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Elio Gaspari: O Apocalipse Já de Bolsonaro

Depois do festival de bobagens de 2020, governo começar o novo ano poupando a plateia de teorias conspiratórias, novas catástrofes e bodes expiatórios

Em agosto de 2019, quando Alberto Fernández venceu as primárias para a Presidência da Argentina, Jair Bolsonaro resolveu atravessar a fronteira para escorregar numa casca de banana em terras alheias:

“Não esqueçam do que, mais ao Sul, na Argentina, aconteceu nas eleições de ontem. A turma da Cristina Kirchner, que é a mesma de Dilma Rousseff, que é a mesma de Hugo Chávez, de Fidel Castro. (...) Se essa esquerdalha voltar aqui na Argentina, nós poderemos ter no Rio Grande do Sul um novo estado de Roraima”.

Era o tempo em que venezuelanos atravessavam a fronteira e vinham para o Brasil. Hoje os brasileiros gostariam de dar um pulinho na Argentina. Lá, desde a semana passada, a população está sendo vacinada contra a Covid.

Virou o ano, o Brasil não tem vacinas, a Anvisa do almirante e o ministério da Saúde do general estão atordoados pelo negacionismo que Bolsonaro impôs ao seu governo. Ganha uma fritada de morcego do mercado de Wuhan quem souber o que fez o comitê interministerial criado em março para lidar com a pandemia.

Na exortação de agosto de 2019, Bolsonaro mostrou o lado apocalíptico de sua retórica. Quando ele falou na “gripezinha”, quando defendeu as virtudes da cloroquina e até mesmo quando classificou a segunda onda da pandemia de “conversinha”, manipulava a ignorância num processo de simples empulhação. Se tivesse razão (e não a tinha), as coisas poderiam melhorar. Quando falou num possível êxodo de argentinos, manipulava o apocalipse, e aí está o perigo, pois a Constituição lhe assegura mais dois anos de mandato.

O catastrofismo tem algo de impessoal. Quem anuncia catástrofes dissocia-se dos problemas. O capitão despediu-se de 2020 no meio da segunda onda de contágio, encostando nos 200 mil mortos. Aproveitou a oportunidade para anunciar que “nós podemos trazer o caos para cá” com “essa política de fechar”: “Esse inferno, essa assombração, está voltando, por irresponsabilidade de fechar tudo .”

Conversa velha. Em março, quando havia apenas um morto, Bolsonaro dizia que “se ficar todo mundo maluco, as consequências serão as piores possíveis”. Ninguém ficou maluco. Ele acrescentava: “Tem locais em alguns países em que já tem saques acontecendo, isso pode vir para o Brasil, pode ter aproveitamento político em cima disso”. Salvo os desordeiros que organizam aglomerações, nada disso aconteceu.

O profeta da catástrofe sempre tem um medo. Bolsonaro explicitou o seu: “Está havendo uma histeria. Se a economia afundar, afunda o Brasil. (...) Se acabar a economia, acaba qualquer governo. Acaba o meu governo. É uma luta pelo poder”.

Quando surgiu um boato delirante de decretação do estado de sítio, Bolsonaro desmentiu-o, com uma ressalva: “Ainda não está no nosso radar isso, não.” Não estava? Na semana seguinte, diante das manifestações que aconteciam em Santiago, profetizou:

“O que aconteceu no Chile vai ser fichinha perto do que pode acontecer no Brasil. Todos nós pagaremos um preço que levará anos para ser pago, se é que o Brasil não possa ainda sair da normalidade democrática que vocês tanto defendem. (...) O caos está aí na nossa cara”.

Um dia, Bolsonaro viu o caos e divulgou-o: Era um vídeo que mostrava a central de abastecimento de Belo Horizonte, deserta. “São fatos e realidades que devem ser mostradas”, escreveu o presidente. Era mentira e desculpou-se.

Na tenebrosa reunião do ministério de abril, Bolsonaro expôs seu medo:

“A desgraça tá aí. Eles vão querer empurrar essa ... essa ... essa trozoba pra cima da gente.”

Não foi Bolsonaro quem criou o vírus, nem foi o vírus quem inspirou o almirante da Anvisa e o general da Saúde para criarem uma situação na qual faltam vacinas, seringas, agulhas e sabe-se lá mais o quê.

Depois do festival de bobagens de 2020, esses doutores poderiam começar o novo ano poupando a plateia de teorias conspiratórias, novas catástrofes e bodes expiatórios. Como são todos militares, podem recordar o exemplo do general Dwight Eisenhower na véspera do desembarque Aliado na Normandia, em 1944. Ele redigiu uma curta nota para a hipótese do fracasso.

Elogiava todo mundo e concluía: “Se alguma culpa deve ser atribuída à tentativa, ela é só minha”.

O tenente alemão

No início da manhã de 6 de junho de 1944, o tenente alemão Cornelius Tauber estava na Normandia e viu o início do desembarque dos Aliados.

Ele esperava que as coisas acontecessem como nas guerras passadas e surpreendeu-se: “Não vieram cavalos. Toda aquela tropa e nenhum cavalo.”

A logística dos Aliados não incluía quadrúpedes, só veículos e tanques. (Em 1941, quando a Alemanha invadiu a Rússia, seu Exército ainda dependia de 600 mil cavalos.)

O general e os oficiais que Bolsonaro botou no ministério da Saúde ficaram sem vacinas e seringas. Achavam que, como grandes compradores, estavam numa posição em que poderiam impor condições aos fornecedores. Como disse o capitão:

“O Brasil tem 210 milhões de habitantes, um mercado consumidor de qualquer coisa enorme. Os laboratórios não tinham que estar interessados em vender para a gente?”

Se Bolsonaro tivesse feito essa pergunta ao economista Paulo Guedes, teria descoberto o tamanho de seu terraplanismo econômico. Segundo a lei da oferta e da procura, quando há muita oferta, manda quem compra, mas quando há muita procura, manda quem vende. Com sua experiência no mundo do papelório, Guedes poderia lhe explicar também os mecanismos de condicionantes para compras antecipadas.

Mando, logo existo

Para quem não sabe, existe um Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios. A girafa mora na capitania do ministro Paulo Guedes e decidiu criar o “licenciamento urbanístico integrado”.

Ele estabelece que obras de até 1.750 metros quadrados podem ser liberadas com a ajuda de um processo eletrônico.

Sabe-se que há muita roubalheira nas burocracias que liberam obras. Sabe-se também que o ministro Rogério Marinho, do Desenvolvimento Regional, deixou de ser flor do orquidário de seu colega Paulo Guedes. Não custava ter ouvido alguns interessados, e não só alguns operadores do mercado imobiliário.

Eremildo, o idiota

Eremildo é um idiota e acha que os ministros do Supremo são todos infalíveis. Ele se assustou com a saia justa revelada pelo ministro Marco Aurélio: a sinopse de notícias enviadas aos doutores sumiu com duas reportagens que tratavam da operação fura-fila das vacinas. Armada em nome da Corte.

O que o cretino não entende é por que os ministros precisam de sinopses das notícias. Como ele é um idiota, talvez precisem do mimo. Nesse caso, porque não o colocam na rede, para usufruto de quem lhes paga os salários?


Dorrit Harazim: A arte de viver

Parece que viramos a página: ficou escancarado em 2020 que, sem o outro, não somos nem seremos

Individualmente, nunca se saberá quem mais sofreu neste soturno ano de 2020. Coletivamente a resposta é fácil: foi a arte. Mas qual delas? Aquela que independe de qualquer genialidade ou talento específico para existir: a arte de viver. Para quem teve o privilégio de não estar entre as quase 2 milhões de pessoas levadas pela Covid, sobreviveu com medo, aceitou perdas, adequou-se ao vazio e ao silêncio, reinventou-se como pôde no confinamento abrupto. Sempre fomos moldáveis na arte de viver para conseguirmos sobreviver e dar sentido à espécie. 2020 quase nos tirou do prumo através de seu cortejo fúnebre. Mas parece que viramos a página: ficou escancarado que, sem o outro, não somos nem seremos.

Se viver é a maior das artes, a poesia vem logo atrás. Ela tem o poder de libertar as profundezas do possível, de restaurar zonas entumecidas. Ser alcançado por um poema de Armando Freitas Filho na hora certa é um choque transformador, libertador.

Em meio à clausura mundial de 2020, nada mais atual do que a meditação sobre a saga humana feita por John Donne 400 anos atrás. Donne, um dos maiores poetas de língua inglesa de todos os tempos, estava seriamente enfermo quando escreveu em prosa a “Meditação XVII” :

— Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; todo homem é parte de um continente, uma parte de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntai por quem os sinos dobram; eles dobram por vós.

Donne foi homem de fé. Fé absoluta em Deus e convicto de que a humanidade só avança se compartilhada. O escritor americano Ernest Hemingway foi o oposto: era ateu roxo, ímpio por opção e incréu pelo que vivenciou. O que não o impediu de recorrer a Donne para o preâmbulo e título de uma de suas obras mais famosas, “Por quem os sinos dobram” (1940), romance sobre o fracasso humano na Guerra Civil espanhola.

Outro poeta-monumento, o galês Dylan Thomas, ao ver o pai moribundo e sem amparo da fé, criou um poema de resistência. “Não entres nessa noite acolhedora com doçura/ Pois a velhice deveria arder e delirar ao fim do dia/ Odeia, odeia a luz cujo esplendor já não fulgura...”, dizem os 19 versos que convidam a não nos dobrarmos pacificamente ao inevitável. “Do not go gentle into that good night”, publicado em 1951, tornou-se um tesouro da língua inglesa, uma ode à tenacidade do espírito humano. Vem muito a calhar neste início de 2021.

Difícil saber no que se agarrar. Se o otimismo é uma forma alienada de fé, e pessimismo é uma forma alienada de desespero, como defende um grande humanista dublê de psicólogo, resta a fé racional no espírito humano. Simone de Beauvoir descreveria essa fé como esperança, “contrapeso lúcido e musculoso ao otimismo cego... esperança de que a verdade possa ser usada”.

Tempos atrás, quando a espécie humana ainda procurava se reconciliar com as ruínas da Segunda Guerra, a NPR, sigla da rede de rádio pública dos EUA, convidou 80 famosos e anônimos a sintetizarem seu credo pessoal de como tocar a vida. As narrativas, porém, precisavam caber em 100 palavras, proposta radical para tempos em que o mundo não girava em torno de 140 caracteres. Entre os participantes, uma vendedora de enciclopédias de porta em porta e John Updike, uma ajudante hospitalar e Eleanor Roosevelt. Havia, sobretudo, Thomas Mann, Nobel de Literatura e autor do colossal romance “A montanha mágica”.

Mann começa constatando que, apesar de a vida ser possuída por uma tenacidade assombrosa, nossa presença sempre será condicional. “Somente por este motivo acredito que a vida tem um valor e charme vangloriados em excesso”, escreveu. Sua crença maior, e no que depositava maior valor, era justamente o caráter perecível dessa presença: “A transitoriedade é a própria alma da existência. Ela dá valor, dignidade, interesse à vida. A transitoriedade cria o tempo... E, ao menos potencialmente, o tempo é a dádiva suprema, a mais útil. Sem começo ou fim, nascimento ou morte, também o tempo inexiste”. Sobraria um nada estagnado.

A cada um sua arte de viver. Da recomendada por John Donne há séculos à entoada com urgência por Emicida, hoje vamos de “AmarElo”: “Tenho sangrado demais/ Tenho chorado pra cachorro/ Ano passado eu morri/ Mas esse ano eu não morro”.


Celso Ming: Desafios à frente e o que esperar de 2021

Não será preciso muito para fazer deste 2021 um tempo melhor do que foi 2020, um annus horribilis, como diria a rainha Elizabeth II, do Reino Unido – se não por outras razões, pelo menos pelo desastre produzido pela pandemia.

A perspectiva da vacina já muda muitas coisas – algumas para melhor. É o que já se pressentiu no último trimestre do ano passado, quando houve boa retomada da atividade econômica, embora ainda faltem os números para dar ordem de grandeza a essa percepção e se possa, enfim, conferir a tal recuperação em “V”, de que tanto fala o ministro da Economia, Paulo Guedes.

As contas externas do Brasil, causa dos enfartes que caracterizaram as crises dos anos 1970 e 1980, continuam em excelente estado. Essa área não preocupa. A eleição de Joe Biden para a presidência dos Estados Unidos aumentou o nível de confiança global, especialmente nas duas últimas semanas de dezembro, quando o Congresso dos Estados Unidos aprovou novo pacote de recursos para enfrentar a crise. A pandemia tende a ser agora nocauteada pela vacina, especialmente nos países avançados. Mas, levando-se em conta que há mais de 200 delas em desenvolvimento ao redor do mundo, não há como negar que há agora luz no fim do túnel.

Os investimentos nos países industrializados têm tudo agora para se destravar e boa parte deles pode chegar ao Brasil, onde novos recordes na produção de grãos devem ajudar a puxar as exportações.

O grande problema do Brasil são as condições internas. As contas públicas continuam em forte deterioração. A dívida pública bruta deve ter fechado o ano em torno dos 93% do PIB (veja o gráfico), mas caminha rapidamente para os 100% do PIB. O governo não tem estratégia clara de enfrentamento. Parece contar apenas com o aumento da arrecadação que se seguiria ao avanço da atividade econômica. O que poderia garantir a volta aos trilhos seriam avanços claros nas reformas administrativa e tributária, mas nada ainda garante esse trunfo.

A economia do Brasil enfrenta três grandes riscos. O primeiro está subjacente ao que ficou dito acima. Trata-se de uma eventual deterioração da confiança que se seguiria à inércia do governo para conter o rombo.

O segundo risco é o do esgotamento do aumento da demanda que reergueu a economia no último trimestre de 2020. Está claro que já não será possível continuar a distribuir auxílios emergenciais, não só pelo refluxo da pandemia como, também, porque o governo ainda não sabe de onde pode tirar os recursos para isso.

Mais preocupante, nada menos que 14,1 milhões de trabalhadores estão lançados ao desemprego. E há outros 5,8 milhões que nem procuram trabalho, porque estão no desalento. Se for confirmada a retomada, já não se espera que o setor produtivo volte a contratar pessoal como antes, porque passou a operar com mais tecnologia e menos mão de obra. Mesmo com a demanda contida, a inflação voltou a se acirrar no segundo semestre de 2020. Ainda não é uma grande preocupação, mas, se alguma coisa der errado, ela pode voltar a disparar. 

O terceiro risco tem natureza política e é o de que, já no primeiro semestre, seja deflagrada campanha prematura para as eleições gerais de 2022. As negociações montadas para as eleições das mesas das duas Casas do Congresso e as escaramuças que envolveram o presidente Bolsonaro e o governador paulista, João Doria, em torno da aplicação da vacina do Butantã mostram que esse risco é forte. Seria fator que poderia bloquear decisões que conduziriam ao saneamento das finanças públicas ou à aprovação das reformas e, por aí, minar a confiança na política econômica. 

Mas, digamos, a hora é de alívio por 2020 ter ficado para trás.


Míriam Leitão: A saúde da economia

No ano de 2021 o Brasil pode crescer sem crescer, e a principal variável da economia não será econômica. Mesmo se a economia ficar estagnada, haverá um número positivo na comparação da média contra a média do ano passado, em que houve uma queda forte no segundo trimestre. O que definirá a chance de alta real do PIB — e não apenas uma ilusão estatística — será a vacinação em massa dos brasileiros. O erros do governo na preparação para a vacina são falhas também econômicas.

O falso dilema que Bolsonaro alimentou no ano passado é um bumerangue que se volta contra seu próprio governo. Ele defendeu a tese de que era preciso manter a economia funcionando normalmente para garantir emprego e atividade. Não trabalhou para garantir a volta sustentada da economia. Este ano o choque entre a sua ideia e a realidade estará mais evidente, porque o atraso na vacina é o maior obstáculo para a recuperação econômica.

O país está vergonhosamente atrasado na vacinação. O fiasco do leilão de seringas feito pelo Ministerio da Saude foi sinal da sua incapacidade de gestão. As providências elementares para um programa de imunização não foram tomadas. Estados e prefeituras já se adiantam e compram seringas, agulhas e vacinas, enquanto o governo federal roda em falso.

O ano está começando com uma série de complicadores. A inflação está alta, o desemprego vai subir nos primeiros meses de 2021, as contas públicas estão num beco sem saída. O nó mais recente foi dado pelo aumento do salário mínimo. Houve um descasamento infeliz. O teto de gastos sobe pelo índice em 12 meses até junho, os benefícios previdenciários são corrigidos conforme a inflação do ano. Ocorre que a inflação acelerou no segundo trimestre. E isso pode custar, segundo o economista Fábio Giambiagi, R$ 15 bilhões a mais. Não por causa do salário mínimo, mas porque todos os outros benefícios, inclusive os mais altos, serão reajustados pelo INPC.

Esse é só um exemplo de nó nas contas públicas que 2021 herda de 2020. A sanção da LDO veio no último momento possível. A incerteza fiscal e as confusões do próprio governo explicam parte da alta do dólar. O real foi uma das moedas que mais perdeu valor.

O ano começa com o país prisioneiro de impasses criados pelo próprio governo. Mesmo quando todos os sinais eram os de início de uma segunda onda, a área econômica preferiu apostar em alguns indicadores setoriais de melhora de consumo, ou na queda do distanciamento social para montar o cenário de que a economia estava voltando ao normal. Não há normalidade à vista, e agora o país está sem instrumentos para enfrentar a nova etapa da mesma crise.

O que se diz no Ministério da Economia é que existe um plano, ele será implantado em fases, as primeiras sem custo fiscal. A estratégia será a de melhorar o conjunto de medidas já tomadas, corrigindo os excessos. E houve muito gasto excessivo no ano passado, como, por exemplo, no auxílio emergencial sem foco e distribuído sem controle.

O começo do ano será marcado pelo agravamento da crise sanitária, pelo impasse da vacinação, e pela incerteza fiscal. Para as famílias, haverá mais inflação. Sobem alguns itens importantes como energia, planos de saúde, remédios, ônibus. A taxa de desemprego cresce sempre no começo do ano e pode chegar a 17%.

A vacinação é a variável que poderá virar esse jogo no segundo semestre. E isso é tão sério que não deveria estar entregue às vacilações do Ministério da Saúde. Enquanto o Ministério da Economia não entender que a economia não será definida por pequenos pequenos detalhes dos indicadores econômicos, mas sim pelo grande cenário da saúde, o país ficará onde está.

O ano está só começando, e o PIB pode ter realmente uma recuperação, mas, para ir além de uma alta meramente estatística, o governo tem que ter um programa crível para lidar com a crise fiscal e ao mesmo tempo saber que estímulos dar à economia. Mesmo antes da pandemia, a agenda econômica da atual equipe tinha sido sabotada pelo presidente da República. A pandemia elevou todos os riscos. Em 2021, a única possibilidade de sucesso depende de que o governo, como um todo, entenda que não há escolha possível entre economia e saúde. A saúde é hoje a maior questão econômica.


Vinicius Torres Freire: Brasil ainda pode ter sucesso com a vacina e alta do PIB com mais miséria em 2021

Como será possível vacinar contra Covid e gripe ao mesmo tempo?

É fácil fazer previsão. Difícil é acertar. Desde o começo do século, dois terços das previsões de crescimento da economia feitas em dezembro (para o ano seguinte) estavam muito erradas: não ficaram nem dentro do intervalo das estimativas mínima e máxima de “o mercado”.

Talvez seja útil mencionar obviedades importantes para o que vai ser de 2021. O óbvio não tem charme, mas quebramos a cara quando não nos damos conta de que ele é o muro adiante das nossas fuças.

VACINAS. O Brasil pode vacinar 1,5 milhão de pessoas por dia ou mais, em esforço de guerra (se não precisar usar essas supergeladeiras para vacinas modernas). Em tese, daria para vacinar todo o mundo com mais de 18 anos em quatro meses.

Butantan e Fiocruz dizem que podem produzir 1,3 milhão de doses por dia a partir de fevereiro (menos que isso em janeiro, mas mais no segundo semestre), bastantes para vacinar 650 mil pessoas por dia.

Desde que a eficácia e/ou efetividade dessas vacinas não seja uma porcaria e os crimes de Jair Bolsonaro não atrapalhem muito, lá por outubro daria para ter acabado o serviço. Bem antes, haveria grande alívio: daria para quase acabar com o morticínio de idosos, liberar os hospitais, reduzir custos do combate à doença, animar a economia etc. Problema de que pouco se fala: como será possível vacinar contra Covid e gripe ao mesmo tempo?

MISÉRIA. O número de novos miseráveis pode aumentar de 10 milhões a 20 milhões (sem auxílio e sem trabalho). Parece que o país se esqueceu dessa tragédia que começa já neste mês.

INFLAÇÃO: chegará a 6% ao ano em junho. Por mês, deve crescer mais devagar agora, mas o estrago acumulado em 12 meses chegará a isso. É uma dentada na renda real, na capacidade de consumo, da metade mais pobre do país em particular.

TETO. Essa inflação vai permitir um aumento considerável de gasto federal em 2022 (6%). Vai ser difícil manter o teto em 2021 (mas haverá gambiarras). Em 2022, o teto pode se manter graças à contribuição imprevista da inflação. Vantagem para Bolsonaro.

PIB PARA RICOS. Se governo e Congresso não arrumarem confusão maior com o teto, é possível que a economia cresça uns 4% em 2021, dados os juros baixos, os preços de commodities em alta, o dólar menos caro e o crescimento menor do que o previsto da dívida pública, afora acidentes.

Não se quer dizer que o teto seja intocável, mas é grande a chance de, agora, a emenda ser pior do que o soneto. De resto, 4% de crescimento nem repõe o que se perdeu em 2020. Mas pode ser o bastante para remediar a vida de metade da população.

É para pensar: o prestígio de Bolsonaro pode se manter perto de onde está, a depender do sucesso da vacinação, que ele pode faturar sem ter feito nada, e dos miseráveis (vão morrer de fome quietos?).

ELEIÇÃO NA CÂMARA. Desde meados do ano, era óbvio que a disputa pelo comando da Câmara dos Deputados seria crucial e emperraria o Congresso. Se a turba de Bolsonaro vencer, facilita o projeto autoritário. A depender de quem ganhar, vai haver mais ou menos “reformas”, que não serão grande coisa.

REFORMAS. Alguém acha que o Congresso vai arrochar os servidores? Esse é o núcleo da PEC “emergencial”, o arremedo de plano fiscal do governo. Alguém acha que o Congresso vá aprovar reforma tributária “profunda” (que provocaria crise com setores como serviços, entre outros conflitos)? Se eu fosse jogar na “Mega das Reformas”, apostaria no seis por meia dúzia, reforminhas.

Este jornalista prevê também que volte de férias em fevereiro.


Janio de Freitas: Traição de Bolsonaro e Pazuello se demonstra com população desguarnecida de vacinas e seringas

Presidente e ministro da saúde deixaram o tempo correr por decisão

O contraste entre a dedicação corajosa do pessoal da saúde e a sabotagem da turma de Bolsonaro à imunização geral reflete, e denuncia, a falta de caráter coletivo das classes e categorias que dominam o Brasil.

O alheamento dessa porção poderosa, historicamente ativa na fermentação dos golpes de Estado e, com menor necessidade, contra reduções das desigualdades, oferece o alicerce para uma traição que passa de presumida a demonstrada.

caso das seringas é eloquente. Há mais de oito meses, ainda com Henrique Mandetta como ministro, a compra de seringas e agulhas estava em questão, inclusive com referência ao Ministério da Economia sobre verbas.

A imobilidade do governo só se rompeu há duas semanas, com um pregão em que o Ministério militar da Saúde fixou e exigiu preços abaixo dos vigentes. Só conseguiu comprar 24 em cada 1.000 seringas que dizia querer.

Por mais retardadas que sejam as mentes de Bolsonaro e do general Pazuello, é impossível admitir que levassem tanto tempo para perceber necessidade assim óbvia e, apesar disso, tão advertida a ambos. Nada os moveu. Além de entupidos nos canais da inteligência e da audição, estavam cegos para a ação do mundo todo.

Bolsonaro, Pazuello e os militares do Exército ao redor de ambos deixaram o tempo correr por decisão. Foi recusa deliberada de adotar as providências simples como nas vacinações em que o Brasil e o SUS se tornaram exemplo planetário.

Nada, absolutamente nada pode explicar que Bolsonaro e Pazuello deixem a população desguarnecida de vacinas e seringas, a não ser a decisão de fazê-lo.

Dupla traição: aos deveres constitucionais das respectivas funções e à população. Logo, ao próprio país, pelas consequências sociais discriminatórias, econômicas e nas relações políticas/comerciais com o exterior.

Outros sinais indicam a permanência da decisão de protelar a compra de vacinas e seringas, por sucessivas trapaças, até onde isso seja possível.

Há pouco, Bolsonaro confirmou que “não dá bola” para a falta de imunizadores nem para o vergonhoso atraso brasileiro. A responsabilidade, na sua explicação, é dos “laboratórios que tinham que estar interessados em vender pra gente. Os vendedores é que tinham que vir atrás”.

Para comprar cloroquina, Bolsonaro em pessoa é que foi atrás de Trump e do indiano Modi.

A explicação imbeciloide recebeu seguimento do coronel Elcio Franco, secretário-executivo do Ministério militar da Saúde. Segundo ele, não houve autorização da Anvisa nem compra de vacina porque não pode “pegar a Pfizer pelo braço” para negociar.

As duas explicações, como de praxe, são falsas. A verdade é que o representante da Pfizer se apresentou no ministério, em tempo hábil para o fornecimento prioritário. Tomou chás de cadeira memoráveis.

E não conseguiu ser recebido pelo general Pazuello. Com justa irritação, em poucas palavras falou a repórteres do seu insucesso. Pazuello e seus camaradas não queriam saber de compra de vacina.

Para quem se iniciou como terrorista contra quartéis do Exército e, como Pazuello, diz que outro manda e ele obedece, ordem de sabotagem e traição são naturais. Tanto que recebem a complacência, ou cumplicidade, do segmento social com poder de influência.

O Bolsonaro que acumula mortes, por exemplo, tem o aplauso de 58% do empresariado —os graúdos.


Roberto Romano: Carteiradas absolutistas do STF e do STJ

No Brasil, funcionários públicos e suas famílias estão acima de quem paga impostos

A diferença entre regimes absolutistas e Repúblicas modernas reside nos direitos usufruídos pelas hierarquias do Estado. Para garantir apoio ao rei e à centralização do poder o Antigo Regime concede privilégios ao clero e aos nobres. Isenção de impostos, cargos públicos, dignidades, pensões e prebendas, regalos que minam os cofres nacionais. Naquela forma política existem dois setores. O primeiro reúne funcionários estatais. Ministérios, empregos civis e militares se destinam aos nobres. Os padres cumprem idênticas funções, menos as militares. Mas Richelieu se apresenta sob armadura, líder dos ataques aos nobres protestantes. O cerco de La Rochelle mostra um cardeal bélico e político que tenta esmagar minorias.

Nobres e clero recebem trato diferenciado na vida política, econômica, cultural. Quando não herdam cargos e privilégios, seus integrantes os compram. A garantia do poder centralizador, portanto, está na corrupção e na venda de apoio ao governante.

Daí surge a bipartição das pessoas. Quem se move no aparelho do Estado usufrui prerrogativas e privilégios, generosos se o rei precisa de ajuda. No outro lado, as pessoas sem prerrogativas nem privilégios, salvo quando elas possuem dinheiro para comprar cargos. O Estado ostenta dois tipos de súditos: os que recebem todas as graças, o clero e a nobreza, e os que integram um terceiro setor sem rosto próprio. 

A Revolução Inglesa do século 17 institui a República, atenua os privilégios, amplia os direitos universais. Um exemplo: no exército os postos são herdados pelos nobres ou adquiridos por graça real. Como os aristocratas usam perucas enormes, símbolo de sua superioridade, os republicanos abolem as ditas perucas, uniformizam o corte de cabelo, estabelecem critérios de mérito para a entrada na hierarquia das forças armadas. É o tempo dos cabelos militares curtos (os Roundheads, simultâneos ao New Model Army, cuja estrutura é oposta à do Antigo Regime), que desafiam os privilégios dos nobres. Em todos os setores do Estado republicano ocorrem mudanças rumo à igualdade. 

Os puritanos, expulsos da Inglaterra por sua fé religiosa e política, fundam na América do Norte um Estado no qual, em vez da pretensa superioridade de elites, regem o princípio da accountability (retomado pelos republicanos da ordem democrática grega), a livre imprensa (basta ler a Areopagítica, de John Milton) e direitos iguais. A presença norte-americana na Revolução Francesa é relevante: liberdade, igualdade, fraternidade.

As origens sociais (nobre/plebeu) deixam de valer no Estado moderno. Um funcionário, juiz da mais alta Corte ou governante, não herda nem transmite cargos ou privilégios aos seus familiares. Entra-se na hierarquia estatal por mérito (concurso) ou por eleição popular. Nos Estados Unidos vigoram as duas formas: juízes são concursados ou eleitos. Em ambas as hipóteses as vantagens e desvantagens dos cargos pertencem ao indivíduo, não à sua família. Esta última pode ter importância nas campanhas políticas ou em acertos financeiros ilegais para provimento de funções. Mas a regra é a plena separação dos indivíduos e de sua grei familiar.

Certa feita sou convidado para a posse de um desembargador amigo. Chego ao salão, onde fitas de isolamento separam dois terços do espaço. Uma hostess vestida de vermelho – o Judiciário aprecia muito tal cor – me pergunta: “O senhor é de alguma família ou apenas convidado?”. Apenas convidado... Espantei-me: na casa da Justiça paulista uma cerimônia pública reduzida a festinha “dos entes queridos”! O Estado posto como propriedade familiar: dois terços para os familiares, um terço para a cidadania. É o que vemos no Brasil, renitente em usos e costumes absolutistas, pré-republicanos. Os funcionários – juízes, parlamentares, governantes – e suas famílias estão acima dos que pagam impostos.

No final de 2020 continua a ausência total de accountability nos Poderes nacionais: Executivo, Legislativo, Judiciário. A cidadania recebe nova bofetada absolutista na face: o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), pretensos garantidores da República e da igualdade, exigem tratamento especial na aplicação de vacinas contra a covid para seus integrantes e familiares. O sistema político e jurídico deve ser coerente: na Constituição republicana as leis precisam ser assumidas por todos e cada um dos cidadãos. Ninguém vive com segurança num país onde ocupantes dos Poderes podem, pelo uso de sua carteira profissional ou por importância política, separar o corpo nacional em dois, como no Antigo Regime. Com o ato ignóbil dos tribunais superiores é solapada a base física e anímica da República. Cortes são necessárias para manter a lei. Mas se elas próprias corroem a fé pública com exigências de privilégios – no caso, a vida e a morte dos brasileiros estão em jogo –, perdem serventia e podem ser fechadas sem grandes comoções públicas. 

Termino: os excelentíssimos magistrados deveriam estudar a história do STF e do STJ. Dos muitos feitos execráveis desses tribunais, a carteirada na fila das vacinas é dos mais hediondos.

*Professor da Unicamp, é autor de ‘Razões de Estado e outros estados da razão’ (Perspectiva)


Eliane Cantanhêde: Sorte e juízo!

Prefeitos assumem com pandemia, pobreza, discurso de ódio e Bolsonaro na praia

Os prefeitos que assumiram no primeiro dia do ano precisam de liderança, força política, experiência, capacidade administrativa e bom senso, além da indispensável ética com a coisa pública. O foco estará em todos e cada um, principalmente em Eduardo Paes (DEM), que reencontra a Cidade Maravilhosa com o amor próprio ferido, arrasada administrativa e financeiramente. Ele não assumiu uma prefeitura, entrou numa guerra.

São tempos difíceis e desafiadores para Paes, os reeleitos Bruno Covas (PSDB) e Alexandre Kalil (PSD), em São Paulo e Belo Horizonte, e para todos os demais: Bolsonaro na praia, vírus a mil, idas e vindas das vacinas, lojas fechando, empresas quebrando, desemprego grassando. E a ajuda emergencial acabou junto com 2020.

O equilíbrio é complicado: responsabilidade com as contas públicas, mas como não gastar com leitos, remédios, profissionais extras, pessoas e famílias? Sem esquecer que estamos em janeiro, é época de chuvas, temporais, desabamentos. O que dá um frio na barriga. Onde há planejamento e diligência, tudo bem. E onde não há?

Além das duríssimas questões administrativas, que incluem educação, a volta às aulas, transportes e saneamento, os prefeitos, novos ou reeleitos, têm a obrigação de quebrar o discurso de ódio, negacionismo, polarização. Girar o leme para o futuro: inclusão, generosidade, combate sério ao vírus, civilidade com os opositores.

Nas posses, aqui e acolá, os prefeitos registraram também preocupação com desigualdade, racismo, homofobia e feminicídio, patologias incompatíveis com um País multirracial, plural e tão acolhedor, mas que estão na moda, em alta. Com estímulos indiretos e até diretos que vêm de “cima”. Não exatamente dos céus.

Tudo isso, aliás, foi firmado nos votos de 2020, que jogaram fora os devaneios da “nova política” e optaram pelo conhecido, testado. Paes, no Rio, é reconhecido pela capacidade de trabalho e de gestão, essenciais para a reconstrução de uma cidade tão atacada, num Estado em que quase todos os ex-governadores passaram pela prisão, o atual foi afastado sem volta, o ex-prefeito está imobilizado com tornozeleira.

Em São Paulo, onde o tucano Bruno Covas travou o bom combate com Guilherme Boulos (PSOL), nova cara da esquerda, as forças políticas se movem com responsabilidade num ambiente de pandemia e de incerteza econômica, que exige mais racionalidade, menos disputa ideológica. E as contas ajudam, depois da renegociação de dívidas camarada feita da capital com o governo Dilma Rousseff. Faz toda a diferença.

Em BH, Kalil não foi apenas reeleito, mas vice-campeão de votos do primeiro turno, só atrás de Bruno Reis (DEM), de Salvador. Sem tititi, sem fazer questão de ser simpático e engraçadinho, Kalil surpreendeu por fazer a coisa certa, não se submeter ao Palácio da Liberdade nem ao Planalto e tratar a pandemia como ela é: perigosa, que adoece, mata, deixa sequelas inclusive na economia.

Esse flash do “Triângulo das Bermudas” projeta o cenário político. PSDB mantém estado e capital em São Paulo. DEM tem Paes no Rio, ACM Neto se desvencilhando da Prefeitura de Salvador e Rodrigo Maia, da presidência da Câmara, ambos livres para articulações nacionais. PSD, que ora vai para um lado, ora para o outro, ganha novo status para 2022, ao herdar uma Minas Gerais órfã do PSDB e do PT.

Dos prefeitos, esperam-se competência, bons resultados e capacidade política para vencer arroubos autoritários, priorizando a responsabilidade com o País, a visão de conjunto e o respeito aos adversários, pondo os interesses das cidades, dos Estados, do País e, sobretudo, dos cidadãos, acima das próprias conveniências. Juízo e boa sorte a todos! O sucesso de vocês será de todos nós.


Cristovam Buarque: A irresponsabilidade da divisão

Bolsonaro já provou seu despreparo técnico e psicológico para cuidar do presente

O presidente eleito em 2018 surpreende sempre para pior. Nesta semana, foi o deboche para se referir à tortura sofrida por sua antecessora, a presidente Dilma Rousseff, quando jovem militante contra a ditadura. Só este gesto demonstra sua psicologia política doentia. Mas na mesma semana, disse “estar nem aí” para a demora em aprovar e distribuir a vacina contra o corona vírus, debochando também do sofrimento de milhões e da morte de 200 mil pessoas, que o elegeram para gerenciar nossa saúde.

Bolsonaro já provou seu despreparo técnico e psicológico para cuidar do presente e conduzir ao futuro, mas também provou estar preparado para a politicagem que elege os populistas irresponsáveis. Devido a este preparo cínico, ele pode se reeleger apesar do péssimo desempenho de seu governo em todas setores, até mesmo com a possível volta da inflação, se as forças democráticas não se unirem com uma alternativa e um nome que não sofra maior rejeição que ele.

Com seu despreparo e maldade, Bolsonaro foi eleito sobretudo pelos democratas-progressistas que estiveram no poder por 26 anos. Por nossos erros, especialmente pelo PT, o eleitor queria “outro”, qualquer que fosse. Bolsonaro conseguiu usar uma máscara de “outro”. E por nossa divisão que permitiu colocar no segundo turno um nome que seria melhor presidente do que o eleito, mas que provocava rejeição no eleitor.

O Brasil e seus eleitores não merecem que as lideranças democráticas, de direita ou esquerda, repitam os erros da divisão que leve ao segundo turno um nome com rejeição maior do que o presidente com apesar de sua psicológica política doentia. Bolsonaro contará com um núcleo duro de simpatizantes que o colocarão no segundo turno.

Seria uma traição, que os democratas apresentem tantos nomes, que leve um núcleo duro de simpatizantes colocar no segundo turno um nome contrário ao Bolsonaro, mas que o elegerá na disputa entre os graus de rejeição e não de esperança. Não temos o direito de correr o risco de facilitar sua eleição pela rejeição ao seu concorrente. As lideranças democráticas lúcidas e responsáveis precisam se unir para construir uma alternativa capaz de chegar ao segundo turno e barrar a reeleição de Bolsonaro. Promover uma aliança com base em compromissos para um governo de transição que deixe as diferenças aflorar em 2026. Fizemos isto com Tancredo em 1985. Em 2022, temos a obrigação de repetir aquela unidade. Podemos exigir que o nome escolhido assuma o compromisso de não tentar a reeleição, que seu governo seja uma espécie de frente com compromissos básicos em comum.

Até aqui, a aliança para eleger o novo presidente da Câmara dos Deputados, a unidade na defesa do uso da ciência e a solidariedade à ex-presidente Dilma nos permitem esperança na possibilidade de uma unidade por uma presidência com sanidade mental e valores democráticos.

*Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador


Míriam Leitão: Acertos iniciais dos prefeitos

Nas três maiores cidades do país, os prefeitos assumiram com discursos claros em defesa da diversidade, da democracia, e da saúde. Em São Paulo e Belo Horizonte, Bruno Covas e Alexandre Kalil já estavam no cargo, por isso a atenção ficou mais concentrada no Rio. Eduardo Paes quis marcar a mudança radical de estilo de gestão com sua chuva de decretos e medidas emergenciais. Das três cidades, a situação do Rio é a mais dramática em todos os sentidos, do colapso fiscal ao descalabro administrativo.

Nem todas as cidades estão em situação de penúria fiscal porque as transferências diretas do governo federal, para compensar a queda de arrecadação e a suspensão temporária do pagamento da dívida com o Tesouro permitiram a várias capitais chegar ao fim do ano passado com dinheiro em caixa e capacidade de investir. Não é o caso do Rio. As capitais em geral são menos endividadas do que os estados, e a cidade de São Paulo foi a mais beneficiada pela renegociação de dívida feita no governo Dilma, que permitiu a troca de indexador, inclusive com efeito retroativo. Isso reduziu fortemente a dívida da capital paulista. Foi possível trocar o IGP-M mais 6% por IPCA mais 4%, ou por Selic, o que fosse menor. Imagina se não tivesse havido essa troca? O IGP-M em 2020 deu 23%. As dívidas estão sendo corrigidas pela Selic de 2%.

O Rio tem anomalias de toda ordem. Uma delas foi a transição feita entre uma equipe acéfala que estava saindo e a que estava chegando. No dia em que o ex-prefeito Marcelo Crivella foi preso, muitas reuniões da transição foram canceladas. Os dados passados aos novos secretários estão incompletos e muitas equipes começaram a saber ontem que tudo é muito pior do que imaginavam. A saúde e a educação estão em situação dramática. O aumento de leitos para pacientes de coronavírus e a criação do Centro de Operações de Emergência, anunciados ontem, foram medidas extremamente necessárias. O Rio passa a ter agora um gestor que tem noção da emergência sanitária que a cidade vive.

Em Belo Horizonte, o prefeito Alexandre Kalil disse que a capital mineira é “uma cidade de todos, de LGBTs, cristãos, evangélicos, negros”. E agradeceu a oposição pela pluralidade. Em São Paulo, o prefeito Bruno Covas começou citando a vice-presidente eleita dos Estados Unidos, Kamala Harris, para falar da fragilidade da democracia. Atacou o negacionismo, “os intolerantes e os lacradores”. No Rio, Eduardo Paes disse que fará um governo antirracista, e prometeu combater “essa chaga brasileira”.

Um prefeito do Rio tem que, antes de tudo, entender isso, e tomara que Paes vá além das palavras. Aqui as marcas da exclusão são muitos visíveis. Milhares de africanos escravizados desembarcaram no Rio para viver longo martírio e, ao mesmo tempo, construir o país. Que faça sim uma administração antirracista, porque é a única que honra o Brasil e a sua identidade plural.

Tudo o que disseram os novos prefeitos afasta as administrações locais da intolerância ao diferente e à diversidade de opinião que é a marca do governo de extrema direita de Jair Bolsonaro. E houve na festa democrática de ontem simbologias importantes. Em São Paulo, a posse foi presidida por Eduardo Suplicy, do PT. Na cidade, a bancada da esquerda, somando-se PT e PSOL, cresceu bastante. No Rio, a posse dos vereadores foi comandada por Tarcísio Mota, do PSOL, o vereador mais votado, amigo de Marielle Franco. A viúva da vereadora assassinada, Monica Benício, também tomou posse.

Revigorados pelo voto, os prefeitos das capitais e principais cidades brasileiras estão mostrando que tomarão as decisões que o governo federal ignora no combate à pandemia. Foram posses cuidadosas, com pouco ou nenhum convidado, presencial com máscara, como no Rio, ou remota, como em Belo Horizonte. O cenário de precaução se repetiu nas outras capitais.

Bolsonaro, com sua atitude irresponsável de negar a doença, a ciência, espalhar mentiras sobre a vacina, promover aglomerações e atrasar decisões inadiáveis, chega ao meio de mandato com uma posse de prefeitos que dá mais um sinal do seu isolamento político. O que os eleitores disseram é que querem administradores que os protejam da pandemia. Por isso a pressão por um programa de imunização vai crescer nos próximos dias.


Folha de S. Paulo: Bolsonaro veta blindagem de gastos para vacina da Covid, mas preserva projetos de militares

Decisão do presidente consta em sanção da Lei de Diretrizes Orçamentárias

Ricardo Della Coletta, Folha de S. Paulo

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetou dispositivos da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) que blindariam gastos do governo federal com a aquisição e distribuição de vacinas contra a Covid-19, além de outros desembolsos com o enfrentamento da pandemia.

Por outro lado, Bolsonaro preservou na lei que serve como guia para a elaboração do Orçamento os principais projetos estratégicos defendidos pelo Ministério da Defesa —como a renovação da frota de caças da FAB (Força Aérea Brasileira) e o desenvolvimento de submarino com propulsão nuclear—, que com a decisão presidencial não poderão ser alvo de contingenciamento.

A LDO foi sancionada com vetos por Bolsonaro e publicada em edição extra do Diário Oficial da União na quinta-feira (31).

A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece que o governo precisa ao longo do ano bloquear o empenho de determinadas despesas caso não esteja conseguindo cumprir a meta de superávit primário (que para 2021 é um rombo máximo de R$ 247,12 bilhões).

No entanto, a mesma redação elencava programas que deveriam ser protegidos desses congelamentos, sendo que Bolsonaro vetou parte da lista.

Entre os trechos vetados está "despesas com ações vinculadas à produção e disponibilização de vacinas contra o coronavírus (Covid-19) e a imunização da população brasileira". O presidente também removeu da lei agora sancionada "despesas relacionadas com o combate à pandemia da COVID-19 e o combate à pobreza".

Segundo técnicos ouvidos pela Folha, a ação do presidente deve ter pouco impacto imediato, em menos em ações diretas do Ministério da Saúde. Na pasta, a maioria dos gastos relacionados ao enfrentamento à pandemia tem sido feita via crédito extraordinário, que não é regido pelos itens vetados por Bolsonaro na LDO.

Em dezembro, por exemplo, Bolsonaro editou uma MP (Medida Provisória) que destina R$ 20 bilhões para a aquisição e distribuição de imunizantes contra o coronavírus.

O dinheiro deve abarcar a compra de doses, seringas, agulhas e toda a logística envolvida na campanha de vacinação. Segundo técnicos, por se tratar de crédito extraordinário, em tese o veto de Bolsonaro não atingiria o dinheiro já reservado.

Eles opinam que os vetos podem ser uma tentativa do Executivo de criar uma ferramenta de controle de despesas voltadas para a Covid-19 que eventualmente venham a ser incluídas por parlamentares na Lei Orçamentária, que ainda não foi aprovada.

A decisão do presidente, no entanto, pode abarcar programas que extrapolam o Ministério da Saúde, uma vez que a expressão "despesas relacionadas com o combate à pandemia da COVID-19" é ampla e a inclusão do termo "combate à pobreza" indica ações relacionadas à assistência social.

Outros itens foram barrados por Bolsonaro na LDO e, portanto, poderão ser alvo de contingenciamento em 2021.

Estão na lista: despesas com saneamento, execução de ações do programa de reforma agrária e de apoio à agricultura familiar, comunidades indígenas e quilombolas; ações de combate ao desmatamento e/ou queimada ilegais em imóveis rurais; despesas com as ações destinadas à implementação de programas voltados ao enfrentamento da violência contra as mulheres; demarcação de terras indígenas e de remanescentes de quilombos; e despesas relacionadas com o Programa Mudança do Clima, entre outros.

Para justificar o veto, o governo argumentou que a manutenção dos dispositivos vetados no rol de despesas blindadas de contingenciamento reduziria o espaço fiscal das despesas discricionárias e restringiria "a eficiência alocativa do Poder Executivo na implementação das políticas públicas". ​

Bolsonaro também justificou que despesas não passíveis de bloqueio aumentam a rigidez do Orçamento, o que prejudica o cumprimento da meta fiscal, do teto de gastos e da Regra de Ouro (mecanismos que impede o governo federal de se endividar para pagar despesas correntes, como Previdência Social e benefícios assistenciais.) O não cumprimento dessas regras fiscais —prossegue o governo— poderia provocar insegurança jurídica e impactos econômicos negativos, como endividamento, aumento de taxas de juros e inibição de investimentos.

"Nesse sentido, entende-se que ressalvar as despesas relacionadas, da limitação de empenho, contraria o interesse público", concluiu o governo nas razões do veto.

Bolsonaro no entanto teve entendimento diferente em relação aos projetos prioritários do Ministério da Defesa, que não foram retirados da lista de despesas blindadas de contingenciamento.

Foram preservados os projetos FX-2 (compra de caças da sueca Saab para a renovação da frota da FAB) e Prosub (programa de desenvolvimento do submarino nuclear brasileiro fruto de acordo com a França ); também estarão livres do bloqueio orçamentário despesas com aquisição do cargueiro militar KC-390 e gastos com a compra do blindado Guarani. Bolsonaro manteve ainda no anexo de despesas livres de contingenciamento a implementação do Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras) e do Sistema de Defesa Estratégico Astros 2020.


DW Brasil: Sem vacinação não haverá retomada no Brasil, dizem economistas

Economistas veem cenário "medíocre" para 2021, e boa gestão da crise sanitária é tida como fundamental para recuperar empregos e renda.

Larissa Linder, DW Brasil

O ano de 2020 representará, senão a pior, uma das piores quedas do Produto Interno Bruto (PIB) da história do país. O Ministério da Economia prevê queda de 4,5%. Já a Fundação Getulio Vargas (FGV) estima um recuo de 4,7%, o que faria com que o PIB per capita retrocedesse ao nível de 2009. Encerra-se assim, dizem especialistas, uma década perdida, com desempenho ainda inferior ao dos anos 1980. É com essa herança e com a bagagem da pandemia que começa 2021.

O ambiente econômico congrega, além da crise na saúde, o fim do auxílio emergencial, desemprego recorde, agravamento da situação fiscal e inflação. "É um cenário medíocre, resta saber quão medíocre vai ser em 2021”, diz a consultora econômica Zeina Latif. A previsão do governo é de alta de 3,2% no PIB em 2021. Na última sondagem do mercado feita pelo Banco Central, divulgada na segunda-feira, 28/12, a expectativa era de alta de 3,49%.

A DW Brasil conversou com economistas para entender o que se pode esperar para o ano que se aproxima. Entre os fatores apontados, um ponto em comum: a importância da vacinação em massa para a recuperação da economia. Por enquanto, contudo, nenhuma vacina foi aprovada pela Anvisa, e a previsão do Ministério da Saúde é de começar a imunização em fevereiro. Mas mesmo isso ainda é uma incerteza.

Sem vacinação, sem recuperação

Da vacinação dependerá, em boa medida, a melhora do mercado de trabalho e, portanto, da renda, duas variáveis essenciais em um contexto no qual 67 milhões de brasileiros deixarão de contar com o auxílio emergencial, o que, por sua vez, afetará o consumo.

"Eu acho hoje a vacina a variável fundamental, porque o setor de serviços depende de interação social, e é intensivo em mão de obra”, afirma a coordenadora do Boletim Macro do Ibre, Silvia Matos.

A pandemia e as medidas de quarentena impactaram principalmente o setor de serviços, que responde por quase dois terços do PIB e dos empregos. O volume de serviços avançou 6,3% no terceiro trimestre ante o período anterior, mas ainda segue longe do nível pré-pandemia. No segundo trimestre, o tombo havia sido de 9,3%.

A vacinação também teria um efeito de redução de incertezas, importante para impulsionar os investimentos, já afetados pelo contexto macroeconômico. Para Latif, além da volatilidade cambial, o que tira o sono de quem está no setor produtivo é a crise na saúde.

"O sujeito é um produtor de móveis, aumentou a demanda agora, e ele contratou mais gente, mas ele vai muito além disso? Provavelmente não. Ele está dirigindo na neblina”, exemplifica a consultora. "A gente fica numa armadilha: porque não cuidamos da saúde, a economia sofre mais, aí vêm as demandas por socorro, que deterioram o cenário fiscal”.

A coordenadora do departamento de Economia do Insper, Juliana Inhasz, acredita que a vacina é "muito importante”, mesmo com as inúmeras aglomerações e o desrespeito às medidas de quarentena. "A gente sabe que tem uma parte importante (da economia) subutilizada”, diz. Mas ela pondera que a vacina não resolve todos os problemas: "A pandemia veio  para agravar uma situação (econômica) que já não era confortável”.

Fim do auxílio e desemprego mais alto

A situação não confortável é, em parte, o cenário de três PIBs fracos nos últimos anos, incapazes de repor o que o país havia perdido na recessão 2014-2016. Esses crescimentos, ainda que fracos, vieram impulsionados pelo consumo, não pelo investimento.

Foi também o consumo o responsável pelo avanço recorde do PIB no terceiro trimestre, de 7,7% em comparação com os três meses imediatamente anteriores, possível em grande medida graças ao auxílio emergencial. Era um crescimento esperado diante do gasto do governo: a expectativa do Ministério da Economia é que tenham sido injetados R$ 322 bilhões em benefícios, cerca de dez vezes o valor do Bolsa Família.

Mas o auxílio chegou ao fim em dezembro, o que deve afetar a capacidade de crescimento do país pelo consumo. Segundo pesquisa Datafolha publicada em 21 de dezembro, 36% dos que recebiam o auxílio dependiam exclusivamente dessa renda.

A equação fica mais complicada com o fator desemprego. Quem ficar sem o auxílio e for em busca de geração de renda, encontrará um mercado de trabalho deteriorado. O nível de desocupação atingiu 14,6% no trimestre encerrado em setembro, segundo o IBGE, recorde na série histórica, que começa em 2012. São 14,1 milhões de desempregados, 1,6 milhão a mais que no mesmo período de 2019.

A previsão, segundo Matos, é que a taxa de desemprego fique entre 16% e 17% no ano que vem, novo recorde. A desocupação deve subir antes de retroceder, já que uma parcela da população que era beneficiada pelo auxílio volta a buscar trabalho e entra para a estatística.

Na estimativa da economista da FGV, se todos que fazem parte da força de trabalho estivessem procurando emprego, a taxa de desocupação seria de 25% hoje. "A expectativa de encontrar emprego no futuro está mais difícil. Se encontrar, é com um salário mais baixo. E com a inflação corroendo o poder de compra”, afirma Matos.

Inflação deve persistir

No ano em que os brasileiros se assustaram com os preços dos alimentos, o IPCA-15, uma prévia da inflação, fechou em alta de 4,23%, o maior avanço desde 2016. E foi justamente o grupo alimentação e bebidas - o que mais afeta os mais pobres - que mais pesou, com alta de 14,36%, a maior em 18 anos. O preço do arroz, o vilão da vez, avançou mais de 72%.

Em 2021, a expectativa é de uma participação menor dos alimentos na composição da inflação, embora ainda deva haver pressão sobre os preços desses produtos, de acordo com o economista Andre Braz, do grupo que acompanha o Índice de Preços ao Consumidor, da FGV.

Por outro lado, deve pesar mais a inflação dos serviços e dos preços administrados, como transportes públicos. Alguns reajustes foram adiados diante da pandemia, como os planos de saúde, mas passam a pesar no bolso novamente. As medianas das expectativas para o aumento dos preços administrados em 2020 e 2021 atingiram, respectivamente, 2,33% e 4,27%, segundo a última sondagem do Banco Central.

Endividamento maior e ajuste fiscal

Além de inflação e desemprego, 2021 herda um endividamento maior. A dívida bruta do governo geral saiu de 75,8% do PIB em 2019 para uma estimativa de 94,4% ao final de 2020, conforme relatório do Tesouro Nacional.

O impacto fiscal das medidas de enfrentamento da pandemia no resultado primário é estimado em R$ 620,5 bilhões, segundo a Secretaria da Fazenda. Essa despesa mais vultosa do governo federal em 2020 foi possível por conta do estado de calamidade que se instalou diante da pandemia, e que permitiu quebrar a regra do teto de gastos.

Diante da vulnerabilidade de parte da população e das empresas, além da necessidade de incentivar o consumo, as medidas de estímulo são tidas como acertadas por grande parte dos economistas, e fizeram parte do receituário de muitos países. Mas seguir com os estímulos e quebrando regras como a do teto de gastos em 2021 está longe de ser uma unanimidade.

Enquanto alguns economistas acreditam que é preciso romper com medidas mais severas de ajuste fiscal diante do contexto de desemprego e redução de renda, outros acham que isso seria uma ameaça à própria recuperação econômica, dianto do aumento do risco de insolvência do governo.

"Gastar sem ter de onde tirar pode ser uma saída política, mas pode ser muito ruim para economia. A gente tem uma fragilidade porque tem déficit há muitos anos”, avalia Matos. "É importante distribuir renda, mas concentrar todo mês R$ 600 sem saber quanto tempo ia durar a pandemia… a gente achou que iam ser cem metros, mas foi uma maratona, e nosso cobertor é curto”, diz a economista.

O caminho para o ajuste fiscal passa por Brasília e demanda articulação política. Entre as medidas mais discutidas está a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Emergencial, de 2019, que cria mecanismos de controle de despesas para União, Estados e municípios. A apresentação do parecer do relator, senador Márcio Bittar (MDB-AC), prevista para dezembro, no entanto, acabou adiada para 2021 por falta de consenso, segundo o próprio parlamentar. Também ficaram para o ano que vem reformas como a administrativa e a tributária.