coronavirus

Marcus Pestana: Depois da tempestade virá a bonança?

O texto bíblico está dito: “depois da tempestade vem a bonança”. Mas não é sequência automática. Depende de como cada um vivencia os momentos de sofrimento, do aprendizado que cada um faz e da mudança de atitude posterior aos tempos de angústia.

O mundo inteiro está mergulhado em momento desafiador. A presente crise promove a combinação perversa entre a violenta pandemia e o fantasma de uma crise econômica inédita e devastadora.

O vírus, além de seu efeito voraz sobre vidas humanas, produz uma lição de humildade aos governantes. O quanto ilusório é o poder? Seu alcance pretensamente ilimitado esbarra, às vezes, quase na impotência. Até os mais autoritários líderes mundiais dobraram o joelho. Recomendo o filme “FLU”, na Netflix, do diretor sul-coreano Bong Joon-ho – ganhador do Oscar: uma reflexão, no ambiente de uma epidemia, sobre como, em situações limites e radicais, decisões políticas dramáticas podem salvar ou sacrificar vidas.

Quem sabe as crises e não a violência sejam as parteiras da história? Em linguagem corrente: “como fazer do limão a limonada”? A meu juízo, tudo vai depender do aprendizado pessoal, familiar e social que construirmos.

Será que perceberemos que, mais do que nunca, estamos integrados em uma “Aldeia Global”? Que as fronteiras são realidades históricas, políticas, institucionais, mas que não resistem a um vírus agressivo e indisciplinado que nasce na China, invade a Europa, assusta os EUA e se dissemina pelo Hemisfério Sul? Será idealismo ou aprendizado necessário, o reencontro com a nossa natureza universal de seres humanos e imaginar um mundo mais fraterno e pacífico?

Será que perceberemos que, diante de uma pandemia quase indomável, as barreiras entre ricos e pobres desmoronam? É evidente que os pobres têm uma situação muito mais vulnerável. Mas o vírus não seleciona por faixa de renda ou patrimônio. Afinal, o epicentro da epidemia na Itália não foi a Lombardia, sua região mais rica? Quem sabe fica o aprendizado e o compromisso coletivo com o combate aos privilégios e às desigualdades?

Será que a crise da COVID-19 deixará um legado de humildade, diálogo, entendimento e convivência respeitosa entre as lideranças políticas brasileiras? Será que descobriremos a quase inutilidade dessa guerra ideológica polarizada e de má qualidade, quando a política na democracia é exatamente a construção de consensos progressivos em ambiente plural de divergências, tendo o diálogo, aberto e franco, como ferramenta? Até aqueles que se achando plenipotenciários enfrentaram as evidências e a Ciência, se dobraram a realidade. Será que aprenderemos que ninguém é dono da verdade? Até agora ninguém têm a verdade absoluta sobre o vírus, apesar de todo o emprenho da comunidade científica. Não temos vacina, remédios com eficácia comprovada, explicações exatas sobre a dinâmica da propagação.

Será que depois da crise valorizaremos e daremos mais atenção ao sistema de saúde e aos seus profissionais, sobretudo ao SUS? Cansei de enfrentar situações no Congresso onde a repercussão da voz da bancada da saúde era diminuta, sempre abafada por outras bancadas temáticas ou setoriais. Será que enfrentaremos de vez o crônico subfinanciamento do SUS e seus gargalos?

Transformar a tempestade em bonança depende de nós, essencialmente do nosso aprendizado. Voltarei ao tema.


Demétrio Magnoli: As mentiras nos EUA luzem sob o sol, enquanto na China seguem abaixo da superfície

Trump mente ininterruptamente; já o regime de Xi Jinping fabrica 'verdade' paralela da pandemia

“Na guerra, a primeira vítima é a verdade.” Essa verdade célebre, cuja autoria atribui-se tanto ao senador americano isolacionista Hiram Johnson (1918) quanto ao grego Ésquilo, o pai da tragédia, no século 5º a.C., vale também para a Peste Negra em curso. Mas as mentiras são diferentes: nos EUA, luzem sob o sol; na China, seguem escondidas abaixo da superfície.

Donald Trump mentiu ininterruptamente, retardando a preparação dos EUA para enfrentar a pandemia.

No fim de janeiro, disse à rede CNBC: “Temos isso sob controle total. É uma pessoa vinda da China, e a temos sob absoluto controle”. No início de fevereiro, gabou-se na Fox News: “Nós basicamente desligamos isso, que vinha da China”.

No final de fevereiro, garantiu que “isso é mais ou menos como a gripe; logo teremos uma vacina” e, referindo-se ao número de infecções, acrescentou: “Vamos substancialmente para baixo, não para cima”. Os EUA tinham, então, 68 casos; hoje, são 240 mil.

No meio de março, quando finalmente admitiu que o vírus “é muito contagioso”, ainda adicionou: “Mas temos tremendo controle sobre isso”.

A mentira trumpiana é uma narrativa política em constante mutação. Apoia-se nas muletas dos “jornalistas” chapa-branca e do aparato de difusão de fake news da direita nacionalista nas redes sociais.

Acredita quem quer —e não são poucos. Contudo, ela concorre com as vozes discordantes, que não são caladas pela força, e sobretudo com a verdade (factual), que emana tanto de órgãos oficiais quanto da imprensa independente. A hora da verdade (política) chega nas eleições, ocasião em que a maioria decidirá se prefere a mentira.

A China também mente sem parar, mas de modo diferente, fabricando uma “verdade” paralela.

A mentira chinesa tem raízes fincadas no chão do controle social totalitário. Ela se espraia por toda a vida cotidiana, propiciando a manipulação centralizada das estatísticas hospitalares —isto é, da fonte primária de informações sobre a natureza da crise.

Há indícios alarmantes de que os números fornecidos pelo governo chinês miniaturizaram a epidemia. Nos EUA, estima-se que a Covid produzirá entre 1 e 3 milhões de casos positivos e algo entre 100 mil e 240 mil mortes.

Já na China, situada em latitude semelhante e com mais de quatro vezes a população americana, a Covid teria praticamente estancado, com menos de 83 mil casos acumulados e cerca de 3.200 mortes. O contraste intriga os mais respeitados epidemiologistas —inclusive Deborah Birx, coordenadora da força-tarefa dos EUA para o coronavírus.

No centro do mistério está a contabilidade de óbitos. Os casos pioneiros da Covid em Wuhan ocorreram em dezembro, mas a notícia foi interditada e os médicos que os relataram, silenciados. A quarentena começou em 23 de janeiro. O vírus teve mais de três semanas para se disseminar, enquanto comemorava-se o Ano-Novo chinês.

Testemunhos anônimos de agentes de saúde chineses dão conta de incontáveis internações sem testagens e centenas de óbitos atribuídos a influenza ou pneumonia. No final de março, veículos online chineses publicaram fotos, tomadas por cidadãos comuns, de milhares de urnas funerárias ainda alinhadas em crematórios de Wuhan.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) nada viu de estranho nos números chineses —e celebra a “eficiência” totalitária de Xi Jinping. Tedros Adhanom, seu diretor-presidente, eleito com decisivo apoio chinês, um ex-integrante do núcleo duro do governo autoritário etíope, não parece alimentar dúvidas entre as alternativas de assegurar a bilionária parceria da China com a OMS ou proteger a verdade (estatística).

Mas, de acordo com relatórios sigilosos da inteligência americana que começam a vazar, a China engajou-se na fabricação de uma mentira monumental, iludindo o mundo.

Mentiras são diferentes. Todas elas, porém, cobram vidas.

*Demétrio Magnoli, Sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.


Hélio Schwartsman: Bolsonaro virou o bobo da corte

A piada em que Bolsonaro se transformou poderá custar vidas

Jair Messias Bolsonaro tornou-se um bobo da corte, com uma diferença importante: bobos da corte costumavam dizer verdades.

Os sinais de que o presidente da República deixou de ser levado a sério são numerosos e inequívocos. Prefeitos e governadores, alguns dos quais eleitos na mesma onda conservadora que impulsionou Bolsonaro, fazem exatamente o contrário do que ele recomenda —e não hesitam em explicitar isso.

Até ministros de Estado, que foram por ele escolhidos e são demissíveis "ad nutum", se articulam para fazer o by-pass do chefe. Além de Mandetta, Moro e Guedes já disseram, ainda que tentando esboçar alguma diplomacia, que apoiam as medidas de isolamento social que Bolsonaro renega. Há notícias de que o núcleo militar tenta enquadrá-lo, mas a persuasão, quando surte efeito, é transitória. Só dura até a próxima declaração ou postagem, quase sempre uma combinação de mentiras com delírios.

É bastante sintomático que empresas de mídia social como Twitter e Instagram tenham decidido censurar manifestações de Bolsonaro, por julgar que se tratam de falsidades que colocam pessoas em risco.

No Congresso o clima não é muito diferente. Parlamentares já desistiram de esperar que Bolsonaro exerça a liderança que caberia ao presidente num momento como este e estão cuidando de elaborar por conta própria medidas para atenuar a crise. Se o Legislativo estivesse operando em condições de normalidade, estaríamos possivelmente iniciando procedimentos de impeachment.

O isolamento de Bolsonaro é internacional. Se, até uma ou duas semanas atrás, ainda havia líderes populistas apostando no negacionismo, como o mexicano Andrés Manuel López Obrador e o próprio Donald Trump, eles vislumbraram o tamanho da encrenca e adotaram uma posição mais responsável. Bolsonaro ficou praticamente sozinho.

Só não dá para rir da piada que Bolsonaro se tornou porque ela poderá custar vidas.


Bolívar Lamounier: Pandemia e pandemônio

Regime totalitário da China e desacertos de Trump e Bolsonaro agravaram a situação

Sobre a pandemia que o mundo está vivenciando dúvidas não faltam, mas podemos tranquilamente afirmar que a dimensão que ela alcançou se deve a uma combinação de fatores epidemiológicos e políticos.

Embora pouco protocolar, fez bem o embaixador chinês em Brasília em repreender um parlamentar que se referira ao coronavírus como o “vírus chinês”. De fato, a expressão do referido parlamentar foi infeliz e poderia alimentar a absurda teoria de que a China propositalmente criara e facilitara a propagação do vírus. É, porém, inegável que a China não alertou o mundo no devido tempo. Em meados de novembro do ano passado, a situação na cidade de Wuhan (situada na província de Hubei) já era crítica e o governo central chinês não se empenhou em prestar esclarecimentos ao mundo, de forma solene e oficial, como conviria a um país com as responsabilidades internacionais da China. Com certeza informou à Organização Mundial da Saúde (OMS), em data que desconheço.

Há quem pense que os chineses demoraram a prestar informações à comunidade internacional porque, nas primeiras semanas, nada sabiam, portanto, nada tinham para informar. Começaram a procurar uma vacina, mas tardaram a entender que o vírus sofrera uma mutação, era, portanto, algo novo, e então passaram a interagir com cientistas e médicos de outros países, facilitando o acesso deles aos dados que possuíam.

Os analistas que se apoiam nessa linha de raciocínio geralmente destacam que Beijing pediu cautela a seus especialistas a fim de evitar um alarme perigoso, que poderia até mesmo provocar uma convulsão social. Suponhamos que essa teoria tenha fundamento e que as informações indispensáveis seriam proporcionadas a outros países para que se preparassem no devido tempo. O fato, no entanto, é que o poder central chinês em nenhum momento se pronunciou sobre a matéria de forma ponderada, mas solene e oficial. Organizando medidas preventivas em tempo hábil, milhares de vidas poderiam ter sido poupadas e a aberrante atitude de alguns chefes de Estado que insistiram em minimizar o risco da epidemia durante cerca de três meses poderia ter sido contestada.

O fato, portanto, é que o todo-poderoso Xi Jinping reduziu o problema às esferas provincial e municipal, mesmo após saber que a disseminação do vírus seria extremamente ampla e após a OMS apontar seu caráter pandêmico. Na prática, o trágico aviso foi dado pela Itália, e em seguida pela Espanha, que não se prepararam adequadamente para o gigantesco impacto que receberam.

O caso mais difícil de compreender, um emaranhado que bem merece ser designado como um pandemônio político, é o dos Estados Unidos.

É sabido que o presidente Donald Trump foi alertado com bastante antecedência pelos serviços de espionagem, em particular pela Central Intelligence Agency (CIA), mas recusou-se a tomar providências preventivas, seja por interesse eleitoral ou por acreditar, em seu tosco entendimento, que a pandemia, na realidade, não passava de uma “gripezinha”, ou pela combinação dessas duas razões.

Fato é que o despreparo dos Estados Unidos para efetuar testes era espantoso. Em fevereiro, autoridades médicas federais falavam em testar 1 milhão e meio de pessoas, mas a revista The Atlantic entrou em contato com os secretários de Saúde dos 50 Estados e do District of Columbia (Washington, DC) e mostrou que a capacidade real do país para efetuar tais testes não passava de 2 mil por dia.

Nem testes, nem isolamento social. Se a propagação do vírus se dá por contatos entre pessoas, é óbvio que a medida mais importante, a ser tomada de imediato, é reduzir drasticamente tais contatos. Isso, como já se notou, Trump não faria. Foi só em meados de março que ele relutantemente aceitou a necessidade de quarentenas.

Comparado aos EUA, o Brasil (leia-se: o ministro Mandetta e as entidades e os profissionais de saúde) estão relativamente bem na foto. É, porém, meridianamente claro que não podemos subestimar os desníveis sociais, as diferenças de qualidade dos serviços médicos entre Estados e regiões, a compreensível preocupação dos que temem um efeito arrasador na economia, nem, e mais importante, as contínuas e desastradas intervenções do presidente Bolsonaro, adepto da mesma tosca teoria da “gripezinha” e, ao que tudo faz crer, incapaz de compreender os requisitos básicos do cargo para o qual foi eleito. Se dependesse só dele, decerto não teríamos implantado e não estaríamos mantendo razoavelmente bem a disciplina do isolamento social.

Há quem afirme, principalmente no tocante à Europa, que a ineficácia das medidas adotadas se deveu em grande parte a informações erradas recebidas da China até meados de janeiro, incluída a de que o vírus não seria transmissível entre humanos. Seja como for, parece-me fora de dúvida que fatores políticos agravaram enormemente a gravidade da pandemia: o regime totalitário de Beijing e desacertos infantis cometidos pelos presidentes dos EUA e do Brasil.

*Sócio-diretor da Augurium Consultoria, é membro das Academias Brasileira de Ciências e Paulista de Letras


Míriam Leitão: Economia revolvida

Economias de todo o mundo estão sendo reviradas pela crise. No Brasil, a falta de um líder provoca ruídos e aumenta a desconfiança

A economia virou uma grande mesa de negociação entre as partes dos contratos. Lojistas de shoppings fechados há 10 dias negociam com os administradores o não pagamento de taxas, inquilinos avisam aos proprietários que é preciso reduzir aluguéis, lobbies vão a Brasília e entram indevidamente em Medidas Provisórias que tratam de questões urgentes, devedores avisam que não pagarão suas contas, e bancos elevam juros em tempos de maior liquidez. E o dólar só sobe, alterando custos. Economistas de bancos e consultorias refazem cada vez para pior o número do PIB de 2020, o ano que não se sabe como vai terminar.

Glauco Humai, presidente da Abrasce, que representa os shoppings centers, vive uma situação inédita. Os 577 shoppings estão 100% fechados, todos os do Brasil. Ele nem defende a reabertura, porque em contato com os administradores em outros países ouviu que mesmo após a normalização as pessoas não vão. Estão receosas. O consumo de certos itens despenca, de outros, dispara. Combustíveis caíram 60%. Vestuários tiveram recuo de 90% pelo cartão de crédito. Já a compra de alimentos e de remédios cresceu. A BRF viu as vendas para restaurantes despencar e para supermercados crescer. Humai se preocupa é com os projetos estranhos que começam a ser pendurados nas propostas que tramitam em regime de urgência no Congresso:

– Há uma certa descoordenação na condução desta crise, o que leva a um vácuo de poder. E por isso há um sem número de projetos esdrúxulos sendo apresentados: ninguém pode cobrar taxa, não pode cobrar empréstimos, coisas do tipo. Então os esforços para a crise se desviam para combater projetos desnecessários junto ao Congresso e assembleias. Estão dissipando forças que deveriam ser concentradas no enfrentamento da crise da saúde.

Não é aconselhável o estímulo a uma onda de calote, mas ao mesmo tempo os contratos precisam ser revistos de parte a parte no setor privado, usando o bom senso.

– Está complicado, estamos fazendo todo o esforço do mundo para ajudar o lojista, estamos muito sensíveis, principalmente o pequeno e médio lojista. Ele não tem fundo, não tem fluxo de caixa, acesso à crédito porque está dificultado. Nós do setor estamos tomando medidas para ajudar o lojista nesses 30 ou 60 dias de crise mais aguda. Uma coisa é dar isenção do pagamento do fundo de promoção, outra é reduzir o condomínio. Mas têm taxas públicas, como IPTU, que estamos pedindo às prefeituras para adiarem – explicou Humai.

No mundo inteiro as economias estão de pernas para o ar. A Bloomberg Consumer Confort Index, uma pesquisa do sentimento econômico nos Estados Unidos em âmbito nacional, mostrou que nas últimas duas semanas houve a mais forte queda em 34 anos que os dados são coletados. Por isso a discussão sobre o PIB é o que acontecerá depois desse túnel. A recuperação será rápida, em V, como dizem alguns economistas, ou passará por um período de estagnação antes de começar a subir, ou seja, em U?

O economista Vitor Vidal, da consultoria LCA, diz que há indicadores se deteriorando em velocidade nunca vista. A alta do dólar, que ontem bateu novo recorde nominal, em R$ 5,32, tem pressionado o custo do setor industrial e mexido no balanço das companhias, mesmo aquelas que tem baixo nível de endividamento em moeda estrangeira. Os bancos, por sua vez, encarecem os empréstimos, e a taxa dos títulos do governo disparou no último mês. O risco-país voltou para a casa dos 300 pontos, depois de rodar abaixo de 100 pontos no início do ano.

– É muito importante que o país consiga visualizar uma data para se começar a normalização, independentemente de quando isso vá acontecer. Trump falou em 30 de abril e as bolsas subiram. Isso dá alguma previsibilidade. Um lado positivo desta crise é que ela não deve ser tão prolongada quanto a recessão de 2015 e 2016. Por isso, as medidas do governo são tão importantes e precisam ser executadas rapidamente – explicou.

Uma parte do ajuste à conjuntura tem que ser feito através de negociações privadas, mas em momento tão conturbado, com toda a economia sendo revirada, é preciso haver um ponto fixo, uma liderança, uma sensação de que o governo sabe para onde ir e comanda o país. E isso não temos no momento.


Ascânio Seleme: Uma geração traumatizada

Minhas duas filhas mais novas nasceram em 1995 e 1998 e cresceram numa casa mais ou menos tranquila de classe média. Mas, desde que começaram a entender a vida, o mundo e o Brasil, se depararam com uma série de crises de diversas naturezas que deve moldar seus caráteres por toda a vida. Clara tinha três anos e Laura seis quando o maior atentado terrorista da História colocou no chão os dois prédios do World Trade Center, em Nova York, atingiu outros alvos nos Estados Unidos e mudou a História do planeta.

O que se seguiu foram anos de guerra transmitida ao vivo pela televisão. As meninas acompanharam, mesmo que a certa distância emocional, os bombardeios e invasão americana ao Afeganistão e ao Iraque. Mas logo começaram a ver as explosões e as fuzilarias que transformaram cidades em alvos de ataques sangrentos do terror. Abismadas como todo mundo, assistiram aos atentados em Londres e Paris e passaram a ter medo de viajar.

Ainda na primeira década dos anos 2000, um abalo sísmico na credibilidade da economia americana produziu a maior crise econômica global desde o “Crack da Bolsa” de 1929. Embora à época as duas não tenham entendido direito a extensão do terremoto, por serem muito jovens, com tempo e estudo passaram a internalizar também aquela mega crise e seus desdobramentos sobre todos os países e todos os setores da economia.

Enquanto o mundo se debatia com seus superproblemas, no Brasil as jovens viam se desenrolar sob os seus olhos um escândalo de corrupção que alcançava uma figura icônica da política nacional. O mensalão do primeiro governo Lula não permitiu que crescesse em muitos meninos daqueles dias a esperança numa alternativa de esquerda. Logo neles, que por natureza devem nascer contestadores. Porque, você sabe, as pessoas nascem revolucionárias e envelhecem conservadoras.

Logo em seguida, as duas garotas viram que o mensalão não foi apenas um desvio momentâneo. Desvendou-se então o maior escândalo de corrupção da História do país: o petrolão, que nasceu sob Lula e cresceu sob Dilma. Foi uma avalanche. O caso era tão sério que alcançou todas as esferas da política nacional. Foi para a cadeia todo tipo de gente. Um ex-presidente, governadores, prefeitos, senadores, deputados e empresários. Elas ouviram e gritaram “Fora, Cunha!”, e viram o ex-presidente da Câmara ser cassado e depois preso. E mais adiante viram um impeachment de presidente.

Não bastasse isso, acompanharam a um outro grande escândalo no governo Temer e, em seguida, viram a eleição de um presidente de extrema direita, reconhecido no mundo inteiro como racista, homofóbico e misógino. Sob Bolsonaro, elas e todos os jovens de 20 e poucos anos assistem apavorados ao festival diário das bobagens produzidas pelo presidente. Muitas delas apenas tolas, outras graves, e algumas gravíssimas.

Depois de ultrapassar todas essas etapas, elas se deparam agora com a crise mundial do coronavírus. Se o pai delas, com mais de 60 anos, está angustiado e inseguro, imaginem o que se passa no coração dessas duas jovens de 21 e 25 anos. O fato é que elas estão metidas num turbilhão que parece não ter fim. E que vem sempre aumentando em escala e densidade. Jovens como Laura e Clara passaram a vida inteira convivendo com ansiedade, às vezes mais, outras um pouco menos.

A questão a ser respondida agora é como essa geração vai superar a sucessão de eventos iniciada com o ataque às Torres Gêmeas. A carga traumática que a garotada carrega é pesada demais. Com alguns poucos intervalos de paz e tranquilidade, a vida emocional desta turma não tem sido fácil. Há quem diga que jovens criados na adversidade são mais fortes. Pode ser. Mas, no caso dessa geração, parece ter havido um certo exagero.

Crise de ciúmes
Mandetta tem mesmo muita paciência para aturar Bolsonaro. Não bastassem as declarações absurdas contra o isolamento social, ele passou a atacar o seu ministro em entrevistas e em lives para rede social. Mandetta já sabia que o seu chefe é um homem inseguro e meio abobado, mas descobriu agora os ciúmes doentios que o capitão tem pelo sucesso alheio. Por ser raso intelectualmente, Bolsonaro não aceita quem pensa direito e se expressa bem. Diante disso, o presidente produziu a frase mais ridícula desde o início da crise sanitária: “Mandetta quer fazer valer a vontade dele...”. Esqueceu que a vontade do ministro da Saúde é a vontade da OMS, dos médicos, dos sanitaristas e dos infectologistas. É a vontade da ciência. Por isso, Mandetta tem o apoio de 76% dos brasileiros, contra 33% de Bolsonaro, segundo a pesquisa Datafolha divulgada ontem.

Os fanáticos
Eles formam um grupo cada vez menor, mas muito barulhento, até mesmo pela sua natureza. São os fanáticos, aqueles que não conseguem enxergar, não entendem o que ouvem e repetem de maneira mecânica, agressiva e extravagante as barbaridades que seus líderes transmitem pelas redes sociais. O caso mais visível de fanático idiotizado foi visto esta semana no Alvorada. Trata-se da mulher que se disse professora e que pediu a Bolsonaro uma intervenção militar para permitir que as pessoas voltassem a trabalhar. Pior que isso, muito pior, foi o presidente distribuir a fala da mulher em rede social. Tudo bem ela não entender como funciona a República e desconhecer os ritos da democracia, ela é uma fanática. Mas o presidente cometeu um crime ao referendar sua fala.

O comandante diz não
Tentando trazer pelo menos um governador para o seu lado na campanha contra o isolamento, Bolsonaro tem pressionado o governador de Santa Catarina, o comandante Moisés, ex-bombeiro. Já mandou recado pelos filhos, por lideranças políticas locais e por empresários do estado, como o dono da Havan. Ele mesmo ligou exortando Moisés a suspender o isolamento usando o velho argumento “você se elegeu graças a mim”. Mas não colou. Até aqui o comandante tem dito não.

O pior quadro
Não há quadro na Praça dos Três Poderes ou na Esplanada dos Ministérios mais fraco do que Jair Bolsonaro. Todos os problemas que são levados ao seu gabinete saem de lá maiores do que entraram. O presidente raramente acerta, e quando o faz, cuida para, em menos de 24 horas, destruir o acerto. Nem Weintraub, Damares ou Araújo se comparam a ele. São gênios diante de sua excelência.

Façam o que eu digo
Apenas Jair Bolsonaro deseduca mais do que o formato das entrevistas organizadas no Palácio do Planalto para divulgar os dados do combate ao coronavírus. Os ministros que falam estão sempre colados uns nos outros, não há nunca o distanciamento de dois metros que a OMS recomenda. Não bastasse a proximidade social, uns cochicham com outros e se tocam desnecessariamente. E os garçons se debruçam pelas laterais dos ministros para trocar os copos de água gelada. Uma festa.

A China recolhe os seus
A embaixada da China em Brasília está recolhendo para dentro do prédio da chancelaria todos os funcionários chineses sediados na capital. Vão morar dentro das instalações oficiais até que os ânimos melhorem na cidade. O chineses estão sendo objeto de ofensas e agressões verbais nas ruas. Funcionários brasileiros da embaixada dizem que o rancor com a China deve-se aos ataques feitos por Eduardo Bolsonaro, o Bananinha.

Respirador artificial
Se a indústria não consegue dar conta da demanda, se a China ignora e não atende os pedidos do Brasil, por que não usar a criatividade? Um grupo de profissionais e professores de Medicina, Engenharia e Informática da Universidade Federal de Itajubá desmontou um velho respirador mecânico, fabricado no Brasil nos anos 1950, e copiou digitalmente todos os seus componentes. Agora, sua transcrição digital pode ser lida por impressoras 3D e reproduzidas em escala. Aplausos.

Claustrofobia global
Meu amigo Evaristo não gosta de elevador. Ele os evita sempre que pode e vai de escada quando o andar é mais baixo. Até o oitavo ele sobe de escada numa boa. Uma vez subiu a pé 22 andares para chegar a um escritório em um prédio velho, com elevador de porta sanfonada, no Centro. Evaristo tem claustrofobia. Esse sentimento é o que assalta o mundo inteiro nesses dias de coronavírus. Além de manter a maioria isolada em casa, a doença ataca as vias respiratórias do paciente e o deixa sem ar. O pavor do claustrofóbico, dono de um sintoma que causa medo mórbido de espaços fechados, não é tanto de ficar em casa, mas sim de perder o ar.


Merval Pereira: Estado inteligente

Países poderosos e vulneráveis se deram conta de que dependem muito mais da China do que é desejável

Parece haver consenso em torno da ideia de que o mundo será outro depois da crise do Covid-19, não apenas porque a humanidade deu-se conta de sua fragilidade, e da necessidade de solidariedade nas relações sociais, como os problemas sociais, em maior ou menor escala, foram escancarados.

O capitalismo terá que rever conceitos, em busca de uma economia mais sustentável e menos desigual. E mesmo as relações internacionais serão alteradas, pois o mundo de repente despertou para uma realidade preocupante: a China produz 90% dos equipamentos de saúde, criando um mercado internacional selvagem de compra de produtos essenciais (máscaras, ventiladores) em que o peso do dinheiro vale mais que vidas humanas em países periféricos como o Brasil. Coisa parecida acontece em outros setores.

Os países, dos mais poderosos como os Estados Unidos, aos mais vulneráveis, se deram conta de que dependem muito mais da China do que é desejável, e terão que mudar suas relações geopolíticas, cuidando de setores essenciais, não apenas a saúde, mas também estratégicos como a Defesa, o Meio-Ambiente, a agricultura.

Ciência e Tecnologia tiveram suas importâncias realçadas durante a crise, e a reação do presidente Bolsonaro às advertências dos cientistas, tentando confrontar a doença primeiro com negacionismo, depois com orações e jejuns, mostra bem como estamos ameaçados de um retrocesso profundo em um setor que merece muito mais importância do que recebe e precisa.

O economista José Roberto Afonso, do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), um dos formuladores da Lei de Responsabilidade Fiscal e, agora, do orçamento de guerra montado pelo presidente da Câmara Rodrigo Maia, escreveu um artigo onde sugere que seja criado um “seguro destrabalho” , diante do fato de que o novo coronavírus só criou isolamento físico, pois já existia o social e até econômico para enorme parcela da população brasileira, que não tinha emprego e nenhuma proteção social.

José Roberto Afonso lembra que o Estado de Bem-Estar Social (Welfare State), organizado no pós-guerra em torno de um elemento essencial, o salário, já não reflete a realidade atual. Porque o emprego já deixou de ser sinônimo de trabalho há alguns anos, e em todo o mundo, devido à revolução tecnológica em curso.

Já Mariana Mazzucato, professora da UCL de Londres, no International Media Call virtual do Forum Econômico Mundial, falou sobre o novo papel do Estado, que ela espera ver surgir dessa crise mundial. Rebatendo a ideia de que a crise de saúde, com suas consequências econômicas, mostrou a necessidade de um Estado forte, ela diz que o que procura não é o Estado mínimo ou máximo, mas o “Estado inteligente”:

“Não é apenas porque o Estado está tendo que intervir maciçamente na economia que vamos mudar o conceito de fazer política econômica no capitalismo”. Ela diz que o Estado tem que injetar dinheiro na economia numa situação dessas, “mas temos que ver em que condições isso será feito”.

Precisamos montar uma economia mais sustentável, para que não tenhamos novos problemas mais adiante. “Por exemplo, as companhias aéreas que precisarão de dinheiro do governo têm que assumir o compromisso de reduzir a emissão de gás carbônico. Empresas que serão auxiliadas têm que garantir os empregos”.

Precisamos definir que tipo de instituições estatais nós queremos. “As empresas privadas mandam seus executivos para o exterior para fazer cursos de especialização, de gerência. Precisamos que os Estados atuem com inteligência, organizando suas estruturas com uma visão mais ampla de sua função dentro de um Estado moderno”.

Mariana Mazzucato acha que os Estados podem se reorganizar, as empresas privadas têm que trabalhar com os organismos estatais para que o país obtenha um resultado mais inteligente de seus setores. “O Estado tem que atuar ativamente para coparticipar da criação do mercado, e não esperar que os problemas aconteçam, e só então intervir”.

Para ela, essa crise não é desconectada do jeito que o capitalismo produz o alimento que consumimos, e os produtos que usamos. “Está diretamente ligada à crise climática. Precisamos criar uma simbiose entre os setores publico e privado, para que a economia esteja preparada para a próxima crise, que sempre virá”. (Amanhã, o “seguro-destrabalho”)


Folha de S. Paulo: Coronavírus deve levar o Brasil à pior década econômica da história

Contração acima de 2% em 2020 traria queda mais profunda na renda per capita que a dos anos 1980

Érica Fraga, da Folha de S. Paulo

O período de dez anos que se encerra em 2020 poderá registrar a maior queda da renda per capita da história republicana do país, superando até mesmo a contração dos anos 1980, que ficaram cunhados como a década perdida brasileira.

Uma contração do PIB (Produto Interno Bruto) superior a 2% neste ano —que vários analistas já consideram factível— levaria o rendimento médio da população a recuar mais do que o 0,43% amargado entre 1981 e 1990, segundo cálculos de Fernando Montero, economista-chefe da corretora Tullett Prebon.

As medidas necessárias para conter a expansão da Covid-19 já têm surtido efeito, fortemente recessivo. Isso não é exclusividade do Brasil.

O problema, no caso brasileiro, é que o quadro negativo da atividade não se restringe a este ano atípico. O país enfrentou uma severa e longa recessão entre o segundo trimestre de 2014 e o fim de 2016. Depois, veio uma recuperação lenta, que, ano após ano, vinha surpreendendo os analistas negativamente.

“A crise atual é muito forte, abrupta, e pega uma economia com uma baixa dinâmica de crescimento, logo no início do ano”, diz Montero.

A debilidade econômica dos últimos anos já fazia com que especialistas comparassem o quadro de estagnação da renda média da população brasileira nesta década com o registrado nos anos 1980, quando a economia foi assolada por hiperinflação e crises da dívida externa.

Até recentemente, as projeções de crescimento entre 1,5% e 2% da economia previstos para 2020 indicavam que o desempenho do período de 2011 a 2020 seria ligeiramente melhor do que a contração de 0,43% da renda per capita, verificada entre 1981 e 1990.

Mas, após a eclosão da crise da Covid-19, as estimativas do PIB para este ano se deterioraram rapidamente, passando de uma expectativa média de alta de 1,5% para outra de queda de 0,5%.

A tendência, segundo analistas, é que essa projeção média de contração mais recente continue a cair nas próximas semanas. Grandes bancos como Bradesco, Itaú Unibanco e UBS revisaram seus números para baixo. As duas instituições esperam, respectivamente, contrações de 1%, 0,7% e 2% em 2020.

Na quinta-feira (2), o BofA (Bank of America) afirmou esperar quedas severas da atividade em toda a América Latina neste ano, com contrações de 3,5% e 8% das duas maiores economias da região —a brasileira e a mexicana—, respectivamente.

Para Montero, sua estimativa atual, de uma queda de 2,5% do PIB do Brasil em 2020, já é uma espécie de cenário menos drástico possível.

“Conforme os números de contágio pelo vírus pioram e aumentam os riscos de uma quarentena mais extensa, talvez até recorrente, uma queda de 2,5% começa a parecer otimista”, afirma.

Se o PIB recuar 2,5% neste ano, a queda da renda per capita na década será de 0,48%.

Montero ressalta que um agravante do cenário atual brasileiro é o fato de o colapso econômico recente ter se concentrado em um intervalo de poucos anos, a partir de 2014.

“Chamam a atenção não apenas a intensidade e a sequência das quedas anuais mas também a ausência de qualquer recuperação significativa no intervalo dos últimos anos.”

A magnitude dos efeitos da Covid-19 sobre a atividade econômica ficará mais clara nas próximas semanas à medida que indicadores da produção e do consumo forem divulgados.

Mas dados preliminares mostram um impacto negativo significativo da pandemia sobre a atividade econômica.

O Índice Gerentes de Compras (PMI, em inglês) mostrou uma queda de 3,9 pontos da atividade industrial no Brasil em março, o pior desempenho desde fevereiro de 2017. Com esse recuo, o nível de produção passou de 52,3 para 48,4 (números abaixo de 50 indicam contração).

No caso do setor de serviços, o desempenho capturado pelo PMI foi ainda pior: uma queda de 15,9 pontos para 34,5 em março, o menor nível e a maior queda desde que a série começou, no início de 2008.

O PMI é bastante acompanhado por economistas porque se baseia em entrevistas com executivos do segmento manufatureiro que focam indicadores como nível de novas encomendas, variações em custos e ajustes de estoques.

Segundo a consultoria IHS Markit, que calcula o PMI, “as medidas de saúde pública para deter a propagação da Covid-19 levaram a uma demanda mais baixa tanto no mercado interno quanto no externo”.

A consultoria destacou que os entrevistados relataram cortes de mão de obra que, como um todo, causaram a maior perda mensal de empregos no setor industrial em mais de três anos.

Além da queda de novas encomendas, os empresários mencionaram maior pressão sobre seus custos, causada por fatores como a desvalorização do real em relação ao dólar.

As medidas de isolamento também tiveram efeito sobre os prazos de entregas de insumos. O subíndice do PMI da indústria que mede isso caiu 4,3 pontos, a maior contração mensal desde a greve dos caminhoneiros, que paralisou o Brasil entre maio e junho de 2018.

Outro efeito já capturado no fim de março foi um forte recuo nos emplacamentos de carros.

Indicadores da confiança de consumidores e empresários, compilados pela FGV (Fundação Getulio Vargas), também mostram uma deterioração abrupta do cenário econômico nas últimas semanas.

Alguns desses índices vinham se recuperando, embora ainda não tivessem voltado para os níveis de otimismo anteriores à recessão despencaram.

Agora, houve uma nova reversão de tendência. O indicador que mede a confiança de empresários de quatro setores —indústria, comércio, serviços e construção civil— recuou 6,5 pontos em março, para 89,5 (patamares abaixo de 100 denotam pessimismo).

As sondagens da FGV são formadas por dois componentes principais, um que indica a percepção de empresários em relação ao presente e outro que revela suas expectativas para o futuro.

O índice que aponta as tendências esperadas no ambiente de negócios nos próximos meses recuou 14,9 pontos, a maior queda desde outubro de 2008, quando eclodiu a crise financeira global.

A confiança do consumidor brasileiro também registrou forte recuo em março, atingindo 82, o menor patamar da série desde janeiro de 2017, quando o país começava a sair da recessão.


El País: Mandetta, o conservador que vestiu o colete do SUS e entrincheirou Bolsonaro

Antiabortista e opositor ferrenho dos Mais Médicos, ex-deputado foi executivo de plano de saúde e se aproximou de presidente na campanha. Ameaçado de demissão, ele anda no fio da navalha e vê apoio popular disparar

Afonso Benites e Naiara Galarraga Cortázar, do El País

“Quanto a eu deixar o Governo por minha vontade, tenho uma coisa que aprendi com meus mestres: médico não abandona paciente.” A frase de efeito, lançada por Luiz Henrique Mandetta, ilustra a rotina paralela em que o Brasil mergulhou desde que começou a crise do coronavírus: acompanhar o duelo tático entre o ministro da Saúde e seu próprio chefe, Jair Bolsonaro, enquanto se conhece o boletim sobre o avanço da pandemia no país. Nesta sexta, a declaração teve tom de desafio: apesar das divergências com o presidente, que fez questão de criticá-lo em público, Mandetta reiterava que não pretende pedir demissão. A figura do ministro tem crescido frente às pressões negacionistas de Bolsonaro a respeito da doença, quando as mortes no país já chegam a 359, a cifra mais alta da América do Sul. “Vamos nos guiar pela ciência”, insiste em dizer este médico ortopedista de 55 anos que vem de uma extensa família de políticos e foi deputado por duas legislaturas.

“É uma luta grande em que vamos precisar de muita paciência, muita resiliência”, relembra Mandetta, que não se rendeu aos apelos e estratagemas do Planalto para que diminuísse as aparições públicas na última semana. Paramentado com um colete do Sistema Único de Saúde (SUS), um acessório de praxe para os momentos de emergência da pasta, ele ora saca as credenciais técnicas, ora explora verve religiosa e espiritual para atrair todos os holofotes para si, parte da titânica tarefa de permanecer no cargo, mesmo sem conseguir convencer o chefe de Estado e parte de seus 210 milhões de compatriotas de que, como orienta a Organização Mundial de Saúde, ficar em casa para reduzir ao mínimo o contato físico é a maneira mais eficaz de frear os contágios enquanto não há cura nem vacina. Atualmente, o ministro, governadores e prefeitos forjaram uma frente informal para implantar um isolamento social que tem semiparalisado o Brasil diante dos chamamentos de Bolsonaro para que os que não são idosos nem doentes crônicos vão trabalhar para amenizar a hecatombe econômica que se avizinha.

Mandetta, que já foi respeitado pelo presidente, agora é desprezado pelo chefe, que foi orientado a não demiti-lo por enquanto para não passar a imagem de total ingovernabilidade. Na última quinzena, Bolsonaro ameaçou dispensar seu ministro da Saúde em pelo menos duas ocasiões. Além das discordâncias técnicas, pesa contra ele uma certa inveja. Hoje, o trabalho de Mandetta diante da pandemia tem o dobro do apoio popular do presidente, conforme atestaram duas pesquisas de opinião recentes, do Datafolha e da XP. Ele ostenta uma aprovação de nível lulista: 76%, de acordo com o Datafolha.

O presidente não se cansa de criticar publicamente seu subordinado. A mais recente crítica foi feita na quinta-feira, em entrevista à rádio Jovem Pan. “O Mandetta quer fazer muito a vontade dele. Pode ser que ele esteja certo. Pode ser. Mas está faltando um pouco mais de humildade para ele, para conduzir o Brasil neste momento difícil que encontramos e que precisamos dele para vencer essa batalha”. Em resposta, o deputado Fábio Trad, primo do ministro, mandou um recado direto a Bolsonaro, via Twitter. “O problema, presidente, é que, se Mandetta ouvi-lo nessa questão, haverá um genocídio no país. Seja humilde o senhor em reconhecer que um médico está mais preparado para combater uma pandemia que um capitão reformado”.

Mandetta está longe de ser apenas um médico ortopedista, um técnico no ministério da Saúde. Ele é de uma família de políticos e entrou na política para defender a causa dos profissionais de saúde e dos ruralistas de seu Estado, Mato Grosso do Sul. Seu pai, Hélio, foi vice-prefeito de Campo Grande, a terra natal do ministro. Já teve um tio e primos como vereadores, prefeitos, deputados estaduais, deputados federais e senador. Foi pelas mãos de um de seus primos, o hoje senador Nelson Trad Filho (PSD-MS), que Mandetta entrou para a política partidária. Era secretário de Saúde quando Trad Filho governou Campo Grande. Por sua atuação na pasta, foi investigado por suspeita de fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois. A denúncia, acusação formal feita pelo Ministério Público, nunca foi apresentada. E é nisso que embasa a sua defesa.

É visto como de perfil apenas técnico quando tem sua performance comparada a outros ministros da tropa de choque ultradireitista de Bolsonaro, como Abraham Weintraub (Educação) ou Damares Alves (Direitos Humanos). Com Damares, inclusive, Mandetta já havia batido de frente, quando se opôs a alguns itens da campanha contra a gravidez na adolescência, baseada em abstinência sexual.

Antes de chegar ao ministério, foi gestor de uma cooperativa de médicos em Mato Grosso do Sul, Unimed, e deputado federal por dois mandatos (2011-2019). No Parlamento, fez pesado lobby contra o programa Mais Médicos, do Governo Dilma Rousseff (PT). Nesta crise, foi obrigado a lançar edital para reconvocar os médicos cubanos do programa dispensados sob Bolsonaro e corre contra o relógio para cobrir o buraco na assistência básica que deixou o desmonte do programa da era petista.

Da Câmara à Esplanada
Conservador, maçom, antiabortista, a favor do uso de maconha para fins medicinais e filiado ao direitista DEM, Mandetta foi a favor do impeachment de Dilma Rousseff. Apesar dessa oposição, transita bem entre políticos de esquerda. Católico, frequentador de novenas e missas, voraz leitor da Bíblia e de livros clássicos, costuma citar ambos em seus discursos e pronunciamentos. Nessa semana, em uma entrevista coletiva, falou de Gibran Khalil Gibran: “Somos os filhos e filhas da ânsia da vida por si mesma”. Quando era um opositor do Governo petista, recorreu ao conto O Rei está nude Christian Andersen, para criticar a organização da Copa do Mundo pela gestão Rousseff, em 2014.

De lá para cá, aproximou-se do então deputado Bolsonaro quando a maior parte dos políticos o rejeitavam. Deu alguns conselhos a ele, como o de que partos prematuros poderiam ser evitados com o tratamento de cárie em mulheres grávidas. Ganhou a simpatia do colega de Parlamento. Foi cogitado para ser um dos congressistas que se filiariam ao PSL juntamente com a onda Bolsonaro, mas preferiu seguir no seu DEM, do qual era vice-presidente do diretório nacional.

Quando Bolsonaro deixou de ser um irrelevante deputado do baixo clero e foi eleito para ocupar o gabinete principal do terceiro andar do Palácio do Planalto, Mandetta, que dizia ter desistido da vida política e não concorreu à reeleição para a Câmara, recebeu apoio das principais entidades médicas brasileiras para assumir a Saúde. A simpatia que o presidente tinha por ele se transformou em um convite formal para administrar um orçamento de 230 bilhões de reais como ministro da pasta. Ele interpretou o chamado como uma convocação.

Nos últimos dias, diante de um fogo cruzado promovido pelo incendiário presidente, Mandetta oscilou contra a ciência uma única vez. Ferrenho defensor do isolamento horizontal, quando a maior parte da população evita o contato social, ele foi pressionado por Bolsonaro a mudar o discurso e defender o isolamento vertical, quando se resguarda apenas idosos e pessoas com problemas de saúde graves. O fez em uma quarta-feira, quando “comprou” o discurso do presidente de que estaria havendo radicalismo por parte de governadores e prefeitos que defendiam uma espécie de quarentena. Ouviu críticas públicas e na esfera privada (entre seus amigos) nos três dias seguintes. Chamou a cobertura dos meios de comunicação de sórdida e foi alvo, no sábado, de um editorial do Jornal Nacional, da TV Globo. Disse a apresentadora: “O ministro da Saúde encontrou uma outra maneira de agradar o presidente: criticou o trabalho da imprensa, afirmando que os meios de comunicação são sórdidos porque, na visão dele, só vendem se a matéria for ruim”.

Foi aí que Mandetta acusou o golpe. Pediu perdão. “Puxaram a minha orelha na Globo porque eu fiz um comentário sobre a cobertura e eu peço desculpas. A gente quando erra, a gente de desculpas”. Desde então, o Mandetta menos disposto a ceder a Bolsonaro voltou à cena.

O regresso ao perfil que segue as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) desagradou ao seu chefe, que voltou a avaliar nomes para substituí-lo. Três estariam numa fila: Antonio Barra Torres, um militar da Marinha que dirige a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Osmar Terra, um médico deputado federal pelo MDB-RS, que foi demitido pelo presidente do Ministério da Cidadania, e Henrique Pratta, um filantropo e gestor do Hospital do Amor, o antigo hospital de câncer de Barretos.

Mas Bolsonaro está entrincheirado, ainda que com o sólido apoio de pouco mais de 30% da população. Falta a ele respaldo político para se desfazer de seu ministro, quando até outras estrelas do gabinete, como Sergio Moro (Justiça), ou mesmo o comandante do Exército, Edson Pujol, se mostram alinhados. Três parlamentares ouvidos pela reportagem disseram que, para além da frase de efeito desta sexta, já ouviram do próprio ortopedista: ele não pedirá para sair. “O Mandetta sabe do tamanho de sua responsabilidade e não é do tipo que abandona o barco nas horas mais difíceis”, afirmou a senadora Simone Tebet (MDB-MS), que conhece o ministro desde a infância.

As próximas semanas, que o próprio Mandetta descreve como “duríssimas”, serão a prova de fogo, inclusive para o apoio popular à pasta que comanda. “A fase do desgaste vem ali na frente”, ponderou. E lançou mais uma frase de efeito: “A mão que afaga é a mesma que apedreja”, disse, citando o poeta Augusto dos Anjos, uma voz crítica que morreu ―de pneumonia— no começo do século passado.


Bernardo Mello Franco: A humilhação de Mandetta

É cada vez mais ingrata a situação de Mandetta no governo. Um aliado conta que ele está “louco para ir embora”, mas quer que Bolsonaro assuma o desgaste de demiti-lo

É cada vez mais ingrata a situação de Luiz Henrique Mandetta no governo. Responsável pelo combate ao coronavírus, o ministro da Saúde já vinha sendo desautorizado pelo chefe. Ontem sua fritura alcançou um grau inédito, com direito a ameaça de demissão pelo rádio.

Em entrevista à Jovem Pan, Jair Bolsonaro voltou a atacar as medidas de isolamento defendidas pelo auxiliar. Ele disse ainda que o Ministério da Saúde teria sido tomado por um “clima de pânico” com a pandemia.

Questionado sobre o futuro do ministro, o presidente afirmou que não pretende demiti-lo “no meio da guerra”. Em seguida, ressaltou que “todo mundo pode ser demitido”. Mais Bolsonaro, impossível.

Foram três minutos de artilharia ininterrupta. “O Mandetta já sabe que a gente tá se bicando há muito tempo”, disse o capitão. “Ele é uma pessoa que em algum momento extrapolou”, prosseguiu. “Tá faltando um pouco mais de humildade para ele”, arrematou.

Foi o ataque mais explícito ao ministro, mas talvez não tenha sido o mais humilhante. Na quarta-feira, Bolsonaro montou uma armadilha para desmoralizar Mandetta diante da própria classe. Promoveu uma reunião de médicos no Planalto e não convidou o auxiliar.

O tema do encontro foi a hidroxicloroquina, que o presidente trata como panaceia contra um vírus que não tem vacina nem tratamento. O medicamento ainda está em fase de testes, sem eficácia comprovada. Além de desaconselhar seu uso sem prescrição, Mandetta já informou que ele provoca arritmia e pode causar parada cardíaca.

Em conversas reservadas, o ministro tem reclamado do clima de sabotagem. Um dirigente do DEM conta que ele está “louco para ir embora”, mas não quer pedir demissão. Prefere que o chefe assuma o desgaste de demiti-lo. “Virou um jogo de gato e rato”, resume o aliado.

À Jovem Pan, Bolsonaro disse que Mandetta precisa “ouvir um pouco mais o presidente”. Na prática, isso significaria trocar a ciência e a medicina por receitas que o capitão colhe na porta do Alvorada e em grupos de zap. Ao fim da entrevista de ontem, ele disse aos brasileiros que “papai do céu está conosco” e pediu um dia de jejum e orações “para a gente ficar livre desse mal”.


Monica de Bolle: A renda básica emergencial

Voucher, ou um “vale”, não é renda. A RBE é uma transferência incondicional de renda do governo para uma parcela da população

Na última segunda-feira foi aprovada por unanimidade no Congresso Nacional a Renda Básica Emergencial (RBE), um benefício de R$ 600 mensais a ser destinado a uma parte da população brasileira mais vulnerável, como os trabalhadores informais. Embora haja muito o que aprimorar, a RBE foi uma enorme conquista para o Brasil. Foi, também, um momento de protagonismo do Congresso, que tem tomado as rédeas da crise enquanto o governo, quando muito, dorme no ponto. Mas não vou tratar das andanças do presidente da República por Brasília, tampouco de suas conclamações ao vírus e à epidemia.

Apesar de a RBE ter sido uma conquista da sociedade junto ao Congresso, movendo o Estado a despeito da inércia do Executivo federal, não tardou para que o governo quisesse dela se apoderar. Ou melhor, quisesse se apoderar da medida para propaganda, porque o pagamento do benefício para quem já está passando fome o governo tratou mesmo foi de embromar. Nos lábios do ministro da Economia, Paulo Guedes, a RBE ganhou logo um nome inapropriado, insensível, de mau gosto, que beira o obsceno: “coronavoucher”. Parte da imprensa pôs-se a repeti-lo sem se dar conta de que um imenso equívoco havia sido cometido pelo ministro. Voucher, ou um “vale”, não é renda. O “vale” é um papel que dá ao detentor o direito de obter um desconto numa compra ou de trocá-lo por um bem ou serviço: vale-transporte, vale-alimentação. Renda é um fluxo de dinheiro para o recipiente, seja na forma de salários, de dividendos ou de transferências do governo. A RBE é uma transferência incondicional de renda do governo para uma parcela da população. A RBE é como o Bolsa Família, com a diferença de que o Bolsa Família exige contrapartidas dos beneficiários. Portanto, o ministro embrulhou conceitos econômicos, na melhor das hipóteses, para se fingir de pai da filha que não havia gerado.

Mas não ficou só nisso. Depois de ter tentado dar nome à filha que não era dele, o ministro disse ser muito difícil começar a pagar a RBE imediatamente. Inventou a necessidade de uma Emenda Constitucional para fazê-lo, o que, além de ser desnecessário, atrasaria o pagamento do benefício, colocando vidas em risco. Sim, vidas. Afinal, os beneficiários são pessoas que só comem aquilo que conseguem arrecadar de renda a cada dia. Pensem nos ambulantes, que, com a quarentena, não têm para quem vender. Pensem em todas as pessoas que têm de escolher entre comer ou arriscar ser contaminadas pela doença e, de quebra, transmiti-la a seus entes queridos. São essas pessoas que Guedes não quer abraçar.

Como fazer para pagar a RBE? O ministro deveria saber, pois não é difícil. Há duas maneiras. A primeira, mais fácil, seria o governo editar uma Medida Provisória (MP) para o pagamento do benefício, indicando como fonte de recursos o superávit financeiro da União — o superávit financeiro, proveniente de operações de câmbio e outras mais, é de dezenas de bilhões de reais, ou seja, muito mais do que o necessário para cobrir a RBE. Outra forma seria o governo emitir dívida.

Para isso, teria de abrir uma exceção ao cumprimento da regra de ouro, dispositivo constitucional que proíbe a emissão de dívida pública em determinadas circunstâncias. Abrir exceção para o cumprimento da regra de ouro não requer Emenda Constitucional alguma. Basta que o governo prepare uma MP indicando ao Congresso por que é necessário descumpri-la para determinada finalidade e que o Congresso aprove o projeto de lei autorizando o governo a fazê-lo. Dada a disposição do Congresso de ver a implementação da RBE, nada disso seria difícil e provavelmente poderia ser feito em menos de 24 horas. Contudo, ao invés de buscar soluções, Guedes busca empecilhos.

No calor desse momento de tamanha aflição, hashtags subiram imediatamente nas redes sociais pedindo o pagamento ou a saída do ministro. Até ministros do Supremo Tribunal Federal se pronunciaram sobre o descalabro.

A RBE será paga, de um jeito ou de outro. A RBE será aprimorada e ampliada, de um jeito ou de outro. A RBE haverá de tornar-se permanente, de um jeito ou de outro. Ela é a esperança para que, na saída dessa crise, tenhamos ao menos uma sociedade menos injusta. Da pandemia ainda nascerá um dos pilares da cidadania.

*Monica de Bolle é Pesquisadora Sênior do Peterson Institute for International Economics e professora da Universidade Johns Hopkins


Hélio Schwartsman: Covid-19 vai vencendo a primeira batalha

Profissionais de saúde estão se contaminando aos borbotões

Eu, por ora, escapei da Covid-19, mas minha mulher não. Médica intensivista e cardiologista, Josiane começou a experimentar os sintomas da doença na semana passada. Ela está se recuperando e, em breve, deverá voltar para a linha de frente. Embora seu quadro tenha sido moderado, não foi nenhum "resfriadinho".

Ciente dos riscos que corria, Josiane já me banira, com os meninos e os cachorros, para o sítio, onde estamos há duas semanas —e ela só me deixou voltar uma vez para levá-la para fazer exames. Nosso isolamento ocorre em condições bucolicamente privilegiadas, mas devo confessar que é angustiante acompanhar a evolução dos sintomas à distância.

Escrevo isso para dizer que estamos perdendo a primeira batalha para a Covid-19. Profissionais de saúde estão se contaminando aos borbotões. No Brasil estamos apenas no início da epidemia, mas, em lugares em que ela está mais madura, os números impressionam.

Na Espanha, quando o total de casos confirmados somava 40 mil, o pessoal de saúde correspondia a 14% dos infectados. No Reino Unido, 25% dos médicos que trabalham para o NHS, o SUS local, tiveram de ser afastados por estar doentes ou para cumprir isolamento. Obviamente, esse tipo de baixa afeta a capacidade do sistema de responder à crise, tanto pela ausência física da mão de obra como pelos efeitos sobre o moral dos profissionais que seguem atuando.

Substituições são necessárias, mas subótimas. A intubação é um procedimento crítico para salvar a vida do paciente grave, mas também uma das situações que expõe as equipes ao maior perigo de contágio. Quando é feita por um médico menos experiente no procedimento, o risco aumenta. Pior, é provável que a dose de vírus a que a pessoa é submetida no episódio da contaminação afete a severidade do quadro que desenvolverá, o que explicaria casos de profissionais de saúde jovens que ficam gravissimamente doentes.