ingressou na mobilização em 25 de julho, em reunião num hotel de São Paulo. Ao discursar no evento, o cantor disse que “enquanto o Senado não tomar essa posição (afastamento dos ministros do STF), (os manifestantes irão) ficar em Brasília e não (sairão) de lá até isso acontecer” (Leia mais na página 4).
No dia seguinte, Otoni de Paula manifestou apoio ao ato em uma rede social. “Dia 7 de setembro, temos que ir às ruas com pauta única — Art. 52 da CF (Constituição Federal). Temos de forçar o Senado Federal a abrir processo de impeachment contra Moraes e Barroso. Ou eles abrem o impeachment contra Moraes e Barroso, ou paramos o país por tempo indeterminado”, escreveu. De acordo com a PGR, a conduta do deputado não se insere na esfera abrangida pela imunidade parlamentar material constitucionalmente prevista.
As providências
- Instauração de inquérito contra os 10 alvos
- Busca e apreensão de documentos/bens de todos os envolvidos que se relacionem aos fatos e delitos sob apuração, bem como de celulares, computadores, tablets e quaisquer outros dispositivos eletrônicos, bem como a perícia dos aparelhos
- Depoimento de todos à Polícia Federal
- Manter distância do prédio do STF de pelo menos 1km, à exceção de Otoni de Paula
- Bloqueio dos perfis nas redes sociais de cada um dos envolvidos
- Bloqueio da chave Pix que era utilizada pelos bolsonaristas para juntar recursos para custear a manifestação
- Proibição de que os alvos da operação mantenham algum tipo de contato ou usem as redes sociais. Eles também foram impedidos de participar de manifestações no DF
Aras se absteve de assinar relatório da PGR
O procurador-geral da República, Augusto Aras, se absteve de assinar o relatório da Procuradoria-Geral da República (PGR) com os detalhes da organização de uma manifestação para o Dia da Independência, liderada por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. O cantor Sérgio Reis e o deputado Otoni de Paula (PSC-RJ) foram apontados pelo Ministério Público Federal como alguns dos mentores dessa mobilização, que incitava a prática de atos violentos e ameaçadores contra a democracia.
Em meio ao processo de recondução para um novo mandato de dois anos à frente da PGR, Aras tem evitado se manifestar em nome da instituição diante de inquéritos mais polêmicos. Nesta semana, inclusive, depois de ser cobrado a se posicionar sobre processos que envolvem Bolsonaro, ele encaminhou um ofício ao STF informando que atuará nas apurações e ações penais “apenas em casos pontuais”.
Aras também declarou que tem se reservado “ordinariamente” à atuação pessoal em processos judiciais que buscam examinar a constitucionalidade de uma lei ou ato normativo ou em processos na esfera cível em que a competência originária é do STF.
O procurador-geral delegou à subprocuradora-geral Lindôra Araújo assinar a peça elaborada pela PGR que baseou a determinação de ontem de Moraes. Além de ter tomado essa decisão para se resguardar na esfera política, de olho na aprovação para continuar no cargo, o intuito de Aras foi mostrar que a Procuradoria não está se escondendo diante de inquéritos que, de alguma forma, têm relação com Bolsonaro.
No início do mês, por exemplo, 27 subprocuradores-gerais assinaram um comunicado no qual frisaram que “incumbe prioritariamente ao Ministério Público a incondicional defesa do regime democrático, com efetivo protagonismo, seja mediante apuração e acusação penal, seja por manifestações que lhe são reclamadas pelo Poder Judiciário” e pontuaram que as atividades de um PGR “hão de ser exercidas em estrita sintonia com os deveres de defesa da ordem jurídica e do regime democrático”.
Por meio de nota, a PGR explicou que Lindôra assinou a petição no lugar de Aras porque, desde 2020, a subprocuradora atua em matéria penal no STF, por delegação do procurador-geral da República. (AF e LP)
Ataque do presidente atinge Mendonça
A ofensiva do presidente Jair Bolsonaro contra o ministro Alexandre de Moraes, ao pedir ao Senado o impeachment do magistrado do Supremo Tribunal Federal (STF), atingirá o ex-advogado-geral da União André Mendonça, que busca a aprovação do seu nome à vaga na Corte.
Indicado ao posto por Bolsonaro, Mendonça tem de ser aprovado em sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Mas as informações de bastidores são de que o presidente do colegiado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), não vai mais pautar a oitiva do ex-AGU. O político amapaense teria considerado grave a iniciativa do chefe do Planalto de pleitear o impedimento de um ministro do Supremo.
Desde que foi indicado, Mendonça pediu exoneração do cargo na Advocacia-Geral da União, com o objetivo de se dedicar a trabalhar por sua aprovação na CCJ. Ele já se encontrou com diversos senadores para pedir apoio.
Na quinta-feira, Pacheco encaminhou a indicação dele à CCJ, mas a data da sabatina ainda não tinha sido marcada. Alcolumbre já resistia ao nome do ex-AGU, devido a uma mágoa com Bolsonaro, por não ter assumido um ministério depois de ter saído da Presidência do Senado.
Articulação
Nos últimos dias, Mendonça ligou para Alcolumbre com a intenção de marcar uma audiência. O senador chegou a sinalizar disposição para o diálogo. Pesou para a decisão dele a articulação do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, que pediu pessoalmente ao presidente da CCJ que não ignorasse o indicado do chefe do Planalto. Agora, o senador deve sepultar de vez as pretensões do ex-advogado-geral da União.
A iniciativa de Bolsonaro de designar Mendonça ao STF representa o pagamento da promessa feita a líderes aliados de indicar um ministro “terrivelmente evangélico” para a Corte. Pastor da Igreja Presbiteriana Esperança de Brasília, Mendonça, de 48 anos, representa um setor que o presidente considera estratégico para suas pretensões à reeleição em 2022.
Pacheco vai rejeitar pedido de Bolsonaro
Em mais um capítulo do tensionamento entre os Poderes, o presidente Jair Bolsonaro protocolou, no Senado, um pedido de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). O chefe do Executivo viajou a São Paulo, para visitar familiares, e deixou a cargo de um auxiliar a entrega da peça.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já adiantou que a solicitação não deve ser acatada. “Não antevejo fundamentos para impeachment de ministro do Supremo, como também não antevejo em relação a impeachment de presidente da República”, afirmou.
No último dia 14, Bolsonaro subiu o tom dos ataques à cúpula do Judiciário, depois da prisão do aliado Roberto Jefferson, presidente do PTB, por ordem de Moraes. O chefe do Executivo também está enfurecido por ter sido incluído, pelo magistrado, no inquérito das fake news. Por meio das redes sociais, ele avisou que apresentaria ao Senado, nesta semana, um pedido de abertura de processos contra o ministro e contra o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso.
No documento protocolado no Senado, Bolsonaro citou a inclusão do nome dele no inquérito das fake news e afirmou que, como presidente, tem sido alvo de críticas. “Da mesma forma, os membros dos demais Poderes, inclusive dos tribunais superiores, devem ‘submeter-se ao escrutínio público e ao debate político’, justificou.
Ele destacou, também, que “o Judiciário brasileiro, com fundamento nos princípios constitucionais, tem ocupado um verdadeiro espaço político no cotidiano do país”. Alegou, por fim, “ter plena convicção de que não praticou nenhum delito”.
Horas depois, Bolsonaro disse que o alvo seguinte será Barroso. “Priorizamos esse pedido do senhor Alexandre de Moraes e, nos próximos dias, ultimaremos o segundo pedido”, afirmou, em Eldorado (SP), onde reside a mãe dele.
O presidente voltou a falar em ruptura institucional. “Não podemos, ao ser (sic) atacados e tendo o poder de usar uma caneta para contra-atacar, usá-la. Temos de ter tranquilidade, caso contrário, o Brasil pode mergulhar em uma situação que ninguém quer. Já disse que sei das consequências internas e externas de uma ruptura. Não quero isso, não provoco e não desejo”, acrescentou.
Diálogo
Pacheco disse que mantém diálogo com Bolsonaro, apesar da investida do chefe do Planalto contra integrantes do Supremo. O senador não deixou de fazer críticas, declarando que o Congresso dará “pronta e qualquer resposta a quem queira sacrificar a democracia brasileira”.
O presidente do Senado declarou que vai analisar os critérios técnicos e políticos para tomar uma providência sobre o pedido. Disse que decidirá “com firmeza e absoluto respeito à democracia”. “Não vamos nos render a nenhum tipo de investida que seja para desunir o Brasil. Nós vamos buscar convergir o país, contem comigo para essa união, e não para essa divisão.” (Com Agência Estado)
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/08/4945068-e-a-primeira-vez-que-um-presidente-da-republica-pede-o-impeachment-de-um-ministro-do-stf.html
Bolsonaro protocola pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes do STF
O documento foi protocolado por um auxiliar do mandatário no final da tarde. O chefe do Executivo está em São Paulo, em visita a familiares. Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, viajou para Minas Gerais, sua terra natal para passar o final de semana
Ingrid Soares / Correio Braziliense
O presidente Jair Bolsonaro protocolou nesta sexta-feira (20/08) o pedido de impeachment ao Senado do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. O documento foi protocolado por um auxiliar do mandatário no final da tarde. O chefe do Executivo está em São Paulo, em visita a familiares. Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, viajou para Minas Gerais, sua terra natal para passar o final de semana.
A entrega dos processo, além de um gesto político é ainda um aceno do presidente ao eleitorado ao ver cumprida sua promessa. Ainda hoje, o ministro da Corte, Moraes proibiu o cantor Sérgio Reis e outros oito investigados pela Polícia Federal de se aproximaram da Praça dos Três Poderes, dos ministros do Supremo e de senadores, atendendo a um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) que apura incitação a atos violentos e ameaças contra a democracia.
Na publicação, o presidente voltou a fazer ameaças contra a democracia. "Todos sabem das consequências, internas e externas, de uma ruptura institucional, a qual não provocamos ou desejamos", escreveu. "De há muito, os ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, extrapolam com atos os limites constitucionais"..
MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES - STF
O chefe do Planalto acrescentou: "Na próxima semana, levarei ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, um pedido para que instaure um processo sobre ambos, de acordo com o art. 52 da Constituição Federal. Lembro que, por ocasião de sua sabatina no Senado, o sr. Alexandre de Moraes declarou: ‘Reafirmo minha independência, meu compromisso com a Constituição e minha devoção com as liberdades individuais".
O artigo 52 atribui ao Senado a competência para julgar crimes de responsabilidade de ministros do Supremo, o que pode levar à perda dos seus cargos por impeachment. Desde a promulgação da Constituição, esse dispositivo nunca foi aplicado pela Casa.
Bolsonaro concluiu a mensagem dizendo que "o povo brasileiro não aceitará passivamente que direitos e garantias fundamentais (art. 5º da CF), como o da liberdade de expressão, continuem a ser violados e punidos com prisões arbitrárias, justamente por quem deveria defendê-los".
Apesar de ter sido aconselhado por aliados a recuar, o presidente repetiu no dia 17 que apresentaria ao Senado os pedidos, mas alegou que não vai interferir na decisão dos senadores "cooptando-os". "Eu vou entrar com pedido de impedimento dos ministros no Senado, colocar lá. O local é lá. O que o Senado vai fazer? Está com o Senado agora, independência. Não vou agora tentar cooptar senadores, de uma forma ou de outra, oferecendo uma coisa para eles etc etc etc, para votar o impeachment deles".
Ainda em meio à crise entre os poderes, ao desembarcar em Brasília ontem após viagem a Cuiabá, o mandatário se reuniu ontem com o ministro da AGU (Advocacia-Geral da União), Bruno Bianco, no Palácio do Planalto para acertar os detalhes dos pedidos de impeachment de Barroso e de Moraes. O encontro não estava previsto na agenda dos dois.https://075b04f0925d8f36cd3ae4d663c5dd94.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html
No último dia 19, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), afirmou que não é recomendável neste momento de retomada para o Brasil um pedido de impeachment de ministro do Supremo Tribunal Federal ou de presidente da República. Os ministros da Corte confiam que Pacheco não dê prosseguimento ao pedido.
Ainda ontem, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), o chefe do Executivo entrou com ação no Supremo Tribunal Federal, pedindo a suspensão do artigo 53 do regimento interno da Corte, que permite a abertura de investigações de ofício, sem aval do Ministério Público Federal. Foi por meio desse dispositivo que, em 2019, o então presidente do Supremo, Dias Toffoli, instaurou a investigação sobre fake news.
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/08/4944984-bolsonaro-protocola-pedido-de-impeachment-a-ministros-do-stf.html
Luiz Carlos Azedo: A crise não viaja
Bolsonaro está em guerra com o Judiciário, que pretende subjugar. Primeiro, nomeando aliados; segundo, pelo confronto com o Supremo, que pretende intimidar
Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense
Toda vez que o presidente José Sarney viajava para o exterior, o então senador Fernando Henrique Cardoso dizia, maledicente: “A crise viajou”. Mais tarde, viria a exercer dois mandatos na Presidência, passando também por seus dissabores. Hoje, os ex-presidentes têm bom relacionamento, mas jamais se tornaram amigos. O presidente Jair Bolsonaro, porém, viaja muito pouco para o exterior. Ninguém o convida para compromissos bilaterais, e sua ida aos foros internacionais são puro desgaste, pela péssima imagem que tem no exterior. Com ele, a crise não viaja.
Políticas interna e externa não são assimétricas; quando isso ocorre, pode terminar muito mal, como no caso do governo de Jânio Quadros, cujo cavalo de pau no Itamaraty, ao condecorar Che Guevara em plena Guerra Fria, deixou-o em rota de colisão com os aliados, principalmente Carlos Lacerda, então governador da antiga Guanabara. Essa crise resultou na sua inopinada renúncia. A longo prazo, os eixos duradouros da política externa são as relações comerciais e a identidade nacional, muito mais do que a momentânea orientação política de governo. Hoje, a divisão internacional do trabalho nos reserva papel estratégico como produtor agrícola e de minérios e faz da China nosso principal parceiro comercial; em contrapartida, do ponto de vista identitário, o americanismo se amalgama à herança cultura ibérica, o que nos afasta do velho nacionalismo latino-americano.
Entretanto, politicamente, vivemos um ponto fora da curva no governo Bolsonaro. O presidente da República atua para nos colocar no eixo de países cujos governantes foram eleitos em pleitos manipulados, seja pelas regras do jogo, seja pelo controle dos meios de comunicação e/ou pela intimidação da oposição. Como o presidente da Federação Russa, Vladimir Putin, que ao assumir não tinha uma estratégia, Bolsonaro se movimenta exclusivamente para continuar no poder, com a diferença de que o líder russo sempre manteve alta popularidade, enquanto a sua derrete. Controle das Forças Armadas, dos serviços de segurança, do Ministério Público, do Judiciário; aliança com oligarcas amigos e
com a Igreja Ortodoxa Russa garantem a longa permanência de Putin no poder.
Controlar o Judiciário é uma via de passagem para o autoritarismo. Na Hungria de János Áder, no poder desde 2012, juízes foram forçados a renunciar, e o regime fez 1.284 nomeações políticas. Os que sobraram perderam autonomia. Aqueles que permaneceram em suas funções tiveram sua autonomia confrontada. Na Turquia, 4,5 mil juízes foram presos e espoliados, nos últimos cinco anos, pelo governo de Tayyip Erdogan. Centenas continuam presos.
O atual presidente da Polônia, Andrzej Duda, do Partido Lei e Justiça, para se reeleger, gastou 40 milhões de euros com uma rede de fake news contra o Judiciário, com apoio do Ministério da Justiça e do Ministério Público. Essas denúncias são do presidente da Associação Europeia de Juízes, José Igreja Matos, desembargador na cidade do Porto, em palestra virtual para magistrados brasileiros, segundo nos relata a jornalista Maria Cristina Fernandes, em sua coluna de ontem, no Valor Econômico.
Supremo
Esse é o eixo de extrema-direita ao qual pertence Bolsonaro, depois da derrota do ex-presidente Donald Trump, nos Estados Unidos, e do ex-primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, em Israel. Com nenhum desses países, inclusive a Rússia, o Brasil tem relações comerciais robustas para sustentar essa política externa. Mas o que importa é o modelo. Bolsonaro está em guerra com o Judiciário, que pretende subjugar.
Primeiro, nomeando aliados para cargos estratégicos, como o procurador-geral da República, Augusto Aras, que pretende reconduzir, e o ex-advogado-geral da União e pastor evangélico André Luiz de Almeida Mendonça, indicado para a vaga do ex-ministro Marco Aurélio Mello no Supremo Tribunal Federal (STF). Ambos serão sabatinados no Senado, que pode homologar ou não seus nomes. É do jogo.
Segundo, pelo confronto com o STF, que pretende intimidar com a ameaça de um golpe de Estado. Não é do jogo. A cassação de Hermes Lima, Evandro Lins e Silva e Victor Nunes Leal pelo regime militar, que provocou a renúncia dos ministros Antônio Carlos Lafayette de Andrada e Antônio Gonçalves de Oliveira, é um trauma no Supremo até hoje. Em 1971, o ministro Adaucto Lúcio Cardoso abandonou o plenário ao ser o único contrário à lei da censura prévia, editada pelo governo Médici. A regra permitia que censores ocupassem as redações dos jornais e vetassem a publicação de textos. Votou contra e renunciou ao cargo.
Bolsonaro sobre Mendonça no STF: 'Deus se fará mais presente'
O presidente destacou que "um ou outro" ministro da Corte atrapalha o governo, mas que com a aprovação de Mendonça para uma das cadeiras, toda sessão começará com uma oração, o que deverá trazer "harmonia" para a tomada de decisões. Ele disse ainda que, por vezes, não é muito feliz nas declarações, mas "sempre fala a verdade"
Ingrid Soares / Correio Braziliense
O presidente Jair Bolsonaro afirmou, nesta quarta-feira (18/08) que caso a indicação de André Mendonça seja aprovada pelo Senado, "Deus se fará mais presente naquela instituição". A declaração ocorreu durante cerimônia alusiva ao Centenário da Convenção de Ministros e Igrejas Assembleia de Deus em Ananindeua, no Pará.
"Na vida militar, eu aprendi que, pior que uma decisão mal tomada, é uma indecisão. Tenho os meus conselheiros, procuro, ao tomar decisões, ouvir, em especial, os mais velhos, os mais experientes, porque bem sei que, da minha caneta, tudo pode acontecer. Sabia que a missão ia ser difícil. Sabia das dificuldades, sabia que quase tudo que nós fazemos passa pelo parlamento. Temos tido um bom retorno do parlamento", alegou.
Bolsonaro destacou ainda que "um ou outro" ministro da Corte atrapalha o governo, mas que, com a aprovação de Mendonça para uma das cadeiras, toda sessão começará com uma oração, o que deverá trazer "harmonia" para a tomada de decisões. O presidente da República tem sofrido reveses do Supremo e atacado os componentes, em especial os ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso.
"Terrivelmente evangélico"
"Sabemos que o outro poder ao lado, o STF, uma ou outra pessoa iria nos atrapalhar. Mas acreditamos que este Supremo, assim como o parlamento, assim como o Executivo, aos poucos vai mudando. Mais que um compromisso com vocês, um compromisso com a minha consciência, em indicar para uma das duas vagas no STF um irmão nosso terrivelmente evangélico", comentou Bolsonaro.
"Tenho conversado muito com o pastor André Mendonça, porque a vida dele também vai mudar, as suas responsabilidades serão majoradas. Decisões difíceis ele tomará também. Mas fiz um pedido pra ele. Ou melhor, uma missão eu dei pra ele, e ele se comprometeu que irá cumprir. Toda primeira sessão da semana, no STF, ele pedirá a palavra e iniciarão os trabalhos após uma oração", acrescentou o presidente.
"Podem ter certeza, Deus se fará mais presente naquela instituição, onde entra a palavra de Deus entra harmonia, entra a paz, entra a prosperidade. Em 2023, quem, porventura, for eleito presidente em 22 indicará no primeiro semestre mais dois integrantes para aquela Corte. Tenho certeza de que nós vamos mudando o Brasil", acrescentou.
A exemplo do discurso feito pela manhã no Amazonas, o chefe do Executivo voltou a culpar governadores pela inflação. "Temos um governo que respeita a Constituição, em nenhum momento fechou comércio, decretou toque de recolher, não fechou igrejas, um governo que respeita as leis, ao seu povo e reafirma que o norte do destino da nossa pátria sempre tendo ele a frente vamos no sentido onde esse povo assim o desejar".
Bolsonaro assumiu também que, por vezes, "tropeça nas palavras" e "não é muito feliz em seus posicionamentos". Mas voltou a repetir indiretas a líderes estaduais. "Temos um presidente que pode, por vezes, tropeçar nas palavras. Pode, às vezes, não ser muito feliz nos seus posicionamentos. Mas vocês têm um presidente que fala a verdade, acima de tudo. Um governo que não engana seu povo, que não procura usar palavras macias, suaves para poder atingir objetivo que não interessa a sua nação", concluiu.
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/08/4944509-bolsonaro-sobre-mendonca-no-stf-deus-se-fara-mais-presente.html
'Eleições têm sido livres e justas', diz procurador Luiz Carlos Gonçalves
Procurador também comemora a retirada do distritão da PEC da Reforma Eleitoral. "Nós escapamos de um gravíssimo retrocesso"
Carlos Alexandre de Souza e João Vitor Tavarez* / Correio Braziliense
A pouco mais de um ano para as eleições, a reforma eleitoral, em tramitação no Congresso, prevê mudanças para o pleito, como a volta das coligações, aprovada em dois turnos na Câmara e que, agora, será avaliada pelo Senado. Para Luiz Carlos Gonçalves, procurador regional da República, o debate é normal na democracia. “Nós escapamos de um gravíssimo retrocesso, que era o distritão. Esse mecanismo acabaria com o sistema proporcional, como temos hoje, o que levaria ao fim do compartilhamento do poder”, comentou, em entrevista ao CB.Poder. Veja os principais trechos da entrevista.
Falta pouco mais de um ano para as eleições. No entanto, as regras do sistema vêm sendo questionadas reiteradamente. Isso não confunde os eleitores?
Sim, sobretudo as narrativas de que urnas eletrônicas são fraudulentas e que, por isso, as eleições correm risco. Esse tipo de comportamento é antidemocrático e contrário à Constituição. As eleições brasileiras têm sido livres e justas, e a urna eletrônica vem sendo desafiada e passando, com aprovação, por vários testes, inclusive diante de comissões internacionais. Os anos ímpares, normalmente, são usados para o aperfeiçoamento da legislação eleitoral e para celebrar mudanças.
Como avalia as discussões em torno da reforma eleitoral, nesta semana, no Congresso?
Nós escapamos de um gravíssimo retrocesso, que era o distritão. Esse mecanismo acabaria com o sistema proporcional, como temos hoje, o que levaria ao fim do compartilhamento do poder. Hoje, um partido faz mais deputados, assim como seus adversários. Isso colabora para que todos os segmentos sociais estejam representados no Parlamento. A volta das coligações (aprovada pela Câmara), eu entendo que seja muito ruim.
Um dos pontos da reforma diz respeito a crimes eleitorais, no sentido de limitar o poder de ação da Justiça, assim como abrandar ilícitos. Como analisa esse movimento?
Está em tramitação um projeto de novo Código Eleitoral, que atende a uma necessidade real, visto que o atual dispositivo é de 1965. Está muito defasado, pois há trechos que atritam com a Constituição. Depois, houve o surgimento de um conjunto de leis eleitorais esparsas e desarmoniosas. A vinda de um novo Código é benfazejo. O novo regulamento trata de processo penal eleitoral. Inclusive, reduz o número de crimes e redimensiona para penas mais severas.
Existe muita desconfiança dos eleitores em relação ao processo eleitoral. A reforma do Código Eleitoral e outras iniciativas resolverão isso?
Acabei de elogiar o projeto do novo código, mas também preciso criticá-lo: ele diminui a transparência dos gastos partidários. Isto é, o espaço que a Justiça Eleitoral tem para verificar como os partidos usaram o recurso público. Então, o projeto, nesse sentido, vai muito mal. Ele cria um prazo inexequível para que a Justiça Eleitoral examine as contas, afrouxa a sanção para o partido que uso mal o recurso, enfim, dificulta a transparência em relação a esse tema tão importante. Outro aspecto que abala a confiança do eleitorado é a reintrodução da propaganda partidária. Esse horário foi extinto justamente porque os recursos usados para financiá-lo seriam aqueles contidos no Fundo Especial de Financiamento de Campanha.
Na sua avaliação, o projeto do novo Código Eleitoral atende bem a questão das notícias falsas. Por quê?
O projeto criminaliza esse comportamento do discurso de ódio e mentiroso e, portanto, abre espaço para atuação criminal em relação a isso. Também prevê multa para candidatos, partidos, coligações e apoiadores que promoverem mentiras, discursos de ódio e manipulação, ou seja, prevê medidas criminais e cíveis.
Quando o crime eleitoral começa a ser tipificado?
Como estamos tratando de uma disciplina eleitoral, a abrangência refere-se mesmo às eleições. Entretanto, alguns comportamentos ilícitos no âmbito eleitoral podem ocorrer a qualquer tempo. Por exemplo, o abuso de poder e o uso indevido de recursos. Tudo isso não tem tempo certo para ocorrer.
Isso tem relação com a live em que Bolsonaro ataca ministros e a legitimidade das eleições?
Prefiro não fazer referência a nenhum caso concreto. Até porque, no Ministério Público, há uma regra muito importante: a independência funcional. Portanto, há colegas que têm a atribuição legal e constitucional de, eventualmente, levar ao Judiciário condutas de altas autoridades. Mas o que se pode dizer, como regra geral, é que o uso de recursos públicos em prol de campanhas eleitorais não se permite.
* Estagiário sob supervisão de Cida Barbosa
Assista a íntegra da entrevista:
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/08/4944348-eleicoes-tem-sido-livres-e-justas-diz-procurador-luiz-carlos-goncalves.html
Polícia Civil do DF abre inquérito contra Sergio Reis após áudio
PCDF irá investigar suposta associação voltada a cometimento de crime em manifestações previstas para setembro. Em áudio, cantor e ex-deputado disse que no dia 8 de setembro daria prazo para que Senado retirasse ministros do STF, e que se isso não acontecesse, país iria parar
Sarah Teófilo / Correio Braziliense
A Polícia Civil do Distrito Federal abriu inquérito para apurar suposta associação para cometimento de crimes em manifestações previstas para setembro. A apuração, que está com o Departamento de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Decor), teve início após a circulação de vídeos e de áudios de pessoas, dentre eles o cantor e ex-deputado federal Sergio Reis, manifestando-se no sentido de cometer os crimes de ameaça, dano e atentado contra a segurança de meio de transporte.
No último fim de semana, o cantor divulgou vídeo afirmando que caminhoneiros e agricultores estavam organizando um movimento "para salvar o país", entre os dias 4 e 6 de setembro, mas não no dia 7, para não atrapalhar o desfile tradicional do presidente na data, em Brasília. "Depois ficamos acampados. (...). Eles vão se assustar com o movimento, mas a gente é da paz. Estamos nos preparando judicialmente para fazer uma coisa séria, para que o Exército tome uma posição, o governo tome uma posição", afirmou.
Depois, um áudio do cantor passou a circular. Nele, o cantor fala de forma mais clara sobre o motivo do movimento, com ameaças ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Senado. No áudio, ele comenta ter participado de um almoço com o presidente Jair Bolsonaro, ministros de Estado e os comandantes das Forças Armadas. "São pessoas importantes que não tinham ideia do que estava sendo preparado pelos caminhoneiros", disse.
Sérgio Reis afirmou que estava se organizando para ir ao Senado no dia 8 de setembro, se encontrar com o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para entregar uma "intimação" junto com dois líderes dos caminhoneiros e dois líderes do sindicato da soja. "Vão receber um documento com 72 horas para aprovar o voto impresso e para tirar todos os ministros do STF. Não é um pedido, é uma ordem. É assim que vou falar com o presidente do Senado", disse.
O cantor ainda pontuou que se não for cumprida a "intimação", darão mais 72 horas, mas que nesse período irão parar o país. No áudio, Reis diz que nada andará pelas estradas, nem carros, nem ônibus, apenas ambulâncias e polícias. "E se em 30 dias eles não tirarem aqueles caras (referindo-se aos ministros do STF), nós vamos invadir, quebrar tudo e tirar os caras na marra", afirmou.
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/08/4944174-policia-civil-do-df-abre-inquerito-contra-sergio-reis-apos-audio.html
Luiz Carlos Azedo: Novos amigos de Cabul
As cenas dos afegãos despencando do avião da USAF durante a decolagem no aeroporto de Cabul são piores do que as da retirada dos funcionários da Embaixada dos Estados Unidos em Saigon
Alexander Burnes, agente da Companhia Britânica das Índias, em 1838, recebeu de Lord Auckland, o governador-geral de Calcutá, a missão de negociar com Dost Mohammed, o Emir do Afeganistão, um pacto com o Império Britânico. Ao chegar em Cabul, lá estava o Conde Vitkevitch, representante da Rússia. Era o “Grande Jogo” da Ásia, no qual a Rainha Vitória disputava com o Czar Nicolau I o controle da Eurásia. O pedregoso território afegão, entre o Cáucaso e a Índia, separando o Irã da Turcomênia, era estratégico para as duas potências. No ano seguinte, 16,5 mil ingleses, indianos e dissidentes afegãos da Army of the Hindus tomaram Cabul. Dost Mohammed rendeu-se em novembro de 1840 e foi encarcerado na Índia.
Burnes transformou sua residência oficial num harém, enquanto os demais invasores profanavam os lares afegãos. Em 1841, os humilhados afegãos se revoltaram, invadiram a casa de Burnes e o esquartejaram. Veterano das Guerras Napoleônicas, o general Elphinston negociou com Akbar, o filho de Dost Mohammed, em 2 de janeiro de 1842, a retirada das tropas britânicas, que estavam sitiadas. Ao atravessarem o passo de Khoord-Cabool, a montanha desabou: pedras em avalanches, tiros de jezails (o fuzil de cano longo afegão), flechas e lanças dizimaram as tropas britânicas. Somente restou vivo o Dr. Brydon, o médico, que escapou a cavalo dos altos do Hindu Kush.
Na Terceira Guerra Anglo-Afegã, em 1919, num acordo com os ingleses, o Afeganistão tornou-se um Estado-tampão na fronteira da Índia. A partir de 1926, uma monarquia sobreviveu até 1973, quando o rei Zair foi derrubado pelos republicanos. Em 1978, com apoio de tropas soviéticas, um golpe de Estado implantou um regime socialista, sob forte resistência dos rebeldes mujahedins, armados e financiados pelos EUA. Em 27 de setembro de 1996, as forças talibãs, constituídas de ex-estudantes fundamentalistas, derrubaram o presidente, capturaram Cabul e passaram a controlar grande parte do país, formando um governo de coalizão.
Mas houve o atentado da Al-Qaeda às Torres Gêmeas, os EUA invadiram o Afeganistão e retiraram os talibans do poder. Hamid Karzai foi escolhido presidente por George W. Bush. Nas eleições de 2004, a maioria dos 17 candidatos da oposição alegou fraude e não reconheceu o governo de Karzai, que incluía membros da Aliança do Norte, um grupo político formado pela majoritária etnia Pashtun. Em 2014, Asharaf Ghani foi eleito e empossado presidente do país no lugar do corrupto Karzai, mas seu destino já estava traçado. O governo Trump decidiria retirar as tropas norte-americanas do país. O novo presidente, Joe Biden, manteve a decisão e ordenou a saída até setembro, uma de suas promessas de campanha. Houve o desastre: o Talibã avançou rapidamente, as tropas governistas não resistiram e abandonaram Cabul. Ghani escafedeu-se.
Rota da Seda
A história se repete como tragédia. A Casa Branca nega comparações com a retirada do Vietnã, mas as cenas dos afegãos despencando do avião da USAF durante a decolagem, ontem, são piores do que as da dramática retirada dos funcionários da embaixada norte-americana em Saigon. Essa conta ficou para Biden. Entretanto, no “Grande Jogo” da Eurásia, não é a Rússia que leva vantagem. A China tem 80 quilômetros de fronteira com o Afeganistão e contratos bilionários, que já negocia com o Emirado Islâmico do Afeganistão. Com 38 milhões de pessoas, o país possui reservas de minérios avaliadas entre US$ 1 trilhão e US$ 3 trilhões, incluindo o segundo maior depósito inexplorado de cobre do mundo.
Em julho, o ministro de relações internacionais da China, Wan Yi, recebeu a comissão de assuntos externos do Talibã, liderada por Abdul Ghani Baradar, na cidade chinesa de Tianjim. O resultado parece ter sido positivo para a China. Além de cobre, o Afeganistão tem reservas de ferro estimadas em US$ 420 bilhões e US$ 81 bilhões de nióbio, cruciais para a indústria chinesa. Em troca, Pequim oferece a infraestrutura necessária para o Afeganistão entrar na Nova Rota da Seda, megaprojeto mundial de construção de portos, estradas e ferrovias ligando três continentes: Ásia, África e Europa, bancado pelo governo chinês. O problema será estabilizar o país e moderar o fundamentalismo islâmico talibã.
Ayres Brito: ‘Só se passa o Brasil a limpo observando a Constituição’
Ana Dubeux / Correio Braziliense
Há um ano e cinco meses, o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto, segue rigorosa quarentena. Só sai de 15 em 15 dias para uma volta de carro, com máscara e sem descer do carro. “Pra isso é que serve o dever da responsabilidade individual e coletiva. Se, em tema de saúde pública, a Constituição brasileira é de primeira qualidade, por que eu vou ser de quinta?”, compara, nesta entrevista ao Correio.
De casa, o magistrado, poeta, árduo defensor da Constituição, Ayres Britto continua a refletir sobre o país e acompanhar os desdobramentos de uma crise sem precedentes na história do Brasil.
“Há muitas lições a colher de uma crise que, no fundo, é de quatro conteúdos: o sanitário, o político, o econômico e o social. Tudo imbricado. E quando os problemas são assim tão graves quanto imbricados, é necessário recorrer à única lei que tem resposta de qualidade para tudo. É a Constituição. Que governa quem governa. Que governa permanentemente quem governa transitoriamente”, explica.
Para ele, a Constituição é o que faz da democracia o “princípio dos princípios”, o que faz a vida coletiva gravitar em torno de instituições, e não de pessoas. “Por isso que, entre nós, não se pode impedir a imprensa de falar primeiro sobre as coisas, nem o Judiciário de falar por último. Por isso, se cuida de único regime a nos aquinhoar com uma antecipada certeza: nenhum eventual governante central subjetivamente autoritário vai conseguir nos impor um governo objetivamente autoritário”, defende.
Ayres Britto defende que é preciso fazer da Constituição mesa redonda para, em torno dela, buscar a saída da crise que já se aproxima de 570 mil mortes. Diz que a cidadania tem sido objeto de boicote e que a “Administração Pública não tem seguido uma trilha virtuosa” ao observar o tema saúde da população na Constituição.
“Mais uma vez, o que é preciso enfatizar é isto: somente se passa o Brasil juridicamente a limpo com a irrestrita observância da Constituição”, conclui.
Como a Justiça e o Direito se adaptaram às novas demandas da sociedade brasileira diante da pandemia?
O Direito está a serviço da vida, assim como a Justiça está a serviço do Direito. Por isso que, diante da emergência de uma vida coletiva sob gravíssima crise sanitária, ele, Direito, passou a se traduzir em leis declaratórias de um estado de emergência em todas as unidades da Federação brasileira. Estado de emergência, a seu turno, justificador de medidas administrativas de vacinação em massa, lockdown, distanciamento social e uso de máscaras, por exemplo. Com um mais expressivo financiamento público em toda a rede hospitalar do País e como pronto-socorro financeiro à população mais economicamente débil. Tudo, por sinal, conforme o disposto no art. 196 da Constituição, que impõe ao Estado a adoção das políticas econômicas e sociais que se fizerem necessárias à administração da saúde como direito de todos e dever do Estado mesmo. Já a Justiça, como termo sinônimo de Poder Judiciário, ela cuidou de otimizar as dimensões do real e do virtual da nossa vida em sociedade, com ênfase para esta última dimensão. Com o que está dando conta da efetivação da regra igualmente constitucional de que o acesso à jurisdição é o maior dos direitos adjetivos ou instrumentais brasileiros. Donde ela, Constituição, sentando praça do dever estatal de não-negação de justiça, enunciar que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (inciso XXXV do art. 5º).
Por que a pandemia, aqui no Brasil, se faz acompanhar de uma crise política do mais forte acirramento de ânimos?
Bem, é que vivemos numa democracia, e o fato é que democracia é o regime de ativação da cidadania. Cidadania que é fundamento do nosso Estado Democrático de Direito – nos termos do inciso II do art. 1º da Constituição de 1988 — e que se traduz em espírito público. Abertura para o coletivo. Interesse por tudo que é de todos. Cidadania é isso. O que faz da democracia a ambiência ou atmosfera ideal para um intercâmbio de ideias que tanto leva à formação de consensos quanto de dissensos. Tudo civilizada ou respeitosamente, porque o campo das ideias é totalmente objetivo. Tão objetivo em si quanto racionalmente fundamentado. O problema é que essa ambiência cidadã tem sido objeto de boicote. De turbação por grupos de interesses que intencionalmente confundem um objetivo dissenso com um subjetivo confronto. Com uma queda-de-braço ou um cabo de guerra, já sabendo da impossível conciliação de posicionamentos. Esta a crise política, porquanto ocorrente do lado de fora das ideias e das instituições, mesmo as partidárias. Reino da mais sectária e até caricata fulanização das coisas, enfim.
Que ensinamento este momento nos deixa?
Há muitas lições a colher de uma crise que, no fundo, é de quatro conteúdos: o sanitário, o político, o econômico e o social. Tudo imbricado. E quando os problemas são assim tão graves quanto imbricados, é necessário recorrer à única lei que tem resposta de qualidade para tudo, praticamente. Essa lei é a Constituição, aqui no Brasil. Que governa quem governa. Que governa permanentemente quem governa transitoriamente. Uma Constituição que faz da democracia aquele princípio-continente de que tudo o mais é conteúdo. O princípio dos princípios, então. O que mais favorece a formação de consensos e dissensos em clima político-social tão objetivo quanto civilizado. Além de fazer a vida coletiva gravitar muito mais em torno de instituições que de pessoas. Por isso que, entre nós, não se pode impedir a imprensa de falar primeiro sobre as coisas, nem o Judiciário de falar por último. Por isso que se cuida de único regime a nos aquinhoar com uma antecipada certeza: nenhum eventual governante central subjetivamente autoritário vai conseguir nos impor um governo objetivamente autoritário. Assim como demonstrou a sociedade estadunidense no governo Trump.
Qual a saída para a crise?
Em suma, o de que precisamos é fazer da Constituição mesa redonda para, em torno dela, buscar a saída dessa multitudinária crise que já se aproxima de 570 mil mortes em nosso território. Sem nenhum culpa dela própria, Constituição, que faz da saúde um dever de toda pessoa estatal e um direito social-fundamental de cada indivíduo. Além de criar o SUS, priorizar os serviços e ações preventivas e ainda obrigar todo e qualquer Presidente da República, junto com o seu Vice, a prestar o compromisso de mantê-la, defendê-la e cumpri-la, quando do ato das respectivas posses. É como está no seu art. 78, ao lado de outros deveres funcionais também diretamente constitucionais.
Se é assim, estamos vivendo o paradoxo de um Direito bom e uma prática administrativa ruim?
Sim. A Constituição é muito boa, em tema de saúde da população, porém a Administração Pública não tem seguido na mesma virtuosa trilha. Principalmente a Administração Federal. Daí o número altíssimo de contaminações e de morte em escala nacional. O que tem faltado é o claro entendimento de que, em tema de saúde pública, a Constituição adota políticas de Estado que se impõem às políticas de governo. Esstas são transitórias, por definição, tanto quanto aquelas são permanentes. É como dizer: as políticas públicas de governo somente serão juridicamente válidas se compatíveis com as políticas públicas de Estado. Mais uma vez, o que é preciso enfatizar é isto: somente se passa o Brasil juridicamente a limpo com a irrestrita observância da Constituição. Tanto é assim que atentar contra o exercício dos direitos sociais (saúde é direito social da espécie fundamental) é crime de responsabilidade. É só ler o inciso III do artigo constitucional de nº 85.
No mesmo tema, o STF tem embaraçado o funcionamento da Administração Pública Federal?
Não! Em absoluto! O que disse o Supremo, acertadamente, foi isso: a) é competência material de todas as pessoas federadas cuidar da saúde da população; b) também é da competência legislativa comum ou concorrente de cada unidade federada brasileira legislar sobre… saúde, justamente. É como está no inciso II do art. 23 e no inciso XII do art. 24, combinadamente com os incisos I, II e VII do art. 30, todos da Constituição. Com o que deixou assentado a liderança, sim, da União, mas não a exclusividade de cuidar de um setor de atividade estatal que é direito de todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país.
Como é ser jurista e um poeta a um só tempo?
É conciliar emoção e razão, nessa ordem. Ou quociente emocional e quociente intelectual, também nessa ordem. O primeiro a abrir os poros do segundo, e não o inverso. Isso na perspectiva da costura de uma unidade que talvez mereça o nome de… consciência.
O que mudou na sua rotina neste ano de pandemia?
Estou há um ano e cinco meses sob ortodoxa quarentena. Isso porque somente saio de casa para uma voltinha de carro, a cada quinze dias, ou para uma eventual consulta médica. Sempre com os elementares cuidados com o uso de máscara, com o distanciamento físico possível e com as palavras de ordem “álcool em gel em mim”. Pra isso é que serve o dever da responsabilidade individual e coletiva. Ah, também já tomei as duas doses da vacina Astrazeneca. Se, em tema de saúde pública, a Constituição brasileira é de primeira qualidade, por que eu vou ser de quinta?
Fonte: Eixo Capital / Correio Braziliense
https://blogs.correiobraziliense.com.br/cbpoder/ayres-brito-so-se-passa-o-brasil-a-limpo-observando-a-constituicao/
Entenda o que está por trás do fim do Bolsa Família
Programa social criado no governo Lula deverá ser substituído pelo Auxílio Brasil, mas benefício ainda não tem valor nem recursos definidos
Israel Medeiros / Correio Braziliense
O Bolsa Família, uma das principais bandeiras do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é considerado por muitos especialistas um dos programas de transferência de renda mais bem-sucedidos do mundo. Em breve, deixará de existir e dará lugar ao Auxílio Brasil, novo benefício do governo Jair Bolsonaro (sem partido), que pretende dar uma turbinada nas parcelas e ampliar a base de beneficiados.
O novo programa, que já teve outros nomes, como Renda Brasil e Renda Cidadã, no ano passado, vinha sendo elaborado para desvincular a política social da imagem dos governos petistas. Após o lançamento, no entanto, analistas veem problemas no desenho do Auxílio Brasil, que ainda não tem recursos garantidos na Medida Provisória enviada ao Congresso Nacional nesta última semana. Um dos motivos é a falta de espaço no Orçamento, que, para ser ampliado, depende da aprovação da polêmica Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que propõe o parcelamento de precatórios — dívidas judiciais da União.
O Bolsa Família teve sua origem em programas de transferência de renda do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Logo, foi resultado da fusão de quatro benefícios sociais existentes até então: o Bolsa Escola, o Auxílio-Alimentação, o Cartão-alimentação e o Vale-gás. Em 2003, esses programas foram unidos, por meio do Cadastro Único, que foi a base de dados para os cadastros do auxílio emergencial.
O objetivo do Bolsa Família sempre foi dar auxílio àqueles em situação de extrema pobreza. Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado em 2019, nos primeiros 15 anos do programa, a iniciativa foi responsável pela redução da pobreza em 15% e da extrema pobreza em 25%. O número de beneficiários passou de 6 milhões de famílias, em 2004, para 13,3 milhões de famílias, em 2017, quando 3,4 milhões de pessoas deixaram a situação de pobreza extrema, e outras 3,2 milhões superaram a pobreza.
Hoje, o programa tem mais de 14 milhões de beneficiários e uma extensa lista de espera. Wanda Engel, secretária de Estado de Assistência Social do governo FHC e figura importante na implementação dos programas sociais na época, explica que, no Brasil dos anos 1990, a assistência era voltada para as consequências da pobreza, como a fome. Era necessário, portanto, dar condições para que os beneficiários pudessem ter uma melhoria de vida, atacando a causa do problema: a renda.
“Veio a concepção de que a pobreza pode ser superada, então, começam programas de transferência de renda da transferência condicionada”, conta. “Ninguém aprende a pescar com fome. Para aprender a pescar, precisa de condições mínimas de garantia de vida, condições básicas. Essas condições são dadas por esses programas. Mas não pode ser só isso, precisa ter frequência na escola, programa de capacitação, saúde”, afirma. Ela aponta que o grande desafio dos auxílios dados à população de baixa renda é garantir a sustentabilidade após a saída da linha da pobreza, evitando que os beneficiários voltem ao ponto de partida. “Isso necessariamente passa pela educação, por toda uma oferta de serviços. A gente precisaria de uma política 2.0, dando conta da extrema pobreza e garantindo a saída com sustentabilidade”, sugere.
Entraves
Para Wanda Engel, a ideia do governo federal de aumentar o número de beneficiários do Bolsa Família no novo programa é boa, mas alerta que, se o programa estiver sujeito ao teto de gastos —emenda constitucional que limita ao aumento de despesas à inflação do ano anterior —, há grandes chances de entraves. “Era preciso um aumento da cobertura, e esse aumento talvez nem atenda a quantidade necessária de famílias. Mas, com o teto de gastos, quanto mais você aumenta a bolsa, menos beneficiados. E vice-versa. É uma relação inversamente proporcional. Agora, o valor pago estava totalmente defasado. Deveria estar em cerca de R$ 415. Qualquer coisa menos do que isso não atenderia às necessidades básicas de uma família”, completa.
José Luis Oreiro, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), destaca a necessidade de auxiliar aqueles que estão abaixo da linha da pobreza. “São pessoas que desempenham atividades não remuneradas ou com baixíssima remuneração e não têm perspectiva de sair dessa situação de pobreza. Isso nos leva à conclusão de que, em um país civilizado, é possível destinar uma parte dos recursos da sociedade para retirá-los da miséria absoluta”, pontua.
Nesse sentido, aponta o professor, o Brasil foi um pioneiro, ao colocar o foco dos benefícios naqueles que estavam em situação de miséria, possibilitando, através das contrapartidas — como a frequência escolar que as gerações seguintes tivessem mais oportunidades. Com os valores sendo revertidos em consumo pelas famílias, o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) é uma consequência natural. “O programa (Bolsa Família) retira muita gente da miséria, gera aumento do PIB e retorna em arrecadação de impostos. É um programa extremamente bem-sucedido, tanto na redução de pobreza quanto no estímulo ao consumo”, comenta Oreiro.
Felipe Queiroz, economista e pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), explica que há um efeito multiplicador dos programas de transferência de renda. “Quando você tem uma política de distribuição de renda, há uma propensão maior de consumo, os recursos retornam ao Estado por meio da economia, que começa a circular, e o efeito multiplicador é total. Esse tipo de política é totalmente positiva e contribui para o desenvolvimento econômico do país”, esclarece. Ele acredita, no entanto, que o Auxílio Brasil, não traz novidades e corre o risco de ser descontinuado por falta de recursos a médio prazo e de, a partir de 2023, ser interrompido por falta de espaço orçamentário.
Medida eleitoreira
O economista Otto Nogami, professor do Insper, também demonstra preocupação com o fato de o programa não ter recursos para ser mantido posteriormente. Ele destaca que, no caso da PEC do parcelamento dos precatórios — que o governo deseja aprovar no Congresso —, haverá recursos a curto prazo para pagar um Bolsa Família mais robusto. Contudo, a situação das contas públicas exige uma atenção maior de longo prazo, com cortes de gastos, exatamente o contrário do que o Executivo está tentando fazer às vésperas das eleições de 2022.
“Essa iniciativa é eleitoral, o governo não teria condições de se aventurar numa coisa dessas hoje”, afirma. O economista opina, ainda, que o novo programa social deveria ter foco em melhorar a vida dos beneficiários como um todo, fornecendo condições para que as famílias possam se sustentar e deixar de ser dependentes do governo. “É preciso um programa de geração de renda, mas o governo só pensa no benefício e pronto. Ele está dando um impulso para aumentar o consumo das famílias, o que infla o PIB, em uma tentativa de criar atalhos para o crescimento econômico”, conclui.
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2021/08/4943755-entenda-o-que-esta-por-tras-do-fim-do-bolsa-familia.html