Congresso Nacional
Demétrio Magnoli: Frustração das ruas com sistema político é salvo-conduto para Temer
‘Fica, Temer’ significa, igualmente, ’Fica Maia’ – e um tratado de cooperação contra as investigações
No horizonte do óbvio, Temer fica pois persuadiu 263 deputados a sustentá-lo, às custas do Orçamento, de cargos e de concessões políticas vergonhosas. Dilma, porém, foi defenestrada, mesmo depois de ofertar tudo isso no altar sacrificial da Câmara. As raízes da diferença entre um caso e outro estão fincadas num horizonte mais profundo: a miséria da nossa política. Temer fica pelos seguintes motivos:
1. Janot desviou a Lava Jato para o labirinto da politicagem. A denúncia contra Temer não nasceu de uma investigação exaustiva, como a conduzida no âmbito do cartel das empreiteiras, mas de uma arapuca vulgar montada em aliança com Joesley Batista. A imunidade absoluta concedida ao corruptor-geral da República provocou asco nacional, manchou a reputação pública da Lava Jato e ofereceu um álibi político eficiente ao ocupante do Planalto. Temer deve uma caixa de charutos a Janot.
2. A economia rompeu a crosta gelada da depressão. Temer preservará o imposto sindical, pervertendo a reforma trabalhista, e substituirá a reforma previdenciária por um emplastro improvisado. Mas, ao menos, a equipe econômica representa um seguro contra calamidades. O empresariado admite quase tudo, mas não um retorno aos folguedos infantis do dilmismo. E, claro, adora uma Presidência exaurida, pronta a curvar-se à exigência de mais um refinanciamento de dívidas em benefício dos amigos dos amigos. Temer deve um vinho de origem controlada a Meirelles.
3. Nossa elite política tem pavor da Lava Jato. Temer, no Planalto, e Rodrigo Maia, na Câmara, são fusíveis que protegem os parlamentares do incêndio. A substituição do primeiro pelo segundo implicaria a remoção do duplo fio de chumbo. O "Fica, Temer" significa, igualmente, um "Fica, Rodrigo" –e um tratado de cooperação diante das investigações policiais e judiciais. A manobra de salvação do presidente assinala o início de uma contraofensiva do Planalto e do Congresso. Temer deve bombons baratos a todos os políticos situados na alça de mira da polícia.
4. Aécio Neves alinhou uma corrente do PSDB à Santa Aliança anti-Lava Jato. Para proteger-se, o cacique tucano cindiu seu partido e atracou seu próprio futuro político ao cais do Planalto. A Lava Jato encontra-se, agora, em situação similar à da Operação Mãos Limpas, na Itália, durante os governos de centro-esquerda de Romano Prodi e Massimo D'Alema, cuja base parlamentar se uniu a Silvio Berlusconi para sabotá-la. Temer deve meia dúzia de pães de queijo a Aécio, outro amigo do peito da JBS.
5. "Fica, Temer" é o desejo oculto de Lula. A bandeira farsesca do "Fora, Temer" destina-se, exclusivamente, a consumo eleitoral. O PT e seus aliados garantiram quorum à sessão de salvação do presidente. Preservando Temer, o condottieri petista assegura para si mesmo o cenário mais favorável na disputa de 2018.
Mas, sobretudo, por essa via, o PT encontra um lugar na trincheira compartilhada pelos políticos que resistem à tempestade da Operação Lava Jato. Temer deve a Lula uma cachaça envelhecida, de alambique artesanal.
6. Nossa elite política separou-se, em conjunto, do interesse público. A crise que produziu o impeachment prossegue no governo Temer. Sob o signo da Lava Jato, vivemos o ocaso da Nova República. Contudo, nenhuma articulação partidária significativa destacou-se da paisagem cinzenta para oferecer ao país uma alternativa de reformas institucionais e políticas.
No lugar disso, em meio às ruínas, assiste-se aos espetáculos deprimentes da decomposição do PSDB, do neoqueremismo lulista e das apostas especulativas de Marina Silva, Ciro Gomes, Jair Bolsonaro, os "salvadores da pátria" de plantão.
A frustração das ruas com a falência geral do sistema político funciona como salvo-conduto do ocupante do Planalto. Temer deve tudo ao medo da mudança. Ele honrará sua dívida, às nossas custas.
* Demétrio Magnoli é sociólogo
Roberto Freire: Para avançar nas reformas
Em mais um capítulo da tumultuada quadra política que o país enfrenta, os brasileiros acompanharam a votação na Câmara dos Deputados que sacramentou o arquivamento do pedido de licença para que o Supremo Tribunal Federal (STF) analisasse se havia ou não elementos suficientes que ensejassem a abertura do processo com base na denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer. Ao contrário do que apregoavam alguns analistas mais precipitados, o governo de transição demonstrou que ainda tem uma sólida base parlamentar de apoio no Congresso Nacional e, por isso, obteve uma vitória por ampla margem.
A bancada do PPS decidiu votar pela autorização da licença, seguindo um princípio histórico adotado pelo partido no sentido de que todas as denúncias de eventuais irregularidades devem ser rigorosamente apuradas, com total transparência. Mesmo assim, devemos reconhecer que, juridicamente, a peça apresentada pela PGR tinha fragilidades e uma série de inconsistências que certamente influíram no resultado final da votação. Além disso, parece consensual que houve certo açodamento do Ministério Púbico Federal ao apresentá-la sem ter reunido um cabedal probatório mais substancioso.
Com o resultado, a Câmara indica que o atual mandato será cumprido com Temer na Presidência da República. Se, em algum momento, havia a possibilidade de um outro presidente liderar a transição, hoje essa alternativa está, evidentemente, excluída. Diante de uma vitória tão acachapante, cabe ao governo a grandeza – e ela já transparece nas palavras do próprio presidente Temer – de buscar a reaglutinação da base de apoio na luta pelo impeachment em sua integralidade, sem excluir os deputados que, divergindo da posição do governo, votaram pelo pedido de licença já arquivado pela Câmara. A partir daí, na continuidade da transição, devem ser esses parlamentares os responsáveis pela retomada da votação das reformas.
O apoio à transição e às reformas tem de ser a palavra de ordem para chegarmos a 2018 em melhores condições e tendo superado os problemas decorrentes do perverso legado do lulopetismo. A principal tarefa do governo será rearticular todas essas forças políticas em prol de uma agenda reformista, positiva e necessária ao Brasil. No caso do PPS, é importante ressaltar que o partido segue com uma posição de independência, mas plenamente integrado na transição e na luta pela votação das reformas e pela recuperação econômica do país.
Apesar de algumas pesquisas de opinião apontarem uma grande rejeição ao presidente, a sociedade desta vez não se manifestou de forma significativa nem foi às ruas – ao contrário do que se viu no impeachment de Dilma Rousseff, que registrou as maiores mobilizações da história democrática do país. Trata-se, evidentemente, de uma clara demonstração de que a parcela amplamente majoritária dos brasileiros repudia a atual oposição, capitaneada pelo PT e também formada por alguns de seus satélites, como o PCdoB e o PSOL. O povo, definitivamente, não encampou a bandeira do “Fora, Temer” empunhada por aqueles que, abusando da desfaçatez, se dizem contra a corrupção, mas apoiaram Lula e Dilma; ou falam supostamente em favor da democracia e defendem a ditadura venezuelana chefiada por Nicolás Maduro.
A população brasileira demonstrou, afinal, que não se esquece do descalabro dos últimos 13 anos: corrupção desenfreada e escândalos em série como o mensalão e o petrolão, a destruição quase completa da Petrobras, a maior recessão econômica da história do Brasil, com mais de 14 milhões de desempregados, entre outras mazelas. Diferentemente do que pregam os áulicos do lulopetismo, que constroem uma narrativa falaciosa, enviesada e desconectada da realidade, os brasileiros não desejam a volta de Lula e do PT ao poder. As eleições municipais de 2016 já haviam sinalizado de forma categórica que o país quer olhar para frente, seguir adiante com um novo governo e avançar em uma agenda virtuosa que nos traga desenvolvimento e crescimento econômico.
O cumprimento dessa pauta benfazeja é o norte a orientar os parlamentares e partidos que têm a exata dimensão da importância de não desperdiçarmos a chance de tirar o país da crise. Já o reconduzimos de volta aos trilhos depois do desmantelo lulopetista. Agora é preciso acelerar e consolidar a retomada da economia.
Base aliada de Temer encolhe 40% depois da delação da JBS
O presidente Michel Temer conta hoje na Câmara dos Deputados com uma base de apoio real de cerca de 260 deputados, o que representa uma queda de quase 40% em relação ao que ele tinha nos primeiros meses deste ano, antes de vir à tona a delação da JBS.
Até o escândalo, que resultou em uma denúncia sob acusação de corrupção passiva contra o peemedebista, a sua base contava com 20 partidos que, juntos, têm 416 dos 513 deputados federais.
Entre a divulgação da gravação da conversa de Joesley Batista com o presidente e a votação da denúncia pela Câmara na quarta-feira (2), quatro partidos anunciaram o desembarque do governo: PSB, Podemos, PPS e PHS.
Na sessão de quarta que barrou a tramitação da denúncia, 89 deputados de partidos governistas votaram contra Temer, em um sinal de que dificilmente continuam seguindo as orientações do Palácio do Planalto.
Com isso, a base real de Temer hoje soma 261 deputados, apenas 4 a mais do que a maioria absoluta das cadeiras da Casa (257). Esse é um número apertado inclusive para a aprovação de simples requerimentos e projetos, tendo em vista que dificilmente as sessões da Câmara contam com quorum completo.
Para aprovação de emendas à Constituição, que é o caso da reforma da Previdência, são necessários 308 votos, 47 a mais do que a base real hoje do presidente.
VARIÁVEIS
Há alguns fatores que tornam volátil essa base, tanto para cima quanto para baixo.
Na votação de projetos de interesse do governo, é preciso levar em conta o tema e outros fatores não necessariamente ligados ao fato de o deputado ser do governo ou de oposição.
Na reforma da Previdência, por exemplo, deputados do PSDB que votaram a favor da denúncia contra Temer tendem a apoiá-lo. Por outro lado, integrantes do "centrão" (siglas pequenas e médias) que apoiaram Temer são claramente contrários à reforma.
Além disso, na votação de quarta-feira, o governo prometeu verbas, cargos e outras benesses da máquina federal para obter votos. A frustração de algumas dessas promessas pode resultar em perda de apoio a projetos e à votação da provável nova denúncia a ser apresentada pela Procuradoria-Geral da República.
O "centrão", por exemplo, quer ministérios e cargos do PSDB, mas Temer reluta em desalojar os tucanos, apesar do alto índice de infidelidade na votação da denúncia.
O presidente tem apoiadores em legendas de oposição, principalmente no PSB (11 de uma bancada de 35), mas a sua base real hoje também mostra fragilidade e potencial de novas dissidências. Onze ministros reassumiram os mandatos para votar a favor de Temer. Ao regressar à Esplanada, voltam os suplentes, que tendem a votar contra o Planalto.
DISSIDENTES
O mapa da votação desta quarta mostra que, excluídos os nanicos, os principais percentuais de infidelidade na base de Temer ficaram com o PV (57%), que tem o Ministério do Meio Ambiente, o PSDB (47%), que tem quatro ministérios, entre eles o da articulação política, o Solidariedade (43%), o PSC (40%), do líder do governo no Congresso, André Moura (SE), e o PSD (37%), que tem o Ministério das Comunicações.
Os mais fiéis, proporcionalmente, foram o PMDB de Temer (10% de votos a favor da denúncia), o PTB (11%), que controla o Ministério do Trabalho, e o PP (15%), que tem Saúde e Agricultura.
No início das negociações de bastidor para barrar a denúncia, os articuladores do Planalto esperavam obter cerca de 300 votos, o que seria uma demonstração de fôlego para aprovar medidas importantes no Congresso e continuar a governar.
Tempos depois, a projeção desceu a 280 e, em seguida, a 260. Um placar de 200 apoiadores barraria a denúncia, mas seria visto como senha de que as condições de governabilidade haviam se exaurido.
Ranier Bragon | Folha de S. Paulo
Democracia X Totalitarismo: realidades distintas para LGBTs
Estados totalitários definitivamente não são bons para quem é LGBT. Apoiá-los representa um duro golpe contra os princípios mais caros que se pode ter no campo político. A esquerda, que evoluiu após uma importante participação na história, realinhou-se ao redor do globo em um modelo fundado na luta democrática pelo poder. Democracia, nesse sentido, representa o compromisso com a vontade popular, mas também com os direitos das minorias.
O espaço democrático constitui uma possibilidade real de se fazer valer direitos essenciais para a população LGBT. Aliás, a única possibilidade. O totalitarismo tende a ser esmagador a qualquer forma de expressão das minorias. Por isso, defender esse espaço e rechaçar quaisquer tipos de apoios a regimes autoritários, não obstante a eventuais afinidades ideológicas, deve representar uma prioridade máxima para qualquer partido, sobretudo para a esquerda que, a exemplo do nosso período ditatorial brasileiro, conhece a perseguição e a censura.
Em uma retrospectiva histórica, faz sentido evidenciar que Lênin, Fidel Castro, dentre tantos outros revolucionários, consideravam a homossexualidade um desvio burguês, uma anormalidade, que deveria ser combatida inclusive mediante coerção estatal. Trata-se de um corpo ideológico e perigoso para preconceitos internalizados culturalmente. Perseguições, demissões, deportações, castrações e, até mesmo, execuções não eram raras para a população LGBT nas antigas repúblicas socialistas. Campos de trabalhos forçados também eram política de Estado que, não diferente dos horrores nazistas, eram usados de modo a “readequar” esses indivíduos para o padrão valorizado à época.
No recorte contemporâneo, episódios como a ratificação do apoio do PT, do PC do B e do PSOL ao regime de exceção de Nicolás Maduro são execráveis e demonstram uma profunda incoerência de grande parte da esquerda brasileira. Os partidos citados, por exemplo, se posicionam como defensores da população LGBT, mas traem profundamente suas bases ao apoiarem um líder que em mais de uma ocasião proferiu ofensas homofóbicas a seus opositores em um dos países que mais persegue LGBTs no mundo.
No campo do casamento igualitário, as democracias liberais — não sem luta — foram as mais bem-sucedidas em garantir e expandir esse direito à população LGBT. Atualmente, o casamento entre pessoas do mesmo sexo é permitido em 24 países em um processo que se iniciou em 2001 com a vanguarda dos Países Baixos. Pode parecer pouco, mas a legalização, na maior parte desses países, ocorreu após 2010, o que representa uma tendência positiva no âmbito dos direitos das minorias.
Em contrapartida, países com antecedentes comunistas, ainda que não proíbam expressamente a homossexualidade, tendem a ser mais homofóbicos e menos abertos a diversidade. Em 2012, promulgou-se, na Rússia, uma lei que proíbe as paradas LGBTs pelos próximos 100 anos e mais da metade da população, segundo pesquisa do instituto Vtsiom, acredita que a homossexualidade deveria ser punida.
No PPS há o entendimento de que o socialismo revolucionário foi corretamente derrotado pela história. Os erros passados da esquerda se mostraram claros no sentido de indicarem a necessidade de uma mudança para um modelo ideológico que valorizasse a tolerância, o humanismo e o diálogo como a forma mais efetiva de se alcançar uma sociedade verdadeiramente justa e plural.
Bruno Couto - Coordenador Estadual do PPS Diversidade (RJ) e Romeu Tavares - PPS Diversidade (São Gonçalo)
Seminário Internacional: “Desafios políticos de um mundo em intensa transformação”
André Amado
Nas crises, uma das primeiras vítimas é a capacidade de encarar o futuro com esperança e otimismo. Em parte, porque não entendemos o que está acontecendo a nosso redor. Presenciamos perplexos a fragilização de conceitos tradicionais de classe, partido e religião no âmbito da chamada prosperidade econômica que, a reboque da globalização e do avanço tecnológico, aumentou não só as diferenças entre ricos e pobres, mas também o número de desempregados, além de provocar deslocamento de populações, flageladas pela nova ordem econômica.
Não surpreende – mas preocupa – a recrudescência de rancores, ódios, intolerância e xenofobia, sentimentos que envenenam as relações entre pessoas, povos e países. Assustam, também, as propostas de solução que se embriagam de simplificações, como se a sobrevivência de uns pudesse compensar as provações dos outros. É a hora dos extremismos, do fundamentalismo, visões caolhas do mundo que conspiram contra um dos pilares da civilização moderna, a democracia.
É em momentos como este que se escrevem as grandes páginas da história. Seja pelas mãos de lideranças políticas, seja pelo vigor de movimentos sociais, seja pelo conluio de ambos atores, de todo comprometidos com a construção do futuro, a tarefa a cumprir implica combater os impulsos alimentados pelos sectarismos e, ao mesmo tempo, favorecer o primado da razão, do poder iluminante das ideias, da reflexão livre de verdades prontas e capaz de desmontar preconceitos e inibir exclusões, na busca de caminhos alternativos e consensuais de saída da crise.
Ninguém questiona a extensão e a complexidade da crise que vem assolando o Brasil nos últimos tempos. Resolvê-la só pelo viés do jogo político ou pelo arsenal de respostas dos economistas poderá ser tão efetivo quanto evitar as guerras com propostas militares de paz.
O Deputado Roberto Freire (PPS-SP) propôs e o Senador José Anibal (PSBD-SP) aceitou a convocação de um seminário em que se discutissem os desafios políticos que tanta desestabilização tem provocado nesse começo do terceiro milênio.
O patrocínio da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) e do Instituto Teotônio Vilela (ITV), centros de estudo e formação política ligados ao Partido Popular Socialista (PPS) e ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), respectivamente, de forma alguma antecipa tratamento político-partidário dos temas. Apenas identifica os promotores originais da iniciativa que, para legitimar-se – estabeleceu-se desde o início – teria de congregar personalidades do universo político, acadêmico e jornalístico do Brasil e do mundo e buscar lançar alguma luz sobre os temas de interesse comum da sociedade.
A lista dos participantes e a definição das mesas de trabalho, que reproduzo a seguir, revelam a importância atribuída pelos organizadores ao atendimento dos objetivos do evento.
As mesas serão:
- A crise de representação política e o futuro da democracia;
- A globalização e a mudança da estrutura das sociedades;
- A revolução tecnológica e o mundo do trabalho; e
- Mãos Limpas e Lava Jato, relações de força e limites.
Para discutir esses temas, que decerto eriçam as preocupações de uma grande maioria, convidaram-se, do exterior, Adrian Wooldridge (co-autor de A Quarta Revolução), Alessandro Ferrara (filósofo, Roma2, Tor Vergata), Gianni Barbacetto (co-autor de Operação Mãos Limpas), Mario Albuquerque (sociólogo e consultor, Chile), Mauro Magatti (sociólogo, UC de Milão, Itália) e Stefan Foster (co-autor de Riqueza Pública das Nações).
Os participantes brasileiros serão Caetano Araújo (sociólogo, Senado Federal), Carlos H. Britto Cruz (físico, UNICAMP e FAPESP), Cristovam Buarque, Demétrio Magnoli (sociólogo, membro do GACINT-USP), Dora Kaufman (socióloga e pesquisadora, ATOPOS USP e TIDD PUC/SP), Fernando Henrique Cardoso, José Álvaro Moisés (Professor Titular do Departamento de Ciência Política da USP), José Anibal Marcelo Moscogliati (Subprocurador-Geral da República), Marco Aurelio Nogueira (cientista político, UNESP), Marcus Melo (cientista político, UFPE), Oscar Vilhena (Diretor da Faculdade de Direito, FGV), Roberto Freire, Rodrigo Chemim (Procurador criminal, Paraná) e Sergio Fausto (sociólogo, Fundação Fernando Henrique Cardoso),
André Amado é secretário Executivo do Seminário Internacional “Desafios políticos de um mundo em intensa transformação”.
Refundar a Esquerda Democrática
Depois de fundada pelo Partidão na década de 20, aprofundada pelo Partido dos Trabalhadores na década de 80, infundada pela clonagem de legendas com o mesmo DNA petista nas décadas de 90 e 2000, e finalmente afundada pelos chamados governos de coalizão (feat corrupção) de Lula e Dilma, parece ter chegado a hora de refundar a esquerda brasileira com os sobreviventes deste período paleolítico e potenciais agregados, como jovens ativistas, sustentabilistas, sociais-democratas e hackers da nova política.
Não que seja tarefa simples, a começar pela definição do que é ser de esquerda ou de direita hoje. Diante da complexidade do mundo atual, o binarismo idelológico se torna cada vez mais obsoleto, extemporâneo e inconclusivo. Isto se já não bastasse, além do fracasso do socialismo no mundo, o PT ter enxovalhado esse conceito teórico sem nunca ter executado minimamente um programa de esquerda - vide os exemplos petistas em administrações municipais, estaduais e no governo federal.
As experiências mais próximas vivenciadas pelo Brasil com o que se convencionou chamar de esquerda não passaram de discursos oposicionistas e, no governo, de flertes esporádicos: com o trabalhismo populista de Getúlio Vargas, a brevidade de Jango entre o parlamentarismo oportunista e o golpe de 64, e posteriormente com os acenos à social-democracia de FHC e Lula, sendo o tucano - que surfava na onda do Real - prejudicado pelo casamento arranjado com o PFL e por episódios como a compra de votos para a reeleição; e o petista, apesar do sucesso de políticas compensatórias e ações de combate à miséria, por ter se rendido a tudo aquilo que o PT prometia enfrentar desde a sua criação.
Fato é que chegamos a esta crise sem precedentes - o que leva a população a condenar genericamente, não sem razão, a política e os políticos, mas sobretudo a esquerda, cujas ideias jamais foram implementadas por aqui. Eis o desafio de quem ainda busca vida inteligente na terra arrasada da democracia representativa brasileira, com algum viés esquerdista: a opção pela redução das desigualdades, pela justiça social, pela cidadania plena, pela distribuição de renda, pela promoção da cultura da paz, pelo papel regulador do Estado e até pela manutenção da utopia - características que em geral a direita despreza.
É neste contexto, por exemplo, que o filósofo Ruy Fausto apresenta o livro "Caminhos da Esquerda" - que a grande imprensa tem debatido - e que outros grupos vem se reunindo para tentar ir além do debate político partidarizado, polarizado, raivoso e estéril, dispostos a encontrar alguma luz no fim do túnel para transportar os ideólogos da esquerda democrática da atual arena visceral para um campo vicejante.
Se é desalentador um cenário em que as primeiras sondagens para 2018 apontem a força crescente de um Bolsonaro à direita ou a teimosa e renitente popularidade de Lula quase como um novo Macunaíma, o herói sem caráter da esquerda preguiçosa, também é verdade que chegou o momento de agir com firmeza e efetividade para construir uma alternativa melhor.
A luz que o eleitorado busca não pode ser, à esquerda, o fogo-fátuo da decomposição petista, nem o farol da direita bolsonarista que se apresenta como trem-bala mas não passa de maria fumaça. Para repor a esquerda nos trilhos, também parece pouco adequado depositar esperanças nos maquinistas de trem-fantasma Guilherme Boulos e Ciro Gomes, que se lançam com ações e pensamentos descarrilados.
Exercícios de futurologia à parte, o mais provável é que o próximo eleito seja um nome do atual sistema - até porque a necessária reforma político-partidária não deve avançar muito além dos limites protecionistas e do instinto de sobrevivência dos atuais congressistas. Alguém tarimbado e de perfil mais próximo do centro, evitando as saídas mais extremistas, é o que se busca na maioria dos partidos.
A centro-direita busca uma peça confiável na plataforma mais tradicional (Geraldo Alckmin, Rodrigo Maia ou Henrique Meirelles, por exemplo) ou reconfigurada (João Doria). A centro-esquerda não descarta um movimento de código aberto (lança balões de ensaio como Joaquim Barbosa e busca outras figuras do meio jurídico para a vaga de vice), mas deve mesmo optar por algum relançamento: Marina Silva, Eduardo Jorge, Fernando Gabeira, Cristovam Buarque e até Fernando Haddad são nomes sempre bem cotados.
Outra opção seriam os outsiders da política, salvadores da pátria que surgem como astros com luz própria e acabam quase sempre com o brilho efêmero de um vaga-lume. Historicamente podem se dar bem com um banho de marketing "collorido", como ocorreu em 1989 com o fictício caçador de marajás que se tornou presidente do Brasil. Mas o fim dos aventureiros costuma ser trágico e a eleição presidencial não pode servir como startup de malucos. Por isso é hora de reinstalar o sistema da esquerda democrática, eliminando os bugs da velha política.
FAP auxilia na construção do manual do XIX Congresso Nacional do PPS
A FAP terá “o grande papel no processo de levar o debate para intelectualidade que está fora do partido”
Germano Martiniano
A Fundação Astrojildo Pereira (FAP) auxiliou na construção da proposta de resolução políticado XIX Congresso Nacional do PPS, que será realizado em dezembro. Por meio de seu dirigente, Caetano Ernesto Pereira de Araújo, sociólogo, que foi indicado pela Executiva do PPS para ser o relator do documento político, foram produzidos alguns textos, que foram discutidos e reformulados até se chegar ao texto principal de debate do Congresso: Garantir a transição e avançar nas reformas.
A proposta de resolução política, dentro contexto do governo de transição e de avanço nas reformas, irá discutir os temas, Globalização e antiglobalização; Mudanças no mundo do trabalho, Mudanças no mundo da política; Da euforia à crise: o trajeto brasileiro os últimos anos; e por fim o papel da Mulher na política. De acordo com Caetano, estes temas foram escolhidos “a partir dos debates recentes do partido” e FAP terá “o grande papel no processo de levar o debate para intelectualidade que está fora do partido”.
“O objetivo do texto é estimular o debate. Nele será votada uma resolução política elaborada com base na discussão que existir. A resolução não será o texto de abertura. Nesse texto discutimos a situação internacional e nacional. Possivelmente a resolução política vai ter como centro a discussão nacional”, disse Caetano.
Indo de encontro com o que disse o dirigente da FAP, o então presidente do partido em exercício, Davi Zaia, afirmou que o objetivo é construir uma resolução no Congresso que aponte os rumos da atuação partidária e estabeleça propostas para o futuro do País.
“Na última reunião do Diretório Nacional [em março] aprovamos as normas congressuais e o texto base, mas como recebemos várias sugestões de mudanças, o Secretariado ficou encarregado de compatibilizar as sugestões e oferecer um texto final para o início das discussões. Agora estamos disponibilizando o documento a todos os filiados para com isso permitir que os Diretórios Municipais e Estaduais possam aprofundar esse debate nos congressos e daí construir, até dezembro, no encontro nacional, uma resolução que aponte rumos para a atuação do PPS nos próximos anos e formular uma proposta visando o futuro do País”, acrescentou Zaia.
Congresso
O XIX Congresso Nacional será realizado nos dias 8, 9 e 10 de dezembro em local ainda a ser definido, conforme as “regras gerais”, aprovadas em abril pelo Diretório Nacional. Já os encontros municipais ocorrerão entre os dias 1º de junho e 30 de setembro, enquanto que os estaduais iniciam em 1º de outubro e se encerram em 30 de novembro.
Os Diretórios Estaduais ficarão responsáveis pela definição das regras gerais dos congressos em suas áreas de abrangência e devem preservar o que determina as normas estabelecidas na Resolução Orgânica 01/2017. Elas deverão ser aprovadas em ata para afastar dúvidas sobres às decisões das etapas do Congresso Nacional.
Além disso, a resolução estabelece como serão definidos os participantes nas instâncias municipais, estaduais e nacional do congresso, assim como o número de delegados e o direito a “voz e voto” em cada etapa.
Confira, aqui, o documento do XIX Congresso Nacional.
Manual do Congresso:
http://www.pps.org.br/wp-content/uploads/2017/06/Manual-para-o-19-congresso-nacional-do-PPS.pdf
Garantir a transição e avançar nas reformas
Documento de Abertura das Discussões do XIX Congresso Nacional do PPS tem como tema “Garantir a transição e avançar nas reformas”. O texto, que será debatido nos congressos municipais, estaduais e nacional, aborda questões como a globalização, as mudanças no mundo do trabalho e da política e estabelece a formulação do programa partidário 2017/2018.
I - Globalização e antiglobalização
1 – Afirma-se no cenário internacional recente uma nova e preocupante configuração: ganha expressão política nos países desenvolvidos o movimento de contestação aberta ao processo de globalização, ao lado de ações de resistência e recusa de suas consequências indesejadas, particularmente no que se refere ao investimento e ao emprego. Os maiores exemplos dessa inflexão, até o momento, são a retirada do Reino Unido da União Europeia e a vitória eleitoral de Donald Trump nos Estados Unidos.
2 – Essas movimentações retiram sua força do descontentamento, da insegurança, do ressentimento e da desesperança de grandes massas de trabalhadores de indústrias tradicionais alijados do emprego ao longo das últimas décadas por força, de um lado, do avanço tecnológico na robótica e na informática e, de outro lado, da competição com as fábricas exportadas para os países periféricos. Sua vitória no país hegemônico em termos econômicos e militares, ao lado de seu avanço nos países europeus, abre a porta para cenários sombrios, de incerteza e risco para os avanços recentes ocorridos no mundo, em termos de avanço da democracia e redução da pobreza.
3 – A maior parte do protagonismo político neste novo cenário se concentra em lideranças, partidos e programas nacionalistas e conservadores, situados à direita do espectro político. No entanto, há setores importantes da esquerda europeia e norte-americana, inclusive das esquerdas novas, desvinculadas dos partidos tradicionais, que partilham com a nova direita conservadora a nostalgia da época em que os conflitos de classe estavam circunscritos aos Estados nacionais e podiam ser equacionados no interior de seus limites. Há uma esquerda estatista e nacionalista, para a qual a globalização é apenas o novo nome do imperialismo e o retorno ao passado não apenas é possível como desejável.
4 – Nesse quadro, o PPS reafirma seu entendimento histórico a respeito do processo de globalização. Trata-se de um processo objetivo, decorrente da revolução científica e tecnológica que vivemos há décadas. No entanto, suas consequências econômicas e sociais não estão pré-determinadas, mas dependem de embates e acordos políticos, que refletem interesses e motivações diferentes e opostas. A emergência da China como potência econômica mundial, o crescimento da Coreia, da Índia e, mais recentemente, do Vietnam, da Indonésia e das Filipinas, com a consequente retirada de milhões de pessoas da miséria, foram a contrapartida do declínio da indústria nos Estados Unidos e na Europa. A revolução na informação deu ao capital uma mobilidade inédita na história, concomitante à redução dos poderes dos Estados nacionais sobre a sua agenda. A inserção dos diversos países nesse fluxo móvel de capitais passou a ser condição necessária a seu sucesso econômico e, consequentemente, cresceram os custos econômicos e sociais da autarquia e do isolamento.
3 – No médio prazo, portanto, políticas de fechamento econômico, que consideram o comércio em particular e as relações internacionais de forma geral como um jogo de soma zero estão fadadas ao fracasso. Conforme a experiência recente, tais processos autárquicos submetem as populações a um processo progressivo de pauperização e afastam os países que as adotam do centro da inovação científica e tecnológica no mundo. Em condições de normalidade democrática, não seriam eleitoralmente sustentáveis.
4 – No entanto, consequências eleitorais resultantes de situações de alta complexidade são de difícil previsão. Já é perceptível o aumento do chauvinismo e da xenofobia na Europa e nos Estados Unidos, aumento relacionado ao crescimento político de candidatos que sustentam a agenda isolacionista. O belicismo segue o mesmo caminho, acolhido com destaque no programa do governo Trump. Cruzar a fronteira da democracia na direção de saídas autoritárias é, portanto, uma possibilidade real para a direita nacionalista e conservadora, na Europa e nos Estados Unidos.
5 – A inviabilidade dessa estratégia, no entanto, mesmo no curto prazo, é evidente. Nenhum dos grandes problemas atuais pode ser resolvido apenas com o esforço dos Estados nacionais no interior de suas fronteiras. A globalização acentuou os nexos de interdependência entre Estados e sociedades ao redor do mundo. Todos dependem para sua resolução de cooperação internacional, com destaque para a regulação do comércio mundial; o combate ao crime, particularmente no que se refere ao tráfico de pessoas, armas e drogas, além da lavagem de dinheiro; a proteção dos direitos humanos; assim como o desenvolvimento científico e tecnológico. É esse também, principalmente, o caso do enfrentamento dos problemas ambientais e de sua prevenção e, nesse rumo, a pactuação de uma transição para uma economia com baixo teor de carbono. Afinal, os mecanismos de deterioração do meio ambiente nunca respeitaram as fronteiras nacionais.
6 – O mesmo ocorre com as novas questões, que o desenvolvimento do processo de globalização leva ao centro da agenda internacional. A regulação pactuada da mobilidade de capitais; a intensificação dos fluxos migratórios, seja à procura de trabalho, seja em razão da guerra, doença ou fome nos países de origem; a expansão do terrorismo islâmico; e as ameaças à paz mundial que resultam dessa conjuntura, como a guerra na Síria, a escalada de tensões na península coreana e a aliança russo-norte-americana que se configura após a eleição de Trump; todas essas questões exigem, para seu eficaz enfrentamento, não a ameaça recíproca de intervenção militar, mas a abertura permanente para a negociação.
7 – Nessa perspectiva, resulta claro que no processo de globalização, interesses e valores entram em choque, choques que estão na raiz dos conflitos políticos e militares que vivemos. No entanto, o avanço recente de posições políticas belicistas na Europa e nos Estados Unidos constitui um fator agravante dessas tensões, que eleva o risco de um desfecho militar das diversas crises e constitui, por si, nova ameaça à paz mundial.
8 – Por tudo isso o PPS mantém sua crítica à política externa de corte terceiro mundista, em favor de uma política alternativa, em prol da retirada de barreiras ao comércio internacional e da integração cada vez maior, econômica, social e cultural, entre os países. Uma política, portanto, de combate ferrenho ao chauvinismo, ao belicismo, à xenofobia e ao isolamento nacional. Uma política que tenha como norte o fortalecimento e a democratização dos organismos internacionais, a resistência ao hegemonismo das grandes potências e o avanço das políticas de integração regional.
II - As mudanças no mundo do trabalho
9 – A dinâmica do desenvolvimento científico e tecnológico, contudo, guarda autonomia em relação aos conflitos políticos nacionais em torno das consequências do processo de globalização. O ritmo da inovação prossegue acelerado e acumula impactos profundos, e por vezes devastadores, sobre a organização do mundo do trabalho.
10 – Categorias inteiras de trabalhadores são substituídas por máquinas; dissemina-se o uso de impressoras em 3D, cada vez mais baratas e eficientes, para a produção de objetos de todo tipo; a disponibilidade de informação em tempo real permite a comercialização de frações de uso de veículos de transporte e de residências, como ocorre com o Uber e a Airbnb. O trabalho se fragmenta: em vez de vínculos permanentes com uma empresa, mediados por contratos, para a realização de um só tipo de atividade, padrão que está na base dos sistemas sindicais e previdenciários atuais, uma nova situação tende a ser mais frequente: a multiplicidade de trabalhos temporários simultâneos.
11 – A condição de trabalhador autônomo tem mais afinidade com esse novo mundo que o ideal do passado recente de uma só atividade, um só contrato, com apenas uma empresa, do começo ao fim da vida produtiva. No entanto, é preciso reformar a legislação trabalhista, a representação sindical e o sistema previdenciário para incorporar os novos tipos de trabalhador que surgem e se disseminam.
12 – Fragmentação e descontinuidade do trabalho caminham ao lado de tendências opostas no campo da educação. A nova situação demanda cada vez mais uma educação permanente. A maior parte das profissões atuais desaparecerá em alguns anos, de modo que as pessoas devem ser preparadas para aprender a realizar diferentes atividades. Um conteúdo torna-se fundamental: a capacidade de aprender – e essa capacidade deve ser exercitada ao longo da vida inteira.
III - Mudanças no mundo da política
13 – Também o mundo da política sofre o impacto da globalização e da disponibilidade irrestrita de informação em tempo real. A primeira consequência observada foi a mudança significativa do mapa das posições políticas nos países democráticos.
14 – No decorrer do século XX, a tendência nesses países foi de simplificação das posições políticas relevantes. Na direita, houve um processo de fusão entre os partidos liberal e conservador. Na esquerda, o modelo socialdemocrata tornou-se dominante.
15 – A partir dos anos 1970, contudo, o campo das posições políticas foi alterado pela necessidade de posicionamento, à esquerda e à direita, perante o processo de globalização. O campo da direita dividiu-se entre liberais extremados e conservadores nacionalistas. No campo da esquerda, aprofundou-se a divisão entre cosmopolitas, herdeiros das tradições internacionalistas, e nacionalistas.
16 - Ou seja, os eixos esquerda/direita e nacionalismo/cosmopolitismo dividem o mapa da política dos países democráticos em quatro quadrantes. Nesses países, na operação da política, as alianças se formam alternadamente segundo um ou outro critério. Em certos momentos, predomina o eixo cosmopolitismo/nacionalismo; e vemos governos inteiramente cosmopolitas, como o da Alemanha dos últimos anos, que reúne conservadores e socialdemocratas; ou governos que representam alianças entre a esquerda e a direita nacionalistas, como o primeiro governo do Syriza, na Grécia. Em outros, predomina o eixo esquerda direita, e vemos governos de partidos ou coalizões que reúnem liberais e nacionalistas, como o governo conservador britânico, enquanto a “Geringonça” portuguesa, que governa desde o final de 2016, resulta de um acordo de todo o campo da esquerda.
17 – A segunda consequência do processo de globalização na política incidiu sobre a forma da representação política, pondo em cheque o modo de operação tradicional dos partidos políticos. O acesso de massas à informação tem sido a condição das enormes manifestações que se sucedem neste século. Houve a primavera árabe, o movimento dos indignados na Espanha, o “ocupar Wall Street” americano, para mencionar alguns dos mais importantes. Democracia foi a reivindicação fundamental dessas manifestações. A implantação de regras democráticas onde estas não existiam e o aperfeiçoamento da representação onde já havia democracia. O fato é que a condição da mobilização é a operação das redes sociais, de modo, que movimentos desse porte se tornaram uma possibilidade permanente.
18 – Nos países democráticos a agenda passa, portanto, pelo aperfeiçoamento da representação. Mesmo quando os movimentos não resultam no surgimento de novos partidos, demanda-se a prestação de contas permanente de representantes para seus representados e a democratização das estruturas partidárias, com propostas como a adoção de mandatos “coletivos”, a proibição de reeleição para qualquer cargo e, até mesmo, o uso do sorteio parar o preenchimento de certas posições.
IV – Da euforia à crise: o trajeto brasileiro nos últimos anos
19 – Durante a vigência da Carta de 1988 dois projetos alternativos de esquerda ganharam corpo no Brasil. O primeiro, parcialmente implementado no governo de Fernando Henrique Cardoso, pode ser chamado de projeto reformista. Podemos chamar o segundo, implementado a partir do final do governo Lula e nos dois mandatos de Dilma Rousseff, de projeto compensatório.
18 – O projeto reformista parte de uma premissa simples: o Estado brasileiro foi formatado, ao longo de sua história, para a preservação, por ação e principalmente por omissão, dos privilégios dos grupos dominantes. Ao se aceitar a democracia como único caminho possível e desejável de mudança, superar tais privilégios passou a significar reformatar o Estado, de forma a inverter o sentido de sua ação. Daí a necessidade de diferentes reformas, cujo conjunto foi chamado pelo PPS de “reforma democrática do Estado”.
19 – O projeto compensatório, por sua vez, considera fundamental a construção de um pacto, com a participação do Estado, empresários e representantes dos trabalhadores e dos movimentos sociais. Conforme esse pacto, o Estado tomaria as providências necessárias para garantir o lucro dos empresários e caberia a estes a responsabilidade pelo investimento, o emprego e o salário. Os trabalhadores excluídos do sistema teriam acesso a uma rede de compensações e benefícios diversos garantidos pelo governo.
20 – O modelo compensatório, justificado com argumentos da tradição keynesiana e cepalina, tem como premissa a capacidade quase ilimitada de intervenção do Estado, como investidor e como indutor do investimento privado e como inspiração a era de ouro do Estado de Bem-estar social europeu, durante a qual um pacto semelhante teve sucesso. Desconsidera, no entanto, a crise desse modelo na Europa, desde pelo menos a década de 1970, em decorrência da sua crise fiscal e, posteriormente, das consequências da globalização. Desde então, os governos perderam progressivamente as condições de garantir o lucro das empresas; as empresas, por sua vez, não puderam mais garantir uma tendência de crescimento do emprego e do salário; e a rede de segurança passou a enfrentar problemas crescentes de financiamento e gestão.
21 – Cumpre lembrar que o PT, embora crítico duro do governo de Fernando Henrique Cardoso, havia, aparentemente, alterado sua posição a partir da campanha eleitoral de 2002. Aceitou o Plano Real, comprometeu-se com a manutenção da estabilidade econômica, calou-se sobre as privatizações e, uma vez no governo, iniciou uma política de reformas, com apoio do PPS, no governo, e do PSDB, na oposição.
22 – Cedo, no entanto, abandonou o caminho das reformas. Em 2004, pressionado por seus aliados conservadores, abortou a proposta de reforma política que havia tramitado até então com seu apoio, pronta para entrar em pauta no plenário da Câmara dos Deputados. Sustentado nos ganhos obtidos pelo governo anterior e por uma conjuntura externa favorável, abandonou, aos poucos, a agenda reformista e, após a crise de 2008 iniciou uma inflexão na política econômica, assumida por completo no primeiro mandato de Dilma Rousseff sob o nome de “nova matriz econômica”.
23 – Hoje, é evidente o fracasso rotundo da nova matriz, assim como do projeto compensatório de que era parte. Vulnerável ao impacto concomitante de uma crise ética, uma crise econômica e uma crise política, o governo Dilma foi abreviado por decisão do Congresso Nacional, segundo rito aprovado pelo Supremo Tribunal Federal.
24 – Antes da análise dessas três crises e do processo de impeachment delas resultante, vale lembrar o primeiro e mais sério revés sofrido pelo governo: as jornadas de junho de 2013. Naquele momento, as ruas foram tomadas por uma sequência de manifestações, as mais importantes havidas no país desde a campanha das “Diretas Já”. Sua eclosão e sustentação foram inesperadas, pois nada houve anteriormente que indicasse o grau de descontentamento que nelas se manifestou. A situação econômica já comprometia o crescimento, dando alertas de risco há algum tempo, mas os resultados desastrosos da nova matriz não haviam ameaçado ainda o emprego. O desemprego era baixo e a renda média dos trabalhadores mantinha-se mais elevada que nos anos anteriores. Do ponto de vista ético, o lento desenrolar do processo do Mensalão exacerbou a insatisfação antiga e generalizada da população com o sistema político. Mesmo assim, do ponto de vista político, apesar das rusgas de sempre, a coalizão governamental parecia sólida.
25 – No entanto, em pouco tempo, manifestações convocadas em torno de reivindicações relacionadas à mobilidade urbana repetiram-se com um comparecimento cada vez maior e uma pauta de reivindicações também crescente. O que demandavam os manifestantes? Em primeiro lugar, mobilidade urbana, depois segurança pública, particularmente contra a violência policial, finalmente, antes de serem dissolvidas pela guerra entre policiais militares e partidários da ação direta, saúde e educação. Ironicamente, depois de 10 anos de governos que se apresentavam como de esquerda, os cidadãos pediam a ação do Estado. Reclamavam contra a ausência do Estado como planejador urbano e como provedor e regulador do fornecimento de serviços de segurança, saúde e educação à população. Se contarmos o repúdio manifesto ao sistema político, wua agenda poderia ser expressa nas palavras de ordem de “reforma política” e “reforma democrática do estado”.
26 – A partir de 20 13, as três crises mencionadas se intensificaram, seu cronograma e andamento foram convergindo e suas consequências foram mutuamente potencializadas. A vitória eleitoral de 2014 foi uma “vitória de Pirro” e o seu resultado imediato foi convencer os eleitores que a campanha governista havia sido deliberadamente enganosa. Logo após a posse e os primeiros atos do governo passou a ficar claro para uma extensa maioria que o governo estava estabelecendo um rumo oposto ao prometido na campanha. Paralelamente, os primeiros resultados da operação Lava-Jato mostraram o funcionamento de um sistema de corrupção muito mais extenso, complexo e duradouro que o precedente do Mensalão. Foi o suficiente para o desencadeamento de uma campanha a favor do impeachment da presidente.
27 – Paralelamente, a crise econômica ganhou intensidade. Os grandes grupos empresariais do país, aliados do governo desde 2002, beneficiados com favores governamentais de todo tipo, concedidos de forma abundante, embora discricionária, mostravam preocupação. A crise não poderia chegar ao extremo do caos, na economia e na ordem pública. Vocalizaram para o governo a necessidade de uma política de ajuste fiscal, de modo a proceder à recomposição das contas públicas. O governo tentou implementar essa política, contra a oposição permanente de grande parte de sua base parlamentar. No momento em que ficou clara a incapacidade de o governo levar a cabo essa política, o chamado “PIB” brasileiro aderiu à tese do impeachment.
28 – Finalmente, a oposição empresarial ao governo encontrou eco no PMDB e nos partidos conservadores da coalizão governamental. Na esteira de um crescendo de desentendimentos uma aliança de doze anos foi desfeita. A partir de então, a vitória do impeachment foi apenas uma questão de tempo.
29 – O governo Temer assume, portanto, com um mandato claro: proceder ao ajuste fiscal, implementar as reformas necessárias para tal, principalmente a reforma da previdência, estancar a recessão e retomar o crescimento. Essa agenda interessa evidentemente aos empresários, mas interessa também aos trabalhadores e às camadas mais pobres da população, que seriam claramente os mais prejudicados com a continuidade e agravamento da crise . Aprendemos, desde o Plano Real, que estabilidade econômica é condição de qualquer política de equidade. Tivemos no governo Dilma a prova reversa dessa afirmação: o fim da estabilidade causa aumento da pobreza e da desigualdade. Em síntese, a agenda Temer tem um aspecto progressista, que justifica o apoio e a participação da esquerda e do PPS no seu governo.
30 – No entanto, os pontos de confluência não podem ser usados para mascarar as fontes de conflito no interior da aliança que sustenta o governo. Primeiro, aceitar uma política de ajuste fiscal implica reconhecer que o acesso ao dinheiro público passa a ser um jogo de soma zero. Mais recursos com uma finalidade implicam necessariamente menos recursos para outra. Não por acaso lideranças corporativas do meio empresarial manifestam-se hoje pela manutenção de subsídios diversos pagos com recursos públicos. Em que pese vários setores entenderem essa reivindicação como progressista, ela concorre com o déficit secular do Estado, que pesa sobre a grande maioria dos brasileiros mais pobres e deve, em linhas gerais, ser recusada na perspectiva de um programa de governo da esquerda reformista.
31 – Além disso, a questão da reforma democrática do Estado, que levou milhares de brasileiros às ruas em 2013, tende a ser encarada de maneira limitada pelo governo. Sua principal tarefa é a restauração da estabilidade econômica, de modo que toda reforma passa pelo crivo de sua contribuição para esse objetivo. A reforma da previdência tem o seu foco na economia de recursos públicos de modo a dar sustentabilidade ao sistema. Está correto, é um avanço, mas há mais a ser feito nessa área, na perspectiva de maximizar a equidade e a sustentabilidade do sistema. A reforma tributária terá como centro o aumento da arrecadação e talvez a simplificação do sistema. Avançará, no entanto, na tributação dos dividendos, das grandes fortunas, na substituição do caráter regressivo do sistema atual por um outro no qual os ricos paguem proporcionalmente mais que os pobres? Poderá o PMDB e os partidos conservadores que passaram pelo governo do PT formular uma política de planejamento urbano que reduza o peso do transporte individual e aumente a importância do transporte coletivo? Há no horizonte do governo Temer uma política de segurança pública que reconheça a violência policial como parte do problema? Sabemos que a resposta a essas e a outras perguntas análogas tende a ser negativa.
32 – O ciclo político que tem início com o impeachment de Dilma Rousseff se encerrará com as eleições de 2018. Quais são os cenários previsíveis? Em termos econômicos, os dados indicam até o momento para o sucesso da política de recuperação. A expressiva queda da inflação, a tendência à queda nas taxas de juros, a retomada, ainda tímida, do crescimento, apontam nessa direção. Se tudo, inclusive a aprovação das reformas, ocorrer no cronograma esperado pelo governo, os indicadores positivos poderão chegar até à reversão do quadro de desemprego. Nesse caso o governo terminaria seu mandato com algo semelhante a um Plano Real em pequena escala nas mãos. Em condições do século XX isso seria mais do que suficiente para eleger o novo presidente. Hoje, contudo, o leque das demandas é mais complexo.
33 – Se o quadro econômico aponta para um futuro cada vez menos incerto, o oposto ocorre no que respeita ao quadro político. A imprevisibilidade reina nesse ponto. A qualquer momento, o governo Temer pode encontrar seu fim na decisão do Supremo Tribunal Federal sobre irregularidades cometidas na campanha. A operação Lava-Jato segue seu curso e não sabemos ainda quais os nomes que serão atingidos nos próximos meses, nem se haverá tempo para sua exclusão do jogo eleitoral ou para sua reabilitação junto à opinião pública. O fato é que ficam cada vez mais escassos os nomes de partidos e candidatos não mencionados nos trabalhos da Lava-Jato. Não é possível prever ainda o impacto eleitoral da divulgação dos resultados da Lava-Jato sobre os principais partidos. Uma possibilidade real é a debacle eleitoral de todos os partidos mencionados, como já ocorreu em parte com o PT nas eleições de 2016. O mesmo vale para todos os candidatos tradicionais dos maiores partidos.
34 – Examinemos o quadro eleitoral à luz dos quatro quadrantes da política democrática no mundo globalizado. Vemos, em primeiro lugar, o surgimento de uma candidatura até o momento competitiva, no campo da direita conservadora, algo inédito na vigência da Constituição de 1988. Bolsonaro vocaliza o nacionalismo estatista, conectado com a política econômica do regime militar; o conservadorismo nos costumes; e o autoritarismo na política. Tudo em sintonia com seus similares europeus.
35 – A direita liberal no Brasil, embora com representantes em diversos partidos, tem sido historicamente representada pelos Democratas e por seu antecessor, o PFL. Nas eleições presidenciais tem acompanhado as candidaturas do PSDB, em razão da aliança desses partidos no governo de Fernando Henrique e na oposição aos governos de Lula e Dilma Roussef. O PSDB, por sua vez, representou mais claramente essa corrente política nos momentos do seu percurso em que se afastou do lado social das políticas sociais-liberais de Fernando Henrique para restringir-se às propostas econômicas, principalmente aquelas de ajuste e responsabilidade fiscais. É possível, portanto, que, mais uma vez, um candidato do PSDB canalize o voto desse quadrante.
36 – Com as hesitações e, até certo ponto, a retirada do PSDB desde que se viu na oposição, o campo da esquerda cosmopolita está pouco povoado no momento. Vimos que o PT ensaiou por um breve momento reivindicar o protagonismo no seu interior. De forma semelhante, a REDE, de Marina Silva, tenta abordar sua agenda pelo lado da sustentabilidade. No entanto, para parte importante da expressão parlamentar da REDE, sustentabilidade é apenas um adendo moderno a concepções de Estado, economia e política características da esquerda tradicional. Assim como o PSDB transita entre os campos da esquerda e da direita cosmopolitas, a REDE se locomove entre a esquerda nacionalista e estatista e um campo de esquerda cosmopolita, centrado na sociedade civil. Resta como ator possível nesse campo, o PPS. Talvez seja o partido com maior clareza acerca dos impasses que uma esquerda moderna deve enfrentar, em razão de sua história, mas não conseguiu, nas eleições recentes, densidade político-eleitoral suficiente para a apresentação de candidaturas próprias e a demarcação pública de suas posições. No entanto, o fracasso sucessivo do PT e do PSDB em representar esse campo de forma consequente, assim como as limitações reveladas por outros partidos para fazer o mesmo, abre espaço para uma atuação mais incisiva do PPS nesse rumo. Nesse sentido, a candidatura própria a Presidente da República é uma possibilidade que não pode ser descartada com vistas à eleição de 2018.
37 – O campo da esquerda nacionalista e estatista tem o PT como seu principal expoente. Seu candidato será Lula, na medida em que sua situação de investigado na operação Lava-Jato assim o permita. Nesse campo disputam espaço também o PSOL e o PDT, com a candidatura de Ciro Gomes exposta à opinião pública. A proposta de campanha desse campo está expressa em recente manifesto de intelectuais de apoio à candidatura Lula: a retomada do programa de campanha de Dilma em 2014.
40 – Finalmente temos a maior parte do PMDB e os demais partidos que integram o chamado “centrão”. Políticos tradicionais, educados na distribuição de benefícios com recursos públicos, de rala identidade ideológica, transitam com facilidade pelos quatro quadrantes analisados. Apoiaram os governos do PT e, antes, os do PSDB. Podem até se aliar a Bolsonaro, por intermédio das bancadas religiosas. Entretanto, em razão da aliança do presidente Temer com o PSDB, também pode se gestar uma frente construída em torno de uma plataforma de centro-esquerda cosmopolita. No entanto, tudo indica que o PMDB e o PSDB estarão entre os setores mais atingidos pela renovação eleitoral que a Lava-Jato propiciará.
41 – Nesse quadro o PPS deve, da definição de sua política de alianças para as eleições, considerar três pontos relevantes. Primeiro, a possibilidade real de redução do espaço de convergência com o governo Temer depois da aprovação das reformas trabalhista e previdenciária, à medida que uma segunda leva de reformas (política e tributária) entre na agenda. Segundo, a flexibilidade como diretriz necessária para enfrentar a complexidade do quadro eleitoral. Isso implica evitar toda estratégia fundada na bipolaridade, uma vez que há interfaces diferentes de discussão com atores dos vários campos mencionados, com exceção da direita conservadora. Terceiro, o uso inteligente da regra dos dois turnos nas eleições, que permite combinar um momento de afirmação da identidade política do partido com outro de construção de amplas alianças interpartidárias.
O PPS considera que um programa democrático, reformista e de esquerda deve, na conjuntura atual, se fundamentar nos seguintes pontos:
Uma visão positiva, embora crítica, do processo mundial de globalização como indutor de mudanças históricas e irreversíveis em todas as dimensões da vida social. Ao mesmo tempo, é preciso construir e apoiar políticas que visem a redução dos impactos negativos dessas mudanças sobre os setores sociais mais frágeis.
A globalização só será uma fase positiva da história da humanidade se estiver concatenada com uma visão cosmopolita do mundo, o que supõe avanços políticos democratizantes nas relações internacionais e a consolidação de governos democráticos ao redor do mundo.
Manter a crítica a uma política externa de corte terceiro-mundista em prol da retirada de barreiras ao comércio internacional e da integração cada vez maior entre os países, rechaçando igualmente o chauvinismo, o belicismo, a xenofobia e a isolamento nacional, com o intuito de favorecer a democratização dos organismos internacionais, a resistência ao hegemonismo das grandes potências e o avanço das políticas de integração regional.
Em função do impacto das mudanças tecnológicas no mundo do trabalho é preciso reformar a legislação trabalhista, a representação sindical e o sistema previdenciário para incorporar os novos tipos de trabalhador que surgem e se disseminam; é preciso assumir uma atitude de autêntica e permanente reforma das instituições e da legislação, procurando promover e garantir uma maior adaptação dos trabalhadores a essa nova situação. No plano político, há uma crise na democracia e não uma crise da democracia.
A globalização e as mudanças tecnológicas alteraram o mapa político bem como a forma convencional de como a política era feita no século XX. A explosão das comunicações on-line em redes se alastrou e passou a exigir uma “nova política”, entendida como uma luta por mais democracia, alterando formas de representação e operação da política.
No caso brasileiro deve-se anotar o esgotamento de dois projetos que estiveram no poder depois da redemocratização. O projeto reformista dos governos FHC e o projeto compensatório dos governos Lula e Dilma. Tal esgotamento faz com que o país busque atualmente uma nova alternativa para o seu presente e o seu futuro, partindo dos anseios que se expressaram desde as “jornadas de 2013” nas quais se propunham reformas para a melhoria da vida das pessoas.
O impeachment que colocou fim ao governo Dilma Rousseff, alicerçado na comprovação dos desmandos praticados, foi uma demanda da sociedade e das forças políticas objetivando superar uma crise devastadora que se abateu sobre o país. O governo Temer é, portanto, derivado dos ditames constitucionais e se mantem dentro dos quadros do regime democrático estabelecido pela Carta Constitucional de 1988, sob o amparo das instituições políticas da República.
O governo Temer se configura, portanto, em um governo de transição para o país se equilibrar e chegar em melhores condições às eleições presidenciais de 2018. Suas tarefas fundamentais são realizar o ajuste fiscal, implementar as reformas necessárias para estancar a recessão, retomar o crescimento e garantir estabilidade. Em síntese, a agenda Temer tem um aspecto democrático e progressista que justifica até aqui o apoio e a participação da esquerda e do PPS no seu governo.
Os desafios a serem enfrentados pelo governo Temer em torno da agenda de reformas coloca claramente os pontos e o terreno no qual deve aparecer a distintividade de um projeto de esquerda democrática para o país. É em torno de um grande projeto de “reforma democrática do Estado” que se deve pautar o debate e os encaminhamentos que estão colocados nas reformas da previdência, na reforma tributária e na reforma política.
Nessa agenda de segundo momento de reformas, o PPS deve prosseguir nas diretrizes que defende historicamente. No caso da reforma política, o aperfeiçoamento da representação, por meio da atualização das bancadas de deputados de cada unidade da Federação, da mudança da regra eleitoral no sentido do voto em lista fechada e do sistema distrital misto, da mudança das regras de financiamento de campanha e, finalmente, da transição em direção ao parlamentarismo.
No que se refere à reforma tributária, o PPS deve pugnar pelo retorno da tributação sobre dividendos e, de maneira geral, pugnar pelo sentido progressivo dos impostos; além do aumento da simplificação, transparência e desconcentração do sistema tributário.
Diante dos possíveis cenários nos quais podem ser vislumbradas algumas candidaturas presidenciais para a campanha de 2018, a posição do PPS deve ser “programática”, apresentando-se com uma candidatura própria ou apoiando outra candidatura. O importante para o PPS no atual quadro é fortalecer o que torna distinto o seu programa dos projetos que se esgotaram nos governos pós-democratização bem como dos projetos que hoje se anunciam, mas que padecem de um convencimento mais objetivo.
José Roberto de Toledo: Temer sepulta a política
A confiança em quase todas as instituições políticas despencou desde 2016
Temer fez o que ninguém conseguiu: transformou a Presidência da República em instituição menos confiável até do que os partidos políticos. Pesquisa inédita do Ibope revela que, de 0 a 100, a confiança dos brasileiros no presidente despencou de 30 para 14, desde 2016. Pela primeira vez, é menor do que a confiança nos partidos. De fato nada é menos confiável aos olhos da população hoje do que quem ocupa a Presidência. E esse nem é o pior problema detectado pelo Ibope.
No último ano, a desconfiança na política em geral bateu todos os recordes – segundo a edição 2017 do Índice de Confiança Social, que o Ibope pesquisa e calcula anualmente desde 2009. Do governo federal às eleições, passando pelo Congresso e pelos partidos, a confiança em quase todas as instituições políticas despencou desde 2016, com exceção dos (recém-eleitos) governos locais. A maioria delas chegou ao seu ponto mais baixo em 2017.
Já é ruim o suficiente porque mostra que, ao contrário do que dizem os políticos, as instituições que eles comandam não estão funcionando – não aos olhos de quem os elege. Mas nem é o tamanho inédito da descrença da população nas estruturas que exercem o poder que mais preocupa. Quando se compara a outras instituições, percebe-se que a crise de confiança não é generalizada. Ao contrário, ela tem foco e sujeito determinado.
Em 2009, a confiança nas instituições políticas era 15 pontos menor do que a confiança média nas demais instituições: 48 a 63. Oito anos depois, a desconfiança na política dobrou, e a no resto ficou praticamente estável. O processo começou com os protestos de junho de 2013, se aprofundou com o impeachment de Dilma e chegou a seu ápice com Temer. Em 2017, o “gap” de confiança nas instituições que envolvem políticos – em relação às demais instituições – chegou a inéditos 35 pontos: 25 a 60.
“Com o descrédito da política, as pessoas estão se apegando à fé e à polícia. Ou seja, as instituições cuja percepção majoritária da população é que estão fazendo algo para melhorar”, diz a CEO do Ibope Inteligência, Márcia Cavallari.
De 2016 para 2017, a confiança média no conjunto das seis instituições políticas (governo federal, eleições, Congresso Nacional, partidos políticos, presidente e governos municipais) caiu 15%. Ao mesmo tempo, a confiança nas outras 14 instituições subiu, em média, 8%. Entre as mais confiáveis aparecem igrejas (subiram de 67 para 72), Polícia Federal (de 66 para 70), Forças Armadas (de 65 para 68) e meios de comunicação (de 57 para 61).
Projetando-se esse descompasso de confiança para as eleições presidenciais de 2018, percebe-se onde eventuais candidaturas-surpresa – e até um pretenso salvador da pátria – poderão se apoiar. Não há transposição direta de confiança de instituições para pessoas. Nem todo padre ou pastor será automaticamente um favorito na corrida presidencial. Mas terão influência.
O mesmo vale para militares (vide o crescimento da intenção de voto em Bolsonaro) e policiais federais. E promotores? A confiança no Ministério Público ficou estável em 54 pontos. É maior do que nos políticos, sindicatos e na Justiça em geral, mas menor do que nos bombeiros, policiais e até nos bancos.
Indubitável mesmo pela pesquisa é que quem estiver ligado ao governo federal ou umbilicalmente conectado ao presidente terá muito mais dificuldade para se eleger do que quem estiver contra ele. A falta de manifestações de rua expressivas e de panelaços pode dar a falsa impressão a deputados e partidos governistas de que sustentar Temer no poder não lhes custará tão caro assim. O autoengano é sempre um atalho para o suicídio político.
O Estado de S.Paulo
Fonte: http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,temer-sepulta-a-politica,70001907392
O Globo: A proposta de uma antirreforma política
São inconcebíveis R$ 3,6 bilhões para campanhas e o ‘distritão’, de que se beneficiarão apenas políticos conhecidos, em prejuízo dos partidos e da renovação
A proximidade de outubro, quando se esgota o prazo para que mudanças na legislação eleitoral vigorem no pleito do ano que vem, agita um Congresso preocupado com as finanças da campanha. E como o tempo é curto, amplia-se a margem de risco da aprovação de medidas de um modo geral equivocadas, e, no caso do financiamento dos gastos eleitorais, contrárias ao interesse do contribuinte.
O perigo é real, como demonstra uma miscelânea batizada de reforma, sob relatoria do deputado Vicente Cândido (PT-SP), que ganhou notoriedade ao embutir emenda no projeto para que candidato condenado a até oito meses do pleito não seja preso. Logo recebeu o nome de “emenda Lula”, líder máximo do partido do deputado e condenado em primeira instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O reluzente chamariz desse projeto é o inconcebível aumento do Fundo Partidário, já em elevados R$ 800 milhões, para R$ 3,6 bilhões ou o equivalente a 0,5% da receita líquida da União. No pleito de 2022, seria reduzido para 0,25%. Em nada alivia para quem paga imposto.
É certo que a democracia tem um custo. Mas é preciso debater esta opção de uma contribuição compulsória de R$ 3,6 bilhões, pelo contribuinte, enquanto as contas públicas continuam muito desequilibradas, e persistem efeitos sobre a população da abissal recessão de 2015 e 2016. Na falta de emprego e na queda da renda.
Este projeto também avança em outro desatino, com a instituição do tal “distritão”, pelo qual cada estado seria um distrito, em que os mais bem votados ocupariam os assentos da bancada estadual, em ordem decrescente.
O sistema é muito simples de entender e, à primeira vista, irretocável do ponto de vista de preceitos democráticos. Afinal, entrariam na bancada os mais votados. Mas é positivo só mesmo à primeira vista.
Ao atender o senso comum — algo quase sempre perigoso —, o “distritão" só beneficiará candidatos à reeleição, portanto, já conhecidos, e famosos em geral. Irá em sentido contrário à necessidade de renovação na política, e ainda deixará em plano secundário os partidos, cujo fortalecimento é crucial para a democracia representativa.
Esboça-se a possibilidade da volta daquele clima de feira livre que o então presidente da Câmara Eduardo Cunha criou em 2015, ao tentar votar uma reforma política a toque de caixa, sem qualquer maior reflexão.
Enquanto isso, está em fase final de tramitação na própria Câmara proposta de emenda constitucional, já aprovada no Senado, com uma reforma eficaz, na medida certa: cláusula de desempenho para exigir que partidos tenham um mínimo de votos, a fim de ter acesso a prerrogativas como o uso do dinheiro do Fundo; e a extinção das coligações em pleitos proporcionais, para não ser distorcida a intenção do eleitor. Não se deve perder esta oportunidade.
Editorial O Globo
Eliane Cantanhêde: Em causa própria
Congresso prepara ‘surpresas’ contra a Lava Jato e a favor dos parlamentares
O Congresso Nacional já está levando palmadas da Lava Jato, broncas da opinião pública e notas baixas nas pesquisas, mas aproveita o recesso para fazer mais peraltices. Como o Estado vem antecipando, os parlamentares tentam usar a reforma política e a reforma do Código Eleitoral para favorecer os alvos da Justiça, do Ministério Público e da Polícia Federal.
Um dos exemplos mais lustrosos é a tal “emenda Lula”, que aumenta de 15 dias para oito meses o prazo em que os candidatos às eleições já de 2018 não podem ser presos, a não ser em flagrante delito. Oito meses é uma eternidade. Principalmente para cometer crimes impunemente.
Quem assume a ideia é o relator da comissão especial da reforma política, deputado Vicente Cândido (PT-SP), e fica evidente a intenção de garantir duas blindagens para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o único nome que os petistas de fato consideram para 2018. De um lado, dificultaria a prisão de Lula. De outro, garantiria a sua candidatura.
O argumento de Vicente Cândido é realista: caso aprovada, a mudança não beneficiaria apenas Lula, mas dezenas, ou centenas, de candidatos que estão com a PF, o MP e a Justiça no cangote. Logo, ele prevê um acordão para a votação em plenário. E nós, o que prevemos? Que haverá dezenas, ou centenas, de candidatos pintando e bordando por aí, ilesos.
A outra bondade coletiva gestada no Congresso, conforme o Estado de ontem, é numa outra comissão, a do Código de Processo Penal. Se nunca aprovou e até articulou estraçalhar as dez medidas anticorrupção sugeridas por procuradores, a Câmara agora tenta partir para cima de três pilares da Lava Jato: a delação premiada, a prisão preventiva e a condução coercitiva.
O relator é o deputado João Campos (PRB-GO), que pretende apresentar seu parecer em agosto, para votação em plenário já em outubro. Isso, claro, é só uma esperança dele e dos interessados diretos, que temem justamente as delações, prisões e conduções coercitivas. É improvável, porém, que haja clima para passos tão ousados na contramão da opinião pública.
Além dessas mudanças, há outras no Congresso sob encomenda para favorecer os próprios parlamentares. Exemplo: o projeto de parcelamento e perdão de dívidas tributárias e previdenciárias. Pois não é que os deputados e senadores que vão votar esse negócio de pai para filho devem R$ 532,9 milhões à União? Se isso não é legislar em causa própria, é o quê?
Essas iniciativas caracterizam o típico corporativismo, ou espírito de corpo, já que a maioria dos partidos (incluindo todos os maiores) e grande parte da Câmara e do Senado são atingidos pela Lava Jato e temem as novas delações que estão sendo negociadas principalmente com a Procuradoria-Geral da República, mas também com a Polícia Federal – caso do publicitário Marcos Valério, pivô do mensalão.
Não custa lembrar que iniciativas anteriores para livrar políticos ou para limitar as investigações não deram certo. A gritaria da sociedade foi mais forte e os parlamentares foram obrigados a voltar atrás na descaracterização das dez medidas anticorrupção, na nova lei de combate ao abuso de poder e na inclusão de parentes de políticos nas benesses da repatriação de recursos ilegais no exterior.
Ou seja, por enquanto, as ideias das comissões são apenas ideias, rascunhos que podem ser muito bem alterados antes de ganharem corpo e serem submetidos aos plenários para virarem lei. E não serão aprovadas se a sociedade, escaldada que está, ficar alerta e de olho vivo. Mais uma vez, é melhor prevenir, enquanto são só projetos, do que chorar sobre o leite derramado, depois da aprovação no Congresso.
Denis Lerrer Rosenfield: Parlamentarismo e importação de ideias
A aprovação de reformas, passa por negociações que nada têm de republicanas, embora sejam de interesse nacional
Volta e meia, imerso em crises, o país vê-se confrontado com propostas de reforma política, voltadas para a implementação do parlamentarismo no país. É como se, em um passe de mágica, todos os problemas fossem suscetíveis de um equacionamento simples, baseado em uma mera troca de sistema de governo. O problema, porém, reside em que as instituições parlamentaristas muito bem funcionam no nível dos princípios ou em seus países de origem. Nada disto, porém, corresponde ao seu funcionamento quando transplantadas a outros países de tradições e histórias distintas.
A questão, muito bem analisada na obra de Oliveira Vianna, consiste na refração das ideias e no deslocamento das instituições. Teria sentido simplesmente importar um sistema de governo? Seria ele “importável”? As ideias ganham, neste processo, outro significado a despeito de guardarem a aparência de sua significação anterior. Os “importadores” podem ter, inclusive, a melhor intenção, mas seus efeitos podem também não corresponder ao que foi projetado.
Operando em outro contexto institucional, conforme outra história, produzem consequências que não ocorreriam em seus países de origem. A depender do modo de utilização das ideias, elas podem vir a produzir grandes deslocamentos políticos. Como pode uma ideia constitucional vingar em países de tradição totalmente diferente? De que valem comparações, se essas não levarem em conta o contexto histórico de implementação destas ideias?
Há uma certa tendência na política brasileira de opção por grandes transformações, em vez de mudanças graduais que observariam os vários contextos particulares de sua concretização. O parlamentarismo pressupõe partidos políticos organizados, com doutrinas próprias, que disputem a opinião pública segundo as suas concepções. Procuram conhecê-la e persuadi-la do bem fundado de seus projetos.
Não são meros agregados de pessoas e interesses, mas deveriam possuir um propósito válido para toda a coletividade. Ora, observamos na cena política brasileira um forte componente fisiológico e, mesmo, de corrupção que faz com que a representação política seja falseada, ou seja, submetida a trocas dos mais diferentes tipos para que propostas coletivas sejam aprovadas.
A aprovação de reformas, por exemplo, passa por negociações que nada têm de republicanas, embora sejam de interesse nacional. Imagine-se, em um sistema parlamentarista, o não atendimento deste tipo de demanda. Ele não repercutiria somente na não aprovação de um projeto, mas produziria um voto de desconfiança, podendo levar à queda do Gabinete. Dado o caráter inorgânico dos partidos políticos brasileiros, poderíamos ter vários primeiros-ministros no transcurso do ano.
De nada adiantam grandes ideias, se elas não vierem acompanhadas de medidas básicas, que seriam de muito valia para um melhor regime republicano. Pense-se que um novo governante deveria, por sua vez, substituir os milhares de cargos comissionados, criando uma total balbúrdia na administração pública. Necessita o país de tal número de cargos?
É evidente que a inexistência de cláusula de barreira para a criação de partidos políticos é um poderoso estimulo à fragmentação partidária, tornando difícil qualquer organização. A observação histórica mostra que, em sistemas de governo presidencialistas ou parlamentaristas, poucos partidos fortes são de natureza a produzir a estabilidade governamental.
Tampouco são favorecidas as instituições se esta pletora de partidos for organizada sob a forma de eleições proporcionais se, dependendo da aliança, o voto em um partido redundar na escolha de outro. A proibição de coligações partidárias seria um poderoso instrumento de depuração do sistema político, produzindo um mínimo de organicidade. Haveria uma coincidência entre a representação política e a partidária.
Agora, na contramão de qualquer depuração, estamos vendo nascer propostas de financiamento público de eleições estimadas em mais de R$ 5 bilhões. Em um país em séria crise econômica, não deixa de ser um escárnio. Tome-se o caso da França. As perdas dos socialistas e republicanos, por suas derrotas legislativas, são estimadas em torno de poucas dezenas de milhões de reais, já feita a conversão. O partido de Macron ganhou em torno de 80 milhões. Os patamares são, comparativamente, para nós, muito baixos. No Brasil, fala-se de bilhões de reais como se fosse apenas o necessário, da mesma forma que a nossa corrupção é de país rico, sempre calculada em bilhões.
Partidos deveriam ser financiados, enquanto entidades privadas, por seus membros e simpatizantes. Deveriam fazer um esforço de coleta, o que é, para pessoas físicas, permitido pela nova legislação. Considerando que não há nenhuma organicidade partidária, parte-se agora, vista a proibição da contribuição empresarial, para o financiamento público, que, de público, só possui o nome, pois é originário de impostos de contribuições. Tirar-se-ia do orçamento da Saúde, da Educação ou da Habitação, por exemplo, para o financiamento dos partidos.
Hoje, sabe-se, graças à Lava-Jato, que os recursos de empresas eram só aparentemente privados, sendo resultado da corrupção e do desvio de recursos públicos. Graças a este esquema político perverso, os espetáculos políticos midiáticos puderem acontecer. A opinião pública, despreparada, comprou a mensagem que lhe foi oferecida. A política tornou-se assunto de marqueteiros, mercadores de imagens, pagos a preço de ouro.
Oliveira Vianna, em seu célebre livro, “O ocaso do Império”, assinalava que, no Segundo Reinado, os partidos tinham se tornado “simples agregados de clãs organizados para a exploração em comum das vantagens do ´poder”. Ou ainda, “os programas que ostentavam eram, na verdade, simples rótulos, sem outra significação que a de rótulos”. Parece que está falando dos dias de hoje. Como pode vingar um sistema representativo sem partidos dignos deste nome?
* Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul