congresso

RPD || Reportagem Especial: Cursos a distância têm maior adesão do público e ampliam acesso a conhecimento

Cleomar Almeida

Desde o início da pandemia da Covid-19, o mineiro Pedro Auarek, de 28 anos, passou a mergulhar ainda mais em cursos online para diminuir a pressão do confinamento social e navegar por formação a distância, que, antes mesmo da crise sanitária global, já apresentava sinais de crescimento no Brasil. “É um novo desafio, e a gente precisa se adaptar”, afirma.

Graduado em relações públicas, Auarek diz ser fã de aulas presenciais, mas já compreende que “os cursos no formato online vieram para facilitar o acesso ao conhecimento para todo mundo”, apesar dos obstáculos no país, onde o acesso à internet ainda não é universalizado.

Três em cada quatro brasileiros acessam a rede, o que equivale a 134 milhões de pessoas, de acordo com a mais recente pesquisa TIC Domicílios, baseada em dados oficiais de 2019.

O levantamento é o mais importante sobre acesso a tecnologias da informação e comunicação, realizado pelo Centro Regional para o Desenvolvimento de Estudos sobre a Sociedade da Informação (Cetic.br), vinculado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil.

Pedro Auarek: “Cursos no formato online vieram para facilitar o acesso ao conhecimento para todo mundo”
Foto: Arquivo pessoal

Mesmo com as dificuldades, as formações online têm avançado no país. Em 10 anos, por exemplo, o número de novos alunos em cursos superiores a distância aumentou 4,7 vezes. Saltou de 330 mil estudantes, em 2009, para mais de 1 milhão e meio, em 2019, o que equivale a um crescimento de 378,9%.

Já o índice de ingressantes em graduações presenciais foi ampliado em escala bem menor: 17,8%. Os dados são do Censo de Educação Superior, pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Em 2018, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Tecnologia da Informação e Comunicação (Pnad Contínua TIC), uma em cada quatro pessoas no Brasil também não tinha acesso à internet. Em números totais, representava cerca de 46 milhões de brasileiros sem acesso à rede.

Iniciativas inovadoras

Ex-secretário de Educação do Distrito Federal, o especialista Marcelo Aguiar observa que “o Brasil sempre foi um país de desigualdades”. “Mas isso nunca impediu que diversas iniciativas, principalmente na área de tecnologia, surgissem”, diz ele.

“O acesso à internet e aos equipamentos vai se disseminando aos poucos também”, ressalta Aguiar. Com mais de 30 anos de experiência na área da educação, ele é sócio do portal Plugged, uma empresa que oferece a estudantes de todo o Brasil uma plataforma de ensino no modelo homeschooling (educação domiciliar).

Mesmo com as dificuldades enfrentadas no país, na avaliação do especialista, as pessoas não podem ficar de braços cruzados à espera de soluções só por parte do Estado. Segundo ele, “também cabe às instituições privadas fornecer oportunidades de conhecimento para reduzir e superar as desigualdades no Brasil”.

A educação a distância está em constante crescimento. Para ter uma ideia, antes mesmo da pandemia, que fez explodir cursos online, esse segmento já apresentava desempenho positivo. De 2017 a 2018, o país havia registrado aumento de 17% no número de alunos matriculados, segundo a Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed).

MELHORE SEU DESEMPENHO

Veja, a seguir, dicas importantes para otimizar aproveitamento de cursos a distância

1.      Não subestime o curso;

2.      Seja organizado;

3.      Crie uma lista de prioridades;

4.      Tenha foco e disciplina;

5.      Monte um cronograma de estudos;

6.      Evite perder os prazos;

7.      Fuja das distrações;

8.      Estabeleça objetivos e metas;

9.      Tenha um local apropriado para estudos;

10.  Evite muito conforto;

11.  Tenha equilíbrio;

12.  Crie mecanismos de motivação;

13.  Tire as suas dúvidas;

14.  Seja independente;

15.  Conte com a tecnologia;

16.  Dicas bônus;

17.  Interaja em fóruns de discussões virtuais;

18.  Aproveite as tarefas coletivas para aprender;

19.  Tenha momentos de descanso.

Capacitação para líderes

Para manter o estímulo à formação a distância no Brasil, a Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília, iniciou, no dia 3 de abril deste ano, o seu mais novo curso com aulas telepresenciais para novos líderes, prefeitos, vereadores e demais gestores filiados ao Cidadania, à qual é vinculada.

Realizado por meio da plataforma Somos Cidadania (somos23.somoscidadania.org.br), o curso Gestão Cidadã tem o objetivo de elevar o padrão das administrações municipais e conta com um time de professores considerados de alto nível.

Roberto Freire: Curso reforça a tradição quase secular do partido. Foto: Cristiano Mariz/VEJA

O presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire, diz que o curso reforça a tradição quase secular do partido, destinada a “políticas de formação de quadros”. “A diferença é que, mais do que anteriormente, a capacitação é bem mais fundamental neste mundo porque as transformações da sociedade e os processos de inovação se refletem também na gestão pública”, afirma.

Antes mesmo de começar, os organizadores comemoraram o sucesso do curso de capacitação, que foi iniciado com mais de mil inscrições de pessoas interessadas em adquirir conhecimento para atuar com gestão inovadora e moderna nos diversos municípios do país.

“Marca de mil inscritos é simbólica”, destaca o coordenador do curso e ex-prefeito de Vitória, Luciano Rezende. Foto: Ana Volpe/Agência Senado

“Volume muito grande”

“A marca de mil inscritos é simbólica. Mostra o volume de pessoas, muito grande, interessadas em se capacitar em gestão pública”, destaca o coordenador do curso e ex-prefeito de Vitória (ES) por dois mandatos (2013 a 2020), o médico Luciano Rezende.

Diretor-geral da FAP e consultor do Senado, o sociólogo Caetano Araújo ressalta que o curso fornece o conjunto de informações necessárias para a gestão pública ser eficiente, a fim de os serviços públicos serem realizados com a maior eficácia possível.

A formação a distância realizada pela fundação, de acordo com Araújo, tem profissionais altamente competentes em suas respectivas áreas. “São pessoas com competência acadêmico-gerencial, conhecidas pelos seus pares e com larga experiência nestes temas”, assevera.

Caetano Araújo ressalta que o curso fornece o conjunto de informações necessárias para a gestão pública ser eficiente. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

A fundação, desde que foi criada, em 2000, tem atuação bastante forte na formação política, primeiro com cursos exclusivamente presenciais. Depois, a FAP passou a fortalecer suas atividades no segmento de cursos a distância.

Apenas no ano passado, a fundação realizou dois cursos online de formação política, com entrega de certificados para 606 concluintes, no total. A Jornada da Cidadania formou 391 alunos e a Jornada da Vitória, 215.

Além de incluir as duas jornadas na lista de seus cursos de formação a distância, o mineiro Pedro Auarek agora ocupa seu tempo com dedicação ao Gestão Cidadã. “Fiz mais de 20 cursos online, a maioria deles no período da pandemia”, comemora.

GESTÃO PÚBLICA DE EXCELÊNCIA

Confira, abaixo, detalhes do curso a distância Gestão Cidadã

Objetivo geral

Formar novos líderes que agreguem valor às gestões do Cidadania e capacitar filiados, prefeitos e vereadores do partido na área de gestão pública, com a finalidade de elevar o padrão das administrações municipais.

Objetivos específicos

Fornecer bases e conhecimentos para a implementação de gestão pública focada no cidadão e preparar gestores públicos para atuar de forma transparente e eficiente, usando toda a tecnologia disponível (Cidades Inteligentes) na execução de políticas públicas, sem abandonar a responsabilidade fiscal e a austeridade, requisitos fundamentais para administração pública de qualidade.

Metodologia e programação

• Formação presencial online (telepresencial): aulas gravadas, associadas a ambiente virtual de aprendizagem assíncrona, com estudos dirigidos (vídeos/podcast e leitura).

• 6 semanas de curso: aulas às segundas e quartas, das 19h às 20h30.

• Carga horária total: 36 horas

• Aproveitamento: certificado para quem visualizar, por completo, 75% das aulas online que serão gravadas e disponibilizadas na plataforma.

Formato do curso

• Aulas telepresenciais: duas aulas semanais ao vivo de 1h30, com 30 minutos para tirar dúvidas dos alunos.

• Leitura Obrigatória: professor indica artigo ou capítulo de livro para leitura com carga de 45 minutos (tempo estimado).

• Material complementar: professor deve indicar artigo ou capítulo de livro para leitura com carga de 45 minutos (tempo estimado).

Público-alvo

• Prefeitos e vereadores eleitos pelo Cidadania 23.

• Filiados do Cidadania 23 que atuam na gestão pública.

• Simpatizantes do Cidadania 23 que desejam conhecer as boas práticas da administração pública.

Fonte:


Mariliz Pereira Jorge: Wajngarten, o tchutchuca na CPI da Covid

Pelo que vimos nesta quarta (12), bolsonarista é o tipo tigrão nas redes sociais, quando escorado pelo aparato do governo, mas muito tchutchuca quando precisa enfrentar uma CPI. Fabio Wajngarten gaguejou, disse e desdisse, caiu em contradição, suou, tremeu e, sobretudo, mentiu em seu depoimento à comissão que investiga a má gestão da pandemia.

O ex-secretário da Secom sofre do mal que acomete essa turma que chegou ao Planalto com a eleição de Jair Bolsonaro. Cria as suas próprias narrativas, seguro de que pode manipular não apenas a opinião pública mas os fatos. Ignora que uma coisa é alimentar a militância bolsonarista com mentiras, a outra é bancá-las quando o que está em jogo é prisão.

Wajngarten achou que seria uma boa estratégia tentar livrar a barra do presidente ao colocar a culpa no ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, numa entrevista à revista Veja, que tem toda a cara de ter sido concedida exatamente para isso. Faltou combinar com os russos. Os senadores parecem pouco dispostos a tolerar as artimanhas de que Bolsonaro e apoiadores se servem e pelas quais nunca são cobrados .

A Secom, com Wajngarten à frente, fez campanha para o fim do isolamento e contra a obrigatoriedade da vacina, enalteceu o uso da cloroquina e usou o Telegram, famoso entre os bolsonaristas, para disseminar essas informações. O ex-secretário diz que não sabe, não viu, que estava de licença médica, mas o print é eterno. Seria cômico, se não fosse trágico.

A carta da Pfizer, enviada em setembro de 2020, em que a empresa cobra resposta sobre a oferta de vacinas feita no mês anterior, foi ignorada por dois meses, até que Wajngarten foi procurado, segundo ele, pelo dono da Rede TV. Como a vida de milhões passou a depender da conversa entre um dono de uma empresa privada e um secretário de Comunicação para que a negociação da vacina fosse adiante? Que Pazuello explique em seu depoimento.

Fonte:

Folha de S. Paulo

https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marilizpereirajorge/2021/05/wajngarten-o-tchutchuca-na-cpi-da-covid.shtml

 


Vinicius Torres Freire: CPI da Covid tem de chamar mais gente para mentir e deixar o ‘teje preso’ para depois

CPI da Covid e parte do país parou para discutir se Fabio Wajngarten deveria ser preso por ter mentido em seu depoimento no inquérito parlamentar. O país já deveria ter aprendido a besteira violenta que dá sair prendendo gente a torto e a direito, mas o assunto de interesse mais imediato nem é esse. A CPI não deve ameaçar os depoentes. Deve chamar mais gente para mentir mais ou até contar a verdade. Seja qual for a opção dos inquiridos, o governo Bolsonaro vai ficar exposto, para usar um eufemismo juridicamente seguro.

general Eduardo Pazuello, ex-chefe do almoxarifado da Saúde, é o próximo da fila do vexame e de um futuro programa de acareações, mas já é uma figura manjada. A fila tem de andar. Por exemplo, quando a CPI vai convocar o general Braga Netto, ora ministro da Defesa e ex-ministro da Casa Civil?

Braga Netto tomou decisões relativas à vacina. Um documento do governo diz que ele liderou o “processo decisório” de adesão do Brasil à iniciativa da OMS (ACT Accelerator) do qual fazia parte a Covax (distribuição de vacinas para países mais pobres). Muito bem. O que ele mais sabe sobre os processos decisórios? A Casa Civil, o ministério da Saúde e o ministério da Economia fizeram reuniões para decidir o que fazer da vacina da AstraZeneca, em 19 de junho de 2020, por exemplo. Os ministros dessas pastas também receberam a célebre carta ignorada em que a Pfizer oferecia vacinas.

Isso consta dos relatórios do “Grupo de Trabalho para a Coordenação de Esforços da União na Aquisição e na Distribuição de Vacinas contra a Covid-19”, que faz também uma lista de instituições que participaram dos debates e ouviram as posições do Ministério da Saúde (associações médicas, Butantan, Fiocruz, conselho de secretários de Saúde etc.). Seriam ótimas fontes de material para as acareações do general Pesadello ou de Wajngarten, pelo menos, dado que não vão poder fundamentar as perguntas para essas criaturas.

Paulo Guedes deveria ser o próximo ministro a sentar no banco do inquérito parlamentar. Além de seu ministério ter participado de decisões ou conselhos relativos à vacina, a Economia também manifestou publicamente opiniões enfáticas a respeito da epidemia. No mesmo dia 17 de novembro em que Wajngarten dizia bater um papinho informal com a Pfizer, a Secretaria de Política Econômica de Guedes afirmava que a possibilidade de “segunda onda” era “baixíssima” no Brasil, entre outras temeridades. Até dezembro, pelo menos, Guedes negava o risco de novo desastre, quando o repique do morticínio já era evidente. Revelou-se outra vez um mestre, quiçá doutor, em avaliação de risco e previsões certeiras (as quais o ministro costuma errar na casa das dezenas de milhões ao trilhão).

O que Braga Netto e mesmo Guedes têm a dizer sobre o fato de o Brasil ter encomendado poucas vacinas da Covax (para cerca de 10% da população, bastantes para pessoas com mais de 80 anos, com comorbidades e trabalhadores de saúde, como argumentou a Saúde)?

Como explicam que a oferta da Pfizer ficou no limbo? Negligência? Levaram a proposta a Bolsonaro? Fizeram alguma coisa? É uma pergunta simples, com respostas simples. Assumem a responsabilidade ou a jogam nas costas de alguém. Não dá nem para mentir.

Ainda falta roteiro de investigação para a CPI. Um quadro de “perguntas sem resposta”, uma planilha de mentiras já registradas, um organograma de responsabilidades a ser preenchido com esses nomes ministeriais e outros.

O “teje preso” é para depois.

Fonte:

Folha de S. Paulo

https://www1.folha.uol.com.br/colunas/viniciustorres/2021/05/cpi-da-covid-tem-de-chamar-mais-gente-para-mentir-e-deixar-o-teje-preso-para-depois.shtml


Maria Hermínia Tavares: Autobiografia de uma nação

Em um artigo publicado em 1994 no jornal turinês La Stampa, sob o título “Aquela Itália modelo Berlusconi”, o filósofo Norberto Bobbio (1909-2004) se perguntou, com um misto de espanto e tristeza, se o berlusconismo não seria “uma espécie de autobiografia da nação, da Itália de hoje”.

A pergunta vale para o Brasil, embora talvez seja precipitado falar em bolsonarismo para designar, seja os seguidores militantes do presidente —os seus minions—, seja o sentimento difuso de apatia benevolente ou simpatia aberta de quase a metade dos brasileiros em relação ao chefe do desgoverno. A despeito da administração catastrófica da pandemia —responsável por um número decerto elevado de mortes evitáveis e estagnação econômica—, sucessivas sondagens indicam que segue estável o contingente dos que consideram o desempenho de Bolsonaro ótimo ou bom, na casa de 30%, e o dos que lhe atribuem conceito regular (da ordem de 20%).

A constância das opiniões parece dizer muito do estado da nação que seus habitantes construíram sem querer ou perceber. É o país da educação pouca e precária, que abre espaço a explicações estapafúrdias sobre a origem da Covid-19 e as maneiras de enfrentá-la.É onde, diante do imperativo de ganhar a vida e à falta de alternativas para fazê-lo de forma segura, milhões de pobres viraram cativos dos discursos que minimizam o perigo da praga e desprezam as medidas básicas de proteção contra ela.

É a nação que deixou que o crime se apropriasse de extensos territórios urbanos, disseminando o medo, a insegurança e a consequente aceitação das formas mais brutais de reprimir a criminalidade. É o país da favela do Jacarezinho, que toma com naturalidade que suspeitos —até de delitos menores— sejam exterminados com autorização do governador do estado, aplausos de apresentadores de TV e apoio ostensivo do presidente e de seu vice.

É a nação onde as distâncias sociais são tão imensas que as próprias instituições que em outras paragens dão corpo à solidariedade social —previdência, serviços de saúde e transporte coletivo— reproduzem desigualdades e diferenças. Sem estruturas de solidariedade social, os mais bem aquinhoados e protegidos veem os que morrem na porta dos hospitais, quando os veem, como estatísticas, e os abatidos numa favela como suspeitos habitantes de outro planeta, onde a vida é sórdida, abrutalhada e breve.

O crescimento da extrema direita, na última década, com seus movimentos, redes, gurus e porta-vozes, é um lado da autobiografia recente desta nação. Bolsonaro apenas deu-lhe o que tem: uma cara cruel e primitiva.

*Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.Postado por Gilvan Cavalcanti de Melo às 08:55:00 Enviar por e-mailPostar no blog!Compartilhar no TwitterCompartilhar no FacebookCompartilhar com o Pinterest

Fonte:

Folha de S. Paulo

https://www1.folha.uol.com.br/colunas/maria-herminia-tavares/2021/05/autobiografia-de-uma-nacao.shtml


Bruno Boghossian: Lula retoma territórios, e Bolsonaro se agarra a base mais restrita, aponta Datafolha

A fidelidade da base lulista e a hesitação do eleitorado que aderiu a Jair Bolsonaro (sem partido) em 2018 ajudam a explicar o descolamento entre os dois principais personagens da próxima corrida presidencial.

De volta ao jogo depois que o STF (Supremo Tribunal Federal) anulou condenações que o impediam de concorrer no ano que vem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) retomou o controle de territórios tradicionalmente petistas, de acordo com números da primeira pesquisa do Datafolha para a disputa de 2022.

Uma fatia da vantagem que o ex-presidente abriu sobre seus adversários aparece principalmente no grupo mais pobre da população —o que sugere que bandeiras petistas como as plataformas de distribuição de renda e redução da pobreza ainda ressoam nesse eleitorado.

Os números indicam que essa faixa é uma trincheira inicial de Lula. Entre eleitores que ganham até dois salários mínimos, o petista aparece com 47% no primeiro turno. Nos demais grupos de renda, ele não passa de 34%. Também está ali sua menor rejeição: 29%, contra mais de 40% em outros segmentos de renda.

Num eventual segundo turno contra Bolsonaro, os mais pobres dariam ao petista uma vitória por 60% a 28%.

A margem de Lula nesse recorte é relevante, no ponto de partida, porque o segmento de baixa renda representa mais da metade do eleitorado brasileiro. Além disso, esses grupos foram alvos de investidas de Bolsonaro ao longo do último ano.

O pagamento das parcelas de R$ 600 do auxílio emergencial, até setembro de 2020, aproximou esse eleitorado da órbita do presidente. O segmento ajudou o governo, em certa medida, a manter sua aprovação estável na pandemia e após a crise com o ex-juiz Sergio Moro, quando Bolsonaro perdeu popularidade em grupos de renda mais alta.

Os índices apresentados pelo Datafolha apontam que o presidente se agarra, agora, a uma base mais restrita. Com uma nova rodada do auxílio em valores menores, Bolsonaro não conseguiu avançar entre os mais pobres. Do outro lado, ele tem seus maiores índices de rejeição em segmentos mais ricos e com escolaridade mais alta.

Embora o presidente tenha consolidado um eleitorado fiel, ele encontra esse obstáculo em sua corrida à reeleição. Brasileiros com ensino superior completo foram alguns dos primeiros grupos a impulsionar a candidatura de Bolsonaro em 2018, abrindo caminho para sua vitória.

Agora, parte deles rejeita o presidente e parece buscar uma alternativa. Nesse segmento, Lula aparece com 30%, contra 22% de Bolsonaro, enquanto outros 36% se dividem entre os candidatos que disputam o rótulo da terceira via: Ciro Gomes (11%), Sergio Moro (10%), João Amoêdo (6%), Luciano Huck, João Doria e Luiz Henrique Mandetta (3% cada).

Esse pelotão, no entanto, não ameaça a vaga de Bolsonaro no segundo turno ou a liderança de Lula em nenhum recorte da população com peso relevante na pesquisa. Pode ser um sinal de que o eleitorado que rejeita os dois principais concorrentes não é tão numeroso quanto gostariam os demais candidatos.

Caso o cenário se cristalize como uma disputa concentrada entre Lula e Bolsonaro, a corrida vai se desenhar ao longo do próximo ano a partir dos movimentos dos dois líderes para preservar redutos, ampliar seus domínios e estimular a rejeição ao adversário.

No numeroso segmento de baixa renda, o desempenho da economia e o uso da caneta presidencial podem mexer nas curvas de intenção de voto. Ainda que os petistas enxerguem um vínculo histórico com esse grupo, a experiência do auxílio emergencial mostrou que parte dos eleitores responde rapidamente a medidas que tenham efeito direto sobre seu bolso.

As discussões no governo sobre a ampliação de despesas, os benefícios prometidos pelo presidente a categorias como caminhoneiros e o enfraquecimento da agenda de cortes do ministro da Economia, Paulo Guedes, indicam que Bolsonaro tem disposição para tomar decisões com potencial eleitoral considerável.

Além disso, auxiliares do presidente esperam que sinais de recuperação econômica e avanços na vacinação, embora extremamente lentos, possam se consolidar até 2022 e ajudar a reduzir a rejeição ao governo pela condução da resposta à pandemia da Covid-19.

A esperança dos bolsonaristas é recuperar, assim, parte do eleitorado que esteve com o presidente em 2018 e que não votaria em Lula no ano que vem. O foco da campanha seria despertar novamente o antipetismo, principalmente em segmentos da classe média e em grupos mais ricos da população.

Na visão de aliados do Palácio do Planalto, se nenhum outro candidato se mostrar competitivo até os meses finais da campanha, parte desse eleitorado poderia se aproximar de Bolsonaro por gravidade para derrotar o PT.

Fonte:

Folha de S. Paulo

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/05/lula-retoma-territorios-e-bolsonaro-se-agarra-a-base-mais-restrita-aponta-datafolha.shtml

 


José Serra: Orçamento sem bom censo

O Orçamento público aprovado no final de abril, com atraso e inconsistências técnicas, compromete o desempenho das políticas públicas no País e cancela, na prática, os recursos para a realização do Censo 2021. Nos Estados Unidos, o presidente Joe Biden defende seu ambicioso plano de Estado para os próximos dez anos; já no Brasil, os formuladores de políticas governamentais promovem desorganização das contas públicas e desmantelamento de programas de governo indispensáveis ao desenvolvimento do País.

Soma-se a esse inadmissível desacerto na condução da política econômica a inepta tese de que o Orçamento público deve ser decidido pelos parlamentares. Como se o papel do Executivo fosse somente largar na porta do Congresso Nacional o principal instrumento de planejamento e gestão do País. Não é admissível que um governo se exima de governar.

Nossa Constituição federal confere ao Poder Executivo competência privativa para elaborar o Orçamento, em função de metas e prioridades estabelecidas pelo presidente da República. Quando o governo abre mão dessa prerrogativa durante o processo de elaboração do Orçamento, o Parlamento ocupa esse espaço e, por inércia, tende a avançar na alocação unilateral dos recursos públicos, por meio de emendas orçamentárias.

Nota-se que o governo federal se descompromete das próprias metas e prioridades ao evitar interações com o Poder Legislativo na fase de discussão do Orçamento. Por sua vez, os parlamentares têm interesses próprios relacionados às suas bases eleitorais e locais. Num sistema político-partidário fragmentado, como se verifica no Brasil, a estratégia do governo, em última análise, compromete a qualidade do gasto e alimenta o viés deficitário do Orçamento.

Nesse contexto, o Congresso praticamente excluiu do Orçamento de 2021 a previsão de recursos para a realização do censo. O relator-geral do Orçamento adotou uma estratégia conhecida na Esplanada como “inversão de prioridades”: corta-se uma despesa essencial para financiar outros gastos de prioridade duvidosa, sabendo que, no fim das contas, haverá forte pressão para recompor a verba cortada.

Sabe-se que o censo, no Brasil, deve ser realizado a cada dez anos, nos termos do primeiro artigo da Lei 8.184, de 1991. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, ao ser provocado, decidiu corretamente ao determinar que o governo tome as providências para realizá-lo neste ano. A Corte julga agora um recurso da Advocacia-Geral da União contra essa determinação, mas, ao que tudo indica, os ministros devem manter a decisão anterior.

O Censo 2021 deve ter prioridade e medidas devem ser tomadas para superar questões sanitárias. Na ponta do lápis, o custo é irrisório comparado aos benefícios: gasta-se pouco para lançar mão de dados que ajudam os gestores públicos a fazer uma alocação melhor e mais eficiente dos recursos públicos. Trata-se de uma ampla pesquisa que cobre os domicílios brasileiros, com um retrato detalhado da população – desde quantidade e características das famílias até o tipo de moradia em que vivem, levando em conta acesso a coleta de lixo, energia elétrica e transporte público, por exemplo.

Cabe também observar que o Brasil vem sofrendo transformações substanciais na última década. São mudanças nos fluxos migratórios e na pirâmide etária do País, por exemplo, que só podem ser medidas com maior precisão com o censo. E são indicadores fundamentais para tomada de decisões e formulação de políticas públicas.

Em países avançados, o censo é considerado uma ferramenta essencial para o desenvolvimento. Recentemente tive a oportunidade de acompanhar a manifestação de um ministro canadense explicando a importância das pesquisas censitárias, especialmente para o planejamento dos negócios no setor privado e das políticas públicas mais importantes para as comunidades. Devemos seguir esse caminho, pondo o censo como instrumento prioritário da administração pública.

Quando ministro do Planejamento, tive a oportunidade de coordenar a elaboração do primeiro plano plurianual do governo Fernando Henrique Cardoso. A maioria das reuniões era realizada no ministério, mas não foram poucas as vezes em que fui pessoalmente ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), braço direito na elaboração do plano.

Eram presença marcante e constante dessas reuniões técnicos da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Este, hoje tão desrespeitado e desprestigiado, foi o responsável por fornecer as estatísticas sobre o acesso da população brasileira aos serviços básicos, níveis educacionais e outros indicadores que nortearam a definição das políticas públicas a serem implementadas no Brasil à época.

É uma pena observar manobras no Orçamento federal que comprometem a realização do Censo 2021. O governo precisa recuperar seu protagonismo no processo de elaboração do Orçamento, sinalizando para o Congresso o compromisso com o planejamento das políticas públicas. Caso contrário, o Orçamento continuará sem bom censo.

*Senador (PSDB-SP)

Fonte:

O Estado de S. Paulo

https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,orcamento-sem-bom-censo,70003713088

 


Bruno Boghossian: Chefe da Anvisa escancara na CPI conduta destrutiva de Bolsonaro

Antônio Barra Torres se diz amigo de Jair Bolsonaro. Nos primeiros meses da pandemia, o presidente da Anvisa frequentava o Palácio da Alvorada e aconselhava um presidente que já fazia questão de minimizar os riscos daquela crise. Agora, com o país mergulhado na tragédia, ele reconheceu que o governo levou o país pelo caminho errado.

O depoimento de Barra Torres à CPI da Covid escancara a conduta destrutiva de Bolsonaro. A comissão já esperava colher depoimentos incômodos para o presidente entre seus desafetos, como o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, mas nem mesmo um amigo foi capaz de acobertar o estrago feito até aqui.

Indicado por Bolsonaro para o comando da Anvisa, o contra-almirante disse que as declarações feitas pelo presidente sobre a vacinação vão “contra tudo” o que a agência defende. “Discordar de vacina, falar contra vacina não guarda uma razoabilidade histórica”, afirmou. “Eu penso que a população não deva se orientar por condutas dessa maneira.”

Barra Torres tem mandato na Anvisa até 2024. A estabilidade no cargo deve ter garantido tranquilidade para que ele entregasse os delitos do presidente. No depoimento, o contra-almirante disse, sem meias palavras, que a cloroquina não funciona contra a Covid-19 e confirmou que o Palácio do Planalto sediou uma reunião para tentar adequar a bula do remédio aos delírios de Bolsonaro.

Embora tenha participado de uma manifestação ao lado do presidente quando o coronavírus já circulava no país, Barra Torres criticou o incentivo a aglomerações. “[Apesar] da amizade que tenho, a conduta do presidente difere da minha nesse sentido”, declarou. “Não tem nenhum sentido do ponto de vista sanitário.”

O depoimento do amigo de Bolsonaro mostrou que o governo vai ter dificuldades para controlar os estragos que podem ser produzidos pela CPI. O futuro do presidente depende cada vez mais de puxa-sacos como Eduardo Pazuello e de uma tropa de choque bem alimentada formada por políticos do centrão.

Fonte:

Folha de S. Paulo

https://www1.folha.uol.com.br/colunas/bruno-boghossian/2021/05/chefe-da-anvisa-escancara-na-cpi-conduta-destrutiva-de-bolsonaro.shtml

 


Rosângela Bittar: Fraulein, o regresso

Assim como não existe legalmente, o Centrão não tem preços fixos. De um lado do balcão, o presidente da República. Do outro lado, as legendas, da Câmara sobretudo. Com suas condições no atacado e no varejo. Em postos bem posicionados, com domínio de comissões decisivas para a linha de montagem dos produtos, representantes fanáticas do presidente Jair Bolsonaro.

Essas transações produzem um escândalo atrás do outro. Quem se importa ou se envergonha?

A Câmara dos Deputados descobriu que o preço do presidente Jair Bolsonaro está abaixo da expectativa do Centrão, uma vez que os critérios da barganha parlamentar só consideram de milhões para cima. Para a sociedade tudo isso é incompreensível e doloroso. Como compatibilizar a votação de uma mudança de costumes com as obras físicas inúteis e superfaturadas? Como pesar o engavetamento do impeachment tendo no outro prato da balança a anulação das minorias parlamentares com uma simples mudança do regimento?

As concessões de Bolsonaro são em moeda corrente. Já o capital do Centrão inclui principalmente bens intangíveis. O preço da involução dos costumes, por exemplo, está ficando insuportavelmente alto. As imposições do presidente são, na verdade, um conjunto de ideias fixas, resultantes de seu voluntarismo.

A abertura da Câmara para o voto impresso, por exemplo, é inexplicável em qualquer idioma, um risco não tabelado.

O presidente da Câmara, que conduz as negociações, não atua propriamente como líder, mas como um intermediário que costura composições onerosas.

Quem presta atenção no fato de que puxam o Brasil para trás, exatamente no quesito com que causam admiração ao mundo?

Absurdo que este retrocesso, com a revogação do sistema eletrônico de votação, parta de uma pessoa que não respira a não ser pelos aparelhos do Instagram, do WhatsApp, do Facebook, do Telegram, etc. Nem sabe ainda o que fazer da montanha de papéis inúteis que produzirá.

Colocada à mesa de negociações diante de outra insensatez, que é a demolição do sistema educacional brasileiro e seus avanços seculares, a Câmara se entregou. Achou uma pechincha a imposição da velha escola, a domiciliar. Que tal uma enquete com os pais de estudantes que estão vivendo esta longa temporada de pandemia com os filhos submetidos a aulas remotas ou a aula nenhuma? Como se fosse possível suprimir o papel dos professores e a socialização das crianças e adolescentes, ou eliminar as novas técnicas pedagógicas e sua integração com a ciência e a vida.

A volta a este passado invoca um dos personagens marcantes da literatura brasileira que está no livro Amar, Verbo Intransitivo, de Mário de Andrade, publicado em 1927. A inesquecível fraulein Elza, mais que professora, mestra em tudo. É esta a proposta? O ensino doméstico acabou na primeira Lei de Diretrizes e Bases.

Quem poderá pagar por isso? Quem controlará os planos, métodos e conteúdos? A quem se prestará contas? Quem fará a atualização de conhecimento? Não vale a pena sequer especular.

Produtos caríssimos, que o Centrão paga sem pedir desconto.

Nesse escambo, vale quanto pesa a regressão nas reformas constitucionais. Ou fatiar a reforma tributária não é o mesmo que dela desistir?

Para ter os votos da maioria que transformam o país nesta colcha de retalhos, o presidente vai criando novas moedas, e o Centrão se farta. A mais recente está expressa em um orçamento paralelo e secreto, revelado por Breno Pires em reportagem publicada pelo Estadão. Invenção que vale ouro nesta contabilidade. O resultado pode ser um trator trombando com uma retroescavadeira, um hospital ao lado de outro, uma rodoviária em cima da outra. Obras eleitorais explodirão neste governo como resultado da cooptação da Câmara.

E o vírus da pandemia sob dezenas de novas cepas.

Fonte:

O Estado de S. Paulo

https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,fraulein-o-regresso,70003712017


Fernando Exman: Centro entra na briga pelo “agro-eleitor”

Fevereiro de 2015. Cerca de nove meses antes do início do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, estavam mais do que dados os sinais da polarização em gestação e que há anos trava o jogo político. Aquele evento no Rio de Janeiro, agendado para ser um ato em defesa da administração petista e a gestão do partido à frente da Petrobras, seria lembrado até hoje por produtores rurais que justificam a decisão de aderir ao projeto político do presidente Jair Bolsonaro e já entraram no radar das siglas de centro.

Havia tensão no ar. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegara ao local depois que militantes petistas e oposicionistas já haviam trocado sopapos. A polícia precisou ser acionada.

“Em vez de ficarmos chorando, vamos defender o que é nosso. Defender a Petrobras é defender a democracia e defender a democracia é defender a continuidade do desenvolvimento social neste país”, discursou Lula, convocando os aliados a saírem pelas ruas. Aplausos na plateia.

Entre os presentes, pouco importava a proposital confusão entre a defesa de uma empresa estatal que sofrera um verdadeiro saque e o desagravo a um governo em derrocada. Sabia-se que Dilma não chegaria ao último dia de mandato. Mas, para Lula e seus aliados, era necessário, antes de tudo, manter a militância vigilante.

Ao concluir sua fala, o petista deu a senha para aqueles que precisavam de um motivo para radicalizar do outro lado: “Quero paz e democracia. Mas, se eles não querem, nós sabemos brigar também. Sobretudo quando o João Pedro Stédile colocar o exército dele do nosso lado”.

Era uma óbvia referência ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e à sua capacidade de mobilização no campo ou na cidade. O MST sempre esteve onde o PT ou outros movimentos sociais precisaram de uma forcinha para aumentar o número de participantes em manifestações.

Àquela altura, não estava claro até onde iria chegar o esgarçamento das relações partidárias, quem emergiria para vencer o pleito de 2018 e de que lado se posicionariam os atores políticos dali em diante. Ficou patente, contudo, que o agronegócio teria que procurar alternativas, embora Lula tenha colocado em seu próprio ministério Roberto Rodrigues, uma unanimidade no setor.

Decidiu-se, então, adubar a campanha do deputado Jair Bolsonaro. Os dois grupos passaram a caminhar lado a lado. Só deixarão de marchar juntos novamente em 2022, se uma força de centro conseguir atrair o setor agropecuário para fortalecer uma terceira via.

Depois de eleito, o presidente até achou que poderia governar se aproveitando dessa proximidade. Sua ideia era driblar os partidos e falar diretamente com as bancadas temáticas do Parlamento, entre as quais se destaca justamente a frente parlamentar do agronegócio. Não conseguiu, para a satisfação do Centrão, mas mesmo assim nunca deixou de patrocinar as pautas de interesse do segmento.

Neste mês, por exemplo, duas propostas defendidas pela bancada ruralista passaram a tramitar de forma mais rápida. A Câmara dos Deputados deve aprovar em breve um novo marco regulatório para o licenciamento ambiental. Outro projeto em discussão versa sobre regularização fundiária, bandeira comum entre produtores rurais e autoridades do governo que citam essa medida como panaceia para o combate ao desmatamento ilegal na Amazônia.

Além dos programas conduzidos pelo Ministério da Agricultura, com o Ministério da Infraestrutura Bolsonaro tem buscado dar um empurrão em diversas obras voltadas ao escoamento da produção. Ao Ministério do Desenvolvimento Regional, cabe acelerar a entrega dos empreendimentos relacionados à irrigação.

A Caixa Econômica Federal deve passar a atuar com mais intensidade no setor, onde o Banco do Brasil já é uma referência. Uma das apostas do governo é assegurar oferta de crédito para a construção de silos. Essa medida daria um conveniente apoio ao produtor de menor porte.

Também se tenta destravar os debates internos sobre o próximo Plano Safra, o qual tende a ter seu desenho concluído ainda neste mês. Restrições orçamentárias devem limitar o seu alcance.

A política de flexibilização do acesso a armas e munições também atende ao homem do campo, mas nada se compara ao que se observa em relação à atual debilidade do MST. A escassez de notícias de novas invasões realizadas pelo movimento se tornou um grande trunfo de Bolsonaro. O presidente já incorporou esse fato ao seu discurso. Isso inevitavelmente estará presente na campanha à reeleição.

A redução desse tipo de ocorrência e a alta do preço das commodities estreitam a cada dia a relação dos produtores rurais com o atual ocupante do Palácio do Planalto. Essa conjunção de fatores parece fazê-los esquecer que em praticamente toda semana algum representante do governo federal, se não o próprio presidente da República, protagoniza algum desaforo em direção à China, principal cliente do setor.

Um ato nacional está sendo preparado para o dia 15 e basta percorrer de carro o país para se ter outras evidências dessa parceria. São muitas as placas publicitárias instaladas às margens das estradas por associações rurais locais. Todas em apoio ao presidente.

Se o Ministério Público não tomar alguma atitude para retirar esses anúncios em razão da proximidade do período eleitoral, dificilmente alguma legenda formalizará pedido na Justiça para que a prática seja considerada campanha antecipada. Restaria aos partidos uma saída que buscasse criar conexões diretas com essa parcela da população, como a escolha de um vice originário do agronegócio para a composição de uma chapa alternativa às que serão encabeçadas por Lula e Bolsonaro. É isso o que lideranças políticas de Brasília pensam quando falam de um vice ideal para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, se o mineiro decidir mesmo deixar o DEM e filiar-se ao PSD para concorrer a Presidência da República

Fonte:

Valor Econômico

https://valor.globo.com/politica/coluna/centro-entra-na-briga-pelo-agro-eleitor.ghtml


Ricardo Noblat: O que disse Barra Torres à CPI da Covid calou Bolsonaro

De manhã, antes do início do depoimento à CPI da Covid-19 no Senado do contra-almirante Antonio Barra Torres, presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Jair Bolsonaro fez o de costume antes de ir trabalhar: reuniu-se nos jardins do Palácio da Alvorada, onde mora, com um grupo de devotos, e deitou falação. Entre outras coisas, chamou jornalistas de “canalhas”.

No meio da tarde, informado sobre o que dissera Barra Torres, e ainda dizia, perdeu a voz. Sequer discursou como estava previsto na cerimônia em que o governo anunciou a liberação de mais dinheiro para a área da Saúde e socorro aos brasileiros pobres atingidos pela pandemia. Aquela seria uma ocasião para faturar politicamente, mas ele não o fez. Parecia bufar de tão furioso.

Não era por menos. Foi até aqui o depoimento que mais afrontou o governo e pessoalmente o presidente da República. Os dos ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich saíram conforme o previsto, assim como o de Marcelo Queiroga, o atual ministro, que poupou o governo e Bolsonaro dos maiores embaraços. Queiroga mentiu e sonegou informações.

Barras Torres, não. Ele confirmou que no início da pandemia houve uma reunião, no Palácio do Planalto, para discutir uma mudança na bula da cloroquina. Disse que não concorda com uso de cloroquina no suposto tratamento precoce do vírus. Defendeu o uso de máscaras e testagem em massa, e afirmou que falas de Bolsonaro sobre vacinas atrapalham o combate à pandemia.

Quer mais? Disse estar arrependido de ter aparecido ao lado de Bolsonaro em manifestação antidemocrática. O ato ocorreu em março de 2020. Considerou “inadequado” o passeio de moto feito pelo presidente no último domingo. E deu em Bolsonaro uma cutucada que ele jamais esquecerá: “No meio militar o que causa mais irritação é o cidadão que quer ser algo que não é”.

Cercado de militares vassalos que só lhe dizem amém, Bolsonaro deve ter imaginado que Barras Torres se comportaria como eles. Como o general Eduardo Pazuello, por exemplo, adepto da teoria do manda quem pode, obedece quem tem juízo. Pazuello irá depor à CPI na próxima quarta-feira, se possível protegido por um habeas corpus que pedirá à justiça para calar-se ou falar pouco.

Tem tudo para ser comparado com Barras Torres e sair de lá execrado, ao contrário do seu colega de farda.

Demitido, Fabio Wajngarten volta a assombrar o governo

Provas, a CPI da Covid-19 ainda não tem. Espera obtê-las ao longo das próximas semanas. Mas evidências ela já reuniu de que Fabio Wajngarten, publicitário e ex-Secretário de Comunicação do governo federal, fez lobby a favor da compra da vacina da Pzifer. Esperava, segundo dois senadores ouvidos por este blog, amealhar alguns trocados. Não por isso, Wajngarten acabou demitido.

Bolsonaro detestou o depoimento prestado à CPI pelo contra-almirante Barras Torres, presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Mas o que ele teme é o que o seu ex-secretário de Comunicação possa dizer. Para livrar-se de suspeitas no caso da vacina da Pzifer, Wajngarten atirou na cabecinha do general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, em entrevista à VEJA.

Wajngarten saiu do governo magoado, de resto como Pazuello. Sempre foi fiel a Bolsonaro desde os tempos da facada em Juiz de Fora, no dia 6 de setembro de 2018. Foi ele que mobilizou empresários e meios de transporte para que Bolsonaro fosse transferido de lá para São Paulo e internado no Albert Einstein, um dos hospitais mais caros do país.

Acabou sendo vítima de intrigas palacianas e perdeu lugar no governo. Está inconformado. Queixa-se, principalmente, do general Luiz Eduardo Ramos, chefe da Casa Civil, que a ele só se refere de forma depreciativa. Poderá usar seu depoimento na CPI para detonar desafetos, ou então para mostrar a Bolsonaro que continua a merecer a sua confiança.

Fonte:

Metrópoles

https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/ricardo-noblat/o-que-disse-barra-torres-a-cpi-da-covid-calou-bolsonaro

 


Bernardo Mello Franco: Engavetador em campanha

Um assessor parlamentar deposita R$ 89 mil na conta da primeira-dama. Quando a história vem à tona, o presidente diz que o dinheiro era para ele. Ao ser questionado sobre o motivo dos cheques, o político se descontrola. Fecha a cara, solta palavrões e ameaça agredir o jornalista com um soco na boca.

A pergunta do repórter do GLOBO ganhou as redes sociais: “Presidente, por que sua esposa, Michelle, recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz?”. Nove meses depois, Jair Bolsonaro ainda não se dignou a respondê-la. Se depender da Procuradoria-Geral da República, continuará em confortável silêncio.

Na segunda-feira, o procurador Augusto Aras rejeitou abrir inquérito sobre o caso. Ele afirmou ao Supremo que não vê “lastro probatório mínimo” contra o capitão. O parecer contrariou o advogado Ricardo Bretanha Schmidt, autor do pedido de investigação. “Quando se trata do presidente, a PGR nunca tem disposição de elucidar os fatos”, protesta.

Desde que foi nomeado por Bolsonaro, Aras se comporta como um aliado do governo. Virou o novo engavetador-geral da República, título inaugurado por Geraldo Brindeiro na Era FH. O procurador já arquivou múltiplas representações contra o presidente. Entre outras coisas, recusou-se a investigar os desmandos na pandemia e o uso da Lei de Segurança Nacional contra opositores.

Em janeiro, a submissão de Aras ao Planalto tirou seus colegas do sério. Numa cobrança pública, seis integrantes do Conselho Superior do Ministério Público escreveram que ele “precisa cumprir o seu papel de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e de titular da persecução penal”. Em outra frente, a Associação Nacional dos Procuradores da República afirmou que “a sociedade brasileira não admite omissão neste momento”.

A fidelidade de Aras a Bolsonaro tinha um motivo conhecido: ele sonhava ser nomeado ministro do Supremo. Como o capitão prometeu a vaga a um jurista “terrivelmente evangélico”, o procurador teve que mudar os planos. Virou candidato a um segundo mandato na PGR. Em 2019, ele convenceu o presidente a nomeá-lo fora da lista tríplice. Agora está em campanha para repetir a dose em setembro.

Fonte:

O Globo

https://blogs.oglobo.globo.com/bernardo-mello-franco/post/engavetador-em-campanha.html